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AROLDO RODRIGUES - PSICOLOGIA SOCIAL: PROBLEMAS ATUAIS E PERSPECTIVAS PARA O FUTURO

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A psicologia social: 
problemas atuais e 
perspectivas para o futuro* 
1. Introdução 
AROLOO RODRIGUES" 
1. Introdução; 2. Psicologia, ciência e 
ftlosofia; 3. A relevância da psicologia; 
4. Urna experiência vivida da tendência 
à polarização e à rotulação em psico-
logia; 5. Desenvolvimento técnico-cien-
tífico e o papel da psicologia; 6. Con-
clusão. 
o método de autoridade - o chamado magister dixit - não desfruta de bom 
conceito entre ftlósofos e cientistas. Dentre as formas de atingir-se a verdade, o 
método de autoridade se inclui, segundo a maioria das pessoas, entre os mais 
precários. Não raro se constata que afirmações feitas por pessoas de prestígio 
resultam falsas. Não obstante, eu, pessoalmente, acho que o método da autori-
dade, embora logicamente falho, é psicologicamente compreensível. Se valori-
zamos uma pessoa, dela esperamos posições merecedoras de crédito dentro de sua 
área de competência. Trata-se daquilo que French e Raven (16) denominaram 
expert power, ou poder de conhecimento ou de perícia e que, sem dúvida, é 
exercido por pessoas reconhecidas corno peritas sobre aquelas que assim as 
• Conferência proferida a convite no XV Congresso Interamericano de Psicologia. Bogotá, 
Colômbia, 14 a 19 de dezembro de 1974. . 
•• Da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Departamento de Psicologia. 
Arq. bras. Psic. apL, Rio de Janeiro, 28 (1): 3-19, jan./mar. 1976 
percebem, dentro, é claro, da área de especialização das que exercem tal tipo de 
influência social. 
Baseada no método da autoridade, a psicologia social e, por que não dizer, a 
psicologia tout court, está em crise, como veremos a seguir. 
Em artigo recente, Lipsey (28) inicia a apresentação de sua pesquisa de 
levantamento junto a professores e estudantes pós-graduados de psicologia citando 
McGuire, Schultz, Palermo e Deese. Todos estes autores referem-se ao estado de 
crise da psicologia contemporânea. Lipsey faz questão de frisar que as citações com 
que inicia seu trabalho são apenas algumas ilustrações de um sem-número de 
afirmações semelhantes. De fato, se percorrermos os últimos volumes da revista 
American Psychologist, não teremos dificuldades em encontrar artigos reveladores 
da preocupação com os problemas que afligem a psicologia de nossos dias - e.g., 
Silverman (39); Brewster Smith (6); Rogers (33); Farberow (11); Dember (9); 
Lipsey (28). E o que dizer dos comentários de Sigmund Koch, o editor da reno-
mada série Psychology: A Study o[ a Science, que em seu artigo preparado para a 
revista Psychology Today diz, simplesmente, que "o esforço massivo de 100 anos 
para erigir uma disciplina dedicada ao estudo positivo do homem dificilmente 
pode ser contado como um triunfo"? 
No que diz respeito à psicologia social em particular, alguns trabalhos apare-
cidos nos últimos dois ou 'três anos me impressionaram particularmente. Brewster 
Smith (5), ao rever os primeiros cinco volumes da série editada por Leonard 
Berkowitz intitulada Advances in Experimental Social Psychology, indaga se a 
psicologia social está realmente avançando e cita uma carta a ele dirigida pelo 
próprio Berkowitz, na qual se lê: 
"O princípio que me tem guiado é o de romper com o establishment que, a 
meu ver, tem encarcerado a psicologia social nos últimos anos, e de apresentar 
toda a grande amplitude de tópicos que psicólogos sociais dentro e fora do 
establishment estão estudando. De qualquer forma, parece-me que a psicologia 
social está atualmente num "estado de crise", no sentido utilizado por Kuhn em 
seu livro The structure o[ scientific revolutions. Parece que estamos um tanto 
perdidos no que tange a problemas importantes a serem investigados e modelos a 
serem utilizados em nossa pesquisa e em nossa teoria. Não há dúvida de que é hora 
de fazer um balanço para ver onde estamos e para onde devemos ir." (p. 86.) 
Phillip Shaver (36), ao comentar o livro de avaliação crítica da psicologia 
social editado na Europa por Israel e Tajfel, assim intitula seus comentários: 
"Perspectivas européias sobre a crise na psicologia social". Shaver conclui sua 
apreciação da obra citada dizendo que nenhuma prova de adiantamento científico 
é ali aduzida e que uma psicologia apresentada apenas em bases de análise concei-
tual, sem prova empírica, é importante mas não suficiente. Em sua opinião, o livro 
não resolve a crise da psicologia social contemporânea. Gergen (18) considera a 
psicologia social não como ciência, mas como um conjunto de teorias que refletem 
determinado momento histórico, cambiáveis de acordo com as circunstâncias 
4 A.B.P.A. 1/76 
históricas prevalentes. Seu ponto de vista é violentamente combatido por 
Schenker (35), em seu artigo intitulado "Social psychology and science". 
Em que consiste, afmal, a crise da psicologia social de nossos dias? No meu 
entender, a crise aqui mencionada engloba, pelo menos, dois tipos de problemas: 
um deles nada mais é que a continuação daquilo que já se pode chamar de 
tradicional em psicologia, ou seja, o choque das posições antagônicas; o outro, 
embora não totalmente desvinculado do primeiro, decorre de características sui 
generis da época em que vivemos, singularizada pelo espetacular avanço técnico-
científico das ciências da natureza e pela conscientização dos problemas sociais 
possibilitada por este mesmo avanço. Ambos os tipos de problemas requerem 
major explicitação mas, antes de fazê-lo, permitam-me que, para não ficar apenas 
no método da autoridade, lhes apresente algumas-provas concretas da crise por que 
passa a psicologia em nossos dias. 
