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TRIBUNAL DO JURI MENDONÇA, Alex Júnio de Campos Graduando em Direito - Anhanguera Educacional /Anápolis RESUMO Este documento visa apresentar características do Tribunal do Júri, bem como conceitos históricos e culturais acerca de tal tema. Vale ressaltar a procura por esclarecimentos quanto à necessidade do uso de juízes leigos na difícil missão de aplicar a justiça e definir o destino de vidas que podem ser arruinadas injustamente com condenações infundadas, bem como a possibilidade de impunidade quanto a crimes mal investigados. Contudo, o presente trabalho tratará de abordar pontos chave para a melhor definição de Júri e o comportamento da sociedade mediante este polêmico assunto. Palavras chave: Tribunal do Júri, justiça, sociedade. ABSTRACT This document aims to present characteristics of the Court of the Jury, as well as historical and cultural concepts about such topic. It is worth highlighting the search for clarifications regarding the need to use lay judges in the difficult mission to apply justice and define the fate of lives that can be unjustly ruined with unfounded condemnations, as well as the possibility of impunity for ill- investigated crimes. However, the present work will try to address key points for the best definition of Jury and the behavior of society through this controversial subject. Key words: Court of the Jury, justice, society. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem o objetivo de realizar um estudo sobre os diversos aspectos que permeiam o debate sobre o Tribunal do Júri, desde a sua inserção na legislação Brasileira até sua concretização nos moldes dos dias atuais, verificando sua estrutura e competência. O problema de pesquisa a ser investigado, portanto, refere-se á como se configurou historicamente a estrutura e competência do Tribunal do Júri brasileiro? Isto porque, segundo a hipótese básica de pesquisa o Tribunal do Júri devido a sua estruturação histórica no Brasil vem perdendo sua identidade ao longo desses anos, devido a muitos fatores de cunho político-social e até de despreparo dos membros escolhidos para enfrentar os desafios de julgar na sociedade moderna. O Júri Popular surgiu na época em que os povos, forçados pela impossibilidade de continuarem com a vingança privada, concederam ao Estado a legitimidade do direito-dever, em nome da coletividade, de julgar infrações cometidas, preservando, no seu campo de atuação, a participação efetiva na jurisdição do homem comum, membro da sociedade, através do Tribunal Popular, consagrando-se o Princípio do Estado Democrático de Direito. Por ser o corpo de jurados integrado por pessoas leigas, a crítica tem sido cada vez mais acirrada, no sentido de que a Instituição perdeu sua identidade ao longo dos anos, devido a muitos fatores de cunho político-social e até de despreparo dos membros escolhidos para enfrentar os desafios de julgar na sociedade moderna. Apesar disso, ainda há muitos defensores da Instituição. Por acreditar que, a partir de um referencial garantista, os jurados devem ser respeitados como verdadeiros juízes do fato e que a garantia do processo está destinada á livre convicção dos jurados, aliada a sua convicção íntima, é que se propôs a presente discussão. Mas a tal alcance somente chegaremos quando aos jurados for exigido que conheçam parte do direito penal, do direito processual penal e das provas do fato que irão julgar, senão, a decisão terá uma margem de erro no mínimo perigosa. O Júri tem origem inglesa, mas tanto á constituição quanto o acionamento são, no Brasil, bem diferente dos originais britânicos. O Tribunal do Júri, é reconhecidamente uma instituição antiga, cuja estrutura, moldada desde os povos primitivos, se consolidou na Inglaterra, adquirindo seus traços definitivos por volta de 1215. Criado depois do Concílio de Latrão, que aboliu as Ordálias e os juízos de Deus, após perder a aparência teocrática, tornou-se julgamento realizado em nome do povo, ganhando importância e se espalhando pela