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TCC - O desamparo Infantil e a Inibição na vida Adulta

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DESAMPARO, ANGÚSTIA E INIBIÇÃO 
DESAMPARO, ANGÚSTIA E INIBIÇÃO
Desamparo, Angústia e Inibição
Um Estudo de caso
Marizil de Oliveira e Elizabeth C. Landi
Pontifícia Universidade Católica de Goiás PUC, Goiânia, Goiás.
Goiânia
2017
Resumo
O presente trabalho tem o propósito de contribuir, na visão psicanalítica, para a compreensão da relação entre os estados de desamparo e a angústia, vivenciados na infância, e a manifestação, na vida adulta, de algumas inibições das funções do Eu, que ressoam em queixas recorrentes na clínica psiquiátrica onde, por vezes, são interpretadas como transtorno de ansiedade. Este estudo tem como fonte principal os textos freudianos, com o apoio subsidiário de textos de autores pós-freudianos. Seu objetivo é discutir questões relacionadas a alguns conceitos psicanalíticos que nos permitam refletir sobre a estruturação do sujeito, bem como articular desamparo, angústia e inibição. Para tanto, o método escolhido foi o estudo de caso referente ao atendimento de uma paciente realizado no Centro de Estudos, Pesquisas e Práticas Psicológicas (CEPSI), cuja queixa inicial era sentimento de angústia perante algumas pessoas, o que lhe causava dificuldades nas relações sociais. Desta forma, o estudo atingiu o objetivo proposto articulando a teoria e a prática na tentativa de compreender como a inibição se dava num caso de neurose de angústia, em particular no caso em estudo que, como resultado possibilitou a paciente se reconciliar com sua própria história apresentando melhoras nas suas interações sociais. 
Palavras-chave: desamparo, inibição, angústia, neurose fóbica.
Noção de Desamparo em Freud
	O objetivo do presente estudo é compreender como o desamparo, a angústia e a inibição se articulam no contexto de uma neurose fóbica e como se dá, na vida do sujeito, a caracterização de tal neurose. Assim, sob a luz da psicanálise e acompanhando o pensamento freudiano sobre o processo de estruturação do aparelho psíquico percebe-se, de imediato, a ligação que este tem com o desamparo do sujeito. Freud (1895/1996) se refere a tal desamparo como a condição de total dependência de um outro cuidador, normalmente a mãe, devido à sua prematuridade motora e psíquica de comunicação no início da vida.
	Segundo Pereira (2008), na teoria freudiana o desamparo não é entendido apenas como um estado de precariedade psicomotora do recém-nascido e nem só se refere às condições acidentais do funcionamento psíquico, mas a todo processo em que a linguagem esteja envolvida. Freud, segundo o autor acima citado, desenvolveu sua teoria sobre o desamparo de forma progressiva, sendo que, no começo de seus estudos percebeu o desamparo como a incapacidade do bebê em dar conta de suas necessidades de sobrevivência. Mais tarde, passou a relacioná-lo aos fundamentos da teoria da angústia e a teoria da constituição do Supereu, e assim, “conferir-lhe um estatuto de dimensão fundamental da vida psíquica que indica os limites e as condições de possibilidades do próprio processo de simbolização” (p. 127). Portanto, o desamparo inicial dos bebês humanos torna necessária a ação de seus cuidadores o que os aliena na dependência a um outro, sendo assim, submetidos a ele e dependentes da interpretação do Outro para simbolizar suas próprias necessidades e desejos.
	Freud (1895/1996) fazendo referência ao desamparo no sujeito diz que “o desamparo inicial do ser humano é a fonte originária de todos os motivos morais” (p.32) destacando a impotência do bebê em cuidar de si mesmo, o que o levaria, em consequência, a ser cuidado e amado por seus pais. Portanto, justificando a noção de dimensão fundamental que a palavra desamparo assume em sua teoria. Ressalta ainda, que ao nascermos, somos incapazes de realizar, sem a ajuda de outros, mudanças necessárias, tanto no nosso mundo interno como externo, para a indispensável descarga do excesso de excitação originada no interior do nosso corpo. Segundo o proposto por Freud (1895/1996), essa é a marca do desamparo, que se configura a partir do momento em que, mesmo depois de adultos, as ameaças do mundo externo e do próprio corpo nos colocam na mesma situação dos recém-nascidos, ou seja, na situação de absoluta impotência e totalmente dependentes da pessoa responsável pelos cuidados. 
Por consequência, mais tarde, Freud (1926/1996) esclarece que, a partir da situação edípica, a mãe é que aparece como esse outro protetor, vez que, face a dependência do recém-nascido é ela que, normalmente, cumpre a função de cuidar e suprir as suas necessidades vitais. Sendo assim, a criança ante a sua impotência se entrega aos cuidados maternos. Nesse sentido, Pereira (2008) explica que é nessa entrega em tenra infância para o mundo adulto, que se fundamenta a situação de desamparo infantil como correlata ao desamparo motor dos recém-nascidos. E como o desamparo psíquico é correspondente ao desamparo motor, a dependência da criança a seus cuidadores faz com que essa situação seja primordial para que ela se sinta amada e possa corresponder ao desejo dos pais. Em decorrência disso, Freud (1926/1996), afirma que “a angústia se revela produto de desamparo psíquico do bebê, que é a contrapartida evidente de seu desamparo biológico. ” (p. 60).
