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P 157 A Nave Explorer em Perigo Clark Darlton

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A NAVE EXPLORER
EM PERIGO
Autor
CLARK DARLTON
Tradução
S. PEREIRA MAGALHÃES
Digitalização e Revisão
ARLINDO_SAN
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Os insetos destruidores que ninguém consegue matar!
A falange do horror num avanço que não se pode conter!
Surgiu o ano 2.326 da cronologia terrana e, nos últimos dois séculos, realizaram-se transformações radicais na parte da Via Láctea explorada pelos astronautas terranos. Desde 1o de janeiro de 2.115, data em que Atlan abdicou ao cargo de Imperador de Árcon, não existe mais nem o Império Solar nem o Reino Arcônida, mas tão-somente o Império Unido, a cuja frente está Perry Rhodan como grande administrador, enquanto que o arcônida
Atlan é o chefe da USO, o “Corpo de Bombeiros Galáctico”.
Sempre que surgem problemas ou situações de emergência que extrapolam os limites da administração de um planeta, podendo exercer influência no âmbito Galáctico, entra então em ação a USO, criada e dirigida pelo Lorde-Almirante Atlan.
Na procura frenética dos ativadores celulares, distribuídos pela imensidão da Galáxia pelo Ser do planeta Peregrino, antes de sua fuga precipitada, já se positivou a ação benéfica e imprescindível da USO para conservar a paz no Universo.
Depois, também na Missão de Eysal, o planeta dos salonos, aconteceu um contratempo de graves conseqüências a um dos melhores agentes da USO, Lemy Danger, o “anão”, que faz um disparo pelo assim chamado “gerador de impulso frontal com energia gravitacional”. O que estas ondas de impulsos frontais em planos pentadimensionais da Galáxia podem produzir, é presenciado pela tripulação de uma nave, seguindo-se logo depois o grito de alarma: “A Nave Explorer em Perigo”!
= = = = = = = Personagens Principais: = = = = = = =
Coronel Schonepal — Comandante da Explorer-3218.
Tenente Borowski — Cientista e um sujeito muito prático.
Professor Nordmann — Cosmólogo; abnegado pesquisador.
Garret — A primeira vítima dos insetos impiedosos.
Tenente Higgins — Um voluntário tragado pelo inimigo.
Gucky — O fantástico mutante que, depois de suas ações espetaculares, vai simplesmente dormir.
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Quase mais ou menos quatrocentos e sessenta e oito milhões de anos foi o tempo gasto durante uma única rotação ao longo da Via Láctea... Apenas a metade deste tempo seria necessária para que a Terra, junto com o Sol e todos os seus planetas, chegasse até o centro da Galáxia e voltasse a seu ponto de partida...
A seu antigo ponto de partida, mas não ao mesmo lugar, pois a própria Via Láctea não apenas tem sua rotação, como também acompanha o movimento ou deslocamento próprio a todas as galáxias. Não há nenhum corpo celeste que não execute pelo menos três movimentos distintos, alguns até mesmo quatro ou cinco...
O próprio homem que se movimenta na superfície da Terra está sujeito a esta lei. Ele anda — é o primeiro de seus movimentos. Em segundo lugar, está envolvido no movimento de rotação de seu planeta, que, com uma velocidade supersônica, o transporta ao longo da linha equatorial. Já que a Terra se translada em torno do Sol, o homem participa também deste movimento, com a velocidade de cerca de trinta quilômetros por segundo. E, finalmente, o Sol com seu sistema gira em torno do centro da Via Láctea. Acrescentando a isto a velocidade radial, teremos cinco movimentos para o homem, movimentos distintos, enquanto ele propriamente apenas dê passadas em terra firme...
Eram estas as divagações reticenciadas que passavam pela mente do Coronel Jak Schonepal, quando caminhava para a central de comando a fim de substituir o Capitão McNamara. Um simples olhar para a grande tela frontal lhe indicava que a Explorer-3218 prosseguia firme na mesma rota, deixando a Terra a mais de dez mil anos-luz para trás. O retículo no quadro de posicionamento apontava para o trecho pobre em estrelas do próximo braço espiralado da Galáxia. A missão da nave de exploração era percorrer a Galáxia, contornando-a por fora e no sentido de sua rotação.
“Um movimento a mais”, pensava Schonepal, cumprimentando os oficiais que se encontravam na central de comando.
O sargento Hoax, que no momento servia de radiotelegrafista, mas cuja profissão verdadeira era a medicina, enfiou a cabeça para fora da pequena abertura da porta, que ligava a cabina de rádio com a central de comando. Sorriu e fez um aceno, desaparecendo logo depois. Foi como se dissesse ao comandante que tudo corria normalmente.
“Minha tripulação é mesmo maravilhosa”, pensou Schonepal, tomando lugar em sua poltrona diante dos controles.
Era o normal em todas as astronaves do tipo Explorer. Cada um dos tripulantes era um exímio cientista de alta especialização, mas ao mesmo tempo um técnico, um telegrafista, um perito em armas, etc.
“Nossa frota de exploração da Galáxia é mesmo algo de singular e ninguém jamais poderá pensar coisa mais acertada, pelo menos enquanto sabemos”, continuava refletindo. “Quanto ao que não sabemos, temos de procurar e investigar. Esta é a nossa missão. Já descobrimos muita coisa, muitas raças estranhas e mundos desconhecidos. Entramos em contato com todos que nos pareciam de algum interesse. Os humanóides são a cúpula, a quinta essência da criação, pelo menos até o momento...
“Possuímos quase dez mil Explorers. Minha astronave leva o número 3218 — um número como qualquer outro, podia-se pensar. Este número nada diz do tamanho de nossa nave esférica, que, em flagrante contraste com suas irmãs, tem apenas duzentos metros de diâmetro e uma tripulação de somente quatrocentos homens. Tripulação não é bem a expressão, melhor seria dizer equipe de especialistas. Longos anos de estudos, acurada aprendizagem por hipnotismo, rigorosa seleção, até chegar finalmente o momento de entrar em ação...
“Estou feliz por ser comandante da 3218. Não posso imaginar nada mais belo e excitante. Deixamos a Terra muito para trás e penetramos em espaços onde até hoje não apareceu nenhum ser humano. Estamos banindo do mapa sideral os trechos em branco, isto é, inexplorados. Somos os ‘Colombos’ da era cósmica, os aventureiros modernos. Há naves Explorers que trazem de volta para a Terra resultados magníficos, como por exemplo, a descoberta de novas raças, e que dão novos nomes para os catálogos siderais. Há, porém, também Explorers que nunca mais regressam. Vítimas de abnegada intrepidez, ficam perdidas na imensidão infinda...
“Nossa missão cabe curta e simplesmente em rápidas palavras: circunavegação da Galáxia no sentido da rotação. Com ousada tração linear não é uma tarefa absurda, mas de qualquer maneira é algo de gigantesco. Vamos percorrer cerca de trezentos e sete mil anos-luz. Temos apenas dez mil atrás de nós...”
— Senhor...?!
O tenente-coronel estremeceu literalmente, despertando de seus devaneios. Era o oficial navegador e biólogo, Tenente Wassil Borowski, que entrara central a dentro em sua direção, tendo na mão uma folha plástica com os cálculos da positrônica de bordo.
— Sim, tenente?
— Senhor, aqui estão os dados que o primeiro oficial pediu.
— Ah! Ele pediu dados? Não sabia. 
Schonepal tomou a folha e leu. Os dados já estavam em texto legível.
— Um agrupamento de dezoito sóis? Distância cerca de duzentos a dois mil anos-luz. Na saída do braço espiral... Então, em breve, estaremos fora da região sem estrelas!
— Para isto falta muito ainda, senhor! A distância é muito grande — disse Borowski. — Assim que tiver novos resultados, lhe comunicarei. Daqui a duas horas estaremos já bem perto.
Schonepal lhe agradeceu com um movimento de cabeça e apanhou um mapa da região. O braço espiralado, que estavam agora sobrevoando, achava-se apenas indicado. Sua extensão não estava ainda bem exata, como também não se sabia o número de estrelas, muito menos o dos planetas.
“Seria mesmo uma coisa sem sentido e quase doida”, continuou Schonepal em seu monólogo íntimo, “se encontrássemos um ativador por aí. Não seria nada impossível, pois o incrível objeto é sempre localizado nos lugaresmais estranhos de planetas desconhecidos. Restam ainda alguns que não foram descobertos. As histórias que se ouvem a respeito das peripécias na sua procura correm de boca em boca. Parece que houve até insurreição da tripulação em algumas astronaves, pois todos desejavam o ativador. Isto nunca acontecerá aqui comigo, minha gente é ordeira... Ou será que não é?”
O Coronel Schonepal ainda ficou muito tempo refletindo sobre estas coisas, sem ser perturbado. Tudo a bordo parecia uma rotina de perfeita automatização, enquanto a Explorer-3218 devorava o espaço com a velocidade da luz. Cada um sabia o que tinha de fazer e o comandante sentia-se no direito de refletir sobre tudo que realmente pudesse acontecer.
“Esta história dos ativadores celulares para substituir as duchas renovadoras ou regeneradoras do planeta Peregrino é mesmo uma coisa muito perigosa. Alguns dos mais célebres mutantes já morreram. Anne Sloane foi assassinada por causa de um ativador. Se ao menos alguém soubesse por que o Ser imortal fugiu do planeta Peregrino... Realmente, é uma coisa perigosa...”
Ao pensar em perigo, Schonepal interrompeu sua meditação, olhou de novo para a tela frontal e procurou se orientar.
O trecho final da saída do braço espiralado ficava cada vez mais próximo. Muitos sóis já se podiam ver a olho nu. Logo começaria o trabalho dos aparelhos de rastreamento, os dados exatos viriam e então se saberia quais os sóis que tinham planetas e entre eles quais estariam aptos para a existência de seres humanos.
Começou o zumbido dos instrumentos. Wassil Borowski estava ocupado com os dados que entravam, passando-os depois para o computador de bordo. Schonepal olhava para a tela frontal, vendo muito sóis duplos. Um sol amarelado lhe chamou mais a atenção. Mais isolado, lembrava-lhe muito o Sol da Terra. Se possuísse planetas, haveria até a possibilidade de que...
