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Betão Armado e Pré-esforçado Fundamentos de betão pré-esforçado série ESTRUTURAS álvaro santos joão guerra martins 1ª edição / 2006 Apresentação Este texto resulta, genericamente, o repositório da Monografia da Eng.º Álvaro Santos. Pretende, contudo, o seu teor evoluir permanentemente, no sentido de responder quer à especificidade dos cursos da UFP, como contrair-se ainda mais ao que se julga pertinente e alargar-se ao que se pensa omitido. Embora o texto tenha sido revisto, esta versão não é considerada definitiva, sendo de supor a existência de erros e imprecisões. Conta-se não só com uma crítica atenta, como com todos os contributos técnicos que possam ser endereçados. Ambos se aceitam e agradecem. João Guerra Martins Fundamentos de betão pré-esforçado I Sumário Este trabalho tem por objectivo principal apresentar os fundamentos do betão pré-esforçado, presente em enumeras obras por todo o mundo. Procura-se uma abordagem, tão actual quanto possível, do pré-esforço por pós-tensão com aderência, seu dimensionamento e execução em vigas pré-esforçadas. Porque apenas se vão abordar os seus princípios básicos o texto será limitado à sua mecânica em estruturas isostáticas, situação de emprego que vigorou, de qualquer modo e mesmo para pontes e viadutos, até aos anos 60 e 70. Contudo, será de salientar que o seu uso limitado a estruturas isostáticas esteve fortemente relacionado com a ausência de meios computacionais de cálculo, que tornassem acessível um estudo fiável e conclusivo para condições de hiperestaticidade. Fundamentos de betão pré-esforçado II Índice Geral SUMÁRIO ..............................................................................................................................................................I ÍNDICE GERAL.................................................................................................................................................. II ÍNDICE DE FIGURAS....................................................................................................................................... IV ÍNDICE DE QUADROS..................................................................................................................................VIII INTRODUÇÃO..................................................................................................................................................... 1 1. PRÉ-ESFORÇO APLICADO AO BETÃO.................................................................................................... 4 1.1. CONCEITO DE PRÉ-ESFORÇO......................................................................................................................... 4 1.2. BREVE REFERÊNCIA HISTÓRICA.................................................................................................................... 7 1.3. ALGUMAS OBRAS COM PRÉ-ESFORÇO........................................................................................................... 8 1.4. PARTICULARIDADES DO BETÃO PRÉ-ESFORÇADO EM RELAÇÃO AO BETÃO ARMADO ................................ 12 1.5. PRINCÍPIOS DO PRÉ-ESFORÇO. .................................................................................................................... 16 1.6. TÉCNICAS E SISTEMAS DE PRÉ-ESFORÇO..................................................................................................... 17 1.7. FUNCIONAMENTO ESTRUTURAL DO BETÃO PRÉ-ESFORÇADO...................................................................... 21 1.8. TRAÇADO DOS CABOS................................................................................................................................. 26 1.8.1. Fundamento físico do traçado dos cabos .......................................................................................... 26 1.8.2. Influência de aspectos construtivos no traçado dos cabos ................................................................ 30 1.8.3. Método das cargas equivalentes........................................................................................................ 31 2. MATERIAIS E EQUIPAMENTO DE PRÉ-ESFORÇO............................................................................. 33 2.1. BETÃO........................................................................................................................................................ 35 2.2. AÇO DE PRÉ-ESFORÇO ................................................................................................................................ 36 2.3. PRINCIPAIS PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS AÇOS..................................................................................... 38 2.4. CORROSÃO DOS AÇOS DE PRÉ-ESFORÇO ..................................................................................................... 39 2.5. BAINHAS .................................................................................................................................................... 40 2.6. CALDA DE CIMENTO PARA A INJECÇÃO....................................................................................................... 41 2.7. EQUIPAMENTOS DE APLICAÇÃO DE PRÉ-ESFORÇO ...................................................................................... 42 3. PERDAS DE TENSÃO................................................................................................................................... 43 3.1. PERDAS INICIAIS DE PRÉ-ESFORÇO.............................................................................................................. 45 3.2. PERDAS INSTANTÂNEAS DE PRÉ-ESFORÇO .................................................................................................. 46 3.2.2. Perdas por atrito ............................................................................................................................... 48 3.2.3. Perdas por reentrada de cabos.......................................................................................................... 50 3.3. PERDAS DIFERIDAS..................................................................................................................................... 52 Fundamentos de betão pré-esforçado III 3.3.1. Fluência............................................................................................................................................. 52 3.3.2. Retracção........................................................................................................................................... 53 3.3.3. Relaxação do aço............................................................................................................................... 53 3.4. PROCESSO SIMPLIFICADO PARA O CASO DE FASES ÚNICAS DE OPERAÇÃO................................................... 55 3.5. DETERMINAÇÃO DO ALONGAMENTO TEÓRICO DOS CABOS ......................................................................... 56 4. ANÁLISE DE SECÇÕES............................................................................................................................... 59 4.1. HIPÓTESES BÁSICAS................................................................................................................................... 59 4.2. ANÁLISE ELÁSTICA EM FASE NÃO FENDILHADA.......................................................................................... 60 4.3. ANÁLISE ELÁSTICA EM FASE FENDILHADA ................................................................................................ 61 4.4. Resistência última da secção em análise não linear. ........................................................................... 63 5. DIMENSIONAMENTO DO PRÉ-ESFORÇO EM VIGAS ISOSTÁTICAS............................................ 65 5.1. EQUAÇÕES LIMITES DE TENSÃO................................................................................................................. 66 5.2. DIMENSIONAMENTO DA FORÇA DE PRÉ-ESFORÇO ...................................................................................... 70 5.3. DIAGRAMA DE MAGNEL............................................................................................................................. 71 5.4. FORÇA DE PRÉ-ESFORÇO MÍNIMA .............................................................................................................. 73 5.6. FUSO LIMITE .............................................................................................................................................. 76 5.7. DIMENSIONAMENTO DA RESISTÊNCIA ÚLTIMA .......................................................................................... 78 5.8. ESCOLHA DO NÚMERO DE CABOS .............................................................................................................. 78 5.9. ESCOLHA DA SECÇÃO................................................................................................................................. 78 5.10. DISPOSIÇÕES CONSTRUTIVAS................................................................................................................... 79 6. ESTADOS-LIMITES ÚLTIMOS.................................................................................................................. 82 6.1. ESTADO LIMITE ÚLTIMO DE FLEXÃO ......................................................................................................... 