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antropologia_social_e_cultural (1).pdf

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57
UNIDADE 2
PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS 
DA ANTROPOLOGIA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade tem por objetivos:
• conceituar a construção do pensamento antropológico;
• compreender os movimentos históricos na antropologia;
• conhecer os novos questionamentos da antropologia.
Esta unidade está organizada em três tópicos. Neles você encontrará dicas, 
textos complementares, observações e atividades que lhe darão uma maior 
compreensão dos temas a serem abordados.
TÓPICO 1 – A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO 
 ANTROPOLÓGICO
TÓPICO 2 – PERSPECTIVAS CLÁSSICAS DA TEORIA 
 ANTROPOLÓGICA
TÓPICO 3 – INQUIETAÇÕES CONTEMPORÂNEAS DA 
 ANTROPOLOGIA
58
59
TÓPICO 1
 A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO 
ANTROPOLÓGICO
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico! Toda disciplina se embasa em estudos clássicos para 
se constituir como ciência, por isso temos de conhecer os nossos clássicos a fim 
de não inventarmos a roda novamente. Ou seja, é a partir deles que os estudos 
sobre o homem na sociedade vão partir. Conhecer a história desses autores, seus 
ensinamentos e seus dilemas antropológicos nos faz repensar a nossa própria 
prática no âmbito desta disciplina. Então vamos lá? 
2 EVOLUCIONISMO SOCIAL E MATERIALISMO CULTURAL
FIGURA 10 - CAMINHO LINEAR DA HISTÓRIA DO HOMEM
FONTE: Disponível em: <http://brasilescola.uol.com.br/filosofia/evolucionismo 
 -cultural-segundo-lewis-morgan.htm>. Acesso em: 20 maio 2016.
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
60
Caro acadêmico! Toda disciplina se embasa em estudos clássicos para 
se constituir como ciência, por isso temos de conhecer os nossos clássicos a fim 
de não inventarmos a roda novamente. Ou seja, é a partir deles que os estudos 
sobre o homem na sociedade vão partir. Conhecer a história desses autores, seus 
ensinamentos e seus dilemas antropológicos nos faz repensar a nossa própria 
prática no âmbito desta disciplina. 
Em 1830 tem-se o embrião de uma Antropologia Evolucionista, na 
Inglaterra, apoiada na Teoria da Evolução, que defende a questão da mutabilidade 
das espécies, de modo que cada mutação ocorrida no homem passa por uma 
seleção. Por outro lado, tem-se os argumentos dos enciclopedistas da Idade Média, 
que acreditavam num mundo ordenado a partir de uma “Grande cadeia do ser”, 
e assim sendo, numa estabilidade da espécie. Entretanto, quem mais influenciou os 
“primeiros antropólogos” foi o filósofo inglês Herbert Spencer, com suas ideias de 
escala evolutiva ascendente baseada na noção de “estágios”. Esse Evolucionismo 
Unilinear se apoiou na ideia de que há uma linha dominante no sistema evolutivo, 
em que todas as sociedades passam pelos mesmos estágios, o que permitiria à 
Antropologia, como ciência, relacionar passado e presente.
Durante esta época acontecia a expansão colonial e o comércio exterior que 
instigavam a busca por um conhecimento global, mas também se estruturava uma 
crítica forte da sociologia britânica, representada por ativistas, em relação ao tráfico 
de escravos e a legalidade da instituição da escravidão nas colônias britânicas. 
Ou seja, buscamos mais conhecimento, mas agimos de formas ainda grotescas e 
impondo nossa força. 
2.1 MORGAN E A SOCIEDADE ANTIGA
Também inspirado por essa linha de pensamento unilinear, o norte-
americano Lewis Henry Morgan (1818-1881) trabalhou muito tempo observando 
os iroqueses e outros povos americanos. Através desse contato e com a ajuda de 
um intérprete, ele percebeu que o sistema de parentesco dos iroqueses era similar a 
outras tribos da América e até mesmo de outras tribos no mundo. Para reforçar sua 
pesquisa, enviou questionários para missões religiosas, agências governamentais 
e instituições científicas nos Estados Unidos que trabalhavam com povos nativos 
e fez viagens curtas a reservas indígenas. Com esse material ele desenvolveu um 
modelo comparativo para a compreensão do sistema de parentesco em todo o 
mundo, concluindo que a história da raça humana é somente uma, e cada povo 
passa por estágios, de acordo com a ordem proposta: selvageria, barbárie e 
civilização. 
Para ele, todos nasciam com iguais capacidades, mas desenvolvê-las 
seria outra questão. Aqueles privilegiadamente nascidos estariam “separados” 
socialmente dos desprovidos. Porém, haveria uma uniformidade das operações 
da mente humana, em que através de invenções e descobertas a inteligência se 
TÓPICO 1 | A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
61
desenvolvia. Para se reconhecer o estágio em que está a tribo, poder-se-ia registrar 
e classificar suas instituições, sendo estas entendidas como germes primários do 
pensamento capazes de desenvolver a sua logicidade. Inicia-se de um estoque 
original comum até o desenvolvimento dessa inteligência que alcançaria a 
civilização, ponto onde os povos teriam mais experiências e maior poder mental 
e moral. Partindo dessa investigação das formas de governo, do sistema de 
parentesco e questão da propriedade, Morgan estabelece a sistematização de 
evidências do progresso humano. 
2.2 TYLOR E A CIÊNCIA DA CULTURA
Edward Burnett Tylor (1832-1917) nasceu na Inglaterra e, trabalhando nos 
negócios de fundição de bronze da família, teve a oportunidade de conhecer o 
México e acessar as ruínas astecas arqueológicas. Sua metodologia dedutiva – 
que parte da conclusão geral para uma premissa particular – era comparar povos 
iguais a fim de identificar as variações da forma cultural entre eles, classificando 
em graus de estágios. 
Dentro da discussão antropológica, ele se concentrava na ideia do progresso 
da humanidade através da análise de traços culturais úteis e persistentes no hábito 
humano, o que reforçou a ideia de evolução dos grupos também a partir da noção 
de "sobrevivências". Os relatos de fenômenos da cultura similares serviam de 
evidências dessa progressão na busca de sistematizações gerais da civilização. 
Por isso, raças menos desenvolvidas poderiam fornecer evidências da cultura pré-
histórica de povos primitivos com o objetivo de classificá-los nos mesmos estágios 
evolutivos da cultura.
Há uma premissa de unidade psíquica humana, uma vez que, ao tê-la como 
objeto de estudo, Tylor percebe a capacidade de raciocínio de seus informantes, 
ainda que seja numa linha progressiva. Através de tabelas comparativas, o autor 
evidenciou leis gerais que explicariam as associações humanas ou conexões 
históricas particulares, e esse modo de análise influenciou outros antropólogos 
culturais. Assim sendo, seu principal interesse de pesquisa foi sobre a origem 
humana e, na sequência, sobre evolução de crenças na religião, sendo esta última, 
produto de esforço das pessoas para explicar o mundo. 
NOTA
Os iroquereses pertencem a uma das cinco diferentes nações que vivem em torno 
da região dos Grandes Lagos na América do Norte, envolvendo Canadá e Estados Unidos. E 
suas terras já foram alvo de disputas comerciais no século XVI, sendo que Morgan os defendeu 
através de uma petição. 
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
62
Ele é conhecido como o Pai da Antropologia Cultural, uma vez que tentou 
definir o que é cultura através de um conceito científico. Para Tylor, cultura ou 
civilização é todo aquele complexo que inclui conhecimento, crença, arte, moral 
lei, costume e outras capacidades e hábitos adquiridos pelo homem em condição 
de membro da sociedade. Entretanto, essa conceituação que trata a humanidade 
como homogênea pode ser limitada para compreender a diversidade social ou 
cultural, ao mesmo tempo em que deixa de lado a especificidade da história de 
vida desses povos e o contexto da sua localização geográfica. 
2.3 FRAZER E A ANTROPOLOGIA SOCIAL 
James George Frazer (1854-1941) nasceu naEscócia e teve sua formação 
acadêmica através da leitura dos clássicos na Inglaterra, através da qual produziu 
a obra "O ramo de ouro". O objetivo é descobrir leis gerais que possam presumir 
como os fatos particulares se conformam. Sem ter realizado pesquisa de campo, 
valeu-se do método comparativo através do raciocínio indutivo – que é a premissa 
particular para a conclusão geral –, em que propõe comparar raças de homens, 
afinidades e entender a evolução do pensamento e das instituições humanas. 
Segundo ele, se a natureza for realmente uniforme, é de esperar que se regule no 
futuro, e caberia à antropologia descobrir essas leis gerais que regem a história 
humana desde o passado. 
Frazer foi convidado para ser professor de Antropologia Social na 
Universidade de Liverpool, na Inglaterra. Ali, ele seguiu duas vertentes de estudos: 
o estudo da selvageria e do folclore. No primeiro, verificou crenças e costumes 
dos selvagens. No segundo, as relíquias (fósseis) ainda existentes dessas crenças e 
costumes, que estavam presentes na noção de “sobrevivências” (desde as ideias e 
práticas mais primitivas que ascenderam a planos mais elevados). 
Mas Frazer pede a atenção de que os selvagens de hoje são primitivos 
apenas no sentido relativo, uma vez que serão comparados conosco e não com 
o homem primitivo (aquele idealizado na origem da sociedade), por isso não 
são primitivos no sentido absoluto. Ele reforça que sobre a condição do homem 
primitivo nada sabemos.
Entretanto, para ele, haveria similaridade do funcionamento da mente 
humana de todas as raças de homens, em que as diferenças seriam mais qualitativas 
do que quantitativas, visto que todos teriam igual capacidade mental e moral. 
Ainda assim, julgava de modo prepotente que os pensadores disseminariam as 
melhores ideias na sociedade, estando ele entre esses. 