— Dos sete sóis, apenas dois estão assinalados com planetas — disse o oficial navegador, transferindo os dados para o mapa. — O sol duplo Ex-Ypsarit tem um planeta gasoso. O astro Ex-Zannma possui cinco planetas, é do tipo do nosso Sol. Distância cento e trinta anos-luz.
— Você está falando daquele sol amarelo lá no fundo? — perguntou Schonepal, apontando para a tela frontal. — E o computador de bordo o chamou de Ex-Zannma? Nome maluco, se quiser saber minha opinião.
— Não é nossa culpa, senhor, não temos a menor influência em tudo isto. Aguardamos suas ordens, senhor.
Schonepal ficou surpreso consigo mesmo ao perceber que não tivera um segundo de dúvida. Um impulso íntimo o levou, quase automaticamente, a escolher como rota o sistema amarelo. Em si, não era nada de anormal, pois Ex-Zannma era o único sol com planetas que podiam despertar maior interesse. Não havia outra opção. No entanto, era um impulso esquisito. Schonepal tentou esquecê-lo.
— Tenente, faça os cálculos para a rota de Zannma, vamos dar uma olhada nos planetas. Se são cinco, haverá pelo menos um que esteja na faixa de condições de vida vegetal e animal.
Schonepal não precisava se preocupar com mais nada, todo o resto corria automaticamente. Somente depois que chegassem todos os dados sobre os cinco planetas, é que teria que tomar nova decisão, ou melhor, se deviam ou não fazer uma aterrissagem. E isto também dependeria de muitos fatores que por enquanto não estavam definidos.
Sendo assim, o Comandante Schonepal tinha mais uma oportunidade de mergulhar novamente em suas meditações. Enquanto seus olhos não se arredavam da tela e seus ouvidos recebiam com certo prazer o ruído já familiar dos motores, seus pensamentos voaram para antigas aterrissagens. Naquela época, a Explorer-3218 fazia pela primeira’ vez viagens para mundos estranhos e desconhecidos. Nem sempre o negócio fora tão simples.
Uma estrela idêntica ao nosso Sol... devia ser um bom augúrio, pelo menos, embora não pudesse se basear apenas em palpites favoráveis. O melhor era estar pronto para o que desse e viesse. Às vezes, Schonepal chegava mesmo a pensar que seria melhor que Perry Rhodan mandasse equipar as naves Explorers com raios transformadores. Mesmo sendo a arma mais terrificante que existia, sua presença não deixava de trazer uma grande tranqüilidade. Não se devia usá-la, mas nesta imensidão da Galáxia, expostos ao pior — o desconhecido — seria útil.
“Serão suficientes os raios convencionais, os canhões atômicos?”, indagou-se mentalmente. “Tenho que me lembrar de novo do desgraçado planeta das pedras vivas, descoberto por nós há pouco mais de ano e meio. Nunca me esquecerei deste malfadado mundo. Primeiro, pensávamos que se tratava de um mundo desabitado, pois não achamos nem uma raiz de capim. Tudo eram montanhas, mares e pedras, aliás pedras muito singulares, de todos os tamanhos e tipos. Estavam isoladas ou em grupos, às vezes desordenadamente, outras muito bem-dispostas, como se alguém, caprichoso, as tivesse espalhado à base de um planejamento estético. Aterrissamos. E, de repente, as pedras se tornaram vivas, vivas demais. Rolavam sobre nós e, quem fosse atingido por elas, estava perdido. Desaparecia simplesmente junto com a pedra que o atingira. Não sabemos até hoje do que estas pedras se alimentavam, quando nenhuma nave ali aterrissava...
“Ah! Se naquela época possuíssemos os raios transformadores, as perdas não teriam sido tão grandes. Assim perdemos lá vinte homens e três mulheres do Setor de Química. As pedras assassinas eram insensíveis aos raios térmicos, somente bombas nucleares é que podiam destruí-las. Mas, em última análise, a frota terrana de exploração cósmica não foi criada para produzir desertos nucleares...
“Ou o caso dos sáurios blindados! Pensávamos primeiro que o planeta verde das matas virgens fosse habitado por sáurios.
Até um certo ponto isto era verdade, mas eram sáurios muito especiais. Pareciam muito inofensivos, até que um grupo de cientistas e biólogos deixou a nave de exploração e se aproximou dos terrenos alagadiços. Tivemos o cuidado de observar todas as medidas de precaução. Apesar disso, perdemos trinta homens e sete mulheres. Os sáurios, verdadeiros monstros metazoários, lhes cortaram o caminho de volta e se abateram sobre eles. Todos se defenderam com armas adequadas, mas até suas pistolas de raios energéticos conseguirem calcinar a terrível carapaça desses animais, já estavam mortos ou devorados. Depois disso, o ataque dos répteis blindados foi contra a espaçonave. Coisa não fácil de se acreditar: sua carcaça era tão resistente que chegaram a produzir pequenas amassaduras no tremendo aço blindado do casco da nave. Não nos restou outra alternativa senão desaparecer do planeta o mais depressa possível, transformando-se assim o mundo das florestas verdejantes em mundo proibido. Nem quero pensar no planeta do plasma que...”
— Senhor...?
Era de novo a voz de Borowski.
— Sim, o que é?
— A rota já está pronta, senhor. Ex-Zannma está exatamente a dez anos-luz daqui. O computador de bordo entregou agora os primeiros resultados práticos. Pelos seus cálculos, devemos preferir o segundo planeta, cujo nome é Zannmalon. Os demais são impraticáveis para nossos estudos.
— Zannmalon? — Schonepal olhou novamente para a tela frontal, vendo ainda o sol amarelo. — Gostaria de saber que critérios usa nosso automático para selecionar nomes tão malucos. Temos que quebrar a língua para pronunciar palavras tão exóticas.
Borowski não deu atenção à observação do comandante.
— As equipes de trabalho dos astrônomos já começaram a interpretar os dados, senhor. Dentro de uma hora, a velocidade será reduzida para vinte por cento abaixo à da luz. As medidas de segurança, como sempre, senhor?
Schonepal lembrou-se das pedras vivas, das carcaças blindadas dos sáurios e mais horrores ainda.
— Todos os postos de artilharia devem ser ocupados. Estado de prontidão, com todas as medidas de precaução vigentes. Toda segurança é pouca. Inicialmente, nada de aterrissar. Está me compreendendo, Borowski?
— Naturalmente, senhor. Estado de prontidão númeroum, até que seja dada ordem em contrário.
Schonepal fez um gesto confirmando. Desta vez não queria omitir nada e iria usar de toda cautela. Não haveria de sofrer mais dissabores com imprevistos, mesmo que a Explorer-3218 tivesse que orbitar planeta por duas ou três semanas, antes de poder aterrissar. Não, desta vez não haveria pedras vivas, sáurios ou planeta de plasmas. Não com Jak Schonepal.
Algumas vezes, porém, nem toda a cautela do mundo pode adiantar.
* * *
Exatamente no dia 1o de agosto do ano 2.326, a Explorer-3218 se aproximava do Sistema Ex-Zannma, passou pelos três planetas externos e voou diretamente na direção de Zannmalon, o segundo planeta. Neste momento, estava a doze mil duzentos e doze anos-luz da Terra.
Schonepal entrou em órbita e começou o trabalho com os especialistas. Era grande a atividade em todos os setores científicos. Zannmalon começou a ser estudado antes que qualquer ser humano nele pisasse. Instrumentos de todos os tipos analisavam os resultados das pesquisas que depois eram enviados para os computadores. Tudo convergia para o centro de informações, de onde o comandante recebia os resultados finais.
Schonepal não estava mais sozinho. Seu primeiro oficial voltara para a cabina de comando e o ajudava. Capitão McNamara era corpulento, mas não podia ser chamado de gordo. Tinha no rosto sempre uma expressão de jovialidade, sendo mesmo considerado pelos colegas como um homem alegre e otimista. A tripulação lhe dedicava muito mais simpatia do que ao próprio Comandante Schonepal.
— Não parece nada mau — disse ele, selecionando o material que estava entrando.
Schonepal respondeu apenas com um movimento de cabeça. Pegou todo o acervo de dados.
— Zannmalon é um planeta do tipo da Terra, do mesmo tamanho e da mesma gravidade. Nas regiões tropicais, densas matas virgens e rios caudalosos. Três grandes continentes e muitos mares. Existe também um bom número de vulcões extintos, que formam uma certa parte da paisagem. Montanhas de porte médio, pólos com gelo derretendo. Até agora só se constatou vegetação. Pelas informações, parece não existir nenhuma fauna.
— Um mundo que tem, portanto, apenas flora — disse McNamara, dando um tom diferente à sua voz. — Quer dizer então que desta vez devemos estar precavidos não com os animais ou com seres humanos, mas com as flores.
— Exatamente, capitão. Se neste planeta não existe outra coisa a não ser plantas, então elas representam logicamente a forma de vida aqui reinante. Sabemos que podem existir plantas inteligentes e que algumas delas são mesmo agressivas e perigosas.
Olhou depois para Borowski, que lhe apresentou mais folhas de papel.
— Algo de novo?
— A sala de rádio anuncia a recepção de impulsos semi-orgânicos, senhor. Não são impulsos transmitidos de origem conhecida. Vêm misturados com irradiações de matéria, irradiações estas que não são de origem atômica, pois não existe radioatividade.
Schonepal examinou as muitas folhas de papel.
— Alguma explicação?
— A interpretação das emissões acentua que não se trata de irradiações produzidas artificialmente nem de transmissões. Mais do que isto, não se sabe, senhor.
Schonepal era físico e chefe da equipe científica. Comandante da Explorer-3218 ele o era, neste caso, somente em segundo plano. Impulsos semi-orgânicos acumulados em irradiações da matéria, ele não conhecia, embora conhecesse muitas outras coisas...
— Que acha disso, McNamara?
O primeiro oficial falou, mas indeciso:
— Plantas, senhor? Com elas tudo é possível. Devem ser elas que provocam esta irradiação. Quem sabe este é seu meio de comunicação e estão participando a toda a flora a nossa chegada?
— Gozador, hein?
Fez uma pausa e, ao prosseguir, Schonepal estava sério:
— Podia também ser uma espécie de arma de defesa, cuja ação se vai ver mais tarde.
McNamara olhou perplexo.
— Arma de defesa, senhor?