O Desamparo e o Perigo da Castração 
	Nos termos da teoria freudiana, o nascimento do bebê constitui o protótipo psíquico da situação de desamparo, vez que é nessa experiência traumática que o incipiente aparelho psíquico do recém-nascido experimenta um terror cruciante, sem representação psíquica, provocado por uma avassaladora excitação que lhe invade a psique diante das perturbações na hora do parto. Nesta primeira vivência traumática o recém-nascido confronta-se passivamente com o perigo da aniquilação, por não ter sido preparado previamente por um sinal que lhe avisasse do perigo iminente a ser evitado. O que significa dizer que nestas condições a situação de desamparo representa “o perigo essencial do qual foge o aparelho psíquico” (Pereira, 2008. p 176), cuja causa específica é a acumulação de tensão pulsional produzida pela excitação não descarregada em razão da inexistência de uma representação psíquica correspondente. 
No texto Inibições, Sintomas e Angústia, Freud (1926/1996), ensina que a essência da situação traumática é o desemparo do Eu embrionário, ante ao aumento da excitação pulsional. E tal desamparo, segundo Freud (1985/1996), refere-se à condição com que nasce a criança, totalmente dependente de um outro ser humano, devido a sua prematuridade motora e de comunicação no início da vida.
Nesse contexto, o estado de desamparo é entendido como semelhante ao estado traumático do nascimento, portanto, uma situação de perigo. O perigo ao qual Freud (1926/1996) se refere “é a de não satisfação, de uma crescente tensão devido à necessidade, contra a qual a criança é inerme” (p.161). Assim, a situação de perigo tem lugar, no espaço temporal entre as exigências pulsionais e o aparecimento da angústia. Assim sendo, para Freud, o perigo é de natureza pulsional, o que caracterizaria uma situação traumática.
Freud (1926/1996) ainda sugere que os perigos pulsionais estão relacionados, primeiramente, ao trauma do nascimento (separação do bebê do corpo da mãe) e depois, as outras separações ou perdas de um objeto amado como: a mãe, o seio, o pênis, o amor do objeto e o amor do Supereu, e que podem conduzir a um acúmulo de desejos não satisfeitos, portanto, a uma situação de desamparo que é correlata ao perigo de castração. 
Nesse sentido, Leite (2011) explica que quando um sujeito se acha em uma situação de desamparo, estruturada na forma de perda do objeto, ou seja, no perigo de castração, a angústia se manifesta como uma espécie de aviso para o perigo advindo de tal situação pois, o acúmulo de desejos no desamparo expõe o sujeito às exigências libidinais e o aprisiona ao que ele mais receia, a castração. Nessa direção, Freud (1926/1996) afirma que "uma exigência pulsionalnão é, afinal de contas, perigosa em si; somente vem a ser assim visto que acarreta um perigo externo real, o perigo da castração" (p. 126). Apesar disso, esse temor a castração, nas mulheres, não estaria presente, razão pela qual Freud (1926/1996) esclarece que para a mulher a situação de perigo é a perda do objeto, mais precisamente, a perda do amor do objeto, o que significa que o temor à perda do amor é, para as meninas, o correspondente ao temor de castração para os meninos. Assim, de certa forma, fica implícito no ensino de Freud que a situação de desamparo é também, o perigo de perder a condição de objeto de amor do outro. Pois que, o temor à castração, enquanto simbólico e equivalente à perda do amor, acha-se vinculado à angústia manifesta na ausência da figura materna, que deriva da insuficiência, psíquica e motora, nos anos inicias da vida de uma criança. Assim, a ausência materna é correlata a uma situação de desamparo quando essa ausência representar a não satisfação das necessidades da criança. 
Angústia em Freud e a Perda do Objeto Amado
De acordo com a teoria de freudiana, a angústia consequente do estado de desamparo no nascimento se desenvolve, num primeiro momento, quando o aparelho psíquico pode conservar traços de memória de uma experiência corporal terrível, de um excesso pulsional que não encontra meios de descarga em simbolização, porquanto, incompreensível. E, num segundo momento, onde a vivência do desmame é tida como prototípica, na medida em que o desmame passa a dar sentido de separação ao trauma do nascimento. Porque, segundo Hanna e Souza (2005), o trauma do nascimento, enquanto referência prototípica, possibilita inscrever originalmente na psique algo assim, tão traumático que deverá ser sempre evitado.
 Freud (1926/1996) esclarece que esse mecanismo fundante do trauma do nascimento é o fundamento da angústia automática, a qual é herdeira da teoria da neurose de angústia, caracterizada por uma forma terrível e incontrolável de excitação pulsional. Por isso que, o trauma do nascimento permanece ao longo da vida do sujeito como um registro histórico que demarca, com uma profunda perturbação corporal, a emergência de uma angústia insuportável que se reedita nas situações de perigo, tais como: na separação do outro ou na perda do objeto amado. E, para explicar essas reedições da angústia automática, Freud (1895/1996) utiliza-se da experiência de satisfação das necessidades vinculando essa experiência à presença do outro, como condição imprescindível para a sua ocorrência, fundando assim, o traumático sobre a experiência da separação.
Por conseguinte, valendo-se da articulação do princípio do prazer/desprazer Freud (1926/1996) propõe que a experiência do desmame, também se caracterizaria um momento protótipo do trauma, vez que, é no desmame que a experiência traumatizante do nascimento ganha sentido e significação de separação. Assim, a partir da experiência do desmame, “será a perda do outro amado o que remeterá a esta condição de abandono absoluto e de desamparo ante o crescimento pulsional” (Pereira, 2008 p. 183).
Segundo Freud (1926/1996), a angústia surge como um sinal de perigo, o qual evoca a lembrança do vivido em absoluta insuficiência do aparelho psíquico para dar conta do aumento da excitação pulsional, como a que acontece no nascimento. Essa excitação atenuada será reproduzida sempre que uma situação semelhante se apresentar. Nesse sentido, a angústia torna-se uma espécie de alarme do Eu, sinalizando a aproximação de algum perigo de ordem pulsional.