TÓPICO 1 | A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
63
Esses trabalhos do final do século XIX e início do século XX na Antropologia 
Britânica são baseados fortemente em recursos patrocinados, ou seja, empresas e 
Estado tinham interesse em descobrir sobre a vida dos povos que habitavam outras 
terras e levar a "civilização" até eles. Assim, o que era produzido sobre esses povos 
através das escritas de viajantes e de descobridores se tornou de grande importância 
para os pesquisadores da época, sendo que a observação direta no campo estaria 
mais em segundo plano, conforme definiam os estudiosos dos clássicos e da 
história. Debruçados sobre esses dados, as principais investigações dos “primeiros 
antropólogos” se concentraram na questão da origem e desenvolvimento gradual 
da história humana, visto que tendo ou não material documental, havia um esforço 
na reconstrução – a partir de pistas sobre evidências – do progresso da sociedade 
humana. 
Ainda que esses pesquisadores fossem reconhecidos como “antropólogos 
de gabinete”, pois ficavam mais em seus escritórios do que entre os nativos, é preciso 
destacar que Morgan realizou pesquisa de campo e que as definições conceituais 
na investigação do estudo da sociedade foram de grande importância para a 
pesquisa antropológica. Essas estratégias de pesquisa através da possibilidade de 
documentar a diversidade de costumes e instituições permitiram a reflexão sobre 
novas metodologias para a disciplina. Aqui, destaca-se o método comparativo, 
que será escrutinado e questionado nas abordagens antropológicas subsequentes. 
Também se elucidam as contribuições de Morgan, Frazer e Tylor no estudo das 
terminologias descritivas, que se esforçam para compreender a diversidade de 
expressões culturais, como: o animismo, a matrilinearidade, a exogamia, o tabu 
etc. 
NOTA
A obra "O ramo de ouro" (1890), de Frazer, afirmava que a magia nas sociedades 
primitivas poderia, então, ser pensada como ciência aplicada ou tecnológica nas sociedades 
contemporâneas, considerando uma linha contínua e de caráter progressista em que a magia 
está numa ponta e a ciência na outra. Cabe lembrar que essa obra não está pautada num 
trabalho de campo propriamente dito, mas numa compilação de mitos, lendas, relatos de magia 
e religião dispostos em acervo documental. Caso queiram acessar a obra digitalizada numa 
versão ilustrada, o link é <http://www.classicos12011.files.wordpress.com/2011/03/45354652-o-
ramo-de-ouro-sir-james-george-frazer-ilustrado.pdf>. 
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
64
2.4 PARTICULARISMO HISTÓRICO E CULTURAL 
FIGURA 11 - FRANZ BOAS POSANDO PARA ESCULTOR DO MUSEU
FONTE: Disponível em: <h http://photo-performanceblog.blogspot.com.br/2009/03/
 anthropologist-franz-boas-posing-for.html>. Acesso em: 31 maio 2016.
Franz Boas nasceu em Minden, em Vestfália (Alemanha), no ano de 1858, 
numa família de comerciantes judeus assimilados à cultura alemã. Cursou Física 
e Geografia em universidade alemã, e logo em seguida mudou-se para Berlim, 
mantendo relações próximas com Adolf Bastian (1826-1905), diretor do Museum 
für Völkerkunde (Museu do Folclore). Na sequência, foi estudar Antropologia 
com o médico anatomista Rudolf Virchow (1821-1902).
Ainda que influenciado pelo estudo das Ciências Naturais, Boas ia se 
questionando sobre a objetividade da ciência nos estudos dos fenômenos humanos, 
e encontrando seus limites. Ele foi testando seus pressupostos e considerou 
a questão de maneira mais complexa, sujeitando as explicações das causas dos 
fenômenos também aos fatores psicológicos elucidados pela história.
Em 1883, Boas planejou uma expedição à Ilha de Baffin, no Canadá, para 
estudar os esquimós – os Inuit –, e foi custeado por um dono de jornal em troca 
de artigos sobre a experiência. Esse foi o seu primeiro trabalho de campo entre 
TÓPICO 1 | A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
65
os “nativos”, contudo manteve-se muito mais como observador do que como 
pesquisador participante. Três anos depois, Boas viajou para os Estados Unidos 
e aproveitou para fazer uma expedição de perspectiva etnográfica ao Noroeste 
do Pacífico, entre os índios Kwakiutl, com o objetivo de estudar línguas, crenças, 
mitos nativos e conseguir objetos para coleções museológicas. Um intermediário 
em campo – George Hunt – com pai inglês e mãe indígena é que mediava o contato 
de Boas com os nativos.
Em 1896 ele trabalhou na curadoria das coleções etnográficas do American 
Museum of Natury History, em Nova York, o que lhe permitiu produzir artigos 
a fim de expor suas críticas à etnologia cultural na maneira de organização dos 
significados de conjuntos culturais. 
Para Boas (2004), em primeiro lugar não havia apenas UMA cultura 
humana, em evolução linear como propunham os evolucionistas, e sim “culturas”, 
no plural. E estas culturas em nada teriam de comportamento animal, como 
estabeleciam as ciências naturais. 
Em segundo lugar, a classificação unilinear preconcebida era criticada 
por ser entendida como arbitrária, em que remete apenas ao ponto de vista do 
observador e não está remetida a uma forma derivada do próprio fenômeno. 
Dessa maneira, Boas chama (2004) a atenção para o esforço do relativismo cultural 
que não pode ser esquecido pelo antropólogo, uma vez que este deve também 
relativizar suas noções para identificar os fenômenos culturais dos povos. 
Em terceiro lugar, os efeitos diferentes dos produtos culturais não teriam 
necessariamente causas diferentes, ou seja, há uma reivindicação boasiana do viés 
pluricausal, que enfatiza condicionantes ao invés de determinantes. Desse modo, 
estariam em jogo as condições ambientais, condições psicológicas e conexões 
históricas do desenvolvimento da cultura, e não uma determinação social sobre a 
espécie humana que coloca uns mais avançados que outros.
Dessa maneira, é relevante destacar que Boas critica veementemente o 
método de comparação dedutivo dos evolucionistas, mas não a Teoria da evoluçãoNOTA
No final do século XIX, os Inuit diminuíram sua população por causa da alteração 
da dieta e das doenças europeias, em consequência do contato constante com os europeus. 
Houve um declínio da caça de baleias e aumento da caça de raposas objetivando o comércio 
com os fabricantes europeus. Já no século XX, os Inuit se tornaram mais sedentários, 
dispersando-se entre outros povos “modernos”. Uma das comunidades mais conhecidas das 
Ilhas Baffin é Cape Dorset, que é reconhecida em todo o mundo pelas esculturas em pedra-
sabão, gravuras e desenhos de seus artistas Inuit. 
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
66
de Herbert Spencer, e consequentemente vai defender o método da indução 
empírica no estudo dos fenômenos humanos. Em uma primeira fase, ele se dedicou 
a uma abordagem histórica, em relação à distribuição geográfica dos elementos 
da cultura. Portanto, o pesquisador deveria investigar os processos pelos quais 
os estágios culturais se desenvolveram, partindo da ideia de que os fenômenos 
poderiam se desenvolver a partir de fontes diversas, e se houvesse a possibilidade 
de comparabilidade do material através de evidências, aí então seria plausível 
generalizar enquanto lei que rege o fenômeno.
 Assim, a semelhança e classificação do resultado do que é culturalmente 
concebido não são para ele um ponto de partida, um fato dado, mas uma meta 
a ser explorada arduamente. Para Boas, se deveria relacionar o elemento à sua 
totalidade, ou seja, o objeto comporia seu “meio ambiente” tomado como produto 
da história de um povo, de modo a compor várias relações com outras produções 
da tribo. 
Na segunda fase, Boas se interessou pelo modo como o “gênio de um povo” 
integrava os elementos da acumulação quase acidental de processos históricos 
que se reuniam numa cultura particular. Esses grupos tomavam emprestados 
elementos culturais e os adaptavam sobre elementos dominantes da cultura, o que 
criaria a cultura com essa adição acidental de diversos elementos individuais e 
dava ensejo, então, a uma totalidade espiritual integrada. 
 Para ele, haveria dinâmicas dos processos culturais em que novos elementos 
eram incorporados a um padrão tradicional. Sendo assim, existiriam níveis de 
integração dos elementos em conjuntos culturais, de modo a se referenciar por 
um padrão tradicional que é expresso em categoriais definidas e universais. Aqui, 
há uma preocupação de integração do autor entre os elementos em conjuntos 
concebidos como uma integração psicológica, fundada em ideias das relações 
dos elementos baseadas em categorias internalizadas inconscientemente e na 
integração histórica, de acidentes no contato entre culturas sujeitas a mudanças. 
 
Na Antropologia, Boas se destacou por dar importância ao trabalho de 
campo e ao esforço de compreensão da linguagem de outros povos, trazendo um 
rigor metodológico (influência do romantismo alemão) e profissionalizando esta 
disciplina nos EUA. Ele desenvolveu uma perspectiva antiteórica, em que não 
reforçou a ideia da humanidade, sendo esta somente alcançada através de uma 
comparação metódica dos processos históricos dos diferentes povos. 
Na refutação do determinismo racial, o autor destacou a sua luta pela 
igualdade racial e apresentou que as culturas sofrem influência da tradição dos 
povos. Ele procurou entender os traços culturais não só como derivados de uma 
causalidade, mas como processos históricos únicos (baseados numa ideia de 
difusão e modificação), em que a explicação não está baseada necessariamente 
na unidade psíquica humana. Dessa maneira, Franz Boas vai criticando as bases 
do evolucionismo, e constituindo uma nova forma de pensar, baseada num 
particularismo histórico, de perspectiva culturalista, dando ensejo para outros 
paradigmas na disciplina de Antropologia. 
TÓPICO 1 | A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
67
2.5 MÉTODO ETNOGRÁFICO E A ESCRITA
FIGURA 12 - MALINOWSKI ENTRE OS NATIVOS
FONTE: Disponível em: <http://antropologiaestudos.blogspot.com.br/
 2012_05_01_archive.html>. Acessado em: 31 maio 2016.
DICAS
Vale a pena a leitura do livro Antropologia Cultural, de Franz 
Boas, organizado por Celso de Castro, para aprofundar o 
conhecimento da discussão do autor. Ali, artigos do antropólogo 
foram traduzidos e podem ser apreciados para se apreender as 
contribuições dele no âmbito da disciplina estudada. 