Europa e América do Norte. Na América do Norte em 1629, o Tribunal do Júri foi consagrado formalmente na Carta Régia, outorgada ao primeiro grupo de imigrantes incumbido da civilização colonial, e, ainda no século XVII, do mesmo modo que na Inglaterra, generalizou-se como " padrão comum", abrangendo o " julgamento geral de todas as causas, tendo sido consagrado na Constituição norte-americana como " o baluarte de liberdade dos cidadãos". DESENVOLVIMENTO O Tribunal do Júri é o órgão do poder judiciário que tem a competência para julgar os crimes dolosos, ou intencionais, contra a vida. Desde algum tempo após o descobrimento e até depois da Independência, a nossa legislação penal foi regida pelo livro V das Ordenações Filipinas de 1603, reformadas por D. João IV em 1643. Experimentamos, no início de nossa vida jurídica, a vigência de uma legislação verdadeiramente iníqua, tanto que ficou conhecida como a ‘famigerada lei”, tal a sua inconsequência e ilegalidade. Apenas para exemplificar, ela determinava que o delinquente devesse ser julgado conforme a “gravidade do caso e a qualidade do ofendido”. Permitia privilégios aos potentados e pena de morte aos humildes. Mandava que se executasse o réu pelo fogo, nos crimes de adultério e de incesto, e como bem nos reporta Ary Franco, fazia distinção entre o nobre e o peão, sendo que para aquele geralmente a pena era a de multa, e para este, quase sempre a de morte. Com a proclamação da Independência a 7 de setembro de 1822, o livro V das Ordenações Filipinas continuou vigendo até a Lei de 23 de novembro de 1823, que abrandava um pouco a legislação anterior. O primeiro processo constitucional do Brasil iniciou-se com um decreto do príncipe D. Pedro I, que no dia 3 de junho de 1822 convocou a primeira Assembleia Geral Constituinte e Legislativa da nossa história, visando à elaboração de uma constituição que formalizasse a independência política do Brasil em relação ao reino português. Dessa maneira, a primeira constituição brasileira deveria ter sido promulgada. Acabou, porém, sendo outorgada, já que durante o processo constitucional, o choque entre o imperador e os constituintes, mostrou-se inevitável. A abertura da Assembleia deu-se somente em 3 de maio de 1823 para que, nesse tempo, fosse preparado o terreno através de censuras, prisões e exílios aos opositores do processo constitucional. Com um total de 90 membros eleitos por 14 províncias, destacavam-se na Constituinte, proprietários rurais, bacharéis em leis, militares médicos e funcionários públicos. Para elaborar um anteprojeto constitucional, foi designada uma comissão composta por seis deputados sob liderança de Antônio Carlos de Andrada, irmão de José Bonifácio. A posição da Assembleia em reduzir o poder imperial, fez D. Pedro I voltar-se contra a Constituinte, dissolvendo-a, nos seguintes termos: (…) Havendo eu convocado, como tinha direito de convocar, a Assembleia Constituinte Geral e Legislativa, por decreto de 3 de junho do ano passado, a fim de salvar o Brasil dos perigos que lhe estavam iminentes: E havendo esta assembleia perjurado ao tão solene juramento, que prestou à nação de defender a integridade do Império, sua independência, e a minha dinastia: Hei por bem, como Imperador e defensor perpétuo do Brasil, dissolver a mesma assembleia e convocar já uma outra na forma de instruções feitas para convocação desta, que agora acaba, a qual deverá trabalhar sobre o projeto da Constituição que eu lhe dei de em breve lhe apresentar, que será mais duplicamente liberal do que a extinta assembleia acabou de fazer . Foi a primeira constituição de nossa história e a única no período imperial. Com a Assembleia Constituinte dissolvida,D. Pedro I nomeou um Conselho de Estado formado por 10 membros que redigiu a Constituição, utilizando vários artigos do anteprojeto de Antônio Carlos. Após ser apreciada pelas Câmaras Municipais, foi outorgada em 25 de março de 1824, sendo-nos imposta a primeira constituição. Mas antes mesmo que fosse outorgada a primeira carta constitucional brasileira, já