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As crises da República e o ensino de História: a democracia brasileira em questão X Simpósio Regional de História Davison Hugo Rocha Alves Thiago Broni de Mesquita (Org.) (Belém, 28 a 30 de novembro de 2016) As crises da República e o ensino de História: a democracia brasileira em questão - X Simpósio Regional de História - Realização: ANPUH/SEÇÃO PARÁ (Belém, 28 a 30 de novembro de 2016) Davison Hugo Rocha Alves Thiago Broni de Mesquita (Org.) As crises da República e o ensino de História: a democracia brasileira em questão - X Simpósio Regional de História - Realização: ANPUH/SEÇÃO PARÁ (Belém, 28 a 30 de novembro de 2016) Belém- 2017 AN PU H AN PU H CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ S621 Simpósio Regional de História ANPUHA-Pará (10. : 2016 : Belém, PA) Anais do X Simpósio de História Anpuha-seção Pará : as crises da República e o ensino de história : a democracia brasileira em questão / organização Davison Hugo Rocha Alves , Thiago Broni de Mesquita. - 1. ed. - Belém [PA] : Paka- Tatu, 2017. recurso digital ; 8 MB Formato: epdf Requisitos do sistema: adobe acrobat reader Modo de acesso: world wide web Inclui bibliografia ISBN 978-85-7803-370-5 (recurso eletrônico) 1. Democracia - Brasil - Congressos. 2. Livros eletrônicos. I. Alves, Davison Hugo Rocha. II. Mesquita, Thiago Broni de. I. Alves, Davison Hugo Rocha. II. Mesquita, Thiago Broni de. 17-44977 CDD: 321.8 CDU: 321.7 27/09/2017 28/09/2017 AN PU H AN PU H SUMÁRIO APRESENTAÇÃO .......................................................................................................................... 13 FILIPPE PATRONI: INDEPENDENTISTA, ABOLICIONISTA E REPUBLICANO. HISTÓRIA E HISTORIOGRAFIA ........................................................... 15 José Alves de Souza Junior Faculdade de História/UFPA A “INVISIBILIZAÇÃO DOS CABOCLOS”: O PENSAMENTO PSEUDORRACISTA OITOCENTISTA E O PROJETO REPUBLICANO NA AMAZÔNIA .................................... 31 Karl Heinz Arenz Faculdade de História/UFPA ARTE XAMÂNICA NA AMAZÔNIA PRÉ-COLONIAL .......................................................... 45 Luis Paulo dos Santos de Castro (UEPA) PRIMEIRA DENTIÇÃO OU ESTÔMAGO DE AVESTRUZ: NOTAS SOBRE O ECLETISMO POLÍTICO, IDEOLÓGICO E ESTÉTICO DA PRIMEIRA FASE DA REVISTA DE ANTROPOFAGIA .................................................... 57 Heraldo Márcio Galvão Júnior (Unifesspa) HISTÓRIA ORAL E PATRIMÔNIO: A MEMÓRIA INSCRITA NAS RUAS, PRAÇAS E MONUMENTOS DE XINGUARA/PA .................................................................... 65 Heraldo Márcio Galvão Júnior (Unifesspa) AMAS DE LEITE NOS JORNAIS DE BELÉM DO GRÃO-PARÁ DO SÉCULO XIX: ALIMENTAÇÃO, SAÚDE E LITERATURA MÉDICA ................................. 77 Damiana Valente Guimarães Gutierres (Universidade Federal do Pará) PLANTAS, GÊNEROS E OBSTÁCULOS: RAZÕES SOCIAIS E RELIGIOSAS PARA O USO DE PLANTAS DE TERREIRO PELAS COMUNIDADES TRANS E TRAVESTI ..................................................................................... 89 Júlio Ferro Silva da Cunha Nascimento O HOMEM (TRANS) COMO SUJEITO HISTORIOGRÁFICO: VIVÊNCIA, TRAJETÓRIA E LUTA ........................................................................................... 95 Júlio Ferro Silva da Cunha Nascimento AN PU H AN PU H A DESCRIÇÃO HISTÓRICA, GEOGRÁFICA E ETNOGRÁFICA DO RIO CAPIM FEITA POR JOÃO BARBOSA RODRIGUES .............................................. 