FONTE: Disponível em: <https://umapiruetaduaspiruetas.files.
wordpress.com/2010/05/franz-boas-antropologia-cultural.
pdf>. Acesso em: 16 jul. 2016.
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
68
Bronislaw Kaspar Malinowski nasceu em Cracóvia, na Polônia, em 1884. 
Cursou matemática, física e filosofia na Jagiellonian University, na Polônia. Já na 
Alemanha, ele começou a se interessar por estudos da psicologia experimental e 
da economia. Seu posicionamento abandonava as inquietações baseadas na busca 
de uma origem humana e nas explicações históricas que tanto preocupavam a 
tradição de antropologia britânica tayloriana. Esse esgotamento do evolucionismo 
seria substituído por uma nova exigência na análise de dados etnográficos 
através da imersão nos detalhes de como a ação dos nativos se desenrolava na 
contemporaneidade. 
Assim, era necessário que o antropólogo buscasse o entendimento e a 
explicação de dentro do próprio objeto de estudo. Essa atitude foi uma ruptura 
definitiva com os fundamentos tradicionais acadêmicos da disciplina, visto que 
Malinowski adotou uma orientação sincrônica – ao invés da perspectiva diacrônica 
(evolução no tempo) antes instalada – e a perspectiva da sociologia funcionalista. 
Considerado o pai da antropologia britânica, Malinowski desenvolveu uma 
análise por meio do funcionalismo que afirmava: todas as partes de uma cultura 
local desempenham um papel de funcionamento com todas as outras partes, e cada 
cultura local constituía um mecanismo integrado e complexo, tendo o “homem” 
como um organismo adaptado ao seu ambiente físico e coletivo. 
Logo, o pesquisador teria que fazer um trabalho de campo intensivo para 
apreender todos os detalhes culturais através dos registros nos diários de campo. 
No início, esses pareceriam arbitrários e sem sentido – tanto nas práticas da 
população local como o modo das pessoas sobreviverem no ambiente local –, mas 
com a acumulação de dados etnográficos – devido ao tempo que o pesquisador 
permanece ali –, alguns núcleos de sentido viriam à tona, e o antropólogo se 
tornaria mediador do significado da sociedade do outro. 
Malinowski foi autorizado a realizar o trabalho de campo em áreas da Nova 
Guiné, administrada pela Austrália, mesmo durante a Primeira Guerra Mundial. 
Entre setembro de 1914 e outubro de 1918, ele passou cerca de 30 meses, em três 
viagens separadas da Austrália, concentrando-se nas Ilhas Trobriand e realizando 
NOTA
Aqui, há grande influência dos escritos do sociólogo Émile Durkheim (1858-1917) 
para a Année Sociologique como fonte de ideias ao estrutural-funcionalismo, e 
mais especificamente do funcionalismo, na questão dos rituais. Junto com Marcel Mauss (1872-
1950), seu sobrinho, eles suscitaram ideias sobre a continuidade do pensamento primitivo e 
científico a partir de uma abordagem sobre as classificações da mente humana, em que o 
segundo reflete os elementos estudados pelo primeiro. Ou seja, a ideia de reconhecimento 
explícito da unidade psíquica da humanidade.
TÓPICO 1 | A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
69
seu trabalho na Nova Guiné. Em 1922, Malinowski publicou os “Argonautas do 
Pacífico Ocidental” e ali ele descreve sobre o método, o assunto e escopo, e a 
geografia das ilhas Trobriand e sua chegada às ilhas. Sua pesquisa trata das regras 
de troca no kula, a construção das canoas, magia e cerimônia. 
 Assim, Malinowski (1975) se opôs veementemente ao evolucionismodos 
“antropólogos de gabinete” e criou uma tradição de trabalho de campo com base 
no uso da língua nativa através da “observação participante”, esta seria imparcial 
e objetiva. Para ele, era necessária a documentação estatística por evidência para 
a construção de quadros sinópticos feitos a partir de um levantamento exaustivo 
de exemplos detalhados, a fim de considerar os imponderáveis da vida social – 
captando a subjetividade – que dão carne e sangue à vida real nativa, preenchendo o 
esqueleto das construções abstratas. Mas ainda que a subjetividade do pesquisador 
interfira, deveríamos deixar os fatos falarem por si mesmos, conforme destaca o 
autor.
Seu método incentiva passagens do trabalho de campo com contato 
próximo com informantes durante um longo período de tempo. Resumindo 
seus ensinamentos, temos que: a) organização da tribo e anatomia da sua cultura 
através do método de documentação concreta e estatística; b) fatos imponderáveis 
da vida social, bem como os tipos de comportamento através da metodologia da 
observação participante e do diário de campo; e c) corpus inscriptionum a partir de 
coleções de asserções como documento da mentalidade nativa. Essas são questões 
objetivas: apreender o ponto de vista do nativo, seu relacionamento com a vida, 
sua visão de mundo.
Para haver uma base de cientificidade na pesquisa, Malinowski se 
preocupava com o “recurso da sinceridade metodológica”, em que o pesquisador 
deveria saber a diferença dos dados referentes da observação direta e interpretações 
nativas e dos dados que são inferências do pesquisador a partir do seu ponto de 
vista. Assim, a importância da etnografia incentivava a tolerância aos costumes 
estrangeiros e levava ao esclarecimento dos leitores sobre os propósitos de 
costumes diferentes dos seus próprios. 
NOTA
O kula é uma instituição enorme e complexa de troca intertribal de presentes/
objetos que obedecem a leis específicas quanto ao sentido geográfico de suas transações. 
Nesse sentido, os artigos trocados não têm apenas uma utilidade prática (Malinowski critica 
a interpretação vigente na época sobre economia primitiva), mas trocam objetos que serão 
usados em danças cerimoniais e reuniões importantes. Entre as comunidades do kula há um 
aspecto moral colocado, em que a equivalência da troca de objetos não pode ser questionada 
por quem recebe, e sim por quem dá. Para eles, a generosidade é sinal de riqueza, e não a 
acumulação de riquezas, como as joias da rainha da Inglaterra.
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
70
Em 1937, Malinowski partiu de Londres para os Estados Unidos para um 
ano intenso na Universidade de Yale, em 1938. Com a eclosão da Segunda Guerra 
Mundial, ele estava nos Estados Unidos. Preferiu ficar lá, mas morreu em 1942, 
pouco depois de aceitar um cargo permanente na Yale. 
2.6 FUNÇÃO, ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO SOCIAL
 FIGURA 13 - O PERFIL DE RADCLIFFE-BROWN
FONTE: Disponível em: <https://pensandoaantropologia.wordpress.com/
 sobre-os-autores/radcliffe-brown/>. Acesso em: 31 maio 2016.
DICAS
Indicamos a leitura do livro "Um diário no sentido estrito do termo", 
de Bronislaw Malinowski, que apresenta as reflexões diárias de 
seu trabalho etnográfico na Nova Guiné, publicado pela primeira 
vez em 1967. Essa publicação ocorreu por decisão da esposa, 
Valetta Malinowska, após a morte do autor, e causou furor entre os 
estudiosos das ciências sociais, porque ali apareciam suas impressões 
estereotipadas sobre os nativos. 
FONTE: Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/
handle/123456789/1365>. Acesso em: 31 mai. 2016.
TÓPICO 1 | A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
71
Alfred Reginald Radcliffe-Brown nasceu em Birmingham, na Inglaterra, no 
dia 17 de janeiro de 1881. Em 1901 ele entrou para a Universidade de Cambridge 
com o objetivo de estudar filosofia, psicologia, economia e as ciências naturais. 
Logo depois de concluir o bacharelado, em 1904, ele se inscreveu na Pós-graduação 
do Departamento de Antropologia, ainda na mesma universidade. E ali, em 1906, 
Radcliffe-Brown participou da expedição nas Ilhas Andam, no Estreito de Torres, 
e então seus estudos se consolidaram na Antropologia Britânica.
Baseado numa abordagem “estrutural-funcionalista”, ele se preocupava 
mais com o lugar dos indivíduos na ordem social e com a construção dessa ordem 
social do que com a ação individual. Seus estudos foram diretamente influenciados 
pelas ideias dos precursores evolucionistas e pela analogia entre a vida orgânica e 
vida social, fazendo com que aderisse a uma espécie de “sociologia comparada”. 
Por um lado, Radcliffe-Brown elogia seus antecessores no que se refere aos 
objetivos comparativos, mas rejeita seus métodos conjecturais; por outro, ele rejeita 
os objetivos relativistas de seus contemporâneos americanos, mas não discorda 
dos métodos de observação e descrição empregados.
O que Radcliffe-Brown propõe como método nas ciências sociais se alinha 
na perspectiva comparativa – permeada pelo indutivismo –, visto que para ele 
a antropologia deveria descobrir as “leis naturais da sociedade”, entretanto, 
ele mesmo não foi muito longe com isso. Para esse antropólogo britânico não 
interessavam somente explicações históricas e as origens dos sistemas ou 
instituições, como se preocupavam os evolucionistas, e sim os fatos presentes dos 
povos, de modo a estudá-los enquanto partes interagindo como uma unidade 
composta da vida.
 Caberia então aos pesquisadores a observação dos atos de comportamento 
desses indivíduos, seus atos de linguagem e os produtos materiais de ações 
passadas, seguidas de comparações e classificações dos fenômenos, numa 
perspectiva de que a Antropologia Social trata dos estudos da sociedade humana 
– tendo como objeto o processo da vida social.
 O que difere da proposição de Boas dos EUA sobre a observação da 
“cultura” dos povos ou mesmo de que elabora uma teoria científica da cultura, 
esses focos de investigação são considerados por Radcliffe-Brown abstratos para 
definir a realidade concreta. Ele prefere a perspectiva dos fenômenos sociais – 
que pretende o estudo da sociedade humana – e se preocupa com as formas de 
associação entre os indivíduos para apreender essa rede de relações existentes 
que denotam características gerais das estruturas sociais, sendo esse estudo 
fundamental para seu trabalho ter status científico.