em 18 de junho do mesmo ano de 1822, e através de uma lei específica, foi criado o Tribunal do Júri, com competência, entretanto, apenas para o julgamento dos crimes de imprensa, restrição esta mantida pelo decreto de 22 de novembro de 1823. Não fazia, entretanto, parte do Poder Judiciário, e somente com a outorga da carta constitucional imperial de 25 de março é que foi ele integrado ao título de judiciário, com atribuição para julgar toda e qualquer matéria de fato, fosse ela criminal, fosse ela de origem civil. Com o passar dos tempos, o Júri foi se acomodando e se limitando nos contornos de sua competência, chegando até a República com a competência para se manter, como dizia Ruy, como uma instituição que surge e que morre com a liberdade. Com o surgimento da República, com ela veio a constituição de 1891 que estabelecia, alicerçada em um verbo-núcleo: “manter”. Dizia nossa primeira constituição republicana, a respeito do Tribunal Popular do Júri: É mantida a instituição do Júri. Com isto, o legislador não só assegurava a existência da instituição, como obrigava o respeito a ela nos exatos termos em que vigoraram durante o império. A expressão “É mantida a instituição do Júri”, não só o legislador estava chancelando, como afiançando até a sua existência, fazendo com que se prorrogasse ad eternum a duração da entidade pré-existente. Dizia Ruy, “Essa cláusula tem, portanto, o duplo valor de uma garantia e de uma definição. Resolve continuar as formas tutelares do Júri, tais quais as fixara o uso nacional, apoiado no das outras nações.”. Não foi fácil o embate dos seguidores com os antagonistas, que buscavam cercear e desnaturar progressivamente a tradição do Tribunal Popular. O certo é que se procurou por todas as formas e por todos os caminhos, nem sempre confessadas, buscar-se a abolição do Tribunal do Júri. Mas, desses embates, vencedor saiu o Tribunal, não mais provincial como era no Império, mas sim, nacional como vive até hoje. Trazia no seu âmago o princípio ruyano de que “não é, com efeito, o júri unicamente uma instituição jurídica: é uma criação política de suprema importância no governo constitucional”. Pela legislação processual, o jurado era escolhido por sorteio, assim como era instalada com base na soberania da consciência, acrescentando-lhe aquela independência suprema sem a qual não se pode admitir a própria existência da instituição, pois o que é essencial a todo instituto judiciário, politicamente considerado, é a independência. Ao jurado, havia de se esperar a independência de seus julgamentos, alicerçados em duas faces: uma, interior, comandada pela boa consciência humana, cheia de isenção e que costumamos chamar de imparcialidade. A outra, é a que se baseia na irresponsabilidade do jurado, como forma de eliminação dos perigos e dependências, que eventualmente podem constrangê-lo, tornando-o parcial. Com esses dois atributos essenciais ao jurado, temos como filha dileta da imparcialidade o direito máximo que o leva até a recusa em julgar. E a outra é garantida pelo sigilo das votações. Mas a essência máxima do Tribunal do Júri, mantida pela República está no segredo das suas deliberações e todas essas garantias não estão destinadas nem ao Poder Judiciário, nem ao Poder Legislativo, e muito menos ao Executivo, porque, por exemplo, é congênito ao júri e dele inseparável o direito às recusas peremptórias. E o direito de escusações é destinado unicamente à defesa e à acusação. Júri e recusação peremptória, irmãs xifópagas, unidas pelo mesmo plasma orgânico, e que asseguram, a todo e qualquer ser humano, o direito de um julgamento imparcial. E tão importante é a recusação peremptória, que dela não se exige sequer a indicação dos motivos. Mas, lamentavelmente, esta instituição que atravessou incólume a história imperial não encontrou nos legisladores republicanos a mesma veneração de outrora. O Projeto Alfredo Pinto e, logo depois, a Lei 515, de 3 de novembro de 1898 emasculavam o Júri Popular. Em editorial do jornal A Imprensa, de 28 de dezembro de 