Uma das perguntas constantes do q1,lestionário enviado 'a professores e 
estudantes pós-graduados de psicologia por Lipsey (28) foi a seguinte: "Em sua 
opinião, qúal é OI problema mais importante a desafiar a psicologia nos dias de 
hoje? " Dos que responderam ao questionário, 73% dividiram-se por três tipos de 
: problemas considerados cruciais para a psicologia contemporânea e assim grupados 
pelo autor da pesquisa: 1. Relevância social. 2. Pesquisa e teoria. 3. Terapia e 
humanismo. A diversidade dos pontos de vista e o extremismo das posições reve-
lados em perguntas subseqüentes, evidenciaram que a amostra de psicólogos entre-
vistados consideram como o problema mais importante a ser enfrentado pela 
psicologia contemporânea tópicos bastante diversos e, até mesmo, apostos diame-
tralmente. A constatação de tendências bem distintas verificadas nesta pesquisa 
constitui, a meu ver, uma demonstração da problemática com que se debate a 
psicologia de nossos dias. Não nego que houve épocas em que muitos fatores 
seriam necessários para explicar a variância das posições assumidas pelos psicó-
logos; parece-me difícil negar porém que, pelo menos no âmbito da psicologia 
social, houve épocas de maior consenso no que diz respeito aos métodos, às 
fmalidades e ao enfoque geral dado aos problemas com que a disciplina se 
confronta. 
Curioso também é verificarmos em toda parte - nas revistas especializadas, 
nos departamentos de psicologia, nos interesses de estudantes e professores, no~ 
encontros e conferências nacionais e internacionais - a grande polarização de 
atitudes e valores dentre os que optaram por fazer da psicologia seu mister quoti-
diano. Consultem, por exemplo, os artigos de Carl Rogers (33 e 34) e os textos de 
Skinner (37 e 38), por exemplo; as posições conflitantes de Festinger e de 
Skinner; os pronunciamentos dos aficcionados da relevância social em psicologia, 
em detrimento de qualquer enfoque da pesquisa básica - Korten, Cook e La-
cey (26) -, e as posições contrárias - Silverman (39) -, ou intermediárias - Rodri-
gues (31 e 32), Varela (41) -, sem falar na já tradicional rivalidade entre os que 
valorizam a quantificação e os métodos atuários e os que veementemente se 
opõem a esta posição, rivalidade que remonta aos tempos de Sarbin e de AllportPsicologia socüzl 5 
na célebre questão do nomotético contra o ideográfico, e no não menos tradi-
cional antagonismo entre a posição dos behavioristas em geral e a dos psicanalistas, 
a dos cognitivistas e a dos humanistas. O próprio editor da série Psicologia: Um 
Estudo de uma Ciência, propõe agora que se substitua o nome psicologia por 
estudos psicológicos, e julga ser a psicologia incapaz de tomar-se uma verdadeira 
ciência. O resultado deste estado de coisas é, indubitavelmente, uma situação de 
verdadeiro caos na psicologia contemporânea. 
2. Psicologia, ciência e fIlosofia 
Parece-me que a totalidade dos psicólogos tende a considerar a psicologia uma 
ciência. Uma ciência passa por crises periodicamente, como é o caso das grandes 
transformações e mudanças de paradigmas verificados nas ciências naturais, tal 
como observa Kuhn (27). Por ocasião da mudança de paradigma, as ciências 
entram em crise. Em psicologia, porém, o que a mim particularmente me preo-
cupa, é o fato de esta ciência viver em crise, com efêmeros e raros momentos de 
relativa tranqüilidade. Tomemos, por exemplo, o caso da física. Esta ciência 
passou, sem dúvida, por crises de maior ou menor intensidade por ocasião das 
mudanças de paradigma: do pré-aristotélico para o aristotélico, deste para a física 
experimental de Galileu e, principalmente, de Newton, do modelo newtoniano 
para os acréscimos a ele feitos pela teoria da relatividade de Einstein e pela física 
quântica de Planck. Notam-se aí poucas mudanças de paradigmas em mais de 20 
séculos!· E a psicologia? Quase que poderíamos dizer que esta ciência - per-
doem-me a irreverência - muda de paradigma como se muda de roupa, ou talvez, 
que nenhum paradigma foi ainda prevalentemente aceito em psicologia. 
Uma das conseqüências desagradáveis desta crise da psicologia é o desvario 
que se verifica em certos departamentos, onde o sectarismo doutrinário domina 
inteiramente, impedindo a formação adequada dos alunos. Daí se segue o desvario 
profissional, com os psicólogos concentrando-se em uma única e tendenciosa 
faceta do spectrum psicológico e valorizando-o em detrimento de todas as demais. 
Cabe aqui uma pergunta: verifica-se esta enorme divergência de pontos de vista em 
fIlosofia? Sim, sem dúvida. Mas isto faz parte essencial da fIlosofia, que não é uma 
ciência empírica, mas sim um setor indispensável do conhecimento humano, 
encarregado de levantar problemas, sugerir metodologias, fiscalizar a coerência 
lógica das proposições teóricas das ciências, rever posições face a novas contin-
gências, procurar uma visão global do cosmos e do homem, enfim, incentivar o 
raciocínio e a busca da verdade e fiscalizar os que procuram, por diferentes 
caminhos, a descoberta da realidade. Em ciência, porém, a situação é bem diversa. 