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
72
 O seu método antropológico se assemelha aos métodos usados nas 
Ciências Físicas ou Biológicas, entretanto, Radcliffe-Brown destaca dois pontos em 
que o estudo da vida social não pode ser comparado ao estudo da vida orgânica: 
quando se pretende estudar a estrutura social independente do seu funcionamento 
e quando se entende que sociedade muda seu tipo de estrutura ao longo dos anos, 
diferente do animal, que não modifica sua estrutura ao longo da vida. 
Entre 1906 e 1908, Radciffe-Brown realizou trabalho de campo nas Ilhas 
Andaman, na Índia, imaginando que essa sociedade representasse o nível mais 
primitivo da vida humana por causa da baixa estatura dos pigmeus. Apesar dos 
esforços, ele nunca desenvolveu com facilidade a língua andamanesa, e a maioria 
dos dados foi coletada por meio de um intérprete de língua hindi. Ali, o antropólogo 
explicou os rituais em termos de suas funções sociais.
 Entre 1910 e 1912, ele realizou trabalho de campo entre os aborígines na 
Austrália Ocidental, com o objetivo de analisar, a partir da perspectiva estrutural-
funcionalista, o parentesco, o mito, o totemismo, no contexto de organização 
social. E depois, como professor de Antropologia, pôde viajar ao redor do mundo 
pela Inglaterra, África do Sul, China, Brasil e Egito. Desse modo, Radcliffe-Brown 
compilou fatos do presente entre os povos estudadosa fim de conectá-los através 
do estudo da sociedade como unidade composta de vida, de modo a comparar a 
estrutura social de uma sociedade com outra, e chegar a uma forma estrutural da 
sociedade. 
Assim, ele considerou a perspectiva da função como hipótese de trabalho, 
ou seja, ele partiu de um esquema articulado a partir da função relacionada 
ao processo e a estrutura para interpretar os sistemas sociais humanos. Este 
direcionamento da investigação não se propõe a uma afirmação dogmática de 
que tudo TEM uma função, mas que pode ter uma função, sendo que um mesmo 
costume social, em sociedades distintas, pode ter funções diferenciadas. 
Radcliffe-Brown entende que a antropologia social deve abranger a 
totalidade da vida social de um povo, considerando relações diversas que levam 
ao estudo do indivíduo e da sua adaptação à vida social. Para ele, a perspectiva 
histórica pode ser complementar à hipótese funcional, uma vez que os acidentes 
históricos também conduzem ao processo da vida social. Entretanto, ele vê com 
maus olhos a ideia da difusão dos traços culturais, como se a cultura fosse um 
NOTA
Segundo Radcliffe-Brown (1973), a estrutura social pode ser apreendida através 
das observações reais para que, na sequência, o antropólogo possa formular generalizações da 
forma estrutural, ou seja, produzir suas inferências sobre a sociedade.
TÓPICO 1 | A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
73
acumulado de relações acidentais entre os povos e não houvesse uma unidade 
funcional dos sistemas sociais. 
Assim, somente a observação direta dos povos apresenta uma rede 
complexa de relações sociais, o que faz com que o autor vincule essas ideias da 
hipótese funcional à noção de estrutura social, questão que vamos analisar no 
momento. Numa aproximação com os precursores evolucionistas, Radcliffe-Brown 
também objetiva a descoberta das características gerais das estruturas sociais, mas 
aqui as unidades componentes são os seres humanos, que têm uma dada posição 
social nesta estrutura. Trata-se de apreender certa constância da estrutura social 
que permite entender sua continuidade através do tempo.
As críticas mais ferrenhas em relação ao trabalho de Radcliffe-Brown se 
referem às ideias do todo conexo proposto pelo funcionalismo, de que a vida 
social se organiza numa coerência funcional entre diversos elementos, de modo a 
manter sua estrutura social em equilíbrio, numa continuidade que reitera. Nesse 
sentido, Radcliffe Brown pensava que podia haver mudanças na forma estrutural, 
mas havia certa permanência da estrutura, o que vai chocar com perspectivas mais 
recentes, que querem justamente trabalhar com a ideia do conflito na sociedade, 
e na perspectiva de Radcliffe-Brown esse conflito estaria colocado de maneira 
funcional na estrutura social.
Esse autor se dedica aos estudos das abordagens clássicas, como a 
terminologia do totemismo e a questão do parentesco, com o objetivo de entender 
teoricamente a sua função relacionada ao todo da sociedade. Essa relação fica 
explícita nos costumes ritualísticos e cerimoniais, que mantêm esses valores nas 
sociedades primitivas. Dessa maneira, ele conclui que a função do casamento seria 
fixar a posição social dos filhos do matrimônio, e assim se adota um padrão de 
comportamento com seus parentes.
DICAS
Indicamos a leitura do livro "Estrutura e Função na Sociedade Primitiva", 
de Radcliffe-Brown, que apresenta ensaios reunidos de diferentes 
épocas escritos pelo autor e que dão a dimensão do seu argumento 
teórico a partir das sociedades primitivas.
Disponível em: <http://docslide.com.br/documents/estrutura-e-
funcao-na-sociedade-primitiva-radcliffe-brownpdf-55ef44e6c8876.
html>. Acessado em: 16 jul. 2016.
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
74
LEITURA COMPLEMENTAR
Por que ler os clássicos
Ítalo Calvino
Comecemos com algumas propostas de definição.
Os clássicos são aqueles livros dos quais, em geral, se ouve dizer: "Estou 
relendo..." e nunca "Estou lendo...".
Isso acontece pelo menos com aquelas pessoas que se consideram "grandes 
leitores"; não vale para a juventude, idade em que o encontro com o mundo e com 
os clássicos como parte do mundo vale exatamente enquanto primeiro encontro.
O prefixo reiterativo antes do verbo ler pode ser uma pequena hipocrisia 
por parte dos que se envergonham de admitir não ter lido um livro famoso. Para 
tranquilizá-los, bastará observar que, por maiores que possam ser as leituras "de 
formação" de um indivíduo, resta sempre um número enorme de obras que ele não 
leu. Quem leu tudo de Heródoto e de Tucídides levante a mão. E de Saint-Simon? E 
do cardeal de Retz? E também os grandes ciclos romanescos do Oitocentos são mais 
citados do que lidos. Na França, se começa a ler Balzac na escola, e pelo número de 
edições em circulação, se diria que continuam a lê-lo mesmo depois. Mas na Itália, 
se fosse feita uma pesquisa, temo que Balzac apareceria nos últimos lugares. Os 
apaixonados por Dickens na Itália constituem uma restrita elite de pessoas que, 
quando se encontram, logo começam a falar de episódios e personagens como se 
fossem de amigos comuns. Faz alguns anos, Michel Butor, lecionando nos Estados 
Unidos, cansado de ouvir perguntas sobre Emile Zola, que jamais lera, decidiu ler 
todo o ciclo dos Rougon-Macquart. Descobriu que era totalmente diverso do que 
pensava: uma fabulosa genealogia mitológica e cosmogônica, que descreveu num 
belíssimo ensaio. Isso confirma que ler pela primeira vez um grande livro na idade 
madura é um prazer extraordinário: diferente (mas não se pode dizer maior ou 
menor) se comparado a uma leitura da juventude. A juventude comunica ao ato de 
ler como a qualquer outra experiência um sabor e uma importância particulares; ao 
passo que na maturidade apreciam-se (deveriam ser apreciados) muitos detalhes, 
níveis e significados a mais. Podemos tentar então esta outra fórmula de definição:
— Dizem-se clássicos aqueles livros que constituem uma riqueza para 
quem os tenha lido e amado; mas constituem uma riqueza não menor para quem 
se reserva a sorte de lê-los pela primeira vez nas melhores condições para apreciá-
los.
De fato, as leituras da juventude podem ser pouco profícuas pela 
impaciência, distração, inexperiência das instruções para o uso, inexperiência 
da vida. Podem ser (talvez ao mesmo tempo) formativas no sentido de que dão 
uma forma às experiências futuras, fornecendo modelos, recipientes, termos de 
TÓPICO 1 | A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
75
comparação, esquemas de classificação, escalas de valores, paradigmas de beleza: 
todas, coisas que continuam a valer mesmo que nos recordemos pouco ou nada 
do livro lido na juventude. Relendo o livro na idade madura, acontece reencontrar 
aquelas constantes que já fazem parte de nossos mecanismos interiores e cuja 
origem havíamos esquecido. Existe uma força particular da obra que consegue 
fazer-se esquecer enquanto tal, mas que deixa sua semente. A definição que dela 
podemos dar então será:
— Os clássicos são livros que exercem uma influência particular quando se 
impõem como inesquecíveis e também quando se ocultam nas dobras da memória, 
mimetizando-se como inconsciente coletivo ou individual.
Por isso, deveria existir um tempo na vida adulta dedicado a revisitar as 
leituras mais importantes da juventude. Se os livros permaneceram os mesmos 
(mas também eles mudam, à luz de uma perspectiva histórica diferente), nós, com 
certeza, mudamos, e o encontro é um acontecimento totalmente novo. Portanto, 
usar o verbo ler ou o verbo reler não tem muita importância. De fato, poderíamos 
dizer:
— Toda releitura de um clássico é uma leitura de descoberta como a 
primeira.
— Toda primeira leitura de um clássico é na realidade uma releitura.
A definição 4 pode ser considerada corolário desta:
— Um clássico éum livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha 
para dizer.
Ao passo que a definição 5 remete para uma formulação mais explicativa, 
como:
— Os clássicos são aqueles livros que chegam até nós trazendo as marcas 
das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura 
ou nas culturas que atravessaram (ou, mais simplesmente, na linguagem ou nos 
costumes).
Isso vale tanto para os clássicos antigos quanto para os modernos. Se 
leio a Odisseia, leio o texto de Homero, mas não posso esquecer tudo aquilo que 
as aventuras de Ulisses passaram a significar durante os séculos e não posso 
deixar de perguntar-me se tais significados estavam implícitos no texto ou se 
são incrustações, deformações ou dilatações. Lendo Kafka, não posso deixar de 
comprovar ou de rechaçar a legitimidade do adjetivo kafkiano, que costumamos 
ouvir a cada 15 minutos, aplicado dentro e fora de contexto. Se leio Pais e filhos, 
de Turgueniev, ou Os possuídos, de Dostoievski, não posso deixar de pensar em 
como essas personagens continuaram a reencarnar-se até nossos dias.
