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Bruno Borges Ramos Obtenção e caracterização de camadas de austenita expandida através da nitretação a baixa temperatura de AISI 316L Dissertação submetido ao Programa de Pós-graduação em Ciência e Engenharia de Materiais da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção do Grau de Mestre em Ciência e Engenharia de Materiais Orientador: Prof. Dr Cristiano Binder Coorientadora: Profª. Dra. Ana Maria Maliska Florianópolis 2018 Bruno Borges Ramos Obtenção e caracterização de camadas de austenita expandida através da nitretação a baixa temperatura de AISI 316L Esta Dissertação foi julgada adequada para obtenção do Título de Mestre e aprovada em sua forma final pelo Programa Pós-graduação em Ciência e Engenharia de Materiais. Florianópolis, 6 de fevereiro de 2018. ________________________ Prof. Guilherme Mariz de Oliveira Barra, Dr. Coordenador do Curso Banca Examinadora: _________________________ Prof. Cristiano Binder, Dr. Orientador Universidade Federal de Santa Catarina ________________________ Prof.ª Ana Maria Maliska Dr.ª Coorientadora Universidade Federal de Santa Catarina ________________________ Tatiana Bendo, Dr.ª Universidade Federal de Santa Catarina ________________________ Prof. Rodrigo Perito Cardoso, Dr. Universidade Federal do Paraná Dedico este trabalho à minha família. AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer imensamente ao PGMAT e toda sua equipe, em especial ao Rogério e ao Professor Guilherme, pois sempre foram atenciosos e prestativos. À Professora Ana Maria Maliska, que tem me permitido realizar atividades desde 2010 no Laboratório de Caracterização de Materiais, que sempre me instruiu na jornada acadêmica e confiou na minha capacidade de desenvolver as atividades de ensino e pesquisa. Junto disso, agradeço à família que nos tornamos nesse laboratório, Patrícia, Bruno, José, Franciscos, Luana, Keila e Carmelita, vocês me ajudaram muito na realização deste trabalho. A contribuição de vocês vai muito além da execução de técnicas e atividades acadêmicas, e passa pelos diversos momentos de distração, reflexão e companheirismo que compõem a nossa amizade. Muito tenho a agradecer a ótima orientação e apoio do Professor Cristiano Binder, que acreditou no potencial do trabalho e muitas vezes me guiou em momentos de indecisão, espero ter causado uma impressão tão positiva quanto tive nessa oportunidade. Estendo o agradecimento a equipe do LabMat. Tati, Diego, Professora Sônia e Professores Daniel e Klein, pelas diversas vezes que me auxiliaram e me ensinaram. Aos colegas e parceiros de pesquisa da 8.1, em especial ao Thiago e Renan, espero que possamos desenvolver muitas atividades de pesquisa nos próximos anos. Como a vida não se resume ao trabalho, agradeço imensamente às amizades de longo tempo como as de Djeison, Julio e Walter. Faço questão de lembrar a todos meus amigos, que os considero minha família. Por fim, agradeço ao crescimento da minha família, e a companhia e cuidado das duas mulheres que dão sentido para minha vida, Manoella e Vera, minha mãe. A primeira delas, uma dessas surpresas da vida, está trazendo mais uma surpresa para o mundo, o Théo, que logo, logo chega para nos ensinar mais coisas sobre a vida. . ..be formless, shapeless, like water.. (Li Tsung, 1972) RESUMO Os aços inoxidáveis austeníticos possuem elevada resistência à corrosão devido ao fenômeno de passivação, que consiste na formação de óxido de cromo na superfície deste material. Estas ligas possuem alta ductilidade e baixa resistência mecânica quando comparado aos inoxidáveis ferríticos e martensíticos. Tratamentos termoquímicos, como a nitretação, podem ser utilizados com a finalidade de aumentar a dureza da superfície destas ligas, porém a fina camada de óxido que se forma espontaneamente na superfície destes materiais tem efeito deletério no processo de difusão. Por isso técnicas que promovem pulverização através da aceleração de íons, como a nitretação assistida por plasma (NAP), têm sido preferidas para o tratamento destes materiais. As técnicas de NAP permitem tratamentos a baixas temperaturas que se caracterizam pela formação de uma camada supersaturada em nitrogênio evitando a formação e precipitação de nitretos de cromo nos aços inoxidáveis austeníticos. A formação desta camada, conhecida como austenita expandida, é ideal para aplicações que visam simultaneamente propriedades químicas e mecânicas. A fase consiste em uma solução intersticial de nitrogênio em austenita para além dos limites de equilíbrio termodinâmico, para valores entre 20 at% e 40 at% de nitrogênio. O estado da arte tem explorado as diferenças entre as propriedades de camadas nitretadas na faixa de temperatura entre 350°C e 550°C, mas poucos estudos se aprofundaram na influência da quantidade de nitrogênio nas propriedades químicas e mecânicas. Assume-se aqui que uma liga inoxidável com diferentes teores de nitrogênio, tratado como elemento de liga, deve apresentar diferentes propriedades de resposta. Antecede ao estudo da resposta química e mecânica, a fabricação de camadas com diferentes teores de nitrogênio, e o domínio dos parâmetros de nitretação que permitam sua fabricação. Sendo assim o trabalho a seguir, através da variação de parâmetros de processo (potencial aplicado, razão cíclica e pressão), obteve diferentes características da camada de austenita expandida em um aço inoxidável 316L. Através das técnicas de Difração de raios X, microdureza Vickers, MEV e EDS, pôde-se caracterizar camadas enriquecidas por nitrogênio com espessuras que variam de cerca de 2µm a 8µm e com teores máximos de nitrogênio na faixa de 18 at% a 38 at%, que permitiram níveis de expansão da célula unitária entre 3% e 9% do parâmetro de rede inicial. Palavras-chave: austenita expandida, nitretação a baixa temperatura, plasma DC ABSTRACT The austenitic stainless steels have high corrosion resistance due to the passivation phenomenon that consists on the formation of chromium oxide on the materials surface. These alloys have high ductility and low mechanical strength when compared to ferritic and martensitic stainless alloys. Thermochemical treatments, like nitriding, can be used to increase the surface hardness of these alloys, but the thin oxide layer that is spontaneously formed on the surface of these materials has a deleterious effect on the diffusion process. Because of that, techniques that promote pulverization through ion acceleration, as the plasma nitriding process, have been preferred to treat these materials. The plasma nitriding techniques allow treatments at low temperatures that are characterized by the formation of a nitrogen supersaturated layer, avoiding the formation and precipitation of chromium nitrides on austenitic stainless steels.The formation of this layer, known as expanded austenite, is ideal to applications that simultaneously require chemical and physical properties. The phase consists of an interstitial solution of nitrogen in austenite above the thermodynamic equilibrium limits, with nitrogen values between 20 at% and 40 at%. The state of the art has been exploring the differences between the properties of layers nitrided between 350 °C e 550 °C, but few studies deepened on the influence of the nitrogen quantity on the chemical and mechanical properties. Here, it’s assumed that a stainless alloy with different levels of nitrogen, treated as an alloying element, should present different properties. The fabrication of layers with different nitrogen levels and the mastery of the nitriding parameters that allow their fabrication precedes the study of the chemical and mechanical response. Therefore, the following study, through the variation of the process parameters (applied voltage, duty cycle and pressure), obtained different characteristics of the expanded austenite layer in a 316L stainless steel. X-ray diffraction, Vickers microhardness, SEM and EDS techniques allow to characterize layers enriched in nitrogen with thickness around 2 µm to 8 µm and with maximum nitrogen levels between 18 at% and 38 at%, which allowed levels of unit cell expansion between 3% and 9% of the original lattice parameter. Keywords: expanded austenite, low-temperature nitriding, DC plasma. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Curvas de Paschen para diferentes gases. .................. 34 Figura 2 - (a) Aspecto do plasma durante uma descarga luminescente anormal, (b) características eletromagnéticas do plasma. ........................................................................................ 35 Figura 3 -Simplificação das interações entre cátodo e gás. ........ 36 Figura 4 - Influência da variação de tensão aplicada nas espécies ativas de um tratamento de cementação ..................................... 41 Figura 5 - Influência do tempo de pulso ligado na intensidade de emissão ótica das espécies formadas. ......................................... 