Buscar

As Origens da Urbanística Moderna Leonardo Benevolo

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 19 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 19 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 19 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

GE I')r:,W Lu í J-. . [j <1(,:~J (19 ~~ .
'-'VI i':'O,'"'A.'~~.~ (('À./ fY"\o) ~'VY',(1,; .
C'·U..!WVJ'U:::U .
j/
Quando em Junho de 1815 chega a Inglaterra a notícia da
vitúria de Waterloo, () alívio pelo filial da guerra foi rapidal11ente
superado pelas preocupações relativas à situação interna, agravada
por muitas dificuldades que o sucesso militar deixava inalteradas.
O velho Jorge 111 estava louco e as suas funções eram exer-
cidn~ pelo corrupto Príncipe ReRente. A política r.xtr.rIIa r.ra dirip'ida
pelo frio e impopular Casl!ereagh, que sele anus mais tarde se SUI-
cidaria perante a indiferença e a hostilidade dos seus concidadãO'>.
As despesas da guerra tinha/ll causado uma prugrcssiva inflaçãu,
duplicando quase o custo de vida entre 17f)() e IR11; "Rora, o r'inal
das restrições de guerra colocava em crise quer o monupólio dos co-
merciantes ingleses nas rotas oceânicas, quer o monopólio dos agri-
cultores ingleses no abastecimento do mercado interno. O Parla-
mento, dOlllinndo pe!o'> prnpriel(Hio'> fundi(nio'>. prrpnrnvl1 ~r 1'11r:l
aprovar a infausta lei pl'Uteccionista sobre o trigo que iria transferir
para os consumidores, e indirectamente para o custo da mão·de-obra
industrial, os encargos da crise agrícola. O medo da Revolução
Francesa transformara muitos conservadores iluminados, como Burke,
cm pregadores úa violência, e induzira o governo a reprimir com
desusado rigor qualqucr manifestação não conformista.
Entretanto, a revolução demográfica e industrial transformara
i(l radicalfTll~nlr: 11 di~'rihllirJí() d()~ hahitanlr.~ no trrrilr'"j". r. 11~
I'o"'l.l S1HIl: .'T'"
':OlO TA" OH\."
'''NO
o capital investido só podiam portanto ser aumentados redu7.indo
os custos e baixando o mais possível o nível das construções. Para
além disso, a maioria das casas operárias de Manchester, de Leeds,
de Birmingham e dos subúrbios de Londres fora construída durante
as guerras napoleónicns, qunndo a mndeira importada dos pníse~
bálticos começava a escassear, a mão-de-obra da construção civil
se tornara mais dispendiosa e sobretudo as taxas de juro sobre o
capital aplicado iam subindo, mantendo-se altas ainda durante muitos
anos npús o finnl do conflito. As cOl1di(J)es do 1("llIflo de' Ruellll
contribuíram pois decisivamente para piorar a qualidade dos novos
bai rros.
Com tudo isto, é provável que as casas ocupadas pelas famí-
lias operárias Ilas cidades n1ío fosselll piores, COllsideradlls IIllIa II
uma, do que as casas do campo de onde essas mesmas famílias
provinham em grande parte.
As paredes eram construídas em tijolo em vez de madeira.
c os tcllllldos CIII nnlú,in 011 CIII pedlll elll ve/. de l·lIlll1l1. 11\ 'Itlll1\1I\
eram mais acanhados, mas sem o estorvo e a poeira das máquinas
fiandeiras domésticas; os sanitários estavam ausentes ou eram igual-
mente primitivos em ambos os casos. ~
A diferença é, em contrapartida, evidente, ~e se con,idcrarelll
- os problemas derivados das relações recíprocas entre as
casas e os outros edifícios, no corpo compacto da cidade industrial;
- a mudança de atitude dos habitantes relativamente aos in-
cômodos que sãu con~trangidm a suportar.
(Hllf o, 011I••.•••.(11I.
_UH •• 1 •• 011I
OH I'''''''D
'000 ITO"IO
1M TO" OltA.(.
11I00' LIA«
(;AI "'(ftlll
o..•.,. 000. .~-• - .
IUllf lto! t'O
( •••.•..Pi .• "1.
CHILO t 2 C.,IU)
I o
I,!! !!!
,c. •.t,.( O' , (( T
Figura 14: Glasgow, uma casa superapinhada ainda existente em 1948 (do
(dournah> do Royal fnstilutc of Brilish Architecls. [948).
carências dos novos locais de fixação começavam a manifestar-se
em larga escala, na ausência de providências adequadas.
As famílias que abandonavam o campo e afluíam aos aglome-
rados industriais ficavam alojadas nos espaços vazios disponíveis
dentro dos bairros antigos, ou nas novas construções erigidas na
periferia. que depressa se multiplicaram formando bairros novos e
extensíssimos em redor dos núcleos primitivos.
A construção das novas casas ou a adaptação das existentes
era obra de especuladores privados - os je!!y bJJjld~ers- e, devido
ao jogo da concorrência, a qualidade dos alojamentos, tal como
o valor dos salários ou a extensão dus horários de trahalho na oficina,
era quase em toda a parte a pior que as famílias operárias estavam
dispostas a suportar. Os alugueres podiam variar apenas dentro de
limites muito estreitos, nivelados pelo mínimo compatível com a
sohrevivência do, v,:ndcdore'\ de: forc,:a de traballlll; e" lucre" ",brc
(
As carências higiénic<ls relativamente slJrort{lvci\ n" r:ílnlfJlI
tornam-se insuportáveis na cidade, pela cantiguidade e o número
enarmíssimo das novas habitações.
Enquanto cada casa tinha muito espaço à sua volta, os de-
jectos líquidos e só/idos podiam ser eliminados cum facilidade. e
1I~ divcrQl1Q IIclividl1dc~ lIt1c ~f' rf'lIli .•IIV;lI11 :I" IIr livrl' '"' i:ll;;j" ci,,'.
animais, tráfego dos peões e dos carros, os ;ogos das crian.,:as-
podiam processar-se sem interferirem demasiado entre si Mas agora,
o adensamento e a extensão sem precedentes dos bairros operários
tornam qua~c ill1ro~~ivcl o c<;coalncnlo d()~ delrilo~; a() )"111(" da ...
ruas correm. os regos dos esgotos a descoberto, e qualquer recantu
afastado está cheio de amontoados de imundícies. Nos mesmí'>'>im(;s
e~paços, promi~cll<1mentc. circulam ()~ carr()~ c O~ reõe~. val(ueiam
lJ~ anilual~, lJl illCilll1 il\ L1l1l1lC,;1\
Os bairros de habitação são construídos preferencialmente pró-
ximo dos locais de trabalho, pelo que as ca.~as e as oficinas ficam
amiúdo em contacto, alternando-se sem qualquer ordem e pertur-
bando-se mutuamente. As oficinas impregnam as casas de fumo,
inquinam os cursos de água com resíduos, enquanto o tráfego
industrial é penosamente tolhido pelo tráfego residencial.
Este quadro caótico vai sendo continuamente alterado pelo
dinamismo dos seus próprios factores: as oficinas transformam-se
e ampliam-se, as casas são demolidas e reconstruídas. as orlas da
cidade avançam para o campo sem se ordenarem num equilíbrio
definido.
E,I"","", • 011'''' <le 111-41TI <le 11IA1 a 11;><) rj '1e '9;><) a '941)
O~ •parque. ~ Charcos ~ C"""' ma"Irmo
Eis a clássica descrição de Manchester feita por Engels em
1845, utilizando muitos dados dos inquéritos e dos estudos efectua-
dos nos decénios precedentes:
[Na cidade velhal as ruas, mesmo as melhures, são estreitas e tur-
tuosas, as casas são imundas, velhas, a cair, e o aspecto das ruas laterais
é absolutamente horrível. Chegando a Long Millgate pela Igreja Velha, tem-se
logo à direita uma fila de casas antiquadas, nas quais nem uma só das paredes
frontais se manteve de pé: .50 o. re,to, da velha MandlC:,ter pré-indll,trinl.
cujos antigos habitantes se transferiram com os seus descendentes para bairros
melhor construídos, abandonando as casas, que para eles se tinham tornado
demasiado miseráveis, a uma casta de operários fortemente mesclada de sangue
irlandê~. Aqui encontramo-nos realmente num bairro quase manifestamente
operário, visto que nem as lojas nem as tabernas se dão ao trabalho de
mostrarem um pouco de asseio. Mas isto ainda não é nada comparado com
as vielas e os pátios que se estendem por detrás, e aos quais apenas se chega
por meio de estreitas passagens cobertas através das quais nãu passam nem
duas pessoas ao lado uma da outra.
t difícil imaginar a mistura desordenada das ca,a" escarnecendo de
qualquer urbanística raciunal, o seu apinhamento, de tal ordem que se en-
contram literalmente em cima uma das outras. E a culpa não é somente
imputável aos edifícios sobreviventes dos velhos tempos de Manchester: em
tempos mais recentes a confusão foi levada ao má:l:imo, pois onde quer que
houvesse um bocadinho de espaço entre as construções da época precedente
continuou-se a construir e a remendar, até arrebatar entre as casas a ultima
unha de terreno livre ainda susceptível de ser utilizado. A prová-Io, apre-
sentamosuma pequena parte da planta de Manchester; não é sequer a parte
mai~ ch0Canle e ná') representa nem um dccimn de I')(la a cidade velha.
terrificante das condições deste pátio naqueles tempos. Desde então, parece
que alguma coi~a foi demolida e recon~tnJÍda: relo meno<;. da Ollcie Brictge
VêCI11-'10 "indn nIHlIr1tn~ pnfcdc ... 0111 rltftun e l\llo~ I1lUntl'C!'I do clltulht) tlO
lado de casas de construção recente. A vista desta ponte - delicadamente es-
condida dos mortais não muito altos por um parapeito de pedra e cal da
altura de um homem - é em geral característica de toda a zona. Em baixo
corre, ou melhor. estagna o Irk, um rio estreito, escuro, fedorento. cheio
de iTllundície~ e de delrito~ que ntira pnrn cima dn mnrgem direila. mllis
plana: com o tempo seco. esta margem fica coberta de repugnantes po.;:!s
lamacentas, esverdeadas, de cujo fundo saem continuamente alé à superfície
bolhas de gás fétido que difundem um mau cheiro intolerável até para quem
está sobre a ponte, quarenta ou cinquenta pés acima do nível da á~a. Para
nlérn di"o, n cndit PI1l::;''U) () rir) é inlcrrofllpic1n por n1tt,., diqll~". ,1('lIlr!) ti/I';
quais se depositam e apodrecem em grandes quantidades o lodo e os ,.!elrllos.