O comandante, de fisionomia carregada, assentiu com a cabeça.
— Estou preparado para tudo. De início, não se pode pensar em botarmos o pé em terra.
Duas horas mais tarde, o computador de bordo corrigiu os resultados da interpretação de dados até o momento, admitindo a existência de vida animal. Tratava-se de animais aquáticos quase pré-históricos, constatados na região equatorial do planeta. Fora da vegetação, pareciam ser os únicos seres de vida orgânica do segundo planeta do sol Ex-Zannma.
— Então, temos uma fauna aquática — disse Schonepal com uma ponta de orgulho. — Isso me tranqüiliza um pouco. Se as plantas fossem mesmo as donas absolutas e inteligentes do planeta, não permitiriam isso. Em hipótese alguma. Acho que agora podemos pensar em descer no planeta. Encarregue-se da composição do primeiro grupo que examinará as condições deste mundo.
Era uma coisa que não precisava ser dita duas vezes ao Capitão McNamara. Enquanto Schonepal tomava as providências para a aterrissagem e procurava um local adequado para o pouso, o capitão reunia sua gente. Se o planeta não apresentava nenhum perigo, o grupo podia ser aproveitado na segunda e terceira fases.
Neste meio tempo, Schonepal encontrara exatamente o que procurava e a Explorer-3218 desceu mansamente, parando a grande altura, na margem do oceano equatorial. Um amplo curso d’água vinha da direção norte, depois de ter serpenteado por vales tortuosos. Antes de sua desembocadura no oceano, descrevia uma grande curva na planície com vegetação muito rala.
Para esta planície é que a Explorer se dirigiu. Schonepal mandou chamar Borowski.
— É possível constatar de que direção vem esta confusa irradiação?
— Não com muita exatidão, senhor. A exploração dos sinais de rádio supõe que sua origem esteja nas montanhas; não há, porém, certeza a respeito.
— Vamos aterrissar ali na planície. De um lado, teremos o mar, isto é, no sul. A leste sobra-nos uma faixa de terra de uns dois quilômetros, terminando também no mar. Pelo oeste e pelo norte, estamos confinados pelo rio. Se formos atacados, teremos boa posição para a defesa — olhou para cima. — Vem então da montanha? Vamos continuar atentos.
A tranqüilidade de Schonepal era apenas por fora. Por dentro, sentia uma ânsia irrefreável de aterrissar, para ficar livre das dúvidas. Tinha certeza de que neste momento não estava sendo um comandante cem por cento eficiente. Mas este estado de espírito, esta excitação febril, o acometia sempre que estava para descer num planeta desconhecido. Tudo podia acontecer, a coisa mais incrível podia se tornar realidade. Por certo encontrariam formas de vida tão estranhas e berrantes, que a mais exuberante fantasia não chegaria a descrever. As matas virgens da Via Láctea encerravam mistérios que extrapolavam as possibilidades imagináveis.
Fazia grande esforço para se manter calmo.
Na tela frontal, duas peculiaridades do estranho panorama eram observadas. Num céu quase azul estava um sol maior que o nosso; em compensação, a apenas dois terços de distância de uma unidade astronômica. Na planície — uma península entre o rio e o mar — podiam-se distinguir agrupamentos de moitas ou trechos de cerrado, havendo de permeio dunas de areia e regiões parecidas com estepes. O rio tinha dois quilômetros de largura. Bem mais para o norte estavam as montanhas, com mais de cem quilômetros de extensão, cinco ou seis de largura, cuja altura não passava de dois mil metros. Os pés da montanha — a nascente do rio — estavam cerca de quinze quilômetros ao sul do ponto onde desceria a nave.
Schonepal apertou o botão do alarma dois e logo depois a Explorer desceu suave, não se sentindo quase o choque com o solo, devido aos amortecedores dos apoios telescópicos. Os campos antigravitacionais continuaram ligados, pois, do contrário, os apoios telescópicos e o próprio bojo da nave poderiam afundar na areia. O zumbido dos motores de propulsão se reduziu até desaparecer totalmente. Somente o cérebro eletrônico é que continuava seu serviço, expelindo sem cessar seus resultados. McNamara entrou na central de comando, entregandoao comandante a lista com os nomes dos cientistas que seriam os primeiros a pisar no solo do planeta Zannmalon.
Esta lista, o coronel irrefletidamente a colocou sobre a mesa dos controles.
— Ainda não, McNamara. Antes que alguém ponha o pé na superfície de Zannmalon, quero ter certeza de que os sáurios podem ser destruídos no mar. Borowski vai fazer um vôo de reconhecimento com um flutuador. Os senhores vão sair da nave com seus grupos só depois que ele voltar são e salvo.
Do laboratório vieram mais notícias. Em sua composição, a atmosfera do planeta era adequada para o organismo humano e não se registraram bactérias nocivas. A análise espectral da vegetação confirmava a existência de clorofila. Não se constataram elementos estranhos.
O Tenente Wassil Borowski já estava há tempo no hangar, ansioso para visitar o planeta. Quando veio a ordem do comandante para a ação de reconhecimento, o tenente galgou a cabina do flutuador e ficou esperando até que a grande escotilha abrisse. Ligou o motor, aqueceu-o e foi para o céu do planeta. A luz do sol o ofuscava. Puxou para frente a pala quebra-luz e subiu até uma altura de trezentos metros, para ter melhor e maior visibilidade. Com toda calma procurava fixar na memória as características topográficas do local. Planando, aproximou-se do mar. Desceu bastante até estar a poucos metros da superfície líquida.
Não estava gostando muito da incumbência que recebera. Tinha de matar um animal que não lhe fizera mal algum. Ninguém sabia se, com isto, não estava desencadeando a reação de uma raça inteligente do planeta, por mais absurdo que isto parecesse. Até o momento não houvera um só planeta no qual os sáurios imperavam sozinhos.
No lado norte, o continente já estava caindo para o horizonte.
— Não se afaste tanto assim — soou a voz de Schonepal através do rádio. — Já o estamos perdendo de vista na tela frontal.
— E eu não vi ainda nada que possa matar — respondeu Borowski. — Alguns cardumes de peixes e nada mais. Parecem sardinhas. Posso atirar neles?
— Bobagem! Continue procurando mais um pouco.
Então Borowski viu um grande animal. Deu-lhe a impressão de ser uma baleia e não parecia perigosa. Já que o animal não tinha pernas, era muito difícil crer que pudesse se arrastar por terra e chegar até a Explorer para atacá-la. Borowski se esqueceu do grande animal e continuou seu vôo.
Somente quando, a uns setenta quilômetros ao sul do litoral, se dirigia para uma ilha, foi que lhe pareceu próxima a execução de sua missão. Nas estreitas enseadas da ilha e de encontro às rochas íngremes, a água espumava muito, como se estivesse fervendo. Centenas de gigantes quase cilíndricos, verdadeiros monstros marinhos, disparavam de um canto para o outro numa agilidade surpreendente para suas proporções. Pareciam brincar no seu agradável elemento, dando pinotes para o ar, para depois caírem nas ondas, espadanando mais ainda a água já revolta.
Borowski ligou para a Explorer.
— Não são sáurios, senhor. Uma espécie de baleia, que com toda certeza não será um animal de terra firme. Mas o fato é que têm pernas. Talvez se desenvolvam mais tarde para animais de terra, ou são mesmo um elo da evolução.
— Qual é o tamanho?
— Mais ou menos dez metros.
— Bem, você sabe qual é sua missão. 
Borowski desligou. Não teria mesmo sentido querer discutir; além disso, Schonepal tinha razão. Não seria certo, por escrúpulos à vida animal, pôr em risco a vida humana. Todos deviam saber como os habitantes deste planeta haveriam de reagir às armas terranas.
Borowski observava um animal mais velho que se isolava um pouco dos demais, afastando-se dos rochedos batidos pelas ondas e pelo espadanar dos “cachalotes.” Seguiu-o a pequena altura e esperou até que estivesse bem distante da ilha. Desceu um pouco mais e apontou a pistola de raios energéticos. O estranho animal morreu logo. Ficou emborcado de dorso para o fundo, mostrando a barriga branca e as quatro pernas em movimento, afundando depois lentamente nas águas geladas.
Borowski enxugou a face coberta de suor. Ele também era um ótimo biólogo e zoólogo. Sentiu muito ter que matar um animal indefeso, que não havia feito mal a ninguém. Mas estava aliviado de sua desagradável missão. Tomou a direção norte e comunicou a execução da ordem ao comandante.
Ainda antes de chegar ao continente, McNamara deixara a nave com sua equipe.
O sol se inclinava lentamente para o poente e McNamara sabia que lhes restavam poucas horas de luz. Eram de trinta horas o tempo de rotação do planeta Zannmalon. Apesar disso, todos os registros eram feitos nos padrões da Terra. Assim aconteceu que o crepúsculo de Zannmalon coincidiu com o amanhecer do dia 2 de agosto.
Não se afastaram muito da Explorer e por via das dúvidas ficaram dentro do raio de ação de seus canhões. Punhados de areia eram retirados do solo pelos geólogos e colocados em recipientes apropriados. Os técnicos em Mineralogia estavam presentes e, mais tarde, tomaram rumo diferente. Os bacteriólogos faziam coleta do ar em alturas diversas. Mas, de todos eles, os mais solicitados eram os biólogos. Em toda parte achavam vestígios de vegetação, coletavam-nos e iniciavam logo a classificação. Somente um arbusto parecido com o salgueiro lhes causou algumas dificuldades.
Dois cientistas da equipe de biólogos se aproximaram desta planta e começaram a observá-la. Estando os rádios de pulso ligados, Schonepal na Explorer lhes podia acompanhar a conversa:
— Parece mesmo com o salgueiro, com as longas varas de vime, as folhas estreitas e compridas. Será suficiente que cortemos um galho.
— Dê cá a tesoura.
Alguém pegou o podão e cortou um dos galhos. Para surpresa de todos, a árvore parece que ficou viva de repente. As varas, como se estivessem furiosas contra os terranos, fustigavam-nos, não confusamente e sem sentido, mas com golpes válidos e bem acertados, havendo de fato uma coordenação superior. Os dois terranos se lançaram imediatamente no chão, arrastando-se para fora do alcance das varas.
— Que está se passando? — perguntou Schonepal, ao ouvir os impropérios proferidos pelos dois.