 No sentido de explicar as diferenças entre angústia como sinal de perigo e angústia automática, Brenner (1972) comenta que pela definição freudiana, a angústia como sinal de perigo está relacionada a reedição atenuada da angústia manifesta ante o trauma do nascimento, enquanto a angústia automática é o próprio temor à castração. Assim, esse temor da castração, da separação do objeto amado, não se refere só ao objeto fálico, mas também, a toda uma série de objetos que se encadeiam a partir dele, fazendo dela o alarme a ser emitido nas ocasiões em que o sujeito corre o perigo de se separar de seu objeto amado, de ser castrado. 
Conforme Hanna e Souza (2005) a ameaça de separação da mãe, do seio, do pênis, do amor do objeto e do amor do Supereu constituem momentos situacionais em que a angústia sinaliza o perigo que a perda dos objetos pode representar ao deixar a pessoa exposta às exigências libidinais, ou seja, ao perigo de castração originado na estruturação do sujeito diante da situação edípica. Esse deslocamento da situação traumática do nascimento para a situação de perigo é, na teoria freudiana, a constituição do mecanismo da angústia como sinal, o qual pode ser entendido como a rememoração do afeto que se derivou do trauma original que se vincularia às vivências traumáticas futuras, quando então o Eu, já mais estruturado e organizado, o perceberia como um sinal de alerta para desencadear seus mecanismos defensivos, visando evitar ao impedir o desenvolvimento de uma angústia insuportável, a angústia automática. E, essa é a angústia de castração originária no perigo de castração no édipo.
Neste contexto, Freud (1926/1996) caracteriza a angústia como uma exigência pulsional que tem íntima relação com os investimentos libidinais e a ameaça de castração. Pois que, o desamparo passa a ser o cerne da situação de perigo e o perigo de castração o motor dos investimentos libidinais dando causa a angústia pois, a natureza de todo perigo, na perspectiva da psicanálise, é ser pulsional. 
Segundo Hanna e Souza (2005), na situação edípica do menino, a angústia de castração emerge quando lhe é impossibilitado investir libidinalmente na mãe, instado pela lei contra o incesto. Situação em que, a criança se vê frente a perda do objeto amado, ou seja, o objeto materno desejado, sendo irremediavelmente marcada pela ameaça da perda desse objeto. Assim, a angústia de castração na teoria freudiana representa um medo inconsciente da perda do pênis, que surge durante o estágio fálico do desenvolvimento psicossexual, o qual permanece latente por toda a vida. 
Em resumo: Freud (1926/1996), explica que a angústia é uma reação a uma condição de desamparo no trauma. Na reformulação de sua teoria sobre a angústia, passa a considerá-la como um estado afetivo, vendo-a como resquícios de vivências traumáticas antigas, que, quando revivida em situações equivalentes, é relembrada como símbolo mnêmico da vivência traumática originária. Ensina que a vivência traumática originária é o fundamento para o aparecimento da angústia ao longo da vida do ser humano. Esclarece que o nascimento é vivido como uma situação de desamparo e, a angústia sentida no nascimento, será então, lembrada e repetida em todas as situações traumáticas de separação ao longo da vida do sujeito. E explica finalmente, que na experiência de separação, em que ocorre a perda do objeto amado é que, precisamente, a angústia de castração manifesta a sua expressão mais significativa. 
Funções do Eu e Inibição
De conformidade com a teoria estrutural freudiana, o aparelho psíquico do bebê humano ao nascer é um todo indiferenciado que, paulatinamente vai se diferenciando a partir das representações psíquicas dos impulsos primários dando origem às instâncias psíquicas, Isso, Eu e Supereu, as quais se desenvolvem de forma gradual e progressiva, definindo, cada uma dessas instâncias, as suas funções na constituição e funcionamento do aparelho psíquico do indivíduo. Assim, no nascimento, o Isso representa a totalidade do aparelho psíquico enquanto o Eu e o Supereu, partes do Isso, vão se diferenciando paulatinamente, até se tornarem entidades funcionais independentes. Essa diferenciação acontece primeiramente com as funções do Eu e, posteriormente, com as funções do Supereu. 
No texto O Eu e o Isso, Freud (1923/1996), esclarece que as funções do Eu são aquelas vinculadas às relações do indivíduo com o seu ambiente. Portanto, o Eu passa a ser a parte da psique que se relacionacom o meio ambiente visando alcançar o máximo de gratificações ou descarga para o Isso. Assim, no início de seu desenvolvimento, o Eu é tido como executor dos impulsos e mais tarde, mais organizado e desenvolvido, começa a exercer também, as funções de controle sobre os impulsos combatendo certos desejos do Isso, entrando em conflito declarado com eles, em razão de sua articulação com o princípio de prazer/desprazer. A esse grupo de funções sobe o comando do Eu, Freud (1923/1996), deu-lhe o nome de funções do Eu esclarecendo, que essas funções no processo do desenvolvimento infantil se expressam no controle motor, na percepção sensorial, na memória, nos sentimentos e nos pensamentos. Em 1926, Freud agrupou alguma dessas funções em conformidade com suas utilidades funcionais, tais como: função sexual, função de alimentação, função de locomoção e função de trabalho.
Brenner (1972) explica que, se no decurso da estruturação do aparelho psíquico, uma criança for privada do contato e dos estímulos físicos normais, pela mãe, principalmente, no curso do seu primeiro ano de vida, algumas das funções a cargo do Eu não se desenvolverão de modo adequado, podendo ser essa a causa de alterações na sua forma de se relacionar com o ambiente externo em razão da fragilidade estrutural do Eu. Por outro lado, as funções do Eu também podem ficar prejudicadas se, no processo de seu desenvolvimento, ocorrerem exagero nas frustrações ou nas tolerâncias, dificultando a criação das identificações. Identificação é o “ato ou processo de tornar-se semelhante a algo ou alguém, em um ou diversos aspectos do pensamento ou comportamento”. (Brenner, 1972. P.56). 