Acima da ponte ficam grandes oficina~ de curtumes, e mais acima ainda
tinturarias, moinhos para pulverizar OSSQ<l e ga.sómctro~, cuj')1 canais de e'.cr};)·
mento e detritos desembocam todos no Irk. que recebe ainda o conteúdo do,
esgotos e latrinns vi7.inhos. t. fflcil imaginar, portanlo, qllal a 1I11111rr/a d,,'
depósitos que o rio encerra. Aos pés da ponte vê-se o entullllJ. a imulIJILle.
a sujidade e as ruínas dos pátios que dão para a íngreme margem e,querda;
as casas sucedem-~ imediatamente umas as outras e, devIdo à inclinac;ão da
margem. consegue ver-se um bocado cte cada uma: todas ne[!ra. do fIlmo.
dr..c;rritn">. vrlhn">. Cll'" n~ ('lli,i1hl)~ (' l)~ vidrll<:;; dao; jflllP!no; "111 I'rdl1l.dl; () flll1\l"
é cUllstitllídu por velhus eslalJelecllllelllus illlJuSlrtais selllelhallles a ilUdi I"'"
[.··1
A cidade nova estende·se depois da cidade velha, sobre uma colina ar·
gilosa entre o Irk e St Georgc's Road. Aqui desaparece qualquer fisionomia
de cidade; fila 'i de j.;nlnda~ cn"n~ flll v.nlrHI~ d~ rtl:1't l"'IlCfl"tr:lln-,;f" di'prr'.:l\
nqui e tlcoli\ CtUItO peqll~IHI'l ,,~lullll·(udu"'i. 'itI1Ht" li t1c"'illudiUII' Irllt'lItl .1I~1I\''l\1
onde nem a erva cresce; as casas. ou ante~. as colla~e,.. encontram-,e em
estado degradauo. sem nunca terem sido reparadas. suja~, com qlJar'(,,, em
caves húmidas e insalubres; as ruas não são pavimentadas nem pO\'iuem
cnJlflj" de cc;conrnenlf). nl;lq nlhenunn irllúncr;g COI"Hlin<: d~ pnrr-t)<:. fcrh;1fllf'-;
Clll pe=queJIl'1 pfttl1h (: c!llqlJr"IIIJ"l (111 1'~ILC"rc:"lId(1 IIVIr'lllr.'l'l~ lt nlllnl;l 1-1.1"'1
ruas são tão lamacentas que somente quando o tempo está muito seco se
tem alglJma possibilidade de as atraveS'ar sem aflHldar l)"j p~s ;jf~ ar) rllrnll/~I'1
a cada passo. Na~ vizinharlc;as de SI. vcurgc's Hoad, as ilhas de casas lr;rrtarll' ,e
mais densas. e deparamos com uma série interminável de caminh,,·:. heC'".
ruela~ sccufldáría~ e pálios, <.:aua VC.'L ",ais tlutllcrosu.s c lIC\OrdClIi.lCl0S a f11edld,l
que nos vamos aproximando do centro da cidade. Em compensação. tornam·,e
mais frequcntes as rua, pavimelll;"'a~ ()u pel,) flICII'fl C'!TJI pa·, .•cil)" calcclad,,~
e canais de escoamento; mas a percaria e as carências das ca~as. particular·
rncnlc :l~ cnvrq, IT1llfllrrll'';(" r.'-::1l'tI1ITlrlllr 11"; IIH"'ltlll<;
É opurtullu fa'l~r aquI al~ulllas olJs~l'\'a,;óes de caracler ~erJI ,,,I,,e
o tipo de construções próprias dos bairros operários de :'-.Ianchesler Vimos
corno na cidade velha foi na maior parte das vezes () acas') a pre",dlr i1';
agrupamento das casas. Cada casa_.é construi0a sem_ qualquer ~prêocupação
com as re~tante<;. e os recanto", livres entre a,:, ca"'a~ rl:CChCllI, ;-, [:lI!;, de olllrn,
Este esboço é suficiente para caracterizar o urbanismo absurdo de todo o
bairro, particularmente na vizinhança do Irk. A margem meridional do Irk.':
aqui muito íngreme e com uma altura entre quinze e trinta pés; sobre este ín-
greme declive estão comtruída~ na maior parte das ve7e~ trê.s fila.~ de casa.s. a
rnai~ baixa da~ quaí~ .~e ergue qua~e imedia!:llllenle sobre o rio, enqllanto a Ia-
chada da mais alta se encontra ao nível das colinas de Long Millgate. Ao longo
do rio estão ainda intercaladas fábricas: também aqui as construções são portanto
apertadas e desordenadas. tal como na parte inferior de Long Millgate. À direita
~ à esquerda, uma quantidade de passagens cobertas conduzem da rua principal
a~ nUrllerO"So, páfío'S, ~ntrando no, quaí, ~H~depara corll urna revoll:tltt~
imundície que não tem igual, particularmente nos pátios virados ao Irk. que
contêm as mais horrendas habitações que eu alguma vez vira. Num destes
pálios. mesmo à entrada, onde termina a pas~agem coberta. existe uma lalrina
privada de porta e tão imunda que os moradores, para entrarem e saírem
do pálio. tem de atraveS'ar uma poça lamacenta de urina putrefacta c de
e:-tcrementos que a circunda. É o primeiro pátio junto ao lrk. por cima de
Ducie Bridge, se alguém tiver vontade de o ir ver; em baixo, sobre o rio.
encontram-se numerosas fábricas de curtumes, que empeslam toda a zona
com o fedor da putrefacção animal. Nos pátios por baixo de Ducie Rridge
de~e-se além disso por escadag estreitas e sujag, e só alravessando muntões
de escombros e de imundícies se consegue chegar às casas, O primeiro pátio
por baixo de Ducie Bridge chama-se Allen's Court. e durante a cólera encon·
trava-se em condições tais que a polícia sanitária leve de o desimpedir. limpar
e desinfectar com cloro: o doulor Kay faz numa sua publicação' um relato
1, P. KA Y, The Moral and Physical Condilion o/ lhe Working C/alieI,
Emp/oyed in lhe Collon Manu!aclure in Manchesler. London 1832 [Nota
de Engel~J.
ORIGINAL
o nome de pátios (courts). Nas partes mais novas deste e doutros bairros
operam>5, construídos nos primeiros tempos de f1orescimento da indústria.
o~ervã-seum maIOr esforço de sistematI7.nçllo. O espnço entro dUM casas
é dividido em pátios mais regulares, na maior parte de forma quadrada,
aproximadamente do seguinte modo:
para a rua do lado oposto e pagam um aluguer inferior ao da primeira fila.
mas superior ao dn segunda. Eis pois. apro:-:imadamente. a disposição das ruas:
COI" c~tr. .,1"1("111" d~ ctll1~I"I\·nn. n vrrtlill1\'f!p dlt·! ,.,,((,fJlr\ d/\ priI1H'II;l
fila é bastante bOil. e a das col/ageJ d.1 terceira Illa lIau ~ pelu 'lIclltri I·"'"
do que a das construções correspondentes do velho SIStema; mas a fila central
é mal ventilada. pelo menos tanto como as casas dos pátios. e a rua secunr'árla
é suja e sórdida. não menos do que os próprios pátios. ~_el!1preiteiros pre-
ferem este sistema de construçlÍo porque econnmira espnço e permite explorar
ainda mais os open\rios melhor pllgos. medillllte os alugueles_ mais elevlld,i,'
das cottagfs da primeira e da terceira fila. Em toda a Manchester se encontram
estes três tipos de Col/ages. ou melhor. em todo o Lancashire e YorLhire.
frequentemente misturados. mas na maior parte das vezes bastante separados.
o fllIe permite rl-.rl1I7ir n irlnrle relnlivn ri,>, vJlrios hnirrns cilnrlinos () tcrrrlr ••
~Islen'ü, u c.lft~ rlJu~ ~<:ctJlltlt\flu~. p.cl!tllllllut dccltlldHlll~llt~ IIU H.'r111dc I",llltl
operário a Este de St. George's Road. dos dois lados -de Oldham Road e de
Great Ancoat! Slreet. e é também fl mais rlifunrlirlfl nfl! flutrfl~ bairrr)!
operários de Manchester e dos seus subúrbiO';.
No grande bairro já mencionado, conhecido pelo nome de Ancoats. estão
situadas ao longo dos canais a maior parte das grandes fábricas de Manche,ter.
edifícios colossais de seis a sete andares. que com as suas chaminés altaneiras
sobranceiram as pequenas coltages opuárias. Por is.sfl a poplJlaçãfl dI) ba irro
é principalmenteconstituída por operários fabris e. nas ruas piores. por te-
ccl6c'\ rnnnuni,. 1\ c; fune; rnniq rr(lX.itl1nQ do crntrn dn cidndr ,no n •• fl1:li""
IIl1tigas. e portlllltu as piore~. III1IS IIleSlllll assilll lageadas e pr uvi",,, de valer,,,
de escoamento: entre estas contam-se as paralelas mais próximas de Oldham
Road e de Oreat Ancoals Street. Mais para lá. na direcção Norde~le. exislem
algumas ruas de construção nova; aqui as co/tages enfileiram-se limpas e
polidas. com portas e janelas novas e enverni7~"~s dc frcsco. e os rlivis(lc,
interiores bem caiadas; as próprias ruus s1\o lI1~is uejadus. com espu<;os livres
maiores e mais frequentes. Mas isto reporia-se apenas a uma parte e não à
maioria das habitações; ao que vem ainda IOmar-se o facto de em quase
todas as cotlageí existirem caves habitadas. de muitas ruas não serem pavi-
rnen1;tdl\~ nt':rn prfJvif!;p; dr. vnlr.tat> e. ~f)hrrl"d(). I) rncln fi,. ,.••t,. ;lc;prcln IlfTlpq
dispostos assim de enfiada e aos quais se tem acesso das ruas através de
passagens cobertas. Mas se a disposição do todo, privada de um plano. era
já nociva para a saúde dos habitantes porque impedia a ventilação, este modo
de encerrar os operários em pátios cercados de construções por todos os lados
l!-o ainda muito mais. O ar não tem qualquer possibilidade de sair de lá;
as próprias chaminés das casas constituem. até se acender o lume. a única
via de escape para o ar viciado dos pátios. A isto vem juntar-se ainda o facto
de a, ca,a, em volta de5t~ pátios 'erem na 5U" maioria dllplo,. unidas duas
a duas pela parede posterior. o que l! já de si suficiente para Impedir UIllA bua
ventilação. E na medida em que a polícia não se ocupa das condições destes
pátios. pelo que tudo aquilo que para lá é arremessado aí pode permanecer
tranquilamente, não é caso para ficar admirado com a porcaria e os montões
de cinzas e de imundícies que neles existem. Estive em pátios - nas proximi-
dades de Millers Street - que se encontravam pelo menos a meio pé abaixo
do nível da rua. e que não possuiam o mínimo canal de escoamento para
as águas que aí se concentram durante as chuvas! Em tempos mais recentes
passou-se a um outro modo de construção, que agora se tornou geral.
As cot/ages operárias já não são construídas isoladamente. mas quase sempre
às dúzias. ou verdadeiramente aos montões. comtruindo um só empreiteiro
uma ou mais ruas à volta. A disposição é então a seguinte: um lado é cons-
tituído por cottages de primeira fila. muito afortunadas por possuirem uma
porta traseira e um pequeno pátio, e pelas quais l! pedido o aluguer mais
elevado. Por trás do muro dos pátios destas cottagel fica uma estreita ruela.
a via secundária (back Sfreet), que é obstruída por construções nas duas extre-
midades e na qual desemboca uma estreita viela ou uma passagem coberta.
As cottages que dão para esta ruela secundária pagam um aluguer menor
do que as restantes, e em geral são as mais descuradas. As suas paredes
po1teriore, são comun~ com a terceira fila de t:otlage.f. que por slJa Ve7. d~()
não passar de aparência. Aparência essa que não dura mais de dez anos.
