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JULIANA RIBEIRO MARIOTTO ESTÁGIO DE DOCÊNCIA Cinética Enzimática JULHO 2006 CINÉTICA ENZIMÁTICA A Cinética de Reações Enzimáticas apresentam os seguintes objetivos: • Medir as velocidades das transformações que se processam; • Estudar a influência de condições de trabalho (concentrações de reagentes e das enzimas, temperatura, pH, concentrações de ativadores e de inibidores) naquelas velocidades; • Correlacionar (equações empíricas ou modelos matemáticos) as velocidades das transformações com alguns dos fatores que as afetam; • Colaborar na otimização do processo; • Estabelecer critérios para o controle do processo; • Projetar o reator mais adequado. 1 Influência da concentração de substrato Um dos fatores que afetam a velocidade de uma reação catalisada por uma enzima purificada é a concentração do substrato presente [S]. O estudo dos efeitos da concentração de substrato é complicado pelo fato de a [S] variar durante o curso de uma reação à medida que o substrato é convertido em produto. Uma forma de simplificar este problema é medir a velocidade inicial da reação (V0). Em um experimento cinético a [S] é sempre muito maior que a concentração da enzima [E], e se o tempo de reação é suficientemente curto, as mudanças da [S] serão negligenciáveis, podendo ser considerada como uma constante. O efeito provocado em V0 pela variação da [S], quando a concentração de enzima é mantida constante está mostrado na Figura 1. Em concentrações pequenas do substrato, V0 aumenta quase linearmente com os aumentos de [S]. Em concentrações maiores de substrato V0 aumenta por incrementos menores em respostas aos aumentos da [S]. Finalmente, é alcançado um ponto acima do qual ocorrem apenas aumentos insignificantes em V0, mesmo diante de aumentos em [S], sendo este ponto chamado de velocidade máxima (Vmáx). Figura 1. Efeito da concentração de substrato na velocidade inicial de uma reação catalisada enzimaticamente. Existem alguns casos em que a velocidade inicial não pode ser medida, ou porque não existe uma técnica experimental que permita acompanhar as variações das concentrações no sistema, ou a transformação não pode ser representada por uma equação química com reagentes e produtos definidos. A velocidade da reação, nesses casos, é freqüentemente representada por uma velocidade média de consumo, ou de produção, de substâncias convenientemente escolhidas (Figura 2) ou, ainda, pela variação de uma propriedade do sistema (viscosidade, textura, absorbância, etc.) em um intervalo de tempo prefixado. Figura 2. Medida da velocidade média de formação do produto no intervalo de tempo ∆t. O perfil cinético apresentado na Figura 1 levou Victor Henri a propor, em 1903, que uma enzima liga-se à molécula de seu substrato para formar o complexo ES, sendo este um passo obrigatório no processo catalítico enzimático. Esta idéia foi expandida em uma teoria geral da ação das enzimas, especialmente por Leonor Michaelis e Maud Menten, em 1913. Eles propuseram que a enzima primeiro combina-se reversivelmente com o substrato, para formar o complexo enzima-substrato, em um passo reversível relativamente rápido: k1 E + S ES (1) k-1 A seguir, em um passo mais lento, o complexo ES se rompe com o reaparecimento da enzima livre e a formação do produto da reação P: k2 ES E + P (2) A segunda reação (Equação 2) é mais lenta neste modelo e, portanto, limita a velocidade da transformação global do reagente em produto. Disto resulta que a velocidade da reação enzimática deve ser proporcional à concentração da substância reagente no segundo passo, ES. Em qualquer instante de uma reação, a enzima existe em duas formas, a não ligada ao substrato, ou a forma livre E, e a forma ligada ES. Em concentrações pequenas do substrato [S], a maior quantidade da enzima estará na forma livre E. Nestas condições, a velocidade de reação será proporcional à [S] porque o equilíbrio da Equação 1, à medida que [S] aumentar, será deslocado na direção da formação de mais ES. A velocidade inicial