82 6.2. ESTADO LIMITE ÚLTIMO DE ESFORÇO TRANSVERSO ................................................................................. 90 6.3. RESUMO DOS PASSOS DE DIMENSIONAMENTO ............................................................................................ 93 CONCLUSÃO ..................................................................................................................................................... 96 BIBLIOGRAFIA................................................................................................................................................. 99 ANEXO A – LÉXICO (NÃO REVISTO) ....................................................................................................... 100 ARMADURA DE PRÉ-ESFORÇO ......................................................................................................................... 101 Fundamentos de betão pré-esforçado IV Índice de Figuras Figura 1.1 - Introdução de um estado prévio de tensões numa fila de livros ou num conjunto de blocos [1]............................. 4 Figura 1.2 A - Sistema de construção em avanços sucessivos [1]. ............................................................................................. 6 Figura 1.2 B - Sistema de construção por pré-fabricação [1]. .................................................................................................... 6 Figura 1.3 - Utilização de tirantes em estruturas de contenção de maciços terrosos ou rochosos. a) Muro vertical com tirantes pré-esforçados. B) Tirantes pré-esforçados com placas individuais de apoio. c) Tirantes pré-esforçados, ancorados no maciço de fundação, usados como ancoragem de uma barragem [1] ..................................................................................................... 9 Figura 1.4 - Ponte pré-esforçada com cabos de estabilidade da estrutura (Portugal) [6]. ........................................................... 9 Figura 1.5 - Edifício com lajes pré-esforçadas (Hong Kong) [6]. ............................................................................................ 10 Figura 1.6 - Interior de uma viga caixão pré-esforçada, cabos de pós-tensão externos (Suiça) [6]. ......................................... 10 Figura 1.7 - Pré-esforço em 30.000m2 de laje térrea (Chile) [6]............................................................................................... 10 Figura 1.8 - Supressão de 70% dos pilares e aumento da extensão de 6.30m para 12.60m (Espanha) [6]. .............................. 11 Figura 1.9 - Instalação de ancoragens de 900 escoras à terra provisórias, até de funcionamento 2.200KN e 2.400 m2 dos painéis de betão pulverizados para a retenção de níveis superiores da rocha e das argilas do maciço terroso (Austrália) [6].. 11 Figura 1.10 - Ponte pré-esforçada com uma extensão de 120m de comprimento e uma altura de 15m, primeira no mundo (Coreia do Sul) [6].................................................................................................................................................................... 11 Figura 1.11 - Estrutura Pré-esforçada, Museu nacional Arte Contemporânea (Brasil)............................................................. 12 Figura 1.12 - Reservatório de água em Betão Pré-esforçado (em Naples, Florida, USA) e silo............................................... 12 Figura 1.13 - Exemplo de uma secção flectida, com armadura convencional [a] e com armadura pré-esforçada [b]. Para a mesma tensão (σc) a viga pré-esforçada apresenta uma resistência em serviço aproximadamente igual ao dobro da viga de betão armado [1]. ..................................................................................................................................................................... 13 Figura 1.14 - Sistema de Pré-tensão [3] ................................................................................................................................... 18 Figura 1.15 - Esquema de uma viga pós-tensionada, com aderência da VSL [6]. .................................................................... 19 Figura 1.16 - Pormenor da ancoragem/bainha e o tracção dos cabos (aplicação do pré-esforço) [6]. ...................................... 19 Figura 1.16.A - Pormenor da ancoragem/bainha e o tracção dos cabos (aplicação do pré-esforço) [6]. .................................. 20 Fundamentos de betão pré-esforçado V Figura 1.17 - Tensões devidas ao pré-esforço centrado e o peso próprio a meio vão............................................................... 23 Figura 1.18 - Convenção de sinais [4]...................................................................................................................................... 24 Figura 1.19 - Tensões devido ao pré-esforço com excentricidade e ao peso próprio a meio vão [4]........................................ 24 Figura 1.20 - Efeito do pré-esforçado aplicado por um cabo curvo [2] .................................................................................... 25 Figura 1.21 - Variação das tensões numa viga simplesmente apoiada [1]................................................................................ 26 Figura 1.22 - Efeito do pré-esforço centrado numa viga simplesmente apoiada sujeita a um carregamento uniforme [1]....... 27 Figura 1.23 - Distribuição de tensões na secção em função do ponto de aplicação da força de pré-esforço: a) P aplicado no eixo neutro da secção; b) P aplicado fora do eixo neutro e dentro do perímetro do núcleo central de inércia; c) P aplicado no perímetro do núcleo central; d) P aplicado fora do núcleo central de inércia [1]. .................................................................... 28 Figura 1.24 - Perfil dos cabos e do diagrama flector (peça hiperestática) [1, adaptado]........................................................... 29 Figura 1.25 - Demonstração gráfica e matemática de MP = P×e [1] ......................................................................................... 29 Figura 1.26 - Tipos de pré-esforço utilizados em vigas simplesmente apoiadas: 1) cabo rectilíneoancorado nas faces laterais da viga; 2) cabo parabólico ancorado nas faces laterais da viga; 3) ancoragens activas nas faces laterais da viga; 4) cabo parabólico ancorado na face superior da viga; 5) ancoragem activa, na face superior da viga [1] ........................................... 31 Figura 1.27 - Equilíbrio de uma força concentrada através de um traçado composto por dois troços recto [4]........................ 32 Figura 1.28 - Equilíbrio de uma força uniformemente distribuída através de um traçado composto por um cabo parabólico [4]. ................................................................................................................................................................................................. 33 Figura 1.29 - Tipos de cabos de pré-esforço utilizados em vigas continuas: a) Viga continua de dois tramos; b) viga continua de três tramos; 1) cabo parabólico ancorado nas faces laterais da viga; 2) Cabo parabólico ancorado na face superior da viga; 3) cabo parabólico ancorado dentro da viga através de uma ancoragem passiva; 4) cabo parabólico, com uma extremidade ancorado na face inferior (pormenor de difícil execução); 5) ancoragem activa na face lateral; 6) ancoragem activa na face superior; 7) ancoragem passiva na face lateral; 8) ancoragem activa na face inferior. Os eixos dos cabos são geralmente projectados como associações de parábolas e trechos rectilíneos [Pfeil, 1984, segundo referência 1 da bibliografia]............. 34 Figura 2.1 - Diagrama característico de vários tipos de aço [2, 4, 15]...................................................................................... 38 Figura 2.2 - Pormenor de uma bainha [1]................................................................................................................................. 41 Figura 2.1 - Diagrama de limites de tensão/extensão [3].......................................................................................................... 45 Figura 2.2 - Ângulo de desvio [3] ............................................................................................................................................ 50 Figura 2.3 - Perda de carga devida a reentrada de cabos [3] .................................................................................................... 51 Figura 2.4. Variação do valor da relaxação com a tensão instalada [3] .................................................................................... 54 Fundamentos de betão pré-esforçado VI Figura 2.5 - Variação da força de pré-esforço ao longo de uma peça após perdas por atrito [3] .............................................. 57 Figura 2.6 - Perdas de tensão no sistema de pós-tensão com aderência [3].............................................................................. 57 Figura 2.7 - Perdas de tensão no sistema de pré-tensão [3] ...................................................................................................... 58 Figura 4.1 - Nomenclatura para a secção [4] ............................................................................................................................ 60 Figura 4.2 - Secção em fase fendilhada [4] .............................................................................................................................. 