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Marlise There Dias Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa 49Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa 2.1 Contextualizando No capítulo 1, você conseguiu perceber a relação da filosofia e a ciência? Pelos estudos que realizou, você pôde verificar que as primeiras ciências apareceram a partir dos questionamentos filosóficos. A necessidade do ser humano em recriar e transformar a realidade é uma característica da filosofia moderna, fazendo surgir as primeiras ciências, como a matemática. A percepção impulsionadora desta descoberta foi a relação entre teoria e prática, percebida pelos pensadores da época. Neste momento, você saberia explicar o que é conhecimento? Todo o conhecimento é igual? Como se constrói o conhecimento? Sabe explicar o que é ciência? Este capítulo pretende mostrar a você as respostas a estas perguntas. Além disso, você encontrará, no texto, aspectos que relacionam a ciência, a filosofia e a pesquisa. Poderá saber de que forma a filosofia influencia a ciência e a pesquisa no decorrer dos tempos. Chamo atenção especial para a compreensão deste capítulo, pois os demais dependerão muito do conhecimento que você assimilar referente à ciência e pesquisa. 2.2 Conhecendo a teoria 2.2.1 Natureza do conhecimento Ao longo dos tempos, o ser humano busca o conhecimento pela sua necessidade, como os povos primitivos que se esforçaram em conhecer o mundo que os rodeava, a natureza, os animais, criaram objetos e formas A CIÊNCIA E A PESQUISA CAPÍTULO 22 Capítulo 2 50 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa de cura para sua sobrevivência e também para saciar suas curiosidades (FACHIN, 2001). Você consegue perceber a relevância e necessidade de conhecer o mundo para que possamos sobreviver? É pelo conhecimento que nos apossamos da realidade e dos objetos que fazem parte dela para lidar com as diferentes situações cotidianas. Em contraponto, se você pensar em seus conhecimentos, pode se espantar quando comparar ao existente no mundo. Ainda quando o possuímos, muitas vezes, esses conhecimentos são superficiais e, muitas vezes, incertos. Ao longo da história, as visões filosóficas focaram de forma diferente o conhecimento. Relembrando os períodos da origem da filosofia, temos os sofistas e Sócrates. Os primeiros acreditavam que todos os homens pensavam da mesma maneira, sendo a verdade a mesma para toda a humanidade. Para Sócrates, o ser humano precisava conhecer a si mesmo para que ideias pudessem nascer, e seria necessário se afastar das ilusões para que a verdade fosse conhecida. Platão abordava o conhecimento baseado na teoria das ideias, em que se reconhece o mundo sensível e o mundo inteligível. A definição de ciência como conhecimento verdadeiro que permite a compreensão da natureza é defendida por Aristóteles. No período chamado de patrística, considera-se que o conhecimento humano das verdades eternas é oferecido por Deus (MARTINS FILHO, 2000). Já os filósofos modernos questionavam se era possível o conhecimento da verdade e centralizado naquele que pretende conhecer. A posição em relação ao conhecimento de Descartes preconiza que as verdades absolutas são deduzidas pelo raciocínio. René Descartes (1560-1650) é considerado o pai da filosofia moderna e sossegou sua inquietude construindo a base para todo o seu pensamento a partir da máxima “Penso, logo existo” (Cogito, ergo sum). Filosofando sobre suas dúvidas, raciocinou que se duvida de algo é porque pensa sobre isto, e se é um ser pensante, existe. SAIBA QUE Capítulo 2 51Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa No período contemporâneo, em relação ao conhecimento, a busca consiste em compreender se o ser humano seria mesmo capaz de criar a tão sonhada sociedade, justa e feliz. O surgimento das ciências e campos específicos da filosofia marca o período. Você consegue perceber que o conhecimento, ao longo do tempo, é reconstruído sempre com a intenção de estabelecer um relacionamento entre o sujeito que deseja conhecer e o objeto a ser conhecido. Além disso, constitui- se de um ato intencional em que há o desejo do ser humano em investigar e compreender um fenômeno determinado. Neste momento, você deve compreender que, por meio do processo de conhecer, conseguimos interiorizar o que vem de fora, da realidade, gerando conhecimento. Quando o desejamos, há um motivo, necessidade que nos impulsiona a buscá-lo. Ao fazer uma análise sobre aspectos relacionados ao ser humano, Cervo, Bervian e Silva (2007) apresentam quatro tipos de conhecimento. Os autores explicam que, ao considerar o mundo, a realidade que rodeia uma pessoa, é possível ditar várias informações com base em experiências rotineiras adquiridas e no senso comum. Outro ponto destacado pelos autores é o recorrente questionamento da espécie humana sobre sua origem, sobre aspectos do presente e do destino. Ainda é possível ao ser humano estudar o que a Bíblia e os profetas de Jesus escrevem a serviço de Deus. Por fim, o homem pode ser questionado sobre a verificação e comprovação de relações entre fenômenos e objetos. Utilizamos as diversas formas de busca de conhecimento para que possamos evoluir e contribuir para o engrandecimento e também evolução da sociedade. Você conhecerá agora os diferentes tipos de conhecimento: empírico, filosófico, teológico e científico. Conhecimento empírico (vulgar ou de conhecimento do povo) Você já viveu a experiência de dar alguma receita de sua avó para uma determinada doença que é passada de geração em geração? Você já disse a um amigo: “olha, não faça experiência própria ou vai se dar mal”? Já observou algum pescador mencionando que determinada fase da lua é melhor para pescar? Capítulo 2 52 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa A resposta dada a todas estas perguntas chama-se empirismo ou conhecimento empírico. Muitas vezes, a planta que a vovó indicava para curar um ferimento ou uma erva para um chá para curar uma doença funcionava, mas não se sabe por que dava certo. As relações que temos em nosso dia-a-dia, seja em sua família ou trabalho, fazem com que você tenha conhecimentos que vieram por sua experiência de vida. Pense em atividades rotineiras que você realiza no seu trabalho, normalmente tarefas assim são executadas sempre da mesma forma. A primeira vez que surge um caso diferenciado, que você nunca executou, ao resolvê-lo, você revela um novo conhecimento que parte de sua experiência. Isso é considerado empirismo. Desde muito tempo atrás, as pessoas que exercem atividades como pescaria, seja por profissão ou lazer, se preocupam em verificar o período da lua buscando a melhor opção para a pesca, pela crença que esta