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ideologia produção ou alivio do sofrimento

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Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica e 
 II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação da PUC-Campinas 
 25 e 26 de setembro de 2012 
ISSN 1982-0178 
 
 
PSICOLOGIA E IDEOLOGIA: PRODUÇÃO OU ALÍVIO DO SOFRIMENTO? 
 
João Paulo dos Santos Salva 
Faculdade de Psicologia 
Centro de Ciências da Vida 
joaopaulosalva@yahoo.com 
Raquel de Souza Lobo Guzzo 
Avaliação e Intervenção Psicossocial: Prevenção, 
Comunidade e Libertação 
Centro de Ciências da Vida 
rguzzo@mpc.com.br 
 
Resumo: O presente plano de trabalho visa analisar 
o conteúdo das entrevistas no banco de dados do 
grupo de pesquisa levando em consideração ele-
mentos ideológicos na forma de se posicionar sobre 
a vida e estabelecer relação do papel da psicologia 
na produção do sofrimento humano ou no seu alívio. 
Seu principal fundamento é a Psicologia Social da 
Libertação e a Crítica à Psicologia Conformista que 
discute o que ficou cunhado como ‘amnésia social’ e 
foi apresentado na obra de Jacob (1975) como uma 
“repressão deliberada de coisas que já são conhe-
cidas” para que as influências e características do 
presente e as mudanças que podem ocorrer sejam 
afetadas pelo fatalismo, pela impotência e en-
fraquecimento nas conquistas de direitos. 
 
Palavras-chave: processos de conscientização, 
ideologia, psicologia da libertação 
Área do Conhecimento: Psicologia – Psicologia 
Social Comunitária - CNPq 
 
INTRODUÇÃO 
 
O presente subprojeto, inserido em um projeto-mãe 
nomeado por, “Fatalismo, impotência e modo de 
vida: o impacto do poder e da opressão em espaços 
educativos e comunitários”[1] do grupo de pesquisa 
Avaliação e Intervenção Psicossocial: Prevenção, 
Comunidade e Libertação, procura investigar as ex-
pectativas e visão de futuro de moradores de uma 
comunidade urbana; nos quais o impacto do poder e 
da opressão influenciam diretamente nas suas “vi-
sões de mundo” e ideologia, facilitando assim pro-
cessos de fatalismo, adoecimento e alienação, im-
possibilitando uma compreensão crítica da conjuntu-
ra atual do modelo capitalista, compreensão essa 
que parte de uma consciência individual e coletiva. 
Sendo assim, o projeto se propõe a sistematizar as 
respostas dadas por um grupo de pessoas sobre a 
relação entre as suas expectativas e visão de futuro, 
para assim posteriormente discutir como a ideologia 
dominante impacta diretamente sobre esses proces-
sos, levantando a seguinte questão: é possível so-
nhar em uma sociedade capitalista? 
 
Fundamentos teóricos: 
 Este trabalho toma como ponto de partida 
para sua fundamentação o conceito de ideologia, 
que se distingue do conceito popularizado das de-
terminações das ideias e estrutura das mesmas, em 
contrapartida a definição que utilizamos se concentra 
naquela representada pelos estudos marxistas na 
qual, o sentido da palavra ideologia torna-se intrin-
sicamente negativo. Nesse sentido então nos explica 
Stoppino [2] que existem dois significados para a 
palavra ideologia, um sentido fraco que designa 
sistemas de crenças políticas, conjunto de ideias e 
valores que tem como função orientar o comporta-
mento da coletividade relativo à ordem pública, e um 
sentido forte, negativo, no qual nos pautamos, que 
possui como significado prioritário, representações 
disfarçadas e deformadas da realidade, aliadas ao 
estado e assim logicamente a classe que o domina. 
 Esse sentido negativo de ideologia é tido 
como sinônimo de falsa consciência do individuo, 
que levado por uma realidade aparente, criada por 
uma superestrutura, o faz refletir a partir dos inter-
esses dominantes, mistificando a realidade vivida e 
imposta. Em sua obra A ideologia Alemã, Marx [3] 
nos coloca um ponto clarificador para essa questão, 
quando crítica à filosofia alemã, e assim declara que 
contrariamente à filosofia alemã, que desce do céu 
para a terra, aqui parte-se da terra para atingir o céu. 
Isto significa que não se parte daquilo que os 
homens dizem, imaginam e pensam nem daquilo que 
são nas palavras, no pensamento na imaginação e 
na representação de outrem para chegar aos 
homens em carne e osso; parte-se dos homens, da 
sua atividade real. Não é a consciência que determi-
na a vida, mas sim a vida que determina a consciên-
cia.(p 26). 
Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica e 
 II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação da PUC-Campinas 
 25 e 26 de setembro de 2012 
ISSN 1982-0178 
 