Depois de ouvir o relato deles, o comandante voltou a indagar:
— Vocês têm a impressão de que a planta pode se deslocar do ponto onde está, ou acham que é estacionaria?
— Ela tem raízes, senhor. Se fosse capaz de se deslocar do lugar onde está, haveria de nos perseguir. Mas isto não acontece.
— Bem, então não se pode pensar em uma destruição, mas, de qualquer modo, sejam mais cautelosos.
Schonepal também não perdia de vista os outros grupos de cientistas. Era fácil fazê-lo, devido às muitas telas da astronave. Se fossem ameaçados por qualquer perigo, todo o poder de fogo da Explorer estaria preparado para ir em seu socorro. Mas o incidente com o “pé de vime” não se repetiu.
Quando começou a escurecer, os cientistas regressaram à nave e iniciaram as pesquisas.
— Acho que é noite — disse Schonepal. — Poderemos dormir tranqüilos. O planeta parece estar limpo. Para a segurança, bastam as sentinelas de sempre. Vamos passar para a segurança número quatro.
— Certo, senhor.
Acordaram quase todos bem antes do raiar do sol. Era a hora em que o 2 de agosto, no tempo da Terra, estava chegando ao seu fim. Quando em Zannmalon era meio-dia, começava na Terra o 3 de agosto. Na Terra, em todos os planetas do Império e também num planeta que se chamava Eysal...
No segundo dia depois de sua aterrissagem naquele mundo, formaram-se três expedições que deviam partir para direções diferentes. Uns iriam investigar o litoral no lado do oeste, outros iriam para o leste. O terceiro grupo tinha seus objetivos no norte, deviam atravessar o rio caudaloso e examinar o terreno até as montanhas. Este último grupo era dirigido diretamente pelo Comandante Schonepal.
* * *
O Professor Nordmann era uma grande exceção naquele escol de técnicos e cientistas. Era o único que não tinha nenhuma patente de militar e nem queria ter. Era um civil cem por cento. Sendo um dosmaiores cosmólogos da Terra, gozava de certas liberdades que nunca o deixavam em apuros.
A viatura blindada rolava sobre lagartas pela estepe a dentro, rumo à margem sul do rio. A vegetação, de início fraca e rala, tornava-se cada vez mais exuberante. Poucos metros acima do nível do rio, o terreno era úmido e fértil. Na cabina da viatura anfíbia, criada especialmente para a frota de exploração galáctica, estavam sentados os membros da equipe de Schonepal. Havia lugar suficiente para os dez homens e três mulheres, além de todo seu equipamento, que não era pouco. Nordmann achava-se sentado ao lado de Schonepal. A viatura era dirigida pelo sargento Buddy Crack que, bem treinado, servia para qualquer equipe de cientistas.
— Um planeta perigosamente inofensivo — disse o Professor Nordmann, olhando para o capim alto que ondulava ao sabor do vento. — Para mim é extremamente suspeito, quando um planeta parece assim tão inofensivo.
Já Schonepal tinha outra opinião.
— Professor, por que não está contente com o fato de tudo estar correndo tão bem assim? Eu me sinto feliz com esta tranqüilidade.
— Sua natureza é menos complicada que a minha, comandante. Já estou há dois anos em sua nave e passei por muita coisa em mundos estranhos. As piores surpresas apareceram sempre onde menos as esperávamos.
Schonepal estava transformado, diferente de antes. Sorria muito feliz.
— Mas, professor, quem é que vai ser tão pessimista assim? Há mais de trinta horas que estamos analisando Zannmalon com muito apuro e até agora nada encontramos que nos possa preocupar. Bem, o “pé de salgueiro”... mostra pequenos vestígios de inteligência num estágio muito primitivo. Mas é tudo.
— E as irradiações provindas da montanha? Já as esqueceu?
Schonepal fez um gesto de espera e olhou por um instante para a margem do rio.
— Vamos investigar isto, professor. Se este fluxo d’água aí na frente for mesmo natural, isto é, normal, o caminho já está aberto para a montanha.
Observação completamente supérflua. As pesquisas do dia anterior já haviam demonstrado que o rio não apresentava nenhum perigo, muito menos quando era atravessado por uma viatura anfíbia de forte blindagem.
Desviaram-se um pouco e atingiram a outra margem do rio sem nenhuma novidade. O sargento Crack desligou os dois turboélices e botou o anfíbio de novo a rolar sobre as lagartas. O aclive era suave e não oferecia nenhuma dificuldade. Atrás deles, do outro lado do caudaloso rio, cintilava com brilho prateado a carcaça da Explorer-3218.
— Alterar um pouco a rota para a direita — disse Schonepal para Crack. — Faça tudo para que possamos atingir a montanha pelo rio.
O grande curso d’água, que acabavam de atravessar, corria mais uns dez quilômetros na direção leste, virando depois para o norte e sumindo na montanha. Crack tinha, pois, de se manter um pouco a leste, a fim de sair no lugar certo.
A paisagem não variava muito. Havia mais árvores, entre elas “salgueiros”, como também maior número de colinas, todas elas em forma de rochedos, que pareciam monstros pré-históricos emergindo da areia. Sargento Hoax, médico e radiotelegrafista ao mesmo tempo, operava seu aparelho de rastreamento, que estava registrando a incidência dos fracos impulsos irradiados.
— A direção ainda é a mesma — disse ele, apontando para a montanha, que subia majestosa da planície para o céu azul. — Muito espalhada, deve ter várias fontes.
Schonepal quase não estava ouvindo. Fez uma ligação para McNamara, que ficara na Explorer.
— Tudo em ordem, capitão?
— Temos todos os senhores com nitidez na tela frontal.
Nordmann tinha um sorriso malicioso nos lábios, quando perguntou:
— Como é, Schonepal, não está mais tão certo de que nada acontecerá?
O comandante continuou olhando zangado para a montanha, que já estava um pouco mais perto. Parecia ser mais alta do que indicavam as medições. O vale estava à direita. O leito do rio de dois quilômetros de largura se estreitava agora para uns oitocentos metros, devendo ser então mais fundo e com mais correnteza. A verdadeira garganta, porém, parecia estar mais afastada, não sendo possível vê-la a olho nu.
A senhorita Peggins, bióloga e desta maneira assistente de Borowski, apontou para fora e disse ao físico Gabriel:
— Veja uma coisa, tenente, aquela planta cheia de farpas lá nos rochedos. Faz-nos pensar nos cactos da Terra, não acha?
Borowski, que estava sentado ao lado dela, resmungou:
— Gabriel é físico e não sabe diferenciar um cacto de um aspargo, miss Peggins.
— Em compensação, você nem sabe qual é a diferença entre um elétron e um átomo — respondeu o físico, voltando a dar atenção à assistente de Borowski.
A montanha ia se aproximando... Podiam-se ver, à esquerda do vale, fendas escuras nas escarpas rochosas, que Schonepal julgava ser cavernas. Não se podia deduzir com maior certeza que destas cavernas é que emanavam as irradiações. A viatura continuava na sua direção, corrigindo depois a rota um pouco mais para a direita, parando perto da margem do rio.
A princípio, era um ribombar longínquo enchendo-lhes os ouvidos, ficando logo mais forte, de tal forma que não lhes era mais possível ouvir as próprias palavras. O quadro que então se lhes deparou foi algo inusitado, sensacional.
Em imensas catadupas, irrompia o curso d’água, indomável, montanha abaixo.
As águas revoltas deviam provir de um planalto, abrindo seu próprio caminho através da rocha, em quedas múltiplas e sucessivas. O processo não devia estar na sua fase definitiva. Mais tarde, talvez depois de centenas de milênios, estaria aberto aí um vale largo e quase plano, através do qual fluiria calmo e profundo um majestoso rio. Agora, porém, era um torvelinho de água selvagem a espadanar de patamar em patamar, formando lagos espumantes e cascatas mirabolantes. O ar resplandecia de pérolas brilhantes que formavam um denso véu de vapor, deixando os homens da expedição bem molhados, assim que desceram da viatura.
Visivelmente impressionados, assistiam extasiados ao milagre da Natureza. Na Terra e em muitos planetas conhecidos não era novidade o fenômeno de grandes cursos d’água que irrompiam das montanhas em estupendas quedas d’água, mas uma tamanha profusão de queda d’água com decantação tão singular, ninguém jamais vira.
— Wunderbar! Wunderbar! — gritava em alemão o Professor Nordmann, nos ouvidos do Comandante Schonepal.
E era mesmo admirável.
— Sim, é superadmirável — respondeu Schonepal, gritando para o professor. — Mas eu já estou todo molhado!
Qualquer conversa ali seria impossível.
Só depois de voltarem para o carro blindado foi que diminuiu o ruído das águas em catadupa e se podia falar melhor.
— Acabaríamos ficando surdos aqui — explicou o Tenente Hoax. — Não há tímpano que agüente isto.
O Tenente Gabriel apontou para o oeste.
— Temos que nos preocupar com as cavernas nas rochas. A irradiação vem de lá.
Buddy Crack pôs a viatura em movimento e foi rolando ao longo da montanha, exatamente na direção do poente. Depois de alguns minutos, os instrumentos de medição acusavam a incidência de impulsos cada vez mais fortes, vindos sempre da mesma direção, isto é, da montanha.
Apesar de o chão ser pedregoso, cresciam ainda algumas plantas. De vales transversais irrompiam riachos que, ou corriam para o mar, ou sumiam nas densas camadas de areia. Em parte alguma se via um vale que tivesse largura suficiente para a passagem da viatura anfíbia. Quem quisesse penetrar na montanha, teria que fazê-lo a pé.
Pararam na primeira caverna. Schonepal encabeçou o grupo, quatro homens e uma mulher. O geólogo Lazarus se mantinha ao lado do Professor Nordmann.
— A estrutura destas rochas não permite, propriamente, a formação de tais cavernas — observou ele, batendo com uma ferramenta diretamente na pedra. — Muito menos através da força da água. A rocha é dura demais. A única hipótese, no caso, seria a origem vulcânica, da qual não há nenhum vestígio.
— Quem sabe houve alguém que propositalmente escavouestas cavernas? — disse Schonepal.
— Seria a última hipótese que eu aceitaria — disse Lazarus abanando a cabeça. — Deve haver outras possibilidades de explicar a formação destas cavernas, ainda desconhecidas de nós. Talvez cheguemos a algum vestígio que nos possibilite isto.
