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TEORIA MARXISTA DA EDUCACAO , Distribuldor no Brasil: Livraria Martins Fontes Pra«;a da lndependAncla, 12 Santos- S. Paul·o BOGDAN SUCHODOLSKI TEORIA MARXISTA DE EDUCACAO ~ Volume D Editorial Estampa Titulo original U Podstaw Materialstycroej Teorii Wychowania Traduc;:ao de J·ose Magalhaes Capa da Soaras Rocha Copyright Panstwowe Wydawnictwo Naukow, Vars6via Editorial Estampa, Lda., 1976, Lisboa Para a lfngua portuguese INDICE CAPITULO IV - 0 signific~»do da revolw;ao soC'i'aUsta, para a edttcar;ao . 00 • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • •• 1. 0 caracter de classe do sistema de ensino na sociedade burguesa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2. A educa!;iio e o ensino dos filhos dos operarios no capitaUsrno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3. A 1iga9iio entre ·o ensino e o trabalho, germe do ensino socialista 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 4. A ·educa!;iio para e pela revolu9iio . . . . . . . . . . .. 5. A organiza~tiio das massas populares e a impor- til.ncia das suas experiencias . . . . . . . . . . . . . . . . .. 6. A actuagiio espontanea e a actua!;ii.O consciente 7. A Iuta pela concepgiio materialista revolucio- naria do ensino 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 8. Problemas da educa9iio moral. . . . . . . . . . . . . . .. CAPITULO V- Sabre os fundamentos da teoria ma.r- xista d;a; cultura 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 00 • 1. A concep!;iio marxista da actuagiio humana 2. A critica de Marx a concep!;iio de cultura de Hegel oo . oo. oo . oo • •oo oo • ••• •oo oo• oo · oo• oo. 3. Contra OS metodos de especula!;6es abstractas . . . 4. A heranga do hegelianiiSmo na pedagogia bur- guesa oo· 00. 00. 00. • oo oo• oo• oo • oo • oo • oo• oo• •oo 5. 0 desenvolvimento posterior da teoria mate- II'ialista da cultura 00. 00. 00. 00. 00. 00. 00. 00. 00. 6. Critica da concepgiio materialista da cultura . .. 7. 0 papel e a responsabilidade do autor da cul- . tura espiritual 00. 00 . 00 . 00. 00 . 00. • 00 7 9 10 16 \ 18 26 36 40 53 65 7.5 77 85 89 87 111 114 121 8. A inicia!;ao na cultura como prepara!;aO para o futuro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125 CAPiTULO VI- Or~tka1 dai concepqiio· metafisico-idea- dealista do homem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129 ' 1. Critica das concep!;6e.s espiritualistas e natura- listas ... ... ... ... ... ... .. . ... .. . ... ... ... ... 133 2. Criti:ca dos fundamentos da mistifica!;ao bur- .guesa ... ... .. . ... ... ... ... ... ... ... ... ... 139 3. 0 utilitarismo burgues como teoria err6nea da motivagao do comportamento humano . . . . . . . . . 143 4. A hist6ria da origem e 0 verdadeiro conteudo dos ideais burgueses de hom em e cidadao .. . 148 5. Critica da educagao burguesa do «homem)) e do «cidadam) · 164 Apendice 173 8 CAPiTULO IV 0 SIGNIFICADO DA REVOLUQ.AO SOCIALISTA PARA A EDUCAQ.AO A analise da situa~ao do homem sob o capitalismo mostrou a crescente aliena~ao que impossibilita run desenvolvimento das massas trabalhadoras, destr6i a sua rela~ao com o trabalho e a sociedade e deforma a sua consciencia. Para que a educa~ao desempenhe a importante tarefa do desenvolvimento do homem em todos os sentidos, deverao, antes de tudo o mais, quebrar-se as cadeias que no capitalismo prendem o homem. 0 destino da educa~ao, em ultima instancia, depende da transforma~ao social, do derrube do sistema ca- pitalista. Nesta base, dar-se-a na sociedade socia~ lista uma aproxima~ao entre as condi~oes e neces- sidades da vida social e as tarefas e possibilidades da actividade educativa. Que papel desempenha a educa~ao nas condi~oes de decadencia e destrui~ao do capitalismo, isto e, na epoca da revolu~ao proletaria? A resposta a esta questao exige uma analise exacta tanto da politica educativa burguesa e da situa~ao da escola na sociedade capitalista, como do significado do desenvolvimento das for~as produtivas e da luta revolucionaria da classe operaria pela edu- ca~ao e pelo ensino. 9 TEORIA MAR~ISTA DA EDUCAg.AO 1. 0 caracter de classe do sistema de ensino na so- ciedade burguesa As teses marxistas fundamentais que dizem res- peito a educa~ao na sociedade capitalista baseiam-se na tese do seu caracter de classe que esta encoberto pela fraseologia ideol6gica. A educa~ao e urn instru- mento nas maos da classe dominante que determina o seu caracter de acordo com os seus interesses de classe, assim como 0 ambito que engloba 0 ensino para a sua pr6pr~a classe e para as classes opri- midas. Mas como a burguesia apresenta o capitalismo como sendo a realiza~ao completa da ordem de vida «natural e racional», o sistema de ensino e o sistema educativo, que na realidade sao urn instrumento dos seus interesses, embelezam-se com bonitas palavras acerca da liberdade e das possibilidades de desen- volvimento. Marx desmascara constantemente esta questao e indica tambem o que significa realmente o ensino na sociedade capitalista para as diferentes classes. No Manifesto Oomunista este problema e sistema- ticamente tratado. Marx assinala tambem, no aspecto cultural, a falsidade e a hipocrisia dos ataques da burguesia aos comunistas. «As acusa~oes - lemos no Manifesto- dirigidas contra o modo comunista _de apropria~ao e de produ~ao dos produtos materiais, · foram-no igualmente contra a apropria~ao e pro- du~ao das obras do espirito. Assim como, para o burgues, o desaparecimento da propriedade privada equivale ao desaparecimento de toda a produ~ao, tambem o desaparecimento da cultura declasse signi- . fica, para ele, a elimina~ao do ensino em geral. 0 ensino, cuja perda 0 burgues lamenta, nao e para a imensa maioria mais do que urn adestramento que o transforma em maquina .. . Mas quebramos, dizeis, v6s, os la~os mais intimas, ao substituir o ensino · familiar pelo ensino social. Mas nao esta tambem o vosso ensino determinado pela sociedade? Deter- 10 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQAO minado pelas rela!;oes sociais, nas quais ensinais os VOSSOs filhos, pela interven!;aO, directa OU nao, da sociedade, pela escola, etc.? Os comunistas nao in- ventam a ac!;iio da sociedade na educagao; mudam-lhe somente 0 caracter e tiram a educagao a influencia da classe dominante.» (1) 0 caracter de classe da educagao burguesa ma- nifesta-se num duplo aspecto. Em primeiro Iugar, pelo facto de que a educagao, que supostamente de- veria servir todos os homens, s6 e concedida aos fi- lhos da burguesia. A educagao nao e urn elemento de igualdade social; e, pelo contrario, urn elemento da hierarquia social burguesa moderna. Ja no estudo da filosofia de Hegel, Marx sublinhou o papel da educagao na sociedade burguesa. Indicou que a so- ciedade burguesa moderna se desembaragou, ao con- trario do feudalismo, da estrutura de castas e pre- tendeu construir uma sociedade de homens iguais. No entanto, converteu-se na realidade numa ordem social com antagonismos de classe ainda mais irreconci- liaveis. A igualdade politica formal de todos os cidadaos converte-se em alga ilus6rio par causa das reais desigualdades sociais. Segundo Marx esta de- sigualdade e completamente arbitraria e pode ser remetida a dais momentos: a propriedade privada e o ensino (2 ). Isto mostra como Marx estava consciente do signi- ficado social do ensino no capitalismo, cuja tarefa e escolher os representantes da classe dominante para os «altos postos». Marx desmascarou este papel da educagao, especialmente no campo da cultura geral que a burguesia organiza. Face as c6modas e ut6picas esperangas de que a melhoria do ensino geralcons- tituiria uma prova do ponto de vista humanista da burguesia e urn elemento da melhoria evolutiva (') Marx-Engels, Ausgewi.ihlte Schiften (Obras Escothi- das), Berlim, 1953, vol. I, pp. 38 e segulntes. (') Ibi dem. 11 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO da situagao das camadas oprimidas, Marx demonstra que todas as concessoes da classe dominante sao 0 resultado de necessidades econ6micas provocadas pela produgao mecanizada em grande escala e exprimem os novos interesses da burguesia. 0 ensino nacional, especialmente o ensino ope- rario, e urn elemento necessaria da produgao. No entanto, no capitalismo tern a tarefa exclusiva de formar forgas de trabalho baratas e nunca ultrapas- sara OS limites que OS interesses da produgao capi- talista exigem. Uma analise detalhada do carac- ter do ensino operario demonstra isto muito cla- ramente. Em segundo Iugar, o caracter de classe do ensino burgues manifesta-se ao transformar o ensino num instrumento supostamente eficaz da «renovagao so- cial». Em todas as ocasioes em que a burguesia se ve forgada a reconhecer que as relagoes capitalistas sao inadequadas, tenta demonstrar com «argumentos educatiVOS» que sao inadequadas, porque OS homens nao sao bons e que estas rela~oes melhorarao quando os homens se tornarem melhores. A educagao deve converter -se numa garantia da futura melhoria dos ·homens, melhoria essa que nao pode ser assegurada em absoluto, porque o mal reside nas rela~oes sociais predominantes e nao nos homens. Ja Thomas More mostrou a ineficacia da edu- cagao sob condigoes que previamente conduzem OS homens a miseria e OS estimulam ao crime. Marx, especialmente nas divergencias com os socialistas ut6picos, sublinha com toda a evidencia a ineficacia de tal educagao. 