61 Figura 4.2 - Momento ao nível das armaduras [4].................................................................................................................... 63 Figura 4.5 - Diagrama rectangular correspondente ao diagrama parábola-rectângulo.............................................................. 64 Figura 5.1 Convenções aplicadas ............................................................................................................................................. 66 Figura 5.2.- Representação gráfica dos limites de tensões [4].................................................................................................. 67 Figura 5.3 - Variação das tensões em secção de momentos positivos e excentricidade máxima da armadura de pré-esforço [4]. ................................................................................................................................................................................................. 68 Figura 5.4 - Diagrama de Magnel [4, adaptado]...................................................................................................................... 73 Figura 5.5 - Determinação gráfica do pré-esforço mínimo e excentricidade máxima.[4]......................................................... 74 Figura 5.6 - Excentricidade admissível [4] ............................................................................................................................... 75 Figura 5.7 - Pré-esforço mínimo para eA > eadm [4] ............................................................................................................... 75 Figura 5.8 - Fuso limite numa viga simplesmente apoiada [4] ................................................................................................. 77 Figura 5.12 - Exemplos de secções pré-esforçadas [2]............................................................................................................. 80 Figura 6.1 - Diagrama de Estado Limite Ultimo de Flexão [3] ................................................................................................ 83 Figura 6.2 - Diagrama Tensões Extensões [3].......................................................................................................................... 84 Figura 6.3 - 1ª iteração para Estado limite ultimo de flexão [4] ............................................................................................... 85 Figura 6.4 - Diagramas para Estado limite ultimo de flexão, tipo A e B [4] ............................................................................ 86 Figura 6.5 - Determinação da linha neutra (xu), por interpolação [3] ....................................................................................... 86 Figura 6.6 - Diagrama Estado Limite Ultimo. Método Geral [3] ............................................................................................. 87 Figura 6.7 - Diagrama Estado Limite Ultimo. Método Simplificado [4].................................................................................. 88 Figura 6.8 - Definição da secção equivalente ........................................................................................................................... 89 Fundamentos de betão pré-esforçado VII Figura 6.9 - Estado Limite último de esforço transverso [2] .................................................................................................... 90 Figura 6.10 - Momento de descompressão [3] ......................................................................................................................... 91 Figura 5.11 - Vectores de forças............................................................................................................................................... 92 Figura 6.12 - Definição das larguras da alma, bω, e da bainha Ø [4] ........................................................................................ 93 Figura 6.13 - Fluxograma de dimensionamento de peça em betão pré-esforçado [4]............................................................... 95 Fundamentos de betão pré-esforçado VIII Índice de Quadros Quadro I.1. - Relações entre resistência e o preço unitário dos materiais utilizados em betão armado (BA) e betão pré- esforçado (BP) [1]. ................................................................................................................................................................... 14 Quadro 2.1-Valores máximos do pré-esforço na origem [11]. ................................................................................................ 45 Quadro 2.2- Coeficientes de atrito em curva e recta................................................................................................................. 49 Quadro 4.1 - Equações fundamentais em análise elástica para Fase Fendilhada [2, 4]. ........................................................... 62 Quadro 6.1 - Largura das almas ............................................................................................................................................... 93 Fundamentos de betão pré-esforçado 1 Introdução O pré-esforço continua hoje, muito embora, como uma solução pouco usada na actividade da construção civil, vicissitude em que também cai a pré-fabricação (com excepção das vigotas pré-esforçadas para pavimentos, profusamente usadas no Norte do país). Por razões de vária ordem, hipoteticamente também relacionada com opções de projecto arquitectónico e de estabilidade, as empresas de construção não tem usufruído de uma eventual redução dos custos e de um aumento da produtividade para diversas situações de solução estrutural. Sendo certo que não se quer com isto insinuar que o betão armado devia ser liminarmente substituído pelo betão pré-esforçado, a verdade é que mesmo para edifícios o seu emprego pode ser competitivo, designadamente em áreas comerciais, industriais e de parqueamento. Tendo em conta a diversidade e a complexidade das situações de trabalho, estes conhecimentos têm de ser adaptados ao projecto a que diz respeito. Constituem, no entanto, orientações e pontos de chamada de atenção, necessários para desenvolver uma boa integração das medidas de pré-esforço na concepção dos projectos da especialidade. Não dispensam o recurso a conhecimentos mais aprofundados, especialmente no caso de se estar em presença de projectos mais específicos, nem a consulta da regulamentação aplicável. A política de produtividade nas empresas é muito importante e surge no sentido de procurar realizar os trabalhos de pré-esforço com qualidade e alto rendimento para todos os intervenientes, porque estamos convencidos que só com qualidade de vida se conseguirá qualidade no trabalho. Com a escassez de obras que se tem feito sentir nos últimos tempos e com os reduzidos prazos para a sua execução, quando surgem, de facto só com organização se poderá atingir o objectivo a aumentar os índices de produtividade e procurando sempre obter máximo rendimento. Em termos da organização deste texto, no primeiro capítulo vai ser dada especial atenção ao conceito de Pré-esforço. Torna-se necessário referir vários aspectos importantes, como por exemplo, as suas aplicações, técnicas e legislação indispensável para se cumprir durante à execução do mesmo. Nesta linha de pensamento, faz-se uma súmula das operações que estão directamente envolvidas na construção deste tipo de estruturas, ilustrando conjuntamente quais os equipamentos que intrinsecamente estão relacionados com o pré-esforço de Fundamentos de betão pré-esforçado 2 estruturas isostáticas, mais especificamente vigas pré-esforçadas, em cada uma das fases de execução. Uma vez enquadrados na essência do tema escolhido, é feita, no segundo capitulo uma análise detalhada dos materiais e equipamentos utilizados em estruturas de betão pré- esforçado. No terceiro capítulo, são apresentados os tipos de perdas de tensão no pré-esforço, sendo também indicado o processo comum do cálculo dessas perdas ao longo de uma peça, tais como perdas instantâneas e perdas diferidas. O quarto capítulo é apresentado a análise de secções, neste capítulo são estudados apenas os casos do Betão pré - tensionado e pós - tensionado com aderência, enunciando as hipóteses básicas de análise: Analise Linear Elástica em fase não Fendilhada; Analise Linear Elástica em fase Fendilhada e por último, a Analise Não Linear, Resistência Ultima de Secção. O quinto capitulo retrata os aspectos mais importantes do dimensionamento de vigas isostáticas de betão pré-esforçado de forma resumida todos os passos do dimensionamento. O objectivo do dimensionamento consiste em garantir que os limites de tensões vão ser cumpridos, as peças apresentam características de resistência e de durabilidade adequadas. No sexto capítulo, são apresentados os Estados Limites Últimos, intrinsecamente conjugados no dimensionamento das estruturas. È efectuada analise ao Estado Limite Ultimo de Flexão com base em um quatro métodos: Método Geral Iterativo; Método Geral; Método Simplificado; Método Simplificado para secções em T. Neste capítulo a verificação de segurança ainda abrange o Estado Limite Último de Esforço Transverso. Por ultimo o sétimo capitulo, apresenta as Zonas de Elementos Sujeitas a Forças Concentradas, a zona de ancoragem a estudar, corresponde à parte do elemento (viga) situada entre a face de aplicação da carga localizada e a secção a partir