Claro que não podemos prescindir da fIlosofia; mas igualmente claro é que não 
podemos fIlosofar constantemente em ciência. Uma ciência tem que apresentar 
certos princípios gerais, tem que ser capaz de fazer predições específicas, e tem 
que substanciar estas predições com provas empíricas. Que vez por outra o 
6 A.B.P.A. 1/76 
paradigma fundamental que serve de base à atividade teórica e experimental se 
modifique, nada há a objetar; mas que, num período continuado de tempo (não só 
nos de crise) cientistas estejam baseando suas atividades em premissas antagônicas, 
nos leva, inevitavelmente, a um estado de grave apreensão acerca do status desta 
"ciência" . 
Quando se defrontam um skinneariano e um rogeriano, um cientista de 
laboratório e um destinado à cura dos inúmeros males da sociedade contem-
porânea, um humanista e um experimentalista, um de orientação quantitativa e 
um de. orientação clínica dinâmica e globalista, e vários outros rótulos opostos, 
freqüentemente a divergência é chocante, entristecedora, prejudicial e, por que 
não dizer, incompatível com o pretendido estágio de ciência proclamado pela 
maioria dos psicólogos. Outro grave inconveniente deste estado de coisas é que os 
esforços dos psicólogos, por não se somarem, resultam em tentativas esparsas, 
muitas delas meritórias, mas de conseqüências menos abrangentes e profundas do 
que as resultantes dos esforços aditivos das ciências naturais de onde, a pouco e 
pouco, vai emergindo um produto resultante dos esforços de um com base nos de 
outros. Aí estão os prodígios da eletrônica, por exemplo, a deixar-nos realmente 
estupefatos. Os computadores de grande porte, os sofisticados aparelhos audio-
visuais, os computadores em miniatura, as façanhas espaciais. Tudo isto mostra 
claramente os resultados de uma atividade derivada de um somatório de esforços, 
oriundos de cientistas que se fundamentam em princípios científicos de compro-
vação clara e insofisrnável. 
Muito poderia alongar-me em tomo desse assunto. Limitações de tempo e de 
paciência dos ouvintes, todavia, compelem-me a passar para o ponto central desta 
palestra, ou seja, as características principais da crise dominante na psicologia 
social. 
3. A "relevância" da psicologia 
Como disse anteriormente, a história da psicologia é pródiga em exemplos de 
posições conflitivas. Ao estruturalismo de Titchener seguiram-se o funcionalismo 
de Dewey e Angell e o beh;aviorismo de Watson, os dois últimos, embora por 
razões diversas, diametralmente opostos à psicologia da estrutura elementarista da 
consciência de Titchener. Também opostos ao estruturalismo titcheneriano e ao 
behaviorismo watsoniano, o gestaltismo de Ehrenfells, Kobler, Koffka e Wer-
theimer, bem como a psicanálise de Freud, opuseram-se, cada um ,a seu modo, a 
estes sistemas dominantes no início do século XX, na psicologia chamada cien-
tífica. Daí por diante, parece-me que um período de relativa tranqüilidade teve 
lugar em psicologia, desaparecendo com Lewin a tendência aos grandes sistemas 
abrangentes, e o surgimento da tendência à elaboração de teorias nitidamente 
ancoradas em um ou outro dos sistemas anteriormente prevalentes, mas destinados 
a integrar um conjunto limitado de achados experimentais e a fazer predições 
Psicololda socüzl 7 
relativas a certos aspectos do comportamento humano, sob determinadas condi-
ções. Para ficarmos apenas no campo da psicologia social, citaremos como 
exemplo as teorias de Festinger, de 1950, 1954 e 1957, a de Hovland e seus 
colaboradores, de 1953. As teorias inspiradas por Fritz Heider - Newcomb (30), 
Jones e Davis (23), Kelley (24), Cartwright e Harary (8), Abelson (1) - e vários 
outros; o trabalho teórico de Deutsch (10) sobre cooperação e competição, a 
teoria de troca de Thibaut e Kelley (40) e de Homans (21) e outras com estas 
características. 
Neste período que, pessoalmente, considero de relativa tranqüilidade em 
psicologia social e que, no tempo, se estende de 1945 a 1965 aproximadamente, 
notamos uma predominância nítida da influência de Kurt Lewin e, no que tange 
especificamente à metodologia, uma aceitação mais ou menos tranqüila do 
método experimental de laboratório como o instrumento mais indicado para as 
incursões dos psicólogos sociais nos meandros da complexidade do comporta-
mento social humano. 
No fmal da década de 60, testemunhamos o aparecimento meteórico de 
forte oposição ao status quo em psicologia social. Trata-se do anseio por uma 
psicologia social relevante, isto significando uma psicologia social destinada à solu-
ção dos inúmeros e cada vez maiores problemas sociais do mundo contemporâneo. 
Vejamos 9s indicadores dessa revolução em direção à "relevância" e em oposição, 
velada por vezes e declarada por outras, aos trabalhos do cientista de laboratório, 
preocupado ainda em estabelecer relações de dependência entre variáveis sob as 
condições ideais de controle fornecidas pelo laboratório. 
Em abril de 1969, Donald Campbell publicou no American Psychologist o 
seu influente artigo intitulado Reform as experiments, no qual se vê,claramente, o 
anseio de colocar os conhecimentos da psicologia a serviço da solução dos proble-
mas sociais contemporâneos. Neste mesmo ano, o último número desta mesma 
revista publicou os discursos presidenciais de George Miller e Morton Deutsch, 
ambos dedicados à relevância social da psicologia e à necessidade de os psicólogos 
se conscientizarem da missão que têm a desempenhar na resolução dos problemas 
sociais de nossa época. 