Nesta direção, Nasio (1999) ensina que pela teoria freudiana, quando os impulsos são pouco controlados pode acontecer deficiências nas funções do Eu e nas funções do Supereu. Pois, quando esse controle pulsional for rigoroso em demasia, pode resultar em um Eu muito tímido e o Supereu muito severo, tendo por consequências, conflitos entre essas instâncias psíquicas. Além disso, segundo Freud (1926/1996), o Eu, para resolver um conflito pulsional ou, ao menos, minimizá-lo, pode, deliberadamente, promover uma restrição ou redução da sua atividade o que foi nomeado por ele de inibição ou seja: “a inibição é a expressão da restrição de uma função do Eu” (p. 93). E como exemplo de uma inibição, Freud, neste mesmo texto de 1926, cita a incapacidade do pequeno Hans, de sair às ruas, afirmando ser essa sua incapacidade “uma limitação que o Eu se impõe para não despertar... angústia” (p. 15)
Sintoma, Inibição e suas implicações com a angústia 
	No texto Inibição, Sintoma e Angústia, Freud (1926/1996), mostra que a inibição pode ter causas diversas sendo classificadas como específicas e mais generalizadas em conformidade com a sua finalidade. As inibições específicas referem-se as inibições neuróticas em que o Eu, para evitar um confronto com o Isso, faz uma renúncia, desistindo de algumas de suas funções para evitar a angústia e não ter que fazer novamente um recalque das pulsões libidinais que lhe invade. O recalque é outra função do Eu responsável por manter fora da consciência as representações libidinais ou agressivas consideradas incompatíveis, o que nem sempre ocorre com pleno êxito, surgindo em decorrência, o sintoma. O Eu também pode, para evitar um confronto, agora com o Supereu, restringir suas funções inibindo-as, por não se ver merecedor dos benefícios que poderiam resultar se as atividades de tais funções fossem de fato realizada. Fazendo isso, o Eu atende a uma finalidade autopunitiva em decorrência da severidade do Supeu. Já as inibições mais generalizadas do Eu dizem respeito a um empobrecimento energético do Eu, principalmente, quando tem que enfrentar situações difíceis com os estados depressivos e luto.
	Ainda no mesmo texto, Freud (1926/1996) explica que a inibição acontece como uma medida cautelar, uma precaução fazendo uso de variados procedimentos, e esclarece que na dinâmica psíquica do mecanismo da inibição, o Eu enfraquecido devido seu embate com o Isso no recalcamento, vê-se ameaçado por moção pulsional indesejada e não querendo um novo processo de recalcamento, opta por renunciar ao deslocamento e a formação de compromisso, provocando assim, uma inibição em suas funções como medida preventiva contra a angústia já anunciada pelo sinal de perigo. Assim, a ação provocada pelo Eu de inibir suas funções se torna suficientemente capaz para evitar a angústia em perspectiva.
	Neste sentido, o reconhecimento do perigo de castração ou perda do objeto amado pelo sinal de angústia emitido pelo Eu, pode levar, dependendo de certas condições, o Eu a se decidir por um dos dois mecanismos, ou seja, escolher o sintoma ou uma inibição para evitar a angústia de castração. Assim, não há dúvida de “que existe uma relação entre inibição e angústia...” (Freud, 1926/1996. p. 92). E esta relação está no impedir o desenvolvimento da angústia. Angústia, que na psiquiatria se apresenta catalogada com distúrbio mental de ampla sintomatologia indo do pânico à fobia social.
Inibição, Vergonha de si e o Olhar do Outro
	Na compreensão da teoria psicanalítica a fobia social ou a timidez excessiva é a angústia ante o olhar do outro. É a vergonha de si. Segundo Venturi e Verztman (2012), vergonha é uma emoção que se apresenta ao psiquismo do sujeito, em determinadas situações e diante de uma condição específica, cuja representação é identificada como medo ou vergonha. É a exteriorização de um afeto nominado de vergonha. Enfim, essa emoção, nada mais é que a rememoração emocional do conflito edipiano no que se refere à situação do perigo de castração ou da perda do objeto amado. E quando houver possibilidade, real ou imaginária, do sujeito se deparar com tal situação de perigo, também sobrevirá estas sensações angustiantes nominadas, pelos autores citados, por medo ou vergonha. Neste contexto, Freud (1926/1996) explica que essas situações de medo são revivescências muito antigas ligadas ao período do desenvolvimento psicossexual infantil, quando as atitudes eram assumidas e o aprendizado era realizado com base nas emoções sentidas. [1: Membros do Núcleo de Estudos em Psicanálise e Clínica da Contemporaneidade – NEPECC, vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, onde, juntos com outros pesquisadores desenvolvem pesquisas focadas na clínica psicanalítica com pacientes diagnosticados pela psiquiatria com fobia social. ]
	Dando curso ao tema da vergonha de si, outra autora do NEPECC, Ferreira (2012) ensina que o sujeito envergonhado padece com o seu sentimento de insuficiência e inadequação diante de um ideal identificado na imagem do Outro. Assim, o que ele receia é a sua própria imagem e aparência ante o olhar de um outro. Para ele há sempre um outro que vê o que não é para ser visto. Neste contexto, Freud (1914/1996) fala do Eu ideal, quando no narcisismo infantil o sujeito se vê “possuidor de toda a perfeição e valor” se atribui uma perfeição imaginária, fruto do próprio narcisismo dos pais. Enquanto que o Ideal do Eu, já atravessado pelos valores da cultura e da crítica, passa a ser o substituto da satisfação que teria antes desfrutado e agora perdida, mas que o sujeito busca recuperar. Assim, o Ideal do Eu seria o que o sujeito projeta diante de si como sendo o seu ideal e, o Eu ideal seria a internalização pelo sujeito das construções e expectativas do Outro em relação a si próprio. Por outro lado, segundo Nasio (1997) o Eu é a imagem percebida, “o Eu está na imagem percebida e essa imagem percebida é o Eu” (p.21). Ainda, o mesmo autor, agora citando Lacan, esclarece que o ideal do Eu é uma instância simbólica, um elemento com uma constância organizadora, que impõe coerência à realidade psíquica. Enquanto o Eu ideal é uma expressão ligada ao campo do imaginário, “é a dimensão esperada do Eu, de se reconhecer como ele esperaria reconhecer-se” (p.24) 
	 Neste sentido, de acordo com Ferreira (2012), a emoção vergonha ocorre quando há um desacordo entre a imagemideal que o sujeito projetou para si mesmo e a sua fantasia imaginada de uma exigência do olhar do Outro. Desta forma, o que importa na vergonha é o que o sujeito atribui ao olhar do Outro. É ele imaginar o que o Outro vê. Porquanto, o sujeito, de acordo com os seus valores, percebe-se envergonhado ao achar que se coloca numa situação de desvantagem ante o olhar alheio. Assim, o que conta na vergonha é o ponto de vista do sujeito e sua fantasia sobre o olhar do Outro.