43 Figura 6 - Influência do tempo de pulso desligado na intensidade de emissão ótica das espécies formadas. .................................... 43 Figura 7 - Microestrutura típica de ligas de aço nitretadas. ........ 44 Figura 8 - Microestrutura típica de ligas de aço inoxidável nitretadas em temperaturas convencionais. ................................ 45 Figura 9 - Microestrutura típica de aços inoxidáveis austeníticos nitretados a baixa temperatura. ................................................... 46 Figura 10 - Difratograma característico da austenita expandida. 47 Figura 11 - Dependência do coeficiente de difusão do nitrogênio com a concentração. ................................................................... 49 Figura 12 - Comparação entre o modelo de Boltzmann-Matano com o modelo que considera o fenômeno trapping-detrapping. 50 Figura 13 - Síntese do Procedimento Experimental. .................. 51 Figura 14 - Difratograma do aço AISI 316L. ............................. 53 Figura 15 - Micrografias do aço AISI 316L utilizado, seção (a) transversal -1000x e (b) longitudinal-500x. Reagente: ácido clorídrico saturado em ácido pícrico. ......................................... 54 Figura 16 - Configuração do reator. ........................................... 57 Figura 17 - Projeção das combinações viáveis para tratamento. 60 Figura 18 - Histórico térmico de diferentes condições de nitretação. .................................................................................................... 68 Figura 19 - Espectro ótico da etapa de pré-aquecimento. ........... 69 Figura 20 - Espectro ótico da etapa de limpeza. ......................... 70 Figura 21 - Espectros óticos da etapa de nitretação. ................... 71 Figura 22 - Média da microdureza Vickers dos ciclos. .............. 72 Figura 23 - Comparação entre posições do ciclo [1-300-60]. ..... 73 Figura 24 - Comparação entre micrografias de diferentes amostras do ciclo [2-300-45]. .................................................................... 75 Figura 25 - Micrografias de cada ciclo, 500x. ............................ 76 Figura 26 - Difratogramas de raios X dos ciclos. ....................... 79 Figura 27 - Variação do parâmetro de rede das amostras. .......... 80 Figura 28 -Variação da expansão da austenita das amostras. ..... 80 Figura 29 - Teor de nitrogênio na superfície das amostras. ........ 81 Figura 30 - Teor de ferro na superfície das amostras. ................ 82 Figura 31 - Teor de cromo na superfície das amostras. .............. 82 Figura 32 - Teor de níquel das amostras. ................................... 83 Figura 33 - Teor de molibdênio das amostras. ........................... 83 Figura 34 - Imagens de (a) elétrons secundários e (b) elétrons retro espalhados do ciclo [1-400-15]. ................................................. 84 Figura 35 - Análise química semiquantitativa das regiões: (a) clara E1, (b) escurecidas E2. ............................................................... 85 Figura 36 - Difração de raio X rasante (1° de incidência) para todos os ciclos. ..................................................................................... 87 Figura 37 - Difratogramas que apresentam possíveis precipitados de nitretos. .................................................................................. 88 Figura 38 - Micrografia da seção transversal, M.O., magnificação 1500x, reagente Behara II. ......................................................... 89 Figura 39 -Micrografia da seção transversal, M.E.V., magnificação 15000x, reagente Behara II. ....................................................... 90 Figura 40 - Espessura das camadas nitretadas obtidas por MO e MEV. .......................................................................................... 91 Figura 41 - Correlação do parâmetro de rede com a concentração de nitrogênio. .............................................................................. 93 Figura 42 - Evolução dos parâmetros de rede dos planos (111) e (200) com a concentração de nitrogênio. ................................... 94 Figura 43 - Anisotropia calculada a partir dos planos (111) e (200). .................................................................................................... 94 Figura 44 - Microdureza Vickers em função da concentração de nitrogênio. .................................................................................. 95 Figura 45 - Produto da pressão e tensão média e sua influência na espessura da camada................................................................... 96 Figura 46 - Produto da pressão, tensão aplicada e razão cíclica e sua influência na espessura da camada. ...................................... 97 Figura 47 - Influência da potência na espessura das camadas. ... 98 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Composição das principais ligas de aços inoxidáveis, por família. ................................................................................. 32 Tabela 2 - Processos industriais para obtenção de austenita expandida. ................................................................................... 46 Tabela 3 - Composição química em at%. ................................... 52 Tabela 4 - Outros elementos encontrados na análise por GDOES (at%). .......................................................................................... 52 Tabela 5 -Valores de parâmetros de superfície mínimos pré- tratamento. ..................................................................................55 Tabela 6 - Distribuição das amostras no cátodo. ........................ 56 Tabela 7 - Parâmetros fixos de processamento. .......................... 58 Tabela 8 - Combinações de experimentos segundo delineamento por quadrados latinos. ................................................................. 61 Tabela 9 - Descrição das caracterizações para um experimento. 62 Tabela 10 - Parâmetros elétricos obtidos. ................................... 68 Tabela 11 - Profundida média das indentações. ......................... 74 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS NAP – Nitretação assistida por plasma MEV – Microscopia Eletrônica de Varredura EDS – Espectroscopia de energia dispersiva ddp – diferença de potencial DC – Direct Current(Corrente contínua) RC – Razão cíclica CFC – Cúbica de face centrada MO – Microscopia ótica DRX – Difração de raios X MDV – Microdureza Vickers DRXr – Difração de raios X rasante SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................... 27 OBJETIVOS ......................................................................... 29 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO .................................... 30 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ..................................... 31 AÇOS INOXIDÁVEIS AUSTENÍTICOS ............................ 31 FUNDAMENTOS DE DESCARGAS DC ........................... 33 2.2.1 Sistemas De Plasma Pulsados ............................................... 37 NITRETAÇÃO A PLASMA ................................................ 38 PARÂMETROS DE NITRETAÇÃO ................................... 40 NITRETAÇÃO DE AÇOS INOX AUSTENÍTICOS ........... 44 CARACTERISTICAS DA AUSTENITA EXPANDIDA .... 47 3 PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL ............................ 51 MATERIAIS ......................................................................... 52 PREPARAÇÃO DAS AMOSTRAS ..................................... 55 APARATO EXPERIMENTAL ............................................ 56 PARÂMETROS FIXOS ....................................................... 58 PARÂMETROS VARIÁVEIS ............................................. 59 PLANEJAMENTO EXPERIMENTAL ................................ 60 MÉTODOS DE CARACTERIZAÇÃO ................................ 62 3.7.1 Preparação Metalográfica do Corte Transversal ................... 62 3.7.2 Microscopia Ótica ................................................................. 63 3.7.3 Microscopia Eletrônica de Varredura ................................... 63 3.7.4 Difração de Raios X .............................................................. 64 3.7.5 Espectrometria Ótica de Emissão .......................................... 64 3.7.6 Microdureza Vickers ............................................................. 65 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES ...................................... 67 EXECUÇÃO DOS CICLOS................................................. 67 CARACTERIZAÇÃO DA DESCARGA ............................. 69 CARACTERIZAÇÃO MECÂNICA .................................... 72 CARACTERIZAÇÃO MICROESTRUTURAL .................. 75 CARACTERIZAÇÃO ESTRUTURAL ............................... 78 CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA DA SUPERFÍCIE ......... 81 CARACTERIZAÇÃO ESTRUTURAL POR DR-X RASANTE ............................................................................ 