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AS RAZOES DA TOLERANCIA

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RESUMO
BOBBIO, Norberto. As razões da tolerância. In: BOBBIO, N. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p.203-217.
Demetrius Gonzaga Kuibida
Curso de Direito Univag 2018/2AN
O autor vincula a palavra tolerância com o contexto em que é aplicada e são as razões da mesma é que se propõe a analisar. Atribui ao sintagma um valor histórico antes de semântico. Neste sentido, aponta o convívio de crenças (primeiro religiosas e depois políticas) diversas, intensificando este aspecto pela generalização para o problema da convivência das minorias étnicas, linguísticas, raciais, para os que são chamados comumente de “diferentes” como por exemplo os “homossexuais” os loucos e ou deficientes. Para tanto, isto implica em análise de discurso em que a verdade transpareça, até mesmo pela contraposição da teoria e da prática. Inclui-se ainda a diversidade por fatores sociais ou físicos, primeiramente o preconceito e conseqüente discriminação. Preconceito era até margem do cabível mas não a discriminação. Preconceito deriva da convicção de possuir a verdade e discriminação igualmente do preconceito entendido como uma opinião ou conjunto de opiniões que são acolhidas de modo acrílico passivo pela tradição, pelo costume ou por uma autoridade cujos ditames são aceitos sem discussão. É difícil convencer alguém a ir com frequencia a mesma igreja, a comungar com as ideias do mesmo partido, a conviver pacificamente com o negro, a não discriminar social e legalmente um homossexual, etc. Assim, o que deve ser combatido não é a intolerância, mas a discriminação, seja ela racial, sexual, étnica, etc. Historicamente a tolerância foi colocada na Europa durante o período de guerras de religião, pelo movimento dos heréticos, pelos filósofos como Locke e Voltaire e principalmente por Joseph Lecler, numa obra de dois volumes, 1954)., no instante. em que ocorre a ruptura do universo cristão 
Visto que tolerante é aquele que aceita a presença do intolerante sendo que o último se defende no sentido de que há sempre uma determinada verdade pela qual vale a pena lutar. Luigi Luzzati, autor de “La libertà di conscienza e di scienza”, 1909, como princípio inspirador do Estado liberal, por um lado e por outro Benedetto Croce, que declarou ser a tolerância “... a fórmula prática e contingente e não princípio universal, não podendo ser usada como critério para julgar a própria história, a qual no caso, tem critérios que lhe são intrínsecos, replicou que, entre os tolerantes, nem sempre estiveram os espíritos mais nobres e heróicos”. Sintetizando, não se pode ser intolerante sem ser fanático, pois que a antítese tolerante-intolerante não é compatível com a de indiferença-fanatismo.
De que maneira temos que compreender tolerância? Como mal menor ou como mal necessário? Em verdade ela não implica em abdicação à própria convicção firme, mas sim na opinião, sendo que a verdade tem tudo a ganhar quando suporta o erro alheio. Cabe esclarecer entre o cético aquele que para quem não importa que a fé triunfe, o tolerante como aquele que dá importância ao triunfo de uma verdade, sendo seu fim o de combater o erro, que seria melhor atingido do que pela intolerância. Aceitar o erro alheio pode ser um ato de inteligência, porque a perseguição causa escândalo e este faz crescer a mancha, a qual ao contrário, deve ser mantida o mais possível oculta. Se persigo alguém, atribuo a eles o direito de ser perseguido. Hoje é você, amanhã sou eu.
Há uma concepção do homem como capaz de seguir não só os próprios interesses mas olhar para o interesse do outro, e a recusa da violência como forma de solucionar os seus próprios problemas. Lembra-se o exemplo da ilha da Utopia, onde Utopo explica suas razões, pois que impossível seria [ . . . ] que aquilo que tu crês apareça como verdadeiro para todos. Lembra o autor, o dito de John Locke: [. . . ]a verdade não precisa da violência para ser ouvida pelo espírito dos homens e não se pode ensiná-la pela boca da lei. Mas a verdade, se não é captada pelo intelecto com sua luz, não poderá triunfar com a força externa. Uma das mais importantes formas de se obter resultados é trocar a força pela persuasão como meio de resolução de conflitos. O discurso da “nouvelle rhethorique” é bem próprio para demonstar a sua inserção entre a argumentação retórica e o método democrático, na prática.
O passo seguinte é o conhecimento da razão moral da tolerância. Ela não implica em abdicação da própria verdade. Refere-se de tudo que devo crer e aquilo que devo fazer. O Estado Liberal admite os direitos naturais como fundamento, sendo o Estado democrático uma extensão do primeiro. Chegar a verdade deve ser por convencimento íntima e não por coerção A tolerância está acima de tudo sendo posta como dever ético e não porque é socialmente útil ou politicamente eficaz. A exemplo do respeito que se deve ter pela liberdade do outro.