0 conjunto da obra cientifica de Marx esta orientado no sentido de indicar o caracter objective do desenvolvimento hist6r ico. Por isso, os seus esforgos revolucionarios deviam orientar-se no sentido do derrube da ordem social capitalista exis- tente e nao no sentido de uma «melhoria» sentimen- tal dos homens. Na sociedade de classes antag6nicas, as relagoes miituas entre OS homens nao sao «rela- 12 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQAO goes de individuos com individuos, mas si~. do ope- rario com o capitalista, do arrendatario com o lati- fundiario, etc.» (3 ). Devem mudar nao apenas OS he- mens, mas principalmente as relagoes e as instituigoes da vida social. Os escritores burgueses, ao recomendarem a edu- cagao como remedio para os pecados sociais da sua propria ordem social, convertem a educagao numa manobra de desvio que deve sufocar o impulse revo- lucionario das massas. A educagao adquire entao uma fungao que ·nao deve exercer. Num dos seus primeiros artigos Marx escreve: «<nclusivamente a parte da burguesia inglesa, que esta convencida do perigo do pauperismo, concebe,este perigo assim como os meios de o remediar de urn modo nao s6 parti- cular, mas, sem duvida alguma, de urn modo infantil e simples. Assim, por exemplo, o Dr. Kay ('''), no seu folheto Recent measures for the promotion of edu- cation in England reduz tudo a educagao desatendida. Que causa se descobre! 0 operario nao ve certa- mente a lei do seu trabalho na falta de educagao, mas nas leis que o situam necessariamente no pau- perismo. Por isso se revolta.» (-') Assim, pois, a burguesia esforga-se por transferir todos os problemas para o campo da educagao, pro/- blemas esses que s6 podem ser solucionados na vida 1 social. N a medida em que a classe . dominante da a educagao uma forga extraordinaria para suposta- mente superar os fen6menos negatives da sociedade burguesa, encontra idealistas prontos para o sacri- ficio, mas ingenues que nao compreendem que os seus «sermoes de moral educativa» significam uma traigao aos interesses das classes oprimidas. (') K. Marx, Da;s E~Emd cler Philo-sophie (A Miseria aa. Filosofi•a.), Berlim, 1952, p. 121. (*) Observagoes do autor. Veja Apendi·oe, -cap. IV, 1). ('' ) l'.>!arx-Engels, Werke (Obras), Berlim, 1956, voi. I, p. ·396. 13 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO Com esta analise Marx e Engels descobrem a con- tradiQao fundamental da politica educativa burguesa. Sao os interesses de classe da burguesia que obrigam a uma limitaQao da educaQao das classes oprimidas e sao os interesses da burguesia que exigem uma certa elevaQao do nivel educativo das forQas produtivas. Ja em A SituaQiio da Olasse Trabalhadora em ln- glaterra Engels observa que a burguesia e forQada a ocupar-se dos operarios apenas na medida em que e ditada pela sua ambiQao de maiores lucros. Mas tambem deve evitar que a formaQao dos operarios se converta numa arma nas maos da classe oprimida. S6 nestas condiQoes a burguesia pactua com a Igreja, porque esta convencida que uma educaQao religiosa oferece a melhor protecQao contra as pe- rigos da educaQao revolucionaria das massas popu- lares. Este pacta e especialmente util quando o do- minio da burguesia comeQa a tornar-se vacilante. Isto pode ser provado com numerosos exemplos de diversos paises capitalistas. Marx ilustra esta questao especialmente com o exemplo da FranQa. «Atraves da lei do ensino - escreve Marx no Achtzehnten Bru- maire des Louis Bonaparte (0 18 de Brumcirio de Luis Bonaparte)- a burguesia intentava asse- gurar o antigo estado de espirito das massas que permitia manter o sistema tributario. As pessoas admiram-se de ver as orleanistas, os burgueses libe- rais, esses antigos ap6stolos do voltairianismo e da filosofia eclectica, confiarem a direcQao do espirito frances aos seus inimigos hereditarios, as jesuitas. Mas orleanistas e legitimistas divergiam no res- peitante ao pretendente ao trona, e depois compreen- deram que o seu dominio comum exigia unir os meios de opressao de duas epocas, que OS meios de repressao de Julho se fortaleciam e completavam com os meios de repressao da RestauraQao.» (6 ) (') Marx-Engels, A.wsgmviihltt Schriften, Berlim, 1953, vol. I, p. 263. 14 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQAO Outro ponto da educaQao burguesa a que Marx dedicou especial atenQaO e 0 seu caracter antinacio- nal e imperialista. Exemplos disso sao a politica educativa prussiana nos terit6rios polacos e a poli- tica educativa colonialista inglesa na india. Nos territ6rios da Posnania, as autoridades prussianas utilizaram as escolas para assegurar o seu dominio e para assegurarem os interesses dos militares e da aristocracia feudal. Na politica colonial inglesa, 0 caracter de classe da educaQao burguesa marii- festou-se, no entanto, de urn modo mais evidente. «A grande hipocrisia da civilizaQao burguesa e a crueldade a ela ligada apresentam-se-nos de uma maneira clara - escreve Marx - se desviarmos o nosso olhar da sua patria, onde adopta formas res- peitaveis, e o dirigirmos para as suas col6nias, onde · se manifesta em toda a sua nudez.» (0 ) Na india os imperialistas ingleses destruiram a civilizaQao in- diana ao «destruirem os interesses publicos indige- nas, ao desarreigarem a industria indigena e ao rebaixarem tudo quanto na ordem social indigena era grande ou se destacava» (7 ). Depois da Inglaterra ter destruido tudo, isso nao a contentou, e empreendeu o seu ataque contra o desenvolvimento social e cultural do pais. Destruiu . a cultura tradicional sem, no entanto, criar urn sistema de ensino e educaQao moderno, apesar dos funcionarios britanicos conservadores considerarem que a populaQao indiana «possui uma grande energia industrial, e perfeitamente capaz de acumulaQao de capital e caracteriza-se pela inteligencia nas mate- maticas, habilidade nos calculos e talento para as ciencias exactas». A politica educativa inglesa propos-se outras ta- refas. Tentou isolar uma quantidade de crianQas in- dianas das massas e deste modoeducar uma nova ( 6 ) Ibidem, p. 331. (') Ibidem, p. 327. 15 TEORIA MARXISTA DA EDUCAg.AO camada de administradores ingleses de urn grande pais. «Dos poucos indigenas indianos educados sob a vigilancia inglesa - escreve Marx - cresce uma nova classe que possui as qualidades exigiveis para governar e que adoptou o saber europeu. » Este carac- ter antinacional da educaQao esta intimamente ligado a aspiraQao de deixar a populaQao indiana na igno- rancia e na impotencia frente as novas condigoes de vida impostas pelos ingleses. 2. A educa~ao e o ensino dos filhos dos opera:rios no capitalismo · 0 caracter declasse do ensino burgues manifesta- -se de uma maneira mais clara quando nos ocupamos do ensino que e concedido aos filhos dos operarios e camponeses do que quando nos ocupamos do ensino que ela reserva para os seus pr6prios filhos e para os da nobreza. A educaQao dos filhos da classe do- minante baseia-se na mentira e na fraude, e a edu- caQao dos filhos da classe oprimida, no indispensa vel No entanto, quem decide o que e indispensavel sao os capitalistas e nao as necessidades das crianQas ou as necessidades gerais da sociedade. Marx em 0 Capital da exemplos convincentes da miseria e da exploragao das familias operarias, que se veem forQadas a alugarem-se aos capitalistas como forQa de trabalho « barata». Os capitalistas conside.:. ram que «a jornada de trabalho compreende as 24 hMas do dia, descontando unicamente as poucas horas de descanso sem as quais a forga de trabalho se negaria em absoluto a funcionar. Em primeiro lugar, achamos muito facil compreender que o ope- rario, desde que nasce ate que morre, niio seja mais que a farr,;a de trabalho; portanto, todo o seu tempo disponivel e, por obra da natureza e do direito, tempo de trabalho e pertence, como e l6gico, ao capital para se'u incremento. Tempo para a formaQiio de uma 16 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO cultura humana, para aperfei~oamento espiritual, para o cumprimento das fun~6es sociais do homem, · para o trato social, para o livre jogo das for~as fi- sicas e espirituais da vida humana, inclusivamente para santificar o domingo - mesmo ate na terra dos beatos, adoradores do preceito dominical- tudo isso nao passa de uma pura ficQaO» (8 )! Estas con- di~6es de vida dos operarios sao especialmente crueis ' para as crian~as que desde tenra idade tern de tra- balhar em trabalho.s pesados. Este trabalho torna , impossivel nao s6 a aquisiQao de uma cultura humana mas tambem destr6i o aspecto fisico. Que tipo de ensino podem receber crianQas que tern de trabalhar durante todo o dia e muitas vezes a noite tambem, trabalho esse que e superior as suas forQas? As normas do trabalho infantii sao extraor- dinariamente altas e tornam impossivel qualquer en- sino. Alem disso, estas normas nem sequer sao ge- ralmente respeitadas. As crianQas convertem-se em forQa de trabalho e sao exploradas sem limites. Marx sublinha especialmente o caracter criminoso desta degeneraQao espiritual de que sao vitimas as crianQas que trabalham. «A degenerar;ao intelectual - escreve Marx- produzida artificialmente pelo facto de converter seres incipientes em simples rna- ' quinas de fabrico da mais-valia - degeneraQao que nao deve ser confundida com esse estado elementar de incultura que deixa os espiritos em estado de · ignorancia sem, no entanto, corromper os seus dotes de desenvolvimento nem a sua fertilidade natural - obrigou finalmente o parlamento ingles a decretar o ensino elementar como condiQao legal para o con- sumo "produtivo" de crianQas menores de 14 anos em todas as industrias submetidas a lei fabril.» ( 9 ) (") K. Marx, Das K I(J)pitaZ (0 Capital), Berlim, 1953, vol. I, p . 275. (") Ibidem, p. 419. 