86 CARACTERIZAÇÃO MICROESTRUTURAL TRANSVERSAL .................................................................. 89 INDÍCIOS DE PRECIPITAÇÃO ......................................... 91 CORRELAÇÃO DAS CARACTERÍSTICAS ..................... 92 INFLUÊNCIA DOS PARÂMETROS DE TRATAMENTO 96 5 CONCLUSÃO ..................................................................... 99 SUGESTÕES ........................................................................ 99 REFERÊNCIAS ................................................................ 101 27 1 INTRODUÇÃO A nitretação a plasma é uma técnica de tratamento termoquímico de superfície que permitiu avanços metalúrgicos devido às peculiaridades inerentes aos fenômenos que se passam no plasma. Nos tratamentos realizados sob descarga luminescente anormal a aceleração de espécies presentes no gás, causada pelo campo elétrico, implica em reações entre íons-gás, gás-gás, íons-sólido e gás-sólido. Destas colisões surgem os efeitos de ionização, dissociação, recombinação, excitação e relaxação das moléculas gasosas e pulverização, rearranjo, difusão e retrodifusão dos átomos em estado sólido, entre outras (PAVANATI, 2005). Os fenômenos de ionização, dissociação e excitação do gás permitem uma taxa de difusão mais elevada quando comparados com processos de nitretação convencionais (EDENHOFER, 1974; EPRI, 1994), enquanto o processo de pulverização é eficaz para promover a quebra da barreira de óxido formada nas superfícies dos aços inoxidáveis e outros metais que apresentam passivação que, por sua natureza iônica, reduz em grandes ordens a difusão de nitrogênio através da superfície (CHEN; STOCK; MAYR, 1994; DOS REIS; NEIDERT, 2011; SCHEUER; CARDOSO; BRUNATTO, 2015). Estes fenômenos tornam a nitretação a plasma uma forma de processamento eficaz para as ligas inoxidáveis. Dentre as vantagens que a técnica de nitretação a plasma apresenta, destaca-se a redução de temperatura de tratamento utilizadas tendo em vista que a velocidade de formação de camadas é superior em tratamentos a plasma, o processo se torna possível mesmo em temperaturas mais baixas, permitindo controle e diferenciação de microestrutura e até mesmo evitando deformações causadas por gradientes internos gerados em operações anteriores (WOLFART JR, 2002). Os aços inoxidáveis foram desenvolvidos para aplicações onde a resistência à corrosão é propriedade chave e têm como característica a adição de cromo, que em teores diferentes e associado a outros elementos de liga permite o controle da estrutura da matriz (PICKERING, 1976). As ligas austeníticas possuem, dentre os aços inoxidáveis, alta resistência à corrosão, sendo selecionado para os meios corrosivos mais severos. Em contrapartida, não permitem tratamentos térmicos capazes de aumentar de forma satisfatória a resistência mecânica para aplicações que envolvem esforços mecânicos severos (ASM INTERNATIONAL, 1995; PICKERING, 1976). 28 Estes esforços podem ser entendidos, por exemplo, de forma estrutural (em toda a peça) ou superficial, sendo este último ligado a fenômenos tribológicos. Surge disto uma necessidade de uma liga suficientemente resistente à corrosão, ao desgaste, economicamente viável e de fácil fabricação. A nitretação e a cementação convencionais são técnicas aplicáveis, mas sabe-se que o ganho de dureza superficial acontece em detrimento da resistência à corrosão devido à natureza dos nitretos de cromo e ferro, que se formam nas temperaturas convencionais de tratamento (acima de 500 °C) (OZBAYSAL; INAL, 1986; SUNDARARAMAN; KUPPUSAMI; RAGHUNATHAN, 1987). ZHANG e BELL (1985) e ICHII, FUJIMURA e TAKASE (1986), realizando tratamentos termoquímicos em temperaturas mais baixas, observaram a presença de uma camada isenta de precipitados e, nos anos subsequentes, muitos pesquisadores (CZERWIEC; RENEVIER; MICHEL, 2000; FEWELL et al., 2000a; LEI; ZHANG, 1997) conseguiram observar e estudar este tipo de microestrutura, que está diretamente ligada a baixas temperaturas de processamento. Os tratamentos termoquímicos a baixa temperatura se caracterizam pela formação de uma fase expandida por solução sólida intersticial, onde o nitrogênio ou/e carbono ocupam os interstícios em quantidadesvariáveis, indo a saturações além do previsto termodinamicamente (CASTELETTI; NETO; TOTTEN, 2014). O estudo dessa fase foi intensificado pelo potencial de elevar as duas propriedades que eram antes concorrentes nos tratamentos a temperaturas superiores, gerando uma microestrutura capaz de atender aplicações que antes eram desafios no ponto de vista da engenharia de superfície (MITTEMEIJER; SOMERS, 2014). Tendo como foco a nitretação da liga de aço inoxidável austenítico, AISI 316L, tratamentos a baixa temperatura foram realizados no intuito de obter camadas de austenita expandida. Para estes aços observa-se certa divergência sobre a temperatura limite para que ocorra a precipitação de nitretos. A literatura aponta uma temperatura a partir de 450°C para que a reação de precipitação e o coalescimento de nitretos ocorra para tempos usuais de tratamento (CHRISTIANSEN; SOMERS, 2006a), outros autores apontam que para o intervalo entre 400°C e 450°C ocorra a precipitação de forma reduzida (BORGIOLI; GALVANETTO; BACCI, 2016; LARISCH, 1999). Muitos tipos de técnicas de nitretação já foram aplicadas para ligas inoxidáveis (MOSKALIOVIENE et al., 2011; PRANEVICIUS et al., 2001; ZHU; LEI, 2000), assim como para nitretação em descarga luminescente estudos têm explorado a influência da temperatura, tempo e mistura gasosa nas propriedades da fase expandida (BORGIOLI et al., 29 2005; FOSSATI et al., 2006; LEPIENSKI et al., 2008). Técnicas de microscopia, de análise química semiquantitativa e de profundidade também são extensamente utilizadas para precisar a espessura e perfil químico de nitrogênio nas camadas expandidas (LUO; YANG, 2015). A despeito disto, as características químicas obtidas através dos diferentes processos e caracterizações não foram correlacionadas com as propriedades químicas e mecânicas dos aços austeníticos. Sendo assim, este trabalho almeja produzir através da variação de parâmetros de processo da nitretação a baixa temperatura, camadas de austenita expandida com diferentes características. Tendo como foco principal a composição química na superfície, estrutura e espessura da camada rica em nitrogênio. As técnicas de caracterização de difração de raios X, microscopia eletrônica de varredura e análise química semiquantitativa foram utilizadas de forma a tornar possível a correlação das características da camada expandida. Através da revisão da literatura optou-se pela variação de parâmetros de controle de processo que alterassem a disponibilidade de nitrogênio na superfície sem modificar outras grandezas importantes para a difusão como a temperatura do substrato e o tempo de tratamento. Sendo assim foram escolhidos os parâmetros de tensão aplicada, tempo de pulso ligado e pressão. OBJETIVOS Do ponto de vista de engenharia de superfície, as características físico-químicas de uma camada têm suma importância nas aplicações tribológicas e químicas. Neste trabalho, busca-se analisar as características físicas das camadas de modo a melhor correlacioná-las com as propriedades requeridas para uso. Sabendo que a austenita expandida não é uma fase estequiométrica, e que o nitrogênio se comporta como um elemento de liga em solução sólida, torna-se possível obter camadas com diferentes combinações de espessura e concentração de nitrogênio. Tais características diferentes das camadas expandidas podem possuir combinações que sejam mais ou menos sinérgicas para dada função de engenharia, porém o conhecimento destes efeitos depende primeiramente do domínio dos parâmetros de processamento ideais para arquitetar a camada. 30 O objetivo principal do trabalho é produzir camadas nitretadas de austenita expandida com diferentes características químicas e estruturais. Sendo assim, torna-se subjacente ao objetivo principal o aprofundamento nas técnicas de caracterização para uma descrição correta das características da camada. Também se objetivo deste trabalho procurar correlações entre os parâmetros de processamento variados e as características metalúrgicas obtidas. ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO A partir deste breve capítulo introdutório serão apresentados na sequência os conceitos que fundamentam a pesquisa. No capítulo 2, introduz-se fundamentos metalúrgicos de aços inoxidáveis, aspectos físicos e químicos de plasmas, aspectos de processamento por plasma, em particular a nitretação, e informações voltadas para a nitretação em aços inoxidáveis austeníticos, buscando fornecer ao leitor subsídios para o entendimento do trabalho. No terceiro capítulo, detalhes sobre a parte experimental serão expostos, indo do material utilizado à seleção de parâmetros de processamento. Também neste capítulo as definições das técnicas de caracterização utilizadas e as condições de ensaio podem ser consultadas. Na sequência os resultados obtidos serão apresentados técnica a técnica e devidamente discutidos e relacionados. No quinto e último capítulo são apresentadas as conclusões e proposições de trabalhos futuros. 