máxima da reação (Vmáx) será atingida quando praticamente todas as moléculas da enzima estiverem na forma do complexo ES, e a concentração da enzima livre E é insignificante. Neste caso, diz-se que a enzima está “saturada” com o substrato e a velocidade da reação não aumenta mais com os aumentos de [S]. Em solução contendo um excesso de substrato, haverá um período cinético inicial chamado de estado pré-estacionário, ocorrendo o crescimento da concentração de ES. O estado pré-estacionário é, usualmente, de duração muito curta. A reação atinge o estado estacionário muito rapidamente e a concentração do complexo [ES] permanecerá praticamente constante durante o decorrer do tempo. 1.1 Equação de Michaelis e Menten A Figura 1 mostra a relação entre [S] e V0 para uma reação enzimática. A curva que expressa esta relação possui a mesma forma para a maioria das enzimas, sendo expressa pela Equação de Michaelis e Menten, derivada por estes pesquisadores partindo de sua hipótese básica de que, nas reações enzimáticas, o passo limitante da velocidade é a quebra do complexo ES para formar o produto e a enzima livre. A Equação de Michaelis-Menten (Equação 3) é a equação da velocidade para uma reação catalisada enzimaticamente e com um único substrato. É uma expressão da relação quantitativa entre a velocidade inicial V0, a velocidade inicial máxima Vmáx, e a concentração inicial de substrato [S], todas relacionadas através da constante de Michaelis-Menten, Km. A constante de Michaelis-Menten é uma constante dinâmica, ou de pseudoequilíbrio, que expressa a relação entre as concentrações reais no estado estacionário ao invés de concentrações no equilíbrio. [ ] [ ]SK SV V m máx +=0 (3) Uma relação numérica importante emerge da Equação de Michaelis-Menten no caso especial quando V0 é exatamente metade de Vmáx (Figura 1). Então: [ ]SKm = → máxVV 2 1 0 = (4) Km é equivalente à concentração de substrato na qual V0 é igual à metade de Vmáx, e indica a “afinidade” de uma enzima pelo seu substrato. Quanto menor for o valor de Km, maior será a afinidade da enzima pelo substrato. Obs: Vmáx depende do k2, que é uma constante, e da concentração da enzima na experiência realizada. Vmáx é proporcional à concentração da enzima (Figura 3). k1 k2 E + S ES E + P (5) k-1 Figura 3. Gráfico de Vmáx variando de acordo com a [E]. 1.1.1 Significado de Vmáx e Km Todas as enzimas que exibem uma dependência hiperbólica de V0 em relação a [S] são ditas seguir a cinética de Michaelis-Menten Entretanto, esta equação não depende do mecanismo de reação relativamente simples de dois passos. Muitas enzimas possuem mecanismos de reação muito diferentes entre si; comoenzimas que catalisam reações com seis ou oito passos identificáveis, que exibem o mesmo comportamento cinético no estado estacionário. Portanto, o significado real e a magnitude de Vmáx e Km podem variar de uma enzima para outra. O significado real de Km depende de aspectos específicos do mecanismo de reação, como o número e as velocidades relativas dos passos individuas da reação. Considerando as reações de dois passos: 1 12 k kkK m − += (6) Para a reação de Michaelis-Menten, k2 é o limitante da velocidade; assim, quando k2 << k-1, Km se reduz ao valor 1 1 k k− . Onde esta condição prevalece o Km representa uma medida da afinidade da enzima pelo substrato no complexo ES. Muitas vezes k2 >> k-1, e então 1 2 k kK m = . Em outros casos, k2 e k-1 são comparáveis e Km permanece com uma função mais complexa do relacionamento entre todas as três constantes de velocidade. A Vmáx também varia muito de uma enzima para outra. Se uma enzima reage pelo mecanismo de dois passos de Michaelis-Menten, a Vmáx é equivalente a k2[Et], onde k2 é o passo limitante da velocidade. Entretanto, o número de passos da reação e a identidade do(s) passo(s) limitante(s) da velocidade podem variar de enzima para enzima. Exemplo: Liberação do produto EP E + P é limitante da velocidade. k1 k2 k3 E + S ES EP E + P (7) k-1 k-2 Na saturação, a maior parte da enzima está na forma EP e [ ]EtkVmáx 3= . Portanto pode-se definir a constante kcat para descrever a velocidade limitante de qualquer reação catalisada por uma enzima nas condições de saturação. Cada enzima tem valores ótimos de kcat e Km que refletem o ambiente celular, a concentração do substrato normalmente encontrado in vivo pela enzima e a química da reação que está sendo catalisada. 