17 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO Marx demonstra, com muitos exemplos concretos, que esta lei foi rapidamente transgredida. Todos esses exemplos caracterizam a situa~ao das crian~as e testemunharam tanto o interesse pedag6gico de Marx como a sua penetra~ao e conhecimentos neste campo. A analise critica das reais condi~oes de vida, como base indiscutivel para o desenvolvimento de formas de vida moral e intelectualmente mais elevadas, pos- sibilitou a Marx uma visao do problema do ensino das crian~as real e concreta, livre de qualquer fra- seologia pedag6gica ilus6ria. Marx dirige a sua aten- ~ao para as condi~Qes de trabalho das crian~as na fabrica e na escola, para a posi~ao dos pais e dos mestres no que respeita aos capitalistas. Aqui se evidencia todo o caracter hip6crita e a superficia- lidade do sistema de ensino e de educa~ao burgues. 3. A liga~ao entre o ensino e o trabalho, germe do ensino socialista A analise do caracter classista do ensino na so- ciedade burguesa e o desmascarar das insuportaveis condi~oes de trabalho e estudo que suportam as crian- ~as de maneira nenhuma impediriam que Marx visse os valores gerais que consistem na liga~ao entre o tra:balho fisico e o ensino, e que no capitalismo nao s6 nao se podem desenvolver mas que sao precisa- mente destruidos. Marx reconheceu muito claramente que, apesar das condi~oes de vida e de estudo terri- velmente dificeis que suportam as crian~as que tra- balham e apesar das melhores condi~oes existentes para os filhos da burguesia, o primeiro grupo de . crian~as supera o segundo. «Do sistema fabril, que podemos seguir em detalhe lendo Robert Owen - escreve Marx- surge o germe da educa~ao do futuro, na qual se combinara, para todas as crian~as a partir de certa idade, o trabalho produtivo com o ensino e a ginastica, nao s6 como 18 TEORIA MARXISTA DA EDUCA<;.A.O metoda para intensificar a produgao social, mas tam- bern como o ii.nico metoda que permite produzir ho- mens plenamente desenvolvidos.» (1°) As crian<;as que tra:balham tern a oportunidade de ligar a actividade fisica ao trabalho intelectual, a teoria a pratica, e deste modo tern a possibilidade de realizar urn de- senvolvimento em todos os sentidos. Mas estas pos- sibilidades sao destruidas pela produgao capitalista ainda que se manifestem ate no facto de «as criangas das fabricas, apesar de nao recel::>erem mais do que 0 ensino medio, aprenderem tanto e as vezes mais que os alunos das escolas comuns» (11 ). Do mesmo modo que o trabalho mecanizado - na opiniao de Marx - nao destr6i por ser mecanizado, mas porque esta organizado pelos capitalistas, tam- bern 0 trabalho das crian<;as s6 e criminoso, porque os capitalistas o convertem em objecto de exploragao. Mas do mesmo modo que a produgao mecanizada se converte em elemento de libertagao e desenvolvimento do liomem no socialismo, tambem a liga<;ao entre o ensino e o trabalho produtivo adquire no socialismo urn alto valor educativo. Marx assinala as possibilidades de ensino que surgem como desenvolvimento das forgas produtivas e que no capitalismo ficam atrofiadas. Sublinha es- pecialmente o significado deste desenvolvimento para o ensino e a educagao completa dos homens. A divisao social do trabalho que existe ha seculos conduziu a uma primeira limitagao e anquilosamento dos ho- mens, ·a sua submissao ao poder das ocupagoes tor- nadas independentes. 0 capitalismo - como vimos anteriormente- agudizou de forma inaudita as consequencias da divi- sao do trabalho atraves da organiza<;ao da manufac- tura e mais ainda atraves da organizagao de fabricas. ('"> Ibidem, p. 509. (") Ibid!em, p. 508. 19 TEORIA MARXISTA DA EDUCAgAO A organizaQao da manufactura consistiu no facto do trabalho manual anteriormente realizado por urn arte- sao qualificado ter sido substituido por diversos tra- . balhos divididos e parciais realizados por diversos operarios. Deste modo o operario transformou-se gra- dualmente em «Operario parcial». Teve de realizardurante toda a sua vida a mesma actividade simples e o seu corpo converteu-se em «Urn 6rgao automatico e parci.al desta actividade». A manufactura cria ho- mens com uma especializaQao de estreitos limites, que deve constituir· a sua forma de trabalho durante toda a sua vida, e recruta tambem operarios sem qualificaQao alguma para os trabalhos mais sim- ples. «Ao mesmo tempo que fomenta ate ao vir- tuosismo as especializaQoes parciais e particulares a custa da capacidade conjunta de trabalho - escreve Marx - converte a especializaQao em ausencia de toda a formaQao.» {1 2 ) As maquinas, em certa medida, revoltaram-se contra estas relaQoes, mas fortaleceram-nas simul- taneamente. Na grande industria consuma-se urn de- finitivo «div6rcio entre potencias espirituais do pro- cesso de produQao e do trabalho manual, com a trans- formaQao daquelas em molas do capital sobre o tra~ balho» (13 ). Saber e inteligencia materializam-se em maquinas e especialistas e os operarios convertem-se exclusivamente em forQa de trabalho. « Vimos como a grande industria vern abolir tecnicamente a divisao manufactureira do trabalho, divisao essa que supoe ligar toda a vida de urn homem a uma determinada operaQao, ao passo que a forma capitalista da grande industria reproduz em proporQ6es ainda mais mons- truosas essa divisao do trabalho; ria verdadeira fa- brica, ao converter o operario num acess6rio com consciencia propria de uma maquina parcial, e nos (") Ibidem, p. 367. (") Ib~dem, p. 444. 20 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO outros sitios, atraves do emprego esporadico de ma- quinas e de trabalho -mecanico e atraves do uso do trabalho da mulher e da crian~a e do trabalho nao especializado como base de divisao do trabalho.» (14 ) «0 caracter da grande industria leva, portanto, a mudan~as preparadas e constantes de trabalho, a substituiQoes de fun~oes, a uma completa mobilidade do operario», porque a grande industria vive da cons- tante renova~ao do processo de produQiio, da melho- ria da tecnica e dos metodos de trabalho e de inova- ~ao de novas ramos produtivos. Este elemento revo- lucionario da produ~ao esta em aguda contradiQao com a organiza~a6 do trabalho capitalista, que se baseia «na especializa~ao parcial» e no «trabalho nao- -especializado» do operario. Assim, manifestam-se rapidamente os primeiros sintomas de urn modo de vida configurado de modo diferente do modo capita- lista. A grande industria exige - sem consideraQoes pelos interesses dos capitalistas - o principia da «maior perfei~ao possivel do operario», a sua boa e completa capacita~ao para o trabalho. 0 desenvolvi- mento das forQas produtivas exige homens capazes de se adaptarem a «necessidades variaveis de traba- lho»; e necessaria substituir «0 individuo parcial,' simples instrumento de uma funQiio social parcial, pelo individuo desenvolvido no seu todo, para quem as diversas funQoes sociais nao sao mais que outras tantas manifestaQoes de actividade que se alternam e se substituem» (15 ). 0 desenvolvimento do sistema de ensino profis- sional que se aperfeiQoa «naturalmente», constitui, como disse Marx, urn dos fe1i6menos e urn dos ele- mentos deste processo. A este respeito Marx, cita as palavras de urn operario acerca das suas experiencias obtidas na California: «Jamais acreditaria que seria (") Ibiaen'IJ, p. 509. ('5 ) Ibi cZem, -p. 513. 21 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQA.O capaz de desempenhar todos os trabalhos que fiz na California. Estava convencido que s6 sabia ser im- pressor ... Logo que me vi metido naquele mundo de aventureiros que mudam de oficio mais facilmente que de camisa, que diabo! fiz como todos os outros. Como o trabalho nas minas nao rendia bastante, abandonei-o e fui para a cidade onde fui sucessiva- mente tip6grafo, construtor de telhados, estanhador, etc. GraQas a esta experiencia; que me demonstrou que podia trabalhar em todos os oficios, comecei a sentir-me menos molusco e mais homem.» (16 ) Estas experiencias constituem para Marx urn exemplo de como os trabalhadores, sob as relaQoes de produQao capitalistas, desbravam o caminho de urn modo natu- ral para adquirirem novas possibilidades de ganhar a vida, como conseguem organizar uma vida que nao esta limitada par nenhuma especializaQao parcial. Mas tanto a ampla formaQao tecnica como a varia- bilidade do trabalho constituem apenas sintomas la- tentes. «Tambem nao oferece duvidas que a forma capitalista de produQao e as condiQ6es econ6micas do trabalho que lhe correspondem estao em diametral oposiQao com esses fermentos revolucionarios e com a sua meta: a aboliQao da antiga divisao do traba- lho.» e7 ) Mas e precisamente esta oposiQao diametral que determina o futuro desenvolvimento hist6rico. As experiencias tecnicas adquiridas acabaram com o principia baseado no periodo da manufactura: sapa- teiro, aos teus sapatos! Desbravaram o caminho para superar a divisao do trabalho na sua forma actual que conduziu ao depauperamento dos homens par causa da sua especializaQao unilateral e parcial e abrem caminho para a aboliQao das contradiQ6es entre o trabalho fisico e o trabalho intelectual. 0 der- rube do sistema capitalista, que, contra as tendencias ( ••) Ibidem. {'1 ) Ibidem, p. 513, nota de pe de pagina 308. 