da qual (princípio de Saint Venant) se desenvolve uma distribuição linear de tensões característica das peças lineares. Fundamentos de betão pré-esforçado 3 Finalmente, em prol dos conhecimentos adquiridos, são apresentadas as principais conclusões decorrentes dos capítulos antecedentes, realçando-se as principais problemáticas associadas à concepção e analise deste tipo de estruturas e pré-esforço em estruturas isostáticas. Refira-se que é indispensável para a compreensão do conteúdo deste trabalho que o leitor já tenha sólidos conhecimentos prévios em Betão Armado, pois a sua elaboração parte desse princípio. Diga-se, ainda, que o Anexo A dispõe de um pequeno léxico dos termos mais usados neste trabalho, que poderá ser consultado em caso de desconhecimento ou dúvida no significado de algum termo aqui utilizado. Fundamentos de betão pré-esforçado 4 1. Pré-esforço aplicado ao betão Neste capítulo vai ser dada especial atenção ao conceito de pré-esforço, já que se torna necessário referir vários aspectos importantes, como por exemplo, as suas aplicações, técnicas e legislação indispensável para se cumprir durante a concepção e execução do mesmo. Devido à sua natureza muito fragmentada, o sector da construção não investe suficientemente na formação, na pesquisa e na comercialização. As pequenas empresas são muitas vezes mal geridas e algumas delas não possuem as competências técnicas necessárias. Um número muito grande de pequenas e médias empresas não tem conhecimento de causa e por isso não usufrui das enumeras vantagens desta técnica. 1.1. Conceito de Pré-esforço. “Pré-esforço é um artifício que consiste em introduzir, numa estrutura, um estado prévio de tensões, de modo a melhorar a sua resistência ou comportamento, sob acção de diversas condições de carga”, citando Pfeil, 1984 [1]. Um exemplo muito simples e bastante significativo de pré-esforço é, por exemplo, a situação em que uma pessoa carrega um conjunto de livros de uma fila horizontal (fig. 1.1). Para que os livros sejam levantados sem caírem, é necessária a aplicação de uma força horizontal que os comprima uns contra os outros, produzindo assim forças de atrito capazes de superar o peso próprio do conjunto. Figura 1.1 - Introdução de um estado prévio de tensões numa fila de livros ou num conjunto de blocos [1] Igual situação se pode pôr num conjunto de blocos que se pretenda fixar (fig. 1.1). Fundamentos de betão pré-esforçado 5 A aplicação da desta força normal pode ser entendida como uma forma de pré-esforçar um conjunto de elementos estruturais, no caso uma fila de livros, com o objectivo de se criar tensões prévias contráriasaquelas que podem inviabilizar ou prejudicar a operação ou o uso desejado [1]. Um barril é também um exemplo de estrutura pré-esforçada. O barril é composto por gomos de madeira apertados por aros metálicos. A compressão produzida pelos aros opõe-se as tensões causadas pela pressão interna do líquido dentro do barril, que geram tracções nessas aduelas. Contudo, neste caso não se trata apenas da prévia tensão de compressão, aplicada nos aros, contrariar a tensões de tracção que o impulso do líquido lhes vai induzir, pois estes aros metálicos podiam ter o seu material em repouso (tensão quase nula) até que a solicitação da pressão hidrostática do fluido tende-se a abrir dos gomos e lhes mobilizasse a sua resistência. Na verdade, o mais importante será não deixar o líquido refluir entre os gomos, pelo que os mesmos devem permanecer justos antes e depois da solicitação do fluido, ou seja: as tensões nos aros devem ser sempre de compressão, mesmo já antes da acção solicitante. Se a questão fosse apenas a resistência, e o equilíbrio directo de forças, tal pré-compressão não seria necessária, bastando que as aduelas tivessem a resistência mecânica suficiente aquando do enchimento do barril. Aqui trata-se de não permitir qualquer folga entre os gomos, assim, por semelhança, se o material de fabrico fosse betão armado esse propósito dificilmente seria conseguido, dada provável de abertura de fendas (ainda que pequenas) por ausência de pré-compressão (as armaduras passivas - varões correntes - só começariam a trabalhar quando o liquido estabelecesse uma solicitação, sucedendo que com a sua natural deformação, conjunta com a do betão, este último rapidamente fissuraria, dada a sua fraca resistência à tracção). Pelo exposto se conclui da conveniência do uso de betão pré-esforçado numa situação destas, pois o betão estaria em compressão antecipada à solicitação, e se as tensões de tracção solicitantes não ultrapassassem estas de compressão prévia, o betão nunca poderia fissurar (por insuficiência de resistência à tracção, apenas haveria que acautelar que a compressão inicial não seria superior à da resistência do betão à compressão, esmagando-o). Óbvio será que no caso de armazenamento de material granular este problema não tem a mesma premência. Fundamentos de betão pré-esforçado 6 A situação atrás traduzida tem algumas semelhanças com a construção de pontes por avanços sucessivos, designadamente até ao fecho da mesma (fig. 1.2 A), sendo certo que a presença do pré-esforço também visa permitir a redução do peso próprio e o aproveitamento optimizados da resistência dos materiais (betão e aço). Figura 1.2 A - Sistema de construção em avanços sucessivos [1]. Também, e ainda no que pontes trata, idêntica situação se coloca num sistema de construção pré-fabricada (fig. 1.2 B). Figura 1.2 B - Sistema de construção por pré-fabricação [1]. Pode-se citar, ainda, o caso de uma roda de bicicleta como uma estrutura tensionada. O aro externo é ligado a um anel interno por meios de fios de aço sob tensão. As tensões de tracção Fundamentos de betão pré-esforçado 7 previamente aplicadas aos raios garantem a estabilidade do aro externo, que fica em compressão tangencial, verificada a resistência do material e os fenómenos de encurvadura. A palavra pré-esforço (prestressing em inglês, précontrainte em francês) é, deste modo, a intenção de criar um estado permanente de tensões em estruturas, e materiais de construção, de forma a melhorar o seu comportamento em serviço e aumentar a sua capacidade de resistência, as cargas sobre elas aplicadas [1]. Diríamos, complementarmente, e tendo em conta o caminhar dos tempos, que se poderá tornar uma forma alternativa ao betão armado, mesmo em estruturas relativamente correntes, dado superior desempenho mecânico e o abaixamento progressivo do custo de aço de pré-esforço. 1.2. Breve referência histórica. O desenvolvimento do betão armado e pré-esforçado deu-se a partir da criação do cimento Portland, na Inglaterra, em 1824. Nos anos que se seguiram, os franceses e os alemães também começaram a produzir cimento e a criar as várias formas de melhorar a capacidade de esforço do betão. Foi em 1877 que o americano Hyat reconheceu claramente o efeito da aderência entre o betão e a armadura. Após vários ensaios com construções de betão, passou- se a colocar a armadura apenas do lado traccionado das peças [1]. A primeira intensão de pré-tensionar o betão foi anunciada em 1886, por P. H. Jackson, de São Francisco (EUA). No final do século XIX seguiram-se várias patentes de métodos de pré- esforço e ensaios, sem êxito, pois o pré-esforço perdia-se devido a retracção e fluência do betão, desconhecidas naquela época. Só por volta de 1912, Koeman e Mörsch reconheceram que o efeito de um pré-esforço reduzido era perdido no decorrer do tempo, devido à retracção e deformação lenta do betão [1]. Em 1919, K.Wettein fabricou, na Alemanha, painéis de concreto pré-esforçado com cordas de aço para piano (cordas de alta resistência). Tal facto foi associado ao desenvolvimento de aços de alta resistência (1923), quando R. H. Dill, dos EUA, reconheceu que se deveriam usar fios de alta resistência sob elevadas tensões para superar as perdas de pré-esforço [1]. Em 1928 é foi apresentado e patenteado o primeiro trabalho consistente de pré-esforço pelo engenheiro francês Eugène Freyssinet, tornando-se o pré-esforço uma realidade. A Freyssinet Fundamentos de betão pré-esforçado 8 se deve os grandes desenvolvimentos no domínio da concepção das ancoragens e do sistema dos macacos hidráulicos de aplicação do pré-esforço, sendo ainda referir que lhe é também atribuída a aplicação da técnica de vibração mecânica do betão (que antes era aplicado a maço). Foi ainda Freyssinet que utilizou pela primeira vez o pré-esforço por aderência (sem ancoragens nas extremidades), mas foi E. Hoyer (Alemanha) que primeiro desenvolveu este processo em aplicações práticas [1]. A aplicação mais generalizada do betão pré-esforçado não foi possível até ao desenvolvimento de processos fiáveis e económicos de tracção e ancoragem das armaduras. Contribuíram, decisivamente, para o desenvolvimento de novas técnicas de pré-esforço, Freyssinet (França) e G. Magnel (Bélgica). Em Portugal a primeira ponte realizada em betão pré-esforçado foi a nova ponte da Vala Nova, na E.N. 118, entre Benavente e Salvaterra de Magos, construída em 1953-1954. Trata- se de uma estrutura formada por três tramos isostáticos simplesmente apoiados com vãos de 33.80m. Devido ao grande desenvolvimento das aplicações do betão pré-esforçado foi também acompanhado pela criação das primeiras Associações neste domínio: ⇒ FIP - Fédération de la Précontrainte, de origem europeia; ⇒ PCI - Prestressed Concrete Institute, criado em 1954 nos EUA. Hoje o betão armado pré-esforçado apresenta crescentes e numerosas aplicações em pontes, edifícios, coberturas, reservatórios e silos, ancoragens (no solo e em rocha), estacas, condutas, barragens e túneis. 