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SABADELL, Ana Lúcia. Manual de Sociologia Jurídica. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. ESCOLAS JURÍDICAS Por “escola jurídica” entende-se um grupo de autores que compartem determinada visão sobre a função do direito, sobre os critérios de validade e as regras de interpretação das normas jurídicas e sobre os conteúdos que o direito deveria ter. Cada escola jurídica oferece uma resposta diferente a três questões: “o que é”, “como funciona” e “como deveria ser” configurado o direito. Essas escolas possuem relação direta com o período histórico e nos possibilitam compreender o surgimento da abordagem sociológica do Direito, que levou, posteriormente, à criação da Sociologia Jurídica. É possível classificar as escolas jurídicas em dois grandes grupos: moralistas e positivistas. Escolas moralistas do Direito (direito natural ou jusnaturalismo) O direito é pré-determinado por “leis” que condicionam a existência desse direito, não à dos códigos, mas sim os valores, princípios, obrigações e também à regras da própria natureza que influenciam a vida do homem na sociedade. A idéia é que o direito é pré-determinado por tais “leis”, que fazem parte do direito natural. Existem duas formas de conceber esse direito: O direito natural é algo dado, “inscrito na natureza das coisas” e independe do juízo que o homem possa ter sobre o mesmo. Ex: maternidade e mulher. O direito natural é um direito ideal, ou seja, conjunto de normas justas e corretas, que devem fazer parte do direito positivo, do direito criado pelos homens. Ex: todos os seres humanos nascem iguais e devem ser tratados enquanto tais. Na atualidade predomina essa segunda vertente. Jusnaturalismo grego Os gregos foram grandes filósofos do direito. A atividade legislativa era considerada uma parte necessária do governo da cidade. A prática do direito era compatível com uma determinada idéia de democracia. O sistema jurídico fundamentado sobre normas escritas era considerado uma decorrência da política e das particularidades de cada cidade da Grécia antiga. Os filósofos gregos desenvolviam muitas análises sobre o mundo, a sociedade e sua organização política e todas tinham uma base comum: que existe uma natureza muito bem organizada e que funciona segundo uma ordem, na qual são submetidos todos os seres. Trata-se de regras do direito natural que não estão escritas, mas que existem no mundo e que o homem acata. O fundamento do direito natural seria a justiça e a razão. As leis naturais impõem aos homens uma série de limites que condicionam sua vida [Ex: se o indivíduo não comer, morre (lei); ninguém pode estar em duas cidades no mesmo horário e dia (limite)]. O cosmos (universo) significa “mundo com regras”. No direito natural destacam-se dois momentos importantes: Constatação: o homem faz parte de um cosmos que impõe a todos regras e limites (poder da natureza); Aplicação: certos valores humanos são estáveis, permanentes e imutáveis, porque fazem parte do cosmos que possui seu próprio equilíbrio. Assim, quando há dúvida, conflito ou problema, a atitude a tomar é a de observar a situação, e desta surgirá, de modo natural, a resposta. Resumindo: o direito natural é entendido como um conjunto de princípios ou idéias superiores, imutáveis, estáveis e permanentes, sendo que a sua autoridade provém da natureza e não da vontade dos homens. Escola Medieval ou Teológica A idéia da existência de um direito natural atravessou toda a idade média, influenciando o surgimento de outras escolas, entre as quais a mais importante é a escola teológica. Existe duas cosmologias (explicações de mundo): - Cosmologia antiga: os homens são mortais e o mundo é imortal. A natureza com suas leis e limites impõe-se aos seres humanos (jusnaturalismo grego). - Cosmologia cristã (mais moderna): o homem é o “centro do mundo” porque é considerado imortal. Deus reserva ao homem um futuro infinito, pois após o Juízo Final, sua alma irá ao inferno ou paraíso, e o mundo será destruído. O direito natural fundamenta-se na vontade de Deus, sendo produto de sua decisão, que cria uma lei eterna para governar o universo. São leis que impõem ao homem determinadas condutas. Desta forma, o Deus cristão se propõe a regular a vida humana por meio do direito (Ex: as 12 tábuas de Moisés). Escola do Direito Natural e Racional A partir do século XVI até finais do século XVIII ocorre o desenvolvimento do jusnaturalismo racionalista. Considera-se que o direito constitui uma ordem pré-estabelecida, decorrente da natureza do homem e da sociedade. O uso da razão humana é o único meio adequado para descobrir os fundamentos da ordem jurídica natural. Nos séculos XVI e XVII ainda existia um vínculo com o pensamento religioso, mas houve avanços. Já próximo ao século XVIII predomina o uso da razão. A ciência jurídica torna-se laica. Nessa corrente destacam-se Grotius e Leibniz, que apresentam visões de base ainda teológica, e Kant, com visão de base iluminista. HUGO GROTIUS (1583-1645) Filósofo e jurista holandês. Fundador do jusnaturalismo moderno. Para ele, a verdadeira natureza dos homens é a razão. O natural é idêntico ao racional. O direito natural seria o resultado de uma dedução lógica e que possui validade universal, sendo que todos os seres humanos de todas as sociedades e épocas são dotados da mesma razão. O direito natural universal oferece o critério de justiça, por ser imutável e independente de uma vontade individual. GOTTFRIED WILHELM LEIBNIZ (1646-1716) Filósofo e matemático alemão. Acreditava que a sociedade era regulada por princípios do direito natural, que seria produto da “eterna razão” divina, a única capaz de estabelecer regras adequadas para o convívio em sociedade. As leis produzidas pelos homens (leis positivas) podem ser injustas. Deus existe e tudo depende da sua vontade. O homem é considerado um ser livre, mas instrumento de Deus, que deve contribuir para a construção do bem comum. Cada homem é senhor do seu destino e determina livremente seus atos. Iluminismo Jurídico Esse movimento atingiu todos os segmentos da vida do homem em sociedade e inclusive as ciências, tendo muitas repercussões no plano jurídico. O iluminismo criticava: a desigualdade diante da lei (sociedade estamental), a servidão existente, o absolutismo, a crueldade da justiça penal, as condições desumanas de vida, etc. A proposta era de renovação radical, guiada pela razão humana. O objetivo era alcançar a felicidade do homem. Um dos objetivos dos juristas ilustrados era a construção de um sistema jurídico que pudesse ser aplicado à toda sociedade. Foi nesse contexto que surgiu a idéia de constituição política, que até então ao existia. Esta foi a primeira etapa de codificação do direito. IMMANUEL KANT (1724-1804) Filósofo prussiano. O critério do “justo” é para Kant a essência do Direito, processo que é realizado pela razão humana. O direito deve garantir a liberdade geral, conciliando os interesses de todos os cidadãos. Uma tal configuração do direito só é possível em uma sociedade iluminada. Kant rejeita quatro argumentos de justificação de uma opinião ou decisão: Rejeição de qualquer argumento de autoridade; Rejeição de qualquer decisão tomada por uma maioria se ela não é baseada na razão humana (Ex: pena de morte) Rejeição da força Rejeição dos interesses e desejos pessoais como justificação da ação. A responsabilidade da convivência em sociedade pertence exclusivamente ao homem. Essa corrente chega a atualidade com pensadores como Jürgen Habermas e Robert Alexy, na Alemanha, e Ronald Dworkin, no espaço anglo-saxão. Essa corrente busca na interpretação do direito a solução “justa” para cada caso concreto, por meio do diálogo e da argumentação racional fundamentada em argumentos moralistas. Em conclusão, o jurista que se atém a esta linha trabalha com definições substanciais (ou materiais) do direito: direito é o que éjusto, correto, conforme os mandamentos da moral.
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