 
 Com isso então se pode entender mesmo 
que de maneira sintética que a ideologia, fazendo 
parte de um sistema hegemônico capitalista, procura 
trazer para a sociedade uma realidade imposta, que 
contraria em grande medida os interesses da popu-
lação mais carente e fragilizada. 
 Procuramos até aqui caracterizar o sentido 
de ideologia no modo de vida capitalista, partimos 
então para a procura de caracterizar a psicologia 
como ciência e como profissão nesse contexto, tra-
tando-se principalmente de América Latina. É sabido 
o contexto latino americano de desigualdades so-
ciais, de opressão e pobreza, fruto de uma estrutura 
econômica social de exploração dos países desen-
volvidos para com os chamados países em desen-
volvimento. Nesse ponto então como reage psicolog-
icamente um individuo posicionado a estas con-
dições? Para Martín Baró (apud Euzebios Filho e 
Guzzo, 2009) “As classes sociais refletem um deter-
minado padrão de relacionamento social que estru-
tura o cotidiano do sujeito e seu próprio desenvolvi-
mento psicológico” (pág. 39). 
 A esse desenvolvimento psicológico particu-
lar, podemos notar o fatalismo, a impotência a inca-
pacidade de romper e até mesmo de entender o 
contexto estrutural vivido, atribuindo assim para si 
único e exclusivamente a culpa das mazelas da vida 
e de suas condições sociais. Dessa maneira, como a 
psicologia olha para tal situação? E se olha como 
propõe ferramentas para auxiliar a população mais 
necessitada? 
 Em um sentido de embate teórico e prático 
existem duas vertentes para a psicologia, conforme 
explicita Bock [4], aquela que individualiza o psico-
lógico o comportamento e sofrimento humano, natu-
ralizando assim qualquer fenômeno e dando as cos-
tas à realidade social, e há a psicologia voltada para 
entender o ser humano em seu contexto histórico e 
social, trazendo a tona o sofrimento individual como 
sendo em grande parte externo e de origem social. 
 Contextualizado isso, o fato é que a psicolo-
gia carrega muita influencia epistemológica de ori-
gem desconectada com a realidade Latino America-
na, dessa maneira podemos então notar que a ideo-
logia no sentido negativo o qual explicitamos no ini-
cio, engendra na construção do conhecimento das 
ciências humanas; a psicologia hegemônica que 
procura influenciar nosso contexto de vida, permite 
então aos profissionais estarem postos apenas à 
realidade aparente e turva das condições objetivas 
que o cercam, impossibilitando o rompimento com 
sofrimento da população, na sua atuação. 
 
2. OBJETIVOS 
 
O projeto se propõe a procura investigar como os 
moradores de uma comunidade urbana percebem e 
pensam o mundo, e suas condições atuais de vida, 
através de suas falas; partindo dessa condição ob-
jetiva esse trabalho então procurará entender e ex-
trair elementos ideológicos nas respostas dadas, 
identificará sentimento e ações relacionados ao fatal-
ismo e a amnésia social, e também em um momento 
posterior relacionará as características demográficas 
e sociais com a própria presença do fatalismo na sua 
subjetividade. 
 