22 TEORIA MARXIST.A DA EDUCAQ.A.O evolutivas das forQas produtivas, mantem a insusten- tav5!1 situaQao actual, permitira organizar o trabalho de urn novo modo em toda a sua extensao. Estas possibilidades educativas e sociais foram ja confirmadas por alguns escritores anteriores ·a Marx. Marx cita Beller s; «John Bellers - escreve Marx - nos fins do seculo XVII ja ve, com absoluta transparencia a necessidade de abolir o sistema edu- cativo e a divisao de trabalho actuais, que produzem a hipertrofia e a atrofia em ambos os p6los da socie- dade, ainda que em sentido oposto. » (18 ) Uns sofrem por excesso de formaQao intelectual e abstracta en- quanta que os outros desfalecem sob o peso de urn trabalho mecanico e embrutecedoramente fisico ( *). Portanto, a ligagao entre o ensino e o trabalho e para Marx, tambem valiosa porque supera a divisao entre o trabalho fisico e o intelectual, que e origi- nada pela divisao do trabalho e acaba com o desen- volvimento prejudicial e unilateral do individuo hu- mano. Marx nao s6 indicou frequentemente que o tra- balho fisico sem elementos espirituais destr6i a natu- reza humana como tambem que a actividade intelec- tual, a margem do trabalho fisico, conduz facilmente aos erros de urn idealismo artificial e de uma abstrac- Qiio falsa. «A independencia entre os pensamentos e as ideias» e, como Marx disse, «uma consequencia da independencia entre as relaQoes pessoais e as relaQoes entre os individuos» (1°). A divisao do tra- balho que torna o «pensar» atributo exclusivo de urn grupo de homens, destr6i tanto o pensamento como os pr6prios homens. Par isso Marx valoriza muito a ligaQao entre o trabalho fisico e o intelectual. Tinha uma grande admiraQao par John Bellers («Urn verdadeiro fen6- meno na hist6ria da economia politica») e sublinhou (" ) Ibidem. (*) •Observagoes do autor. Veja Apendice, cap. IV, 2). (" ) Marx-Engels, Wei7'1ce, Berlim, 1958, vol. 3, p . 432. 23 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO as suas correctas anaJises e observa~oes sobre a edu- - ca~ao. Bellers disse de modo convincente: -«0 apren- der ociosamente e pouco melhor que 0 aprender ocio- sidade ... 0 trabalho e tao necessaria para a saude . do corpo como comer e necessaria para a conserva- ~ao do corpo ... 0 trabalho eo azeite da lamparina da vida que o espirito se encarrega de acender.» A exac- tidao com que Marx conhecia as correntes pedag6- gicas da sua epoca manifesta-se na observa~ao que fez as palavras de Bellers: «Urn trabalho infantil nescio naotira a sua ignorancia da inteligencia infan- til.» Marx observa que estas palavras de Bellers se podem referir profeticamente as concep~oes de Base- dow e aos «seus imitadores modernos» (2°). Este co- mentario mostra claramente a diferen~a radical entre ·a concep~ao marxista sobre a liga~ao .da educa~ao ao trabalho e as concep~oes semelhantes de caracter burgues. Basedow e principalmente o seu discipulo Salzmann organizaram, preocupados com o povo sob a 6ptica burguesa, urn ensino pratico destinado a preparar para a vida principalmente os 6rfaos. Estas teorias nao continham nem teses gerais acerca da forma~ao te6rica e pratica dos homens, nem tenden- cias revolucionarias de uma transforma~ao social. Marx e Engels combateram sistematicamente esta liga~ao insuficiente entre a educa~ao e o trabalho. Na sua obra Anti-Duhring Engels expoe: «Certa- mente o Sr. Dtihring ouviu algo sobre o facto de que na sociedade socialista o trabalho e a educa~ao devem ligar-se e que por isto deve ser assegurado urn ensino tecnico complete, assim como uma base pratica para a educa~ao cientifica; este ponto e tam bern muito util para a sociabilidade. Mas, tal como vimos ante- riormente, a antiga divisao do trabalho conserva-se nas suas partes essenciais na produ~ao futura orga- nizada segundo o modo Dtihring, este ensino fica se- (") K. Marx, Das Kapital, Berlim, 1953, vol. I, p. 514. 24 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO parado de qualquer aplicaQao pratica posterior e de qualquer importancia ou significado para a propria prodUQaO. 0 seu unico objectivo e substituir a ginas- tica, de que o nosso revoluciom'trio nao quer sa- ber.» {21 ) Com estas palavras clarifica-se a diferenQa radi- cal que existe entre as ideias burguesas de uma ligaQao do trabalho ao ensino, ideias que . servem fins filantropic6s ou ideologias reformistas, e a con- cepQao marxista de tal ligaQao, que so pode desen- volver-se por completo atraves do moderno desenvol- vimento das forQas produtivas na sociedade socia- lista. Marx e Engels formularam os principios da liga- Qao entre o trabalho eo ensino na sua luta implacavel contra a exploraQao capitalista do trabalho infantil. Assim, assentaram as bases para a politica educa- . tiva da classe operaria e para o seu futuro programa. Neste sentido o Manifesto do Partido Comunista pro- poe a «aboliQao do trabalho fabril das crianQas na sua forma actual», mas ao mesmo tempo acentua ,a necessidade de «ligar o ensino a produQao material». Em Critica do Programa de Gotha) Marx precisa este ponto de vista ao opor-se a aboliQao absoluta do trabalho infantil e exige nesta questao que se deter- mine com toda a precisao os limites de idade. Marx escreve: «A proibiQaO geral do trabalho infantil e incompativel com a propria existencia da grande industria e, portanto, nao e senao urn desejo ingenuo e vao. A aplicaQao desta medida, caso fosse possivel, tornar-se-ia reacciom'tria, porque, sendo assegurada uma exigente regulamentaQao do tempo de trabalho segundo as diferentes idades e tomando as devidas precauQ6es para proteger o trabalho das crianQas, combinar o trabalho produtivo desde a mais tenra (") F. Engels, Hen·n Eugen Duhrvngs Urnwiilzung der W ·iJssensclwft (TmmsformaQiio da Oiencba pelo Ssnhor Eugen Diihring ) , Berlim, 1952, p. 401. 25 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO idade ao ensino e urn dos mais eficazes meios de transformaQao da sociedade actual.» (2 2 ) Marx nao determinou mais precisamente OS prin- cipios de tal ligaQao. Em InstTuktion an die Delegier- ten des Provisorischen Zentralrats uber eizelne Fragen (1866), Marx exigia apenas que as escolas tecnicas ocupassem os seus tempos livres, pelo menos parte deles, com a venda de objectos produzidos e que este trabalho economicamente produtivo estivesse ligado a urn programa adequado de ocupaQoes fisicas e intelectuais. «A relaQao entre o trabalho produtivo pago, ensino intelectual, exercicios fisicos e o ensino politecnico elevara a classe operaria a urn nivel muito superior ao nivel das classes medias.» (23 ) S6 a revoluQao socialista podera focar de urn modo pratico o problema da educaQao do homem para o trabalho e atraves do trabalho de tal forma que o trabalho nao limite o homem, mas que, pelo contrario, o desenvolva em todos os seus aspectos. S6 a revo- luQao socialista quebrara as cadeias que impedem o desenvolvimento das forQas produtivas. Com ela, pela primeira vez na Hist6ria, e possivel apresentar a questao da educaQao do homem para o trabalho e pelo trabalho numa esfera humana nova na qual os homens se convertem em produtores independentes e responsaveis, que os liberia da esfera do cultivo de escravos e da formaQao de «forQas produtivas». 4. A educa~o para e pela revolu~ao A concepQao da ligaQao entre o ensino e o tra- balho produtivo e, no entanto, apenas urn dos ele- mentos fundamentais do programa educativo e de ensino que os fundadores do socialismo cientifico ("") Marx-Engels, Ausgewiihltt Bchritten, Berlim, 1952, vol. II, p. 28. · ("") Marx -Engels, Vber Erziehung ~ma Bildung ( Sobre Ensirtw e E ducagiio) , Berlim, 1960, p. 162 26 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ./1.0 defenderam. 0 segundo elemento fundamental e 0 principia da ligaQao entre a educaQao, o ensino e a actividade revolucionaria da classe operaria. A con- cepQao geral da luta contra o capitalismo que Marx e Engels desenvolveram implica, antes de mais, afas- tar todo 0 programa ut6pico que nao expressa ne- nhuma medida para a realizaQao das ideias referidas. 0 principia fundamental de Marx e Engels era ligar o mais estreitamente possivel o socialismo cienti- fico e a luta revolucionaria da classe operaria e orga- nizar esta luta como o unico caminho que conduz ao socialismo. A separaQao de esperanQas ut6picas, aspiraQoes ou intenQoes de organizar as «futuras» comunidades no seio da actual sociedade e a politica concreta da luta revolucionaria que conduz a aboliQao das relaQoes existentes sao algo tao primordial que, naturalmente, tinha de afectar tambem as questoes do ensino. E evidente que a educaQao dos homens na base do socialismo ut6pico tinha de ser algo total- mente diferente da educaQao nos principios da luta de classe do proletariado. Isto requereu um amplo e intensivo trabalho ideol6gico organizador a Marx e Engels. Embora no periodo do crescimento constante do movimento ope- rario e do desenvolvimento da conscH~ncia ideol6gico- -politica dos operarios a eliminaQao das tradiQoes ut6picas tenha criado enormes dificuldades, a deter- minaQao do processo correcto nas situaQoes politicas concret:;~.s era uma tarefa tao dificil como extraor- dinariamente necessaria. Neste aspecto, Marx e Engels tiveram de se desembaraQar de muitos obsta- culos e de se distanciar claramente de muitas con- cepQoes inimigas. Dado que se consagraram a politica revolucionaria da classe operaria, tiveram de repelir em muitas ocasioes os ataques da burguesia liberal e de combater o programa da pequena burguesia. Alem disso, tratava-se de combater todas as tenta- tivas de tergiversar os antagonismos fundamentais de classe e as tentativas de defender uma politica 27 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO de reconciliaQiio e compromisso, assim como de des- mascarar as tendencias anarquistas e conspirativas que se manifestavam em defesa de uma acQiio revo- lucionaria espontanea sem que as condiQoes objec- tivas estivessem dadas. Em oposiQiio a tudo isto, a linha politica de Marx e Engels unia o principia da luta revolucionaria a analise ser ena e precisa da realidade social, a uma estratt'!gia e uma tactica ponderadas. Isto surgiu na- turalmente em intima relaQiio com as suas concepQoes filos6ficas e cientificas acerca do desenvolvimento hist6rico, em especial o do capitalismo. 