O único indício que descobriram aumentou ainda mais o enigma. As entradas para as cavernas tinham espantosa regularidade. Eram todas iguais, isto é, redondas e com um diâmetro de mais ou menos cinco metros. A irradiação parecia agora vir de todos os lados, ficando ainda mais difícil constatar sua procedência.
Nordmann não escondia sua desconfiança:
— Sei não, comandante, meus pressentimentos sempre me alertaram, pelo menos até o presente, contra qualquer coisa que não está certa, principalmente contra perigos iminentes. E neste momento meus pressentimentos são muito fortes. Seria melhor que voltássemos imediatamente, ou então enviarmos primeiro uma vanguarda bem armada. Nunca se sabe os perigos que vamos encontrar e meu sexto sentido jamais me enganou.
— Este mundo parece não ser habitado. — Schonepal voltava à segurança de antes. — Todos nós estamos com as pistolas de raios energéticos, e é o suficiente para nos defendermos. Por que devemos voltar?
— Não há nenhuma resposta, no plano lógico, para isto — disse Nordmann, friamente.
Não descobriram nada e uma hora depois estavam voltando para a viatura anfíbia, sem nenhum resultado prático. Em Zannmalon devia ser agora meio-dia. Houve uma pausa para alimentação e um curto repouso, após o que, o Tenente Borowski tomou o comando de um grupo de exploração e entrou na segunda caverna.
Em toda a Galáxia, o calendário automático iniciava um novo dia. Era o 3 de agosto. Também em Eysal.
O destino ainda esperava vinte e quatro horas...
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2
Borowski dava algum valor ao sexto sentido e, talvez por isso, pediu certas explicações ao Professor Nordmann.
— Professor, o senhor acha então que os corredores foram abertos por seres inteligentes?
— Estou convencido disto. Nenhum fenômeno natural pode produzir cavernas assim. São regulares demais. A altura dos corredores parece ter sido calculada com todo o rigor. Não tenho nenhuma dúvida de que foi feita artificialmente por mão inteligente. Por quem, não posso dizer exatamente. Não conheço na Galáxia nenhum ente que seja tão inteligente a ponto de construir tais cavernas para nelas morar. Seres sem inteligência não as podiam fazer, embora pudessem gostar de morar nelas. Estamos, pois, praticamente diante de uma contradição.
— Quem sabe, seus construtores já desapareceram há tempo?
— Ou estiveram apenas de passagem no planeta Zannmalon, tenente? Quem sabe procuravam aqui minérios ou outros elementos de mais valor? Mas deviam ter deixado vestígios desta passagem...
Desta vez penetraram mais na montanha e os instrumentos começaram a oscilar alucinadamente, acusando a proximidade da fonte de irradiação. Infelizmente, porém, os rastreadores apontavam para todas as direções.
O geólogo Lazarus estava meio perturbado.
— Na minha opinião, a fonte irradiadora é uma só, mas devido à formação das rochas as ondas refletem em todos os sentidos. Não podemos, pois, confiar cegamente nos aparelhos.
— Então é mais do que estranho o fato de recebermos com toda nitidez as transmissões do aparelho de Schonepal — disse Borowski.
Nordmann não quis entrar em discussão. Foi caminhando firme para frente, esquecido de todas as suas dúvidas. Tinha, porém, a arma engatilhada na mão.
De repente, o corredor se alargou, o que até então não acontecera. O túnel era sempre rigorosamente uniforme, do mesmo tamanho. E agora, as paredes recuavam para fora e o teto subia a quase oito metros, formando um verdadeiro salão subterrâneo.
A senhorita Peggins, a bióloga, soltou um grito estridente.
Nordmann, que estava a seu lado, segurou-a pelo braço.
— Acalme-se, senhorita Peggins. Não há motivo para ficar nervosa. O animal está morto e isto já há muito tempo.
Borowski contemplava silencioso o corpo gigantesco de um monstro pré-histórico que ali estava no centro da câmara subterrânea. Lembrava-lhe, de longe, uma baleia, talvez semelhante à que vira antes no mar equatorial do planeta. No entanto, era um pouco diferente.
Os jatos de luz dos faroletes deixavam ver a pele enrugada penetrando por entre os ossos. Em muitos pontos, já estava destruída. Podiam-se ver os ossos com nitidez. O que estava mais bem conservado era a cabeça do monstro.
Seu diâmetro devia ser de uns cinco metros. Vazios estavam os dois pontos dos olhos. Abaixo se abria uma grande fenda, talvez a boca. Nesta cavidade luziam os dentes, pelo menos pareciam dentes. Na parte de trás da cabeça, começavam os tentáculos ou pegadeiras.
— Um sáurio! — disse Lazarus perplexo, esquecendo as irradiações.
A senhorita Peggins já estava mais calma. O fato de o monstro já estar morto a deixou sossegada. Deu um passo à frente e dirigiu sua lanterna na direção da cabeça, contemplando o estranho animal com uma mistura de nojo e curiosidade científica.
— Não, não é nenhum sáurio, para isto lhe faltam as principais características. Olhe bem, não há membros para locomoção, mas apenas para pegar alguma coisa. Deve ser provavelmente um réptil.
— Então não pode ser um sáurio — disse Lazarus irritado.
Nordmann, de novo, não deu atenção ao aparte e acompanhou a senhorita Peggins.
— A senhora acha que era um ser inteligente?
A bióloga hesitou ao responder.
— Não posso afirmar, professor. Por que pergunta?
Nordmann virou seu farolete para o outro lado.
— Está vendo ali? É por causa daquilo. Foi só então que os homens e também a senhorita Peggins reconheceram o enorme bloco de metal a poucos metros da cabeça do esqueleto. Tinha o formato de um grande armário e sem a menor dúvida era feito por mãos inteligentes. Na parte da frente havia alças, grandes e bem visíveis. A hipótese de se tratar de um mecanismo, um gerador ou estação de relê ou mesmo uma central de ligações, era reforçada pela existência de escalas ou graduações.
Do interior deste bloco vinha um leve zumbido, podendo-se supor que possuísse fonte própria de abastecimento.
— Veja senhorita — repetiu Nordmann, com um gesto desajeitado — os membros superiores do monstro estão esticados para frente. O do lado direito parece estar pegando numa alavanca, como se a tivesse puxado para cima.
— Mas isto não é possível! — exclamou Lazarus. — Um monstro assim jamais poderá ser inteligente.
— O senhor Lazarus e seus preconceitos! — Nordmann deu uns passos à frente na direção da cabeça com os pegadores. — Que tem a forma do corpo e seu tamanho a ver com inteligência? Uma coisa não tem nada com a outra. Não fique pensando sempre nos velhos moldes, mas procure antes olhar objetivamente para a realidade. Este mostrengo era inteligente. E, se não me engano, foi ele quem escavou os corredores na rocha. Agora, não me vá perguntar como ele fez isto. Mas tudo indica que as coisas foram assim.
— O tamanho da cabeça corresponde exatamente ao corte transversal dos corredores. — a senhorita Peggins reencontrara seu bom senso. — Não será bom comunicarmos o achado ao comandante?
Num instante se fez a ligação de rádio. Schonepal ficou excitado com o que lhe foi descrito e ordenou que não se tocasse em nada. Haveria de comparecer logo em companhia de Hoax e de Gabriel.
Enquanto esperavam o comandante, Borowski descrevia sua viagem de reconhecimento no flutuador. Salientou que os animais do mar não eram de maneira alguma tão grandes como este da caverna e de maneira alguma podiam ser da mesma espécie. Além disso, não davam nenhuma mostra de inteligência.
Chegaram então Schonepal e seus dois acompanhantes e se plantaram ali, como estátuas, perplexos diante do que viam. Acabaram confirmando a opinião de Nordmann de que o monstro estava se servindo do tal aparelho... Mas, nem um só dos participantes da expedição aceitava a idéia de que o mecanismo fora confeccionado pelo próprio monstro.— Quem sabe, foi obra do acaso? — indagou Schonepal, depois de se recuperar da grande surpresa. — O monstro veio casualmente para esta montanha, viu as cavernas e se arrastou para dentro. Acabou morrendo diante da máquina. Os membros superiores esticados podem ser um último reflexo. Dou razão ao Dr. Lazarus, um monstro com este porte não pode nem deve ter sido inteligente. Seria o fim de nossa civilização. Estes monstros teriam então a navegação espacial e Zannmalon estaria cheio deles. Deve ter vindo ou deve ter sido trazido para cá... Talvez veio de outro mundo.
— Bobagem pura! — protestou o Professor Nordmann, com o rosto todo vermelho. — Quem é que teria interesse em voar pelo espaço com um “lagarto” gigantesco assim? Devem morar nesta montanha, que certamente está cheia de corredores e cavernas. Por este motivo é que não os vimos ainda. Devem ser também inteligentes, embora com isso não se afirme que conheçam ou tenham conhecido a navegação espacial. De qualquer maneira, tal acontecimento nos abre uma perspectiva muito desagradável, isto é, que a qualquer momento podemos nos deparar com eles. Mas só que bem vivos.
Miss Peggins pôs fim à discussão:
— Posso lhe fazer uma proposta, comandante? O monstro aqui está morto e não representa mais nenhum perigo, mas nos pode ser muito útil. O senhor permite que eu retire amostras para examinar no laboratório da Explorer?
— Não tenho nada contra, senhorita. Talvez isto nos vá ser vantajoso.
Miss Peggins lhe fez um gesto de agradecimento e pediu a Borowski que a ajudasse. Enquanto os outros se espalharam pela imensa caverna, procurando por algum indício de vida racional, e o Tenente Gabriel examinava o bloco metálico, os dois naturalistas pegaram seus instrumentos e se prepararam para retalhar o esqueleto do monstro.
Mas ficou tudo na intenção...
Primeiro quebrou o serrote de Borowski, ao tentar cortar um pedaço de osso do esqueleto. Aquela serra, que cortava os melhores aços de Árcon sem a menor dificuldade, capitulou diante dos ossos do ser desconhecido.
Foi a primeira surpresa. A segunda foi ainda mais estranha.