De facto, a estrutura das próprias c()((ng~" nno é menOl reprovllvel du qlle
a disposição das ruas. De inIcio, todas se apresentam limpas e sólidas, as
suas paredes maciças de tijolo enchem a vista, e percorrendo uma destas
ruas operárias de construção recente, sem ter em conta as ruas secundárias
ou sem observar melhor a construção das próprias casas, não se pode deixar
de partilhar a afirmação dos industriais liberais de que em parte alguma os I
operários se encontram tão bem alojados corno em Inglaterra. Mas, olhando
um pouco mais de perto, vê-se que as paredes destas coltages são o mais
frágil que é possível construir. As paredes exteriores, que sustêm a cave, o
andar térreo e o telhado têm, no máximo, a espessura de um tijolo, de tal
mooo que em cada estrato horizontal os tijolos se encnntram uniclr). pelo
lado mais comprido; mas tenho visto muitas cot/ages da mesma altura - e
algumas ainda em construção - nas quais as paredes exteriores tinham apenas
a espessura de meio tijolo, e em que os tijolos eram portanto aplicados não ao
largo mas ao comprido, unindo-se assim uns aos outros pelo lado mais curto. Isto
acontece em parte para poupar material, e em parte também porque o~ em-
preiteiros não são os proprietários do terreno mas, segundo o costume inglcs,
têm-no alugado por vinte, trinta, quarenta, cinquenta ou até por noventa anos,
decorridos os quais retorna ao antigo proprietário com tudo o que sobre ele
se encontra, sem que este último tenha de reembolsar seja o que for pela
constrllç!io erllllida, Por j,,<, rI nrrendnt~rir) cOlIsI r(,i o, ecliffcio, de lal mndll
que, no fim do prazo contratua!. estejam o mais poss(vel privados de valor;
e na medida em que essas coltages são frequentemente construídas apenas
vinte ou trinta anos antes de tal data. é fácil compreender que os emprei-
teiros não estejam interessados em fazer com elas grandes despesas. A isto
vem juntar-se o facto de estes construtores, na sua maioria pedreiros, car-
pinteir"" ou industriais, gastarem pouco 011 nada em repara<,;ÍJes, em parte
para não diminuírem os rendimentos provenientes dos alugueres. e em parte
também porque se avizinha o momento da restituição do terreno onde se
erguem as construções; e a tudo isto vem ainda somar-se o facto de, devido
às crises comerciais e à consequente falla de trabalho, ficarem frequente-
rnerlt~ rua~ irtl~ira~ dC:$f;rla~, Caílldf) a-s CfJ(frIK"" rllpíd:l1nCrllc (:'rI rUfflSif'\ c
tornando-se inabitá veis".
Eis efectivamente a descrição de um bairro de co((ages
degradado:
Numa depressão bastante profunda, rodeada em semicírculo pelo Medlock -t
e em todos os quatro lados por altas fábricas e altas margens cobertas de
construções e áreas terraplenadas, estão cerca de 200 colfage.r reunidas em
dois grupos, na sua maior parte com a parede posterior comum duas a dua~,
e nas quais habita um total de cerca de 4000 pessoas, quase todas irlandesas. '.:"
As colfages são velhas, sujas e do tipo mais pequeno, as ruas são desiguais,
cheias de buracos e em parte não pavimentadas e sem valetas. Imundícies.
detritos e lama nauseabunda estão dispersas por todo o lado em enormes
quantidades, no meio de lameiros permanentes; a atmosfera é empestada pelas
suas exalações e escurecida e adensada por uma dúzia de chaminés; uma
nln"t;n dr. ,tllllhcreQ c dr. crinnt.'llq Itl.,llfl,pilhn,q l"Írclllnlll prln .• Í1llrdin •..·'4,r,. "li"'"
corno os porcos que se deleitam nos montões de cinzas e nos lameiros; em
suma, toda a zona apresenta um aspecto talvez mais desagradável e repug-
nante do que os piores pátios junto ao Irk. A raça humana que vive nestas
cOlfages a cair, por trás de janelas partidas e remendadas com tela, por trás
de portas desconjuntadas e de caixilhos podres, ou na" caves húmidas e
escuras, no meio de toda esta porcaria sem limites e deste mau cheiro, numa
atmosfera que parece propositadamente fechada, esta raça humana deve per-
tencer realmente ao mais baixo degrau da humanidade; esta é a impressão
e a conclusão que somos con~trangidos a tirar tão só pelo aspecto exterior
do ""irro. M,,~ flue dl7cr ;10 tornar cnnhccifllrnto dr. qtlf' ""1 cacln li"'" drr;lat::
cnsltu~t que cUIII~ln no IlIt\xI111U dois quartos ~ ltS i\~lIl1~·ltlll:HllI". C lfU.ll1t1tl
muito ainda uma cave. habitam em média vinte pessoas, ao saber que em
todo o bairro existe uma única latrina - naturalmente, na mai!)r parte das
veze~ impraticável- para cada 120 pessoas, aproximadamente. e que não
obstante todas as advertências dos médicos. não obstante a al\itaç~o prnvooda
lia p'lifcia sanitúria lia époclt da cúlt:ra pelas cundic;ucs da ,d'cquclI,' Irlalld,.,.,
ainda hoje, no ano da graça de 1844, as condições se mantêm quase as
mesmas de 1831? O dout')r Kay relata que n,J() somente as cavc'; mas tamberll
os andares térreos de todas as casas deste bairrosão húmidos: que lIumerosas
l'nv("'i., inicinlrnf'lll(" RI"'rrn":1~. plllll'll Irlt1!''' Vlllvid" rl\nlll1 df' 1111\1' df'l;ld'~lr'li":,;
e silo agora Ilafllladi-i'l pu. tllillldc.,c'l; qlle IllJllIU cavo;:: nlJI' llc\\ tlllt:llIlI .,c CII
contrava abaixo do nível do rio, a água brotava continuamente por um buraco
subterrãneo tapado com argila, peJo que o inquilino. um tecelã,) manual,
era obrigado a esvaziar a sua cave atirando a água para a rua',
Engels de.:scn:ve.: os casos piore.:s e.: niío a Itl~tlia. 'I 1It1;, \ i;l. a \\1.1
recolha de situações-limite é justificada na medida em que a opinião
pública já não as considera admissíveis, independentemente <1:.1 sua
difusão estatística, Aqui reside o verdadeiro móhil da<; dent"!nciél<;
Ijlcr(tria~) Cqlllerllpflftlllca', c dlt·~ 'lIICC','livu'l jlCt,:(tr:'i rellJIIIIlII!llljl'l
Os inconvenientes do ambiente pré-industrial eram entendiLlo-;
como um destino inelutável; existiam (k~(k lr;mr'J', irn-:fT/"r;'I',":I', ,.
pareciam - pelo menos no horizonte de cada gera<,:ão - substancial-
mente imutáveis,
Em contrapartida, a cid<lde industrial é um facto novo, surgido
num tempo limitado sob os olhos das me\ma'i pessoas que lhe
suportam os incómodos. É um facto singular, perturha os háhitos
e a capacidade.: dc CIIIIlIJrccn'iii" tI"s CI>lllclllI",ri\lll'''\, 11111\1'/11<'< "
tudo menos fixo e inevitável. Ainda não se encontrou um sistema
ra~oável. para controlar os seus processos, mas parece natural que
a inventiva do homem e a força das máquinas. tal como originaram
esta realidade, possam tamhém mudélr-Ihe o curso, -
Em todas as épocas existiram misérias equiparaveis e taha
mesmo mais graves do que é1S de'>critas píJr Engels e pe/r)\ outrc)',
escritores dos primórdios do século XIX, e é possível contrapor às
suas descrições outros escritos mais antigos que repetem quase lite-
ralmente a mesma coisa; foi o que fez Uarbagallo, citando textos
\ " de Vauban (1698), de Boisguillebert (1697) e de Mercier (1783)'.
De facto, a diferença não reside nas coisas descritas, mas no tom
A' das descrições: triste e resignado na época pré-industrial, e agora ,
carregado de revolta e iluminado, não obstante a grande miséria
do presente, pela confiança num futuro melhor.
A pobreza - condição suportada há séculos sem esperança
de alternativas razoáveis - é agora reconhecida como «miséria», quer
dizer, é vista na perspectiva moderna de um mal que pode e deve
/1 ser eliminado com os meios à disposição.
A. Bevan escreve: «Por miséria entendo uma consciência geral
de privações não necessárias - e esta é a condição normal de
milhões de pessoas na moderna cidade industrial - unida a um
profundo sentimento de desilusão e de insatisfação pela situação
local actual. De nada serve replicar que as coisas sempre estão
._,) ',\" melhor que outrora.' As pessoas vivem no presente, não no passado.
',:J O de~cl}ntcntarncnto lIa~cc do contra,te entre aquilo que ~e "/lhe
i ," ,..I',' ser possível e o que efectivamente existe. Há a universal e justificada
),'.,~ (. (' convicção de que a grande massa de homens e mulheres se encontra
, ,(' \ pior do que poderia estar»".
\ ~."", Convém portanto buscar as origens do urbanismo moderno
.. ' . 'o na época em que as situações de facto se concretizaram em lIledilla
'v' ,>,;,;" suficiente para provocar não somente o mal-estar, mas também o
protesto das pessoas nelas envolvidas; aqui o discurso histórico deve
", ser necessariamente alar~ado das formas de povoamento à prohle-
, \ mática social lia época, mostranúu u currectu posídunamento úa
urbanística moderna como parte da tentativa em curso para es-
te.nder a todas as classes os benefícios potenciais da revolução indus-
tna!,. e p.ondo a claro de uma vez por todas a inevitável implicação
polttlca Inerente ao debate técnico.
Não é por acaso que se dá precisamente em Manchester, em
1819, o primeiro incidente importante que inaugura os conflitos so-
ciais do século XIX: o episódio de Peterloo.
A política repressiva do governo levara as associações operárias
e os radicais extremistas a porem-se de acordo. Os operários liam
o «Policial Registen> de Cobbett, que desde 1816 era vendido a
dois ("'flCt', e o Roverno respondia nlOhili7l1lldo polícin e e~ér("it{).
ordenando prisões preventivas, fazelll.!u sus(Xnller as seculares garan-
tias do habeas corpus.
A 16 de Agosto de 1819 - conta Trevelyan - foi autoriz.1da para o
campo de S. Pedra, em Manchester, a reunião de uma multidãll ordenada
e desarmada de 60000 homens, mulheres e crianças; mas depois, as autoridades
encarregadas da vigilància, alarmadas à vista de uma tal multidão, mandaram
a milícia a cavalo prender o orador, o conhecido radical Hunt, na altura em
quc n rcuniRo ntinllia o aURC. Quando m militarcs, crnhrcnhal\(I" ..sc °entre a
ITlultidliu pura cUlnprirern n 11Ii~·H'\u. rornlll vtti"dl.~ c repelido"', n, nll(()ridnd("'~
ordenaram à cavalaria de reserva que carregasse. O embate empurrou a densa
massa de seres humanos praguejando e gritando para fora do campo, enquanto
a milfcia, formada por partidários laries, brandia os sabrcs com gosto. Nus
recontros desse dia, pelo menos onze pessoa.; foram mortas ou morreram
na sequel1ciu de ferirl1el1to'\; lJlni3 dc urlln ~el1lClln fic"u feridn 1><:1", \l,I",.\
e várias outras centenas foram colhidas pelos cascos dos cavalos ou sairam
maltratadas da rj~a, O numero de mulheres feridas elevou-se a mais de I1ma
centena 7.