0 sublinhardo caracter objective destas leis de desenvolvimento e simultaneamente o destaque dado ao papel cons- ciente da classe operaria deram a base para a luta sem compromissos contra todas as correntes oportu- nistas e anarquistas. No decur so desta luta devia desenvolver-se urn programa completamente novo de educaQiio do operario. E naturalmente tambem na pratica. A luta de Marx e Engels por uma linha consequentemente revolucionaria da luta dos opera- rios encontrou a sua expressao nas concepQoes sabr e a educaQiio dos homens que devem participar na configuraQiio do futuro socialista. Por isso, o objecto da nossa exposiQiio posterior deve ser precisamente a analise de todas as con- cepQoes fundamentais sabre a educaQiio da classe operaria para o cumprimento das suas tarefas hist6- ricas, que se opoe aos programas educativos dos socialistas ut6picos e tambem aos programas do socialismo pequeno-burgues de todo o genera, espe- cialmente oportunismo e anarquismo. «0 mais importante no ensino de Marx- escreve Lenine- e a explicaQiio do papel hist6rico universal do proletariado como criador da sociedade socia- lista.» ( 2 4 ) Este papel da classe operaria, segundo ("' ) V. I . Lenine, Au,sgewiihlt·e W erke, Berlim, 1954, vol. . I, p. 69. 2.8 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO Marx, . e o~ factor principal que permite abolir a mi- seria, a explora~ao e as humilha~6es que a classe possuidora faz. Marx, no seu trabalho Critica da Filosofia do Direito de Hegel, formula de urn modo geral as ta- refas especiais do proletariado. «E, pois, necessaria - escreve Marx - que uma determinada classe resuma em si a repulsa geral, de tal modo que a liberta~ao desta esfera aparega como a autolibertagao universal.» (2°) Contra a classe opressora levanta-se a classe dos libertadores. Esta classe e concretamente o proletariado~ 0 proletariado encontra-se numa situa~ao de opressao tal, que as suas reivindicag6es tomam o caracter de reivindicag6es sociais universais, nao se limitando a exprimir" apenas as necessidades de urn determinado grupo de homens. Esta classe nao defende para si mesma nenhum direito privativo; no caso de reivindica-lo, trata-se de urn interesse que se repercute para o bern de todos. As suas reivindicagoes nao s6 o sao do ponto de vista hist6rico, mas partem tambem do interesse humano geral. A libertagao do proletariado e a liberta~ao de toda a sociedade, e «a recuperagao total do homem que se baseia numa perda total» (2°) . 0 proletariado nao s6 deve empreender a luta contra as classes dominantes porque tern de defender os seus interesses vitais imediatos, mas tambem porque aspira a uma nova ordem social e por iss6 deve combater toda a classe que constitua a sua negagao. Nesta luta, a consciencia do proletariado e o conhecimento do seu papel hist6rico desenvol- vem-se. Esta consciencia deve exigir que a filosofia se converta na arma espiritual do proletariado. Esta concepgao do papel do proletariado, que Marx expos nos seus escritos de juventude, constitui (" ) Marx-Engels, La Sa,gmdJa Familia, Ed. Grijalbo, Me- xico, 1962, p. 12. ' (") Ibvaem, p. 14. 29 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQAO tambem o objecto dos seus posteriores pensamentos e investigaQoes. De acordo com os principios mate- rialistas da sua filosofia, Marx tentou rebater as diversas concepQoes sobre o papel da classe operaria com que, entao, teve de se enfrentar. Teve princi- palmente de enfrentar a idealizaQao ut6pica infun- dada do proletariado, que via neste todas as virtudes e valores num estado de perfeiQao, assim como o desprezo fatalista pela !uta do proletariado cons- ciente e disposto ao sacrificio. Em oposiQao a estes dois pontos de partida, Marx defendeu a concepQao de que a decisiva tarefa hist6rica universal da classe operaria e determinada pelo desenvolvimento hist6- rico objectivo e que da sua disposiQao consciente e activa depende o cumprimento desta tarefa. Deferideu tambem a conviQiio de que a classe operaria se desen- volvera no decurso da sua I uta e dos seus esforQos; que o resultado do movimento operario revolucio- nario socialista nao sera a consequencia mecanica da situaQao dos operarios nem das suas condiQoes de vida. Ja em A Sagrada Familia Marx e Engels criticam decididamente as representaQoes ingenuas e idealistas do proletariado. «E quando os escritores socialistas - escreve Marx- atribuem ao proletariado este papel hist6rico-universal nao e, como a Critica critica pretexta acreditar, porque considerem os proletarios como deuses. Antes pelo contrario, atribuem-lho por chegar a sua maxima perfeiQaO pratica, no proleta- riado desenvolvido, a abstracQao de toda a humani- dade e ate a aparencia dela; porque nas condiQoes de vida do proletariado se condensam todas as condiQoes de vida da sociedade actual, agudizadas no modo mais desumano; por o hom em se ter perdido a si proprio no proletariado, adquirindo em troca nao s6 a consciencia te6rica desta perda mas tambem sob a acQao imediata de uma penuria absolutamente impe- riosa- a expressao pratica da necessidade -a que ja se nao pode fugir nem tentar mitigar, o acicata- 30 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO menta inevitavel da sublevaQao contra tanta desuma- nidade; por todas estas razoes, o proletario pode e deve libertar-se a si proprio.» (2 7 ) 0 papel do proletariado e determinado atraves do processo do desenvolvimento social e nao por quaisquer qualidades fisicas inatas dos homens que lhe sejam proprias. A idealizaQao consciente das qualidades da classe operaria como «argumento» para a possibilidade da sua libertaQao nao corres- ponde em absoluto aos factos e, alem disso, teste- munha concepQoes ingenuas e utopicas acerca do desenvolvimento social e dos seus factores realmente eficazes. Alem disso, tal idealizaQao da Iugar a todos os possiveis ataques da reacQao que se levantam con- tra os operarios. Estes ataques tern por objectivo despojar ainda mais os operarios das suas condiQoes humanas de vida. Toda a discussao toma entao urn rumo falso e converte-se numa discussao acientifica, tendenciosa e inutil. 0 essencial nao e a maneira como esta cons- tituida a maioria dos operarios, como tambem nao e «aquila que este . ou aquele proletario ou mesmo o proprio proletariado possa ter de vez em quando como meta. E o que o proletariado e e o que esta historica- mente obrigado a fazer no que respeita a esse seu ser. A sua meta e a sua acQao historica estao clara e irrevogavelmente predeterminadas pela sua propria condiQao de vida e por toda a organizaQao da socie- dade burguesa actuaL» (28 ) Com esta exposiQao do problema, Marx sublinha todo o conhecimento peda- gogico que podia caracterizar-se como o «crescimento dos homens nas suas tarefas». Isto significa que nas tarefas educativas nao deve ser apenas considerado o que os homens particulares sao numa dada epoca, mas tambem e principalmente ( 21 ) Ibi~mn, p . 101. ('") Ibidem, p. 102. 31 TEORIA MARXISTA DA EDUCA<;.AO aquila a que sao chamados numa, situaQao hist6rica concreta e que tarefas lhes sao apresentadas a partir do desenvolvimento social objectivo. Isto e urn cri- teria transcendente. Determina que nao se pode atri- buir significado extraordinario ao determinismo psicol6gico segundo o qual o homem, no decurso da sua vida, continua a ser o que era no principia. Isto significa que se deve confiar no desenvolvimento que se efectua na base de condiQ6es objectivas atraves da soluQao de tarefas objectivamente possiveis. 0 ensino marxista nao e apenas urn ensino da revoluQao proletaria historicamente inevitavel, mas ao mesmo tempo urn ensino da educaQao do prole- tariado para o cumprimento destas tarefas hist6- ricas. Esta educaQao deve ser concr etizada na «pra- tica revolucionaria».0 marxismo e uma demonstraQaO de que 0 desen- volvimento hist6rico se processa por etapas que se caracterizam pelas transformaQ6es revolucionarias. «Pais Marx- disse Engels no seu discurso junto ao tfunulo de Marx - foi sobretudo urn r evolucio- nario. A sua verdadeira palavra de ordem foi cola- borar de uma maneira ou outra no derrube da sociedade capitalista e das instituiQ6es estatais criadas por esta sociedade, colaborar na libertaQao do proletariado moderno, a quem foi o primeiro a dar consciencia da sua propria situaQao e necessi- dades, a consciencia das condiQ6es da sua emanci- paQao. A luta foi o seu elemento.» (29 ) Marx rebateu sempre toda a politica conciliadora que se esforQa exclusivamente por obter «pequenos exitos» e que deste modo anulam a forQa revolucio- naria do proletariado. «Os pequeno-burgueses demo- cratas muito Ionge de querer transformar toda a sociedade em proveito do proletariado r evolucionario, (" ) Marx-Engels, A usgewahlte SchT·iJrten, B erltim , 1953, vol. II, p . 157. 32 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO pretendem modificar a ordem social de modo a tornar a sociedade existente tao suportavel e c6modo que possivel... No entanto, estas reivindicag6es nao po- de:in satisfazer em absoluto o partido do proletariado. Enquanto os pequeno-burgueses democratas preten- dem acabar a revolugao o mais rapidamente possivel e ap6s ter realizado, como ponto maximo, as reivin- dicag6es atras citadas, e de nosso interesse e dever fazer com que a revolugao seja permanente, ate que as classes possidentes em maior ou menor grau sejam desapossadas do seu dominio.» (8°) A tenacidade e a constancia na luta revolucio- naria, a sublevagao sem compromissos contra a socie- dade burguesa sao para Marx OS momentos decisivos . politica e educativamente. Na luta revolucionaria, o proletariado toma consciencia das suas tarefas e da ·sua forga. A luta revolucionaria constitui a melhor escola do novo homem socialista. Os pensamentos contidos em A I de alogia A lema tornam mais preciso este ponto de partida que Marx seguiu fielmente toda a vida. Marx atenta na absoluta novidade hist6rica da revolugao socialista que nao s6 destr6i uma classe dominante determinada, mas que ainda por cima anula por completo a sociedade de classes, e a este respeito Marx sublinha a grande importancia da consciencia comunista. Escreve: «Tanto para a constituigao desta consciencia comunista como para a realizagao desta mesma questao sao necessaria::; amplas mudangas no homem, que s6 num movimento pratico, numa revolugao, se podem produzir; assim, pois, a revolugao nao s6 e necessaria porque a classe que provoca o derrube s6 numa revolugao pode alcan- gar os objectivos de se desfazer de toda a velha por- caria e alcangar a nova fungao da sociedade.» (81 ) (:ro) Ibidem, val. I, pp. 90 e seguintes. ( 31 ) Marx-Engels, Werke, Bedim, 1958, val. III, p, 70. 