De seu ponto de vista, a verdade só pode ser alcançada através do choque das verdades parciais, pois que não é una. A verdade tem muitas faces. Neste sentido, colocam-se três posições filosóficas representativas desta exigência: o sincretismo de que foi expressão, na época das grandes polêmicas teológicas, o humanismo cristão, e modernamente a tentativa de conjugar catolicismo com marxismo, nas incoerências do mundo liberal e social, ocidental e oriental, capitalismo e coletivismo, historicismo relativista, como desejava Max Weber numa era de politeísmo de valores, onde o único templo aberto deveria ser o de Panteão, ou seja, onde cada qual pode adorar o seu próprio deus.
O termo intolerância é aplicado em diversos sentidos, e que na verdade tem dois conceitos específicos, um positivo e outro negativo. Em sentido positivo, tolerância se confronta a intolerância. E intolerância sinônimo de severidade, rigor, firmeza, qualidades que se inserem no âmbito das virtudes: tolerância em sentido negativo pode ser sinônimo de indulgência culposa, de condescendência com o mal, com o erro, por ausência de princípio, por amor a vida tranquila ou por cegueira diante dos valores. Para Locke o ateu não deveria ser tolerado porque não tinha nenhuma razão para temer a Deus. Tolerância em sentido positivo se opõe a intolerância (religiosa, política, racial) ou seja a saída do diferente. Ou a tolerância de forma negativa, quando resolve-se não piorar mais o estado crítico de determinado fato, ou aquele que escandaliza (ex. pedido de normatizar a pornografia). Importante notar aqui o conceito de variável ou seja, aceitar a existência de uma zona cinzenta, nem isto nem aquilo, cuja menor ou maior amplitude é variável: é sempre esta variável que se pode admitir qual sociedade é mais ou menos tolerante, ou mais ou menos intolerante.
É difícil estabelecer os limites a ser estabelecido. Marcuse bem faz a distinção entre ideias progressistas e reacionárias, dizendo que boa tolerância é aquela que tolera apenas as boas. Bobbio considera que a sociedade democrática destruiu as bases para uma tolerância universal. O que deseja efetivamente demonstrar é que esta posição é inaceitável, visto que se as más ideias puderem ser toleradas, logo, isto seria passar de uma forma de intolerância para outra. Trata-se pois de tipos de tolerância, ora repressiva ora emancipadora, que é exaltada
Não quer dizer pois que a tolerância deva ou seja limitada, porque não abraça todas as formas, incluindo algo e excluindo outro. O que se destaca, é uma regra de jogo que permita que todas as opiniões se manifestem e não a tolerância transformar-se em perseguição. Se não admitir um modus vivendi diversificado, acaba perdendo a razão de ser 
Locke defendia que os princípios de tolerância não deveriam ser estendidos ao católicos, e politicamente por exemplo, a negação do direito de cidadania aos comunistas e aos fascistas, e ainda das maiorias sobre as minorias opressoras ou oprimidas. E conclui afirmando que a única forma do intolerante tornar-se tolerante, não se daria pela opressão mas pelo direito de defender-se. Para tanto, Bobbio aduzdois exemplos iluminadores. Para Gaetano Mosca, a violência nada poderia contra a verdade e a liberdade, aceitando que a história dera mais razões aos intolerantes que aos tolerantes. Outra é a de Luigi Einaudi: Para se manterem vivas, os homens livres não podem renegarem-se a própria liberdade de que se professam seus defensores. 
Conclui seu trabalho dizendo que a história nos últimos séculos parece ambígua e neste momento é que mostra a interdependência entre a teoria e a prática da tolerância, por um lado e o espírito laico por outro que confia a sorte do regnum hominis, mas a razões da razão que une todos os homens do que aos impulsos da fé. Este fundamento está fundamentado, no princípio de que a liberdade de um começa onde termina a do outro, ou como queria Kant, “a liberdade do arbítrio de um pode subsistir com a liberdade de todos os outros segundo uma lei universal (que é a lei da razão).
Conclusão
Após as breves considerações formuladas ao longo deste tema, é possível constatar que a parte central da ideia de tolerância é a aceitação do igual direito de conviver, apesar das diferenças religiosas, étnicas ou raciais. Refere-se de pressuposto necessário para a consubstanciação da democracia.
Apenas através do respeito ao semelhante e da proteção das minorias é possível a formação de uma sociedade global pluralista, baseada na dignidade da pessoa humana. Sendo o homem um imperativo categórico, de modo algum deve ser usado como instrumento para a consecução de determinadas finalidades, já que ele constitui um fim em si mesmo.

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