Borowski procurava dissolver um pedaço de osso com os fortíssimos raios térmicos de sua pistola. Primeiro, não aconteceu coisa alguma, depois, o material foi tomando uma coloração esquisita e encolheu um pouco. Foi tudo. O osso não se dissolveu nem produziu nenhum gás.
O biólogo, desiludido, se levantou.
— É uma coisa estúpida! Nem mesmo o duríssimo arconídio resistiria ao calor tremendo dos raios térmicos, e estes ossos aqui não sofreram nada.
O cosmólogo Nordmann não queria ficar apenas em suposições.
— Com meios comuns não haveremos de resolver o problema, Schonepal. Temos diante de nós um esqueleto e contra isto não pode haver dúvida. Pertence a um ser vivo como até agora nunca foi encontrado. Também isto é inegável. Se não podemos examinar os resíduos orgânicos com os meios comuns, temos então de lançar mãos de meios extraordinários.
— Uma pistola de raios térmicos para ossos é um meio mais que extraordinário — disse Borowski, olhando desconfiado para a arma quente em suas mãos.
— Não conseguimos dissolver um pedaço de osso!
A voz de Nordmann não escondia a grande impaciência que havia nele quando continuou:
— Temos então que trazer para cá os recursos mais adequados da Explorer, ao invés de levar o osso para a nave.
Neste momento, o sargento Hoax se ergueu. Estivera até então um pouco afastado, totalmente entregue ao aparelho de rastreamento, estudando-lhe os dados.
— Esta estranha irradiação vem de diversas direções, mas demonstram uma sensível concentração no sentido norte. Acho que, se investigarmos naquela região, haveremos de encontrar seu ponto de partida.
— Mas não hoje — disse Schonepal, com voz firme. — Para mim basta este maldito esqueleto.
Nordmann não deixou de fazer suas objeções.
— Não tenho a mesma opinião, comandante. Não queremos perder tempo. Mande de volta a viatura anfíbia de lagartas e mande trazer para cá o laboratório. Enquanto Borowski e sua equipe examinam o esqueleto do estranho animal, outros grupos podem continuar penetrando nos labirintos das cavernas e pesquisar a origem das irradiações. Além disso, alguns peritos podem se ocupar com o bloco de metal. Não me sinto bem com o pensamento de que minha vida, ou nossa vida, depende de um simples acaso.
Depois de curta discussão, a proposta de Nordmann foi aprovada. Buddy Crack ajudou a senhorita Peggins e alguns cientistas a embarcarem e partiu na direção sudoeste. Bem no horizonte, refulgia à luz do sol a esfera da Explorer-3218, talvez a uns quinze quilômetros.
Depois de uma hora, mais ou menos, Crack estava de volta, trazendo um verdadeiro time de técnicos altamente qualificados e de especialistas com seus laboratórios portáteis. Quando viram o gigantesco esqueleto, não houve tanta surpresa. Mas quando iniciaram as experiências, a situação mudou. Estavam todos perplexos e, depois de uma hora de trabalho, não sabiam o que dizer.
Não havia mesmo nenhum meio de se examinar o osso. Apenas puderam constatar seu peso específico. Havia apenas uma diferença de volume nas partes afetadas pelos raios, pouco mais reduzidas que as não afetadas.
— Uma negação fisiológica! — sentenciou, furioso, Nordmann, irritado com o fato de que um simples esqueleto passara a ser um enigma insolúvel. — Em milhares de planetas, pudemos investigar milhões de formas de vida diferentes. Foi sempre possível traçar certos paralelos, encontrar semelhança e dar algumas explicações. Mas isto aqui... — apontou para o esqueleto — ...é uma coisa que não devia existir. Se estivesse vivo, não poderíamos destruí-lo. E vocês sabem o que isto quer dizer, não é?
É claro que todos sabiam. Schonepal estava mais preocupado.
— Seu pensamento está certo, professor, será então meu dever enviar logo um relatório à central de informações em Terrânia. Perry Rhodan tem de ficar a par disso. Quem sabe, já se descobriu em outros mundos coisa idêntica? Só a central pode saber isto, porque todas as informações convergem para lá. Achamos até agora apenas um cadáver, mas que seria se encontrássemos um exemplar desta raça vivo? E que acontecerá se forem ferozes e inteligentes, qualidades que podem muito bem estar unidas? Mas, que seria ainda, Nordmann, se sua teoria de que o monstro não pode ser destruído com os meios conhecidos, for verdadeira?
— Não há nada que não possa ser destruído — disse Borowski.
Nordmann olhou para ele.
— Queiram os deuses que você não esteja errado — respondeu o professor. — Acredite-me uma coisa, eu mesmo desejaria estar errado. Mas confesso que já não sei o que devo dizer. Há na minha frente uma coisa que não deveria existir. Não tenho explicações.
— Mesmo assim, ele está morto — disse Schonepal, com uma ponta de satisfação. — Não podemos saber se foi o último representante de uma raça extinta.
— Mesmo que o fosse, não está morto há muito tempo, comandante. A cabeça está bem conservada, coisa que ainda não foi totalmente explicada. Não apenas os ossos, mas também o que restou da pele resiste a todo tipo de análise. Será que é pele mesmo?
— Pelo menos, eu a classificaria como matéria orgânica — disse Borowski, que estava de pé ao lado de miss Peggins. — Infelizmente, o senhor tem razão, professor. A pele não pode ser examinada. Mesmo os ácidos mais fortes não lhe causam nada. Não deixam nenhum sinal. Schonepal decidiu:
— Vou entrar em contato com McNamara. Ele me levará de volta num flutuador para a Explorer. Quero saber o que pensa a central da Frota de Exploração. Espero todos vocês antes do cair da noite. Nordmann, o senhor vai assumir o comando do grupo.
Olhou um pouco para este e acrescentou:
— Nada de imprudência, hein!
O professor fez um gesto de assentimento.
— Aprecio tanto minha vida como o senhor a sua — respondeu Nordmann.
Schonepal dirigiu-se à saída da caverna e ligou para McNamara. Dez minutos mais tarde, já estava dentro do flutuador.
Daquela grande caverna,os corredores levavam para três direções diferentes. Já que o sargento Hoax conseguiu indicar a direção em que estavam mais concentradas as faixas de ondas, o grupo tomou tal caminho, isto é, o do meio. Eram quatro homens e uma mulher que marchavam para o desconhecido, tendo à frente o Professor Nordmann. Embora soubesse que a arma não adiantava nada caso se deparassem com um monstro, caminhava com a pistola na mão direita, preparado para atirar imediatamente. A arma lhe restituía um pouco da segurança que perdera durante as pesquisas no esqueleto.
Atrás dele, vinha Hoax com o aparelho de rastreamento na mão e a arma no cinturão. A lanterna pendurada no pescoço balançava de um lado para o outro, provocando sombras que dançavam nas paredes do corredor. O Tenente Gabriel e a senhorita Peggins caminhavam lado a lado. Formando o fim da fila vinha o Tenente Borowski. Também estava com as mãos ocupadas: na esquerda o farolete, na direita a pistola engatilhada.
O corredor era de uma irritante regularidade; paredes, chão e teto eram tão lisos, como se tivessem sido polidos proposital-mente. A rocha tinha um brilho escuro e às vezes um tanto oleoso, como se tivessem recebido um acabamento especial. Não podia mais haver sombra de dúvida de que o labirinto de corredores era de origem artificial. Nenhum fenômeno da natureza poderia produzir uma coisa assim.
O ar estava abafado e um pouco quente, mas ainda suportável.
Hoax parou, quando o corredor dobrou para a esquerda.
— A irradiação vem mais do norte, se continuarmos nesta direção, estamos nos afastando dela.
Nordmann também parara.
— Diga-me uma coisa, Hoax. Que tipo de irradiação é este? Quer dizer, é perigosa?
— Não, isso não, professor. Pelo menos não contém componentes rígidos. Embora não conheçamos sua natureza, posso dizer que não é perigosa, enquanto se pôde deduzir das experiências feitas até agora.
— Você não está muito certo disso, não é verdade?
— Não, isto não. Mas a maior probabilidade...
— Bem, vamos continuar. Temos que correr o risco.
Depois de uns trinta metros, o corredor virava de novo para o norte. Caminhavam agora diretamente no sentido das irradiações. Ninguém se sentia tranqüilo.
— Estou com medo — disse miss Peggins, aproximando-se mais de Gabriel. — Devíamos pelo menos esperar mais um pouco, até que Schonepal obtivesse mais informações e nos desse mais instruções.
A pobre coitada não obteve resposta. O corredor começou a se alargar e o teto ficou mais alto. O chão, até então um tanto abaulado, ficou completamente plano. Parecia se repetir o quadro de quando descobriram o grande salão do esqueleto.
Uma nova caverna...?
Nordmann reduziu seus movimentos.
— Atenção! Se estamos nos aproximando da segunda caverna, é bem possível que nos deparemos com o “primo” vivo do gigantesco sáurio do esqueleto. Certamente ele não será muito rápido em seus movimentos, de maneira que poderemos facilmente fugir. Estejam com as armas preparadas, embora não creia que elas nos possam ajudar.
Continuaram caminhando, agora um ao lado do outro, pois o corredor tinha largura suficiente para todos. Alargou-se mais ainda, formando de repente a entrada para a caverna. Era bem maior que a primeira e possuía nichos.
— Que é isto? — perguntou Borowski, comprimindo os olhos, a fim de poder enxergar melhor. — Dá a impressão de como se alguém mantivesse aqui um depósito de munição.
As “balas”, de mais ou menos dez a doze centímetros de comprimento, eram roliças, numa espessura de dois a três centímetros. A cor puxava para roxo. Estavam nos nichos, não colocadas em ordem, mas jogadas sem maior cuidado, como se alguém as atirasse ali apressadamente. Não tinham nada de vida, pensamento, aliás, mais que absurdo.
— Vagens! — disse o sargento Hoax.
Na realidade, as estranhas “balas” pareciam mais vagens de feijão ou de ervilha, ou melhor ainda, se assemelhavam muito aos charutos. Devia haver milhares, só naquela gruta.
— Bobagem! — disse Nordmann, aproximando-se dos nichos. — Como podem crescer num lugar deste vagens de feijão ou de ervilha ou de qualquer outra coisa? Agora, não podemos recusar a hipótese de que se trata de uma reserva de forragem para alimentar os sáurios. Apenas quero perguntar: alguém já viu tais plantas crescerem aqui no planeta Zannmalon? Hein, senhorita Peggins?
