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Exame 12º Maria Matono

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Exame – Tempo de Realização 2H00 
GRUPO I 
A 
Lê o texto. 
Apresenta as tuas respostas de forma bem estruturada. 
Tudo é absurdo. Este empenha a vida em ganhar dinheiro que guarda, e nem tem filhos a 
quem o deixe nem esperança que um céu lhe reserve uma transcendência desse dinheiro. 
Aquele empenha o esforço em ganhar fama, para depois de morto, e não crê naquela 
sobrevivência que lhe dê o conhecimento da fama. Esse outro gasta-se na procura de coisas de 
que realmente não gosta. Mais adiante, há um que […] Um lê para saber, inutilmente. Outro 
goza para viver, inutilmente. Vou num carro elétrico, e estou reparando lentamente, conforme 
é meu costume, em todos os pormenores das pessoas que vão adiante de mim. Para mim os 
pormenores são coisas, vozes, frases. Neste vestido da rapariga que vai em minha frente 
decomponho o vestido em o estofo de que se compõe, o trabalho com que o fizeram – pois que 
o vejo vestido e não estofo – e o bordado leve que orla a parte que contorna o pescoço separa-
se-me em retrós de seda, com que se o bordou, e o trabalho que houve de o bordar. E 
imediatamente, como num livro primário de economia política, desdobram-se diante de mim 
as fábricas e os trabalhos – a fábrica onde se fez o tecido; a fábrica onde se fez o retrós, de um 
tom mais escuro, com que se orla de coisinhas retorcidas o seu lugar junto ao pescoço; e vejo 
as secções das fábricas, as máquinas, os operários, as costureiras, meus olhos virados para 
dentro penetram nos escritórios, vejo os gerentes procurar estar sossegados, sigo, nos livros, a 
contabilidade de tudo; mas não é só isto: vejo, para além, as vidas domésticas dos que vivem a 
sua vida social nessas fábricas e nesses escritórios... Toda a vida social jaz a meus olhos só 
porque tenho diante de mim, abaixo de um pescoço moreno, que de outro lado tem não sei que 
cara, um orlar irregular regular verde-escuro sobre um verde-claro de vestido. Para além disto 
pressinto os amores, as secrecias [sic], a alma, de todos quantos trabalharam para que esta 
mulher que está diante de mim no elétrico use, em torno do seu pescoço mortal, a banalidade 
sinuosa de um retrós de seda verde-escura fazendo inutilidades pela orla de uma fazenda verde 
menos escura. Entonteço. Os bancos de elétrico, de um entretecido de palha forte e pequena, 
levam-me a regiões distantes, multiplicam-se-me em indústrias, operários, casas de operários, 
vidas, realidades, tudo. Saio do carro exausto e sonâmbulo. Vivi a vida inteira. 
Fernando Pessoa, Livro do desassossego, edição de Richard Zenith, Lisboa, Assírio & Alvim, 2015, pp. 
253 e 254. 
 
1. Interpreta a sequência dos vários comportamentos de determinadas pessoas evidenciados 
no texto desde «Este empenha…» até «viver, inutilmente.» (linhas 1 a 6). 
2. Explicita a relação entre o enunciador observador e a «rapariga» (linha 9) que vê «num 
carro elétrico» (linha 7). 
3. Tendo em consideração a globalidade do texto, apresenta uma justificação válida para a 
última afirmação do seu autor: «Vivi a vida inteira.» (linha 27). 
 
 
 
Grupo B 
O avô e o neto 
Ao ver o neto a brincar, 
Diz o avô, entristecido, 
«Ah, quem me dera voltar 
A estar assim entretido! 
Quem me dera o tempo quando 
Castelos assim fazia, 
E que os deixava ficando 
Às vezes p’ra o outro dia; 
E toda a tristeza minha 
Era, ao acordar p’ra vê-lo, 
Ver que a criada já tinha 
Arrumado o meu castelo.» 
Mas o neto não o ouve 
Porque está preocupado 
Com um engano que houve 
No portão para o soldado. 
E, enquanto o avô cisma, e triste 
Lembra a infância que lá vai, 
Já mais uma casa existe 
Ou mais um castelo cai; 
E o neto, olhando afinal 
E vendo o avô a chorar, Diz, 
«Caiu, mas não faz mal: 
Torna-se já a arranjar.» 
 [1924?] 
Fernando Pessoa, Poesia do eu, edição de Richard Zenith, Lisboa, Assírio & Alvim, 2014, pp. 165 e 166. 
 