afeta as marés, embora não saibam o porquê de tal ocorrência. Os pescadores têm razão: nas luas cheia e nova, as marés estão mais fortes, fazendo com que subam e desçam com muita violência (VENTUROLI, 1994). Pode-se perceber que o conhecimento empírico pode ser adquirido independente de estudos, pesquisas ou reflexões. Apresenta explicações para fatos da forma que suas experiências mostram ao sujeito que tem razão de ser daquela forma. Muitas vezes, o homem não sabe justificar aquele conhecimento, pois, na maioria das vezes, aprende em função de determinada circunstância, sem qualquer formalização da investigação realizada. Você percebe que o primeiro contato que realizamos é com o conhecimento empírico? Ao conhecer coisas e objetos, num primeiro momento, fazemos o reconhecimento, mas não nos aprofundamos em suas especificações. Você sabe identificar o que é um papel, mas não possui explicações mais científicassobre sua origem, a celulose. Você compreende que está com gripe, mas não consegue especificar que tipo de vírus o acometeu. Fachin (2001) apresenta ainda outros exemplos que possibilitam entender a limitação do conhecimento empírico. Você pode reconhecer e utilizar um lápis com frequência, mas alguns seletos notam que é composto por grafite e é um condutor de energia. Um homem pode também reconhecer uma folha Capítulo 2 53Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa de uma planta ornamental, agora se perguntarem sua classificação, de quais partes é composta, dificilmente saberá responder. Você percebe que os estímulos externos são relevantes para a criação do conhecimento empírico que advêm de nossas percepções a fatos que nos acontecem e que nos são repassados. Ao refletir sobre o conteúdo apresentado sobre conhecimento empírico, podemos unir alguns aspectos presentes, como a falta de especificidade, aceitar o básico sobre o que é dito ou se sabe sobre o objeto; tem foco nas realidades que se apresentam; o resultado da experiência está estruturado por quem a vivenciou, não há qualquer sistematização que afirme a veracidade do fenômeno. PRATICANDOPRATICANDO Pratique o exercício: identifique cinco conhecimentos que você tem e podem ser classificados como conhecimentos empíricos. Justifique por que você o considera desta forma. Isto o ajudará a entender melhor o conceito deste tipo de conhecimento. Conhecimento fi losófi co Acredito que seja possível a você rapidamente relembrar as noções que estudou até aqui. Como você aprendeu, a filosofia tem sua relevância por possibilitar a quem a estuda desenvolver algumas habilidades que permitem desenvolver o raciocínio. Além disso, pressupõe o questionamento ou investigação sobre algum fato novo, exigindo do filósofo uma reflexão crítica. Estes aspectos são necessários em qualquer ser humano com o desejo de estudar, desvelar novos fenômenos. Para Fachin (2001, p. 7), o conhecimento filosófico: conduz a uma reflexão crítica sobre os fenômenos e possibilita aos filósofos informações coerentes [...] objetiva o desenvolvimento funcional da mente, procurando educar o raciocínio. Capítulo 2 54 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa O conhecimento filosófico pressupõe uma reflexão sobre um fato ou objeto, sempre objetivando a busca da verdade, mas não seu estabelecimento a todo o custo. Assim, é possível, ao estudioso, por meio do debate de ideias, compreender o objeto e desenvolver seu raciocínio. Alguns aspectos são também destacados no conhecimento filosófico, como apresentar hipóteses não verificáveis; os questionamentos filosóficos são realizados de forma ordenada logicamente, e quando há indagações, estas estão em consonância com a realidade, pois advêm de fatos ou fenômenos sociais. De acordo com o que você estudou, o conhecimento filosófico propõe a reflexão e elabora princípios e valores válidos e considerados universais. Conhecimento teológico Você já deve ter ouvido a palavra teologia, e rapidamente, ao ler o subtítulo, fez uma relação com religião ou Deus. Você está no caminho certo. A origem da palavra vem do grego, em que theos significa “Deus” e logos significa “palavra”. Desta forma, podemos compreender a teologia como o estudo de Deus ou manifestações divinas. O que se pode afirmar a respeito deste conhecimento é que não há possibilidade de ser negado ou comprovado. Se você estiver frente a um mistério, como é o divino, você pode tomar dois caminhos: tentar de todas as formas usar sua razão, valendo-se de procedimentos e técnicas que possibilitem o transformar em conhecimento filosófico ou científico; ou aceitar o que é dito por alguém a respeito do mistério. Os mistérios nos colocam em situações complicadas ao necessitar tomar uma posição. Pense em alguns casos judiciais em que a situação é tão complexa que, embora haja um julgamento, sempre ficaremos desconfiados quanto à verdade. Por exemplo, um acusado de assassinato sem testemunhas em que o réu jura ser inocente. A menos que o acusado assuma a autoria do crime, nunca saberemos se falou a verdade, por não ter qualquer outra pessoa que tenha visto o incidente. Quando você acredita em algo que lhe foi contado por alguém, mas que você não tem como saber a verdade, demonstra uma atitude de fé. Assim, o conhecimento teológico refere-se àquele em que o resultado do Capítulo 2 55Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa intelecto, de sua razão recai sobre a sua fé, que se manifesta pela presença de revelações do mistério ou sobrenatural interpretados como revelação divina (FACHIN, 2001). Todos sabem da certeza de que se tem a respeito da morte. Costuma-se dizer que é a única certeza que o ser humano tem na vida: um dia, morrerá. Porém, há várias outras questões que não conseguimos responder, e muitos acreditam na existência de uma divindade e em resposta vindas dela. O que é exatamente esta divindade? Onde está? Como se apresenta? São perguntas que podem se modificar pelos anos da história e conforme a cultura dos povos. Deuses são cultuados há bastante tempo; alguns povos tiveram como esta figura o sol e a lua, outros acreditavam no Deus do amor e muitos recorrem a um Deus único, universal. Assim, o conhecimento que é revelado pela divindade se aceito pela fé teológica irá criar o conhecimento teológico. Independente da forma como os povos acreditam que seu Deus se manifeste, o conhecimento teológico existe e estará embasado na fé apresentada por estes povos. Aquilo que pensamos e acreditamos com fé nos move, faz pensar e sentir. Você já deve ter ouvido a máxima: “a fé move montanhas”. Ela nos diz que a fé contida em nós tem poder e está unificada com nosso intelecto e faculdades mentais. O conhecimento teológico são respostas, resultados que alcançamos