1.1.2 Ordem da reação 1.1.2.1 Primeira ordem • Ocorre quando [S] << Km [ ] m máx K SV V =0 (8) Considerando kK V m máx = : [ ]SkV =0 (9) Onde: k: constante de velocidade de primeira ordem (min-1). A Equação 9 indica que quando [S] é muito pequena, a velocidade absoluta diminui a cada momento, à medida que [S] decresce (Figura 4). Porém, em um certo momento, uma fração constante de substrato presente se transforma em produto: [ ] [ ]SkV dt Sd ==− 0 [ ] [ ] dtS Sdk 1⋅−= (10) Como V0 diminui com o tempo na região de primeira ordem, gráficos de [S] e [P] contra o tempo são curvos (Figura 5). Pode-se determinar a quantidade de substrato utilizada ou de produto formado durante qualquer intervalo de tempo utilizando a equação integrada de velocidade de primeira ordem, cujo resultado será: [ ] [ ] ( )00log3,2 ttkS S −=⋅ (11) Figura 4. V0 diminui continuamente com o tempo. Figura 5. Aparecimento de [P] e desaparecimento de [S] não são lineares com o tempo. Um gráfico semilog da forma integrada da velocidade de primeira ordem possui uma inclinação 3,2 k− , e uma interseção de log [S]0 no eixo de log [S] (Figura 6). Figura 6. Gráfico semilog. Obs: t1/2 é chamado de tempo de “meia vida”, que é o tempo necessário para converter em produto metade do substrato originalmente presente → relacionado ao k (Equação 12). k t 693,0 2 1 = (12) 1.1.2.2 Ordem zero • Ocorre quando [S] >> Km. [ ] [ ]S SVV máx=0 máxVV =0 (13) 1.1.1 Determinações dos parâmetros cinéticos A Equação de Michaelis-Menten pode ser algebricamente rearranjada em formas que são mais úteis no tratamento gráfico dos dados experimentais. 1.1.2.3 Lineweaver-Burk Uma transformação muito empregada é obtida de forma simples, invertendo-se os dois lados da Equação de Michaelis-Menten: [ ] máxmáx m VSV K V 111 +⋅= (14) • Gráfico: V1 contra S1 ; • A linha reta tem inclinação igual a máx m V K , o intercepto no eixo V 1 é igual a máxV 1 e o intercepto no eixo ][ 1 S é igual a mK 1− ; • Vantagem: permitir uma determinação acurada de Vmáx, o que pode ser feito apenas aproximadamente em gráficos de V versus [S]. Figura 7. Gráfico duplo-recíproco ou de Lineweaver-Burk. 1.1.2.4 Método de Hanes Consiste simplesmente em multiplicar por [S] ambos os membros da Equação 14. [ ] [ ]S VV K V S máxmáx m 1+= (15) • VS][ varia linearmente com [S]; • A linha reta tem inclinação igual a máxV 1 , o intercepto no eixo V S][ é igual a máx m V K e o intercepto no eixo [S] é igual a –Km. Figura 8. Gráfico de Hanes. 1.1.2.5 Método de Eadie-Scatchard Rearranjando e multiplicando por [ ]S1 os dois lados da Equação 3, obtém-se: [ ]S V KVV mmáx −= (16) • Gráfico: V versus [ ]SV ; • A linha reta tem inclinação igual a mK− , o intercepto no eixo V é igual a máxV e o intercepto no eixo ][S V é igual a m máx K V . Figura 9. Gráfico de Eadie-Scatchard. 1.1.2.6 Forma integrada da Equação de Michaelis-Menten Km e Vmáx podem ser determinados pelo uso da forma integrada da equação de velocidade. [ ] [ ] [ ]SK SV dt SdV m máx +=−= [ ] [ ] [ ] [ ]( )SSS SKtV mmáx −+⋅⋅=⋅ 00log3,2 (17) Onde: [S]: concentração de substrato em qualquer tempo t → [ ] [ ]PSt −= 0 [ ] [ ]( )SS −0 : concentração de substrato utilizado no tempo t → t = [P] (concentração do produto formado no tempo t). Dividindo a Equação 17 por t e rearranjando: [ ] [ ] [ ] [ ]( ) t SS KK V S S t mm máx −⋅−=⋅ 00 1log3,2 (18) • Gráfico: [ ][ ]S S t 0log3,2 ⋅ versus [ ] [ ]( ) t SS −0 ; • A linha reta tem inclinação igual a mK 1− , o intercepto no eixo [ ][ ]S S t 0log3,2 ⋅ é igual a m máx K V e o intercepto no eixo [ ] [ ]( )tSS −0 é igual a máxV . Figura 10. Gráfico da forma integrada da Equação de Michaelis-Menten. Exemplo: Os valores da Tabela 4 mostram a velocidade