Este episóllio rapidamente sensi!Jilil.Ou iI Inlilgillil~a'l li", LI>!I
temporâneos, que o baptizaram com o nome de «batalha de Peterloo.>,
A história corroborou esta apreciação, e em todos os manuais o
nome de Peterloo vem lado a lado, com significativa simetria. com o
de Water!oo, real~':II\(1t1 II conlrasle enlle 11 r'\l'klldlll dOI p••hll'·,1
externa e a obscuridade da política interna,
Os contemporâneos foram sensibilizados não pela naturc;;l du,
factos nem pela crueldade das autoridades responsáveis, que cederam
ll., 1'r"lic •• ~ llií •• 1"IJplillllll'lll" 11 11111 1'111111'I'lI' ,.';1111".1<-.id .• , "",', 1"'1..
sentimento de inutilidalle no comportamento lias duas partes, amua,
aparentemente hll)rjlJeadas nlJm imfJfH\f' s~rn s;)ída,
A autoridade, adoptando urna posição de força, não prillla
e~perar qllalqlll:r rC'llIlIado dlJlado'll1J 1:l/,O,\vrl (;, hi-,I,'>li" irlf~Ir",,,
tornara desde há tempo impossível governar com tais meiOS); e os
manifestantes, por sua vez _... o, m()racf()rc~ da, viela, e do\ r;tlj,J"
descritos por Engels - eram movidos por uma revolta elementar.
airllJa plÍvllda de jlCl'I1'ecl iVlIs de 1It'~'li() dd illidll';
Cobbett inventara um termo significativo, a coisa, «para lIe-
signar o conjunto de ministros, de traficantes eleitorais, de juhilado\,
de senhores, de eclesiásticos, de industriais que acorrentavam, tira-
nizavam e sangra\'arn a Inglaterra»'; e contra uma imagem deçte
, C. BARBAGALLO, Le Origini delfa Grande !nduslria Canlempo-
ranea. cil. capo XIX.
Cil. in ~II Mondo~, 20 de Dezembro de 1960.
G. M. TREVEL YAN. 8rilifh Hif10ry In Ninefeenlh Cenluf/ and
Afler (1922).
0/1 (.j(
OR\G\NAL
tipo é que era dirigido o protesto dos manifestantes de Peterloo,
\ ainda incapaz de apontar para ohjectivo5 precisos.
\ A constatação dos males da cidade industrial e o protesto dos
seus habitantes perfilam-se pois, por agora, num vazio ideológico
que deixa a sociedade dos primeiros decénios do século XIX mo-
mentaneamente privada de instrumentos para corrigir esses males J
na prática: insuficientes e desacreditados os antigos instrumentos,
ainda não caracterizados os novos.
Doravante trata-se de encher este vazio com uma série de
iniciativas individuais, de propostas, dc leis capazes de soldar-se
por uma nova e coerente experiência; de caracterizar uma a uma
as feições da «coisa», para conseguir mudá-Ia.
O urbanismo moderno não é apenas uma tentativa para re-
presentar visualmente estefenómeno, transferindo-o para a organi-
zação dos espaços, mas intervém concretamente corno um dos facto-
res que cooperam na construção de uma comunidade democrática .
. A urbanística perde assim a posição de aparente distanciamento
dos conflitos sociais, mantida até então à somhra do podcr nbsoluto,
e perde inclusive a aparente capacidade para regular com carácter
definitivo, do alto, o equilíbrio do povoamento; apresenta-se, mais
modestamente, coma uma das técnicas necessárias para definir este
equilíbrio; não insiste já numa forma perfeita a realizar à partida,
mas numa série de modificações parciais, num compromisso razoável
entre as forças em jogo, a renovar continuamente de acordo com
o seu movimento recíproco.
No período entre 1815 e 1848 - de Waterloo à revolução de
Fevereiro - os aspectos técnicos e os aspectos políticos da pesquisa
urbanistica apresentam-se fortemente ligados e quase incorporados
entre si.
Este é um aspecto característico da cultura da época: bastará
recordar o caso de Bentham, o filósofo radical que empenhou os
melhores anos da sua vida e uma boa parte do seu património na
vã tentativa de realizar o seu «pan-óptico», uma prisão modelo cons-
truída de tal modo que um só carcereiro pudesse ver todos os pri-
sioneiros através de um sistema de espelhos, sem ser visto por eles.
A facilidade com que eram aswciados argumentos técnicos e
ideológicos em urbanística parece-nos hoje desconcertante e ingénua,
na medida em que resulta de uma avaliação imperfeita das forças
em jogo e dos obstáculos reais a superar, e que virão gradualmente
a clarificar-se nos períodos sucessivos. Todavia, esta capacidade de
associação mantém-se ainda fortemente sugestiva, e testemunha a
unidade ideal subjacente às diversas experiências urbanísticas do
século XIX, encaminhada~ após lR4R num sentido consideravel-
mente divergente.
Por isso este período - que quanto aos efei~os das realizaçõe~
cOIH:relns pertence nntes 1I pré-Itistúrill do IIr!lllnlsnlO ,."odcrlP. ,-
pelo contrário rico de assomos metodológicos tanto Ill.als ~1~nlflCatlVos.
Torna-se finalmente claro o duplo carácter, clentlflco e mora-
lista da urbanística moderna; delineia-se a combinação particular de
motivos que distinguc tão c1aramentc a acção rcspons;\vel dos .SCII\
promotores, da acção subaltcrna ou literariamente evasiva dos arllsta~
de uma época, e que pode ser descrita atravé~ da~ palavras de Brecht:
drc;drll1 f'" lrl1ncidndf"'. cnl1!JrcilT1r'nln ,.. rl""1)("'liitn
l:lJIIIJHCr.It·.Ou .141 pltlllt:ulttJ c dtl ~cl"lu.
Neste âmnito exi~tem dUil'i linh<l) de <lcC;iir>,que por <lg'lra
se apresentam claramente divididas: a que aborda ,O~ prohlemas da
ur1Janística moderna partindo de IInl 1Il,,,IcI,, Ilk"IClgwCI glClhlll, '1111'
é apresentad0 em altcrnativa à cidade existent: e que se procura
realizar experimentalmente longe cJe~ta, ou entíJO a que pilrtt; d;I',
t:xigências técnicas individuais, ligadas ao desenvolvimento da Cidade
illdll!lllial, ~ 11II,,"IIII' "I>lligil CI·' \1'11', dr!"r'ilCl" i';ldlldl~" .
Ambas tendem a convergir e integrar-se, pOIS as tentall\ as
para realizar os modelos teóricos levam a teoria a confrontar-'>c
com a realidade, enquanto as providências para resolver os pro-
blemas técnicos isolados tra7.cm .1 IU7 a inlerligação entre os dl-
vcrsos problemas, e rinalmcntc o problema linitúrio ua planifi-
cação territorial. ...
Por isso, a nossa exposlçao será diVidida em duas partes:
na primeira falar-se-;I dns utopins do século XIX --- ns dc Owen.
de Saint-Silllon Je "OUI ier e de Cabe! - e Ja\ e.'1'cIICIICliI"' llill;l
pô-Ias em práti~a: na segunda examinar-se-ão as experiências teóricas
que alteraram o equilíbrio tradiciunal da utili/il')fI do ',%, t Irl""
duziram portanto a exigência de um novo equilíhrio calcuhdo. Como
veremos, as principais iniciativas nuo partem das grandes ubrus
públicas, mas dos múltiplos inconvenientes de ordem higiênica da
cidade industrial, que dependem de uma combinação de muitos
factores e requerem uma legislação que rapidamente se estende do
campo sanitário ao campo mais geral da urbanística.
'.
\ .
. '
.) I. t,·í I " •
ORIGINAL
daqui a indiferença pela questão urbanística, e a indeterminação
das previS()cs sobre a'l formos dc povon mcn to nn 'locicdodc futu 1"11",
O impulso dos utopistas para intervir de imediato, sem esperar
por uma reforma geral da sociedade, adquire nesta medida um valor
permanente de estímulo, e a cidade ideal por eles imaginada entra
na cultura urbanística moderna como um modelo cheio de gene-,
rosidade e de simpatia humana, muito diferente da cidade ideal do
Renascimento,
As esquemáticas descrições de Owen, de Fourier e de Cabet
constituem até o grandc viveiro de ideias ue que partiram as expe-
riências urbanísticas do período que se lhe seguiu e se estendeu até
aos nossos dias, É fácil detectar a impressionante semelhança de
algumas das suas propostas - a «unidade de habitação» com um
número limitado de habitantes, as instalações centralizadas, os pátios,
a rue inlérieure, a circulação de viaturas no andar térreo - com
certas soluções da arquitectura moderna, Até o número de habi-
tantes previsto no paralelogramo de Owen (1200) e no Falanstério
de Faurier (1620) se aproxima do da rmilé d'hahilalion de Lc Cor-
busícr, c a ucnsiuaue inuicaua por Owen, um acre por habitante,
é igual à indicada por Wright para Broadacre City,
A investigação dos reformadores socialistas será utilizada por
[' Howard nas garden cilies e pelos prajectistas alemães nas Siedlungen
uas primóruia~ uo pós-guerra, cmpobrecenuo a conceito da ciuaue
ideal até fazer dela um elemento subalterno da metrópole moderna:
o bairro satélite mais ou menos independente. Mas os programas
e as iniciativas anteriores a 1848 mantêm-se na nossa cultura a in-
uicar um<J meta muito mai'i <Jlllbicio'ia, OIJ seja, a rcorganização de
toda a paisagem urbana e rural segunuo novas relações econámicas
e sociais.
" «Pretender resolver o problema da habitação e ao mesmo tempo
pretender conservar os grandes aglomerados urbanos conlemporãneo~ é um
contra-senso. 03 grandes aglomerados urbanos contemporâneos só serão eli-
minados com a aholiç50 do modo de rroduçãCl cnritalisla» (er. F. ENírEI.S,
() I'rohlema da lfabitaçu'J 11~72J).
J' -,,
•• C'
\li'
J'
I Vi '
~-
2. OS PRIMóRDIOS DA LEGISLAÇÃO URBANtSTlCA MO-
J)1~ltNA EM IN<;I,ATF.ltHA E I;.M FH:\N(,'"
,\~
•••• 1" ~_
• ' ' J.\}i'·
\' '~"
\ J • \)
''\",~
(;
,.(
I·
I
:" ,
Nos anos da revolução industrial grande parte das infra-es-
truturas urbanas e territariais - estradas, pontes, c:ln:lis, porlos ,-
foram realizauas pela iniciativa privaJa, e o Estauo, quando não
era movido por razões estratégicas, preferia limitar a sua interven-
ção a urna vigilância genérica. mediante as formalidades das auto-
I i/ll~''-le~ c dll~ plllcnlc~. .'