1898, continha a verberação de Ruy Barbosa: O Projeto Alfredo Pinto é virtualmente o epitáfio desta instituição. Não se atreveu a ser consequente. Mas após ele, virá quem o seja; e, de redução em redução, cada vez mais facilmente, porquanto cada uma se apoiará em maior cópia de arestos legislativos, o júri irá minguando, até desaparecer de todo, sem que da Constituição, entretanto, se risque o ‘é mantido”. E concluía firmemente: “É mantido quer dizer: aqui jaz”. Mas foi no Rio Grande do Sul o estado onde o Júri encontrou suas maiores resistências. É que, meus senhores, a Constituição castilhista, com base no positivismo comtiano colocou os maiores embargos ao procedimento eminentemente democrático. A reforma de 26 não alterou aquilo que já era tradicional. Estabelecia como características do Tribunal a corporação de jurados, composta de cidadãos qualificados, renováveis periodicamente, estabelecendo-se a incomunicabilidade dos jurados entre si ou pessoas estranhas ao conselho. Previa a sustentação das provas da acusação e defesa produzidas oral e publicamente perante os jurados, que seriam livres para julgar segundo sua consciência, e, por fim, a irresponsabilidade pelo voto emitido contra ou a favor do réu, passava a ser a garantia instituída pelo sigilo das votações. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL (DE 16 DE JULHO DE 1934) Com a revolução liberal de 1930, vivemos um período em que, ainda que o Presidente da República tivesse os mais elevados poderes, somente com a Constituição de 1934, passamos a ter uma resolução sobre o nosso júri. Nós, os representantes do povo brasileiro, pondo a nossa confiança em Deus, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para organizar um regime democrático, que assegure à Nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bem- estar social e econômico, decretamos e promulgamos a seguinte constituição da república dos estados unidos do Brasil. Com ela, ampliado ficou o texto do artigo 72 da Constituição de 91, pois que no artigo de mesmo número 72 da Constituição de 34 tínhamos: “É mantida a instituição do Júri, com a organização e as atribuições que lhe der a Lei”. Esta Constituição teve vida efêmera de vez que, a 10 e novembro de 1937, através de um golpe de estado, o ditador revogou a Constituição, fazendo, como, aliás, já fizera D. Pedro I, outorgou a Constituição de 1937, Constituição esta com os mais profundos vezos ditatoriais, a ponto de omitir-se quanto a existência do Tribunal do Júri. Constituição dos Estados Unidos do Brasil (de 10 de novembro de 1937) O PRESIDENTE DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL, ATENDENDO às legitimas aspirações do povo brasileiro à paz política e social, profundamente perturbada por conhecidos fatores de desordem, resultantes da crescente agravação dos dissídios partidários, que, uma notória propaganda demagógica procura desnaturar em luta de classes, e da extremação, de conflitos ideológicos, tendentes, pelo seu desenvolvimento natural, resolver-se em termos de violência, colocando a Nação sob a funesta iminência da guerra civil; ATENDENDO ao estado de apreensão criado no País pela infiltração comunista, que se torna dia a dia mais extensa e mais profunda, exigindo remédios, de caráter radical e permanente; ATENDENDO a que, sob as instituições anteriores, não dispunha o Estado de meiosnormais de preservação e de defesa da paz, da segurança e do bem-estar do povo; Sem o apoio das forças armadas e cedendo às inspirações da opinião nacional, umas e outras justificadamente apreensivas diante dos perigos que ameaçam a nossa unidade e da rapidez com que se vem processando a decomposição das nossas instituições civis e políticas; Resolve assegurar à Nação a sua unidade, o respeito à sua honra e à sua independência, e ao povo brasileiro, sob um regime de paz política e social, as condições necessárias à sua segurança, ao seu bem-estar e à sua prosperidade, decretando a seguinte Constituição, que se cumprirá desde hoje em todo o País: Seguia ela a linha inflexível