31 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Este capítulo tem por fim apresentar brevemente as características dos aços inoxidáveis, da austenita expandida, conceitos de nitretação a plasma e estudos realizados sobre os parâmetros de processamento. Tais conceitos serão utilizados para fundamentação e interpretação dos resultados obtidos. AÇOS INOXIDÁVEIS AUSTENÍTICOS Os aços inoxidáveis são ligas à base de ferro que possuem teor de cromo mínimo de 11% em peso em solução sólida. Devido à alta reatividade do cromo com o oxigênio, esses aços apresentam uma fina camada de óxido de cromo em suas superfícies, tornando-os menos suscetíveis à corrosão. Este fenômeno é conhecido como passivação (CASTELETTI; NETO; TOTTEN, 2014; M.MCGUIRE, 2008). Devido a este fenômeno, esta classe de aços é utilizada para diversas aplicações que exijam resistência à corrosão e estabilidade química. Os aços inoxidáveis são, tipicamente, classificados de acordo com suas fases, sendo : ferríta, austenita, martensita e duplex. Existe ainda uma quinta família para as ligas endurecíveis por precipitação (PICKERING, 1976; SMITH, 1993). Alguns exemplos de ligas são apresentados na Tabela 1. Uma ferramenta bastante útil para prever o tipo de matriz para os aços inoxidáveis é o diagrama de Schaeffler que relaciona o cromo equivalente e o níquel equivalente, considerando estes dois elementos como os principais elementos na constituição de aços inoxidáveis, sendo o cromo principal responsável pelo fenômeno de passivação e o níquel principal elemento estabilizador de austenita. Os valores de Cromo e Níquel equivalente são dados pelas equações (DACAPO STAINLESS, 2017): 𝐶𝑟𝑒𝑞 = (𝐶𝑟) + 2(𝑆𝑖) + 1.5(𝑀𝑜) + 5(𝑉) + 5.5(𝐴𝑙) + 1.75(𝑁𝑏) + 1.5(𝑇𝑖) + 0.75(𝑊) (1) 𝑁𝑖𝑒𝑞 = (𝑁𝑖) + (𝐶𝑜) + 0.5(𝑀𝑛) + 0.3(𝐶𝑢) + 25(𝑁) + 30(𝐶) (2) 32 Tabela 1 - Composição das principais ligas de aços inoxidáveis, por família. AISI C Mn Si Cr Ni outros Austeníticos 304 0,08 2 1 18,0- 20,0 8,0- 10,5 316 0,08 2 1 16,0- 18,0 10,0 - 14,0 2,0-3,0 Mo Ferríticos 409 0,08 1 1 10,5- 11,7 0,5 6x %C-0,75 máx Ti 430 0,12 1 1 16,0- 18,0 Martensíticos 420 0,15 min 1 1 12,0 -14,0 440C 0,95- 1,2 1 1 16,0- 18,0 0,75 Mo Duplex UNS S30205 0,03 máx 2 máx 1 22,0- 23,0 4,5- 6,5 3,0-3,5 Mo 0,14-0,2 NUNS S32304 0,03 máx 2,5 máx 1 21,5- 24,5 3,0- 3,5 0,05-0,6 Mo 0,05-2,0 N End. Por precipitação 17-4 PH 0,07 1 1 15,5- 17,5 3,0- 5,0 3,0-5,0 Cu 0 0,15-0,45 Nb 13-8 PH 0,05 0,2 0,1 12,2- 13,2 7,5- 8,5 2,0-2,5 Mo 0,9-1,3 Al Fonte: CASTELETTI; NETO; TOTTEN (2014) Neste trabalho trataremos apenas dos aços inoxidáveis austeníticos. Tais aços apresentam estrutura cúbica de face centrada devido a adição de elementos de liga gamagênicos como níquel, manganês e nitrogênio. A série 300 destes aços contém alto teor de níquel (na faixa de 8% a 35%), até 7% de manganês e adições de molibdênio, cobre, silício, alumínio, titânio e nióbio que influenciam na resistência à corrosão (ASM INTERNATIONAL, 1995). Possuem alta ductilidade e podem ser submetidos a deformações de até 50%. O sufixo L é utilizado para identificar ligas com teores de carbono reduzido, ideais para aplicações que envolvam soldas. A quase ausência de carbono reduz a formação de zonas afetadas pelo calor com precipitação de carbonetos intergranulares, que tem efeitos negativos na resistência mecânica local e também na resistência química (LIPPOLD; KOTECKI, 2005; PARANZINI, 2005). O cobre e o manganês desempenham juntamente com o níquel o papel de estabilizantes da fase gama, sendo o manganês o principal elemento para evitar transformações martensíticas a baixa temperatura. Estes aços são aplicados extensamente nas indústrias químicas, alimentícias, médicas e nucleares. 33 FUNDAMENTOS DE DESCARGAS DC O termo plasma define um gás totalmente ou parcialmente ionizado. Existem numerosas configurações para a criação de um plasma, comumente, para tratamentos termoquímicos as descargas são geradas por radiofrequência, micro-ondas ou através de aplicação de uma diferença de potencial (d.d.p.) entre eletrodos. No último caso, uma tensão aplicada entre um cátodo e um ânodo, contidos dentro de uma câmara à baixa pressão, pode ser suficiente para fornecer uma corrente de elétrons capaz de ionizar as moléculas gasosas que separam os eletrodos causando um efeito cascata de produção de cargas (GUO, 2010). O nível de ionização do gás é uma importante característica nos plasmas. Quando a população de elétrons, íons e espécies neutras são semelhantes o plasma é chamado de quente. 𝑇𝑖𝑜𝑛 ≈ 𝑇𝑒 ≈ 𝑇𝑔 (3) Contudo, é possível a obtenção de plasmas com quantidades baixas de íons e elétrons quando comparadas ao total de partículas moleculares. Estes são chamados de plasmas frios por possuírem uma temperatura macroscópica baixa devido à grande população de espécies neutras. 𝑇𝑖𝑜𝑛 > 𝑇𝑒 ≫ 𝑇𝑔 (4) A geração de um plasma com corrente direta (DC) consiste na aplicação de uma diferença de potencial entre um diodo composto de no mínimo um cátodo e um ânodo. A correlação entre pressão, tensão aplicada, distância entre os diodos e tipo de gás determina se a reação de produção de íons será suficiente para gerar plasma, ou seja, gerar uma corrente de elétrons e íons entre eletrodos através de mecanismos colisionais. Na Figura 1, pode-se observar estas curvas de ignição, também chamadas de curvas de Paschen. 34 Figura 1 - Curvas de Paschen para diferentes gases. Fonte: Plasma Chemistry (FRIDMAN, 2008) Para os tratamentos de nitretação é utilizado o regime de descarga luminescente anormal, pois este tipo de descarga cobre a área do cátodo totalmente, permitindo o aquecimento e potencial químico homogêneo e, por consequência, um tratamento uniforme. Tais descargas têm uma arquitetura definida, que de forma simplificada, se pode distinguir de acordo com as zonas de luminosidade diferenciadas, apresentadas na Figura 2. A queda de potencial se concentra, essencialmente, ao longo da bainha catódica o que implica em uma grande aceleração dos íons e elétrons nesta região. Ao fim da bainha catódica, os elétrons primários que foram acelerados em direção ao ânodo entram em colisão com as moléculas e/ou átomos gasosos. Estas colisões causam transferências de energia entre partículas, podendo ser observadas diferentes tipos de transferências. De maneira resumida, são elas (MARCHAND, 1988): • Transferências de quantidade de movimento, que são negligenciáveis devido à pequena massa dos elétrons; • Transferência de energia cinética em energia potencial que causam a ionização, dissociação e excitação das moléculas. Estas excitações podem ser de caráter vibracional, rotacional ou eletrônicas. 35 Figura 2 - (a) Aspecto do plasma durante uma descarga luminescente anormal, (b) características eletromagnéticas do plasma. Fonte: Principles of Plasma Discharges and Materials Processing, LIEBERMAN e LICHTENBERG (2005) adaptado por PAVANATI (2005). As espécies ionizadas por sua vez são aceleradas em direção ao cátodo podendo causar a implantação iônica, a emissão de elétrons secundários, pulverização, transferência de energia cinética com átomos/moléculas e diversos outros tipos de transferência de energia entre gás-sólido. Estes fenômenos são esquematizados na Figura 3. 36 Figura 3 -Simplificação das interações entre cátodo e gás. Fonte: BERNARDELLI (2011) O bombardeamento do cátodo pelas espécies rápidas do gás (íons e neutros rápidos) provoca uma série de reações na superfície da peça. A emissão de elétrons secundários é uma das mais importantes consequências deste bombardeamento. Outra reação importante é a ejeção de átomos da superfície do cátodo conhecido como pulverização catódica ou sputtering. O processo colisional de íons ou espécies neutras rápidas com os átomos do cátodo pode ser tratado como uma série de colisões binárias. A espécie energética, ao se chocar com o cátodo, transfere momento aos átomos da superfície. O átomo que recebeu a colisão primária transfere momento aos vizinhos e estes, por sua vez, aos átomos mais próximos, sendo este fenômeno conhecido como cascata colisional (CHAPMAN, 1980). Nesta sequência de colisões um átomo pode ser ejetado (pulverização catódica) ou a energia pode ser transferida gradualmente para o interior sendo então dissipada, produzindo o aquecimento do cátodo. Outras reações, não menos importantes, podem ocorrer devido ao bombardeamento de espécies energéticas. Dentre várias pode-se citar a implantação da espécie no interior do material e o rearranjo estrutural, que podem causar o aumento da densidade de defeitos cristalinos e alterações na estequiometria do material. 