inicial de formação do produto para diversos valores de concentração inicial do substrato em uma reação enzimática (Figura 11). Tabela 1. Velocidade inicial de formação do produto em função da concentração inicial de substrato. [S] (g/L) V0 (g/L.h) 0,25 0,78 0,51 1,25 1,03 1,66 2,52 2,19 4,33 2,35 7,25 2,57 0,0 1,0 2,0 3,0 0 2 4 6 8 [S] (g/L) V o (g /L .h ) Figura 11. Representação gráfica dos valores da Tabela 1. Aplicando-se, aos valores da Tabela 1, o método de Lineweaver-Burk e o de Hanes, obtêm-se os resultados representados, respectivamente, nas Figuras 12 e 13. y = 0,228x + 0,3668 R2 = 0,9991 0,0 0,4 0,8 1,2 1,6 0 1 2 3 4 5 1/[S] (L/g) 1/ Vo (L .h /g ) Figura 12. Determinação de V0 e Km pelo método de Lineweaver-Burk. • Resultados → [ ] [ ] L gK V K hL gV VSV VSV K V m máx m máx máx máxmáx m 622,0228,0 73,23668,01 Portanto, 3668,01228,01 111 0 0 =⇒= ⋅=⇒= +⋅= +⋅= y = 0,3595x + 0,2419 R2 = 0,9993 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 0 2 4 6 8 [S] (g/L) [S ]/V o (h ) Figura 13. Determinação de V0 e Km pelo método de Hanes. • Resultados → [ ] [ ] [ ] [ ] L gK V K hL gV V S V S S VV K V S m máx m máx máx máxmáx m 672,02419,0 78,23595,01 Portanto, 3595,02419,0 1 0 0 =⇒= ⋅=⇒= ⋅+= ⋅+= 2 Inibição da atividade enzimática A catálise enzimática pode ser impedida por compostos, que, quando presentes no meio, ligam-se diretamente à enzima, impedindo sua ação. 2.1 Inibidores reversíveis competitivos Os inibidores competitivos são substâncias que têm forma estrutural suficientemente semelhante à do substrato para poderem ligar-se ao sítio ativo da enzima (Figura 14). Faltam- lhe, entretanto, grupos químicos que pudessem levar a reação a cabo; o resultado da sua presença no meio de reação é o estabelecimento de uma competição entre as moléculas do inibidor competitivo e as do substrato pela ligação com o sítio ativo da enzima. Naturalmente, o porcentual de inibição resultante dependerá de dois fatores: (1) as concentrações relativas de substrato e inibidor competitivo; (2) da afinidade diferencial da enzima pelo substrato e pelo inibidor. Por suas características, a inibição competitiva é bastante específica. Figura 14. Inibidores competitivos. Como o inibidor se liga reversivelmente à enzima a competição pode se tornar favorável ao substrato, pela simples adição ao meio de reação de mais substrato, tornando mínima a probabilidade de uma molécula de inibidor se ligar à enzima. A reação, neste caso, exibirá uma Vmáx normal. Entretanto, o valor de Km aumentará na presença do inibidor. Este efeito no Km aparente e a ausência de um efeito em Vmáx são diagnósticos da inibição competitiva e é facilmente revelado através de um gráfico duplo-recíproco. A Figura 15 mostra um conjunto de gráficos duplo-recíproco obtidos na ausência do inibidor e em duas concentrações diferentes de um inibidor competitivo. O aumento de [I] resulta na produção de uma família de linhas com intercepto comum no eixo 0 1 V , mas com inclinações diferentes. Devido ao intercepto no eixo 0 1 V ser igual a máxV 1 observa-se que a velocidade máxima não muda quando a reação ocorre na presença de um inibidor competitivo, isto é, em uma dada reação enzimática sempre haverá uma concentração tão alta de substrato que deslocará o inibidor competitivo do sítio ativo da enzima, não importando quão alta seja a concentração do mesmo. Figura 15. Gráfico duplo-recíproco da inibição competitiva. • Equação de Michaelis-Menten com a presença de um inibidor competitivo: [ ] [ ] [ ]SKIK SVV I m máx +⎟⎠ ⎞⎜⎝ ⎛ + ⋅= 1 (19) • Aplicando-se o método de Lineweaver-Burk na Equação 19 (Figura 16): [ ] [ ]SV K IK VV máx I m máx 1111 ⋅ ⎟⎠ ⎞⎜⎝ ⎛ + += (20) • Determinação de KI: Figura 16. Determinação de KI. As Equações (3) e (19) permitem calcular a relação entre as velocidades da reação sem inibidor e com inibidor: [ ]( ) [ ]ISKK K V V mI m I ⋅++= 1 0 (20) Se for possível trabalhar com concentrações de substrato relativamente altas, a influência do inibidor pode se tornar desprezível (Figura 17). Figura 17. Influência das