1.3. Algumas obras com Pré-esforço O pré-esforço de betão pode ser usado em diversas aplicações, sendo mesmo quase infinitas, dado que é sempre possível inventar um modo diferente de utilizar o pré-esforço, como se viu em 1.1. Fundamentos de betão pré-esforçado 9 Vale ainda a pena citar as estruturas de grande porte, tais como plataformas marítimas (offshore) de exploração de petróleo ou gás, invólucros de protecção de centrais atómicas, etc. É comum, também, a utilização de tirantes de ancoragem pré-esforçados em obras de terra, tais como estruturas de contenção lateral de solos e barragens. Figura 1.3- Utilização de tirantes em estruturas de contenção de maciços terrosos ou rochosos. a) Muro vertical com tirantes pré-esforçados. B) Tirantes pré-esforçados com placas individuais de apoio. c) Tirantes pré- esforçados, ancorados no maciço de fundação, usados como ancoragem de uma barragem [1] . Figura 1.4 - Ponte pré-esforçada com cabos de estabilidade da estrutura (Portugal) [6]. Fundamentos de betão pré-esforçado 10 Figura 1.5 - Edifício com lajes pré-esforçadas (Hong Kong) [6]. Figura 1.6 - Interior de uma viga caixão pré-esforçada, cabos de pós-tensão externos (Suiça) [6]. Figura 1.7 - Pré-esforço em 30.000m2 de laje térrea (Chile) [6]. Fundamentos de betão pré-esforçado 11 Figura 1.8 - Supressão de 70% dos pilares e aumento da extensão de 6.30m para 12.60m (Espanha) [6]. Figura 1.9 - Instalação de ancoragens de 900 escoras à terra provisórias, até de funcionamento 2.200KN e 2.400 m2 dos painéis de betão pulverizados para a retenção de níveis superiores da rocha e das argilas do maciço terroso (Austrália) [6]. Figura 1.10 - Ponte pré-esforçada com uma extensão de 120m de comprimento e uma altura de 15m, primeira no mundo (Coreia do Sul) [6]. Fundamentos de betão pré-esforçado 12 Figura 1.11 - Estrutura Pré-esforçada, Museu nacional Arte Contemporânea (Brasil). Figura 1.12 - Reservatório de água em Betão Pré-esforçado (em Naples, Florida, USA) e silo. 1.4. Particularidades do Betão Pré-esforçado em relação ao Betão Armado O betão tem boa resistência à compressão e baixa resistência à tracção. A resistência à tracção, cerca de 10% da resistência à compressão, além de pequena é imprecisa, pois o material comporta-se de forma aleatória quando traccionado. Quando o betão não é bem executado, a retracção acentuada pode provocar fissuras na região traccionada da peça, eliminando completamente a resistência à tracção, mesmo antes de actuar qualquer solicitação. Devido à sua natureza incerta, a resistência à tracção do betão é geralmente desprezada nos cálculos. O artifício do pré-esforço consiste em introduzir esforços prévios na peça de betão, que reduzam ou anulem as tensões de tracção provocadas pelas solicitações em serviço. Nestas condições, a fissuração deixa de ser um factor determinante no dimensionamento da peça [1, 3]. Fundamentos de betão pré-esforçado 13 A Figura 1.13. (a) representa uma secção de betão armado, com a tensão no bordo superior da peça com um valor de σc e variação linear ao longo da sua altura, até . O momento-flector em serviço na secção vale: 2158,088,036,0 2 1 bddbdBraçoAreaBraçoForçaM ccc σσσ =×××××=××=×= A Figura I.13. (b) representa a mesma secção com armadura pré-esforçada. Sob acção da força de pré-esforço, e do momento devido às cargas, pode-se chegar ao diagrama de tensões mostrado nessa figura, com o valor σc no bordo superior igual ao da Figura I.13. (a). Neste caso, consegue-se que o diagrama se estenda até á fibra mais inferior, fixando-se aqui o eixo neutro, para que não exista tracção nesta fibra (pois poderiam aparecer fissurações) e o momento-flector de serviço na secção vale: 233,0 3 2 2 1 bddbhM cc σσ ≅××≅ Verifica-se que, para a mesma secção de betão, é possível dobrar o momento resistente utilizando o pré-esforço. Assim, pode-se concluir que, usando betões pré-esforçados com resistências características, fck, iguais ao dobro dos valores usuais em betão armado, é possível obter secções pré-esforçadas capazes de resistir a momentos flectores em serviço quatro vezes maiores que as suas similares em betão armado. Figura 1.13 - Exemplo de uma secção flectida, com armadura convencional [a] e com armadura pré-esforçada [b]. Para a mesma tensão (σc) a viga pré-esforçada apresenta uma resistência em serviço aproximadamente igual ao dobro da viga de betão armado [1]. Do ponto de vista económico, o betão pré-esforçado possui características que podem ser determinantes numa analise de custo global, quando comparando com o betão armado. As Fundamentos de betão pré-esforçado 14 resistências de betão pré-esforçado, são duas a três vezes maiores que as utilizadas em betão armado. Os aços utilizados nos cabos de pré-esforço têm resistência três a cinco vezes superiores às dos aços usuais de betão armado. Os aumentos percentuais de preço podem ser muito inferiores aos acréscimos de resistência obtidos, tanto para o betão como para o aço. O Quadro I.1. apresenta um exemplo comparativo de relações de resistência e preços unitários para betão armado (BA) e betão pré- esforçado (BP) [Pfeil (1983), segundo referência 1 da bibliografia]. De referir que este quadro tem já mais de 2 décadas, sendo hoje a diferença de preço entre o aço corrente e o de pré-esforço significativamente menor. Quadro I.1. - Relações entre resistência e o preço unitário dos materiais utilizados em betão armado (BA) e betão pré-esforçado (BP) [1]. O pré-esforço das armaduras em estruturas de betão proporciona uma série de vantagens [1], como por exemplo: ⇒ Permite projectar secções mais esbeltas do que no betão armado convencional, sobretudo se o comportamento em serviço é um factor predominante, uma vez que toda a secção de Parâmetros comparativos BA BP BP/BA Resistência media (MPa) 20 40 2,0 Preço m3 de betão --- --- 1,3 Tensão média de dimensionamento do aço (MPa) 250 1250 5,0 Relação do preço por unidade de peso entre aços --- --- 2,0 a 3,0 Fundamentos de betão pré-esforçado 15 betão pode trabalhar à compressão. Assim, normalmente as peças de betão pré-esforçado possuem menor peso próprio, em relação as peças equivalentes de betão armado, o que viabiliza economicamente o projecto de estruturas de grandes vãos. ⇒ Permite controlar a deformação elástica e limita-la a valores menores que os que seriam obtidos para estruturas similares em aço ou betão armado ⇒ Proporciona melhores condições de durabilidade, pois anula totalmente, ou quase totalmente, as tensões de tracção, principais responsáveis pela fissuração. As armaduras ficam mais protegidas. ⇒ Permite que a estrutura se recomponha após a actuação de uma sobrecarga eventual não prevista. Cessada a causa, as fissuras abertas, fecham-se devido a acção da força do pré- esforço. ⇒ A estrutura normalmente possui maior resistência à fadiga, pois a variação de tensão no aço, proveniente de cargas moveis, é muito pequena quando comparada com o valor da sua resistência característica. A operação de pré-esforço funciona como uma verdadeira prova de carga, pois as tensões introduzidas nessa fase são muito maiores que as correspondentes à situação da peça em serviço. A estrutura é testada antes de entrar em operação, propriamente dita. Em contrapartida, podem ser relacionadas algumas desvantagens do betão pré-esforçado: ⇒ O betão de maior resistência exige melhor controle de execução. ⇒ Os aços de alta resistência exigem cuidados especiais de protecção contra a corrosão. ⇒ A colocação dos cabos de pré-esforço deve ser feita com a maior precisão de modo a garantir as posições admitidas nos cálculos. Como a força de pré-esforço possui, em geral, um valor muito alto, um pequeno desvio do cabo da posição de projecto pode produzir esforços não previstos, levando ao comportamento inadequado da peça e mesmo até ao colapso. ⇒ As operações de pré-esforço exigem equipamento e pessoal especializados, com o controle permanente e dos esforços aplicados e dos alongamentos dos cabos. Fundamentos de betão pré-esforçado 16 ⇒ De um modo geral, as construções pré-esforçadas exigem atenção e controle superiores aos necessários para o betão armado. 1.5. Princípiosdo Pré-esforço. Três diferentes conceitos [2] podem ser utilizados para explicar e analisar o comportamento básico do betão pré-esforçado. Pré-esforçar para transformar o betão num material elástico O betão, que é fraco em tracção e forte em compressão, é comprimido (por varões de alta resistência) para que o betão frágil possa ser submetido a tensões de tracção. Se não houver tensões de tracção no betão, não existirão fendas e toda a secção de betão é activa comportando-se como um material elástico. Sob este ponto de vista o betão está sujeito a dois sistemas de forças: ⇒ Pré-esforço interno; ⇒ Acções exteriores. Em que as tensões de tracção devidas às acções exteriores são contrabalançadas pelas tensões de compressão devidas ao pré-esforço. Pré-esforçar para combinar aço de alta resistência com o betão O betão pré-esforçado é encarado, de forma idêntica ao betão armado, como uma combinação de dois materiais: aço e betão. Também aqui o aço a receber as tracções e o betão a receber as compressões, em geral. Para tirar partido do aço de alta resistência é necessário submetê-lo a grandes deformações. Por isso, se simplesmente este aço fosse colocado no betão como armadura passiva, o betão envolvente sofreria enorme fendilhação antes que se desenvolvesse as tensões a que a armadura resiste. Assim sendo, é necessário esticar previamente o aço de alta resistência e ancorá-lo contra o betão de forma a desenvolver um efeito favorável nos dois materiais (compressão no betão e tracção no aço) antes de aplicar as cargas exteriores. Fundamentos de betão pré-esforçado 17 Pré-esforçar para alcançar a carga equivalente Segundo este conceito o pré-esforço é, basicamente, interpretado como uma tentativa para equilibrar as cargas actuantes sobre o elemento. No projecto de uma estrutura pré-esforçada o efeito do pré-esforço é visto como uma carga equivalente às acções permanentes, de tal forma que os elementos sujeitos à flexão (lajes, vigas) não ficarão sujeitos ao momento-flector para um dado carregamento (acções permanentes e/ou acções quase-permanentes). 