37 2.2.1 Sistemas De Plasma Pulsados As fontes de tensão pulsada constituem uma chave na tecnologia de nitretação por descarga DC por oferecerem as seguintes vantagens (GALERIE, 2002; GUIBERTEAU et al., 1997): • Melhoria na estabilidade da descarga, evitando a passagem acidental ao regime de arco, que causa sobreaquecimento localizado, podendo danificar o cátodo; • Permite alterar a temperatura do tratamento com o ajuste da razão cíclica sem modificar as características gerais do fluído ionizado; • Permite uma melhor penetração das descargas em peças com geometria complexa. Estes geradores são capazes de fornecer correntes cuja frequência varia entre 50 e 30000 Hz e razões cíclicas de 0,1 a 0,95. A razão cíclica (RC) é definida pela fração de tempo ligado em relação ao tempo total deum pulso: 𝑅𝐶 = 𝑡𝑙𝑖𝑔𝑎𝑑𝑜 𝑡𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 ⁄ (5) 38 NITRETAÇÃO A PLASMA Tratamentos termoquímicos a plasma podem ser realizados utilizando atmosferas ricas no elemento a ser difundido. Para a nitretação a plasma atmosferas contendo em N2 são usualmente utilizadas. A nitretação a plasma apresenta uma série de vantagens em relação aos processos realizados a gás e em banho de sal (BELL; SUN; SUHADI, 2000; EDENHOFER, 1974). Menores tempos de tratamento, maior controle de processo e menor impacto ambiental tornam a tecnologia atraente para o endurecimento superficial de inúmeros tipos de ligas. Os parâmetros de nitretação em plasma pulsado são inúmeros e, devido à natureza do plasma e dos diferentes aparatos experimentais, complexos de serem avaliados. Por ser um processo predominantemente difusivo os estudos realizados avaliam principalmente: • mistura gasosa (DE LAS HERAS et al., 2017; LEPIENSKI et al., 2008; SKONIESKI, 2008); • tempo de tratamento (FOSSATI et al., 2006; MOSKALIOVIENE et al., 2011; WANG; JI; SUN, 2006); • temperatura de tratamento (BORGIOLI et al., 2005; BÔRTOLI; VITOI; FRANCO JR, 2012; MANOVA et al., 2013). Estes três parâmetros alteram diretamente propriedades do transporte de massa em sólidos que são descritas pelas equações de Fick. A diferença de potencial químico imposta por misturas gasosas ricas em nitrogênio serve como como força motriz, como mostra a primeira lei: 𝑗𝑁 = −𝐷𝑁. 𝑑𝐶𝑁 𝑑𝑥⁄ (6) Onde jN (átomos/cm².s) é o fluxo de massa de nitrogênio, CN (átomos/cm³) é a concentração de nitrogênio e DN (cm²/s) a difusividade intrínseca do nitrogênio, dependente da temperatura segundo a seguinte equação de Arrhenius: 𝐷𝑁 = 𝐷𝑁0. 𝑒 −𝑄 𝑅𝑇 (7) Onde DN0 é o coeficiente de difusão do nitrogênio quando a temperatura tende ao infinito, que para uma matriz de ferro austenítico 39 tem o valor de 0,0034 (cm²/s), Q é a energia de ativação que é de 34600 (cal/mol), R é a constante de gases e T é a temperatura em Kelvin. Para regime transiente, a segunda lei de Fick em sua forma diferencial (Equação 8), descreve a concentração de nitrogênio em função do tempo e da distância de uma superfície inicial com concentração constante. 𝜕𝐶𝑁 𝜕𝑡 = 𝜕 𝜕𝑥 (𝐷 𝜕𝐶𝑁 𝜕𝑥 ) (8) A solução para a Equação 8, proposta por Grube (Equação 9), considera que o coeficiente de difusão não depende da posição ou da concentração e que a concentração é constante na superfície, utiliza uma função de erro que possui valores tabelados (REED-HILL, 1982). 𝐶𝑠−𝐶𝑥 𝐶𝑠−𝐶0 = 𝑒𝑟𝑓 ( 𝑥 2√𝐷𝑡 ) (9) Na sequência, veremos que a solução fornecida na Equação 9 não é a melhor solução para o tipo de perfil de difusão obtido, mas é o suficiente para ilustrar os conceitos a seguir. Além dos aspectos de transporte de massa em sólidos, outros parâmetros podem alterar o comportamento do plasma e por consequência do transporte de massa de nitrogênio. Sendo assim a pressão, tensão aplicada e as características do pulso elétrico também podem ser utilizadas para o controle do processamento. De uma forma ampla, a disposição desses parâmetros influencia na: • Distribuição de espécies ionizadas presente no plasma; • Densidade de íons do plasma; • Arquitetura da descarga luminescente; • Temperatura do cátodo; • Taxa de pulverização catódica; • Energia das espécies rápidas. 40 PARÂMETROS DE NITRETAÇÃO Como mostrado na seção anterior outros parâmetros de processo têm influência na característica do plasma e, por consequência disso, nas características da camada formada. Neste trabalho os parâmetros variados foram: • Pressão; • Tensão aplicada; • Razão cíclica. Para compreensão da influência destes parâmetros, alguns modelos e conceitos serão apresentados. Inicialmente é necessário o conceito de livre caminho médio. Para um gás que se encontra numa câmara em vácuo existe uma diminuição do encontro entre as moléculas do gás devido a menor quantidade de moléculas presentes no volume, quando comparado a um gás a pressão atmosférica,. O livre caminho médio torna-se uma propriedade do gás importante para técnicas que aconteçam em vácuo, pois o comportamento de um gás rarefeito pode ser viscoso ou molecular. Ou seja, quando mais rarefeito menos as moléculas passam a interagir entre si, até um momento que a interação moléculas-paredes passa a ser principal (BINDER, 2017). 𝜆 = 𝑇 𝜉2𝑃 2,33. 10−20 (10) A expressão 10 correlaciona o livre caminho médio, (cm), com temperatura, T (K), pressão, P (torr), e diâmetro da partícula, (cm). Na Equação 10 temos que a pressão é inversamente proporcional ao livre caminho médio das espécies presentes. Para a faixa de pressão usualmente utilizada em tratamentos termoquímicos obtém-se livres caminhos médios que vão de frações a dezenas de micrômetros, portanto, ainda sob regime viscoso. A pressão utilizada também tem relação direta com a espessura da bainha catódica, região onde ocorrerão grande parte das reações com grande impacto no tratamento (CARDOSO, 2003). As Equações 11 e 12 relacionam a pressão com a espessura da bainha catódica para nitrogênio e hidrogênio (LIEBERMAN; LICHTENBERG, 2005) . 𝑃. 𝑑 = 0,42 𝑡𝑜𝑟𝑟. 𝑐𝑚 (𝑁2) (11) 𝑃. 𝑑 = 0,9 𝑡𝑜𝑟𝑟. 𝑐𝑚 (𝐻2) (12) 41 Para as misturas gasosas e pressões utilizada nos tratamentos a plasma a bainha catódica apresenta espessura, d, na faixa de 0,1cm à 3cm. Já a tensão aplicada sob o cátodo tem como principal efeito o aumento da densidade de íons, pois implica em uma maior emissão de elétrons, que por consequência aumentam o número de colisões que geram íons ao fim da bainha catódica. Além disto BUDTZ-JØRGENSEN (2001) demonstra que para o aumento da tensão aplicada há diminuição da bainha catódica de forma a manter as propriedades de equilíbrio do plasma (CHAPMAN, 1980). Para uma mesma pressão, mistura gasosa e razão cíclica, RIE, MENTHE e WÖHLE (1998) demonstraram, a partir de espectroscopia ótica, que a intensidade dos principais íons formados durante um tratamento de cementação evolui de forma aproximadamente exponencial de acordo com o aumento da tensão aplicada entre os eletrodos (Figura 4). Isto nos permite assumir que a variação da tensão tem influência direta com a taxa de ionização do plasma. Figura 4 - Influência da variação de tensão aplicada nas espécies ativas de um tratamento de cementação Fonte: RIE; MENTHE; WÖHLE (1998) A espessura da bainha catódica, o livre caminho médio e a tensão aplicada podem ser correlacionados como na Equação 13, onde C é uma constante e a Ei é a energia do íon ao fim da bainha catódica (PAVANATI, 2005). 42 𝐸𝑖 = 𝐶. 𝑉. 𝑑 (13) Esta equação, de forma simplificada, permite a compreensão do quão relacionadoestão os parâmetros de pressão e tensão aplicada. Sabendo que o livre caminho médio para as faixas de pressão e tensão aplicadas é da ordem de 10-3 a 10-4 o tamanho da bainha catódica, temos que os íons sofrerão colisões durante a bainha catódica, alterando a sua energia cinética nas colisões. Nessas colisões entre íons e átomos neutros podem ocorrer a troca de carga ou a troca de energia cinética, o que gera os chamados neutros rápidos (Equação 14). Muitos autores se dedicaram ao estudo das espécies geradas no plasma, incluindo a influência delas em tratamentos termoquímicos (QUANDT, 2002). 𝐴𝑟 + + 𝐴𝑙 → 𝐴𝑟 + 𝐴𝑙 + (14) Para as descargas que funcionam em regime pulsado a frequência e a fração de tempo em que a descarga fica ligada/desligada (ou razão cíclica) inserem outras variáveis no processo de nitretação. A razão cíclica tem influência no tempo onde há disponibilidade de partículas ionizadas, ao mesmo passo que impede arcos e mantêm a temperatura. Sabe-se que variando a razão cíclica pode-se diminuir drasticamente a cinética de nitretação devido a tempos altos de pulso desligado, implicando em um tempo real de nitretação reduzido e em uma menor intensidade de partículas ionizadas e excitadas. RIE, MENTHE e WÖHLE (1998) mostraram que para tempos de pulso desligado fixos, Figura 5, o aumento do tempo ligado, alterando assim a frequência do pulso, tem impacto linear na formação de espécies devido ao aumento do tempo real de tratamento. Enquanto o aumento do tempo desligado faz com que as espécies percam intensidade (Figura 6). Os resultados da Figura 6 corroboraram com estudos em pós- descarga, em que as espécies têm decaimento aproximadamente exponencial com o aumento do tempo de plasma desligado (ALVES JR; RODRIGUES; MARTINELLI, 1999). Segundo estudos anteriores as espécies excitadas possuem tempo de vida de alguns milisegundos enquanto que as espécies ionizadas têm impacto superior na sua intensidade, decaindo para cerca de 10% da intensidade inicial após 100 microsegundos (ALVES JR; RODRIGUES; MARTINELLI, 1999; PETITJEAN; RICARD, 1984). 