Em 1970, uma publicação da American Psychological Association intitulada 
Psychology and the problems of society foi totalmente dedicada ao problema de 
relevância social da psicologia. Neste volume encontramos artigos, como o de 
Bemard Baurim, por exemplo, que asseveram ser imoral um trabalho de pesquisa 
cuja relevância social não seja inequívoca. 
Em 1971, Irvin Silverman declarou o seguinte: "Se a tendência dos anos 70 
continuar, esta era, nas ciências sociais e em outras mais, poderá ser denominada a 
idade da relevância." 
Em 1972, um grupo de psicólogos sociais europeus procurou apresentar uma 
análise crítica da disciplina, ressaltando, entre outros tópicos, "a relevância e 
significado dos resultados da ciência psicológica". 
8 A.B.P.A. 1/76 
Em 1973, Brewster Smith diz que "relevância" e "novas prioridades" 
tornaram-se clichês e, em seu artigo sobre a relevância da psicologia para novas 
prioridades, salienta muitas das partes aqui mencionadas anteriormente, quando 
procurei indicar.o pot-pourri de posições conflitivas na história da psicologia. 
Em 1974, Lipsey publica os resultados de sua pesquisa com professores e 
estudantes pós-graduados de psicologia, e mostra que relevância social foi o tema 
mais freqüentemente citado pelos entrevistados como constituindo um dos proble-
mas principais da psicologia de hoje. 
Vejamos os prós e os contras da ênfase na relevância social, bem como 
aquilo que, em minha opinião, deu ensejo a esta tendência nítida da psicologia 
social contemporânea e se constituiu num dos importantes pontos de discórdia 
entre os proftssionais. 
É difícil negar-se a importância de orientar o trabalho do psicólogo para a 
promoção do bem-estar humano e 'solução dos problemas que afligem a sociedade 
em que vivemos. Parece-me que quanto à importância e necessidade de o psicólogo 
assim proceder há quase unanimidade de opiniões. A controvérsia surge quando se 
defende a relevância social do trabalho do psicólogo em. detrlmento de qualquer 
outra atividade que não seja direta e inequivocamente relacionada com a solução 
dos problemas sociais. Como disse anteriormente, alguns, como Baurim (4), por 
exemplo, consideram imoral qualquer atividade científtca que não tenha direta 
implicação social. Neste ponto parece-me que entramos na esfera do extremismo, 
do radicalismo, de intransigência, do exagero, da polarização de posições, enftm, 
da atitude não-científtca. Silverman (39), num artigo intitulado "Crise em psico-
logia social: a relevância da relevância", salienta que o fato de a psicologia social 
sentir-se, não raro, impotente para lidar com os problemas que nos afligem atual-
mente, não decorre da negligência dos psicólogos sociais em estudarem tópicos 
socialmente relevantes; de fato, se consultamos os livros e revistas sobre a disci-
plina veriftcamos que "aflição, agressão, atitudes e mudanças de atitudé, comuni-
cação, competição, conformismo, tomada de decisão, dinâmica de grupo, forma-
ção de impressão, relações grupais, liderança, negociação, persuasão, preconceito, 
poder social, socialização", aos quais poderíamos ainda acrescentar atração inter-
pessoal, relações internacionais, conflitos, altruísmo etc., são tópicos obviamente 
relevantes aos problemas sociais da atualidade e que têm merecido intenso estudo 
por parte dos especialistas. Se respostas adequadas à solução dos problemas sociais 
de nossa época não foram totalmente encontradas, não se pode atribuir esta falha 
à falta de interesse por tais tópicos mas, provavelmente, à complexidade dos 
problemas e/ou à deftciência da metodologia utilizada. 
Quanto a esse último ponto, é conhecida a crítica feita à psicologia social 
experimental, baseada na impossibilidade de generalização dos achados obtidos na 
situação artiftcial do laboratório para os problemas concretos da vida real. Muito 
se tem dito sobre isso e não me parece valer a pena alongar-me sobre o assunto. 
Apenas gostaria de dizer, em consonância com o ponto aqui abordado, que 
segundo estatística recente - Fried, Gumper e Allen (17) -, as principais revistas 
Psicologia social 9 
especializadas de psicologia social continuam mostrando amplo domínio dos expe-
rimentos de laboratório sobre as outras modalidades de pesquisa em psicologia 
social, tais como experimento e estudos de campo e pesquisas de levantamento. A 
proposição de Campbell (7) a que já me referi parece alternativa promissora, de 
vez que combina o rigor da experimentação com a aplicabilidade dos achados e 
situações sociais concretas de vida real. Sua exeqüibilidade, porém, suscita apreen-
sões, pelo menos em certas estruturas socioculturais, além de ser difícil de ser 
posto em prática o tipo de experimentação proposto, tal como se vê, por exemplo, 
na experiência narrada por Goodwin (19). O fanatismo pela relevância social da 
atividade do pesquisador pode, freqüentemente, levar os investigadores sociais a 
misturar ciência com política, utilizando-se dos conhecimentos científicos que 
possuem para obter transformações sociais orientadas por ideologias desta ou 
daquela natureza. O extremismo de posições é, no caso, conseqüência pratica-
mente inevitável e nefasta. 