A construção e a manutenção das antigas estradas. II'glcsd\
era da competência das freguesias, mediante as corvées Impo~ta,
aos habitantes locais. A ineficácia das administrações das fregueSias.
caua vez mais acentuaua uurante o século XVIII, ueixou deterio-
rar-se o estado das estradas precisamcnte quando aumcnta\'am ;\s
exigências do tráfe~o, Para remediar es.ta :it~,?:,~o. o Parl~mento
começou a publicar em 1745 as Turnplke\ Aets que autOrlza'/am
n sector priv:ldo a cnnstrllir novas estradils CO'Tl portagem: entre-
lalltu O~ CUlltIIl,Ulu,> léCllic"" <ll: T<:lltJld e dc 1\-IIICII<lIIIII,Illellllol:lIlIl"
sem paralelo a qualiuaue e a duração uas estradas, permitiam re·
vogar os velhos rcglJliullt:n(f)) 411(; limitil'/;lfTl () pe',(j r; " (_;11'5:) ri',',
veículos, seguindo o principio ue <:ldaptar o tráfego a estraua: man-
tinham-sc us incullvcnil:IIIl:" (kvido'; 11 partículal idadl: ue t:.\i"tll <:111
numerosas entiuades gestnrils de pequenos troços e a perm<:lnência
ue urna rede <:linda vastíssirna d(; estradas secundária, adrnini,tr<tlJa:,pel:ls fregllesi:l~. O Fslilllll leve de intervir em IR:'O. p:lra IInifiC:lr
em certa medida a gcsl;\" dlls C,II,\(I;I\ CIIIII plll tllgclIl, c Clll IH.\·'
para abolir as corvées, autorizanuo as freguesias a cobrar uma taxa.
As portagens foram anolidas gradualmente entre IH5H e IWJ5, e
as despesa, de manutenção elas estradas foram atrihuídas em IRRR
aos cunuadus".
A rede dos canais navegáveis foi construída P?r proprietários
privados de minas e por grupos esp~culadores, segulnd.o o. exemplo
do duque de Bridgewater, que abriu em 1761 o ~rlme.lr? c~nal
perto de Manchester. Entre 1790 e 1794, as excess~vas InICiativas
deste tipo causaram um verdadeiro boom especulatlvo. ~ Estad.o '
concedia uma autorização prescrevendo que o canal devia servir
todos os utentes mediante pagamento de uma taxa58• •
Mas a invenção de um novo meio de tra~sp~rte, ~ ca~lnho
de ferro alterou completamente as coisas. As primeiras vias ferreas
foram e'xperimentadas junto das .minas, e ~o in~ci~ do século XIX
foram abertos os primeiros ramais de serviço publico, sempre para
carruagens puxadas a cavalos. As primeiras tentativas com compo-
sições a vapor" resultaram mais dispendiosas do que as de tracção
animal, até à invenção da locomotiva de Stcphenson, que fez a
.<-.0: primeira carreira pública entre Stockton e Darlington em 1825.
A primeira linha importante, entre Manchester e Birmingham, foi
aherta em IR30, iniciando-se <I concorrência do novo meio de tral1.~-
porte com os tradicionais. Tentou-se primeiralllente aplicar os fer-
rovias a mesma legislação das estradas e dos canais, prescrevendo
que os trilhos do caminho de ferro servissem qualquer utente, me-
l ".' diante uma portagem, mas isto revelou-se impossível na medida
. r em que as empresas construtoras exigiam a gestão das suas linhas.
Deste modo, o Parlamento não pôde manter por muito tempo o tra-
dicional critério de não intervenção, confiando na livre concor-
rência para assegurar o bom andamento do serviço, e em 1844 votou
urna lei que concedia ao Est<ld" <I faCilIdade de optar pela compra
das ferrovias dentro de 21 anos (mas no termo do prazo, em 1865,
a diferente conjuntura política aconselhou a manter o regime pri-
vado), fixando entretanto os limites de velocidade, da utilização e
,das tarifas das linhas existentes.
".r.'" Analogamente, no períotlo inicial, enquanto os ramais se man-
í''': tinham isolados, os construtores podiam adoptar sem problema
).'~r).)- diferentes bitolas para a via férrea; mas quando os ramais se uniram
rJ ,_,;" formando uma retle, o Estauo teve de intervir fixando em IR4li
'<:.-"' Jf'" uma bitola uniforme tle 4 pés, 8 polegadas e meiaH.
,~:<'J ~(.r'1 Em França, o ancien régime deixara uma boa rede de estradas,
J.'.>: mantida com as corvées da população rural. Este sistema foi abolido
.r?---:--
jo-)
, , 5" Op. àl.
.' '?' ' 51 Um primeiro modelo fOI construido em 1769 por G. Cugnot, em
(.J ",,(I )França: apú~ a invenção de Watt. foram feita~ outra~ tentativas por Rooin>fJn
J J e Murdock entre 1780 e 17~), e por ., re·vitl\kk em I~CJJ .
.1,'- ~. Op. cit.
y'~\,.
,..)- \ ,"~
l . "
;';, ,'~ peln Revolul,:iío e o Estndo elll:nITegou-se di.rectllnlcnte de construil
~J'" O/I' e reparar as estrauas; Napoleão I construIu mUitas vias. tl~ mte-
resse estratégico em França e nos territórios ocupados:. ellmmando
por conseguinte o expediente das portagens; a Restauraçao melhorou
sobretutlo as vias secundárias e formulou em 1 R 1R um plano para
,(- a construção dos canais, solicitantlo a iniciativa das companhias pri-
vadas e autorizantlo-as a cohrar uma taxa; ;j monarquia de Julh,)
- que em 1831 criou um ministério das obras públic3s - elaborou
em IR.1(j um vasto r1rOp'ramn Ifnil;trio para a Cll,,~t 1"I;iill dI' 1"';11';"1.,,;
\~ .
'. e tle canais, atribuindo-lhe no tlecénio seguinte cerca de MOO nll-
Ihões de francos.
O problema das construções ferroviárias foi prontamente aco-
metido com lnrguezi1 de vistas; a primcira linha férrca pnto d~
SI. Etienne entrou em funcionamento em 1832, e logo em 1M3] o
Governo encarregou o ccComeil général des ronls et chaussccs"
de formular um plano rara todo o país: todavia. foi repetidamenle
,I' I~jl~illtdlt (c '" IX 1\ I I! 11 <' I I! lI!) Ii 1""I""tll 1'11111 "",,1 il.'l li" 1;',1;,.1,· :I
(I ,I' \ "", .\ ,. construção tlas vias férreas, como se fizera na Udglca, e dL!rantc
\, . ~ um certo período continuou-se a proceder caso a caso, conceuendo
j,: "as autorizações às companhias privadas. Mas a exigência de um
,', ,,<.,' 'controlo unitário veio a conduzir <l lei de IR42, que atrihuiu Ú'
( ,/"', grandes companhias o monopólio das linhas principais. repartindo
,. a despesa em partes quase iguais entre o capital privado e o Eslatlo.
''''~' e estabelecentlo que as vias férreas passariam para o Estado ao
•1 ,(,'1 fi m ue 40 a nos"' .
,.' \ Os IlUVU\ plugralllas Je ubras públicas, e e\lH:ciallllellle "., .tC
'1 J , .• ,V. 'ferentes às vias férreas. permitiam de facto à administração publica
.). modificar profundélmcntc o ortlenamento tcrrilorial, c mC',rnl} CI. dll',
't centros habitauos _ basta pensar nos efeitos tlo plano ferrovia riu
tle IM42 elll Fra/ll;a, Cutll a~ selc grallJc\ li Ilhas cOllvcrgillJu \1I1J1 c
Paris, ou nas consequências resultantes tla localização escolhitla para
as estações ferroviárias nas orlas da citladc -, mas a urgéncla e a
,I "complexidnde das exigências lécnicas deixar;1I11 pn~qr qll;l\C d,'~-
percebido u valur urIJallislicll global du\ IIUVUS IIICIII'. 1.111111.1 1c~1\
lação como a prática atlquiriram um carácter espeCializado. sectonal
impedindo descortinar as relações e as interligações entre 05 sectore'>.
'f
,c"
('
\
f.\J
~.i.' .
•'J
-'"
\.
r ·u-J
" (. )\
.)
'" Op. cit .. No final de 18]7, F. Barlholomy, presidente da Companhia
d'Orléans, dcclara: "li apliLaçáo do vap'Jr a navcgaçáo c a'R camlllh()\ de
ferro só pode igualar·,e, pela sua importância. à invençáo da imprensa ou
11 d~'H:()ht:rl:l dJl "'lJl~ril:ll. ilf'Ill1lrj·j,nrn1n •• 'I"" "lII/Ja';lI" a r,lI l'" dI) fTlllllflll'l
(dt. jn 11. Pl--YHI.I, Ifl.)ltJlIl! tlf') CII,'''I/II\ 1/" If'r "li 1'/(J/llt' ,'/ 111111\ Ir 1\/1I1/1/r,
Paris 1949).
ORIGINAL'
Portanto, a muderna legislação urbanística nuo podia nascer
deste terreno, tendo pelo contrário encontrado imediatamente na
própria legislação sectorial sobre as vias férreas e as obras públicas
um dos obstáculos mais poderosos.
A única consequência importante destes avanços, válida para J
os fins urbanísticos gerais, foi a revisão da lei da expropriação,
que inicialmente era considerada uma operação rara e excepcional,
.' r), ao passo que agora, por ter de ser aplicada em larga escala, foi
.~I'· disciplinada de modo cada vez mais favorável para o Estado.
Em Inglaterra, as garantias concedidas pela lei para proteger
os direitos dos proprietários fundiários tornavam, em 1840, o custo
das linhas ferroviárias cinco vezes mais elevado do que nos países
germânicos, e dez vezes mais elevado do que na América, onde
,,:-as linhas férreas avançavam pejos territórios livres do Oeste'lu. Mas
também em Inglaterra o processo de expropriação viria a ser dis-
t,· ciplinado de modo explícito em 1842 e 1845.
Em Prar1<;a, a lei lJapolcf"lica de IHI() e a orleanisla de IH.1J
- resultantes das exigências dos já referidos programas de obras
públicas - foram aperfeiçoadas em 1841 pela lei de 13 de Maio,
. J;' ,"que precedeu o plano nacional ferroviá'rio e serviu de modelo às
; / leis de muitm outros países, entre as quais a lei italiana de 18(,5;
• " foi então estabelecido que a expropriação devia ser autorizada pelo
poder legislativo, os seus termos definidos por decreto do prefeito
e pro~unciada pela autoridade judiciária, a quem competia também
a deCisão sobre eventuais controvérsias.
Mas a teia UêlS inlerlígaçõe:i urbanísticas criadas pclo desen-
volvimento industrial torna-senecessariamente evidente através da
constatação dos inconvenientes de ordem higiénica causados pela
desord~m e a aglomeração das novas periferias. Quando estes in-
convenientes se tornaram intoleráveis - devido às epidemias de có-
lera .q~e ~roliferaram depois de 1830 - e se estudaram as primeiras
proVidenCIaS ~ara os eliminar, tornou-se clara a pluralidade das
,(' cau.sas determlnantes, pelo que as providências adquiriram neces-
sariamente um carácrer múltiplo e cuortlcl1ado, lJe~le motlo 'I Ie-
; (, •. , ''gis~ação san!tá.ria torna-se o precedente directo da moderna' iegis-
laçao urbanlstlca e cedo, se. gcneralizou a noção de expropriação,
estendendo-a das obras publIcas a todo o corpo da cidade.