43 Figura 5 - Influência do tempo de pulso ligado na intensidade de emissão ótica das espécies formadas. Fonte: RIE; MENTHE; WÖHLE (1998) Figura 6 - Influência do tempo de pulso desligado na intensidade de emissão ótica das espécies formadas. Fonte: RIE; MENTHE; WÖHLE (1998) 44 NITRETAÇÃO DE AÇOS INOX AUSTENÍTICOS Assim como as ligas de aços tradicionais, os aços inoxidáveis quando tratados a temperaturas convencionais, acima de 500 °C, apresentam arquitetura da camada similar às dos aços ao carbono. Onde temos a formação de uma camada de compostos cerâmicos, também chamada de camada branca, na parte mais externa, seguida de uma região de difusão onde o nitrogênio se encontra na forma de precipitados em uma matriz com seus interstícios saturados em nitrogênio. Trabalhos como de OZBAYSAL e INAL (1986) e dos REIS, MALISKA e BORGES (2008) realizados sobre aços inoxidáveis mostram a semelhança da arquitetura das camadas de aço inoxidável nitretadas com as dos aços comuns (Figura 7 e Figura 8). Destaca-se aqui que, devido à alta quantidade de cromo nas ligas e a maior afinidade do nitrogênio com o cromo quando comparado ao ferro, aconteça uma forte precipitação de nitretos de cromo, além da precipitação dos nitretos de ferro já bastante explorados na literatura, ’ e . Figura 7 - Microestrutura típica de ligas de aço nitretadas. Fonte: Adaptado de LAMIM (2016) 45 Figura 8 - Microestrutura típica de ligas de aço inoxidável nitretadas em temperaturas convencionais. Fonte: Adaptado de MONTEIRO et al. (2017). Os tratamentos realizados a estas temperaturas têm como objetivo, assim como a maioria dos tratamentos termoquímicos, melhorar as propriedades tribológicas dos aços inoxidáveis, principalmente dos inoxidáveis austeníticos, que devido à alta ductilidade possuem desgaste adesivo acentuado (LIANG et al., 2000). Porém a formação de nitretos de cromo seguida da depleção da matriz em cromo tem efeito negativo na resistência à corrosão, apresentando mecanismo semelhante a sensitização, onde a resistência química das regiões com teor de cromo abaixo de 10,5 wt% é drasticamente diminuída (BORGIOLI et al., 2005; CARDOSO; MAFRA; BRUNATTO, 2016). Como solução alternativa aos tratamentos a alta temperatura foram desenvolvidos os tratamentos a baixa temperatura, apresentados primeiramente por ZHANG e BELL (1985). Utilizando temperaturas inferiores a 450 °C, estes pesquisadores conseguiram gerar camadas endurecidas isentas de nitretos e com alto teor de nitrogênio dissolvido intersticialmente chamadas de austenita expandida (Figura 9). Após isto, inúmeros pesquisadores se dedicaram ao entendimento do mecanismo e do processamento a baixas temperaturas. É unanime que o principal fator inibidor da precipitação de nitretos é a temperatura, pois para acontecer a supersaturação em nitrogênio é necessário permitir ao nitrogênio difusividade intersticial suficiente para penetrar na superfície ao mesmo tempo que a difusividade dos átomos da rede cristalina, CrN / Nitretos de Ferro (N) Intersticial Precipitados de nitretos 46 principalmente o cromo, seja suficientemente baixa para evitar a nucleação de precipitados. Figura 9 - Microestrutura típica de aços inoxidáveis austeníticos nitretados a baixa temperatura. Fonte: Adaptado de FERNANDES et al. (2016). Apesar de inúmeros trabalhos a temperatura ótima para que se coíba a precipitação de nitretos varia de acordo com características do processo, mas sabe-se estar contida na faixa de 400 °C à 450 °C. Atualmente os tratamentos termoquímicos focados na obtenção de fases expandidas podem ser encontrados industrialmente, sendo o mais comum a nitretação a plasma. Na Tabela 2 são apresentadas algumas alternativas industriais registradas até 2010 para obtenção de fases expandidas (DONG, 2010). Tabela 2 - Processos industriais para obtenção de austenita expandida. Nome comercial Processo Propriedade de Kolsterising carbonetação Bodycote,EUA Nivox carbonetação a plasma Nitruvid,França Expanite nitretação/carbonetação a gás Expanite A/S, Dinamarca NV-Pionite carbonetação a gás Air Water ltd, Japão Swagelok carbonetação a gás Swagelok,EUA Palsonite nitretação a banho de sais Nibin Parkerising, Japão Solnit nitretação a gás em alta temperatura Ipsen, Alemanha Fonte: Adaptado de DONG (2010). 47 CARACTERISTICAS DA AUSTENITA EXPANDIDA A fase formada através de tratamento a baixa temperatura é conhecida como austenita expandida, também relatada como fase S, fase m ou apenas γn (BUHAGIAR, 2010). Os primeiros estudos foram realizados por ZHANG e BELL (1985) e ICHII et al. (1986), demonstrando que a austenita supersaturada em nitrogênio era capaz de manter as propriedades de resistência à corrosão originais dos aços inoxidáveis aliadas a respostas tribológicas superiores. A fase, considerada metaestável, pode ser obtida através de diferentes técnicas de nitretação e carbonetação (CASTELETTI; NETO; TOTTEN, 2014), e tem como principal característica a grande quantidade de solutos intersticiais acompanhada pela expansão da célula unitária. Essa expansão da célula unitária, que pode ser calculada através da Equação 15, pode ser observada claramente através de difração de raios X, observa-seos picos originais deslocados para ângulos menores (Figura 10). %𝑒𝑥𝑝 = ( 𝑎𝑡−𝑎0 𝑎0 ) 𝑥 100 (15) Figura 10 - Difratograma característico da austenita expandida. Fonte: Adaptado de BELL (2002). A expansão calculada na Equação 15, através do parâmetro de rede inicial, a0 e após tratamento, at pode atingir valores superiores à 10%, em volume da célula unitária, isso é equivalente a cerca de 30% do volume inicial. Devido a esta grande variação de volume as camadas de austenita 48 apresentam grandes níveis de tensão residual compressiva e deformação (CHRISTIANSEN; HUMMELSHØJ; SOMERS, 2010). Isto implica em alterações na estrutura cristalográficas difíceis de ser interpretadas. Diferentes tipos de célula unitária já foram propostos principalmente devido à expansão mais elevada para a família de planos {200}(LO; SHEK; LAI, 2009). FEWELL et al., (2000b)simulou diferentes estruturas cristalográficas e as comparou com certos experimentos, obtendo um melhor ajuste para uma estrutura triclínica de face centrada, com uma distorção dos ângulos da célula. MARCHEV et al., (1999) sugere uma estrutura tetragonal de corpo centrado enquanto BACCI et al. (2001) e MENTHE e RIE (1999), sugerem que uma estrutura em paraequilibrio tetragonal de face centrada se formaria. Estudos mais recentes apontam para uma estrutura CFC anisotrópica, causada pelo alto número de falhas de empilhamento e tensões residuais preferenciais na direção [200] (BRINK et al., 2017; CHRISTIANSEN; SOMERS, 2004; XU et al., 2003). Os átomos de nitrogênio possuem raio atômico de aproximadamente 0,056 nm, sendo levemente maiores que os sítios intersticiais octaédricos da austenita que são de 0,053 nm (LUO; YANG, 2015). A semelhança de tamanhos e o fato de que os sítios tetraédricos possuírem cerca de metade do raio dos octaédricos leva os pesquisadores a assumirem que o nitrogênio difunda prioritariamente através dos interstícios octaédricos (ABRASONIS et al., 2005; CHRISTIANSEN; SOMERS, 2006b). Teores de nitrogênio intersticial entre 15 at% e 40 at% são observados em maior frequência. Considerando que uma célula unitária CFC possui 4 átomos na rede e 4 sítios octaédricos, para uma saturação de 50 at% teríamos todos os sítios octaédricos ocupados. CZERWIEC; RENEVIER; MICHEL (2000) e PICARD et al., (2001) apontam para uma relação linear entre a quantidade de nitrogênio na austenita e a expansão do parâmetro de rede, considerando que a estrutura continue CFC. 𝑎𝑁 = 𝑎0 + 𝛼𝐶𝑁 (16) Onde aN é o parâmetro de rede da austenita expandida, a0 o parâmetro de rede sem tratamento, CN a concentração de nitrogênio e a constante de Vegard que equivale a 0,0078Å para N at%. Atualmente, dois modelos complementares descrevem a forma com que o nitrogênio difunde na austenita e atinge valores fora do 49 equilíbrio. O primeiro é o modelo de difusão apresentado anteriormente onde a Equação 8 tem como solução o modelo proposto por Boltzmann- Matano que considera que D é dependente da concentração local (MÄNDL; RAUSCHENBACH, 2002), e o segundo é o modelo apresentado por PARASCANDOLA et al. (2000) de trapping- detrapping. O modelo de trapping-detrapping assume que o nitrogênio, inicialmente, difunda para posições intersticiais específicas de forma a interagir eletronicamente com átomos de cromo. Esta interação entre nitrogênio-cromo leva à supersaturação da matriz em nitrogênio, de forma que localmente os átomos de cromo e nitrogênio se encontrem em pares fazendo com que a liga atinja valores entre 17 at% e 20 at%. Junto desta supersaturação o processo difusivo é facilitado pela deformação da estrutura cristalina, ou seja, a deformação causada pelo nitrogênio já difundido aumenta a velocidade de difusão do nitrogênio até cerca de 40% (Figura 11). Após isto o coeficiente de difusão local diminui devido a menor probabilidade de encontrar um sítio intersticial vago. Figura 11 - Dependência do coeficiente de difusão do nitrogênio com a concentração. Fonte: CHRISTIANSEN et al. (2008). 