	Barbosa, Pinheiro, Verztman e Venturi(2006), explicam que o envergonhado ante o olhar do Outro é tomado pela angústia da vergonha, mesmo que o olhar do Outro não seja negativo. De tal modo, o envergonhado procura o tempo todo evitar o perigo do julgamento alheio e, consequentemente, evitar o desprezo e humilhação de outras pessoas, ante o aparecimento peculiar de uma angústia crônica que sinaliza a o perigo do olhar do Outro. Esta angustia sinal, mobiliza o psiquismo do sujeito fazendo colocar em ação as defesas do Eu que imediatamente provoca uma inibição em algumas de suas funções, limitando a sua exposição, impedindo que se torne uma exibição que contrarie a imagem idealizada de si mesmo, pondo fim a angústia.
	Segundo Nasio (1997), na vergonha de si que se apresenta principalmente nas interações sociais, o sujeito no qual a vergonha se manifesta, sente uma sensação de que algo de humilhante ou embaraçoso poderá acontecer na interação com outras pessoas. Nessas situações, normalmente, surge no sujeito pensamentos que refletem a imagem de que os outros vão julgá-lo no que pretenda fazer ou dizer. E assim, angustiado sente-se desaprovado, ignorado, criticado ou rejeitado pelos outros em razão de imaginar não poder corresponder-lhes a expectativa. Em assim sendo, uma angústia apavorante invade a psique do sujeito levando-o a evitar tais situações constrangedoras. Tal angústia tem sua origem na avaliação que o Outro pode estar fazendo de seu desempenho, portanto do olhar do Outro.
 De acordo com Fernandes (2000), Freud esclarece que um olhar constitutivo de um outro tido como primordial que, passa a transcender às pessoas do pai e da mãe e passa, numa dimensão simbólica, a estar ao alcance de uma dada cultura, olhar esse, será expresso por seus padrões ou exigências socioculturais. Neste contexto, segundo Zimerman (2001), na perspectiva da psicanálise a vergonha é vista como uma percepção mental distorcida, que só adquire sentido em função da presença, em especial, do olhar do Outro. O que é confirmado pela definição de Lacan, citado por Fernandes (2000), “o Outro é a exterioridade em relação ao indivíduo, enquanto lugar de linguagem que preexiste e condiciona toda existência humana” (p. 47). Ou seja, sendo o ser humano um ser de linguagem, é a partir do Outro equivalente à linguagem, que o sujeito se constitui e tem-se o Outro como o lugar onde as palavras adquirem sentido. Nessa perspectiva, se é o olhar do Outro que nos constitui sujeitos confirmando nossa existência simbólica, se esse olhar nos liberta, ele também pode nos aprisionar em ideias destorcidas de nós mesmos. Neste sentido é que a vergonha se apresenta como um sentimento social que surge perante o olhar do Outro. 
Em resumo: pela teoria freudiana, a vergonha, como medo do olhar do outro, surge no percurso do desenvolvimento do Eu, no início da vida. E, justamente na trama edipiana quando a criança toma conhecimento de si e da entrada de um terceiro na relação mãe-filho, é que a criança se vê e se percebe sendo vista ao mesmo tempo. Segundo Freud (1926/1996) é o olhar do pai que vê essa relação com a mãe e impõe a proibição do incesto, forçando o prazer decorrente dessa relação incestuosa entrar em processo de recalcamento. Esse olhar, no processo de identificação com o pai, será interiorizado e assimilado como Ideal do Eu. Porquanto, segundo Fernandes (2000), aquele olhar paterno, será reproduzido nas situações de perigo, será o olhar do Outro e provocará o sentimento da vergonha de si. Esse olhar do Outro se revelará um olhar temido e apavorante, capaz de fazer com que o sujeito se sinta transparente ante os Outros. E, essa é uma experiência muito angustiante para o sujeito. Então, o Eu, para evitar tal angústia que leva o sujeito a se sentir envergonhado e se fechar em si, produz inibições e impedimentos na tentativa de evitar o perigo, terrível e ameaçador da sua integridade que é o olhar do Outo.