Em Inglaterra, as primeiras tentativas sérias para melhurar
as condições higiénicas da cidade foram levadas a cabo após a
"'I Cil. de Á P, I;SIfFH, ;f" Inlr'l'f'" I;IJII 10 11", 1,,<I'Jllr"JI 1Ii>I'Iry o/
England. Londres 1939, p 449.
reforrl1l1 e1eilornl dc IHJ2, c CIl((lllldrllll1-\C Iltl VII\lll plllHllIlll1I Ir,
formista do novo governo whig,
No mesmo ano de 1832, Edmund Chadwick (1800-1890), ex-
-assistente de Bentham, foi nomeado inspector na Comissão dos
Pobres, tendo contribuído para a formulação da nova lei de IRJ~.
e até se retirar da vida pública, em 1854, foi o animador de todas
as reformas no campo da higiene social.
A lei dos pobres de 1834 respeita em certos aspectos os pre5-
Sl/postO'i lec'lficllS de oriw:m radical rn')prio'i da c1i1s<;c diri~I~IlI\, 1'11
tão no poder.
Foi abolido o ruinoso sistema de Speenhamland, estabelecen-
do-se o princípio de que ninguém devia receber subsídios parci,JI);
para os desempregados estavam previstas as casas ele trahalho (lvnrk-
houses), mas tendo o cuitlatlo de «tornar a vida menos agrad<'.I\c1
, . do que a dos mais infelizes trabalhadores independentes»)'''. Na
C; \ ,', \ l1?Jl)in~s,ma época foi criad~ uma organização de vigilância muito mais
',«9/' cflclcl1lc do ((111' 11 1I1111gll, ('''111 1111111<;nic' (TI1II"III r dq'f'llllrlll·l."
~)/ perifcricas para cada grupo tlc frcguesias; a eslcs sClviç", 1", {illl1-
bém atribuída a responsabilidade de prestarem assistência médica
aos pobres, posteriormente de tomarem a cargo os registos dos nas-
cimentos e mortes - estas últimas classificadas segundo as GIII\;)S.
em confurmidade COIII a Registraliol1 Àct dc IHJCJ-- c fi,1<l11111:nll:
a vacinação pública, depois de 1840.
Chadwick, que foi nomeado secretário da comissão central,
QV)f.-t.\'· ,\,_' \. teve ,rossibil idade ele se doeu me n ta r ampla men te <;obre <1S cond içr)e<;
<:.,"0- (.' " ..• ,' dc Vida da'l ciWI';!", JlICI10', 1I111I''';"lw" C lk'l "1: ('''JlIII de '1"': ,,', I'"
I" ,-{", c" "rI deres até então concedidos pela lei aos serviços de assistência aos
" \ pohres apenas permitiam 11m;) inlcr'l'~n(;iir) paliariva; ;fS (:;IlJ~;l', /j;,
',_'I \ \' Iv'", desastrosa situação sanitária estavam inseparavelmente ligadas ao
•.• j(,1 ,;.-.' I e~p~çn cOllstrllido c ;1'1 ~lla<; rccclllc1 t,all',for 1I111\f'C1, dr:víd" ;,',
(- .;.~,. qualS os tradicionais meios de intervenção se tornavam ineficazes,
,j' Exi~t iam de f aclo l1a~ cidades 11Ume f()~a~ c,1I iJalk~ pú 11/ICi!'
(trezentas só em Londres) encarregadas da iluminação. da pil1i-
IIIClllll';iio, do'; c';J.\ol,,~, d" 1I1'1I':lrl'illlt'llllI d,' (,gllll 1111 d •. 11'"
respe.itar os regulamentos relativos à construção, a~ tráfego e' '~(l
~ol~c.Jamen~o, ~as es~avam desacre~itadas, incapazes de se adaptarem
a flslonomla e as difIculdades técnICas do novo ordenamento urbano.
Em 1835 foram criadas nova<; admini<;lraçr)c\ mllllícipili\ clcil;l\.
Gl ESI~,q ~ão a' r~l.1vra' de Na"~1I ,éninr l1"e. jlllll.1menle com íha-
dVJie'J.:, ("j 11 (Ir "" 111/11 , r r,; P" " "dt " •.•1 "rlll Iri, li' 1,·",J,J,""lr7 ("r ali' d'·I"'I~ d.":
cri Ias pÚICllli(alllclltc por U!(kCIIS CIII UI,,'u r"" II (I MJM).
a 4ue foram atribuídas as tarefas antcriormcntc dispcrsas por aquclas
entidades tradicionais, mas era preciso conceder-lhes os poderes
necessários para agir e introduzir as correspondentes limitações nos
direitos privados.
Devido ao carácter acentuadamente privatístico da legislação e J
dos hábitos ingleses, esta inovação foi longa e difícil, e só a dra-
mática evidência das epidemias de cólera, que se repetiam de 183 [ .
em diante, persuade enfim as autoridades a sairem da sua reserva
teórica.
Em 1838, as autoridades londrinas pediram à comissão da lei
dos pobres que fizesse um inquérito sobre uma epidemia eclodida
em Whitechapel.
O relatório da comissão de inquérito - formada por três mé-
dicos, Arnott, Kay e Southwood Smith - e sobretudo o relatório
pessoal de Southwoou Sl11ith sobre a falta de água sensibilizaram
a opinião púhlic<l; Chadwick ohteve de 10r<1 RusseIl, em 1839. o
conscntimcnto para quc o inquérito l'ossc alargado li todo () p"ls,
e em 1842 compilou o relatório final, que ofereceu pela primeira
vez um quadro completo das condições sanitárias das classes tra-
balhadoras';2. I I l,:,:,J',.\' o'C')
Entretanto, uma comissão da Câmara dos Comuns começou
a ocupar·se do assunto, e em 1840 publicou um relatório que con-
firmava as conclusões de Chadwick; pouco depois, Peel, pressionado
também por Lord Ashley e pelo príncipe consorte, nomeou uma
comi,~ií() real de inquérill), que ,lr:u a conhcc;er a, ,lia, CCH\(,:lu>',c~
em I !l44 e em 1845'''.
lIAS
DB4TH
(I~ A RAia:)
lJee" i".il •.,1 I,y 11,,·t:,".""j"i",,,·r. U( (· •••".IIU"
Sew"r~ lu lllkt' up hi" abo.h· in Larnbelh! or, (rom
wflat IIlher viilllnllUq r.aulil· prr)r.~,'cl~ Ih •• (ril{hl(1I1
Morlalily hy which we ure.urrllundcd !
I" lhi •••••• 1-11"',,,· u( lhe IU"'ruJloli •• a.ul
di5grace 10 lhe Nalíon, lhe main, Ihornugh(are!
Are ~t,ill wil!l,,"t ellmlnllfl Sl~l<\'er~, Illtl'IIUgll the
Inh"bilanl. h"n~ pllicl Cl(or!lil"nl Jl"le~ (rom limp.
I 111111" Illllrl •• I 111
•• o Re •• eal Ihal •• ch _mp.nlc.a. lho.'''., allr.14 .
•• ~ paI I. ~.err hOIlHI halld, • w"lp,
••To I•••• lhe raaeal. nalleodl I"roal" lhe W'orl"."
Unleu ~omet"inll: be ~pecdily done 10 allay
the growilllÇ di,C'cJllIl'III ••r lhc' 1"'lIplc, relrihulive
jultice in her !UllulHry "engeance "ill eommence
her ope~tion! wil!l the Lamp-Iron and the
Halter.
É interessante ler. nos relatórios da comlssao real, a grande
variedade das providências su~eridas para melhorar a higiene da
cidade:
- confiar os controlos sanitários às autoridades locais, soh
a supervisão directa da Coroa;
- fazer levantamentos c indaga<J,es cxactas ~ohrc n 7.0I1a,
antes de projectar a instalação de esgotos;
- combinar os trabalhos dos esgotos com os da pavimentação;
- conceder fundos às autoridades locais para alargarem e
melhorarem as ruas;
"' Reporl 011 Ilte Sanilary Condilions n/ Ilte LabOllrillg POflll/aliot!,
1'142; ef. J. H. CLAPHAM. An Economie Hif10ry o/ ,"fadem Rrilait!. lhe
f,'ar/y RlJI/way A K", C","brjrlv.~ I') I'). GIl' J
O" f'ITlI Rl!porl o/ (lrl! CUmmll'llUnen for ["'llIirill/( illlo Ilre Sla/e o/
Large TOIVt!s and POpll/OIl5 Vi5lriel5, 1844; Seeond Reporl. ele., 1845.
J·ll!."ra 'I. (1,11 IJlJtIlI1r.')II' fi,., lii\J, li"" 111131111 n~ ('••Iflllllll') ~"IIIr'. it~ ("li
dições sanitárias de Lundres (em L. WIUGIlI', La civtllà //1 bagllo, eJ. 11<1.)
_ fixar os requisitos higiénicos mínimos p;\ra tO(,I;\s,I\S habi-
tações e tornar obrigatória a instalação ~os servlço~ sall1tános;
_ obrigar os proprietá:ios a ventl~ar e a limpar adequada-
mente as casas insalubres, Criando uma hcença para o aluguer dos
alojamentos; " ,
_ criar um corpo de médicos téCl1lCOSde higIene;
_ conceder fundos para a abertura de parques públicos nas
cidades industriais que os não possuem.
É já evidente que as futuras leis sanitárias deverão desenvol-
\. " ver-se no sentido de uma legislação urbanística geral, e que uma vez
\_ ; .,' abordado um problema - o sanitário - todos os outros virão como
, " consequéncia.
, A primeira consequênciajurídica destes inquéritos foi a lei
, . "de 9 de Agosto de 1844, para Londres e arredoreso" que definiu
.,f' , certos requisitos higiénicos mínimos para os alojamentos de aluguer
" e proibiu que as divisões subternineas fossem uestinauas a habitação
a partir de Julho de lR4r" Ainda em IR4r, foi nprovat!;\ a primeira
leí para a criação de balncários c lavalldarias públicas na capital.
No mesmo ano, o Parlamento começou a estudar uma lei
geral; homens púhlicos e jornalistas desenvolveram com insistência
os argumentus te6rÍ<.:us du liberalisl!lo contra a intervençào pública
nesta matéria, enquanto uma nova epidemia de cólera tornava ur-
gente a decisão.
Uma primeira proposta de lei. haseada nas recomendações da
comissãu rcal, fui apresentaJa cm )!l47, mas posteriormente reti·
rada; só no ano seguinte foi aprovaJa a primeira Public Health Aet,
de alcance mais jimitauo mas de incalculável importância política,
sendo esta a primeira tentativa para introduzir na legislação tra·
dicional a realidade da nova situação urbanística, pelo menos em
alguns aspectos mais evidentes,
A lei de 31 de Agosto ue 1848 é um documento longo e
minucioso, e ocupa bem setenta páginas dos decretos oficiaisQS,
A extensão deriva em parte dos hábitos juríJicos ingleses, ma,
também do carácter da nova lei que, introduzindo um novo con-
ceito de controlo público num campo até então não regulado, ou
o. 7 el 8 Vicloriae Reginae, capo LXX XIV; An Acl for Regulaling
lhe Conslruclion and lhe Use of lluildings ir! lhe Melropolis and ils Net'-
ghbourhood, p. 190.
o', 1/" JZ Víclo,lu" I<"",;"u", ;1" ,A ':1 I'" I"""'''I/''e Ih" 1',,/,11" I/"u/I/',
p. 721.
e
P'H'~
h h Lhh h
h
n .-----
h ~
z:
h o•...