utilizando nosso raciocínio, mas com base em revelações divinas. Conhecimento científi co Você lembra que o estudo dos tipos de conhecimento iniciou pelo empirismo? Ao primeiro olhar criterioso, pode lhe parecer um conhecimento bastante simplório, por não usar qualquer método e não ser sistemático. Por outro lado, você percebe que o conhecimento empírico está relacionado às primeiras informações que se recebe e tem sua origem em tempos remotos. Capítulo 2 56 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Neste sentido, para que seja gerado, o conhecimento científico necessita do empírico como base. É sobre a realidade existente, fruto do conhecimento empírico, que o ser humano irá estudar, procurando por comprovações, como causas e leis que possam ser aplicadas. Na busca da verdade e comprovação do empirismo, o estudioso deve se valer de métodos e sistematizações que possibilitem demonstrar os resultados encontrados. O pesquisador fará classificações, comparações, aplicará métodos, fará análises e sínteses para estruturar o conhecimento científico. A forma de conhecer utilizada para alcance do conhecimento científico difere do empírico exatamente pelo uso de instrumentos metodológicos. Espero que você tenha percebido a palavra “metodológicos”, que deve remetê-lo ao nome desta disciplina. Perceba que os estudos que fará nos próximos capítulos estarão relacionados à busca do conhecimento científico. A busca pela verdade dos fatos é objeto do conhecimento científico e não admite que o pesquisador se deixe influenciar em seus resultados por suas crenças ou valores. Para encontrar a verdade, é necessário que se tenha uma manifestação clara, transparente, o desvelamento e desocultamento do ser, que se chama evidência (CERVO, BERVIAN e SILVA, 2007). Você já deveter ouvido e usado a palavra evidência para demonstrar aspectos que demonstrem clareza de que, por exemplo, determinada situação ocorreu. Pense em sua mesa de trabalho. Todos têm formas específicas de cuidar das suas coisas. Você deve deixar seus documentos e instrumentos de trabalho organizados de seu jeito. Se, ao chegar ao seu trabalho, perceber algo diferente em sua mesa, dirá que tem evidências de que alguém passou por ali, mesmo que seja para realizar a limpeza. No caso do conhecimento científico, a evidência pode ser obtida por meio de instrumentos metodológicos e sistematização de estudo. Quando o pesquisador, embasado na evidência, chega a uma verdade considerada por ele de grande valia, em que não se tem dúvidas de sua veracidade, diz-se que se tem certeza. Cervo, Bervian e Silva (2007, p. 14) a definem como “um estado de espírito que consiste na adesão firme a verdade, sem temor de engano”. Se, no exemplo anterior, além de você ver seus pertences em lugares diferentes, perceber que uma mancha de café foi retirada de sua mesa, terá certeza de que alguém passou por sua mesa. Lembre que no conhecimento científico, tudo precisa ser comprovado de alguma forma. Capítulo 2 57Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Você pode pensar, então, que se chegou à certeza não há mais o que discutir sobre o objeto de estudo. Engana-se, atualmente não existem verdades absolutas e eternas. A qualquer momento, uma verdade pode ser contestada e pesquisadores podem refutar, mudar ou confirmar verdades. 2.2.2 A ciência e a fi losofi a Durante a história, em um longo processo, por meio de observações do meio em que vive, o homem reuniu e processou várias informações, criando conhecimento. Você conheceu as diversas formas de conhecimento existentes: empírica, filosófica, teológica e científica. Nenhuma destas pode ser descartada e o conhecimento empírico, por exemplo, é, por vezes, base para que haja investigação por meio de método, criando o conhecimento científico, que permite fazer ciência. Ao relembrar as questões filosóficas estudadas no capítulo 1, percebemos que, inicialmente, filosofia e ciência andavam entrelaçadas. Muitos filósofos foram responsáveis por desenvolver temas científicos, como por exemplo, Tales de Mileto e Pitágoras, que realizaram descobertas matemáticas. Porém, as descobertas de Galileu, comprovando matematicamente uma observação de mundo por meio da lei da queda dos corpos (chamada ciência positiva), fizeram com que ciência e filosofia se separassem. De acordo com Fachin (2001), ao longo do tempo, outros episódios demonstraram o aparecimento e fortalecimento da ciência, como: • a geometria apresentada por Euclides, baseado em conhecimentos egípcios; • os estudos sobre ciências naturais e biologia partindo da descoberta de movimento celular apresentados por Aristóteles e também de descrições de animais e classificações por meio de dados encontrados instituindo, em livro, uma metodologia; Figura 1 - Personifi cação da “Ciência” em frente à Biblioteca Pública de Boston Fonte: Science - Bela Pratt. Capítulo 2 58 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa • Francis Bacon sugeriu, baseado nas ideias de Aristóteles, que o método científico deveria iniciar com observação e experimentação; • a publicação do livro de René Descartes, O discurso do método, que sugeriu a apresentação da verdade pela utilização de procedimentos racionais; • Newton institui o conhecimento científico por meio da experimentação na matemática e da apresentação da simbologia empregada neste campo; • estudiosos como Stuart Mill e Claude Bernard introduziram aspectos referentes à forma como a comprovação científica deve ser realizada. Inicialmente, a filosofia era considerada a “dona do saber”, mas com o positivismo e a consideração exacerbada da razão, até mesmo a filosofia passou a ser considerada área inferior à ciência, e seus seguidores imaginaram que só haveria ciências, sugerindo a extinção da filosofia. Pelos estudos filosóficos do capítulo 1, foi possível observar que os conceitos puramente racionais foram extintos no século XX e a filosofia voltou à ativa como responsável pelos pressupostos da ciência. As demonstrações apresentadas pela ciência de que seus princípios não eram totalmente corretos e rigorosos e que seus resultados poderiam estar totalmente incorretos ou sem fundamentação abriram espaço para a filosofia. A incumbência de compreender, interpretar e discutir os conceitos, os métodos, os resultados alcançados pelas ciências, além de estabelecer a interdisciplinaridade entre as várias áreas de conhecimento, ficou a cargo da filosofia (ARANHA e MARTINS, 2001; CHAUÍ, 2003). EXPLORANDOEXPLORANDO Acesse o site http://www.abc.org.br/ e conheça a Academia Brasileira de Ciências. Esta instituição, fundada em 1916, reúne diversos cientistas de grande evidência em diferentes ciências, como Matemáticas, Físicas, Químicas, da