A leitura de um clássico deve oferecer-nos alguma surpresa em relação à 
imagem que dele tínhamos. Por isso, nunca será demais recomendar a leitura direta 
dos textos originais, evitando a mais possível bibliografia crítica, comentários, 
interpretações. A escola e a universidade deveriam servir para fazer entender que 
nenhum livro que fala de outro livro diz mais sobre o livro em questão; mas fazem 
de tudo para que se acredite no contrário. Existe uma inversão de valores muito 
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
76
difundida segundo a qual a introdução, o instrumental crítico e a bibliografia são 
usados como cortina de fumaça para esconder aquilo que o texto tem a dizer e que 
só pode dizer se o deixarmos falar sem intermediários que pretendam saber mais 
do que ele. Podemos concluir que:
— Um clássico é uma obra que provoca incessantemente uma nuvem de 
discursos críticos sobre si, mas continuamente as repele para longe.
O clássico não necessariamente nos ensina algo que não sabíamos; às vezes 
descobrimos nele algo que sempre soubéramos (ou acreditávamos em saber), mas 
desconhecíamos que ele o dissera primeiro (ou que de algum modo se liga a ele de 
maneira particular). E mesmo esta é uma surpresa que dá muita satisfação, como 
sempre dá a descoberta de uma origem, de uma relação, de uma pertinência. De 
tudo isso poderíamos derivar uma definição do tipo:
— Os clássicos são livros que, quanto mais pensamos conhecer por ouvir 
dizer, quando são lidos de fato mais se revelam novos, inesperados, inéditos.
Naturalmente, isso ocorre quando um clássico "funciona" como tal, isto é, 
estabelece uma relação pessoal com quem o lê. Se a centelha não se dá, nada feito: 
os clássicos não são lidos por dever ou por respeito, mas só por amor. Exceto na 
escola: a escola deve fazer com que você conheça bem ou mal um certo número de 
clássicos, dentre os quais (ou em relação aos quais) você poderá depois reconhecer 
os "seus" clássicos. A escola é obrigada a dar-lhe instrumentos para efetuar uma 
opção: mas as escolhas que contam são aquelas que ocorrem fora e depois de cada 
escola.
É só nas leituras desinteressadas que pode acontecer deparar-se com aquele 
que se torna o "seu" livro. Conheço um excelente historiador da arte, homem de 
inúmeras leituras e que, dentre todos os livros, concentrou sua preferência mais 
profunda no Documentos de Pickwick, e a propósito de tudo cita passagens 
provocantes do livro de Dickens e associa cada fato da vida com episódios 
pickwickianos. Pouco a pouco, ele próprio, o universo e a verdadeira filosofia 
tomaram a forma do Documento de Pickwick, numa identificação absoluta. Por 
esta via, chegamos a uma ideia de clássico muito elevada e exigente:
— Chama-se de clássico um livro que se configura como equivalente do 
universo, à semelhança dos antigos talismãs.
Com esta definição nos aproximamos da ideia de livro total, como sonhava 
Mallarmé. Mas um clássico pode estabelecer uma relação igualmente forte de 
oposição, de antítese. Tudo aquilo que Jean-Jacques Rousseau pensa e faz me 
agrada, mas tudo me inspira um irresistível desejo de contradizê-lo, de criticá-lo, 
de brigar com ele. Aí pesa a sua antipatia particular num plano temperamental, 
mas por isso seria melhor que o deixasse de lado; contudo não posso deixar de 
incluí-lo entre os meus autores. Direi, portanto:
TÓPICO 1 | A CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO
77
— O "seu" clássico é aquele que não pode ser-lhe indiferente e que serve 
para definir a você próprio em relação e talvez em contraste com ele.
Creio não ter necessidade de justificar-me se uso o termo clássico sem fazer 
distinções de antiguidade, de estilo, de autoridade. (Para a história de todas essas 
acepções do termo, consulte-se o exaustivo verbete "Clássico", de Franco Fortini, 
na Enciclopédia Einaudi, vol. III). Aquilo que distingue o clássico no discurso 
que estou fazendo talvez seja só um efeito de ressonância que vale tanto para 
uma obra antiga quanto para uma moderna, mas já com um lugar próprio numa 
continuidade cultural. Poderíamos dizer:
— Um clássico é um livro que vem antes de outros clássicos; mas quem leu 
antes os outros e depois lê aquele, reconhece logo o seu lugar na genealogia.
A esta altura, não posso mais adiar o problema decisivo de como relacionar 
a leitura dos clássicos com todas as outras leituras que não sejam clássicas. 
Problema que se articula com perguntas como: "Por que ler os clássicos em vez de 
concentrar-nos em leituras que nos façam entender mais a fundo o nosso tempo?" 
e "Onde encontrar o tempo e a comodidade da mente para ler clássicos, esmagados 
que somos pela avalanche de papel impresso da atualidade?" É claro que se pode 
formular a hipótese de uma pessoa feliz que dedique o "tempo-leitura" de seus dias 
exclusivamente a ler Lucrécio, Luciano, Montaigne, Erasmo, Quevedo, Marlowe, 
o Discours de la méthode, Wilhelm Meister, Coleridge, Ruskin, Proust e Valéry, 
com algumas divagações para Murasaki ou para as sagas islandesas. Tudo isso 
sem ter de fazer resenhas do último livro lançado nem publicações para o concurso 
de cátedra e nem trabalhos editoriais sob contrato com prazos impossíveis. Essa 
pessoa bem-aventurada, para manter sua dieta sem nenhuma contaminação, 
deveria abster-se de ler os jornais, não se deixar tentar nunca pelo último romance 
nem pela última pesquisa sociológica. Seria preciso verificar quanto um rigor 
semelhante poderia ser justo e profícuo. O dia de hoje pode ser banal e mortificante, 
mas é sempre um ponto em que nos situamos para olhar para a frente ou para 
trás. Para poder ler os clássicos, temos de definir "de onde" eles estão sendo lidos, 
caso contrário tanto o livro quanto o leitor se perdem numa nuvem atemporal. 
Assim, o rendimento máximo da leitura dos clássicos advém para aquele que sabe 
alterná-la com a leitura de atualidades, numa sábia dosagem. E isso não presume 
necessariamente uma equilibrada calma interior: pode ser também o fruto de um 
nervosismo impaciente, de uma insatisfação trepidante.
Talvez o ideal fosse captar a atualidade como o rumor do lado de fora da 
janela, que nos adverte dos engarrafamentos do trânsito e das mudanças do tempo, 
enquanto acompanhamos o discurso dos clássicos, que soa claro e articulado no 
interior da casa. Mas já é suficiente que a maioria perceba a presença dos clássicos 
como um reboar distante, fora do espaço invadido pelas atualidades, como pela 
televisão a todo volume. Acrescentemos então:
— É clássico aquilo que tende a relegar as atualidades à posição de barulho 
de fundo, mas ao mesmo tempo não pode prescindir desse barulho de fundo.
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
78
— É clássico aquilo que persiste como rumor mesmoonde predomina a 
atualidade mais incompatível.
Resta o fato de que ler os clássicos parece estar em contradição com nosso 
ritmo de vida, que não conhece os tempos longos, o respiro do otium humanista; 
e também em contradição com o ecletismo da nossa cultura, que jamais saberia 
redigir um catálogo do classicismo que nos interessa.
Eram as condições que se realizavam plenamente para Leopardi, dada a sua 
vida no solar paterno, o culto da antiguidade grega e latina e a formidável biblioteca 
doada pelo pai Monaldo, incluindo a literatura italiana completa, mais a francesa, 
com exclusão dos romances e em geral das novidades editoriais, relegadas no 
máximo a um papel secundário, para conforto da irmã ("o teu Stendhal", escrevia 
a Paolina). Mesmo suas enormes curiosidades científicas e históricas, Giacomo as 
satisfazia com textos que não eram nunca demasiado up-to-date: os costumes dos 
pássaros de Buffon, as múmias de Federico Ruysch em Fontenelle, a viagem de 
Colombo em Robertson. Hoje, uma educação clássica como a do jovem Leopardi é 
impensável, e sobretudo a biblioteca do conde Monaldo explodiu.
Os velhos títulos foram dizimados, mas os novos se multiplicaram, 
proliferando em todas as literaturas e culturas modernas. Só nos resta inventar 
para cada um de nós uma biblioteca ideal de nossos clássicos; e diria que ela 
deveria incluir uma metade de livros que já lemos e que contaram para nós, e outra 
de livros que pretendemos ler e pressupomos possam vir a contar. Separando uma 
seção a ser preenchida pelas surpresas, as descobertas ocasionais.
Verifico que Leopardi é o único nome da literatura italiana que citei. Efeito 
da explosão da biblioteca. Agora deveria reescrever todo o artigo, deixando bem 
claro que os clássicos servem para entender quem somos e aonde chegamos, e 
por isso os italianos são indispensáveis, justamente para serem confrontados 
com os estrangeiros, e os estrangeiros são indispensáveis exatamente para serem 
confrontados com os italianos. Depois deveria reescrevê-lo ainda uma vez para 
que não se pense que os clássicos devem ser lidos porque "servem" para qualquer 
coisa. A única razão que se pode apresentar é que ler os clássicos é melhor do que 
não ler os clássicos.
E se alguém objetar que não vale a pena tanto esforço, citarei Cioran (não 
um clássico, pelo menos por enquanto, mas um pensador contemporâneo que só 
agora começa a ser traduzido na Itália): "Enquanto era preparada a cicuta, Sócrates 
estava aprendendo uma ária com a flauta. "Para que lhe servirá?", perguntaram-
lhe. "Para aprender esta ária antes de morrer".
FONTE: Adaptado. CALVINO, Itálo. Por que ler os clássicos. Companhia das Letras, 1993. 