A bióloga balançou a cabeça. Ainda estava muito fascinada com o grande número de vagens.
— Não, infelizmente, não, professor. Não vi esta planta aqui.
— Talvez ela cresça somente na montanha, o que não pudemos ainda averiguar — disse Borowski se aproximando de Nordmann, que já havia enfiado a arma no cinturão, pois as vagens agora não lhe inspiravam mais medo. — Ou somente nas cavernas subterrâneas. Temos também na Terra plantas que crescem sem precisar da luz do Sol!
Nordmann perguntou com ironia:
— Você acha então que o réptil das cavernas cultivou aqui uma espécie de cogumelo, um bom champignon? Puxa, que fantasia, hein?
O biólogo nem por isso perdeu a calma:
— Somente uma pesquisa mais profunda nos poderá dizer até quando nossas suposições poderão ser meras fantasias. O professor vai me permitir pegar algumas destas vagens e levá-las para a Explorer? Estou curioso para saber se também elas vão resistir aos nossos métodos de análise.
— Pegue à vontade — disse Nordmann, continuando seu caminho no interior da caverna.
O professor acabou constatando que tinha quarenta metros de comprimento por vinte de largura. Estreitava-se de novo na saída do corredor, que prosseguia montanha a dentro.
O sargento Hoax também já terminara suas medições.
— São as vagens que irradiam as vibrações. Aqui nesta caverna existe um foco de irradiação. Um dos senhores tem alguma explicação para isto, já que, como se supõe, trata-se de frutos da terra ou coisa semelhante?
Nordmann de repente encarou-o.
— O que o senhor está dizendo? A irradiação provém destas coisas aí? Está falando sério?
— São os instrumentos que o dizem, senhor. Está excluído qualquer erro.
— “Vagens” transmissoras! — disse Borowski rindo à vontade.
Nordmann olhou para ele com ar de censura e se inclinou para apanhar uma das vagens. Colocou-a na palma da mão e ficou olhando-a à luz da lanterna. A casca lisa continuava com o brilho roxo puxando de leve para o verde. Não se via nenhuma pequena fenda e não parecia também quebrável.
— Não aperte tanto assim — disse Nordmann, quando Borowski experimentou uma delas.
O biólogo respondeu com muita calma:
— Primeiro temos milhares destes frutos aqui. Um não vai fazer falta... Depois a casca reage de tal maneira que parece não querer quebrar tão facilmente. Pelo contrário, tenho a impressão de que ainda haveremos de presenciar muitos fatos surpreendentes. Com sua licença.
Não esperou pela permissão de Nordmann, mas apanhou a vagem, apalpou-a bem e sacudiu a cabeça. Depois abriu a bolsa a tiracolo e guardou-a com cuidado.
— Pegue mais algumas — disse para miss Peggins.
Os discutidos objetos tinham um peso considerável. Cada uma das vagens, como Hoax garantia, tinha um mínimo de irradiação. A irradiação mais forte era, pois, a soma de todas as unidades. Não se podia admitir que simples vegetais possuíssem dispositivos independentes de irradiação. As vagens não eram, portanto, plantas.
Mas o que eram então? Nordmann não queria mais quebrar a cabeça a respeito.
— Já pegou o suficiente, Borowski?
— Mais ou menos vinte ou trinta. Acho que chega.
— Acho também. — Olhou para o relógio: — Em duas horas começa o crepúsculo. Temos de tentar chegar até a nave neste meio tempo.
— Não será difícil — disse Borowski, pegando a senhorita Peggins pelo braço. — Vamos indo?
Em todo este tempo, nada aconteceu de importante com o esqueleto. Os especialistas, que lá ficaram, tentaram extrair um osso do esqueleto por via mecânica, mas nada conseguiram. Um físico disse o que, aliás, todos pensavam:
— Professor, se encontrarmos um animal deste, vivo, seria melhor nos afastarmosdele. Ninguém pode crer que haja uma arma capaz de matar um deles.
— Acha que é mesmo assim? — Nordmann parecia agora indiferente. — Este exemplar está mesmo morto, como se vê. Deve ter tentado fazer alguma coisa com a máquina que tem a seu lado, mas parece que não obteve resultado. Também não sabemos que tipo de máquina é esta e o que se podia fazer com ela.
— Nem sequer sabemos se de fato é uma máquina — disse Buddy Crack.
Nordmann olhou perplexo para ele.
— Se é máquina ou não, de qualquer maneira a carcaça na frente do esqueleto não é nenhum bloco de pedra nem outro esqueleto. Foi construída por mãos inteligentes e trazida para aqui. E o sáurio morto estava querendo fazer alguma coisa com ela. O quê, não sabemos. Mas ainda teremos melhores informações a respeito.
Todos se sentiram mais aliviados ao chegarem ao ar livre. O sol estava caminhando para o horizonte, um pouco à direita da Explorer. Buddy Crack esperou até que o último subisse na viatura anfíbia, para ligar o motor. Meio vagaroso começou a rodar na direção do rio.
Pouco depois, ouviram atrás de si o ronco das quedas d’água. À frente deles, surgiam o deserto, o rio e a espaçonave.
* * *
No laboratório, Borowski quebrava a cabeça com as vagens. Uma delas estava na chapa metálica da mesa, tendo ao lado facas, serras de aço, um martelo, um formão quebrado, um maçarico e um radiador térmico.
A vagem não apresentava o menor arranhão.
— Com os diabos! — exclamou o biólogo, e sua mão direita, que segurava um cigarro, tremia demais. — Até duas serras de aço terconite, de compressão molecular, já foram embora, perderam os dentes. Não sei o que mais posso fazer!
Lá fora já era noite. Zannmalon não tinha lua e no céu viam-se poucas estrelas. Estava bem escuro.
— Quem sabe os outros tiveram mais sorte do que nós, em seções diferentes? — Miss Peggins parecia descontraída. — Todos receberam as vagens. Alguém deve ter conseguido alguma coisa.
Borowski pegou o intercomunicador:
— Gabriel? Como estão as coisas por aí?
— Nada, Borowski! Ninguém consegue nada. Cheguei até colocá-la na prensa hidráulica. Apesar de o motor receber a carga máxima, a prensa não consegue vencer os dois centímetros da espessura da vagem.
O Departamento de Química anunciou que a imersão em banhos de ácidos, os mais corrosivos, não trouxe nenhum resultado.
Do Departamento de Medicina, Hoax relatou que a vagem foi bombardeada com todos os tipos de irradiações possíveis, também inutilmente. E mais: dois bisturis de tempera especial estavam quebrados.
Finalmente vieram os resultados do laboratório técnico com a inaudita notícia de que, depois de dezenas de experiências infrutíferas, a vagem foi introduzida numa câmara de fusão de um reator nuclear. Ainda continuava lá, sem nenhuma alteração.
Ao desligar o intercomunicador e ao se virar para a senhorita Peggins, estava totalmente pálido e seus lábios não passavam de uma linha fina. Havia ódio nos seus olhos.
— Desgraçada!...
Não falou mais do que isto, por alguns segundos. Depois, de cabeça baixa, disse entre zangado e desiludido:
— Temos que avisar o comandante. Mas não sei, não... Acho melhor esperar até amanhã. Ele também não pode fazer nada. As desgraçadas vagens são tão resistentes como os ossos do esqueleto do sáurio, ou do que ele seja. Vá dormir, senhorita Peggins. Não preciso mais da sua ajuda hoje. Os senhores também, meus amigos.
Os cientistas cumprimentaram seu chefe de equipe e se retiraram. A senhorita Peggins ainda olhou pensativa para seu chefe e saiu do laboratório.
Borowski ficou sozinho com as vagens.
Olhava para elas de má vontade, mas ainda com curiosidade. Se ele ao menos soubesse que tinha diante de si um objeto de fabricação artificial ou um tipo de vegetal desconhecido! Se pelo menos soubesse isto, iria dormir tranqüilo. Mas não sabia. E não chegou até a verdade, por mais simples e assustadora que fosse.
* * *
Na manhã do dia seguinte, o Coronel Schonepal ordenou que os chefes de equipe fizessem seus relatórios. Todos foram unânimes: não era possível determinar a natureza do tal vegetal. Em certo sentido, constatou-se uma estreita analogia com os restos do sáurio gigantesco: ambos eram indestrutíveis!
Seu velho otimismo estava se transformando. Começou a sentir medo do planeta Zannmalon, pensando de novo nas pedras vivas e nos sáurios blindados. Monstros gigantescos indestrutíveis e vagens de feijão resistentes a tudo, não poderiam ser coisa melhor.
O capitão McNamara estava sentado na poltrona dos controles e, depois de verificar os instrumentos, disse:
— Sabe do que mais gostaria, senhor?
— O que seria?
— Decolarmos daqui o mais depressa possível, até mesmo neste minuto.
Intimamente, Schonepal tinha que confessar que este também era seu desejo. Não podia, porém, supor que já fosse tarde demais para isto. Nem mesmo uma partida naquele instante poderia salvar a Explorer-3218. Se tal fizesse, teria apenas aumentado o número de vidas perdidas entre a tripulação, ou para ser mais exato, seria a morte para todos.
Mas Schonepal não podia imaginar uma coisa destas. Primeiro aceitou, com algum alívio, o fato de que seu primeiro oficial e colega no Departamento de Bioquímica Cósmica comungava com sua opinião, pensava como ele. Depois, disse sem maiores intenções:
— Como é que você pode pensar assim? Decolar imediatamente?! Já fiz meu relatório à central de pesquisa da Frota. Como poderemos explicar que vamos interromper nosso trabalho aqui? Pés-frios? Seria isto uma explicação?
— Seríamos apenas cautelosos, senhor.
— Sim, este é seu pensamento, mas será que os almirantes vão compreender isto? Não, começamos e vamos terminar nossa missão. Vamos abrir estas vagens mesmo que para isto tenhamos de usar os canhões de bordo. O reator no laboratório técnico é pequeno demais para essa tarefa. A experiência lá embaixo não pode ser considerada como definitiva.
Schonepal sabia que estava subestimando a realidade. Queria apenas tranqüilizar a si mesmo.
— Este desgraçado “ovo” do diabo me acaba deixando louco.