da Constituição ditatorial Polonesa, tanto que restou conhecida como “A Polaca”, e o seu redator pereceu com o epíteto de “Chico Ciência”. Apesar de não dar sequer as linhas mestres do Tribunal do Júri, aliás, preocupação totalmente descabida, pois que o ditador jamais governou com base no Texto Constitucional. Seu governo se caracterizou pela satisfação de suas vontades através da emissão de decretos. De 1937 a 1945, Getúlio Vargas governou por decretos. Com a queda da ditadura, experimentou o Brasil uma Constituição, a mais democrática que se poderia ter à época. O artigo 141, que a propósito tratava da declaração de direitos, trazia no seu § 28, a seguinte redação: “É mantida a instituição do Júri, com a organização que lhe der a Lei, contanto que seja sempre ímpar o número dos seus membros e garantido o sigilo das votações, a plenitude da defesa do réu e a soberania dos veredictos. Será obrigatoriamente da sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.”. Das leituras mais elucidantes sobre o texto constitucional de 46, está contido na obra do Desembargador do Tribunal Justiça do então Distrito Federal, Desembargador José Duarte. Em sua obra, traz em 3 volumes a exegese dos textos à luz dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte. O texto do § 28 do artigo 141, surgiu da emenda n° 2.726, da autoria do Deputado Aloísio de Carvalho, o homem que, junto com Ataliba Nogueira enfrentou os embates dos adversários da instituição do júri com a frase: Os defeitos do júri são os naturais das instituições humanas. Nós, homens, é que seremos, talvez, culpados dos erros e males do júri. Devemos, e muito, ao Juiz Magarinos Torres a sobrevivência do nosso Tribunal Popular, porque, como Juiz Presidente do Tribunal da Capital Federal, então Rio de Janeiro, não titubeou em manter bem alta a nomeada do Júri, ignorando todas as investidas do período ditatorial anterior. A Constituição de 46 durou até a vigência dos Atos Institucionais surgidos depois de 1964. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967 O Congresso Nacional, invocando a proteção de Deus, decreta e promulga a seguinte Dos Direitos e Garantias Individuais Art 150 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: § 18º – São mantidas a instituição e a soberania do júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Constituição da República Federatia do Brasil Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXVIII – é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida; Pela primeira vez, graças ao caráter eminentemente garantista, vez que pensa no cidadão e nos seus inalienáveis direitos, especifica, não mais as linhas longas de definição acerca do júri popular, especificando todas as suas circunstâncias existenciais. NUVENS tem, também uma direção à emasculação, ao descaracterizar o nosso tão sábio tribunal do júri. Há, já, anteprojetos tentando ‘escabinatar’ o júri, criando um tribunal com magistrados adjuntos chamados do povo, aos moldes dos tribunais dos Países Baixos, que se anexavam ao magistrado adjunto ao burgomestre. Ora, caros amigos, a ciência nos ensina que, todos os híbridos tendem a ser estéreis. E o que é mais importante que se diga, desde logo que, este sistema híbrido que se houve falar nos corredores frequentados pelos inimigos da instituição milenar, esses colegiados mistos só deram resultados em instituições hierarquizadas e onde deve ser observada a hierarquia. Deram e hão de dar sempre nos órgãos colegiados mistos formados, por exemplo, na Justiça Militar, composto por integrantes das Forças Armadas e bacharéis, quatro oficiais e um Juiz Auditor nos Conselhos Permanentes e Especiais de 10 grau. Aqui, no caso do nosso tribunal do povo, aquele que, como dizia Ruy, “não é, com efeito, o júri unicamente uma instituição jurídica: é uma criação política de suprema importância no governo constitucional. ” Outras criações inventivas já pululam, já se multiplicam-se muito, e com rapidez, nos porões das desilusões, tentando ter como causa da criminal idade, a existência