Dessa forma, o objetivo desse trabalho foi compreender como o desamparo, a angústia e a inibição se articulam no contexto de uma neurose de angústia e como se dá na vida do sujeito, a caracterização de tal neurose. Essa pesquisa é relevante por incidir nas situações em que o sujeito apresenta alguma forma de inibição do Eu e sendo essas, normalmente, interpretadas e tratadas como doença, por conseguinte, com uso de drogas psicotrópicas que atuam sobre o sistema nervoso central e periférico, alterando de alguma maneira o comportamento do sujeito. E, sendo assim, o estudo sobre essa temática pode contribuir para o entendimento do que seria este quadro para a psicanálise e para alguns de seus possíveis desdobramentos clínicos. 
Método
Participante
A paciente escolhida para este estudo de caso aqui será chamada de Anna. É a filha do meio de uma prole de três; tem 34 anos; casada; cristã evangélica, reside com o marido que está desempregado; tem uma filha de 7 anos. Seus pais se separaram quando tinha 5 anos, sua mãe foi internada para tratamentos psiquiátricos quando tinha 2 anos; ficou separada da mãe por 5 meses, ficando aos cuidados da avó materna. Anna buscou o atendimento relatando necessitar muito de auxilio, pois se sentia angustiada, com medo de perder o amor da filha, se sentindo insegura diante dela, do próprio marido e de todas as pessoas com quem tinha algum relacionamento significativo.
Procedimento
A paciente foi selecionada nas fichas de triagem que estavam disponíveis para atendimento CEPSI (Centro de Estudos, Pesquisas e Práticas Psicológicas). E o critério de seleção do estagiário foi o turno disponível dos candidatos, e a preferência era pelo período matutino. Após a seleção da ficha de Anna, foi realizado o primeiro contato por telefone para marcar um horário com a paciente, combinando-se dia e horário para a primeira sessão. Os atendimentos iniciaram em agosto de 2016, duas vezes por semana, com duração média de 50 minutos cada sessão. 
Na primeira sessão foram esclarecidas as regras da instituição em relação aos atrasos e faltas. Esclareceu-se também que o referencial teórico que seria utilizado era o psicanalítico e assim, foi-lhe explicado a regra fundamental da Psicanálise, na qual pede-se para que o paciente fale o que lhe vier à cabeça, sem objeções. A escuta do estagiário se deu de modo flutuante, como orienta Freud (1912/ 1996) em Recomendações aos Médicos que Exercem a Psicanálise, para que não haja uma falsificação do que é escutado, nem seleção de material. Pois, a Psicanálise enquanto método consiste fundamentalmente na interpretação, por parte do analista, dos conteúdos inconscientes que comparecem no dispositivo analítico por meio da associação livre que Freud (1912/1996) aponta como “exigência feita ao paciente, de que comunique tudo o que lhe ocorre, sem crítica ou seleção” (p.126). Os conteúdos inconscientes são produções do sujeito que se repetem via transferência, como por exemplo: significantes, atos falhos, chistes, sonhos, sintomas. Para tanto, o analista deve conter todas as influências conscientes da sua capacidade de prestar atenção e abandonar-se à memória inconsciente na atenção flutuante. O estagiário se sustentou no tripé analítico, recebeu, portanto, supervisão semanal, realizou estudos teóricos individualmente e em grupo e submeteu-se à análise pessoal, como recomendado por Freud (1912/ 1996), para assim evitar o risco de projetar peculiaridades suas sobre a paciente. As supervisões semanais dos atendimentos foram realizadas com a Profª Msª Elizabeth Cristina Landi.
A duração dos atendimentos deu-se em vinte eduas sessões, visto que se iniciaram no segundo semestre de 2016, no mês de agosto e não houve prosseguimento no semestre seguinte, em razão de desistência pela paciente, que relatou estar se sentindo melhor, inclusive já havia retornado ao trabalho como vendedora e não podia mais comparecer aos atendimentos. Durante todo o período do atendimento Anna foi assídua e pontual. 
Resultados e Discussão
Anna, procurou o atendimento no Centro de Estudos e Pesquisas Psicológicas (CEPSI) por se sentir muito angustiada e com e com um profundo sentimento de menos valia. Nas entrevistas preliminares, as três primeiras sessões, Anna, relatou que, sendo a segunda filha de uma série de três irmãos, sempre foi uma criança triste e que nasceu em um momento em que seus pais passavam por graves problemas emocionais e financeiros. Seu pai, sem emprego fixo e profissão definida, estava viajando à procura de trabalho, enquanto sua mãe e irmã moravam com sua avó materna. Disse que depois do seu nascimento sua mãe começou a apresentar sinais de transtornos mentais exigindo cuidados especiais, pois agia de forma incompreensível colocando em risco a integridade físicas dos filhos e a dela mesmo, sobrecarregando assim, a avó materna nos cuidados e atenção para com as duas crianças. 
Anna, relatou que desde muito cedo em sua vida percebeu que sua avó materna demonstrava ter mais carinho e atenção para com sua irmã, a primogênita, do que para com ela e se sentia preterida na preferência da avó. Anna também disse que quando sua mãe não estava em crise, não se percebia tratada pela mãe com o mesmo cuidado que a sua avó dispensava a sua irmã, mas que mesmo assim, era ao lado dela o lugar onde se sentia protegida e amada, vez que seu pai sempre lhe foi muito ausente e distante. Afirmou que quando estava com um ano e dois meses, nasceu seu irmão caçula e que sua avó paterna assumiu os cuidados do bebê dado as condições de saúde mental de sua mãe.
Anna revelou que junto a sua mãe sentia-se feliz e segura, mesmo quando era colocada em um buraco cavado no chão e forrado com um pano, onde ficava enquanto sua mãe lavava as roupas de seus clientes. Disse também que quando estava com quase dois anos de idade sua mãe teve que ser internada em uma clínica psiquiátrica e ela se viu forçada a separar-se de sua mãe durante os cinco meses em que durou a internação e tratamento dela. Anna relatou que neste período de afastamento de sua mãe sofreu muito e chorava compulsivamente, apesar dos esforços de sua avó para acalentá-la, o que aumentava a animosidade de sua avó para com ela, que, por vezes, perdendo a paciência usava de violência verbal e física para fazê-la se calar e parar de chorar. 