concentrações do substrato e do inibidor competitivo na relação IV V0 . Curiosidade: A inibição competitiva é empregada terapeuticamente para tratar pacientes que ingeriram metanol, um solvente encontrado em misturas anticongelantes para veículos automotores. No fígado da pessoa intoxicada o metanol é convertido em formaldeído pela ação da enzima álcool desidrogenase. O formaldeído é muito lesivo para os tecidos vivos e a cegueira é o resultado freqüente da intoxicação pelo metanol, porque os olhos são particularmente sensíveis. O etanol compete efetivamente com o metanol como substrato para a álcool desidrogenase. A terapia para o envenenamento com metanol é uma infusão endovenosa de etanol, que diminui a velocidade de formação do formaldeído, o suficiente para que a maior parte do metanol possa ser excretado na urina sem maiores danos. 2.2 Inibidores reversíveis não competitivos O inibidor não compete com o substrato pelo sítio ativo, mas vai ocupar outro sítio da enzima (sítio regulativo ou de inibição), formando além de complexos ES e EI, um terceiro complexo, enzima-inibidor-substrato (EIS) (Figura 18). A enzima é inativada quando o inibidor está ligado, o substrato estando também presente ou não. Uma concentração infinitamente alta de substrato não consegue levar toda enzima sob forma de ES, que é a forma produtiva. Para qualquer [I] uma parte da enzima permanecerá sob a forma [EIS], onde se pode prever que Vmáx será menor que a Vmáx observada na ausência de inibidor. Em geral, o efeito sobre Km é pequeno ou nenhum. Figura 18. Inibição não competitiva. • A equação da velocidade é dada por: [ ] [ ] [ ] [ ] ⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛ ++⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛ + ⋅= II m máx K IS K IK SVV 11 (21) • Aplicando o método de Lineweaver-Burk na Equação 21: [ ] [ ] [ ] ⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛ ++⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛ += ImáxImáx m K I VSK I V K V 11111 (22) Na inibição não competitiva, gráficos construídos com os valores de velocidade obtidos experimentalmente produzem a família de linhas mostrada na Figura 19, com intercepto comum no eixo [ ]S1 . Isto indica que Km para o substrato não é alterado por um inibidor não competitivo, mais Vmáx diminui. Figura 19. Gráfico duplo-recíproco da inibição não competitiva. 2.3 Inibidores reversíveis incompetitivos Trata-se de uma inibição por bloqueio do complexo ES. Supõe-se que existam na enzima dois sítios ativos: um reservado ao substrato e outro ao inibidor, mas este último só pode se fixar de modo reversível sobre o complexo intermediário ES (Figura 20). Figura 20. Inibição incompetitiva. A associação enzima-inibidor é não exclusiva. O inibidor não permite ao complexo ternário ESI evoluir para elaborar o produto. Neste tipo de inibição, a velocidade máxima (Vmáx) e Km são menores que na ausência de inibidor. • A equação da velocidade é dada por: [ ] [ ] [ ] [ ]S K I K S K I V V I m I máx + + ⋅ + = 1 1 (23) • Aplicando o método de Lineweaver-Burk na Equação 23 (Figura 21): [ ] [ ] ⎟⎟⎠ ⎞ ⎜⎜⎝ ⎛ +⋅+⋅= Imáxmáx m K I VSV K V 1111 (24) Figura 21. Gráfico duplo-recíproco da inibição incompetitiva. 2.4 Inibidores irreversíveis Inibidores irreversíveis são aqueles que se combinam com um grupo funcional na molécula da enzima e que é essencial para sua atividade, estes inibidores podem, também, promover a destruição de tal grupo (Figura 22). É comum a formação de uma união covalente entre um inibidor irreversível e uma enzima. Figura 22. Equação química com a presença de um inibidor irreversível. Um substrato que se combina irreversivelmente com uma enzima pode assemelhar-se a um inibidor não competitivo porque Vmáx diminui, ao passo que Km permanece a mesma. AVmáx diminui porque parte da enzima é completamente removida do sistema. • Equação de Michaelis-Menten na presença de um inibidor irreversível (Figura 23): ( ) [ ][ ]SK SEIkVV m máxI +⋅−= ][3 (25) Figura 23. Influência de [S] na velocidade de reação na presença de um inibidor irreversível. • Aplicando-se o método de Lineawer-Burk na Equação (25) (Figura 24): [ ] [ ] [ ]SEIKV K EIKVV máx m máxI 111 33 ⋅−+−= (26) Figura 24. Método de Lineweaver-Burk na inibição irreversível. 