das decisões populares. Temos que lutar, e essa creio ser a razão máxima desse seminário, pela manutenção de nossas sagradas instituições. E tenho certeza que, nessas fotografias que hoje se inauguram nesta catedral da justiça, passarão a ser, de ora em diante, os olhos atentos e fiscalizadores da manutenção integral do nosso Tribunal popular do Júri. No final dos anos 80 o Ministério Público, movido pelos ideais libertários do regime democrático e Estado de Direito que se consolidavam no Brasil, tornou-se a grande sentinela dos interesses metaindividuais, cujo arroubo e fascínio proporcionados por uma infinita gama de atribuições que ainda busca açambarcar mudou definitivamente seu perfil institucional, quiçá, de seus membros. Felizmente, todo esse avanço histórico restou ainda mais fortalecido pela investigação criminal, que, sem dúvida alguma, encontra-se legitimada pelo poder constituinte originário e seu verdadeiro titular, o povo. De todo modo, o Tribunal do Júri; instituição de aporte milenar, e símbolo rebenque a qualquer espécie de afronta aos direitos fundamentais, revela-se na sociedade contemporânea muito mais importante que outrora, apesar de todas as críticas. Homens qualitativos que notabilizaram o cenário jurídico (a exemplo do estadunidense Clarence Darrow; de Ferri, na Itália; Maurice Garçon, na França; Erskine, na Inglaterra; e Mongenout Bonfim, no Brasil, dentre tantos outros) fizeram da palavra e dialética na tribuna seu propósito de vida. Donos de retórica pujante construída nos plenários da Justiça, tiveram o destemor no cumprimento do dever ao se defrontarem com a face mais escura do fenômeno criminal, a morte, ainda que dela se possa falar em um dia de vida. Nos Estados Unidos o Júri é marcado pelo processamento de causas cíveis e penais. Na França, berço dos direitos humanos, forma-se o escabinato, ou seja, três magistrados e nove jurados, cuja culpa do acusado apenas será reconhecida em caso de oito votos dentre os doze integrantes. Na Espanha, a Constituição prevê que o cidadão tem o direito de participar da administração da Justiça. Nesse sentido, os esforços do Ministério Público brasileiro, digno de encômios, evidenciado na segunda semana nacional do Júri, materializou a tutela da ordem jurídica e do regime democrático, debruçado, dia após dia, sobre diversos processos que se perdem na infinidade do tempo, marcadopela solidão acusatória que perpassa o próprio campo jurídico e social; o parquet revela na figura clássica do Promotor do Júri toda a sua essência e história plasmadas na defesa do bem mais valioso que se pode proteger junto ao corpo social, a vida, contra a qual se tentou ou foi extirpada por um ato de violência. Em países do primeiro mundo, como os Estados Unidos da América, além de consagrado como um direito fundamental presente na Sexta Emenda, é sem dúvida um instrumento valioso a serviço da democracia que se faz, na perspectiva anglo-americana, pela participação direta do povo na vida pública, e não apenas e tão somente no exercício do direito ao voto. Em outras palavras, a presença da sociedade no Tribunal do Júri é resultado do princípio democrático, da democracia participativa, segundo a qual os cidadãos aprendem a democracia, e o exercício da liberdade, participando diretamente das decisões do poder, neste caso, do poder jurisdicional. Na América, a função de jurado está jungida ao processo democrático, tanto que demonstra o exercício pleno da cidadania e o acusado tem o direito substantivo fundamental de ser julgado pelos seus pares, quer dizer, por todos aqueles que fazem parte da comunidade onde o crime foi praticado. O Júri brasileiro, garantia fundamental e cláusula pétrea, sempre despertou o interesse de estudantes, operadores do direito, em especial de jovens promotores de justiça, notadamente no limiar da carreira onde o ingresso passa, necessariamente, pela tribuna. Demais disso, o luto da sociedade e o sangue da vítima simbolizados nas cores da tradicional beca do Promotor do Júri, sempre utilizada com brio e invejável