Disponível em: <http://www.alfredo-braga.pro.br/discussoes/classicos.html>. Acesso em: 3 jun. 
2016.
79
RESUMO DO TÓPICO 1
 Nesse tópico você viu que:
• Para se constituir como ciência, a Antropologia se baseou nas teorias das Ciências 
Naturais.
• A busca por leis gerais da sociedade foi uma preocupação inicial da Antropologia.
• A teoria evolucionista influenciou uma visão linear das sociedades, da primitiva 
à civilização.
• A definição do conceito de cultura foi se complexificando ao longo do tempo.
• Cada vez mais os antropólogos saíram dos escritórios e foram a campo, fazer 
etnografia.
80
AUTOATIVIDADE
1 A emergência da Antropologia como ciência foi processual e definida de 
acordo com a circunscrição de seu objeto de estudo, sua metodologia e os 
conceitos-chave. Nesse sentido, inicialmente baseada na produção científica 
das Ciências Naturais, a Antropologia se aproximou dessas disciplinas para 
aos poucos se diferenciar, criando suas próprias teorias e metodologias. 
Logo, disserte sobre as teorias que influenciaram a Antropologia e como se 
deu o diálogo entre essas disciplinas. 
2 Cada vez mais a ideia de realizar o trabalho de campo entre os nativos é 
reificada na Antropologia. Bronislaw Malinowski foi o pioneiro nessa 
metodologia de forma mais metódica, passando temporadas entre eles 
e vivenciando o cotidiano junto aos nativos. A partir de seus estudos, 
comente sobre o aporte metodológico da Antropologia e o que permite essa 
metodologia em relação a outras ciências.
3 Visite um local diferente do seu cotidiano. Pode ser uma igreja, um mercado, 
um parque, um serviço de saúde. Passe ali um turno observando tudo o que 
acontece, podendo interagir com o ambiente e as pessoas. Depois, em casa, 
produza um diário de campo sobre essa experiência, detalhando os seus 
estranhamentos e percepções das situações vistas, fazendo comentários e 
trazendo as descrições do que viu, ouviu e sentiu em campo. Essa atividade 
fará com que você vivencie por um momento a experiência do trabalho 
de campo, de modo a se aproximar das metodologias utilizadas pelos 
antropólogos. 
81
TÓPICO 2
PERSPECTIVAS CLÁSSICAS DA TEORIA 
ANTROPOLÓGICA
UNIDADE 2
1 INTRODUÇÃO
Depois de conhecer o panorama geral da emergência da Antropologia 
como ciência, vamos nos aprofundar em cada escola que se apropriou dessa 
disciplina a fim de avançar em relação às suas teorias e suas metodologias. Essa 
divisão geográfica e temporal permitirá que se dê conta das especificidades de 
estudos antropológicos, e se conheça a possibilidade de reflexão a partir dessa 
matéria. Vamos lá então, acadêmico?
2 A ESCOLA FRANCESA
Baseado na herança da tradição intelectualista franco-germânica, Émile 
Durkheim (1858-1917) propôs a criação de uma nova matéria, de caráter científico, 
intitulada sociologia. Ou seja, o estudo da sociedade a partir do que é o próprio ser 
humano e suas relações sociais. Esta disciplina também formulava as bases para 
a antropologia, especificando o estudo do homem, na Escola Francesa. De forma 
rigorosa, o sociólogo define métodos e aplicações da nova ciência com o objetivo 
de colocá-la no mesmo patamar de outras áreas do conhecimento, e a antropologia 
aprofunda esses princípios de acordo com sua especificidade, numa perspectiva 
mais microssocial. 
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
82
2.1 REPRESENTAÇÕES COLETIVAS E FORMAS PRIMITIVAS DE 
CLASSIFICAÇÃO 
 FIGURA 14 - RITUAIS PRIMITIVOS
FONTE: Disponível em: <http://nepo.com.br/2014/11/25/religiosidade-primitiva
 -e-o-pensamento-fundamentalista/>. Acesso em: 6 jun. 2016.
Émile Durkheim é considerado fundador da Antropologia Francesa e da 
Sociologia Moderna, tendo sido influenciado pelas ideias de Auguste Comte e 
Herbert Spencer. O último já foi apresentado, mas Auguste Comte não. Este foi um 
filósofo e matemático francês, nascido em 1798. Suas ideias, de cunho positivista, 
reforçavam a teoria do darwinismo social, em que seriam naturais a evolução e o 
avanço da sociedade de um estágio inferior para outro superior, garantindo a vida 
dos grupos de indivíduos mais evoluídos. Essa visão influenciou os estudos dos 
fenômenos sociais. 
Durkheim fez uso dessas ideias e tentou resolver a questão da categoria 
do entendimento humano através da perspectiva do sujeito, e então elaborou 
os limites entre a filosofia e a sociologia/antropologia. Ele ressaltou que essas 
categorias não são inatas, mas construídas socialmente, visto que se concebe as 
categorias de entendimento como “representações coletivas” apreendidas na 
socialização dos sujeitos. Este sujeito durkheimiano é coerente, homogêneo e 
conhece objetivamente os fenômenos sociais em suas formas universais e imutáveis 
a partir dessas categorias de entendimento socializantes; assim, Durkheim espera 
resolver alguns problemas antigos da filosofia e fundar a nova disciplina.
Para ele, as “representações coletivas”, de caráter autônomo e vinculadas 
ao inconsciente do indivíduo que as possui, são configurações específicas 
estabelecidas a partir das mesmas categorias para todos, em que o homem – como 
TÓPICO 2| PERSPECTIVAS CLÁSSICAS DA TEORIA ANTROPOLÓGICA
83
ser social – pensa sua experiência através de conceitos. Por conseguinte, sendo 
possível o estudo dessas representações, a ciência sociológica pretende acessá-
las através de fenômenos por meio dos quais o grupo representa as suas práticas 
sociais no mundo, como, por exemplo, os ritos e os símbolos. A fim de alcançar 
o conhecimento das outras sociedades, o autor se vale do método comparativo 
cartesiano para a análise das diferentes “representações coletivas” existentes, e 
assim, diferencia esta disciplina da Psicologia que, para Durkheim, tinha como 
objeto de estudo as “representações individuais”. 
Portanto, o objeto de estudo da sociologia durkheimiana passa a ser os 
“fatos sociais” – que, em conjunto, são entendidos como um sistema permeado 
por “representações coletivas” –, caracterizados como coercitivos, exteriores 
aos indivíduos e gerais, sendo eles tratados como ‘coisas’. Nesta perspectiva, a 
dimensão histórica perde lugar para a abstração do tempo, de forma tal que a 
sociedade apresenta seu modelo de apreensão do mundo a partir do consciente 
coletivo (normas e valores). Para Durkheim, a manutenção da ordem social é 
referenciada pelo sentimento de solidariedade entre os indivíduos, sendo esta 
sociedade não resumida ao agrupamento das partes, mas há nela algo que seria 
“transcendente” e constrangeria coletivamente suas maneiras de pensar e as 
relações sociais.
 Essa certa consciência social poderia ser mantida nos ritos – como 
agenciando “representações coletivas” –, que seriam atualizados e reafirmados na 
sociedade em questão ao mesmo tempo em que a ação social realizada perpassaria 
o indivíduo e reforçaria o “todo”. Assim, a eficácia do rito mantém (cria e recria) 
a materialidade da sociedade por meio da conexão do indivíduo ao seu coletivo 
por esse “fato social” que é exterior aos sujeitos; logo, conhecer os símbolos 
dessas representações torna possível mensurá-los, e assim, formular hipóteses e 
explicações sociais.
Marcel Mauss (1872-1950) é seguidor das ideias de Durkheim, aprofunda 
sua reflexão teórica no sentido de tentar trazer, através do método comparativo, 
semelhanças estruturais entre as práticas presentes na sociedade contemporânea 
e todas as sociedades existentes na história. A partir do conceito de “fato social 
total”, este autor deseja estudar as práticas disponíveis na sociedade que remetam 
à sua totalidade, de modo que tudo o que acontece nesta sociedade é válido para 
formular sua compreensão. 
DICAS
Para compreender o que é Sociologia, temos de diferenciá-la da Filosofia e também 
da Psicologia, por isso se recomenda o estudo dessas diferenciações. Um dos links possíveis 
para esse estudo é <http://www.cafecomsociologia.com/2013/01/o-que-e-sociologia.html>.
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
84
Marcel Mauss nasceu em Epinal, na França. Ele era sobrinho de Émile 
Durkheim e participou das principais discussões sociológicas da época. Mauss 
teve um papel importante como fundador do jornal L’Humanité, foi militante do 
Partido Socialista e foi bastante ativo durante os debates mais radicais. Ele estudou 
história, dedicou-se à sociologia das religiões e posteriormente a linguística através 
do estudo do sânscrito. Em 1898 ele assumiu a cadeira de Religiões Indianas 
na seção dos estudos religiosos da Ecole Pratique des Hautes Etudes e em 1902 foi 
nomeado diretor de estudos das religiões primitivas dessa mesma instituição. 
Para Mauss, os fatos estão carregados de significações simbólicas – conforme 
expõe Durkheim (1989) ao se remeter às obrigações sociais –, no entanto podem 
compor novas configurações a partir de invariantes de um modelo inacabado, no 
qual o social só emerge como sistema integrado quando está atrelado à experiência 
individual. Mais preocupado com o todo do que com as partes, Mauss estuda as 
trocas sociais enquanto “fatos sociais totais”, como perpassadas por uma série de 
atividades heterogêneas e institucionalizadas, realizando, assim, um estudo da 
sociedade enquanto sistemas morais em que há uma flexibilização possível.
A partir da teoria dos ritos como estruturantes da vida social de Durkheim, 
Mauss (1974) propõe a Teoria Geral da Magia, na qual os ritos seriam como “ritos 
mágicos” – diferente dos ritos religiosos, dispostos num culto organizado –, com 
ações definidoras de outros elementos dessa magia, de modo que o pensamento 
mágico agiria como “representação coletiva” apropriado individualmente pela 
tradição, e, assim, seria reforçado pelo social. 