105 HISTORICAL DESCRIPTION, GEOGRAPHIC AND ETHNOGRAPHIC THE CAPIM RIVER MADE BY JOÃO BARBOSA RODRIGUES Cláudio Lísias Moreira Ximenes Álvaro Augusto Queiroz Costa Alan Watrin Coelho A PAISAGEM DO ITACAIÚNAS EM DOIS TEMPOS: UMA ANÁLISE DOS DIÁRIOS DE VIAGEM DE CUNHA MATTOS E IGNÁCIO MOURA (1839-1910) .............. 123 Anna Carolina de Abreu Coelho A IMPRENSA CATÓLICA: UMA ANÁLISE SOBRE A QUESTÃO RELIGIOSA NO JORNAL A BOA NOVA ............................................................... 135 THE CATHOLIC PRESS: AN ANALYSIS OF THE RELIGIOUS QUESTION IN THE BOA NOVA NEWSPAPER Raynara Cintia Coelho Ribeiro ENTRE POLOS: O EMBATE IDEOLÓGICO ENTRE COLLOR E LULA NAS ELEIÇÕES DE 1989 ............................................................................. 149 Andrey Ferreira Bastos JORNAL MARABÁ: FACES DO BARATISMO NO SUDESTE DO PARÁ (1945 E 1946) ................................................................................................................... 163 Aldair José Dias Carneiro INCLUSÃO DE ALUNOS CEGOS EM AULA DE HISTÓRIA ................................................ 179 INCLUSION OF BLIND STUDENTS IN HISTORY CLASS Tiese Rodrigues Teixeira Júnior FARQUHAR, O PORTO E A AVENIDA: UM BOULEVARD-CAIS ....................................... 187 Marcia Cristina Ribeiro Gonçalves Nunes (Universidade Federal do Pará – Programa de Pós Graduação de História – Doutoranda) O BOULEVARD-CAIS NA REPÚBLICA: UMA NOVA RUA COMERCIANTE ................. 203 Marcia Cristina Ribeiro Gonçalves Nunes (Universidade Federal do Pará – Programa de Pós Graduação de História – Doutoranda) ENTRE O NATURAL E O SOCIAL: O TRABALHO FEMININO ......................................... 217 ENTRE NATURAL Y SOCIAL: EL TRABAJO FEMENINO BETWEEN THE NATURAL AND THE SOCIAL: THE FEMININE WORK Gisély Damasceno Furtado Francivaldo Alves Nunes AN PU H AN PU H O RECONHECIMENTO DA IDENTIDADE CULTURAL POR MEIO DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA ................................ 233 THE RECOGNITION OF THE CULTURAL IDENTITY BY MEANS OF HERITAGE EDUCATION: A REPORT OF EXPERIENCE Carlos Eduardo Miranda da Conceição TOMÉ-AÇU: DO RURAL PARA O URBANO SOB UMA PERSPECTIVA ECONÔMICA E SOCIAL NAS DÉCADAS DE 1940-1980 ....................................................... 245 TOME-AÇU: RURAL TO URBAN IN AN ECONOMIC PERSPECTIVE AND SOCIAL IN DECADES OF 1940-1980 Tatiane do Carmo A VOZ E NOME: ESTRATÉGIA E IDENTIDADE DE TRABALHADORES E IMPACTADOS PELA UHE DE ESTREITO – MA/TO 2007-2012 ....................................... 261 THE VOICE AND NAME: STRATEGY AND IDENTITY OF WORKERS AND IMPACTED BY ESTREITO HYDROELECTRIC POWER PLANT - MA / TO 2007-2012 LA VOZ Y EL NOMBRE: LA ESTRATEGIA Y LA IDENTIDAD DE LOS TRABAJADORES Y IMPACTADOS POR UHE ESTREITO - MA / A 2007-2012 Cícero Pereira da Silva Júnior CATALINEIROS: MILITARES DA AERONÁUTICA NA AMAZÔNIA (1960-1985) ........... 279 Carlos Eduardo dos Santos e Santos CIRCUITOS DE FESTAS DE FÉ ................................................................................................... 293 FAITH FESTIVAL CIRCUITS Decleoma Lobato Pereira ENCONTROS ENTRE INFÂNCIA, MORAL E CIDADE NOS DISCURSOS DA IMPRENSA VIGIENSE NA DÉCADA DE 1920 .......................................... 307 MEETINGS BETWEEN CHILDHOOD, MORALITY AND CITY IN THE SPEECHES OF VIGIENSE PRESS IN THE 1920S José Renato Carneiro do Nascimento DALCÍDIO JURANDIR E O GRUPO MODERNISTA DA REVISTA TERRA IMATURA .................................................................................................. 313 DALCÍDIO JURANDIR AND THE MODERNIST GROUP OF “TERRA IMATURA” MAGAZINE Maíra Maia MUDANÇA CULTURAL/MUSICAL NA COMUNIDADE QUILOMBOLA DO MUMBUCA NO JALAPÃO, TO ............................................................ 