33 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO A importancia do facto de Marx considerar a revolugao como a escola do novo homem e-nos mos- trada em toda a sua extensao ao · sublinhar que a revolugao, segundo a concepgao dos clasicos do mar- xismo, nao pode ser urn acto unico desligado . dos outros. Uma revolugao, que elimina definitivamente a sociedade de classes, deve ser a coroagao de uma larga luta revolucionaria. Neste sentido Marx es- creye: «0 comunismo nao e para nos nem uma situagao que se deva criar, nem urn ideal ao qual a realidade se deve adaptar. Chamaremos comunismo ao movimento real que termina com a situagao actual. As condigoes deste movimento provem das premissas actualmente existentes.» (32 ) A actividade concreta, real, que se realiza sob condigoes determinadas opos- tas as representagoes ideais do futuro, constitui a tese fundamental da tactica politico-ideol6gica mar- xista, que possui urn grande significado educativo. Esta tese determina que OS homens nao devem estar na expectativa frente as tarefas hist6ricas objectivas, mas que devem actuar eficazmente. A revolugao nao e para Marx algo do futuro, mas a ultima etapa da acgao revolucionaria da actuali- dade. Constitui, como se diz em Teses sabre Feuer- baoh~ a «pratica revolucionaria». A organizagao desta pratica e a principal tarefa da vanguarda do prole- tariado. S6 na pratica revolucionaria se educam os homens de amanha. A concepgao marxista estabelece, pais, uma ~s treita ligagao da actuagao no presente com a actuagao tendo em vista o futuro. Esta e a tese principal da tactica politica que o Manifesto do Partido Comunista resume nas seguintes palavras: «Os comunistas lutam para alcangar os fins imediatos presentes e os interesses da classe operaria, mas representam tam- bern no momenta actual o movimento do futuro. » (" ) Ibidem, p. 35. 34 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO Este principia determina o caracter da «educagao do proletariado para as tarefas revolucionarias» como uma educagao que esta ligada a pratica da actividade revolucionaria. Deste modo, a concepgao da educagao dos fundadores do socialismo cientifico adquiriu caracteristicas particularment'e importantes. Como se sabe, havia urn certo conflito na teoria edu- , cativa no que respeita ao que devia ser feito ao aluno, tendo em conta as actuais possibilidades e ne- cessidades, e o que deveria ser feito considerando as necessidades e tarefas futuras. A educagao que se ocupava do presente preocupava-se muito pouco com o futuro, enquanto que a educagao que se ocupava do futuro nao tinha possibilidade alguma de actuar no presente. Este conflito foi especialmente patente ao agudizar-se a luta da classe operaria na sociedade burguesa contra a ordem capitalista. Na pedagogia - burguesa a educagao tern urn caracter apologetico em relagao a ordem existente e nao prepara a juventude para urn novo futuro. Segundo as concepgoes dos · ut6picos, a educagao para o futuro impede qualquer ligagao com as condigoes actuais. Pelo contrario, a concepgao marxista diz como se deve organizar o conjunto do ensino que prepara ja na actualidade capitalista o futuro socialista. Esta concepgao apareceu ligada a nova concepgao materialista da psique humana, das fontes da sua forga e da consistencia das representagoes e concep- goes. Tal como indicamos, Marx opos-se a substan~ tivar e a absolutizar o conteudo da consciencia. De- fendeu a concepgao contraria de que o motor essencial da vida pessoal do homem e a sua actividade na exis- tencia real, que se reflecte mais ou menos correcta- mente nas suas representagoes, concepgoes, senti- mentos, etc. «0 ser produz a consciencia» tanto no campo social como, em certa medida, no campo individual. 0 isolamento de determinadas ideias da consciencia humana e a introdugao de novas fazem-se, segundo Marx, nao atraves de uma critica intelectual 35 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO a margem da vida, mas dentro do enquadramento de uma vida realmente mutavel. A elimina~iio da cons- cH~ncia de representa~oes err6neas «realiza-se me- diante circunstancias que mudam e niio atraves de dedu~oes te6ricas» (88). Na vida intelectual, em Ultima instancia, afirma-se a mesma verdade que rege a hist6ria, isto e, que «a for~a motriz da hist6ria, da religiiio, da filosofia e de outras teorias seme- lhantes niio e a critica mas a revolu~iio» (84,). Mas a importancia da revolu~iio reside apenas no facto de criar . condi~oes novas para os homens, sob as quais se pode formar uma nova consciencia social, mas tambem no facto de chamar os homens a colaborar conscientemente na cria~iio de novas rela~oes sociais. «0 meio ambiente - escreve Marx- forma os homens do mesmo modo que os homens formam o meio ambiente.» ( 85 ) A actividade revolucionaria e precisamente esta «Convergencia do ambiente ou das circunstancias mutaveis eda actividade humana» que condiciona principalmente a «transforma~iio» dos homens. 5. A organiz~ao das massas populares e a impor- tancia das suas experH~ncias 0 mais importante, alem do caracter do prole- tariado, e a maneira como se criam as suas tarefas hist6ricas e a pratica revolucionaria na qual o prole- tariado pode amadurecer para estas tarefas. Sendo assim, 0 problema central da educa~iio e, evidente- mente, responder a questao de como deve organizar-se este processo de amadurecimento. Se isto deve acon- tecer na actividade real, concreta, revolucionaria, esta actividade deve ser naturalmente uma actividade ( 33 ) Ibid·em, p. 40. (") Ibidem, p. 38. ( 35 ) Ibidem. 36 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQAO de massas. Marx tinha uma sensibilidade altamente desenvolvida no sentido de valorizar todo o homem e por isso foi um inimigo decidido de todo o genero de teoria de elite, que despreza as massas. Marx ligou esta sensibilidade moral a teoria do desenvolvimento hist6rico, segundo a qual nao sao os individuos des- tacados que exercem uma influencia decisiva no decurso dos acontecimentos, mas o desenvolvimento das for~as produtivas, isto e, todos OS factores rela- cionados com as condi~6es de trabalho e de vida das massas. Ao criticar Hegel, Marx refere-se tambem a outros que, como Hegel, defendem teorias idealistas da elite sabre a hist6ria, que proporcionam argumentos sabre a falsa caracteriza~ao dos «representantes do Espirito objective». Na sua critica aos doutrinadores franceses que fazem exercicios de magia com o conceito da razao, indica que este conceito se uti- liza da participa~ao no Governo para separar as massas (3°). Faz o mesmo na sua critica a Stirne, que tirava toda a importancia as massas e que via nelas a «nega~ao do Espirito». Em oposi~ao a estas concepg6es, Marx sublinha a importancia dos movimentos populares na hist6ria, A grandeza e o significado dos acontecimentos hist6- ricos alcangaram-se -segundo Marx- com a par- ticipagao activa das massas. No entanto, as massas tern estado afastadas, na hist6ria ate aos nossos dias, da participagao nos bens e na cultura que, . gradual- mente, se foram transformando em dominies reser- vados dos privilegiados. Esta situagao deve mudar e a critica que os comunistas fazem neste campo - na opiniao de Marx - corresponde a realidade, na forma de movimentos emancipalistas das massas. «E pre- ciso conhecer - escreve Marx - a ansia de instrugao dos operarios ingleses e franceses, a sua energia ( ' 6 ) Ibiu~em, vol. II, pp. 89 e seguintes. 37 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO moral, o seu impulso ilimitado de desenvolvimento, para ser passive! ter-se uma ideia da nobreza humana deste movimento.» (37 ) A actividade que afecta as massas e uma neces- sidade hist6rica de todas as epocas em que 0 prole- tariado se apresenta como a classe mais revolucio- naria, que participa com 0 trabalho das suas maos no processo de produ~ao. Constitui simultaneamente o cumprimento das exigencias marais e humanas. Com esta actividade para o trabalho, cujo primeiro impulso foi observado par Marx em Fran~a e na lnglaterra, aument~ tambem a nova consciencia do proletariado. Se esta actividade afecta as massas, a sua activi- dade deve ligar-se 0 mais estreitamente passive! as tarefas hist6ricas do proletariado, porque s6 neste caso esta actividade tera uma eficacia educativa. Marx concebeu esta Iiga~ao de urn modo perfeita- mente concreto. Foi sempre inimigo das concep~oes do politico que s6 tenta agir com as massas e utilizar a sua imensa for~a. Lutou sempre por urn movimento organizado, activo e vivo das massas trabalhadoras. 