Um dos indicadores da crise de psicologia social contemporânea é, precisa-
mente, o dilema decorrente da enorme necessidade de intervenção social para a 
melhoria das relações e das condições humanas de um lado, e a tendência a 
buscar-se o rigor da metodologia experimental de laboratório, de outro. Na 
pesquisa de opinião efetuada por Lipsey (28), quatro tipos de psicólogos foram 
identificados: os preocupados com a relevância social de suas pesquisas e com a 
necessidade de experimentação; os preocupados com a relevância social, porém 
despreocupados com experimentação; os despreocupados com a relevância social 
de suas investigações e pró-experimentação e os despreocupados com a relevância 
social e contra a experimentação. Conforme o enquadramento de professores e 
estudantes nessas quatro categorias, determinados autores eram mais citados como 
produtores de trabalhos que mereciam maior respeito. Freud, Rogers, Skinner, 
Festinger, Allport, Piaget, Pavlov, George Miller, Neal Miller. Esses, Meehl e 
Gibson apareceram entre os mais citados, variando a indicação conforme o grupo 
em que se enquadravam os entrevistados de acordo com a classificação em cada 
uma das categorias derivadas dos fatores ortogonais identificados: preocupação 
com a relevância social e ausência desta preocupação; e a favor da experimentação 
e contra a experimentação. 
4. Uma experiência vivida da tendência à polarização e à rotulação em psico-
logia 
Olhando em retrospecto a minha própria atividade em psicologia, vejo com ciareza 
como os psicólogos estão habituados à polarização de posições e como suas 
percepções são influenciadas por seus preconceitos. Comecei minha atividade em 
psicologia como psicólogo clínico. Freqüentava hospitais psiquiátricos onde 
aplicava vários testes, principalmente projetivos, e passava horas a estudar as mani-
festações comportamentais das pessoas enquadradas nos vários síndromes clínicos 
10 A.B.P.A. 1/76 
existentes. Durante dois anos dei aulas de técnicas projetivas. Exerci, também, as 
funções de orientador vocacional, abandonando-as pela ansiedade que me trazia o 
fato de sentir que podia influir decisivamente no destino de um cliente baseado 
em técnicas e instrumentos que se me afiguravam precários. A partir desetembro 
de 1962, quando iniciei o meu curso de doutorado na Universidade da Califórnia, 
em Los Angeles, mudei significativamente de orientação e de interesse: dedi-
quei-me à psicologia social experimental e comecei a valorizar, cada vez mais, o 
método experimental em psicologia, bem como a reconhecer a importância da 
quantificação e a utilidade dos métodos estatísticos como auxiliares do trabalho 
de pesquisa básica do investigador. 
Lembro-me que minha formação humanista, fortemente influenciada pela 
psicologia cognitiva de Fritz Heider, com quem estudei no meu curso de mestrado, 
fez com que eu resistisse bastante ao pragmatismo e ao behaviorismo americanos. 
Penso, todavia, que esta sucessão de tipo de atividades e de influência rece-
bidas resultaram num ponto positivo: sempre evitei os extremismos em psicologia, 
procurando tirar de cada orientação básica aquilo que, a meu ver, ela possuía de 
contribuição concreta ao entendimento do comportamento humano e de suas 
motivações conscientes ou inconscientes. 
Regressando ao Brasil em 1966 voltei ao Departamento de Psicologia da 
PUC do Rio de Janeiro. Como professor e pesquisador, continuei pautando as 
minhas atividades numa visão polivalente da psicologia, com predominância da 
escola gestaltista e das teorias de Lewin e Heider, na valorização da pesquisa 
básica, na necessidade de aprimoramento das técnicas de medida e no reconheci-
mento da importância da quantificação dos fenômenos psicológicos. De 22 traba-
lhos de pesquisa por mim publicados nos últimos 10 anos, 14 são experimentos de 
laboratório sem direta relevância a um problema social específico; os outros oito 
apresentam aspectos aplicados e se referem a estereótipos, preconceitos, tipos de 
influência social etc. 
Curioso é confessar, dentro do contexto do tema central desta palestra, as 
minhas percepções das reações que se seguiram ao meu engajamento em tal tipo de 
atividade no Brasil. Apesar de ter tido inúmeros alunos de graduação e pós-
graduação, conto nos dedos os que mostraram simpatia por minha atividade 
teórico-experimental. Pelo que ouço aqui e ali, consegui despertar mais interesse 
pela psicologia social experimental através de meu livro-texto publicado em 1972 
e cuja quarta edição se encontra atualmente no prelo, do que em contato direto 
com meus alunos. Se fora só isto, concluir-se-ia, sem muito esforço, que sou um 
péssimo professor e, possivelmente, um escritor menos ruim. Acontece, porém, 
que meu entusiasmo pela pesquisa pura e pela quantificação em psicologia 
suscitou interessante fenômeno psicossocial. Principalmente na universidade onde 
ensino, mas também nos centros psicológicos da área geográfica circunvizinha, 
estereótipos os mais variados surgiram (e continuam surgindo) em relação às 
minhas posições psicológicas. Primeiramente foi amplamente difundido que eu era 
um anticlínico por excelência. Esse estereótipo teve seu componente cognitivo 
Psicologia social 11 
gravemente abalado em 1973, quando na qualidade de presidente da Associação 
Brasileira de Psicologia Aplicada, defendi com determinação e energia a frustrada 
tentativa de um pequeno grupo de psiquiatras no sentido de impedir o psicólogo 
clínico de fazer atendimento psicoterápico. Juntamente com o estereótipo de 
anticlínico, foi-me também atribuído o de contrário à psicologia aplicada. Minha 
estreita associação com Jacobo Varela, a quem fui apresentado por intermédio de 
Leon Festinger em 1968, ratificada por convites a ele por mim dirigidos para 
proferir conferências e núnistrar uma disciplina de pós-graduação no Departa-
mento de Psicologia onde trabalho, fez com que esse estereótipo também dinú-
nuísse de intensidade. Nos últimos anos tem vigorado entre razoável parte de 
alunos e mesmo entre alguns professores do departamento a que pertenço, a 
crença de que eu sou anti teórico, adversário incondicional da ftlosofia, um experi-
mentalista de orientação behaviorista e um inveterado manipulador de comporta-
mentos à la Skinner ... É óbvio que essas pessoas jamais leram qualquer coisa que 
eu tenha escrito, onde facilmente ressaltam, dentro da tônica de aproveitamento 
do que cada corrente tem de bom, claras inclinações por uma psicologia cognitiva, 
e firme convicção na necessidade de teorias em psicologia e na importância da 
ftlosofia em qualquer atividade humana. 