Anna, ainda, relatou que sempre foi muito criticada pelos adultos quando criança, lembrou que certa vez seu pai lhe disse: “Você tem a coisa ruim de sua mãe” e que ela “era um lixo”. E no final disse: “É, às vezes é assim que me sinto, eu sou mesmo um lixo”. Então, o estagiário fez uma intervenção perguntando-lhe: “Será que é assim mesmo? Você é um lixo? ” Houve um momento de silêncio e logo depois ela disse: “Eu só me vejo assim e tenho me sentido assim há algum tempo. Tenho medo de acontecer comigo o que aconteceu com minha mãe, tenho medo de ficar doente e não poder cuidar de minha filha, pois já estou tendo até dificuldades para me aproximar e conversar com ela. É muito sofrimento e preciso de ajuda para mudar isso”. Assim a sessão foi encerrada e o estagiário pode perceber que a transferência com a Anna poderia ser possível pela via da escuta. Finalmente, um lugar onde sua fala poderia ser acolhida sem crítica, onde poderia ser ouvida e sentir-se melhor. Um lugar para dar voz ao seu silêncio. 
 Segundo Freud (1913/1996), o experimento preliminar destina-se a uma sondagem do caso e ver se ele se adequa ao tratamento psicanalítico, muito embora as seções preliminares já sejam o início de uma psicanálise, é nelas que se permite ao paciente falar quase o tempo todo, livre de interrupções, “sobre a história de sua vida ou a história de sua doença ou sobre a sua infância” (p.7). E tem como objetivo, segundo Quinet (2009), identificar o sintoma para que a análise propriamente dita possa dar início, “transformado o sintoma do qual o sujeito se queixa em sintoma analítico ” (p.16).
Na quarta sessão, Anna continuou a falar de seu sentimento de inadequação e de inferioridade. Queixou-se pelo fato de não se sentir bem em nenhum lugar, que sempre está aquém, sentindo-se inferior aos outros, que não consegue agradar, por mais que se esforce. Por isso se isolava, fugindo amiúde das situações sociais. Inclusive, já não estava mais frequentando sua igreja por temer ser convidada a dar testemunho, falar em público. Pela mesma razão, também deixou de trabalhar e estudar. 
 Para o estagiário o sintoma inicial já estava se evidenciando como uma neurose de angústia, quadro clínico descrito por Freud (1909/1996) como “histeria de angústia” por caracterizar uma entidade clínica em que o sintoma fóbico tem um caráter único e isolado, em que a fobia é a questão central e cujo mecanismo psíquico se assemelha ao quadro da histeria. Porquanto, é a partir do estudo do caso do menino Hans em 1909, que a neurose fóbica passa a ser compreendida como entidade nosológica com o nome “histeria de angústia”. Porém, é a partir da publicação do texto Inibição, sintoma e angústia que a Freud (1926/1996), passa a considerar a angústia neurótica como sinal de perigo a ser emitido pelo eu para impedir o desencadeamento da angústia-libido, como dito anteriormente. Assim, histeria de angústia, passa a ocupar um lugar independente na classificação nosografica, como um mecanismo próprio de defesa contra a angústia. Importante lembrar que para Freud, a fobia é a série de evitações ao objeto fóbico. Assim, no cotejo com a teoria fica claro em seu discurso que Anna apresentava sinais evidentes de inibições e evitações de algo que temia, ou seja, o olhar do Outro. 
Na sessão seguinte, Anna revelou o mesmo mal-estar em sua fala, queixando-se de sua dificuldade em estar na presença das pessoas importantes para ela. A certa altura da sessão, Anna narrou que abandonou os estudos “por não conseguir mais se esconder”. Então o estagiário imediatamente indagou: “Esconder? Como assim? ” Ela respondeu dizendo: “É, me escondia na sala de aula, sentava sempre no canto, ao fundo da sala de aula, para evitar ser vista pelos professores e assim evitar ser convidada a responder a alguma pergunta. ” Após um instante de silencio, o estagiário entendendo que poderia incentivar a paciente a continuar a sua fala lhe perguntou: “ O que você acha que poderia lhe acontecer se o professor lhe fizesse alguma pergunta? ” Ela então respondeu: “ Eu não suportaria, morreria de vergonha. ” O estagiário perguntou então: “Será que morreria mesmo? ” E a sessão foi encerrada.
Ao analisar a fala de Anna, o estagiário percebeu com clareza os movimentos de evitação de algo que se teme, no trabalho, na escola, na igreja, no contato com a filha e com o esposo em que Ela, revelou uma inibição incisiva para evitar se expor a um perigo ameaçador. Nesses casos, de fobia, Freud (1926/1996) ensina que o reconhecimento do perigo da castração, pelo sinal de angústia emitido pelo Eu, inibe o processo do investimento ameaçador do Isso. Anna apresentava uma inibição no funcionamento psíquico que, para evitar a angústia insuportável que o olhar crítico do Outro lhe despertava e, consequentemente, evitar o suposto julgamento produto desse olhar, esquivava-se do convívio social. Pois, segundo Freud no texto citado, nesses casos de inibição e de evitação, a angústia, em razão de seu dinamismo psíquico, tem fundamental função visto que a tendência à inibição se dá em consequência do Eu se ver ameaçado por um acúmulo de excitação e não desejando um novo recalcamento, desiste do deslocamento e da formação de compromisso promovendo paralizações nas funções do Eu capazes de evitar a angústia de castração iminente. Assim, a angústia sinaliza o perigoe a inibição, na proteção do Eu, paralisa algumas de suas funções. Porquanto, de conformidade com a concepção freudiana as evitações e inibições nada mais são do que resultantes dessas defesas contra a ameaça de castração representada pela angústia automática, a qual, como já foi dito e segundo Freud (1926/1996) tem como determinante uma situação análoga ao trauma do nascimento, em que o Eu fica desamparado diante de uma exigência pulsional contínua e crescente. Porquanto, para Freud, a angústia nas fobias é a angústia de castração. 