Terra, Biológicas, Biomédicas, da Saúde, Agrárias, da Engenharia e Ciências Sociais. Capítulo 2 59Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Chauí (2003) afirma que há três concepções de ciência ditadas pela história: a racionalista, a empirista e a construtivista. E a autora (2003) explica: • Desde o período grego até o século XVII, tem-se a concepção chamada racionalista, em que a ciência podia comprovar verdades universais sem que houvesse dúvidas, sendo um conhecimento racional dedutivo e demonstrativo. • Na concepção empirista, cujo período é de Aristóteles, ao final do século XIX, o conceito de ciência é visto como interpretação de fatos com base em fatos e experimentações. • Na concepção construtivista, a ciência é vislumbrada como criadora de modelos que explicam a realidade, opondo-se à ideia de representação da própria realidade. O homem percebeu a possibilidade de pensar e conhecer vislumbrando que seus desejos podem ser descritos e que era possível a sua inteligência demonstrar e comprovar conhecimentos empíricos por meio de observação, experimentação e organização, obtendo o conhecimento científico e, assim, fazendo ciência. Gil (2008) afirma que, epistemologicamente, a compreensão do conceito de ciência é conhecimento. No entanto, como já se comprovou a existência de diferentes tipos de conhecimento, esta definição não é aceita, sendo mais adequado relacioná-la especificamente ao conhecimento científico. Para Fachin (2001), ciência pode ser conceituada como: a sequência permanente de acréscimos de compreensão e domínio de mundo, de maneira racional, realizada pelo ser humano. Outra definição diz que ciência pode ser “um conjunto de conhecimentos racionais, certos ou prováveis, obtidos metodicamente, sistematizados e verificáveis, que fazem referência a objetos de uma mesma natureza” (ANDER- EGG, 1978 apud FACHIN, 2001, p. 3). Cervo, Bervian e Silva (2007, p. 7) explicam que “ciência é entendida como uma busca constante de explicações e soluções, de revisão e reavaliação de seus resultados e tema consciência clara de sua falibilidade e de seus limites.” Capítulo 2 60 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Para Lakatos e Marconi (2010), ciência se refere ao aprendizado ou registro de fatos e sua demonstração por meio de causas que o constituem ou determinam. Você percebe que a ciência acontece por meio do emprego de meios formais e sistemáticos de observação e experimentação, que permitem a comprovação de determinado objeto de estudo, gerando conhecimento científico. Você consegue, neste momento, compreender as razões pelas quais está estudando esta disciplina?Qual a relação entre conhecimento, ciência e metodologia? REFLEXÃO A ciência possui, por sua natureza, um objetivo de estudo, em que há a preocupação de diferenciar características comuns de leis que regem determinados evento; uma função, relacionada à responsabilidade de permitir o aperfeiçoamento humano, considerando o aumento do seu conhecimento e a relação homem e mundo; e ainda possui objetos divididos em: material – em que congrega tudo o que se deseja estudar, analisar, interpretar ou verificar; e é formal, já que várias ciências possuem objeto material idêntico (LAKATOS e MARCONI, 2010). Atualmente, os pesquisadores prezam pelo emprego do rigor científico, pois se acredita que, desta forma, é possível alcançar uma verdade mais absoluta. O espírito científico é responsável pelo alcance do rigor necessário à ciência. Diz- que uma pessoa tem um espírito científico quando busca soluções reais e verdadeiras para dificuldades ou situações problemas que encontra em sua realidade, baseada em métodos adequados. Para Cervo, Bervian e Silva (2007), esta atitude pode nascer com o ser humano ou vir da experiência por meio de aprendizado. Neste contexto, o homem dotado deste espírito apresenta em seu pensamento a crítica, a objetividade e a racionalidade (CERVO, BERVIAN e SILVA, 2007). Capítulo 2 61Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa O pensar crítico seria não permitir que a facilidade de uma resposta, de um resultado, sem que se exija a demonstração e comprovação do que foi obtido como solução a um problema encontrado. O fato de não aceitar ”achismos” demonstra a objetividade necessária. Se você tem espírito científico, não pode se deixar levar por aquilo que acredita ou parece ser. Você precisa focar a sua situação problema e forma de encontrar soluções que a atendam. A ciência não permite sentimentos ou crenças para as respostas ou soluções encontradas. Você precisa racionalmente explicar o que encontrou para solucionar a o fato pesquisado. A ciência apresenta hoje muitas pessoas com este perfil, que buscam respostas para questões da sociedade a serem respondidas criticamente, com objetividade e racionalidade. No entanto, vimos no capítulo 1 que não há verdades eternas e que, a qualquer momento, um conhecimento pode ser transformado ou até questionado. Vislumbrando a filosofia contemporânea, você pode pensar que há um contraponto, mas perceba que são os questionamentos ditados pela filosofia que fazem surgir novos questionamentos do ser humano para a construção de novos conhecimentos científicos. LEMBRETELEMBRETE Lembre-se que a filosofia contemporânea trouxe à tona o questionamento do mundo que vivemos, de nossas atitudes e das consequências daquilo que criamos. Classifi cação das ciências Como vimos, durante a história, muitos filósofos, por meio de seus questionamentos em relação ao mundo, à realidade humana, acabam por serem também responsáveis pelo surgimento de várias ciências. Pela diversificação de tipos de áreas encontradas, os cientistas têm procurado realizar uma classificação das ciências. Capítulo 2 62 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa De acordo com Aristóteles, filósofo que você já conheceu, sugeriu uma divisão baseada na finalidade que cada ciência possuía. O autor foi criticado por não fazer um relacionamento entre as ciências e excluir algumas consideradas relevantes, como a história, porém para este, as ciências poderiam ser divididas em (FACHIN, 2001): • Teóricas: o objeto seria o conhecimento puro, como a matemática e a física. • Práticas: o comportamento do ser humano seria o foco, caso da ética, economia e política. • Poéticas: preocupam-se com as obras que os homens são capazes de produzir, como as artes. Da época renascentista, o filósofo inglês Bacon classifica as ciências a partir das faculdades humanas exigidas à época. Esta é a principal crítica à divisão apresentada a seguir. Fazem parte dela (FACHIN, 2001): • Memorativa ou História (da memória): agrupa história natural, civil e sagrada. • Imaginação ou Poesia: abrange a poesia épica, dramática