Contei-lhes estes aspectos de núnha vida profissional e as percepções que 
tenho das respostas a núnha atividade, para ilustrar a tendência à polarização de 
posições e a rotulações que predonúnam em psicologia e que, a meu ver, constitui 
um dos principais obstáculos ao desenvolvimento desta ciência e, conseqüente-
mente, um dos maiores problemas da psicologia, social ou de outro tipo, e que 
embora não seja novo, mantém uma atualidade incrível. Notem que o objeto da 
polarização de atitudes varia um pouco através dos tempos, por exemplo: estru-
turalismo versus funcionalismo, e associacionismo versus globalismo, no fmal do 
século passado e princípios deste; psicologia dinâmica versus psicologia comporta-
mentista, em várias décadas deste século; posição ideográfica versus posição nomo-
tética de 40; enfoque clínico versus enfoque estatístico, prevalente durante os 
últimos 50 anos e magistralmente focalizado por Paul Meehl (29), em sua conhe-
cida obra Clinicai versus statistical prediction; skinnerianismo versus psicologia 
humanista e cognitiva, nas últimas décadas; pesquisa pura versus pesquisa aplicada, 
uma dicotomia que assoma renitelÍtemente de tempos em tempos, apesar da sábia 
posição de Kurt Lewin que tão bem conciliava esses dois aspectos de atividade do 
investigador; e, mais recentemente, relevância versus irrelevância. Nessa lista de 
dicotomias rivais, lista esta apenas exemplificativa e não exaustiva, ressalta com 
inquestionável clareza a tendência dos psicólogos e atitudes polarizadas. Qual será 
a causa e que fazer acerca disto? 
A polarização de atitudes em psicologia e suas maléficas conseqüências 
parece poder ser parcialmente explicada através da consideração do fenômeno 
social de distorção perceptiva. O estudo do processo de percepção social nos 
mostra que a intemalização do estímulo distante sofre a interferência de condi-
ções me9iadoras entre o estímulo distante e o estímulo próximo e de processos 
12 A.B.P.A. 1/76 
psicológicos (estereótipos, necessidades, interesses, tendenciosidades cognitivas, 
valores, atitudes, processos de atribuição etc.), entre o estímulo próximo e o 
percepto. Como já foi claramente demonstrado por Asch (3), um mesmo texto 
atribuído a autores diversos e sobre os quais o percebedor tem poSições distintas, 
influi marcadamente na interpretação atribuída ao texto percebido. O fenômeno é 
perfeitamente normal, compreensível e explicável. 
Sou de opinião, todavia, que os psicólogos deviam ser mais atentos aos 
ensinamentos oriundos dos estudos sobre percepção social a ftm de nos situarmos 
a cavaleiro das distorções a que somos naturalmente impelidos. Despir-se, pois, de 
qualquer preconceito e avaliar o dado em si mesmo, como recomendava Claude 
Bernard, é a atitude que se impõe. 
Penso também que a psicologia já atingiu estágio suftciente de desenvolvi-
mento para poder passar a somar os conhecimentos adquiridos, aproveitando o 
que há de inquestionavelmente verdadeiro nas várias posições em litígio. O traba-
lho de Varela (41) constitui, a meu ver, excelente ponto de partida para essa 
síntese integradora. Ao propor uma tecnologia social capaz de transformar as 
descobertas de pesquisas puras e aplicadas em produtos socialmente úteis, Varela 
se mostra totalmente despido de preconceitos teóricos e doutrinários, e se baseia 
nos resultados evidenciados pelos investigadores e nos sucessos e fracassos de sua 
integração dos resultados para a obtenção de fms específtcos. Pode-se dizer que 
Varela se adiantou a Campbell, sebem que este salienta mais os aspectos formais 
de experimentação, ao propor a realização de reformas como experimento. 
Acho ainda que o estudo da história das outras ciências nos ensina que, 
enquanto não se pode demonstrar algo experimentalmente, posições divergentes 
surgem em profusão e depois se tornam anacrônicas. Enquanto estivermos (ou se 
sempre tivermos que permanecer) num estágio pré-experimental como estão vários 
campos da psicologia, pelo menos devemos ser menos radicais em nossas posições. 
5. Desenvolvi~to técnico-científico e o papel da psicologia 
Finalmente, mister se faz ressaltar outro aspecto dominante na realidade de nossos 
dias, em minha opinião, parcialmente responsável pela crise da psicologia e direta-
mente ligado ao problema da relevância das pesquisas em psicologia social. O 
desenvolvimento espetacular das ciências naturais e de tecnologia não-social, ao 
mesmo tempo que trouxe enormes benefícios à humanidade, criou também pro-
blemas sociais sérios. A televisão, por exemplo, juntamente com os demais meios 
de comunicação de massa, tornaram o mundo uma aldeia global, como disse 
McLuhan. Participamos de tudo o que nela acontece. O assédio de informações, 
gratiftcante sob muitos aspectos, traz inevitavelmente conseqüências psicológicas 
nem sempre benéftcas. E o que dizer-se dos aviões a jato, que nos permitem mudar 
rapidamente de ambientes e fusos horários, exigindo um esforço adaptativo psico-
fISiológico severo? E os Jumbos, transportando 400 passageiros com grande 
hicologia social 13 
conforto, mas gerando um pandemônio nos períodos pré e pós-embarque? E 
assim por diante. Ninguém terá dificuldades em verificar as vantagens do adianta-
mento técnico-científico e também em apontar os subprodutos negativos deste 
adiantamento, repercutindo estes últimos de forma nítida na capacidade adapta-
tiva da pessoa. 