1. Distingue as duas tristezas do avô referidas no poema. 
2. Explicita a conceção de infância presente no texto. 
 
C 
Num texto bem estruturado de 180 a 200 palavras, relaciona o conteúdo do ortónimo, 
Fernando Pessoa, atentando nas temáticas, com o conteúdo dos heterónimos Alberto Caeiro 
e Álvaro de Campos. 
Linhas de desenvolvimento: 
Em que medida se aproximam? Onde há um claro afastamento? Como pode Caeiro ser o 
mestre? 
Grupo II 
 
Nas respostas aos itens de escolha múltipla, seleciona a opção correta. 
Lê o texto. 
Naquela longa varanda suspensa no espaço, pista de corridas, parque infantil, observatório do 
mundo, passei horas inesquecíveis. Recordo particularmente as noites de verão, cálidas, 
cheirosas das flores da vizinhança, na meia obscuridade. Apagava-se a luz da casa de jantar, para 
poupar o gás e porque nem sequer se justificava o seu consumo. A mãe trazia uma cadeira para 
a varanda, e sentava-se, permanecendo com os olhos fechados e o seu sorriso de todas as horas. 
O pai ficava cá dentro a ressonar na sua cadeira de braços. A avó estava na cozinha a lavar a 
loiça, e as irmãs andavam por cá e por lá. Cálida e cheirosa, a noite. O céu, azul-escuro, repleto 
de estrelas cintilantes. Espetáculo maravilhoso de um firmamento que a civilização aniquilou. 
Não é saudosismo. Juro! Já não se veem estrelas, à noite, no céu de Lisboa, nem nos céus dos 
grandes aglomerados populacionais. Os gases de combustão da gasolina dos automóveis, dos 
óleos dos camiões, do combustível dos aviões, a incessante fumarada das chaminés das fábricas, 
cobriram a cidade de um capacete denso que não se deixa atravessar pela fraca luz das estrelas. 
É um facto observado; não é saudosismo, repito. As novas gerações não sabem o que é um céu 
estrelado, a não ser que o tenham visto em regiões menos poluídas, talvez no campo ou na 
praia. Mas o campo não interessa aos jovens, e a praia, à noite não é para fitar o céu mas para 
morder a terra. […] Estas vigílias na varanda não eram hábito particular da casa dos meus pais. 
Olhando a rua, e pelas outras ruas igualmente, viam-se sempre pessoas nas varandas, quando 
as tinham, ou muito repousadas com os antebraços apoiados nas sacadas das janelas de peito. 
Estavam ali, de verão e de inverno, na primavera e no outono, a bisbilhotar, a ver quem passava, 
a espreitar os vizinhos, a chamar os vendedores ambulantes, a tomar ar simplesmente. Havia 
sempre na vida das pessoas domésticas um tempo destinado a estar à janela, em particular ao 
fim da tarde, depois de terminadas as lides da casa, após o jantar. Era um hábito excelente, 
saudável, de comunicação social. As pessoas, à janela, falavam para a rua, conversavam com os 
vizinhos próximos, confraternizavam ou descompunham-se, batiam com as vidraças 
ostensivamente quando se zangavam ou permaneciam gozosas e, a desfrutarem as guerrilhas 
dos outros. Era uma característica do tempo, do meu tempo, hoje totalmente ultrapassada. 
Chego à janela, nos dias que decorrem, e verifico que todas as janelas estão fechadas, dia e 
noite, a não ser quando as abrem, da parte da manhã para arejar os quartos, mas sem ninguém 
à vista. À noite é o encerramento total. Que teria acontecido? Que prenderá as pessoas, dentro 
de suas casas, invisíveis do exterior, como se o Governo tivesse declarado o estado de sítio? 
Aqui, e em todo o mundo (civilizado, é claro) a humanidade foi submetida a uma opressão 
ditatorial que todos acolhem voluntariamente. Que estarão a fazer as pessoas nas suas casas, 
segregadas, com as janelas fechadas, sem darem sinais de vida? Se formos espreitá-las vê-las-
emos todas sentadas, homens, mulheres e crianças, novos e velhos, sem trocarem uma palavra 
entre si, de boca semiaberta, a olharem para uma caixa, colocada estrategicamente em certo 
lugar do compartimento,de onde todos a possam ver bem. A caixa é o televisor e a humanidade 
o conjunto dos telespetadores. 
 