e alegórica. • Razão ou Filosofia: em que a preocupação era com Deus, Homem e Natureza. Augusto Comte foi considerado o pai do positivismo e sua divisão das ciências foi pautada em suas convicções e foi base para a classificação moderna da ciência. Cabe destacar que problemas com generalizações e subordinações das áreas prejudicaram sua divisão. Sua proposição é apresentada a seguir (FACHIN, 2001): • Matemática: esta área foi assim definida pelo foco ser a preocupação com a quantidade. • Astronomia: a ideia seria agrupar as ciências que estudam as forças, movimento das massas e sua atração. • Física: o objeto seria a preocupação com qualidade, critérios de quantidade e força. Capítulo 2 63Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa • Química: o estudo da matéria, sua qualidade, força e quantidade envolvem esta área. • Fisiologia: prepondera a preocupação com o estudo da matéria organizada e não orgânica. Pelo seu conhecimento até o momento, alguma das opções de classificação apresentada abrange todas as áreas de conhecimento que você conhece ou ouviu falar? REFLEXÃO Pode-se perceber a evolução das divisões com o passar do tempo e dos pensamentos dos filósofos em cada época e, ao mesmo tempo, a falta de consenso entre os autores. Atualmente, Lakatos e Marconi (2010) adotam a seguinte classificação: Nas ciências formais, há preocupação com o estudo das ideias, não sendo possível o contato com a realidade para validar seus conhecimentos, como é o caso da lógica e da matemática. Embora haja abstração de objetos da realidade, as ideias destas ciências são interpretadas pela nossa mente, estando em forma conceitual e não fisiológica. Vamos pensar na seguinte situação: sua mãe lhe pede para comprar dois abacaxis, três maçãs, uma melancia, cinco pêssegos e uma penca de banana. Perceba que, ao chegar à feira, você consegue identificar nas prateleiras e separar em sacolas o número de cada fruta utilizando sua lógica de raciocínio. Porém, não lhe é possível identificar, na essência, o número 5. O que vemos são representações desenvolvidas pelos estudiosos e que aprendemos no decorrer de nossa vida. Formais Factuais Lógica Naturais Matemática Sociais Figura 2 - Divisão das ciências Fonte: adaptado de Lakatos e Marconi (2010). Capítulo 2 64 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa As ciências factuais referem-se aos fatos e realidade do mundo em que vivemos. Neste caso, os pesquisadores necessitam se utilizar de observação e experimentações para que possam ter uma comprovação, ou não, de causas ou soluções propostas. O que acontece se sua avó enche um copo de água até o limite e depois coloca a dentadura antes de dormir? Se você respondeu que a água irá espalhar está correto. Isso acontece por uma lei na química em que se afirma a impossibilidade de dois corpos ocuparem o mesmo lugar no espaço ao mesmo tempo. Desta forma, é possível verificar como as ciências factuais podem ser visualizadas, ao contrário das formais. Nas ciências factuais, as naturais congregam ciências como a física, a química e a biologia; e as ciências sociais abrangem áreas como o direito, a economia, a política, a sociologia, a psicologia. Com relação à divisão apresentada na figura 3, os autores afirmam que foram considerados alguns aspectos para ser desta forma: • Formais: preocupa-se com enunciados. • Factuais: tratam de objetos empíricos, coisas e processos.• Formais: relações entre símbolos. • Factuais: fenômenos e processos. • Formais: lógica para comprovar rigorosamente teoremas. • Factuais: utilizam experimentação e/ou observação. Procura alterar fenômenos para saber até que ponto as hipóteses são comprovadas. • Formais: são suficientes em relação a métodos de prova e conteúdos. • Factuais: com relação ao conteúdo depende do fato e em relação ao método precisa da experimentação. • Formais: ser coerente ao enunciado que foi escolhido para comprovação, como por exemplo um teorema. • Factuais: os enunciados devem ser racionais e verificáveis por meio da experimentação. • Formais: realizam demonstrações ou provas. • Factuais: refutam ou comprovam hipóteses definidas previamente. Objeto Diferença entre enunciados Método de comprovação enunciado Grau de sufi ciência (conteúdo e método de prova) Coerência para alcance da verdade Resultado alcançado Figura 3 - Aspectos considerados na divisão da ciência em formais e factuais Fonte: adaptado de Lakatos e Marconi (2010). Capítulo 2 65Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Cabe, em se tratando de ciência, definir fato, lei e teoria, por serem termos indispensáveis dentro do contexto científico. Quando se fala em fato, corriqueiramente se imagina algo que aconteceu e, por isso, não pode ser desmentido. Como por exemplo, um acidente de trânsito que você presenciou. Em se tratando de ciência, fato ou fenômeno é algo que será considerado para verificação e que, por meio de observação, foi descoberto. Ao criar este universo de observação e análise, definindo a propriedade do fato, é possível que o pesquisador vislumbre acontecimentos que se repetem, e que seria interessante, no universo da ciência, serem agrupados ou considerados de uma mesma classe; neste caso, temos uma lei científica. Esta apresenta como funções: resumir um volume considerável de fatos e favorecer a prevenção de novos fatos que, se acaso não se adequarem à lei existente, podem permitir a formulação de uma nova. A teoria, ao ser elaborada, está um patamar acima da lei. No linguajar popular, quando se trata de sabedoria, diz-se que a teoria é oposição à prática, ou seja, a teoria seriam os conteúdos, e a prática, a aplicação destes. No entanto, no contexto científico, tem-se outra concepção. A teoria tem como característica expressar a uniformidade e explicações das leis em um patamar mais genérico e mais amplo (LAKATOS e MARCONI, 2010). As teorias científicas têm como objeto reunir várias leis que se relacionam, criando uma lei universal (CERVO, BERVIAN e SILVA, 2007). Um exemplo de lei é a criada por Galileu, a “Lei da queda livre dos corpos” ou Lei de Kepler. Em relação à teoria, tem-se a Teoria de Newton, que abrange as Leis de Kepler e também a Lei de Galileu. Pesquise e defina o que é a lei de Kepler. E procure refletir: de que forma a Lei de Kepler e a Lei de Galileu podem estar inseridas em uma mesma teoria científica? DESAFIO Capítulo 2 66 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Desta forma simplificada, você pode identificar a representação da relação fato, lei e teoria a partir da apresentação da figura 4. Conjunto de fatos relacionados Conjunto de fatos relacionados Classificação de fatos Classificação de fatos Lei A Teoria Lei B } Figura 4 - Relação entre fato, lei e teoria Fonte: adaptado de Lakatos e Marconi (2010). Você sabe dizer qual a forma utilizada pelo pesquisador para gerar leis e teorias? De que forma, após definir uma temática para estudar, o pesquisador vai à busca de sua verdade? O próximo tópico tem como intuito apresentar estas respostas e outros conteúdos referentes à geração de conhecimento e à necessidade humana de questionamento. 