nobreza, são partes de uma liturgia que cativa os jurados pelo forte simbolismo social. Quanto à roupa dos oradores, em particular, todos que leram os comentários introdutórios na primeira parte deste trabalho e atentaram para o que foi mencionado até este momento já puderam ter a dimensão da importância das vestes talares (ou seja, aquelas que vão até o talão = calcanhar, e que hoje em dia, talvez por questão de conforto e/ou modismo, estão mais curtas). Tanto a toga, para os magistrados, quanto a beca, para os promotores e advogados são o vestuário simbólico do cargo. Acreditem: todos que participam das sessões do júri, principalmente os jurados, esperam, conscientemente ou não, enxergar os personagens do Júri com os trajes que caracterizam a nobreza, a austeridade e a seriedade das suas funções. São os mesmos que desejariam ver o médico de jaleco branco, ou padre de batina, sob pena de minorar em importância a imagem do profissional ou o conceito do religioso. De mais a mais, essa situação se repete também na advocacia, e na magistratura; advogados como Troncoso Peres, Evandro Lins e Silva não devem ser, jamais, esquecidos, além da figura imparcial e serena de juízes como tão bem retratada por Magarino Torres. Por outro lado, a resistência contra o júri brasileiro tem avançado. Nesse passo, poder-se-ia supor, em raciocínio incauto e sofismático, que o Júri se tornou obsoleto, rudimentar e contraproducente. Na verdade, pensar assim seria o mesmo que defender o autoritarismo, a tirania e o silêncio próprio das ditaduras, enfim, um verdadeiro menoscabo aos dois pilares de sustentação do Estado Democrático de Direito: a democracia e os direitos fundamentais. Muito cedo se aprende no Júri que o momento em que o homem mais se aproxima de Deus é no momento em que ele julga, e o julgamento do homem pelos seus pares revela, sobretudo, sua conotação nitidamente democrática, exemplo de cidadania e de consciência popular. Del Vechio afirmava que o Direito Positivo não é apenas mutável, mas necessariamente mutável, logo, o veredicto de um Conselho de Sentença tende, sim, com o tempo, a sofrer progressiva mutação diante das transformações sociais, fato que assegura uma permanente atualização do ordenamento jurídico, sem levar em conta a equidade na apreciação das causas, à luz do bom senso, de considerações morais, éticas e psicológicas, livres da rigidez da letra fria da lei. As críticas permanecem, sob os argumentos de morosidade, de ter o Júri cumprido seu papel histórico, da complexidade do procedimento, além do tom teatral, levantam-se vozes que clamam por sua completa extinção. Sim, o Júri nacional precisa de aperfeiçoamento, não negamos isso, de simplificação de seu rito e quesitação, mas a ideia de extingui-lo em uma reforma política nos parece demasiadamente forte e descabida. Conquanto tenha sido feita, grosso modo, uma reforma da instituição do Júri, cabe ao Direito se adaptar à realidade e não o contrário, logo, deveria ter sido modernizado de acordo com as peculiaridades locais e não por meio de epistemologias estrangeiras, de centros com culturas e realidades distintas, salientando-se, contudo, que, no Brasil, possivelmente não temos um problema no Júri propriamente dito, mas sim nos homens. É preciso lembrar, ainda, que o Tribunal do Júri está alinhavado aos ideais responsáveis pelo surgimento do próprio Ministério Público, quer dizer, do Estado-acusação. Parte da doutrina afirma que a origem do Ministério Público está no antigo Egito, no chamado Magiai, que era um funcionário do Faraó encarregado de representar seus interesses, além de acusador oficial. Para outros, estaria em Roma, na figura dos Éforos - autoridades que detinham o poder de acusar e julgar. De sorte, prevaleceu, no entanto, a ideia de que a origem do parquet remonta da França, encarnada na figura dos Procuradores do Rei, e que, após a revolução francesa (1789), tornou-se um direito fundamental do indivíduo de que aquele acusador não deveria julgar, surgindo, a partir desse momento, o Estado-acusação, o