'"
lu"".1
..
a
'"...
:J:
Tu,,"tl
211 10,0'
"",dt h
ltWII IQU
-_.- --
h
h
4" "To IlAlIl s) "~
VARO. ...•......
-'
v
:r:....
Figura 32: Planla de um pátio de Nottinghall1: desenho incluido nu Rda·
lório da ComiBào Real JOhre o ESlado das Grandes Cidades, de 1845 (se·
gundo HOSKINS)
regulauo por prescrições discordantes e antiquadas. requer uma
longa série uc cspccifica<,:iíc\ (10 COflfrofltar·\(; com olltra\ ki\ c h;'d,i-
tos vigentes. As definições dos termos usados ocupam só p<Jr si
qU<l'(; trê:s págill<l\.
Os objectivos da lei são assim declarados no início: «Na
medida em que é necessário tomar novas e mais eficazes provi-
dências para melhorar as condições sanitárias das cidades e dos
distritos populüsüs em Inglaterra e no r<lis de Gales. interessa que
~,\ r' \ O abastecimento de água a estas cidades e distritos, os esgotos, as
~ drenagens, a limpeza urbana e as pavimentações sejam tanto quan(n
\~:" possível colocados sob um único e mesmo órgão local de gestão
r: c"ntr"I". q"llfllrlid" " ';"I)rr"j~ii" v.rr;d rll"i~ 1I"lIi~" illdi(';lll"
(<11'1. I),
A primeira coisa criada pela lei é a General Dourd ar Henlt~l,
formada por três membros de nomeação rcal, por um secretáflo
e pelo pessoal necessário. A General Bo~rd o~ He~l~h tem ~ facul-
dade de nomear inspectores para conduZlrem Inquentos locais onde
tal venha a ser requerido pelo menos por um décimo dos habitantes,
ou onde a taxa de mortalidade nos últimos sete anos seja superior
a 23 por mil (arts. 3-8).
Em seguida a tais inquéritos a General Board of Health pro-'
move nesses lugares a aplicação da nova lei, criando para o efeito
circunscrições (dislricls) coincidcntcs ou nãu coincidcntcs com as
circunscrições administrativas normais (sujeitas, em alguns casos,
à aprovação das assembleias locais; arts. 9-11).
Em cada distrito é criada uma Board of Health local, for-
mada por funcionários e por representantes dos proprietários c dos
contribuintes. Os artigos seguintes (12-33) estabelecem as modali-
dades para as eleições destes representantes.
As Boards of Health locais podem nomear inspectores, em-
pregados <: também um méúico para o cargo de Técnico de lllgiclle
(art. 40).
Os poderes das Boards locais abrangem:
a) os esgotos (arts. 41-54); a lei prevê que acima de tudo
seja elaborado «um mapa, quc represente um sistema dc eSHl,tm
adaptado à satisfação das necessidades do distrito, numa escala a
prescrever pela General Board of Health». Além disso, «todos os
esgotos existentes à data do início da aplicação da presente lei,
ou a ~cguir comtruído'i ('ialvo alguma'i cxcepçiic'i) com os cdifícios,
tal como as instalações e matcriais anexos devem pertencer e ser
geridos pela Board of Health local»; é prevista a expropriação das
obras pertencentes aos antigos proprietários. Cada casa de nova
construção deve ser provida de e'igoto próprio e de latrina; quem
transgredir esta obrigação é passível de multa até 20 libras ester-
linas, e a Board local pode ordenar a construção da latrina omissa
a expensas do proprietário. Também passa a ser obrigatória, para
as novas construções, a notificação dos níveis dos quartOl mai'l
baixos e da localização dos serviços sanitários, que deve ser apro-
vada pela Board local; para os transgressores é prevista uma multa
até 15 libras esterlinas e a modificação forçada das obras cons-
truidas abusivamente;
b) a limpeza urbana (arts. 55-57);
c) a remoção de quanto possa causar danos higiénicos (ca-
nais descobertos, pocilgas, imundícies, águas estagnadas nos subter-
rànco'i, etc.; arts. 5R-óf);
d) a regularnental,:ão dus matadourus (arts, 61-(5);
- ~~~
•
!~.,""'.• - .. - ~-~. • .-:__ :'.::'S.:_:!lJ:==-;";~'~..;-
_ ..- -.-::
Fill"r" 11' f\. r"nd"çi,c' de P"ri, (c''1"in" entre a Rue Snllfrtot c a Rue
Sain' JIlC'IIIC'; dc f\. JO/\NNI'" /'",;, 1//",,,,:. lW]IJ/,
e) a rcgulamcnf;J';iio da'i C;l'i;)'i de allJglJer (arl, ór,-(7),. qlJe
devem possuir delerminados requisito) de assclo e de \cnt!lac,.<H), c
pruibido o lI)O d;)s cavcs para ha!Jila<;;iIl, ';1: Il;i" c"rJ,:·,p"lldt:rcrn :1
certas condições, e é previsto um prazo - de seIs meses a um anu -
dentro do qual dcverão s.cr de'iimpedid<l'i <I'i cavc,> niio reglJiarnen·
tares actualmente habitadas:
/) li pavilllcllla~';íll c 11 1I11111111cll,iíll d,,'; 11111': (1111'. (,!'l 7' I,
g) os jardins públicos (art. 74); «as Boards af I-Iealth locaIS,
com a aprovação da General Board, podem patrocln.ar, m,anter,
traçar, plantar e melhorar espaços de~tinados a passeios publlcos
ou jardin), e contribuir para empreendImento) scrncJll<lllles de Ini-
ciativa privada»:
h) o aba')!ccimento de água (art') 75-~OJ;
i) a sepultura dos mortos (arts, 81-83),
() ali. 117 ,:':lal)(:I<:,',: aillda '1')(: w: ""ard~ I,,,'ai': Il':':llllllr:ill
as fUllçues de vigilúncia das estraúas estatai'i,
ORiGINAL
Os artigus seguintes - du 84 em diunte -dizem respeitu nu
funcionamento administrativo e financeiro das Boards locais, e
estabelecem que as despesas suportadas com a execução das ins-
talações sanitárias podem ser recuperadas de dois modos: mediante
contribuições especiais (special district rates) a aplicar aos imóveis'
l',' a que dizem respeito essas instalações, e mediante contribuições
.' gerais (general districl rales) aplicáveis a todo o distrito. Quando,
os trabalhos executados consistem na beneficiação de um bem pri-
vado, o respectivo proprietário deverá pagar outras contribuições
(privale improvements rales).
As relações entre as Boards e as entidades privadas são minu-
ciosamente reguladas pelos últimos artigos da lei; são concedidas
muitas garantias legais aos proprietários, mas o exercício pleno
dos direitos de propriedade é inevitavelmente limitado de diversos
modos pela nova lei; para além de serem obrigados a cumprir os
regulamentos, a pagar as contribuições e a submeterem-se even-
tualmente ao processo tle expropriaçiío. os proprielúrios privado,s
devem garantir sempre aos funcionários tia Board of Healt o
livre acesso aos edifícios e aos terrenos «para elaborar os planos,
inspeccionar, medir, nivelar, examinar os trabalhos, verificar o
percurso dos esgotos e das condutas tle tlescarga,averiguar ou
fixar os limites».
A lei não se aplica à City de Londres (onde existe a Metro-
politan Commission of Sewers com amplos poderes), aos distritos
onde actuam as Cornmis'iions of Sew';rs criadas a 13 de Novembro
e a 4 de DezemiJru tle IH47, e a zona tle Regenl's Park, subme-
tida em 1825 a um regime de vigilância especial.
O debate que acompanhou o iler parlamentar da lei é bastante
interessante, pela variedade e a insistência das ohjecções, colocadas
não apenas pelos proprietários cujos interesses foram postos em
causa e pelos seus representantes, mas também pelos teóricos li-
berais, entre os quais Herbert Spencer"n; este caso é recordado por
Waller Lippmann, como exemplo típico da deformação c;1I1~ada
pelo dogma da não intervenção do Estado,
O radical «Economist», em 13 de Maio de 1848 lamenta
que a Public Health Act não tenha encontrado uma opo~ição ade-
quada, e desdenhando entranhar-se nos pormenores na medida em
que a lei abarca «uma grande quantidade de matéria, que não
"podemos enumerar s~m atulhar o nosso espaço com um rol de
- 'palavras quase ofenSIvas» (trata-se de esgotos, imundícies, etc,),
.,' H, SI'ENCER, Suciul S/Vlle>. 1~51; cL W, L11'I'MAN, ,I Sutle-
dade Justa (194J),
o"~crvlI: (ISofrilllclllo C 111111e,síio I\dmnc<;tn~-iíc~ d.n llat,"rC7:l: niín
é possivcl eliminá-Ios, e as illll,Jacielllcs tellllllivilS lillll~lIIII'IClI' llillll
os banir do mundo através da legislação, sem determinarem o seu
objecto e o seu fim, sempre trouxeram ~ais mal d? que bem»",
Contra estas filosMicas argumentaçoes, Chadwlck e os seus'\",,' 'I I I Icolegas podiam opor o senso cumum e a r~:,III( ,I( c l as Cpll Cllllil'.
que irrompiam em Londres, ex~~tamente ne.ssa alt~ra: Mas o ala~mc
dos especialistas era bem JUstifIcado; a lei. cO,nst,lt~la um pn~eJro
pn"o pnra IInHl profllnda mlld:lnç:l d:lS 1rlstllul~oes, que nnn ,e
queda ria por certo 110<; limites fixados pe,tos legislado I ';'1, (~~ I K,IH
. (. ' As Boards locais começaram a funcionar, com lentldao e, di-
ficuldade: na primeira fase úe aplicação da 1<:1 foi pelo cor]! r;trl')
decisiva a acção da General Soard of Heallh (composta por dOI'>
emillelltes pulíticos, lord Shaftcsbury c lord Mor~)"ct, e por dOI"
técnicos de higiene, Chadwick e Southwood Srlllth), que actuoLl
durante dez anos entre contínuas controvérsias até ser anollda elfl
1R'iR, selldo a~ qlns competêncin<; tr:ln<;ferid:l<; par:l n Cnn<;(~lhn Pri-
vado; Ileste pedlHlo cOII'l'gllill <:1 illl IX.! IlOII"" 11"'l1i'; (', ',,(/"1 '11""
vaI', em 1851, a primeira lei sobre a construção subSllJlaLla, aper-
feiçoada posteriormente em 1868 e 1875, M<ls o curso da legl;-
lacào sanitária inglesa era doravante irreversí\'e!: os passos seguIntes
fo~am a criar,:íio ;Ia I,ocal (Jovelll1l1CIlI Iloard ("OI!1 illri\di~';i" '1'1<'1
sobre sanidade quer subre a assislência aos pobres!. e a ~'ULI kl
sanitária de 1875, até à unificação das leis sobre a conslruçao suh)J-
diada e sobre sanidade pelo Housing of the Working Classes Act,
'io.: 1 ~,)(),
'"' EII1 (:ralll,:a, as Clll1sequél1clas da il1t1u,lllidlla~a", L, ti" 1111",
. ,\": ,r <.-,. , nismo manifestaram-se mais tarde, mas as conJiçi)es IJIglenlcas (L1s
'~, "\, ,.0-, i {grandes cidades e do', aglonteradtl~ indlJ',Ifl;II', u;,rrJ UfI I~li) I;,"
_ '\ r'r· ' nl;Hmante~ como as venflcadas em Inglaterra, ,
[111 1l:\4U, l;régier, um [unClIJl1anIJ da pre!l:111llil ti" Selld.
formulou um plano de construç')cs púhlic;lS para as cla<;<;es meno<;
abastadas"", Nu mesmu ano aparece o primclru inljuérll" JOCUfIlLfI'
1;ltI" ,ohrr ns ct>lIdilJlrs ,k \'idn tll1S n!wr;üi,,·'. tln nllLori" til' "d,
Iernlt;~.", Mas durallte il IIIUllill quia de JulllLJ, iI "IUd,clt> tle 1I111"CI
I' (l~' I
I -
c"t' :1
. 1",('1,., ',11
'.•..e..:. ,.("
,r-. ':
( ~,,',.,' .•...
r \ '.