50 Figura 12 - Comparação entre o modelo de Boltzmann-Matano com o modelo que considera o fenômeno trapping-detrapping. Fonte: CHRISTIANSEN et al. (2008). A utilização dos dois modelos juntos permite uma boa aproximação dos perfis de composição encontrados para a nitretação à baixa temperatura. Entretanto, outras variáveis como a rotação dos grãos, influência da tensão e de defeitos tornam complexo o modelamento da formação das camadas de austenita expandida. Sendo assim, um maior aprofundamento nos mecanismos pode ser encontrado na literatura (CHRISTIANSEN; SOMERS, 2008; MÖLLER et al., 2001; MOSKALIOVIENE; GALDIKAS, 2012; TEMPLIER et al., 2010). 51 3 PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL Este estudo pretende, através da variação de parâmetros de nitretação, produzir diferentes camadas de austenita expandida em um aço 316L. As amostras serão processadas e caracterizadas seguindo as etapas mostradas na Figura 13. Os parâmetros de processamento variados neste estudo foram: tensão aplicada, razão cíclica e pressão. As variáveis de resposta avaliadas através das caracterizações serão: parâmetro de rede, espessura de camada e teor máximo de nitrogênio na superfície. Figura 13 - Síntese do Procedimento Experimental. Fonte:Autor. 52 MATERIAIS As amostras utilizadas no estudo serão de AISI 316L que, segundo a norma ASTM A276, possuem composição mostrada na Tabela 3. As composições obtidas pelas técnicas de espectroscopia ótica de descarga luminescente (GDOES) e espectroscopia de energia dispersiva (EDS) são fornecidas na mesma tabela. Tabela 3 - Composição química em at%. C Si Mn P S Norma ASTM Máx. 0,03 Máx. 1,0 Máx. 2,00 Máx. 0,045 Máx. 0,030 EDS -- -- 1,5±0,6 -- -- GDOES 0,04±0,01 0,4±0,1 1,3±0,1 0,03±0,01 0,03±0,01 Cr Ni Mo Fe Norma ASTM 16,0 - 18,0 10,0 - 14,0 2,0 - 3,0 bal EDS 16,9±1 11,5±2 2,7±0,5 69±2 GDOES 15±1,5 9,7±0,5 1,7±0,7 71±1,5 Fonte: Autor e ASTM INTERNATIONAL (2017). Tabela 4 - Outros elementos encontrados na análise por GDOES (at%). W Co Cu V GDOES 0,141 0,117 0,137 0,063 Fonte: Autor. Esta liga de aço inoxidável austenítico foi escolhida pois é largamente utilizada industrialmente, sendo de fácil obtenção. Por tal motivo, muitos dos estudos de grande impacto utilizaram a mesma liga (CZERWIEC; RENEVIER; MICHEL, 2000; FEWELL et al., 2000a; MOSKALIOVIENE et al., 2011). Segundo TSUJIKAWA et al., (2007) a presença de molibdênio catalisa o processo de carbonetação à 400°C, tornando mais interessante a escolha da composição quando comparada aos aços 304, assim como o 53 baixo teor de carbono permite observar o efeito do nitrogênio e evitar a formação de camadas duplas, devido ao acúmulo de carbono composicional empurrado pelo nitrogênio difundido (CZERWIEC et al., 2006). Na Figura 14 pode-se observar o difratograma de raios X da amostra, onde são indicados os picos referentes aos planos. O parâmetro de rede calculado é de 3,591±0,005. Figura 14 - Difratograma do aço AISI 316L. Fonte: Autor. A Figura 15, por sua vez, mostra a micrografia do aço em sua seção transversal e longitudinal, indicando que o material passou por processamento mecânico, o que é evidenciado nas bandas de deformação na seçãolongitudinal. Medidas de microdureza Vickers fornecem valores de 220±30 HV, valor de dureza ligeiramente superior aos reportados em fichas técnicas, provavelmente resultado de deformação a frio e do tamanho de grão reduzido. Além disso a grande quantidade de defeitos, induzidos pelo processo de conformação e grãos reduzidos tem efeito positivo na cinética de nitretação a baixas temperaturas (BOTTOLI, 2015; MANOVA et al., 2007). 54 Figura 15 - Micrografias do aço AISI 316L utilizado, seção (a) transversal - 1000x e (b) longitudinal-500x. Reagente: ácido clorídrico saturado em ácido pícrico. Fonte: Autor. (a) (b) 55 PREPARAÇÃO DAS AMOSTRAS A partir de barras de perfil circular foram confeccionadas amostras de 4 mm±1,2 mm de altura e diâmetro de 15,8 mm utilizando-se uma cortadeira do tipo cut-off. Posteriormente as amostras foram preparadas segundo o seguinte procedimento manual, de forma a garantir rugosidade almejada e evitar formação de martensita por deformação: • Lixamento nas lixas: 120#, 220#, 320#, 400#, 600# e 1200#; • Pré-polimento com diamante monocristalino em 6μm, 3μm com pano tecido de poliéster; • Polimento com diamante monocristalino em 1μm em pano sintético de pelo curto. As amostras passaram por ciclos de limpeza em ultrassom com álcool etílico entre cada fase do polimento e, após isto, tiveram sua rugosidade analisada por interferometria ótica para garantir parâmetros de superfície abaixo dos limites contidos na Tabela 5. A definição dos parâmetros apresentados pode ser encontrada em STOUT (1981). Tabela 5 -Valores de parâmetros de superfície mínimos pré-tratamento. Parâmetro Valor Sk <15nm Spk <5nm Svk <5nm Sa <10nm Sq <8nm Sds >0,003 1/μm² Sdq <0,002 Fonte: Autor. 56 APARATO EXPERIMENTAL As amostras foram processadas em reator com configuração similar à ilustrada na Figura 16. As amostras foram tratadas em cátodo junto da amostra de referência, usado para medir temperatura através de um termopar tipo K (alma de chromel-alumel / luva de Inconel 600). Termopar e amostra de referência são isolados eletricamente por uma peça cerâmica cilíndrica com menos de 1mm de parede. A configuração do reator possui duas fontes de energia, uma para obtenção do plasma e outra para aquecimento por irradiação. Elas possuem as seguintes características: • Fonte do Plasma: fonte de corrente direta pulsada, de frequência 4 kHz (pulso de 250 μs), razão cíclica máxima de 0,96, tensão aplicada de 300,400,500,600 ou 700 V. Medidor de tensão média aplicada (V), tensão máxima aplicada (V) e corrente (A). • Fonte de Aquecimento Auxiliar: fonte de corrente pulsada controlada pela potência ou pela temperatura do termostato que é ligada a fitas de molibdênio instaladas dentro do reator, tais fitas aquecem por efeito Joule, e considera-se que fornecem energia para a câmara do reator apenas por irradiação, devido à baixa pressão. As amostras foram dispostas no cátodo segundo a Tabela 6, onde a posição ‘y3’ é sempre ocupada pela amostra de referência e a posição ‘z2’ é vizinha da conexão elétrica do cátodo. Uma distância de ao menos 20 mm é deixada entre a borda do cátodo e amostras. Tabela 6 - Distribuição das amostras no cátodo. x y z 1 x1 y1 z1 2 x2 y2 z2 3 x3 y3 termopar z3 Fonte: Autor. 57 Figura 16 - Configuração do reator. Fonte: LAMIM (2016). 58 PARÂMETROS FIXOS A Tabela 7 demonstra os parâmetros fixos para nitretação. O tratamento termoquímico terá três etapas diferentes, a primeira de pré- aquecimento, seguida da limpeza e por último a nitretação. Tabela 7 - Parâmetros fixos de processamento. Etapa Parâmetro Valor Pré-Aquecimento Temperatura 20 °C à 150 °C Mistura gasosa 75% H2 – 20%Ar – 5% N2 Tempo 1 hora Pressão 3 Torr Tensão aplicada 300V Taxa do Aquecimento resistivo 2°C/min Limpeza de Superfície Temperatura 380 °C à 400 °C Mistura gasosa 30% H2 – 70% Ar Tempo em aquecimento 30 min Pressão 2 Torr Taxa do Aquecimento resistivo 8°C/minuto Tensão Aplicada 600V Tempo em patamar 0,5 horas Nitretação Temperatura de nitretação 400°C Mistura Gasosa de nitretação 80% N2 – 20% H2 Tempo de nitretação 6 horas Aquecimento resistivo 400 °C Tempo de Residência 43,5 segundos Área Catódica 397,5 cm² A fase de pré-aquecimento, além de dar início ao aquecimento do reator de forma mais branda, tem como intuito a degasagem e a limpeza de compostos orgânicos presentes no reator. A leve adição de nitrogênio serve para extração de impurezas que contêm carbono (AHMADI; CZERWIEC, 2008). A segunda etapa, de limpeza, tem como função principal a quebra da camada de óxido de cromo presente nos aços inoxidáveis. Sendo 59 assim, nesta etapa é interessante o aumento da energia das partículas aceleradas, o que justifica o aumento da tensão aplicada (PAVANATI, 2005). Assim como a composição da atmosfera, sendo o argônio utilizado por possuir maior peso atômico e o hidrogênio por ser mais reativo (DOS REIS; NEIDERT, 2011). Por fim, a nitretação, realizada a 400°C para todos os ciclos, vale lembrar que esta temperatura é controlada e homogênea devido à energia transferida pela irradiação das resistências auxiliares. Devido a este fato, a temperatura que o plasma, por si só, é capaz de fornecer ao cátodo será necessariamente menor que 400°C e variável para as combinações de parâmetros. PARÂMETROS VARIÁVEIS Como já citado anteriormente, as variáveis que serão avaliadas são: • Tensão aplicada: 300 V, 400 V, 500 V e 600 V; • Razão Cíclica: 0,15, 0,30, 0,45, 0,6; • Pressão: 0,5 Torr, 1 Torr, 2 Torr e 3 Torr. Tais variáveis foram escolhidas em faixas típicas de operação, porém certas combinações são inviáveis para a geometria e tamanho do reator. Foi realizado uma varredura de todos os pontos em busca dos pontos viáveis, que devem respeitar os seguintes requisitos: • Manter a descarga em regime luminescente anormal; • Não aquecer a amostra a temperaturas superiores de 390°C; • Não apresentar instabilidades na descarga como arcos e cátodos ocos nas partes do reator. A Figura 17 mostra os pontos onde há viabilidade experimental. Dentre as 64 combinações de tensão aplicada, pressão e razão cíclica, 16 não são viáveis por não atenderem aos requisitos apresentados acima. 