Promotor de Justiça criminal. Desse modo, do Júri não deve nunca se afastar, sob pena de perda da própria identidade. A história nos mostra e adverte que toda a instituição de Estado que se distanciou, seja por qual motivo fosse, de sua origem e essência, acabou imiscuindo-se em matérias de somenos importância, distanciadas de seus fins, e o pior e mais grave, deixando de atuar onde deveria, perdeu espaço e acabou sendo substituída. Certamente no Ministério Público do porvir, além de firme e destacada atuação no processo civil coletivo e ações pontuais dos grupos de inteligência, sempre deverá existir espaço, isto é, um local de destaque a ser ocupado pelos Promotores do Júri, que, na defesa das vítimas e da sociedade, conseguiram manter viva a chama e essência da instituição paramentada nos ideais republicanos. CONCLUSÃO O Estado Democrático de Direito, instituído pela Constituição Federal de 1988, teve o reconhecimento e a proteção dos direitos fundamentais, sendo seu núcleo essencial a dignidade da pessoa humana. O ordenamento jurídico deve ser um instrumento de harmonia entre sistema positivo e os fundamentos do Estado Democrático de Direito no exercício da pretensão punitiva. A concretização da dignidade da pessoa humana deve ser fonte informadora da ordem jurídica, para que o Direito Processual Penal seja o Direito Constitucional aplicado. O Código de Processo Penal é instrumento de defesa da liberdade do cidadão e não exclusivamente de defesa social. O direito de punir estatal deve ser legitimado pela ponderação entre os interesses do réu, da vítima e da acusação. Na avaliação do sistema penal e processual penal, a dignidade da pessoa humana torna-se um elemento indispensável de hermenêutica, como concretização do sistema punitivo constitucionalizado. O princípio da presunção de inocência deve ser elevado á condição de dogma constitucional em decorrência da observância da dignidade da pessoa humana, fundamento do EstadoDemocrático de Direito brasileiro. Por fim, o estado de inocência preserva o cidadão, não podendo ser considerado objeto do jus puniendi, nem ter tratamento incompatível com os direitos e garantias inerentes na relação processual penal. O princípio da presunção de inocência importa em dupla interpretação: no que concerne á prova, quando guarda estrita relação com princípio do in dubio pro reo, de incidência probatória; e no que se refere ao status libertatis, identificando a excepcionalidade da imposição de restrição á liberdade do acusado. O princípio do in dubio pro reo é o componente substancial do estado de inocência, como um dos instrumentos processuais previstos para a sua respectiva preservação. Não podemos ouvidar que com o advento da lei 11.689/08 do Código de Processo penal sofreu várias modificações conforme está mencionado nas folhas 33 e 34 da presente. Restando de hora em diante obedecer os critérios da nova lei quando de seu novo aspecto normativo- processual. REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO BONFIM, Edilson Mougenot. No Tribunal do Júri. 5ª ed., São Paulo: Saraiva, 2013. CANO, Leandro Jorge Bittencourt; ANTUNES, Rodrigo Merli; DOMINGUES, Alexandre de Sá. O Tribunal do Júri na visão do juiz, do promotor, e do advogado. São Paulo: Atlas, 2014. Direito constitucional. 2ª ed./Obra organizada pelo instituto IOB – São Paulo: Editora IOB, 2012. GALVÃO, Vinícius Alcântara Galvão. O Júri e sua Retórica. A lógica do Discurso. Rio de Janeiro: Lumen juris, 2017. RANGEL, Paulo. Tribunal do Júri. Visão Linguística, Histórica, Social e Jurídica. 5ª ed., revista e atualizada até 31 de dezembro de 2014. São Paulo: Atlas, 2015. REIS, Wanderlei José dos. O júri no Brasil e nos Estados Unidos. Algumas considerações. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3490, 20 jan. 2013. Disponível em:<http://jus.com.br/artigos/23474>. Acesso em: 13 de fevereiro de 2015. TREIN, Thales Nilo. Júri. As linguagens praticadas no plenário. A oratória, os gestos e uma nova comunicação. 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