 
3. MÉTODO 
 
Esta pesquisa toma como fundamento metodológico 
o materialismo histórico dialético, inserido então em 
uma perspectiva qualitativa de estudo, proposto para 
a compreensão dos objetivos da pesquisa a partir da 
análise das respostas de membros de uma determi-nada comunidade urbana às questões levantadas no 
instrumento geral e nas questões específicas que 
são foco deste relatório. Optar pelo materialismo 
histórico dialético, como fundamentação metodológi-
ca, traz necessariamente à psicologia formas de 
estruturar e compreender o sujeito como um ser 
psicossocial, e ainda mais importante, possibilita a 
construção de medidas efetivas no sentido de rom-
pimento com a opressão histórica dos homens sobre 
os homens. 
 Para a sistematização dos elementos das 
condições de vida de moradores de uma ocupação 
urbana foram utilizadas as entrevistas pertencentes 
ao banco de dados do grupo de pesquisa Avaliação 
e Intervenção Psicossocial: Prevenção, Comunidade 
e Libertação, do Programa de pós-graduação em 
Psicologia do Centro de Ciências da Vida, da Pontifí-
cia Universidade Católica de Campinas. Esse banco 
de dados é composto por 60 entrevistas coletadas 
por diferentes membros do presente grupo de pes-
quisa durante várias visitas feitas à comunidade do 
bairro Eldorado dos Carajás, entre 2009 e 2010. 
Para tanto foram estruturados dois instrumentos a 
partir de algumas questões norteadoras, com per-
guntas objetivas e subjetivas elaboradas com o obje-
tivo de considerar o interesse inicial da pesquisa, 
com base em um instrumento já utilizado pelo grupo 
de pesquisa. 
Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica e 
 II Encontro de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação da PUC-Campinas 
 25 e 26 de setembro de 2012 
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 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO 
 Para a execução desse subprojeto, o plano 
de análise baseia-se em questões subjetivas formu-
ladas em um questionário inserido então em um 
banco de dados, no qual o entrevistador realizou 
perguntas que auxiliam no contexto do projeto, psico-
logia e ideologia: produção ou alívio do sofrimento? 
 As respostas às questões foram retiradas do 
banco de dados, e sua análise foi feita a partir da 
leitura exaustiva que permitiu a extração de argu-
mentos que originaram as categorias apresentadas 
nas tabelas abaixo. Respectivamente cada tabela 
traz as respostas dos sujeitos, à perguntas tidas 
como relevantes para o entendimento de como a 
psicologia não está coesa com uma proposta que vá 
de encontro com a verdadeira emancipação dos 
homens frente à alienação produzida fundamental-
mente pela economia capitalista. 
 Nesse sentido analisaram-se as respostas 
dos 60 sujeitos que compõe o banco de dados a 
partir das seguintes perguntas: o que é necessário 
mudar no bairro, o que os sujeitos mais gostam no 
bairro, o que os sujeitos menos gostam no bairro, o 
que mais gostam de fazer na vida, onde os sujeitos 
obtém informações para se manterem atualizados, 
quais suas maiores preocupações, o que gostaria de 
mudar na vida, o que espera para o futuro, como o 
sujeito define sua condição de vida, que mudanças o 
sujeito deseja que aconteçam na sociedade e por 
último a questão, o que impede, na opinião dos su-
jeitos, as pessoas se organizarem e lutarem por seus 
direitos. 
 Assim de acordo com as respostas dos sujei-
tos, tal qual a frequência das mesmas, é possível 
refletirmos a cerca do fazer psicológico no contexto 
histórico social da comunidade estudada, utilizando 
do referencial teórico da psicologia histórico cultural, 
para possibilitar de alguma maneira o como a psico-
logia está se defrontando com as demandas das 
populações economicamente carentes, no que tange 
o seu sofrimento psicológico. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 
Acredita-se de grande relevância um trabalho voltado 
à comunidade, que tenha a psicologia como foco de 
análise para compreensão dos problemas descritos 
até aqui tal qual, suas possíveis ferramentas para 
solução, tornando assim qualquer comunidade e 
membros da mesma como atores participativos des-
sa mudança e não apenas pacientes coadjuvantes 
muitas vezes seguindo o estereótipo da psicologia 
dominante. O processo de transformação torna-se 
então uma via de mão dupla no qual o psicólogo 
apresenta alternativas aos oprimidos à medida que 
os mesmo se engajam na luta para uma trans-
formação mais libertária da sociedade em que 
vivemos. 
 Conclui-se então que o objetivo proposto 
nesse subprojeto o qual levanta o questionamento se 
é possível sonhar em uma sociedade capitalista, 
trouxe por meio da fala dos participantes questiona-
mentos importantes ao iniciante científico; as as-
pirações dos moradores da comunidade urbana 
pesquisada demonstram então que sonhar sim é 
possível porem, é de suma importância que esse 
movimento não se torne uma ilusão que faz com que 
ocorra uma naturalização com a realidade imposta; 
nesse sentido o presente trabalho demonstrou que 
muitas vezes os sonhos apresentados na fala dos 
participantes sobressaem sua conduta de embate 
com a realidade concreta. 
 
5. REFERÊNCIAS 
[1] GUZZO, R. S. L. (2009). Fatalismo, Impotência e 
Modo de Vida: impacto do poder e da opressão 
presentes em espaços educativos e comunitá-
rios. Projeto de Pesquisa para Bolsa Produtivi-
dade – CNPq. Campinas. PUC-Campinas. 
 
[2]. STOPPINO, M. 2002. Verbete "Ideologia". In : 
Bobbio, N. & Matteluci, N. Dicionário de Política, v. 1. 
12. ed. Brasília : UNB. 
 
[3] Marx, K; ENGELS, F. FEUERBACH. Oposição 
entre a concepção materialista e a idealista. A ideo-
logia Alemã. Tradução de Conceição Jardim e Edu-
ardo Lúcio Nogueira. 4ª ed., Lisboa/São Paulo: 
Presença/Martins Fontes, 1980. p. 11-102. (original 
publicado em 1845). 
 
[4] Bock, A. M. (2003) (org). Psicologia e o com-
promisso social. São Paulo: Cortez.

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