3 Influência do meio sobre a atividade enzimática A estrutura e a forma do sítio ativo são decorrência da estrutura tridimensional da enzima e podem ser afetadas por quaisquer agentes capazes de provocar mudanças conformacionais na estrutura protéica. Isto torna a atividade enzimática dependente do meio ambiente, notadamente do pH e da temperatura. 3.1 Influência do pH A maioria das enzimas apresenta um valor de pH para o qual a sua atividade é máxima, a velocidade da reação diminui à medida que o pH se afasta desse valor ótimo, que é característico para cada enzima, mas com freqüência, está próximo do pH neutro. Ácidos, pela definição de Brönsted, são compostos capazes de dissociar-se, liberando H+. Ácidos fracos são aqueles em que a dissociação não é completa, restando em solução também uma porcentagem do ácido não dissociado; existe, portanto, um equilíbrio químico que pode ser escrito: ++↔ HAHA (27) As concentrações relativas de HA e de A dependem do pH. Quando o valor do pH é baixo (alta concentração de prótons), o equilíbrio rearranja-se pelo aumento da concentração de HA e diminuição da concentração de A. Quando o valor do pH é alto (baixa concentração de prótons), ocorre o inverso. Os grupos R dissociáveis dos aminoácidos comportam-se de maneira análoga. Existe uma concentração hidrogeniônica que propicia um determinado arranjo de grupos protonados e desprotonados, que leva a molécula de enzima à conformação ideal para exercer seu papel catalítico. Esse pH ótimo depende do número e tipo de grupos ionizáveis que uma enzima apresenta, ou seja, depende de sua estrutura primária. Por outro lado, quando o substrato contém grupos ionizáveis, as variações de pH também poderão afetar sua carga. A Figura 25 apresenta uma curva experimental da V0 com relação à variação do pH (curva A) e a curva de estabilidade (curva B) para uma enzima. Figura 25. Efeito do pH na atividade e estabilidade de uma enzima, curva A: atividade da enzima, curva B: V0 em pH 6,8 após incubação em outros valores de pH. Observa-se que a incubação da enzima em pH 5 ou pH 8 não produz nenhum efeito na atividade medida em pH 6,8. Então, o declínio da atividade entre pH 6,8 e 8 e entre pH 6,8 e 5 deve resultar da constituição de uma forma iônica não adequada da enzima e/ou substrato. Quando a enzima é incubada em pH > 8 ou pH > 5, a atividade total não é obtida em pH 6,8. Portanto, parte do declínio na atividade acima de pH 8 e abaixo de pH 5 resulta em uma inativação irreversível da enzima. O efeito do pH sobre a afinidade pode ser eliminado utilizando-se altas concentrações de substrato de modo a se saturar a enzima em todos os valores de pH. 3.2 Influência da temperatura A influência da temperatura sobre a cinética da reação enzimática deve ser entendida em duas fases distintas: no princípio, aumentos de temperatura levam a aumentos de velocidade de reação, por aumentar a energia cinética das moléculas componentes do sistema. Esse efeito é observado em um intervalo de temperatura compatível com a manutenção da estrutura espacial da enzima. Temperaturas mais altas levam à desnaturação da enzima por alterarem as ligações químicas que mantêm sua estrutura tridimensional. Rompidas as pontes de hidrogênio, que são ligações bastante termolábeis, desencadeia-se uma cascata de alterações estruturais, levando a enzima a uma nova conformação ou a um estado sem estrutura definida. A temperatura que provoca desnaturação está, geralmente, pouco acima de sua temperatura ótima. Enzimas de baixo peso molecular compostas de uma única cadeia polipeptídica e possuindo pontes dissulfetos são geralmente mais estáveis ao calor do que enzimas oligoméricas, de alto peso molecular. O efeito da temperatura em uma enzima depende de um número de fatores que incluem o pH, a força iônica do meio e a presença ou ausência de