0 comunismo nao pode, desde logo, ser construido par fil6sofos, legisladores ou politicos. S6 se pode e deve alcan~a-lo desde o inicio com as maos dos tra- balhadores. «Cada passo verdadeiro do movimento - escreve Marx a Bracke - e mais importante do que uma duzia de programas.» (38 ) Marx manifesta uma po- si~ao semelhante em rela~ao a Comuna de Paris. «0 seu verdadeiro segredo - escreve Marx - foi ser essencialmente urn Governo da classe operaria», urn Governo formado exclusivamente par operarios, apesar de todos os «especuladores politicos» e «fede- ra~oes politicas». Houve dificuldades e erros neste (") lbi·dem, p. 89. (") Marx-Engels, AW81gewiihUt~ Schriften, Berlim, 1953, vol. II, p . 9. · 38 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO \ 1grande exemplo da construQiio de uma sociedade so- cialista. Mas sao precisamente estas dificuldades que possuem urn grande significado educativo. «A classe operaria - escreve Marx - nao exigia nenhum mi- lagre da Comuna. Nao e necessaria introduzir ne- nhuma utopia fixa e elaborada por decisao popular. A classe operaria sabe que para preparar a sua pro- pria libertaQao e com ela toda a forma de vida mais elevada ... tera de travar grandes lutas, tera de passar por toda uma serie de processos hist6ricos, atraves ·dos quais os homens e o ambiente social se transfor- mam por completo. Nao ha nenhum ideal a realizar; s6 ha que par em liberdade os elementos da nova sociedade que se desenvolveram ja no seio da socie- dade burguesa em decadencia.» (3 9 ) 0 materialismo hist6rico preve o aparecimento de novas forQas no seio do passado capitalista no ocaso e nas lutas contra o velho, o superado. Da o fundamento essencial para esta tactica politica que sublinha a necessidade da luta revolucionaria das massas e outorga urn valor especial ao processo da formaQao dos homens nesta luta. 0 materialismo hist6rico exige desconfianQa face aos diversos «ideais» e «Sistemas» que se afastam da realidade. No entanto, tambem pede confianQa para a nova vida, que esta em germe no seio das velhas relaQoes, e uma actuaQao para urn novo futuro. · Este realismo da actividade socialista das massas afasta todas as concepQoes que representam o deseli- volvimento social como urn resultado da actuaQiio de politicos ou de assombrosas concessoes da classe do- minante. Opoe-se a todas as concepQoes segundo as quais a nova sociedade nao deve surgir como resul- tado de uma luta irreconciliavel dos antagonismos de classe. ( 30 ) Ibidem, Berlim, 1953, vaL I, ·P· 495. 39 TEORIA MARXISTA .DA EDUCAQ.AO Segundo Marx, a luta revolucionaria da classe operaria e 0 elemento mais importante da constru~ao' do futuro socialista. 0 processo de educa~ao dos cons~ trutores do socialismo e a sua participa~ao nas trans- forma~oes hist6ricas, que se produzem como resul- tado da sua luta, sao urn todo coeso e unico. Esta -concep~ao da educa~ao opoe-se decididamente a todas as formas de educa~ao pessoal «desmedida», que nao valoriza as tendencias de desenvolvimento da socie- dade e carece de todo o criteria cientifico. A con- cep~ao marxista estabelece de modo especial estes criterios que s6 podem dar-se atraves da actividade social pratica. Esta concep~ao opoe-se a todas as representa~oes ihis6rias de uma educa~ao individua- lista, que pretende educar OS homens a margem da actua~ao social e do processo hist6rico da !uta por urn futuro socialista. 6. A actu~ao esponmnea e a actu~ consciente De tudo o que foi exposto depreende-se claramente que o problema da educa~ao e forma~ao da conscien- cia socialista esta ligado o mais estreitamente pas- sive! ao crescimento da !uta revolucionaria. Ao afir- mar que o ser social determina a consciencia social, Marx e Engels sublinharam sempre a importancia do progresso social para o desenvolvimento da cons- ciencia. A maneira clara como Marx viu esta depen- dencia e demonstrada pelo desmascaramento que fez da politica colonial inglesa na india, que destruiu a cultura nativa: « ... nao devemos esquecer que estas comunidades camponesas idilicas, apesar do seu aspecto inofensivo, constituiram semprea base con- creta do despotismo oriental, que limitavam a razao humana a urn circulo extremamente estreito, con- vertendo-a num instrumento d6cil da supersti~ao e 40 TEORIA MARXIST A · DA EDUCAQ.AO , o escravo das normas aceites, despojando-a de toda a grandeza e de toda a forQa hist6rica.» (10 ) A passagem do feudalismo ao capitalismo foi extremamente tn1gica para as massas populares, mas deu ao proletariado a possibilidade hist6rica da sua libertaQiio. 0 aproveitamento destas possibilidades devia servir, entre outras coisas, para a formaQiio da consciencia dos operarios. 0 facto do socialismo ter sido fundado ap6s uma analise exacta da realidade social torna possivel a descoberta das leis fundamentais da sociedade capi- talista. Isto teve naturalmente uma grande impor- tancia para a educaQiio. N a formaQiio da conscH~ncia politica do proletariado corresponde uma grande importancia a acumulaQiio de saber. Apesar da tra- diQiio de apelar para os sentimentos, apesar dos diversos tipos de ensino moralizador, apesar das muitas formas semimisticas e quase rituais do actuar, apesar de tudo o que na pratica tornava doente o socialismo ut6pico e tambem o socialismo pequeno- -burgues frances e o socialismo alemao, Marx e Engels quiseram sobretudo facilitar a actuaQiio do proletariado com urn saber exacto e uma vontade consciente. «E o comunismo ja nao significa mais urn invento da fantasia, urn ideal social perfeito, mas compreen- sao da natureza, condiQoes e objectivos gerais que provem da luta dirigida pelo proletariado. De maneira . nenhuma defendemos a opiniao de insinuar os novos resultados cientificos em grossas brochuras apenas ao mundo culto. Antes pelo contrario. Assentamos · ambos profundamente no movimento politico, depen- demos de certo modo do mundo culto, concretamente na Alemanha Ocidental, e de urn rico contacto com o proletariado organizado. Tinhamos o dever de fun- (") Ibidem, p. 324. 41 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO damentar as nossas opini6es cientificamente» ( 41 ). No prefacio ao Manifesto do Partido Oomunista) no seu discurso sobre as perspectivas de desenvolvi- mento da AssociaQiio Internacional de Trabalhado- res de 1890, Engels observa : «Para a vit6ria defi- nitiva das proposiQ6es enunciadas no Manifesto) . Marx contava unicamente com o desenvolvimento intelectual da classe operaria, que devia resultar da acQiio e da discussao comuns. » (4 2 ). Este ponto de partida determinou que os valo- res espirituais do · proletariado e que os factores do seu desenvolvimento se valorizassem com especial prudencia. Tanto Marx como Engels indicaram fre- quentemente a delicadeza e a honradez dos opera- rios em oposiQiio a superficialidade e ao convencio- nalismo intelectual das chamadas camadas cultas. Ja a Briefe aus London (Carta de Londres) da epoca juvenil de Engels continha, ao lado de uma critica aguda as retr6gradas universidades inglesas, a afir- maQaO de que s6 as chamadas camadas inferiores se interessam pela arte e pela ciencia. S6 elas leem Byron e Schelley, s6 para elas existem ediQ6es bara- tas de Leben Jesu (Vida de Jesus) de Strauss, assim como traduQ6es de Rousseau, Voltaire e Hoi- bach ( 43 ) • Engels repetiu esta afirmaQiio mais tarde nos seus estudos sobre A Situagiio da Olasse Traba- lhadora na lnglaterra) onde sublinha com mais desta- que «Como conseguiu o proletariado ingles adquirir uma cultura independente. Ouvi muitos operarios falarem sobre geologia, astronomia, etc., com mais conhecimentos que muitos burgueses cultos da Ale- manha» (44). (") Ibidem, Berlim, 1953, vol. II, rp. 320. (") Ibidem, Berlim, 1953, vol. I , p. 20. (") Marx-Engels, Werke, Berlim, 1958, vol. I, p . 469. ( 44 ) F. Engels, D iJe Lage der arbeiJtenden K'lasse in En- gland, (A Situagao da Classe Trabalhadora na Inglaterra), Berlim, 1952, p. 292. 42 TEORIA MARXISTA DA IDDUCAQ.AO Tambem a penetraQao dos operarios, com quem discutia muitas vezes, foi especialmente valorizada por Marx. Na valorizaQao da obra principal de Weitling Gar.antien der Harmonie und Freiheit (Ga- rantias da Harmonia e Liberdade), Marx escreve no anode 1884 : «Se compararmos a mediocridade insi- pida e terra a terra da literatura politica alema com' o inicio literario, enorme e brilhante, dos operarios alemaes; se compararmos as enormes possibilida- des do proletariado no seu amanhecer, com a poli- tica ja gasta da burguesia alema, nao podemos fazer outra coisa senao profetizar urn tamanho gigantesco a Gata-Borralheira.» (45 } Com interesse semelhante fala Marx do operario Dietzgen e observa que ele exprime «pensamentos valiosissimos» (40 ). Esta grande valorizaQiio da po- tencia espiritual da classe operaria expressa-se nas tarefas que Marx e Engels prop6em aos operarios no trabalho ideol6gico-politico. Numa energica dis- cussao no comite correspondente de Bruxelas, em 30 de MarQo de 1846, Marx op6e-se as tendencias que nao valorizam suficientemente a ciencia e a cultura. Segundo a informaQao que Annenkow nos da, Marx teria dito: «Especialmente na Alemanha existe urn jogo vazio e desavergonhado nos discursos em que por um lado e preciso urn profeta entusiasmado e por outro lado s6 se admitem asnos que o ouQam boquiabertos. Evidentemente, nestes discursos que se dirigem aos operarios nao existe a menor ideia cientifica nem nenhuma teoria positiva.» (47 } Urn juizo semelhante e expresso por Engels alguns anos mais tarde quando afirma que «os operarios C"' ) Marx-Engels, Werlve, Berlim, 1958, vol. I, p. 405. ( 4 ' ) K. Marx, Brief wn Kugelmann (Oar.ta a Kugetmann), Berlim, 1952, p. 7 4. (") E. P. Kandel, Marx i Enge~-organizatorzy Zwiaz- ku Ko'YI'liU/IVi!st6w, Vars6via, 1954, p. 126. 