Neste estudo, estamos discutindo um caso de uma paciente do sexo feminino, uma jovem senhora, sendo assim, sobre a questão relacionada ao perigo da castração podemos pensar a angústia de castração na mulher como Freud (1926/1996) a descreve: “temos o direito de introduzir esta pequena modificação: mais que a ausência ou a perda real do objeto, se trata da perda do amor por parte do objeto” (Freud, 1926/1996, p. 135). E na conferência XXXII de 1932, ele sugere que o medo da perda do amor seja, possivelmente um prolongamento da angústia da criança quando constata a ausência da mãe. E, se a criança se percebe desamparada na presença da mãe da mesma forma de quando ela está ausente, então a criança fica insegura, sem ter a certeza de que suas necessidades serão satisfeitas e, provavelmente fique exposta a uma sensação angustiante geradora de uma forte tensão, análoga ao do trauma do nascimento.
Semelhantemente Anna disse que nasceu em um momento de muitas dificuldades financeiras para sua família e logo em seguida sua mãe ficou doente sem condições de cuidar dos filhos, sendo separada dela em tenra idade. Depois relatou que desde muito cedo constatou que sua mãe não lhe dispensava os mesmos cuidados que sua avó materna dedicava a sua irmã, o que lhe causava um sentimento inexplicável, confirmando assim, a teoria freudiana sobre o perigo da castração na mulher, ser análogo ao perigo “da perda do amor materno” (Freud, 1926/1996, p. 135), ou seja, na mulher a angústia de castração é a perda do amor. E que, no caso de Anna, essa angústia se repete, principalmente na sua relação com o pai onde, desde terra idade percebia a sua rejeição e abandono que, na vida adulta, veio se manifestar em forma de inibição perante o olhar crítico do Outro. 
Sendo assim, a situação atual de Anna, sugere uma relação com as situações de desamparo vivenciadas por ela no início de sua vida pois, Freud (1926/1996), ao referir-se à angústia como uma resposta do Eu à ameaça de ocorrência de uma situação traumática, portanto, de uma situação de perigo que se deu em tenra idade, explica o que aconteceu com Anna quando ainda bebê e se viu separada de sua mãe, fato que se repetiu, da mesma forma traumática, tempos depois, quando sua mãe teve que ser internada. Freud, no mesmo texto, sugere que a angústia fóbica advém como uma revivescência de situações vividas no passado como traumática que são reatualizadas em algum momento da vida do sujeito. E, esclarece ainda, que nesses casos o desejo recalcado do Isso que procura ter acesso à consciência é percebido como um perigo. No caso de Anna, o desejo recalcado perigoso era o pensamento de raiva insuportável que sentia de seu pai, quando este lhe criticava e a humilhava chamando-a de lixo, inclusive, em uma das sessões ela verbalizou o seguinte: “não me lembro de um elogio de meu pai, só me lembro dele me criticando e reclamando que eu chorava muito, dizendo que eu era um troço ruim que não o deixava dormir. Nossa! Como desejava que ele morresse! Assim, nunca obtive dele um elogio, um olhar de reconhecimento e de aprovação”. 
Então, hoje, aquele olhar crítico do pai de Anna, acompanhado das suas palavras ofensivas e xingamentos, funcionam para Anna como perigo de castração, reproduzido no olhar do outro que lhe é importante. Isso acontece porque, segundo a teoria freudiana, aquele sentimento hostil de Anna em relação ao seu pai, é hoje considerado pelo seu Eu como inaceitável e inadequado e, por consequência, sofre a ação do recalcamento no Isso, mas mesmo assim, procura insistentemente ter acesso à sua consciência, obrigando o seu Eu a reproduzir uma parte da angústia já vivida na situação do nascimento, que é representada por um sinal de desconforto que funciona como um alarme (angústia sinal), alertando da aproximação de uma angústia insuportável. Nestas condições o Eu de Anna, em resposta a esse sinal, põe em ação a inibição como mecanismo defensivo para evitar o olhar crítico do Outro.
Dessa forma, Anna, tende a se isolar afastando-se do convívio social, por jugar que o olhar do Outro vê nela o que o seu pai via quando ela era criança. E isso lhe é tão perigoso que, caso se veja na impossibilidade de evitar o olhar do Outro, a angústia liberada ameaçará engolfar o seu Eu, o qual se sentirá tão desamparado quanto na situação prototípica do perigo no trauma do nascimento.
Conclui-se, portanto, que o presente estudo atingiu seu objetivo articulando a teoria e a pratica na tentativa de compreender como o desamparo se articula com a angústia resultando em inibições na neurose de angústia, em particular no caso discutido de Anna. E que, por meio do dispositivo analítico possibilitou ao estagiário exercitar na prática, uma escuta de modo singular e se posicionar diante do indizível que angustiava a paciente, o que lhe permitiu conduzir a análise de forma a propiciar a reconciliação de Anna com sua própria história, bendizendo-a. E assim, favorecendo ao estagiário um crescimento pessoal e profissional, visto que apesar de seu interesse pela teoria psicanalítica ao estuda-la ao logo do curso, foi essa a primeira oportunidade de colocá-la em pratica num contexto clinico, fato que lhe despertou um forte desejo de continuar trilhando por esse caminho. 
REFERÊNCIAS
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