O primeiro oficial dizia isto furioso e com um princípio de desespero.
— Tem de haver uma possibilidade de solucionarmos este mistério. Enquanto não soubermos nada de certo a respeito, não devemos sair da Explorer.
— Sou de outra opinião, McNamara. As pesquisas podem prosseguir, mas não podemos omitir esforços para obtermos conhecimentos mais amplos. Se as vagens não nos derem nenhuma resposta, talvez as cavernas e corredores nas montanhas nos permitam alguma explicação. Vou mandar um grupo de voluntários para lá.
— Estou curioso para ver quem se apresenta como voluntário.
Logo se constatou que o pessimismo de McNamara estava errado. Apresentaram-se duas vezes mais do que era necessário. Schonepal deixou a direção do grupo a Borowski, entregando também a ele a seleção dos voluntários e, uma hora depois, partia o novo grupo de exploradores. O motorista agora era o sargento Crack.
A seu lado estavam sentados Borowski e Hoax, sendo que o grupo contava ainda com oito cientistas dos diversos setores. Dos que tomaram parte na expedição do dia anterior não havia ninguém.
Pararam diante de outra caverna. Crack permaneceu na viatura, enquanto Borowski, com seus nove companheiros, penetrou no corredor. Estavam em contato permanente com Crack através do rádio, que por sua vez achava-se em linha também com o Comandante Schonepal.
A caverna era mais ampla e mais ramificada que as duas do dia anterior. Aliás, o número de cavernas era menor, enquanto os corredores, sempre uniformes, penetravam muito mais na montanha, terminando sempre em pequenas câmaras. Em todas elas havia as misteriosas vagens, mas não se encontrou outro esqueleto de sáurio gigantesco.
Voltaram, pelo meio-dia, para a viatura anfíbia de lagartas e tomaram a direção do leste. Borowski propusera examinar, mais uma vez, o mecanismo junto do qual estava o esqueleto do sáurio pré-histórico.
Metade do dia 4 de agosto de2.326 já passara.
O esqueleto estava do mesmo modo que no dia anterior, também o mecanismo a seu lado. Alguns técnicos se prepararam para examiná-lo. Enquanto cinco homens ficaram ocupados ali, Borowski, Hoax e mais três cientistas penetraram pelo recinto dos nichos. Também ali tudo parecia estar como antes. A luz dos faroletes de bolso refletia nas tais “vagens de feijão” ou “de ervilha” e as paredes tinham um brilho esverdeado.
Hoax ajeitou seu transmissor portátil e entrou em contato com Schonepal através de Crack, na viatura. Poderia ter feito uma ligação direta com a Explorer, mas a misteriosa irradiação dos vegetais petrificados aumentara muito, dificultando a transmissão direta para a nave.
Borowski estava exatamente se inclinando para apanhar uma vagem, quanto sentiu um leve tremor sob os pés. Voltou à posição normal e olhou para seus companheiros como a querer perguntar alguma coisa.
— Que foi isto?
— Talvez um tremor de terra? Hoax deixou seu transmissor ligado. Na montanha é muito possível isto.
— Terremoto é possível em qualquer lugar, não apenas nas montanhas — contestou Borowski. — Quem sabe devemos fugir daqui? Se o corredor desmoronar, ficamos presos!
Um segundo abalo sacudiu a todos, fazendo com que alguns cambaleassem. O teto da imensa galeria, porém, estava firme. Contudo, de um lado rolou um fragmento de rocha.
— Vamos embora, Hoax. Pegue o transmissor, temos de sumir daqui.
Ouviu-se a voz do sargento Crack:
— Tenha cuidado, tenente, aqui fora a terra também treme. O anfíbio blindado balança como um navio na tempestade em alto-mar. Como posso apanhá-los na montanha, se ela desabar em cima de vocês?
— Não se preocupe, as rochas são firmes.
Borowski ouviu passos que se aproximavam rápidos. Não ficou surpreso quando os cinco técnicos, que haviam ficado na caverna do sáurio e do mecanismo, voltaram de repente para a câmara dos nichos. Estavam ofegantes e de fisionomia transtornada.
— Que aconteceu? Por que não ficaram onde estavam?
— A máquina, senhor! A máquina... começou a trabalhar.
Borowski repetiu perplexo:
— Começou a trabalhar?! Que quer dizer isto?
— Recomeçou sua atividade, pode-se ouvir perfeitamente. Quando se deu o primeiro tremor de terra, começou um zumbido no seu interior, alguns mostradores começaram a funcionar e pequenas lâmpadas acenderam. Resumindo: está funcionando. O abalo sísmico deve ter dado ensejo para isto.
— Como deveria...? — começou Hoax. Mas logo foi interrompido por Borowski.
— Então não foi um terremoto comum, deve ter acontecido algo que ninguém podia prever. Hoax, informe Schonepal do ocorrido, enquanto nós nos retiramos.
Um terceiro tremor veio retardar a retirada. Foi exatamente o tempo necessário para que fossem desencadeadas as forças do inferno...
— As vagens! As vagens!... — exclamou alguém espantado.
Borowski olhou para os nichos. A princípio não notou nada de extraordinário, mas depois... Os pretensos vegetais estavam se movendo!
Era como se estivessem levando pancadas, compressões fortes e mesmo impulsos. Tremiam convulsamente. Algumas vagens saltitavam tão alto que caíam no meio da caverna. Duas delas chegaram a rebentar.
Quando viu o que continham as duas cápsulas, uma sensação de quase pânico tomou conta de Borowski. Um invólucro abriu, expondo seu conteúdo: um ser vivo semelhante a um lagarto de cabeça redonda. O comprimento total era de uns onze centímetros, puxando para o roxo e, no meio do corpo, havia um forte estreitamento, como se fosse um inseto. Na parte de trás da grande cabeça sem olhos, destacavam-se quatro ferrões duplos, como para morder, dois em cima e dois embaixo.
As vagens eram ovos!
No mesmo instante, passou pela cabeça de Borowski a semelhança do minúsculo animal com o esqueleto do gigantesco sáurio, mas lhe parecia impossível que um monstro daquelas dimensões pudesse surgir de larvas tão diminutas. Devia levar muitos anos até que aqueles filhotes tão pequenos chegassem àquele tamanho. Não teve porém mais tempo para pensar, pois os acontecimentos se precipitaram...
Os dois animaizinhos começaram a se mover. Só agora, Borowski percebeu os minúsculos pezinhos que estavam sob o peito. Eram tantos que não conseguiu contar, mas calculou por alto uns cinqüenta. As outras “vagens” estavam também rebentando e em poucos instantes a caverna estava repleta de filhotes de lagartos, que aparentemente passavam alguns segundos parados, se adaptando ao meio.
— Vamos levar uma conosco — disse Borowski, que já havia esquecido os abalos sísmicos e não imaginava novos perigos. — Acho que agora conseguimos finalmente uma prova. Garret, você queria ter a bondade de...
Garret fez que sim com a cabeça e se agachou para pegar o filhotinho que se contorcia a seus pés, como se sentisse alguma coisa. Os outros homens viram fascinados como o animalzinho, de repente, se encurvou todo e deu um salto contra o rosto de Garret.
Foi por mero acaso que Borowski presenciou o incidente e viu a boca do animalzinho bem aberta. Uma fila de dentes bem finos surgiu. No centro desta fila, havia um dente maior, um tanto curvado para trás, tendo um orifício na extremidade. Desta abertura mínima jorrou um jato fino e lei-toso que atingiu Garret.
Quando este líquido se dispersou, não havia mais Garret!
No chão se via apenas uma gosma indefinida não se sabe de quê.
— Para fora daqui — gritou Borowski, dando um empurrão em Hoax.
O radiotelegrafista deixou cair seu aparelho, que erguera do chão há pouco, e saiu correndo. Também os outros cientistas compreenderam a situação e fugiram. Mas as recém-nascidas lagartas tinham um terrível senso de orientação e atacaram imediatamente. Tentavam, às centenas, barrar o caminho da fuga aos terranos e se lançaram no seu encalço, soltando seu líquido mortífero, que destruía qualquer matéria.
Borowski ainda conseguiu ver mais três vultos caírem por terra e se transformarem num líquido espesso no chão, mas continuou correndo. Com um grande salto, passou por cima de três ou quatro lagartos, atingindo o corredor, sem olhar mais para trás, continuando em desabalada carreira. Ouviu passos atrás de si. Tinha, pois, certeza de que outros também conseguiram escapar.
Mas o longo corredor e o eco produzido dentro dele o enganou. Quando atingiu a caverna onde se achava o monstro do esqueleto, era somente Hoax que estava com ele. Dos outros oito cientistas não havia nenhum sinal.
— Olhe ali! — disse Hoax, ofegante e exausto, apoiando-se na parede. — A máquina! Que aconteceu com ela?
Borowski ficou olhando para o mecanismo que estava ainda perto do sáurio gigante. Ouviam um zumbido bem forte, que periodicamente aumentava e diminuía. O chão da caverna trepidava e o metal do bloco mudara completamente de cor, passando agora para um rosa incandescente. Só então foi que Borowski e Hoax perceberam como estava quente ali.
— O negócio pode explodir a qualquer momento. Não podemos deixar os outros abandonados à própria sorte...
— Nenhum deles está vivo, tenente — interrompeu-o Hoax. — Eu vi quando as larvas os atingiram. Horrível. Isto é um planeta ou é o inferno?
— Schonepal tinha receio disso e apesar de tudo não se evitou a catástrofe. Mas ele não tem culpa nenhuma. Queria só saber se há alguma relação entre os tremores de terra, o súbito funcionamento da máquina e o surgimento dos animaizinhos dos ovos.
— Não podemos ficar mais tempo aqui, tenente. Estes bichinhos terríveis logo chegarão.
Havia determinação nos traços fisionômicos de Borowski, quando tirou do cinturão a pistola energética.
— Vamos ver se resistem à energia pura. Não vamos nos entregar assim tão facilmente.
A muito custo deixou-se convencer por Hoax a tomar uma posição que possibilitasse a fuga imediata.
Depois esperaram um pouco.
Primeiro não ouviram outra coisa fora do zumbido da máquina. Depois, foi um sussurro que vinha de longe e se aproximava rápido. Começaram a chegar os primeiros animaizinhos na entrada da caverna.
— Saltam como

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