43 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQAO alemaes ... pertencem ao povo da Europa mais te6rico e conservaram este sentido te6rico que os chamados cultos da Alemanha perderam». Com este «Sentido te6rico que se desenvolve entre os operarios ale- miles» Engels fundamenta a grande for~a de atrac- ~ao do socialismo, afirmando ao mesmo tempo que «a indiferen~a face a todas as teorias» e uma das razoes principais do avan~o lento do movimento operario ingles, apesar da organiza~ao perfeita dos gremios. Engels caracteriza tambem como profundidade te6rica insuficiente .a «confusao que o proudhonismo na sua forma original ocasionou nos franceses e belgas, e nos espanh6is e italianos na sua forma caricaturada por Balmnine». Partindo disto, Engels considera que alem disso sao necessarios «esfor~os duplos no campo da luta e da agita~ao. 0 dever do dirigente e esclarecer cada vez mais todas as questoes te6ricas, e libertar-se cada vez mais da influencia recebida, das velhas concep~oes perten- centes as frases, e ter sempre presente que o socia- lismo, desde que se converteu numa ciencia, deve ser estudado como ciencia. Trata-se de difundir com paixao intelectual a inteligencia cada vez mais clara deste modo adquirida entre as massas trabalha- doras» (48 ). Marx e Engels defenderam decididamente esta concep~ao de actua~ao politico-educativa. Isto mani- festa-se nas lutas que Marx e Engels dirigiram como organizadores da Liga dos Comuriistas e mais tarde da Associa~ao Internacional de Trabalhadores. Nas numerosas · discussoes que tiveram lugar nos anos 40 na Associa~ao Cultural Operaria Alema, Marx exigia constantemente que a propaganda tivesse urn caracter cientifico e nao agitador, moralizante ou (") F. Engels, Der Deutsche Bauernkrieg, (Guerra dos Oamponeses rva A~emamha), Berlim, 1951, .pp. 28 e seguintes: 44 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQAO sentimental (19 ). Marx e Engels condenaram, nas polemicas contra Bakunine e seus partidarios, a sua aversao a ciencia e a cultura e sublinharam a grande importancia da divulgaQaodo saber socialista para a elevaQao do nivel da actividade revolucionaria. Afirmam com indignaQao que nestes circulos se proibe a juventude de se ocupar do pensar e da ciencia s6 porque se teme que isso possa prejudicar a fidelidade a ortodoxia {50 ). A maneira como Marx e Engels destacaram a educaQao intelectual do proletariado para o cumpri- mento das suas tarefas hist6ricas nao significa de maneira nenhuma que fossem «professores de gabi- nete», como Weitling os acusou, nem que conside- rassem o ensino intelectual como representaQao espe- cifica da verdade, que os cientistas tenham alcan- Qado para as massas. Muito pelo contrario, Marx e Engels destacaram a dependencia do conhecimento correcto da realidade em relaQao a actividade pro- gressista de urn novo tipo. Na critica aos socialistas . ut6picos, indicam que o seu erro principal consistia na convicQao de que o socialismo e a expressao da verdade absoluta, da razao e da justiQa, que s6 tern de ser descoberto para que conquiste o mundo pela sua propria forQa. Este erro tambem era comparti- lhado pelos comunistas pequeno-burgueses france- ses, ingleses e alemaes. Para os socialistas ut6picos, dado que a verdade absoluta e independente do tempo, <;to espaQo e do desenvolvimento humano ·e hist6rico, o quando e o onde da descoberta da ver- dade absoluta e uma mera casualidade. Assim, isto e uma visao completamente subjectiva que deve ser uma suposta «revelaQaO» da verdade e exige dos partidarios uma obediencia passiva as visoes muito diversas, que se tentaram conciliar com urn metoda ( 40 ) Ma rx-Engels, Obras, vol. XXVIII, pp. 60 e s egs. (em russo). (" ) I bidem, Segunda Parte, vol. XIII, p . 505 (em ~usso) . 45 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO que Engels caracteriza como «polimento das ares- tas». A este «metodo» da produQao de uma cons- ciencia socialista, Engels opoe o seguinte principia: «Para converter o socialismo numa ciencia, era ne- cessaria, em primeiro Iugar, assenta-lo numa base real.» (51 ) Este ponto de partida real significa estabelecer uma intima relaQao entre a · vida e a actividade do proletariado, enquanto classe hist6rica que e 0 til- mula da burguesia. «Na mesma medida em que a burguesia desenvolve a sua industria, o seu comercio e os seus meios de intercambio - escreve Engels - produz por sua vez o proletariado. E num certo ponto - que nao se produz necessariamente em todos os sitios ao mesmo tempo ou no mesmo nivel de desenvolvimento - a burguesia comeQa a obser- var que o seu duplo proletario se emancipa dela.» (52 ) A partir deste momenta, a burguesia com- bate o proletariado sem consideraQoes e, de modo cada vez mais decisivo, combate tambem a ·verdade cientifica que ameaQa o seu dominio. No conhecido prefacio a 0 Capital) Marx mostra como a burguesia se converte progressivamente no inimigo da «livre investigaQao cientifica». Inclusiva- mente em todos os campos da ciencia em que a burguesia poderia alcanQar resultados muito valio- sos, na fase de desenvolvimento agonizante do capi- talismo, inicia-se uma evoluQao reaccionaria. Assim e, por exemplo, no campo da economia politica: «A burguesia, - escreve Marx - tiriha conquistado o poder politico na FranQa e na Inglaterra. A partir deste momenta a luta de classes comeQa a tamar, te6rica e praticamente, formas cada vez mais pro- nunciadas e mais acusadoras. Havia soado a sineta (") Marx-Engels, Ausgewiihlte Schriften, Berlim, 1953, vol. II. rp. 118. ( 0 ' ) F . Engels, De1· Deutsche Bauernkrieg, Berlim, 1951, !P· 14. . 46 TEORIA MARXISTA DA EI:>UCAQAO do funeral da ciencia econ6mica burguesa. Ja nao se tratava de saber se este ou aquele teorema era verdadeiro ou nao, mas se era born ou prejudicial, c6modo ou inc6modo, se infringia ou nao as ordens da policia. Os investigadores desinteressados foram substituidos por espadachins a soldo e os estudos cientificos imparciais deram Iugar a consciencia turva e as perversas inten~oes da apologetica» ( 53). Algo de semelhante sucedeu na historiografia. 0 seu merito foi a descoberta da !uta de classes na hist6- ria, mas 0 ambito da validade desta descoberta foi limitado em correspondencia com os interesses de classe da burguesia. Reproduzimos urn exemplo de como Marx julga o proeminente historiador frances A. Thierry, que durante certo tempo esteve sob a influencia de Saint-Simon: «E assombroso como este senhor, o pai da "luta de classes" na historiografia francesa, no prefacio se agasta com os "novos" que querem ver tambem urn antagonismo inclusivamente na hist6ria do tiers-etat ate 1789. Esfor~a-se muito por demonstrar que o tiers-etat engloba as camadas que nao sejam a nobreza ou o clero e que a burgue- sia desempenha o seu papel como representante de todos estes outros elementos. » (54 ) Nesta base es- conde-se a verdade atraves de mentiras que servem ' objectivos concretos e dissimulam-se os interesses -dos possuidores com uma roupagem cientifica. Sair destas redes nao e facil para OS cientistas. As autori- dades e o Governo exercem uma resistencia e um.a oposi~ao que exigem valor pessoal. 0 cientista arrisca nesta questao a sua paz e bem-estar e inclu- sivamente a sua propria vida. Do mesmo modo que em muitas outras situa~oes, 0 problema da analise exacta da realidade nao e urn problema exclusivo da qualifica~ao psicol6gica e moral dos cientistas. ( 03 ) K Marx, Das K <Q;pi1Jal, Berlim, 1953, vol. I, p. 13. (" ) Marx-Engels, Ausgewiih~te Briefe, Berlim, 1953, p. 105. 47 TEORIA MARXISTA DA EDUCAQ.AO E tambem e principalmente urn problema dos crite- rios objectivos. Existem criterios extrapsicol6gicos com a ajuda dos quais se pode determinar o caminho para uma investigac;;ao e uma compreensao correc- tas, inclusivamente sabre as condic;;6es da sociedade de classes, criterios esses que por sua vez evitam erros. Estes criterios podem definir-se geralmente como uma ligac;;ao entre o espirito investigador e a pratica revolucionaria. 0 modo como Marx concebe esta ligac;;ao e indicado pela sua actividade te6rica e pratica. Marx examina este problema de urn modo muito clara na sua critica a Proudhon. Toda a expo- sic;;ao mostra que Proudhon, enquanto representante dos interesses pequeno-burgueses, nao podia com- preender a acc;;ao revolucionaria da classe operaria e que, por nao ter participado nesta acc;;ao, nao foi capaz de formular a sua teoria socioecon6mica sem preconceitos. «Proudhon - escreve Marx - ao lado dos utopistas, perseguiu uma chamada "cH~ncia" atraves da qual deveria extrair-se "a priori" uma formula para a "soluc;;ao da questao social", em vez de deduzir a cii.~ncia a partir do conhecimento cri- tico do movimento hist6rico, de urn movimento que produz em si mesmo as condir,;oes materiais da emancipar,;ao.» (55 ) Em relac;;ao a critica a Proudhon e aos econo- mistas burgueses, Marx indica no exemplo dos uto- pistas o caminho que conduz a ligaQao criadora entre o pensamento e a pratica revolucionaria. «Do mesmo modo que os economistas sao os representantes cientificos da classe burguesa, os socialistas e os comunistas sao os te6ricos da classe proletaria. Estes te6ricos nao serao mais que utopistas que, para resolverem as necessidades da classe oprimida, for- ("') K. Marx, Das Elend der Phi losophie, Berlirn, 1952, p. 43. 48 · TEORIA MARXISTA PA EDUCAQAO mulam sistemas e seguem uma ciencia regeneradora, enquanto o proletariado nao esta suficientemente desenvolvido para constituir-se em classe e, par con- seguinte, a luta do proletariado contra a burguesia nao adopta ainda nenhum caracter politico; enquanto as for~as produtivas nao se tenham ainda desen- volvido suficientemente no seio da mesma burguesia, para que se manifestem as condi~oes materiais que sao necessarias
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