1.6. Técnicas e sistemas de pré-esforço. A presente monografia retrata a técnica de pós-tensão com aderência, ainda que se faça uma breve referencia a outras tecnologias de pré-esforço. As principais técnicas [1] de pré-esforço nas estruturas de betão podem classificar-se em: Pré-tensão As armaduras (normalmente são usados fios) são tensionadas antes da colocação do betão, fig. 1.14 a), sendo a transferência realizada por aderência, quando o betão adquire a necessária resistência, fig. 1.14 b), e se libertam as armaduras das ancoragens iniciais, fig. 1.14 c). Envolve, em geral, grandes perdas de pré-esforço, porque a transferência do pré-esforço se faz usualmente para um betão com poucos dias de cura. Este processo é característico da produção fabril de elementos pré-fabricados. Pós-tensão As armaduras são tensionadas depois do betão ter adquirido a resistência necessária, sendo a transferência garantida nas ancoragens existentes nas extremidades da peça de betão (sendo esta uma zona sensível da peça de betão, sujeita a um possível esmagamento, devido as elevadas compressões). Betão Pré-esforçado Pré-tensão Pós-tensão Com aderência Sem aderência Fundamentos de betão pré-esforçado 18 Sapata de reacção Ancoragem Armaduras pré-tracionadas Figura 1.14 - Sistema de Pré-tensão [3] A sequência da pós-tensão, essencialmente, é a seguinte: ⇒ 1º - Execução da estrutura com as armaduras passivas, betonagem e cura (incluindo a colocação das bainhas dos cabos); ⇒ 2º - Inserção dos cabos e seu traccionamento (aplicação do pré-esforço); ⇒ 3º - Montagem dos aparelhos de ancoragem com transmissão do pré-esforço por fixação dos cabos nas cunhas. No sistema de pós-tensão distinguem-se os sistemas com e sem aderência: ⇒ No betão pós-tensionado com aderência, os cabos de pré-esforço ficam aderentes à secção de betão mediante a injecção de calda de cimento nas bainhas, após ganhar presa. ⇒ No betão pós-tensionado sem aderência, na construção definitiva, as armaduras mantêm- se desligadas da peça de betão, uma vez que continuam a poder deslizar no interior da bainha, normalmente usa-se um tipo de graxa que reduz o atrito, para melhor protecção das armaduras. O betão pós-tensionado é característico da aplicação in-situ, em construções de médio e grande vão. Fundamentos de betão pré-esforçado 19 Figura 1.15 - Esquema de uma viga pós-tensionada, com aderência da VSL [6]. Os sistemas de pré-esforço estão patenteados, sendo diversas as designações comerciais, muito embora actualmente sejam pequenas as diferenças entre as várias marcas. A opção por um dado sistema é, em geral, função dos custos e do apoio técnico prestado pelas respectivas empresas. Figura 1.16 - Pormenor da ancoragem/bainha e o tracção dos cabos (aplicação do pré-esforço) [6]. Existem vários sistemas de pré-esforço por pós-tensão, sendo os mais comercializados na Europa: Freyssinet; VSL/Stronghold; Dividag; BBRV; CCL. Fundamentos de betão pré-esforçado 20 Figura 1.16.A - Pormenor da ancoragem/bainha e o tracção dos cabos (aplicação do pré-esforço) [6]. Fundamentos de betão pré-esforçado 21 Ainda sobre este assunto será oportuno referir que [4]: ⇒ Pré-tensão com ausência de aderência não faz sentido, embora teoricamente não a possamos excluir, também o uso de cabos com trajectórias outras que não rectas é complicado, embora o recurso a desviadores seja um processo. ⇒ O pré-esforço não aderente poderá parecer menos seguro, dado que o rebentamento da ancoragem poderá determinar, mais facilemente, o colapso da estrutura. Contudo, no pré- esforço não aderente há cabos complementares de segurança, podendo até existir bainhas em vazio para substituição em processo de manutenção; ⇒ O pré-esforço por pós-tensão e aderente tem o problema da calda, que poderá não preencher com totalidade o vazio das bainhas (muito embora muitos avanços tenham sido efectuados); 1.7. Funcionamento estrutural do betão pré-esforçado Basicamente, sob este ponto de vista, o betão está sujeito a dois sistemas de forças: pré- esforço interno e acções exteriores. Em que as tensões de tracção devidas às acções exteriores são contrabalançadas pelas tensões de compressão devidas ao pré-esforço [3]. Consideremos uma viga de secção rectangular com um cabo localizado no seu eixo e sujeita a duas cargas (fig. 1.17): 1. Uma exterior, uniformemente distribuída descendentemente no seu plano (q); 2. Outra interna, por extensão do cabo e sua fixação as secções extremas (P). Na verdade, para se obter a força P o fio é esticado usando, por exemplo, um macaco, sendo em seguida seguro a umas placas metálicas rígidas, situadas nas extremidades da peça, este procedimento corresponde ao pré-esforço por pós-tensão. Seja P a força do pré-esforço que origina uma tensão de compressão uniforme no betão, com a excepção das secções nas extremidades, em que devido as cargas concentradas as tensões não são uniformes. Contudo, o princípio de St.Venant é tido para secções suficientemente afastadas das extremidades, vindo, para compressão negativa: Fundamentos de betão pré-esforçado 22 cA P−=σ Sendo M o momento numa secção da viga devido ao peso próprio e às cargas exteriores, a tensão numa fibra qualquer dessa secção devida a M será, em regime elástico: W M I y ±=×Μ±=σ Com: P - valor da compressão dada pelo pré-esforço; y - distância da fibra ao Centro de Gravidadeda secção (que coincide com linha neutra em flexão pura); I - momento de inércia da secção; W - módulo de flexão (I/y). O sinal ± justifica-se pois se uma fibra extrema está em compressão a outra terá que estar em tracção. A tensão resultante pode ser obtida pelo princípio da sobreposição de efeitos, considerando que o comportamento da viga se mantém dentro do regime elástico, como se pode observar na Figura 1.17, pelo que: W M A P I y cc ±−=×Μ±Α Ρ−=σ Quando o cabo é colocado excentricamente em relação ao centro de gravidade da secção, a peça de betão pré-esforçado é acrescida de novas tensões, como se pode observar na figura 1.19, de acordo com a convenção de sinais da figura 1.18. De facto, actuando o cabo com uma excentricidade (e) a secção é solicitada pela força de compressão P de forma também excêntrica. Ora, esta excentricidade não é mais que um braço actuado por uma força, logo um mecanismo produtor de um momento, P×e. Fundamentos de betão pré-esforçado 23 eixo neutro W - módulo de flexão c c A - área de betão e - excentricidade do cabo ao Cg da viga I - inércia da seccção c P A W M b t M WA P c PP f = - + b tf = - - W M (+) b W M (-) t c (-) P A = + - +- A y y - distância da fibra em consideração ao Cg da secção W = I y y e = 0 t b W = I y W = I y b b t t t - fibra superior de topo (top) b - fibra inferior de base (bottom) q q - carga uniformemente distribuida descendente compressão compressão compressão tracção Figura 1.17 - Tensões devidas ao pré-esforço centrado e o peso próprio a meio vão. As tensões produzidas por este momento, P×e, são: W e×Ρ=σ a distribuição de tensões resultantes é dado por: WW e c c Μ±×Ρ±Α Ρ−=σ Quando os cabos são curvos (Figura 1.20), normalmente toma-se o equilíbrio da parte esquerda ou da parte direita em relação à secção em análise. Será de salientar que a resultante das compressões no betão, devidas apenas ao pré-esforço, é igual e de sinal contrário à força P do cabo, actuando com uma excentricidade (e). As tensões no betão devidas ao pré-esforço excêntrico também aqui são dadas por: Fundamentos de betão pré-esforçado 24 W e c .