60 Figura 17 - Projeção das combinações viáveis para tratamento. Fonte: Autor. PLANEJAMENTO EXPERIMENTAL Inicialmente o trabalho foi pensado como um experimento fatorial, onde n são o número de níveis das variáveis de entrada k. O plano fatorial completo, segundo as variáveis demostradas na seção anterior, é dado por: 𝑛𝑘 = 43 = 64 (17) Sabendo-se que, nem todas combinações são viáveis, e que seria impraticável realizar 64 ciclos e caracterizar 512 amostras, um estudo fatorial parcial torna-se necessário. Segundo MONTGOMERY (2001) e GIRAULT e DUGUÉ (1969) é possível realizar planejamento fatoriais em ordens menores, sem que haja perda substancial de informações. Para isto é necessário a escolha correta dos níveis e dos pontos a serem experimentados. Existem algumas formas de reduzir o número de experimentos sem que haja efeito deletério na análise dos resultados. GIRAULT e DUGUÉ (1969) apresentam a técnica delineamento atravésde quadrados latinos, que permite a redução de ensaios para 16, escolhendo pontos equidistantes. 61 A escolha dos pontos dessa forma vai de encontro ao objetivo do trabalho, permitindo combinações de parâmetros mais distribuídas dentro das combinações possíveis, aumentando a chance de obtenção de respostas diferentes e podendo prover informações básicas sobre a influência dos parâmetros. Os experimentos da Tabela 8 foram obtidos através do delineamento anteriormente citado. Esta combinação conteve a menor quantia de pontos inviáveis, fornecendo quatorze combinações de ensaios. Tabela 8 - Combinações de experimentos segundo delineamento por quadrados latinos. Pressão (torr) Tap (V) RC (%) Legenda 0,5 300 15 0,5-300-15 0,5 400 30 0,5-400-30 0,5 500 45 0,5-500-45 0,5 600 60 0,5-600-60 1 300 60 1-300-60 1 400 15 1-400-15 1 500 30 1-500-30 1 600 45 1-600-45 2 300 45 2-300-45 2 400 60 2-400-60 2 500 15 2-500-15 3 300 30 3-300-30 3 400 45 3-400-45 3 600 15 3-600-15 Fonte: Autor. 62 MÉTODOS DE CARACTERIZAÇÃO A tabela a seguir prevê para cada experimento, a quantia de medidas, suas posições no cátodo (Tabela 6) e as técnicas utilizadas para a caracterização das amostras. Nas subseções a seguir são apresentadas as técnicas, sua disponibilidade, e as principais informações que se busca obter. Tabela 9 - Descrição das caracterizações para um experimento. Técnica Amostras (por posição) x1 x2 x3 y1 y2 z1 z2 z3 MO x x x x x x x x DRX x x MDV x x x x x x x x MEV/EDS x x x x DRXr x MEV/EDS x MO x Fonte: Autor. A escolha desta distribuição de medidas tem como objetivo: • Mitigar efeitos ligados a posição das amostras; • Evitar uso excessivo das técnicas mais sofisticadas; • Evitar aquisição excessiva de dados; • Submeter a análises destrutivas o menor número possível de amostras, deixando amostras para outros possíveis estudos. 3.7.1 Preparação Metalográfica do Corte Transversal Para a realização das caracterizações da secção transversal é necessária a manutenção da integridade das camadas nitretadas e da planicidade nas bordas. Para isto as amostras foram seccionadas em cortadeira de precisão modelo Isomet4000, com velocidade de avanço 1,7 mm/s e de corte 3000rpm utilizando disco adiamantado. 63 Após a secção as amostras foram embutidas em embutidora automática, modelo Struers CitoPress-1, em uma mistura de resina de alta dureza e condutora na ordem de 1:3, de forma a facilitar a observação em MEV e evitar o arredondamento de borda. A planicidade e refletividade das amostras serão garantidas pela preparação em politriz automática, modelo Struers TegraPol-21. Nesta etapa a pressão aplicada foi reduzida de forma a evitar transformações martensíticas induzidas por deformações intensas. Para a revelação da microestrutura foram testados os reagentes Marble, Behara II e ácído clorídrico saturado com ácido pícrico. Para a determinação da espessura da camada de difusão o reagente Behara II apresentou melhores resultados. 3.7.2 Microscopia Ótica Micrografias da superfície pós-tratamento foram obtidas através de microscopia óptica, utilizando o microscópio Leica – DM 4000 M com câmera digital acoplada (Leica DC 300). As imagens da superfície foram adquiridas na borda e centro das amostras, em campo claro e em luz polarizada e com interferência. As imagens de corte transversal foram adquiridas em microscópio Leica DM 4000 MLED que possui software disponível para medição da espessura da camada em aumentos de 1500x. 3.7.3 Microscopia Eletrônica de Varredura A caracterização da superfície e secção transversal das amostras foram realizadas em microscópio eletrônico de varredura (MEV), modelo Tescan Vega3 utilizando filamento de tungstênio. As imagens da superfície foram obtidas em aumentos de 3.000, 6.000, 9.000 vezes a 10kV e a secção transversal em aumentos de 15.000 vezes também com aceleração de 10kV, ambas se utilizando o detector de elétrons secundários (SE) para dar ênfase à modificação superficial e formação da camada nitretadas e do detector de elétrons retroespalhados (BSE) para fins exploratórios. Acoplado ao MEV, há um espectrômetro de raios X por energia dispersiva capaz de realizar análises químicas semiquantitativas. Medidas de topo foram realizadas para avaliar a composição superficial. Também para as análises químicas foi utilizado uma aceleração de feixe de 10kV. 64 Para todas as análises foram fixados os seguintes elementos: ferro, cromo, níquel, manganês, molibdênio e nitrogênio. Simulações de Monte-Carlo realizadas em Ferro por GOLDSTEIN et al. (1992) demonstram que para essa aceleração o volume de interação é menor que 0,4 µm de diâmetro. 3.7.4 Difração de Raios X A análise estrutural das camadas nitretadas foi realizada através da difração de raios X com geometria Bragg-Brentano e por incidência rasante, ambas com radiação Kα do cobre. A faixa de varredura para geometria normal foi de 30° a 100°, step time de 1s e step size de 0,02°. Para ângulos rasante a varredura ocorreu entre 30° a 50°, sendo utilizado step size 0,02° e step time de 10s. Para a difração rasante, utilizou-se 1° de incidência do feixe, com o intuito de avaliar a presença de fases na parte mais externa da superfície. Todas as medidas foram realizadas em difratômetro Philips X’Pert MDP, Espera-se que para a geometria típica a maior parte do sinal recebido para construção do difratograma venha de uma espessura aproximada de 5 à 2 µm (CULLITY; STOCK, 2014), e que para ângulos rasantes a espessura de interação seja em torno de 0,5 µm segundo os resultados obtidos por LAMIM (2016). 3.7.5 Espectrometria Ótica de Emissão Para caracterizar o plasma, foi acoplado ao reator o espectrômetro ótico Ocean Optics USB4000, a técnica tem como objetivo obter informações sobre as espécies geradas no plasma e fornecer informações sobre a repetibilidade das fases de pré-aquecimento e limpeza. Foram adquiridos a cada ciclo: • 1 espectro durante o pré-aquecimento por 45s; • 1 espectro durante a limpeza durante 4s; • 2 espectros durante a nitretação por 4s; • 2 espectros durante a nitretação por 25s; • 1 espectro durante o resfriamento. 65 3.7.6 Microdureza Vickers Valores de microdureza foram obtidos através do microdurômetro Vickers (Leco LM100AT, software Amh43). As medidas foram realizadas na superfície após o tratamento, e para maior confiabilidade nos dados de microdureza foram feitas três indentações. Todas as indentações utilizaram carga de 10gf (menor carga que o equipamento suporta), para que as medidas correspondam ao máximo à dureza da camada expandida superficial. O cálculo da microdureza foi dado pela Equação 18. A profundidade da indentação pode ser obtida a partir da razão trigonométrica entra a diagonal e o ângulo entre as faces do indentador (Equação 19). A ASTM E384 determina que as indentações devem ser realizadas a uma distância correspondente a 2,5x da diagonal da indentação para que seja evitado a influência do campo de deformação de da primeira indentação. Transferindo este raciocínio para a profundidade da indentação podemos esperar que os resultados de dureza da superfície tenham influência da propriedade mecânica em uma profundidade de ao menos o dobro da profundidade do indentador. 𝐻𝑉 = 1854.4 . 𝑃 𝑑2