ligantes. Os substratos freqüentemente protegem a enzima da desnaturação pelo calor. Na reação enzimática a constante de velocidade k é função crescente da temperatura do sistema. A influência da temperatura na constante de velocidade k obedece à lei de Arrhenius (Equação 28): RTekk α−⋅= 0 (28) Onde: • α: energia de ativação; • R: constante dos gases perfeitos; • T: temperatura absoluta do sistema. A Figura 26 representa a Equação 28. Figura 26. Representação da variação da constante de velocidade k com a temperatura absoluta T. Lembrando que as enzimas são termolábeis, ao mesmo tempo que ocorre a reação enzimática que nos interessa, desenvolve-se também a reação de inativação térmica da enzima que atua no sistema (Equação 29): k’ E Enzima inativada (29) A constante de velocidade desta equação (k’) também é afetada pela temperatura de acordo com a lei de Arrhenius (Equação 20): RTekk β−⋅= '0' (30) Sendo β a correspondente energia de ativação. O efeito da temperatura na velocidade das reações é em geral expresso em termos de coeficiente de temperatura (Q10), fator pelo qual a velocidade aumenta quando a temperatura aumenta 10ºC (Equação 31): 10 log3,2 1012 QTTREa ⋅⋅⋅⋅= (31) 4 Regulação da atividade enzimática No metabolismo celular grupos de enzimas trabalham em conjunto, formando vias seqüenciais para desenvolver um dado processo metabólico. Nesses sistemas, o produto da reação da primeira enzima tornar-se o substrato da enzima subseqüente e assim sucessivamente. Em cada sistema enzimático, entretanto, há pelo menos uma enzima que determina a velocidade de toda a seqüência, porque ela catalisa a reação mais lenta ou a reação limitante da velocidade. Estas enzimas reguladoras têm sua atividade catalítica aumentada ou diminuída em resposta a determinados sinais, ajustando a velocidade de cada seqüência metabólica, devido as necessidades de energia e de biomoléculas requeridas no crescimento da célula e no seu auto-reparo. A atividade das enzimas reguladoras é modulada através de vários tipos de moléculas sinalizadoras, as quais são, em geral, pequenos metabólitos ou cofatores. Nas vias metabólitas existem duas grandes classes de enzimas reguladoras, as enzimas alostéricas e as enzimas reguladas pela modificação covalente. 4.1 Enzimas alostéricas As enzimas alostéricas funcionam através da ligação não-covalente e reversível de um metabólito regulador chamado modulador. Estas enzimas são aquelas que possuem “outras formas” ou conformações induzidas pela união com moduladores. Em alguns sistemas multienzimáticos a enzima reguladora é inibida especificamente pelo produto final da via, sempre que este estiver em excesso em relação às necessidades celulares. Quando a velocidade da reação catalisada pela enzima reguladora diminui, todas asenzimas subseqüentes passam a operar em velocidades reduzidas, porque as concentrações de seus substratos diminuem proporcionalmente. Este tipo de regulação é chamado de inibição por retroalimentação Os moduladores das enzimas alostéricas podem ser inibidores ou estimuladores, ou efetuadores alostéricos negativos ou positivos, respectivamente. O próprio substrato é freqüentemente um ativador e as enzimas reguladoras para as quais o substrato e o modulador são idênticos são chamadas de homotrópicas, quando o modulador é uma molécula diferente do substrato a enzima é heterotrópica. Algumas enzimas têm dois ou mais moduladores. Em adição ao sítio ativo ou catalítico, as enzimas alostéricas geralmente têm um ou mais sítios reguladores ou alostéricos para a ligação do modulador, sendo este específico para o seu modulador. As enzimas com vários moduladores geralmente têm sítio de ligação diferente e específico para cada um deles. Outras diferenças entre as enzimas não reguladoras e as alostéricas envolvem as propriedades cinéticas. As enzimas alostéricas mostram relações entre V0 e [S] que diferem do comportamento enzimático normal, do tipo Michaelis-Menten. Elas exibem saturação quando [S] é suficientemente alta, mas para algumas enzimas alostéricas quando V0 é colocada em gráfico contra [S] resulta em uma curva com saturação sigmóide e não na curva hiperbólica exibida pelas enzimas não reguladoras (Figura 27). Figura 27. Comparação de uma enzima reguladora com uma não reguladora; 1. Enzima não reguladora (Michaelis-Menten), 2. Enzima reguladora. As enzimas alostéricas mostram diferentes respostas em suas curvas de variação da atividade em função da concentração do substrato porque algumas possuem moduladores inibidores, outras moduladores ativadores e várias possuem os dois tipos. 