2.2.3 Noções gerais sobre pesquisa Em nosso cotidiano, há uma necessidade de nos apropriarmos de determinados objetos, considerando suas características e seus aspectos relevantes de modo a identificá-los para que possamos prosseguir em nossas atividades. Por exemplo, se, em seu trabalho, você precisa utilizar determinado software específico, é necessário conhecê-lo para desenvolver, de forma adequada, sua função. Desta forma, o conhecimento dependerá de nossos sentidos e de como os utilizamos. Quando você está descobrindo algo, inicialmente busca dados a respeito do que deseja conhecer. Dados são fatos ou elementos reconhecidos por sua forma bruta. Ao ser analisado de forma individual, não nos leva à compreensão da situação ou fato. Somente olhando o software que você terá que trabalhar, não consegue mensurar o grau de dificuldade que terá, por exemplo. Ao juntar os dados que você obtém a respeito do sistema que fará uso, independente da forma de recebimento, dando significado a estes dados, será possível ter informações sobre o uso do software especificado. Quando, além de observar as funcionalidades do sistema, você também faz questionamentos Capítulo 2 67Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa a quem já fez uso do sistema, buscando saber o grau de dificuldade destas pessoas, fica mais fácil ter uma noção se terá ou não dificuldades na utilização do novo recurso. Observe que a interpretação dos dados pode ser diferente para você e para outras pessoas que os recebam. Cada um possui experiências e realidades que o fazem pensar de forma diferenciada na transformação de dados e informação. Para que você se torne um conhecedor do novo objeto de estudo que lhe está sendo apresentado, precisará fazer um pouco mais de esforço. Para dizer que você tem conhecimento a respeito do novo software, é preciso que experimente, que o utilize e, baseado no que já tem de conhecimento da área de tecnologia, é possível ter mais ou menos facilidade de uso. Neste caso, você terá conhecimento quando analisar, transformar e até experimentar as informações recebidas para poder afirmar se há, ou não, dificuldade no uso do novo recurso de software. PRATICANDOPRATICANDO Pense na quantidade de dados que recebe todos os dias e faça o seguinte exercício em um dia de sua rotina: elabore uma lista de dados que observa ou identifica. A partir disto, liste quais informações conseguiu obter. Sendo um pouco mais exigente, peço que identifique o que gerou de conhecimento neste dia. O exercício o fará pensar na imensidade de informações que recebemos todos os dias, principalmente com a chamada era da informação, advinda do uso das tecnologias da informação. Mas será que tudo o que recebemos é transformado? Ou seja, dados geram informações e as informações são analisadas de forma a gerar conhecimento? Provavelmente, você respondeu não para esta pergunta. Como vimos, o conhecimento é algo desejado pelo ser humano. Logo, recebemos dados, informações, e geramos conhecimentos quando nos é necessário ou interessante. Além disso, o número de informações é tão grande que não conseguimos assimilar tudo o que recebemos. Capítulo 2 68 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Quantas vezes você já se viu na situação de, durante uma conversa com um colega, responder um sim sem saber sobre exatamente o que conversavam? Muito provavelmente, o que estava sendo apresentado não era interessante a você naquele momento ou você estava pensando sobre algum outro dado ou informação. Por ser o conhecimento a fonte para transformar nossa realidade e da sociedade, damos mais importância a alguns fatos, em detrimento de outros, quando estamos em processo de conhecer. Nesta disciplina, interessa-nos o conhecimento científico, aquele que pode ser comprovado. Como faremos para transformar nossos dados brutos eminformações que possam ser evidenciadas para obtermos o conhecimento científico? Quando descrevemos a situação do novo software a ser utilizado em seu escritório ou quando você pensa em algo que deseja investigar, qual sua primeira atitude? O que você pensa que precisa conhecer de verdade de um fato ou objeto que escolheu para seu estudo? Se você respondeu que precisa pesquisar sobre o tema para ter dados e informações que possam ser analisadas e que lhe ajudem a encontrar a resposta, você está correto! Em se tratando de conhecimento científico, a pesquisa tem um caráter formal, pois nos permite, por sua natureza, alcançar os quesitos necessário para a comprovação do estudo, sendo atributo primordial em se tratando de ciência. É por meio da pesquisa científica que se torna possível a validação do conhecimento científico! SAIBA QUE Capítulo 2 69Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Fachin (2001, p. 124) diz que a pesquisa é Um procedimento intelectual para adquirir conhecimentos pela investigação de uma realidade e busca de novas verdades sobre um fato (objeto, problema). Com base em métodos adequados e técnicas apropriadas, o pesquisador busca conhecimentos específicos, respostas ou soluções ao problema estudado. O autor ainda lembra que não se tem a verdade absoluta sobre a descoberta, pois estas são renovadas e a análise realizada sobre determinado objeto sempre será questionada. Pode-se dizer que esta é uma influência da filosofia sobre a pesquisa atual, ao questionar sempre o que é tido como verdade. E vimos que isto é primordial para a geração de novos conhecimentos. Pense na epidemia recente que houve no mundo, chamada popularmente de gripe A. Analisando cientificamente, o que poderia ter acontecido se os cientistas acreditassem apenas em conhecimentos anteriores, que estes não poderiam ser questionados e tratassem as pessoas como se estivessem com uma gripe comum? REFLEXÃO Gil (2008, p. 26) afirma que pesquisa é “um processo formal e sistemático de desenvolvimento do método científico. O objeto fundamental da pesquisa é descobrir respostas para problemas mediante o emprego de procedimentos científicos”. Tal conceito é aceito também por Cervo, Bervian e Silva (2007), que afirmam que a pesquisa faz uso de processos e métodos científicos para a busca de uma solução para problemas ou dúvidas. Você consegue perceber a relevância da pesquisa científica para a produção do conhecimento cientifico? Em que ela diferente