A psicologia social, entre outros setores das ciências sociais, é solicitada a 
apresentar soluções aos problemas indiretamente decorrentes do progresso 
técnico-científico, do aumento populacional, das migrações internas para as 
grandes cidades, e das tensões inevitáveis que o mundo que construímos provoca 
na maioria de nós, principalmente, por paradoxal que pareça, nas regiões mais 
civilizadas. A impotência da psicologia (ou dos psicólogos ... ) em apresentar 
soluções a inúmeros problemas que nos afligem quotidianamente, conduz o setor a 
desenfreada busca de relevância social; além disso, a magnitude dos problemas e a 
insistência com que a psicologia é solicitada a propor soluções para os mesmos faz 
com que um estado de crise momentânea seja inevitável. 
Acredito que gradualmente superaremos a crise. Elliot Aronson (2), numa 
obra magistral de clareza, precisão, moderação e competência - The social animal 
- apresenta, entre outras, as seguintes razões por ter escrito o livro: "A finalidade 
deste volume é a de apresentar, sem constrangimento (mas com alguma hesitação) 
a relevância que a pesquisa em psicologia social pode ter para alguns dos proble-
mas que aturdem a sociedade contemporânea. A maioria dos dados discutidos 
neste volume são baseados em exprimentos; a maior parte das ilustrações e 
exemplos, todavia, derivam de problemas sociais atuais - neles se incluindo 
preconceito, propaganda, guerra, alienação, agressão, insatisfação e revoltas 
. políticas. Esta dualidade, continua Aronson, "reflete duas de minhas tenden-
ciosidades - tendenciosidades estas que eu prezo. A primeira é a de que' o método 
experimental é a melhor maneira de compreender-se um fenômeno complexo. É 
um ponto incontroverso em ciência que o único meio de se compreender de fato o 
mundo é o de reconstruí-lo, isto é, a fim de entender realmente o que causa o quê, 
devemos fazer mais do que simplesmente observar; mais do que isto, devemos ser 
responsaveis por produzir o primeiro 'o quê' de forma a podermos estar seguros de 
que ele realmente causou o segundo 'o quê'. Minha segunda tendenciosidade é que 
a única forma de nos certificarmos se as relações causais descobertas nos experi-
mentos são válidas é trazê-las para fora do laboratório e inseri-las no mundo real. 
Assim, -como cientista, eu gosto de trabalhar no laboratório; como cidadão, entre-
tanto, eu gosto de ter janelas pelas quais eu possa observar o mundo. Janelas, 
naturalmente, funcionam em ambas as direções: freqüentemente derivamos hipó-
teses de observação da vida quotidiana. A melhor maneira de testá-las é sob as 
condições estéreis do laboratório; e, a fim de evitar que nossas idéias se tornem 
estéreis, nós tentamos levar os nossos achados de laboratório de volta pela mesma 
janela, a fim de verificar se eles se mantêm na situação da vida real. 
Implícito em tud'o isto, continua ainda Aronson, "está a minha crença de 
que a psicologia social é extremamente importante, de que os psicólogos sociais 
14 A.B.P.A. 1/76 
podem desempenhar um papel crucial na tentiva de tomar este mundo um lugar 
melhor para se viver. De fato, nos meus momentos de maior entusiasmo, eu 
entretenho uma convicção secreta de que os psicólogos sociais estão numa 
condição singular no sentido de produzir um impacto profundo e benéfico em 
nossas vidas, através do fornecimento de uma crescente compreensão de fenô-
menos importantes tais como conformismo, persuasão, preconceito, amor e 
agressão." (p. xü e xili). 
Também outro grande psicólogo social contemporâneo, Jacobo, Varela, 
encara com otimismo o futuro das ciências sociais, propondo o que denominou 
de tecnologia social. Para mim, a grande atratividade da posição de Varela é que 
ela concilia a dicotomia ciência pura versus ciência aplicada e o problema da 
relevância versus irrelevância. Para Varela, todas as descobertas da verdade são 
relevantes, e cabe ao tecnólogo social organizá-las e aplicá-las de forma que surja 
um produto de utilidade social. Inúmeros são os exemplos por ele apresentados 
de sucesso da tecnologia social em seu livro Psychological solutions to social 
problems. Aliás, o conhecimento do trabalho desenvolvido por Varela, quando 
fui a ele apresentado por Leon Festinger, que de há muito conhecia e valorizava 
sua atividade de psicólogo social aplicado no Uruguay, constituiu um dos 
eventos mais importantes de minha atividade profissional. Lembro-me que 
estava, na época, ainda sob o forte impacto da frustração da pouca ressonância 
que tinha meu enfoque valorizador da pesquisa pura em psicologia junto a meus 
estudantes e a meus colegas. Eu reconhecia que minhas investigações não 
tinham relevância social direta - não resolviam o problema dos favelados da 
cidade do Rio de Janeiro, não diminuíam a agressão e a violência das grandes 
cidades, não afetavam os preconceitos raciais, religiosos etc. - enfim, não 
faziam a sociedade tomar-se melhor. Faltou-me o gênio criador de Jacobo 
Varela para verificar que estas pequenas descobertas poderiam ser engenhosa-
mente utilizadas pelo tecnólogo social. O meu encontro com esse homem de 
raro brilho intelectual e de genuína preocupação com a resolução dos problemas 
sociais, e o entendimento de sua fIlosofia de a5ão, foi para mim como que um 
verdadeiro grito de Arquimedes dentro de mim mesmo. Dali por diante, coloquei 
em ordem as minhas idéias no que concerne às dicotomias referidas. Por ter 
aprendido com Varela a superá-las, é que tão veementemente me insurjo contra 
a tentativa de tantos em perpetuar discussões e polarizações de atitudes total-
mente estéreis e prejudiciais. 