 
Na compilação de “Ensaio sobre a dádiva” (1924), Mauss estuda a 
reciprocidade entre os homens como atributo humano a fim de conceber as relações 
sociais pautadas nas trocas. A partir do potlach – forma de troca ‘mais evoluída’ –, 
entende que a dádiva está relacionada ao “sistema de prestações totais”, sendo 
elas desinteressadas e obrigatórias, com a consequência de que havendo uma 
instabilidade hierárquica entre diferentes chefes tribais, essa prática de dons e 
contradons estimula tanto a manutenção (ou não) dos laços sociais, como o fato 
de que a aceitação de um compromisso dignifica e prestigia aquele que expõe suas 
riquezas. 
TÓPICO 2 | PERSPECTIVAS CLÁSSICAS DA TEORIA ANTROPOLÓGICA
85
FIGURA 15 - FESTAS RITUAIS E TROCAS SOCIAIS BASEADAS NO POTLACH
FONTE: Disponível em: <http://www.donsmaps.com/
 potlatch.html>. Acesso em: 6 jun. 2016.
Por conseguinte, Mauss (1974) propaga três obrigações totais desse sistema 
de prestação: (1) obrigação de dar, em que se deve oferecer a outros clãs coisas 
para mostrar que se é favorecido pelos espíritos e por riquezas, e então coloca o 
donatário em relação de dívida estabelecendo um vínculo jurídico; (2) obrigação 
de receber, em que se deve aceitar o compromisso, e não agir dessa maneira seria 
recusar a aliança e a comunhão; e (3) a obrigação de retribuir, de dar de volta o 
"hau" da coisa dada, de maneira a colocar-se em constante troca com quem deu 
algo. 
Para Mauss (1974), há na “coisa dada” uma virtude produtora que explicita 
a personalidade do clã daquele que deu a “coisa”, forçando as dádivas a circularem 
entre as sociedades. Entretanto, o autor chega a esta explicação a partir da 
conclusão nativa sobre o “hau”, de que um indivíduo dá o objeto a outrem, sendo 
esse transferido para uma terceira pessoa, o último deve devolver este “espírito da 
coisa dada” através de algo de maior valor simbólico, até que se chegue ao primeiro 
doador, estabelecendo entre eles um “vínculo das almas” numa constante troca, 
que fundaria a reciprocidade. 
Enquanto Mauss pensava que a observação empírica do fato social seria 
suficiente para apreender a realidade em sua totalidade, Levi-Strauss (1974) 
entendia o observador como sendo da mesma natureza do seu objeto, logo, deveria 
considerar-se parte da observação – não haveria dicotomia rígida entre o sujeito 
e o fato social –, e que a vivência do fato como indígena lhe daria a consciência da 
diferença entre a sua teoria e a teoria indígena, o que não foi feito pelo autor do 
“Ensaio sobre a dádiva”. Consequentemente, para Levi-Strauss (1974), Mauss só 
replicaria o que diz o nativo, e destacaria a lógica ordenadora da dádiva conforme 
buscava, porém não construiria uma interpretação antropológica do pensamento 
humano.
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
86
2.2 PENSAMENTO SELVAGEM E ESTRUTURALISMO
FIGURA 16 - O PERFIL DE LÉVI-STRAUSS APÓS ENTREVISTA
FONTE: Disponível em: <http://www.substantivoplural.com.br/
 a-logica-do-sensivel/>. Acesso em: 6 jun. 2016.
DICAS
Para conhecer mais sobre o trabalho de Marcel 
Mauss, é possível ver o documentário "Marcel 
Mauss segundo suas alunas", produzido pelo 
NAVI/UFSC, que está disponibilizado na internet 
em partes. O link é <https://www.youtube.com/watch?v=4_bsGMv1Ns8>. 
TÓPICO 2 | PERSPECTIVAS CLÁSSICAS DA TEORIA ANTROPOLÓGICA
87
Claude Lévi-Strauss (1908-2009) nasceu em Bruxelas e estudou filosofia. 
Passou um período de ensino na França e em 1935 veio para o Brasil, sendo 
nomeado como professor na Universidade de São Paulo. Aqui ele realizou diversas 
expedições nos territórios indígenas.
 
Em 1940 voltou para a França, mas por causa da II Guerra Mundial foi para 
Nova York e assumiu uma cátedra na School of Higher Studies. Somente em 1948 
conseguiu voltar para a França, onde defendeu sua tese “Les structures élémentaires 
de la parenté” e “La vie familiale et sociale des Indiens Nambikwara”. Em 1950, Lévi-
Strauss sucedeu Maurice Leenhardt (1878-1954) na Ecole Pratique des Hautes Etudes 
e em 1958 foi eleito para o Collège de France, ficando ali até 1983, até se aposentar.
Lévi-Strauss aprofundou os estudos na Escola Francesa e tornou-se o 
fundador da Antropologia Estrutural. De maneira tal que se passa a realizar uma 
análise das estruturas da mente humana, e não das representações sociais (como 
propagava Durkheim) ou das relações sociais (como desejava Mauss). Tendo o 
pensamento humano como objeto antropológico, Lévi-Strauss foi fundador da 
Antropologia Estrutural na França. 
Nesse sentido, Lévi-Strauss afastou-se do estudo dos fenômenos conscientes 
para acessar estruturas do inconsciente, com a consequência de que a palavra (ou 
um átomo básico social, no caso do estudo do parentesco) não mais seria tratada 
como unidade independente, mas sim, em termos de suas relações entre si por 
meio de operadores binários refletindo as leis do inconsciente. Essa afirmação de 
Lévi-Strauss daria ensejo para o estabelecimento de leis gerais do pensamento 
humano – tanto para os ditos “selvagens” como para as sociedades “modernas” 
–retomando a discussão do clássico, que já vimos anteriormente.
Para ele, a estrutura social é composta por modelos de pensamento que 
permitem fazer classificações sociais, como nos sistemas totêmicos, em que 
os símbolos relacionados a animais e plantas são referenciados à ação social, 
de maneira que esses signos são inconscientemente apreendidos e, apesar de 
permitir transformações, e inovações para se complexificar, são limitados por 
suas combinações nas estruturas. Em outras palavras, para Lévi-Strauss, como se 
trata de um pensamento baseado numa lógica racional, as relações entre símbolos 
inconscientemente apreendidos são complexas, porque são recombinadas de 
diferentes maneiras. No entanto, mesmo assim esse autor apresenta essa estrutura 
de certa forma como sendo estática, em que ela só se renova em suas relações e não 
em seus conteúdos. 
Este antropólogo apresenta uma estrutura rígida e imutável, em que 
apenas no plano lógico é que surgem combinações entre simbolismos para 
articular a ação social. Lévi-Strauss se interessa pela análise do funcionamento do 
intelecto, no qual o modelo agenciado informa sobre fenômenos socioculturais e 
os mecanismos da mente. Diferente de Mauss, Lévi-Strauss considera as relações 
sociais como matéria-prima para a formulação dos modelos referidos da estrutura 
social, consequentemente os símbolos e signos são os meios para a comunicação 
entre os indivíduos. 
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
88
Segundo Lévi-Strauss (1975), o inconsciente é vazio de imagens, porém, 
através da sua estrutura, a função simbólica é de impor leis estruturais por meio 
da atividade inconsciente do espírito, impondo formas a um conteúdo. Por 
conseguinte, para este autor teríamos o produto social como sistema simbólico, e 
o antropólogo deveria se esforçar em dar uma explicação nativa baseada em uma 
explicação antropológica. 
Por isso, como afirma Lévi-Strauss (1975) na pergunta dessa questão – e 
explicitamos neste ensaio –, a Escola Francesa passa da análise do conjunto de 
“representações sociais” permeadas por ritos e símbolos, exterior ao indivíduo, 
que Durkheim espera agrupar fazendo uma sociologia do simbólico, para uma 
compreensão maussiana em que as relações sociais enquanto simbólicas agiriam, 
dessa maneira, no laço social entre os sujeitos. Entretanto, Lévi-Strauss se apropria 
dessas questões para ir além e procurar a origem desse simbólico “dentro” do 
indivíduo, uma vez que os símbolos são formas agenciadas nas estruturas do 
inconsciente do pensamento humano, configurando assim um “novo” objeto para 
o estudo antropológico.
Afastou-se do estudo dos fenômenos conscientes para acessar estruturas 
do inconsciente, de modo que a palavra (ou um átomo básico social, no caso do 
estudo do parentesco) não mais seria tratada como unidade independente, mas 
em termos de suas relações entre si. Essa afirmativa de Lévi-Strauss daria ensejo 
para o estabelecimento de leis gerais do pensamento humano – tanto para os ditos 
“selvagens” como para as sociedades “modernas”. A partir da escrita do prefácio 
do “Ensaio sobre a dádiva” (publicada pela primeira vez em 1950), de Marcel 
Mauss, Lévi-Strauss aprofundou sua proposta do estudo das estruturas da mente 
DICAS
Indicamos o documentário "Claude Lévi-Strauss: 
Saudade do Brasil", produzido em 2005 pela TV Senado, 
que reconstitui a experiência do antropólogo no país 
e problematiza suas questões teóricas. Está disponível 
em: <https://youtu.be/i32Mf_eeYJg>.
TÓPICO 2 | PERSPECTIVAS CLÁSSICAS DA TEORIA ANTROPOLÓGICA
89
humana e se posicionou criticamente sobre a questão da dádiva teorizada pelo 
autor do livro. 
Segundo Lévi-Strauss (1974), a solidariedade em Mauss articula relações 
reais e práticas entre a psicologia e a sociologia, de modo que se parte da ideia 
da psiquê para analisar a sociedade. O conceito de “fato social total” de Mauss 
traria, então, a ideia de que o social só emerge como sistema integrado quando 
está atrelado à experiência individual. Assim, Lévi-Strauss se apropria dessa ideia 
de complementariedade entre o psíquico e o social para interpretá-la como relação 
dinâmica, em que tanto um como o outro compõe os significados que permeiam os 
simbolismos da vida social, de modo que só se pode apreendê-lo a partir da síntese 
entre as duas dimensões, sem subordiná-las.