das atividades do nosso dia-a-dia em busca de conhecimento? Se você respondeu que, para a pesquisa científica, é necessário a utilização de métodos e procedimentos que permitam a validação e Capítulo 2 70 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa comprovação de resultados, você acertou! Para isso, temos a metodologia científica, que nos apresenta uma série de estratégias para execução da pesquisa e obtenção de resultados que possam ser considerados conhecimento científico. Áreas de pesquisa Como você aprendeu, as ciências são divididas em grupos de acordo com alguns critérios e, assim, cada campo de conhecimento é integrado a um grupo, conforme a classificação proposta pelos autores. Você aprendeu que a filosofia valida os métodos aplicados e resultados obtidos pela ciência produzida por meio da pesquisa. A atividade do pesquisador nos permite alcançar o conhecimento científico. Atualmente, há investimento de órgãos governamentais para a produção de conhecimento e, consequentemente, no desenvolvimento de pesquisas. Um dos órgãos que realiza esta atividade é o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Pertencente ao Ministério da Ciência e Tecnologia, o CNPq tem como finalidade fomentar a pesquisa científica e tecnológica, além de promover a formação humana voltada à pesquisa no Brasil. Desta forma, trata-se de uma agência governamental responsável por desenvolver pesquisadores altamente qualificados, incentivando a produção de conhecimento no país (CNPQ, 2010). Como órgão do governo que possui uma responsabilidade relevante no que se refere à pesquisa, o CNPq proporciona oportunidades para o desenvolvimento de pesquisa com atividades como: bolsas de pesquisa de iniciação científica, de mestrado e de doutorado, programas de pesquisa e editais de pesquisa que oferecem apoio financeiro para o desenvolvimento de pesquisas. Assim, para que os vários campos de conhecimento possam ser beneficiados com o que é oportunizado pelo CNPq, foram criadas áreas de conhecimento que congregam as várias disciplinas de pesquisa, como pode ser observado na figura 5. Capítulo 2 71Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa • Matemática • Ciência da Computação • Física • Química • Medicina • Nutrição • Farmácia • Enfermagem • Filosofia • Sociologia • Antropologia • Psicologia • Biologia Geral • Bioquímica • Farmacologia • Agronomia • Fitotecnia • Engenharia Florestal • Engenharia Agrícola • Letras • Artes • Educação Artística • Engenharia Civil • Engenharia Mecânica • Engenharia Química • Direito • Administração • Ciências Contábeis • Economia • Bioética • Ciências Ambientais • Defesa • Divulgação Científica 1 Ciências Exatas e da Terra 4 Ciências da Saúde 7 Ciências Humanas 2 Ciências Biológicas 5 Ciências Agrárias 8 Linguística, Letras e Artes 3 Engenharias 6 Ciências Sociais Aplicadas 9 Outros Figura 5 - Áreas de conhecimento do CNPq Fonte: <www.cnpq.br/cnpq/index.htm>. EXPLORANDOEXPLORANDO Nem todos os campos de pesquisa apresentados pelo CNPq estão disponíveis na figura 5. Acesse o site <http://www.cnpq.br/areasconhecimento/ index.htm> e confira todos os campos pertencentes a cada área de conhecimento e também a nova tabela de áreas de conhecimento sugerida. Capítulo 2 72 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Perceba que há vários campos disponíveis para pesquisa e que cabe ao ser humano se dispor a novas descobertas. Não aceitar todas as verdades como certas. Utilizar os conceitos da filosofia que nos propõem questionar, indagar o porquê das coisas, dos fatos, dos fenômenos. 2.2.4 Etapas da pesquisa Você deve estar se perguntando quais os procedimentos deve adotar se resolver realizar uma pesquisa, ou seja, como deve sistematizar seu conhecimento. Inicialmente, Cervo, Bervian e Silva (2007) sugerem que, ao realizar uma investigação, o pesquisador deve pensar em algumas etapas, como: escolha do assunto - seleção, delimitação, objetivos; definição do problema; estudos exploratórios - documentação, biblioteca, material de pesquisa; e a coleta e análise de dados. Estes tópicos serão apresentados tendo como base os autores apresentados. Na fase de escolha do assunto, os autores (2007) sugerem que você escolha temas que tenham relação com a carreira de pesquisa que deseja seguir. O desejo de descobrir pode ser simplesmente por curiosidade do pesquisador, mas normalmente está vinculado ao desejo de tornar algo melhor. Você pode criar critérios que lhe auxiliem na escolha do melhor tema dentro da sua área de estudo. Após a escolha do tema, torna-se fundamental delimitar o tema, ou seja, decidir especificamente o que estudará a respeito do assunto selecionado. Se você escolheu pesquisar sobre futebol, por exemplo, existe uma infinidade de extensões para o tema: referentes ao jogador, ao esporte, aos torcedores, aos dirigentes, entre outros. Não será possível em uma pesquisa abordar com grandeza dados e informações suficientes para gerar conhecimento científico se tratarmos do assunto como um todo. Assim, focalizar os tópicosque o pesquisador deseja abordar é fundamental no processo de pesquisa. Você pode decompor seu tema em várias partes que facilitem a sua escolha ou ainda você pode definir que vai estudar o tema em um período específico e em determinada região, por exemplo. Na sequência, o pesquisador deve indicar qual seu objetivo com a pesquisa, o que pretende indicar em sua conclusão. Quando você pensa em pesquisar algo o faz por algum questionamento que fez a respeito de determinado objeto; potencialmente, é uma dificuldade Capítulo 2 73Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa encontrada pelo pesquisador que o leva ao desejo de desvendar. Neste caso, o problema de pesquisa pode ser feito na forma descritiva e/ou com a criação de uma pergunta de pesquisa em que o pesquisador indaga sobre o problema em questão. Ao realizar estudos exploratórios, o pesquisador buscará informações já existentes sobre o tema escolhido para auxiliar no desenvolvimento de sua pesquisa. Para tanto, pode utilizar levantamento documental e bibliográfico, e outros tipos de material de pesquisa. Por fim, o pesquisador irá se concentrar na obtenção de dados que possam lhe auxiliar a responder sua pesquisa de forma comprobatória. É uma tarefa árdua que pressupõe coleta e registro de informações, além da análise e interpretação dos mesmos. Estes passos básicos para realizar uma pesquisa contribuem para que você compreenda o que terá que fazer para tornar-se um pesquisador. Eles contribuem para direcionar as atividades de pesquisa na sua fase inicial. No decorrer da disciplina, as etapas serão analisadas e detalhadas de forma a permitir seu conhecimento no desenvolvimento da pesquisa e consequente criação do saber científico. 