Ρ±Α Ρ−=σ Sendo apenas de notar que o valor da excentricidade varia ao longo da peça e, como tal, também o momento induzido pelo pré-esforço em cada uma das suas secções. G x y (+) Figura 1.18 - Convenção de sinais [4] eixo da peça W - modulo de inercia c c A - área de betão e - excentricidade I - inercia seccção c P A b Pe W W M b t M WW Pe tA P c PP f = - - + b tf = - + - W M (+) b W M (+) tt (+) Pe W c (-) P A W Pe (-) b = + - + + -+- A ye y - distancia ao eixo neutro W = I y y Figura 1.19 - Tensões devido ao pré-esforço com excentricidade e ao peso próprio a meio vão [4]. Fundamentos de betão pré-esforçado 25 Conclui-se, assim, que as tensões no betão devidas ao pré-esforço são apenas dependentes da grandeza e localização de P na secção, ou seja, do seu valor e da sua excentricidade, independentemente do traçado do cabo ao longo da viga (isto em peças isostáticas). C o m p r e s s ã o N = Pe P r é - e s f o r ç o P A ' A Figura 1.20 - Efeito do pré-esforçado aplicado por um cabo curvo [2] Por vezes, em função do valor do pré-esforço e da sua excentricidade para baixo do Centro de Gravidade da secção, a tensão σt (tensão no topo da secção) é positiva (tracção) e há perigo desta (em valor absoluto) ser maior que a tensão resistente do betão a tracção. Consequentemente, poderá provocar fendilhação na face superior da viga, sobretudo numa situação de pouca carga, como aquando da aplicação do pré-esforço, em que apenas a construção se encontra com a estrutura fabricada e, eventualmente, nem toda esta. Certo é que no caso da peça já se encontrar em serviço, em que toda a carga permanente e parte da sobrecarga já se encontra aplicada, é natural que a fendilhação principal seja na zona superior da viga, mas na zona dos apoios e não ao meio vão, motivada pelos momentos negativos. Contudo, tal asserção, embora genericamente válida, depende muito da situação de continuidade e rigidez dos apoios e do traçado do próprio cabo, obviamente. É de realçar o facto da transferência do pré-esforço se dar, em geral, quando o betão é novo, a que corresponde a uma resistência à tracção inferior àquela que terá quando for mais velho, ou seja, quando a estrutura entrar em serviço [4]. Fundamentos de betão pré-esforçado 26 1.8. Traçado dos cabos O traçado dos cabos é de fundamental importância para a configuração final de esforços numa peça de betão pré-esforçado, diremos, mesmo, que será um dos maiores segredo do sucesso de uma estrutura pré-esforçada. Uma vez que o objectivo primário do pré-esforço numa peça é actuar em sentido oposto aos esforços produzidos pelo carregamento externo, o traçado dos cabos deve ser projectado em função das cargas actuantes na peça e posteriormente ajustado, de forma a satisfazer os requisitos peculiares construtivos de cada situação de projecto. 1.8.1. Fundamento físico do traçado dos cabos Considere-se, por exemplo, uma viga simplesmente apoiada e submetida a um carregamento uniforme (figura 1.21). A introdução de um cabo rectilíneo na posição correspondente ao eixo neutro da viga, caracteriza o pré-esforço centrado, produzindo tensões uniformes de compressão ao longo de toda a viga. Da sobreposição dos efeitos do carregamento externo e do pré-esforço resulta a distribuição de tensões mostrada na figura 1.22 Na região dos apoios o momento-flector é praticamente nulo e, consequentemente, não produz tensões na secção, nem de tracção nem de compressão. Mmax diagrama de momento flector variação das tensões normais de tracção na fibra externa na face traccionada t maxσ Figura 1.21 - Variação das tensões numa viga simplesmente apoiada [1]. Fundamentos de betão pré-esforçado 27 O pré-esforço centrado produz tensões normais de compressão nessa região (Figura 1.22.a) e o betão fica, então, sujeito a tensões normais e de corte combinadas. Por outro lado, no centro do vão as tensões de compressão nas fibras comprimidas da viga, produzidas respectivamente pelo carregamento e pelo pré-esforço, somam-se aumentando a solicitação do betão nessa região (Figura 1.22.b). É possível melhorar a configuração de esforços na viga alternando o traçado do cabo de pré-esforço [1]. Ainda considerando um cabo de pré-esforço rectilíneo, pode-se perceber que deslocando a linha de actuação da força de pré-esforço do eixo neutro da viga, a distribuição de tensões numa secção genérica deixa de ser uniforme (Figura 1.23). a + = configuração final das tensões variação das tensões normais na fibra externa na face traccionada b configuração final das tensões + = variação das tensões normais na fibra externa na face comprimida σp σc max σ +p σc max t max σp σp σ tensões normais de compressão produzidas pelo pré-esforço tensões normais de tracção produzidas pelo carregamento externo tensões normais de compressão produzidas pelo carregamento externo tensões normais de compressão produzidas pelo pré-esforço o acréscimo de compressões no centro pode ser prejudicial para o betão Figura 1.22 - Efeito do pré-esforço centrado numa viga simplesmente apoiada sujeita a um carregamento uniforme [1]. Na verdade, à medidaque a linha de actuação da força de pré-esforço se afasta do eixo neutro e se aproxima do perímetro do núcleo central de inércia da secção, as tensões de compressão, Fundamentos de betão pré-esforçado 28 decorrentes do pré-esforço, aumentam numa das faces da viga e diminuem na outra (Figura 1.23.b). Se a força de pré-esforço for aplicada fora do perímetro do núcleo central de inércia, as tensões sofrem uma mudança de sinal ao longo da secção, surgindo tensões de tracção na face mais distante da linha de actuação da força de pré-esforço (Figura 1.23.d). Pd c P P P b a diagramas de tensão Nucleo central de inercia Figura 1.23 - Distribuição de tensões na secção em função do ponto de aplicação da força de pré-esforço: a) P aplicado no eixo neutro da secção; b) P aplicado fora do eixo neutro e dentro do perímetro do núcleo central de inércia; c) P aplicado no perímetro do núcleo central; d) P aplicado fora do núcleo central de inércia [1]. A situação é semelhante à da distribuição de tensões debaixo de uma sapata em função da colocação de um pilar sujeito a esforço de compressão isolado, muito embora não possam surgir tensões de tracção insuportáveis pelo solo. De um modo geral, o ideal é que as tensões de pré-esforço variem proporcionalmente às induzidas pelos esforços externos. Isso pode ser conseguido se o traçado dos cabos acompanhar o diagrama de momentos-flectores produzidos pelo carregamento externo (figura 1.24). Fundamentos de betão pré-esforçado 29 Traçado do cabo absorve a quase totalidade do momento provocado pela carga distribuida Diagrama de momento flector provocado pela carga distribuida Carga distribuida Figura 1.24 - Perfil dos cabos e do diagrama flector (peça hiperestática) [1, adaptado] M = P.eM = F = 2P α = P.e L 4 4 L momento devido a uma carga concentrada a meio vão4 F.L diagrama de momento flector para ângulos muito pequenos pode-se trocar o seno com a tangente F = 2 Psen α = 2P αP α F P 2e LL/2 etgα = = = α diagrama de momento flector P.e P PF eα L/2L/2 Figura 1.25 - Demonstração gráfica e matemática de MP = P×e [1] Fundamentos de betão pré-esforçado 30 Com essa configuração, o pré-esforço actua na posição óptima para anular as tensões provocadas pela solicitação externa (e pelo peso próprio da peça) e, de forma associada, contra a fissuração do betão. Reparar que, propositadamente, na figura 1.24 o traçado do cabo não absorveu completamente a flexão provocada pela carga, isto porque tendo sempre que existir armadura passiva construtiva, será de a rentabilizarmos para ajudar à resistência mecânica necessária a fazer face à solicitação global (incluindo o peso próprio que aqui foi desprezado). Durante a definição do traçado dos cabos, o projectista deve sempre tentar trabalhar com as menores curvaturas possíveis, bem como o menor número de curvas possível, com o objectivo de minimizar as perdas por atrito devido a esses factores. Como se afirmou, num dado ponto da viga, o momento produzido pela força de pré-esforço P é MP = P×e, onde “e” é a excentricidade da força de pré-esforço no ponto considerado. A demonstração gráfica e matemática pode ser verificada na figura 1.25. 1.8.2. Influência de aspectos construtivos no traçado dos cabos Além do efeito do carregamento outros factores influenciam o projecto do traçado dos cabos, como: ⇒ A geometria da peça (ex: esbelteza da alma); ⇒ Particularidades dos processos construtivos (ex: quando e onde se aplica o pré-esforço); ⇒ Comportamento de estrutura (ex: alteração dos esforços internos e sua redistribuição na aplicação do pré-esforço). No caso de peças de betão com cabos pós-tensionados, dentro de bainhas flexíveis, o traçado dos cabos é definido propondo-se uma associação de tramos parabólicos e rectilíneos (figura 1.26 e 1.27) [1]. Em vigas pré-esforçadas de grande porte, muitas vezes é necessário utilizar vários cabos para conseguir o pré-esforço necessário e, frequentemente, a área da face externa da viga não proporciona espaço necessário para a colocação das peças de ancoragem para todos os cabos. Quando essa situação ocorre, o traçado dos cabos é projectado de tal forma que alguns deles são ancorados na face superiores da viga e outros são ancorados na face inferior ou, ainda, nas faces laterais da peça (figura 1.26 e 1.27) [1]. Fundamentos de betão pré-esforçado 31 1 2 5 4 3 Figura 1.26 - Tipos de pré-esforço utilizados em vigas simplesmente apoiadas: 1) cabo rectilíneo ancorado nas faces laterais da viga; 2) cabo parabólico ancorado nas faces laterais da viga; 3) ancoragens activas nas faces laterais da viga; 4) cabo parabólico ancorado na face superior da viga; 5) ancoragem activa, na face superior da viga [1] 1.8.3. Método das cargas equivalentes Numa estrutura isostática o efeito do pré-esforço pode ser calculado, aproximadamente, através do conceito das cargas equivalentes. Este conceito é uma tentativa de equilibrar uma determinada quantidade de carga sobre a estrutura [3]. O método consiste em transformar o efeito do pré-esforço e considerar um carregamento externo equivalente a esse efeito. Para as estruturas isostáticas, este método não é especialmente indicado, sendo especialmente vantajoso para estruturas hiperestáticas, planas e espaciais [4]. Em projecto esta técnica pode ser adoptada como uma forma muito simples de obter uma ordem de grandeza do pré-esforço e, portanto, dos cabos requeridos, o que é fundamental para o dimensionamento da forma e proporções da secção [2]. Reparar