<11 J, lI. CI.AI'II/\1\1. "I', 111., p, 5-15; cI 1\ lU SSI I I, 1/'11'''''' "<I,
{deia, d" S,;culo XIX (19.1-1)
'I~ Der C{UI'íf.:'i {)af1lt":"'U'J", di: lu /}()fJUlflI1tlll dOI/. 1,,; r;r(Jn,j"7 ~'I!!'"
ec dn ,1,,("'-"/1, de /('1' R/~/1dre .\feil/etlrn. Paris í ,~-1f),
t I' '/11 I I "~/f' 1"111",,,, ,I,' '"('u, "//\,.1'1/11' ,,{ 1\("'1f1 ,t·
(}tI,'nc·"'. 1',lrlS IH,lU,
ORIGINAL
Figura 34: I3irmingham, a construçáo by lali! nas zonas concêntricas da cidade,
que ilustram a evolução dos regulamentos sobre a construção a partir de
mearJ0' alé final rir, ,écul" XIX ('e~1Jnrlr, r. lIJfJRNS, T"wn IJI/llrlinf(
in /I i.l/or y).
Figura 35: O~ tipos de construção mai, comuns n;" três 7onas: casas com
Ir~~ pil;(n 1r."II,) ai, IJld" Irq -:"''1il,'li, f:,t;;I'; '"'1111 d/II\\ pi~lI': , f'''I (li ':.I"'J'I'."·;
iflLOI puradt):'); CH:').t') I...IJlII Jitldllll illlt.\lJ hegullL!t) 111()'t~:)J.
ORIGINAL
---li".iiiiiiii iR
•••mm~ !!
iiiiiiii-
Figura 36: Conslrução em conformidade com o Public Heallh Act de 1875
(em C. BA UER, Modern Nou linl( J. As prescriçôcs elos primeiros regulamentos
prediais sobre a altura, os t1istanciarnentos, etc., interpretados fl letra pelos
construtores de modo a obterem a máxima densidade permitida, lornaram
a construção das novas periferias uniforme e obsessiva. Enquanlo dura a
vaga especulaliva que deu origem aos primeiros jerry buildings, os regula-
mentos não têm valor resolulivo; ~eria nccessário diFcrenciar as prescriçôes
de local para I<>cal, ist<> é, Iil;ar IlS rCl;lIlalllCnlo'l a um plan<> aulêlltic<> e
concreto.
" turbado domínio da burguesia liberal não permitiu que se tomassem
, . quaisquer providências eFicazes para limitar o exercício da proprie-
, dade predial e fundiária; a polémíca contra os alojamentos írlsa-
" ' (( fubres Foi por isso levada por diante pelas duas principais correntes
(' :," . de opo<;ição: os católicos e os socialistas.
I'o"'" Em IR42, a Ordem de S. Vicente de Paula encarregou ulIla
comissão de estudar as condiçõl:s higiénicas dos alojamentos ope-
rários de lille. Em 1845, a Société d'Economie Charitable começou
a publicar os «Annales de Ia Charité», onde aparecem vários es-
y. critos sohre o problema do saneamento dos bairros operários;";
,í o animador principal destas iniciativas é o conde Armand de
.\;/ l'vIelun, que foi a seguir um dos promotores da primeira lei urba-
....;,... ,,,,nística, durante a segunda República.~,--,
,-.rI, '
fI"
>' ';'.)' '0 M me de CARON, Du LogemeJIl du I'auvre el de l'Ouvrier, 1845,
)' IjJi pp. 393-402; H. ROMAIN, Des Clanes Oum'éres, 1847, pp. 747·762.
,(
[.r'·
\:",1/' !
r'
Os socialistas tmlJlIlhallllll 110 IIIC;:SIIIUseltlidll, c;: as dCSCIlt.;i\O
magoadas dos «Annales de Ia Charité» encontram-se pontualmente
no relatório de Blanqui sobre as condições da classe operária fran-
cesa em 1848". Os socialistas viam o prohlema de modo mais dou-
trinal, esperando que uma nova organização econúmica resulvesse
globalmente o problema dos alojamentos juntamente com os outros
problemas sociais; por isso, O~ cat61icos, propensos li cOl\)idtrartlll
as questões p0r partes, foram os mais decididos promotores das
rdOrlllll'1 ti dlll 11Í'il iCII'l.
No breve período de vida da segunda República, os estudus
e as propostas elanor;]d;]'i no, dnis dccénins preccdcnl';, rivn;lln
concretização numa lei precisamente por mérito de Armand de
rvrellln e do irmiio AII:lfok, q1le em I!H') :lprc';cIII,," 11111:11""1',,',1:1
à Assembleia Nacional.
;\ proposta Melun passoIISlICC'i\ivarnente pelo crivo de ullla
comissão parlamentar presidida por labordere, e de uma comissão
III1~ilillr dll A';';("11Ihlrill pl(""ididll 1'''1 Hillll(,("Y-, ("';11', 11., IrI'II,,""
oFicial, apresentou a lei com cautela mas com firllléla. cuntra
os previsíveis ataques da oposição: I(A matéria é delicada r J,
o livre uso, a livre disponibilidade dos bens pertencentes ao cidadão
exigem o resreitn mais ri,gornsn, rnis siio as hases primordiais tI;1
ordem sucia!J>. Toúavia, elll 1111111l:ruSOScasos «() dilTilu c;: u i,IICICY>C
privado devem ceder perante o interessepúhlico». e exi'>tem já
diversas limitações deste género ao direito de propriedade: é proi-
hido vender alimentos estragados, Faler navegar 11m" ernhMc;I~'iill
<:111I1lall estado. FSlil'. proil,it.;,·,c'; lI;ío clII I aqtll'ccllI " I" IIILI"I" de
propriedade, mas al1tes o salvaguardam: «Nada justifica melhor a
propriedade do qlJe a prr'lpria ;IIJI1l,ir!;Hk (1:J ),;;, Ijl/l; I"~; r';~',1:r
e sanciona o exercíciOll;2.
A lei foi atacada lia época pel1l'> li\'CI"is dc 11I1cl\. Lidcmolc'>
dos «direitos do homem)), e pelo'> socialista'>, jú de,i1udido'i pelo
Fa"l~nço do~ ulelíen fw,ílJnuux e Jesconliados de 4ual4un medida
parCial de reforma.
1~llIlc os pllllc·,tll'> IlIai'> sigllilIC:;lil\o\, ICClll,LI-\C ill/lIl lIlIl <1/111>"
na «Revue des Deux Mondes» escrito pelo ex-'>ainHiJTJoniano i\li-
chel ChcvaJiern e um outro no jornal sociali'ita ala VOIX du P::uple,.,
" 1. A. BLANQUI. Ues ClaJl'eJ Uurrii:res en f'rance pendafll /'.~nnt'e
1848, Paris 1849 .
n Cit. in J. HUGUENEY, L'n Cenlenaire Oublté.· Ia Premiere Lai
Frflnçn;H' d'{Irh""; .•,,J'", 11 ri,' /1 vril 18')1}, in fI'.a Vir' Irhair ••·" 1')<;fl p 7 lfl
() felal.'JI,q é ft'fH11lltllldlJ 111 ••Afllllt1t·" de LI (Il.lllle"". I/H'J, 1'11 1.'·,/1,.
que antevia a sorte da~ famílias operarIas expulsas dos alojamentos
insalubres e sem poderem arranjar outros melhores, acima das suas
possibilidades, e por isso reduzidas a «procurarem um outro abrigo
que ainda tenha escapado à polícia, ou então a dormir ao ar
livre»".
Durante o debate foram apresentadas e rejeitadas algumas J
emendas de notável interesse: uma de Roussel, para alargar a bair-
ros inteiros oS trabalhos de saneamento previstos, e uma de Wo-
lowski, para tornar as administrações comunais aptas a construir
novos alojamentos, em substituição uos velhos uemolidos.
Uma última epidemia de cólera, em 1849, foi provavelmente
o motivo determinante para que a lei fosse aprovada a 13 de Abril
de 1850. O seu conteúdo é mais restrito do que o da lei inglesa,
limitando-se a disciplinar as características uos alojamentos ue alu-
guer e confiando a execução da lei a serviços comunais, não assis-
tidos por um órgão central coordenador e dinamizador.
O art. I estabelece: ((Em todas as comunas onde o Conselho
Municipal o julgue necessário, nornear-se-á urna Comissão encar-
regada de investigar e indicar as medidas indispensáveis ao arranjo
dos alojamentos e dependências insalubres alugadas ou ocupadas
por pessoa distinta do proprietário, do usufrutuário ou do utente».
O art. 2 regulamenta a composição da Comissão, que deve com-
preender um arquitecto e um médico, não necessariamente resi-
dentes na comuna. Os artigos seguintes diferenciam as causas da
insalubridade: se é devida ao proprietário, este é obrigado a exe-
cutar ()~ trahalhos nece~súrios para a eiimin;)r, ';llh pena de indemni·
zações que podem atingir o dobro da importância dos trabalhos.
O art. 13, finalmente, determina: «Quando a insalubridade resulta
de causas externas e permanentes, e quando estas causas não se " I'
podem remover sem trabalhos de conjunto, a Comuna pode aduuirir,
dLaçQLdo com as normas e modalidades da lei de 3 de Abril de
1841, a totalidade das propriedatles compreenditlas no perímetro
dQL!.rllQª!t)0.s»7$. -
N.este artigo reside toda a ifllporlilncia da lei. DifercnlcfJlcnlc
do que acontecia em Inglater~a, em França exi~tia u.ma I~gislação
eficiel1.te sobre a expropriação, baseatla na lei de 1841. -
Estas disposições, pensadas para as obras -públicas, podem
agora ser aplicadas ao saneamento dos bairros de habitação. ~ esta
7' 7 de Março de IR50; d. a re~p()<;la de A. de Melun nas actas
parlamenlare1 cila<!a1 pele) .MIlllilclJr.
" 1. HCGUENEY, op. cil., p. 246.
lei que servirá a Haussmann para realizar a transformação radical
da Paris nos vinte anos seguintes, uproveitullllo-se ue UIllU I:IIlt:nua
de 23 de Maio de 1852, que permite a expropriação não apenas
através de uma lei, mas também de uma deliberação do poder
executivo.

Continue navegando