4.2 Modificação covalente Algumas enzimas são submetidas a um processo de regulação que consiste na ligação covalente de um grupo químico à sua estrutura. Um exemplo freqüente é a transferência de um grupo fosfato, proveniente do ATP, para a enzima-alvo (Figura 28). Naturalmente, a presença do grupo fosfato acarreta a mudança da conformação espacial da enzima, com duas conseqüências possíveis: para algumas enzimas a nova conformação é cataliticamente inativa; para outras, só então se forma um sítio ativo funcional. Assim, quando várias enzimas são simultaneamente fosforiladas, o metabolismo é drasticamente alterado, sendo acionadas vias que estavam inativas e inibidas vias até então funcionando. Figura 28. Modificação covalente de uma enzima. APÊNDICE Dedução da Equação de Michaelis e Menten A dedução inicia-se com as duas reações básicas envolvendo a formação e o desaparecimento de ES (Equações 1 e 2). Nos primeiros momentos da reação a concentração do produto [P] é negligenciável e para simplificar podemos assumir que k-2 pode ser ignorado. A reação reduz-se, então, a: k1 k2 E + S ES E + P (1) k-1 A V0 é determinada pela quebra de ES para formar o produto e, portanto, é dependente de [ES]: [ ]ESkV ⋅= 20 (2) Como [ES] na Equação 2 não é facilmente medida experimentalmente, precisamos descobrir uma expressão alternativa para [ES]. Primeiro introduziremos o termo [Et] representando a concentração total da enzima (ou seja, a soma das concentrações das enzimas livre e ligada ao substrato). Logo, a concentração da enzima livre, ou não ligada ao substrato, pode ser representada por [Et] – [ES]. Ainda, como [S] é ordinariamente muito maior que [Et], a quantidade de substrato ligada à enzima em qualquer momento da reação é negligenciável quando comparada com [S]. 4.2.1 Passos para a Equação de Michaelis e Menten • Passo 1: As velocidades de formação e desaparecimento de ES são determinadas pelos passos governados pelas constantes de velocidade k1 (formação) e k-1 + k2 (desaparecimento), de acordo com as expressões a seguir: Velocidade de formação de ES: [ ] [ ]( )[ ]SESEtkES −= (3) Velocidade de desaparecimento de ES: [ ] [ ]ESkESkES 21 += − (4) • Passo 2: Assume-se, agora, que a velocidade inicial da reação reflete um estado estacionário no qual [ES] é constante, isto é, a velocidade de formação de ES é igual à velocidade de desaparecimento. Estas condições assim assumidas definem o estado de equilíbrio estacionário. No estado estacionário, as expressões nas equações 3 e 4 podem ser igualadas para dar: [ ] [ ]( )[ ] [ ] [ ]ESkESkSESEtk 211 +=− − (5) Passo 3: Desenvolvemos, agora, uma série de passos algébricos para resolver a Equação 5 em função de [ES]. [ ] [ ][ ][ ] 211 1 kkSk SEtkES ++= − (6) Simplificando ainda mais esta última expressão de forma a que todas as constantes de velocidade estejam combinadas em um único termo: [ ] [ ][ ][ ] ( ) 1 12 k kkS SEtES −++ = (7) O termo ( ) 1 12 k kk −+ é definido como a constante de Michaelis-Menten, Km. Substituindo esta na Equação 7, a expressão simplifica-se para: [ ] [ ][ ][ ]SK SEtES m + = (8) • Passo 4: V0 pode agora ser expressa em termos de [ES]. A Equação 8 é empregada para substituirmos [ES] na Equação 2, dando: [ ][ ] [ ]SK SEtkV m + = 20 (9) Como a velocidade máxima ocorrerá quando a enzima estiver saturada e, portanto, [ES] = [Et], Vmáx pode ser definida como k2[Et]. Substituindo esta expressão na Equação 9 obtemos: [ ] [ ]SK SV V m máx +=0
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