que para ângulos Ø pequenos, 1cos ≈φ e, por conseguinte, PP ≈φcos . Assim, para a figura 1.27, as tensões a uma distancia x do apoio esquerdo, e até meio vão )2/( lx = , numa dada secção da viga, são dadas por: W MM A P prim c ++−=σ Fundamentos de betão pré-esforçado 32 φtgxPePM prim −== . e φφ sin2 sin2 21 xPxPxFxRM ==== Onde Mprim é o momento devido ao pré-esforço e M é o momento devido às cargas exteriores. Também para ângulos pequenos φφ tg≈sin e as tensões numa dada secção, são dadas por: A P c −=σ Como se a peça estivesse sujeita a compressão simples. L/2L/2 V = 2Psinφ P F = V Psinφ Pcosφφφ P c.g. Figura 1.27 - Equilíbrio de uma força concentrada através de um traçado composto por dois troços recto [4] Assim, a carga P = V equilibra o pré-esforço introduzido pelo traçado do cabo. A carga equivalente a um traçado do cabo é uma carga que só por si provoca um diagrama de momentos flectores de efeito igual ao cabo, que terá de ser, em proporção, determinado através da igualdade Mprim com M. Para um traçado parabólico do cabo (fig. 1.28) a carga equivalente será uma carga uniformemente distribuída, sendo, assim, o valor dessa mesma carga dado por: 2 max8 L Pe=ω Onde emax representa a excentricidade máxima a meio vão e “L” a distância entre apoios. Fundamentos de betão pré-esforçado 33 Deformada Diagrama de momentos flectores -Pe + - M M +e -e L ω Psinφ=4Pe /L Pcosφφ P c.g. cabo parabólico max emax Figura 1.28 - Equilíbrio de uma força uniformemente distribuída através de um traçado composto por um cabo parabólico [4]. A título de curiosidade e informação genérica serão apresentados seguidamente alguns exemplos de traçados de cabos em vigas hiperestáticas (fig.1.29). 2. Materiais e equipamento de pré-esforço Este capítulo refere-se aos materiais e equipamentos utilizados em estruturas de betão pré- esforçado. Para bem do sector da construção,e consequente aumento da qualidade das estruturas, todos os materiais usados devem ser devidamente homologados e com experiência de aplicação largamente verificada e reconhecida, pois a qualidade e segurança de uma estrutura de betão pré-esforçado passa pelos materiais e pela sua boa utilização, respeitando suas capacidades técnicas, disposições construtivas e legislação aplicável. De referir que estar homologado não significa que o material é bom ou adequado para todas as situações, apenas nos diz que o está na sua ficha técnica corresponde ao que realmente estamos a usar/comprar, independentemente dessas características serem boas ou más. Fundamentos de betão pré-esforçado 34 5 1 6 2 3 7 8 4 5 3 7 8 4 5 Figura 1.29 - Tipos de cabos de pré-esforço utilizados em vigas continuas: a) Viga continua de dois tramos; b) viga continua de três tramos; 1) cabo parabólico ancorado nas faces laterais da viga; 2) Cabo parabólico ancorado na face superior da viga; 3) cabo parabólico ancorado dentro da viga através de uma ancoragem passiva; 4) cabo parabólico, com uma extremidade ancorado na face inferior (pormenor de difícil execução); 5) ancoragem activa na face lateral; 6) ancoragem activa na face superior; 7) ancoragem passiva na face lateral; 8) ancoragem activa na face inferior. Os eixos dos cabos são geralmente projectados como associações de parábolas e trechos rectilíneos [Pfeil, 1984, segundo referência 1 da bibliografia]. Fundamentos de betão pré-esforçado 35 2.1. Betão A construção de estruturas pré-esforçadas requer um controle de qualidade do betão muito rigoroso. Deve-se exigir a realização de ensaios prévios, o controle contínuo do cimento e dos inertes utilizados, bem como a fiscalização constante durante a elaboração do betão. Normalmente, os betões utilizados em peças pré-esforçadas possuem resistência superior àquelas das peças de betão armado. Para o betão pré-esforçado, o REBAP, segundo o Artigo 13º, paragrafo 4º, não permite utilização de betões de classe inferior a B30, ou seja os betões B15, B20 e B25 não podem ser usados. As características gerais do betão estão indicadas no REBAP (artigos 12º a 20º) [15], muito embora a ENV206 seja a norma em vigor no que aos betões concerne. De uma forma simplista, podemos dizer que, normalmente, as resistências à compressão do betão (1) e (2) usado em estruturas tipo são: ⇒ Moradias de betão armado: 16MPa < fck < 20Mpa ⇒ Edifícios de betão armado: 20Mpa < fck < 25Mpa ⇒ Pontões e estruturas especiais em betão armado: 30Mpa < fck < 35Mpa ⇒ Pontes e estruturas em betão pré-esforçado: 35Mpa < fck < 40Mpa Nota: (1) - provetes cúbicos; (2) - provetes cilíndricos Factores que justificam resistências elevadas [1]: ⇒ A introdução da força de pré-esforço pode causar solicitações prévias muito elevadas, frequentemente mais elevadas que as correspondentes a uma situação de serviço, inclusive junto aos pontos de amarração provocando elevadas compressões nas peças com sistemas das ancoragens; ⇒ O emprego de betão e de aços de alta resistência permite a redução das dimensões das peças, diminuindo o seu peso próprio e, por conseguinte, viabilizando técnica e economicamente a execução de estruturas de grande vão; Fundamentos de betão pré-esforçado 36 ⇒ Os betões de alta resistência possuem, em geral, módulo de elasticidade mais elevado, o que diminui tanto as deformações imediatas como as que ocorrem ao longo do tempo. Isso reduz os efeitos da perda de pré-esforço oriundos da retracção e fluência do betão. Segundo o artigo 17º do REBAP, temos: 3 ,5,9 jCmCJ f=Ε E, de facto, através do anexo 1 vem: ( ) ( ) 28, , ' , , c c tccc tt tt Ε= Ο Ο Ο ϕσε ⇒ Nas peças pré-tensionadas (pré-esforço por aderência) a utilização de betões de alta resistência permite o desenvolvimento de maiores tensões de aderência. Esta conclusão é imediata se analisarem as equações do artigo 80.º do REBAP (ver também art. 16.º): fbd = 0.3 cdf ⇔ aderência normal (f cd em MPa) fbd = 2.25 fctd ⇔ alta aderência (f ctd em MPa) Além de boa resistência, é importante que o betão tenha boas características de compacidade e baixa permeabilidade, para que tenha protecção suficiente contra a corrosão das armaduras. Por outro lado, um bom recobrimento das armaduras garante uma boa aderência entre as mesmas e o betão, sendo que um betão de alta resistência (fck > 30Mpa), no local das tracções serve como protector à fixação mecânica. O recobrimento deve ser no mínimo igual a dois diâmetros (2Ø) do elemento a proteger. Estudos recentes, aconselham a que se aumente o recobrimento para quatro diâmetros (4Ø), pois garantem um melhor desempenho, estabilizando as tensões [1,4]. 2.2. Aço de pré-esforço A variedade dos aços é, genericamente, ditada pela sua quantidade em percentagem de carbono, associada aos elementos de liga que contém e às suas quantidades relativas. Assim, os tipos de aço são, basicamente: ⇒ O aço macio, cuja percentagem de carbono está entre 0.2% e o 0.3%; ⇒ O aço duro, cujo teor de carbono vai até 1.5%; Fundamentos de betão pré-esforçado 37 ⇒ O ferro fundido, com percentagens acima desse valor. As propriedades das armaduras ordinárias são apresentadas no REBAP, nos Artigos 21º a 25º. O teor de carbono nas armaduras de pré-esforço varia de 0,7 a 0,9% [15]. Os aços usados no betão pré-esforçado caracterizam-se por elevada resistência e pela ausência de patamar de cedência. Tornam-se, proporcionalmente, sensivelmente mais económicos que os aços normalmente empregados na construção com betão armado, já que a sua resistência pode ser, aproximadamente, até três vezes maior. Os aços de alta resistência podem ser fornecidos também na forma de fios e cabos, evitando-se assim os problemas relacionados com as emendas da armadura em peças estruturais de grandes vãos. Na construção com betão armado, estado de tensão inicial nulo no aço, o emprego dos aços de alta resistência é desaconselhado, pois os alongamentos excessivos provocariam fendas muito abertas. Já no betão pré-esforçado este problema é evitado através do alongamento prévio da armadura [1], estado de tensão não nulo das armaduras. Segundo o REBAP, artigo 26º, os aços de pré-esforço são encontrados nas seguintes formas: ⇒ Fios e associação de fios; ⇒ Varões ou cordões e cordões paralelos (cabos em feixe); ⇒ Associações de cordões dispostos em hélice em torno de um eixo horizontal comum (cabos ou cordões). A distinção entre fio e varão esta ligada a possibilidade de fornecimento em rolos e é feita habitualmente pelo diâmetro de 12 mm [15]. No betão pós-tensionado tem-se optado por usar 7 cordões de Ø 12,7 mm. O cordão de 7 arames de Ø 15,4 mm é menos utilizado, apesar de apresentar grandes vantagens no que diz respeito ao alojamento dos cabos em peças cujas dimensões não podem ser aumentadas [1]. Quanto às modalidades de tratamento do aço de pré-esforço podem ser: ⇒ Endurecimento a frio por trefilagem ou estiragem; ⇒ Tratamentos térmicos; Fundamentos de betão pré-esforçado 38 ⇒ Tratamentos mecânicos. Estes tipos diferentes de tratamento podem ser aplicados num mesmo aço, destinados a melhorar as suas características elásticas e reduzir as perdas de tensão por relaxação [1]. 2.3. Principais propriedades mecânicas dos aços O módulo de elasticidade médio do aço é, aproximadamente, idêntico para todos os seus tipos e, em regra, invariável com o tratamento (Ep = Es = 200 GPa), para casos sem grande rigor. Muito embora, deverá ser baseado em determinações experimentais cuidadas, variando de fornecedor para de fornecedor (com variações entre 165 Gpa
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