Acredito também que a psicologia social comunitária que, juntamente 
com outros setores das ciências sociais, concentra seus esforços no melhor 
ajuntamento do homem à comunidade onde vive, realiza esta integração leviana 
e vareliana de ciência pura e ciência aplicada. Parece-me que esse setor irá, 
progressivamente, capturando o interesse dos psicólogos sociais no futuro, ao 
mesmo tempo em queserão incrementadas as pesquisas e trabalhos de campo 
interdisciplinares, como o exige a natureza do objeto material desse setor da 
psicologia social. 
Psicologia social 15 
6. Conclusão 
ResullÚndo as principais idéias desenvolvidas nesta conferência, parece-me que os 
pontos centrais aqui ressaltados foram: 
1. A psicologia contemporânea está em crise; ela busca um certo consenso no 
que tange às suas prellÚssas filosóficas e à sua metodologia mais adequada. 
2. A história da psicologia é caracterizada pelas freqüentes dicotollÚas e pola-
rizações de atitudes, o que revela a imaturidade da ciência psicológica, buscando 
ainda, como a física, um Galileu e um Newton. 
3. Na psicologia social, a polarização mais recente e a mais discutida é a de 
relevância versus irrelevância de pesquisas sociais. 
4. Um exame introspectivo de minha própria vivência como psicólogo social 
revelou-me a tendência de muitos psicólogos e estudantes de psicologia a rotu-
larem seus colegas e professores de forma radical, confirmando a tendência "à 
polarização e isolamento em grupos fechados, ao invés de estimular a soma de 
esforços e a tentativa de conciliação de posições que deveria predominar entre os 
que exercem a mesma atividade e, pelo menos teoricamente, visam o mesmo fim. 
5. O fenômeno de percepção social deveria ser mais levado em conta pelos 
psicólogos a fim de tomarem consciência dos fatores que facilitam a deformação 
do estímulo distante, acarretando sua pequena correspondência à internalização 
mental do mesmo. 
6. O desenvolvimento técnico-científico trouxe concollÚtantes sociais preju-
diciais ao ajustamento social, exigindo da psicologia esforço no sentido de cola-
borar para a erradicação dos subprodutos nocivos ao avanço material. 
7. A tecnologia social proposta por Varela constitui-se num poderoso instru-
mento à disposição dos psicólogos, no sentido de ajudarem a promover o 
bem-estar humano. 
8. A psicologia social comunitária deverá merecer atenção crescente dos psicó-
logos, os quais procurarão contribuir para o ajustamento e crescimento da pessoa 
em sua comunidade, em trabalho conjunto com outros setores das ciências sociais. 
Diante de llÚnha percepção da problemática atual da psicologia e da psico-
logia social, dentro das limitações impostas por uma comunicação desta natureza, 
ouso especular que o restante da década de 70 e, muito provavelmente toda a 
década de 80, será caracterizado por uma busca séria, determinada e incessante de 
resolver os principais problemas epistemológicos que aturdem a psicologia de hoje. 
Juntamente com esse esforço, espero que a polarização de atitudes tenda a 
diminuir e que a atjvidade psicológica atinja um grau de maturidade que dificil-
mente se poderá generalizar à maioria dos psicólogos de hoje. Acho também que a 
16 A. B.P. A. 1/76 
orientação seguida por Lewin em sua atividade de pesquisa empírica amparada por 
teoria e dirigida à solução de problemas concretos voltará a constituir-se em 
modelo principal a orientar nossos trabalhos. Nessa linha de ação, a tecnologia 
social proposta por Varela e a psicologia social comunitária constituem-se em 
iniciativas das mais promissoras para a psicologia social do futuro. 
Acredito, todavia, que o método experimental em psicologia social atingiu 
tal grau de sofisticação e de reconhecimento pela maioria dos psicólogos que, a 
não ser que se verifique profundo corte epistemológico em psicologia num futuro 
próximo, esta forma de reconstruir a realidade há de prevalecer ainda por várias 
décadas na psicologia social. 
Tivera eu posições radicais em psicologia, terminaria dizendo que, ou se 
verificam sérias mudanças nas atitudes da maioria dos psicólogos e um esforço 
redobrado no sentido de clarificação epistemológica em psicologia, nos próximos 
15 anos, ou este setor converte-se-á numa atividade lúdica a entreter os que se 
comprazem com as especulações acerca do comportamento humano. Como não 
sou profeta, nem dado a radicalismos em ciência, prefiro dizer simplesmente que, 
a permanecer por muito mais tempo o status quo, a psicologia continuará a ser 
preterida nas prioridades governamentais, continuará a encontrar resistência junto 
a leigos e outros profissionais e, pior que tudo isto, retardará por mais tempo a 
ampla difusão dos muitos benefícios que tem capacidade de trazer a tantas pessoas 
deles necessitadas. 
Mudanças, quer de atitudes quer de paradigmas, se impõem na psicologia em 
geral, e na psicologia social em particular. O que já aprendemos através da própria 
psicologia nos fornece subsídios valiosos para iniciarmos algumas destas mudanças. 
Outras estão a requerer o brilho dos gênios e o esforço tenaz e consciente de 
todos. Esperemos confiantes a verificação destas mudanças num futuro próximo, 
quando então, metaforicamente falando, entraremos na fase pós-newtoniana da 
psicologia. 
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