2.3 Aplicando a teoria na prática A família Alves está muito feliz, pois sua filha caçula Joana está se formando em um curso superior. Será uma bióloga, recebendo, em poucos dias, o título da universidade que cursou. Desde pequena, demonstrava muita habilidade, esforço e inteligência no desempenho das atividades estudantis. Sua aprovação nas disciplinas sempre foi consolidada com antecedência e os professores não lhe poupavam elogios. Adorava as disciplinas de matemática e ciências no ensino fundamental e se encontrou com biologia no ensino médio. Agora que está se formando, Joana pretende atuar como professora, ensinando aos alunos o que aprendeu. Ao pensar no ensino fundamental, identifique uma disciplina que possa ser conceituada como ciência formal e uma como ciência factual. Aponte ao menos uma disciplina estudada por Joana durante a vida estudantil (desde séries iniciais à universidade) para quatro áreas de conhecimento (conforme tabela do CNPq apresentada). Lembre-se de consultar o site, caso seja necessário para sua resposta. Durante a caminhada estudantil, você acredita que Joana fez uso de quais tipos de conhecimento? Capítulo 2 74 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa 2.3.1 Resolvendo No caso da ciência formal, Joana teve a disciplina de matemática durante todo o ensino fundamental e ensino médio, e como ciência factual, cita-se a disciplina de física. Quando se trata de áreas de conhecimento do CNPq, pode-se citar: • Ciências Exatas e da Terra: disciplina de química durante o ensino médio. • Ciências Biológicas: durante o curso superior, teve várias disciplinas, já que se trata da área de seu curso. A disciplina de ciências é dada no ensino fundamental e trata dos temas desta área de conhecimento, o mesmo ocorrendo no ensino médio. • Ciências Humanas: a disciplina de filosofia é trabalhada no ensino médio e em alguns cursos superiores. • Linguística, Letras e Artes: educação artística é disciplina do ensino fundamental. Durante o aprendizado, nas mais diversas áreas, os vários conhecimentos são abordados. Considerando o estudo de Joana desde as séries iniciais até o grau universitário, pode-se perceber disciplinas que a fizeram utilizar e/ou ter contato com diversos tipos de conhecimento. O conhecimento científico é o que todas as disciplinas envolvem, pois por serem assim considerados é que são ministrados aos alunos. De acordo com os conceitos vistos, os conhecimentos empírico, filosófico e teológico foram utilizados por Joana para auxiliar seu raciocínio na compreensão dos conhecimentos científico. Capítulo 2 75Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa 2.4 Para saber mais Portal do Ministério da Ciência e Tecnologia - <http://www.mct.gov.br> O Ministério tem responsabilidades governamentais que o permitem dispor de legitimidade, entre outros aspectos, sobre uma política nacional de pesquisa científica, tecnológica e inovação. Possui duas agências de fomento – CNPq e FINEP – que possibilitam a fiscalização e coordenação das atividades relacionadas à execução de projetos e programas destinados à pesquisa. CNPq – <http://www.cnpq.br/cnpq/index.htm> O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico apresenta uma série de informações relevantes para quem pertence à academia e pode propiciar suas atividades iniciais como pesquisador. Instituto Ciência Hoje - <http://cienciahoje.uol.com.br> Neste site, você obtém informações sobre o que é pesquisado e construído de conhecimento científico em várias áreas. É possível também acessar a Revista Ciência Hoje, com muitas matérias interessantes. É importante seu contato para verificar a forma de realização da ciência, os métodos empregados e resultados obtidos. 2.5 Relembrando O capítulo 2 apresentou: • os tipos de conhecimento e sua relevância para o desenvolvimento humano. Foram apresentados: conhecimento empírico, conhecimento teológico, conhecimento filosófico e conhecimento científico; • a filosofia e sua influência na ciência, além do conceito e a divisão da ciência em formais e factuais; • a relação entre filosofia, ciência e pesquisa. Os conceitos e as áreas de pesquisa foram apresentados e discutidos. Por fim, as etapas básicas para o desempenho de uma pesquisa foram descritas. Capítulo 2 76 Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa 2.6 Testando os seus conhecimentos 1) “Tudo o que conheço agradeço à fé divina e às escrituras.” A que tipo de conhecimento a afirmação se refere? a) Teológico. b) Científico. c) Filosófico. d) Artístico. e) Empírico. 2) No que se refere às ciências factuais, escolha as assertivas corretas. I. A apresentação rigorosa de provas quando do resultado de uma pesquisa é referência das ciências formais. II. As experimentações são irrelevantes nas ciências factuais. III. As ciências formais podem ser visualizadas como realidades para validação de provas, diferente das factuais. IV. A comprovação de fatos por meio de observação é característica das ciências factuais. Assinale a alternativa que apresenta apenas os itens verdadeiros: a) I, II, III d) II, III b) II, IV e) I, IV c) I, III 3) Qual a influência da filosofia na ciência e na pesquisa? 4) Relacione fato, lei e teoria, considerando seus conceitos no universo da ciência. 5) Supondo que você seja um pesquisador que irá estudar sobre o tema “acidente”. Observando as etapas de desenvolvimento de uma pesquisa, explique como procederia sua pesquisa, descrevendo o resultado das etapas de delimitação de tema, opções de objetivos e forma de exploração do tema. Capítulo 2 77Construção do Conhecimento e Metodologia da Pesquisa Onde encontrar ARANHA, M. L. de A.; MARTINS, M. H. P. Filosofando: introdução à filosofia. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Moderna, 1993. CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A.; SILVA, R. da. Metodologia científica. 5. ed. São Paulo:Pearson, 2007. CHAUI, M. Convite à filosofia. 13. ed. São Paulo: Ática, 2003. CNPQ. Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Disponível em: <http://www.cnpq.br/cnpq/index.htm>. Acesso em: 11 jul. 2010. FACHIN, O. Fundamentos da metodologia. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. de A. Metodologia científica. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010. MARTINS FILHO, I. G. Manual esquemático de história da filosofia. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTR, 2000. VENTUROLI, T. Sob o domínio da Lua: os mitos deste satélite. Super Interessante, São Paulo, 1994. Disponível em: <http://super.abril.com.br/ciencia/dominio- lua-mitos-deste-satelite-441015.shtml>. Acesso em: 30 jun. 2010.
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