 Baseada nessa análise, a observação empírica do fato social total não seria 
suficiente para apreender a realidade em sua totalidade, como pensava Mauss, o 
que faz Lévi-Strauss chamar a atenção de que o observador é da mesma natureza 
que seu objeto, e essa questão deveria ser considerada como parte da observação. 
Assim, não haveria uma dicotomia rígida entre o sujeito e o fato social, e o etnógrafo 
deveria se esforçar para viver o fato como indígena, mas tendo noção da dimensão 
entre a sua teoria e a teoria indígena.
Da mesma forma, o pesquisador não poderia deixar que a sua apreensão 
subjetiva se sobrepusesse – de maneira totalizante – sobre a teoria indígena. Na 
busca obstinada de Marcel Mauss pela lógica ordenadora da dádiva, as atividades 
sociais de trocas são observadas, mas Levi-Strauss entende que o antropólogo só 
apreende as três obrigações relacionadas à troca e não aprofunda essa questão como 
forma do pensamento humano. Dessa forma, Mauss é criticado por Levi-Strauss 
por deixar-se mistificar pela teoria “indígena” ao entender que a restituição de um 
objeto dado carregaria algo como um “espírito da coisa”. Assim, Mauss não entra 
no mecanismo de funcionamento das trocas sociais entre os grupos estudados, 
o que Levi-Strauss vai tentar explicar pela via da capacidade de simbolizar, até 
chegar nas estruturas inconscientes do espírito.
Este antropólogo está mais preocupado com a estrutura dessa teoria da 
dádiva, que revelaria a virtude da troca, não só enquanto ato de troca, mas como 
concepção. Para ele, o “hau” não seria o último motivo da troca, como expõe Mauss, 
de modo que ela não é real, é da ordem do pensamento. Assim, Levi-Straussentende 
que a teoria indígena está numa relação mais direta com a realidade indígena do 
que com uma teoria proposta e elucidada de Mauss. Resumindo o que esclarece 
Levi-Strauss (LEVI-STRAUSS, 1974, p. 32):
 
A troca não é um edifício complexo, construído a partir de obrigações 
de dar, receber e retribuir, com auxílio de um cimento afetivo e místico. 
É uma síntese imediatamente dada ao e pelo pensamento simbólico, que 
na troca como toda outra forma de comunicação, supera a contradição 
que lhe é inerente de perceber as coisas como elementos de diálogo, 
simultaneamente sob a relação de si e do outro e destinadas por natureza 
a passar de um para o outro. 
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
90
Assim, para este autor teríamos o produto social como sistema simbólico, 
e o antropólogo deveria se esforçar para dar uma explicação nativa baseada numa 
explicação antropológica. Esse raciocínio contribui com os estudos antropológicos 
posteriores.
3 A ESCOLA AMERICANA 
Outra vertente emerge nos anos de 1920, baseada numa relação entre 
“cultura e personalidade”. Essa perspectiva centrou-se na personalidade dos 
membros de cada sociedade, os considerando como produto de sua cultura. 
Tinha duas etapas claras: a primeira, influenciada pela psicologia, considerando 
o indivíduo como principal objeto de pesquisa; e a segunda, mais voltada para as 
noções de “personalidade básica” e de caráter nacional. As principais expoentes 
destacadas dessa escola são Ruth Benedict e Margaret Mead. O contexto é pós 1ª 
Guerra Mundial e início da 2ª Guerra Mundial, no qual se deseja compreender as 
lógicas de outras sociedades objetivando uma ação militar mais harmoniosa. 
DICAS
Levi-Strauss ainda discutiu sobre outras questões, do âmbito mais geral 
em Antropologia, que podem ser acessadas on-line numa compilação 
de textos didáticos e objetivos. O livro se chama "Raça e Cultura", de 1952, 
com traduções em português e separado por temáticas relevantes, no 
link: <http://disciplinas.stoa.usp.br/pluginfile.php/965742/mod_resource/
content/1/Ra%C3%A7a-e-Hist%C3%B3ria-L%C3%A9vi-Strauss.pdf>. 
TÓPICO 2 | PERSPECTIVAS CLÁSSICAS DA TEORIA ANTROPOLÓGICA
91
3.1 CULTURA, PERSONALIDADE E GÊNERO
FIGURA 17 - RUTH BENEDICT
FONTE: Disponível em: <https://en.wikipedia.org/wiki/Cultural
 _anthropology>. Acesso em: 11 jul. 2016.
Ruth Fulton Benedict (1887-1948) nasceu em Nova York, nos EUA. Em 1919 
iniciou seus estudos de Antropologia na New School for Social Research, e no ano de 
1922 matriculou-se na Columbia University e trabalhou como assistente de Franz 
Boas no Barnard College. Ali se inspirou para a realização da primeira experiência 
de campo entre os Serranos no sul da Califórnia, e desenvolveu uma pesquisa 
comparativa entre os índios americanos, resultando em material para sua defesa 
de doutoramento em 1923.
A partir destas pesquisas, Benedict concebeu a Teoria da Configuração 
Cultural, segundo a qual cada grupo selecionaria um arsenal de recursos humanos 
dentre possibilidades diversas, estabelecendo assim suas próprias feições culturais. 
Essa perspectiva converge à ideia de que um todo cultural (ou linguístico) 
determinaria a natureza das partes e suas relações.
As ideias de Benedict serão melhor desenvolvidas na obra “Padrões de 
Cultura”, de 1934, já que nessa obra argumenta a possibilidade de compreensão do 
processo de transformação e de diferenciação das culturas, junto a cada tradição, 
modelando a conduta humana dos membros em questão. Para compreender os 
padrões culturais dominantes, a autora estuda as diferentes formas de expressão 
culturais e variedades de costumes nas vidas dos indivíduos.
UNIDADE 2 | PERSPECTIVAS SÓCIO-HISTÓRICAS DA ANTROPOLOGIA
92
O método utilizado é o fato de que cada membro tem sua “história de vida” 
como prova concreta da acomodação aos padrões tradicionalmente transmitidos 
pela cultura que vive. Desse modo, a antropóloga reforça sua defesa de que a cultura 
não seria transmitida biologicamente e se contrapõe ao método evolucionista, que 
pretende agrupar fragmentos culturais de épocas e locais distintos para estabelecer 
a historicidade da conduta humana, como também já criticava Boas.
Para Benedict, a cultura está referida em um modelo mais ou menos 
consistente de pensamento e ação, em que não se tem só a soma de feições 
particulares, mas cada cultura teria um arranjo único e uma única inter-relação 
entre as partes, resultando assim numa “nova entidade”. Desse modo, como Boas 
compreende a “configuração” (ou modelo cultural) como espírito de cada cultura, 
Benedict pretende estudar as partes, não só enquanto partes, mas considerando 
o “conjunto cultural”. Sua crítica é para com os trabalhos antropológicos que 
preferem destacar a análise de feições culturais ao invés do estudo da cultura como 
um todo articulado, na qual se possibilitaria contextualizar suas diferentes formas 
de combinações. 
Para tanto, a antropóloga entende que se deve estudar as sociedades 
primitivas, e não as sociedades contemporâneas. Como um “laboratório” de 
análise da diversidade de instituições humanas, as culturas primitivas teriam 
um relativo isolamento regional e vários séculos para elaborar temas culturais 
apropriados. Elas não seriam consideradas inferiores, entretanto teriam menos 
conexões históricas e poderiam ser estudadas enquanto totalidades. 
Assim prontas, seriam fontes vivas de informações sobre as variações de 
ajustamentos humanos, permitindo a compreensão dos processos culturais. Nesse 
sentido, a tradição cultural das sociedades primitivas é percebida por Benedict 
como simples, contrapondo-se à nossa complexa civilização, sendo possível 
apreender a conduta humana e a moral dos membros ajustadas num padrão bem 
definido como numa cultura homogênea.
A autora deixa claro que não pretende fazer a reconstituição da origem 
humana, nem estabelecer uma generalização através de uma lei social geral. 
Seu objetivo é estudar a distribuição de feições universais da sociedade humana 
encontrada em diferentes combinações e associações, por meio do conhecimento 
da “infância” da humanidade. 
Para tanto, a metodologia empregada é o registro das formas e condições 
variantes, como fez em “Padrões de Cultura”, ao comparar os Zuni do Novo México, 
os Kwakiutl da ilha de Vancouver e os Dobuanos da Melanésia, exercitando certo 
relativismo cultural ao destacar que o que é entendido de uma forma numa cultura 
é entendido de diferente maneira em outra.
Durante a 2ª Guerra Mundial, Benedict trabalhou para o Army Information 
Bureau, no War Department, onde apoiou a entrada dos EUA na guerra contra o 
racismo do totalitarismo alemão e desenvolveu uma monografia sobre o Japão, a 
TÓPICO 2 | PERSPECTIVAS CLÁSSICAS DA TEORIA ANTROPOLÓGICA
93
fim de que se pudesse compreender os contextos de mudanças sociais e determinar 
se o imperador deveria ficar ou sair do país. Ela não era muito dedicada ao trabalho 
de campo, e em seu livro “O crisântemo e a espada” (1946) defendeu a possibilidade 
de estudar os japoneses sem ter ido ao Japão, valorizando a pesquisa de “cultura 
à distância”, de forma que considera o contato com adultos – que desenvolveram 
sua personalidade em tal cultura – uma fonte fidedigna sobre a cultura, mesmo o 
indivíduo estando em outro local. 
Desde 1923, Benedict assumiu a cadeira de Antropologia na Columbia 
University, onde orientou diversos trabalhos sobre Apaches do Sudoeste (1930), 
Blackfoot das Planícies do Norte (1938) e pesquisas comparativas entre até mesmo 
culturas contemporâneas. Em 1948, então presidente da Associação Americana de 
Antropologia, Benedict morre.
FIGURA 18 - MARGARET MEAD ENTRE NATIVOS
FONTE: Disponível em: <https://www.letemps.ch/culture/2016/02/26/margaret-
mead-anthropologue-scandale>. Acesso em: 6 jun. 2016.
Margaret

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