Rómulo de Carvalho, [Memórias], Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2010, pp. 60 a 62. 
B1 
Antes de fazeres as perguntas de escolha múltipla, deves fazer uma cópia do texto. 
B2 – responde às perguntas de escolha múltipla, selecionando a opção mais correta. 
1. No primeiro parágrafo, o memorialista recorda as noites passadas «numa longa varanda» 
(linha 1) através da referência a sensações de natureza, respetivamente, 
 (A) táteis / olfativas / visuais / auditivas. 
(B) olfativas / táteis / auditivas / visuais. 
(C) visuais / táteis / olfativas / auditivas. 
(D) táteis / auditivas / olfativas / visuais. 
 
2. A frase «cobriram a cidade de um capacete denso» (linha 12) integra uma 
 (A) hipérbole. 
(B) personificação. 
(C) metáfora. 
(D) comparação. 
 
3. Com a frase «a não ser que o tenham visto em regiões menos poluídas.» (linhas 14 e 15) o 
memorialista exprime 
(A) uma afirmação. 
(B) uma exceção. 
(C) um contraste. 
(D) uma alternativa. 
4. O tempo que as pessoas passavam «nas varandas» ou «nas sacadas das janelas» (linhas 
18 e 19) era fundamentalmente um tempo 
(A) de observação. 
(B) de socialização. 
(C) perdido. 
(D) de alegria. 
 
5. O autor estabelece entre esse tempo e o nosso, uma relação de 
 (A) semelhança. 
(B) identidade. 
(C) inferioridade. 
(D) contraste. 
6. Os pronomes presentes na frase «Se formos espreitá-las vê-las-emos todas sentadas,» 
(linhas 34 e 35) constituem, mecanismos de construção da coesão 
(A) frásica. 
(B) referencial. 
(C) temporal. 
(D) interfrásica. 
7. A visão que o enunciador tem da humanidade, na sua relação com a televisão, tal como 
exposta no último parágrafo do texto, é de natureza 
(A) irónica. 
(B) hiperbólica. 
(C) metafórica. 
(D) antitética. 
8. Refere o valor modal presente na utilização do verbo poder no enunciado «uma caixa, 
colocada estrategicamente em certo lugar do compartimento, de onde todos a possam ver 
bem.» (linhas 36 e 37). 
9. Indica a função sintática da oração subordinada presente na frase complexa «verifico que 
todas as janelas estão fechadas» (linha 28). 
10. Classifica a oração subordinada presente na frase complexa «Chego à janela, nos dias 
que decorrem,» (linhas 27 e 28). 
 
 
 
 
 
GRUPO III 
A amizade entre pessoas de idades diferentes ou mesmo afastadas pode constituir um fator de 
enriquecimento para todos os envolvidos. 
Escreve um texto de opinião que confirme esta perspetiva, apoiando-te em pelos menos dois 
argumentos significativos e respetivos exemplos. O teu texto deve ter entre 200 e 300 palavras 
e deve estruturar-se nas três secções habituais. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Cotação 
Parte A ...................................................................................................................... 48 pontos 
1. ........................................................................................................... 16 pontos 2. 
........................................................................................................... 16 pontos 
3. ........................................................................................................... 16 pontos 
Parte B ...................................................................................................................... 32 pontos 
5. ........................................................................................................... 16 pontos 
6. ........................................................................................................... 16 pontos 
Parte C ...................................................................................................................... 20 pontos 
7. ........................................................................................................... 20 pontos 
Grupo I 100 pontos 
GRUPO II 
 1. .......................................................................................................... 5 pontos 
2. .......................................................................................................... 5 pontos 
3. .......................................................................................................... 5 pontos 
4. .......................................................................................................... 5 pontos 
5. .......................................................................................................... 5 pontos 
6. .......................................................................................................... 5 pontos 
7. .......................................................................................................... 5 pontos 
8 . .......................................................................................................... 5 pontos 
9. .......................................................................................................... 5 pontos 
10 .......................................................................................................... 5 pontos 
 
Grupo II 50 pontos 
 
GRUPO III............................................................................................. 50 pontos 
 
TOTAL ............................................................. 200 pontos

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