327 CULTURAL / MUSICAL CHANGE IN THE QUILOMBOLA COMMUNITY OF MUMBUCA IN JALAPÃO, TO Marcus Facchin Bonilla (UFT/UFPA) Sonia Maria Moraes Chada (UFPA) AN PU H AN PU H AS RELAÇÕES ENTRE O CLERO E O ESTADO NA DÉCADA DE 1850: AS CONTRADIÇÕES DE UM ULTRAMONTANISMO NO PARÁ ....................................... 341 RELATIONS BETWEEN THE CLERGY AND THE STATE IN THE 1850: THE CONTRADICTIONS OF A ULTRAMONTANISM IN PARÁ Kelly Chaves Tavares MEMÓRIA DA GUERRILHA DO ARAGUAIA: RELAÇÕES DE PODER NA COMUNIDADE INDÍGENA SURUÍ/AIKEWARA .............................................. 353 Paula Miranda Monteiro POR UMA CIDADANIA MULTICULTURAL - A EXPERIÊNCIA MUTIDISCIPLINAR DE ENSINO, PESQUISA EXTENSÃO NA ESCOLA DE APLICAÇÃO DA UFPA, NO TRATO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS ........................................................................................................................... 369 Antônia Maria Brioso Tavares (Escola de Aplicação da UFPA) MEMÓRIA DE MESTRES DO MIRITI: NATUREZA, TEMPO E TRABALHO NA AMAZÔNIA ........................................................... 381 Claudete do Socorro Quaresma da Silva (UFPA) A CONTRIBUIÇÃO DA POSSE PARA O POVOAMENTO E FORMAÇÃO DAS GRANDES FAZENDAS NA FREGUESIA DE SÃO PEDRO DO FANADO DE MINAS NOVAS NO XIX ................................................. 391 THE CONTRIBUTION OF POSSESSION TO THE SETTLEMENT AND FORMATION OF LARGE FARMS IN THE PARISH OF SÃO PEDRO DO FANADO DE MINAS NOVAS IN THE XIX Juliana Pereira Ramalho IMAGEM, ETNICIDADE E SABERES INDÍGENAS ............................................................... 405 Denise Machado Cardoso (Docente da Faculdade de Ciências Sociais – UFPA) Letícia Cardoso Gonçalves (Graduanda em História - FIBRA/ Bolsista de Iniciação Científica – RENAS/MPEG) Irana Bruna Calixto Lisboa (Mestranda em Antropologia - UFPA/PPGSA/GEPI) UM TEMPO, UMA PAISAGEM: OCUPAÇÕES, PAISAGENS E USO DE RECURSOS NA SERRA LESTE DE CARAJÁS, PARÁ ....................................... 415 Tallyta Suenny Araujo da Silva LUIZ BRAGA E MILTON HATOUM: FRONTEIRAS MÓVEIS ........................................... 427 Arcângelo da Silva Ferreira O VALE TOCANTINO: OCUPAÇÃO E NAVEGAÇÃO NOS SETECENTOS .................... 439 Carlos Barbosa AN PU H AN PU H TRABALHO BANCÁRIO: REFLEXÕES SOBRE GÊNERO, CLASSE E RAÇA .............. 459 BANK WORK: REFLECTIONS ON GENDER, CLASS AND RACE Luciana Carlos Geroleti RESISTENCIAS, ALFORRIAS E NEGOCIOS DO MUNDO DA ESCRAVIDÃO NUMA FREGUESIA DO GRÃO-PARÁ OITOCENTISTA (1870-1882) ................................. 471 Roberta Conceição Tavares DISCURSO, MEMÓRIA E NARRATIVA: O DESEJO DE CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE EM PARAGOMINAS-PA .............................................................................. 485 Rayana Nadyr Lucena Callou HISTÓRIA, MEMÓRIA E POLICIA MILITAR: OS ESPORTES E A “VOLTA DA CIDADE CEL FONTOURA” EM BELÉM (1937-1975) ................................ 501 HISTORY, MEMORY AND MILITARY POLICE: THE SPORTS AND THE “CEL FONTOURA CITY TOUR” IN BELÉM (1937-1975) Itamar Rogério Pereira Gaudêncio (Academia de Polícia Militar “Cel Fontoura” - Instituto de Ensino e Segurança do Pará) 1964: GOLPE OU REVOLUÇÃO? A DISPUTA PELA MEMÓRIA NAS PÁGINAS DO JORNAL O ESTADO DE S. PAULO ......................................................... 515 1964: COUP OR REVOLUTION? THE CONTEST FOR THE MEMORY PAGES OF THE NEWSPAPER O ESTADO DE S. PAULO Cássio Augusto Guilherme CASCA DE CRAVO, ÓLEO DE COPAÍBA E RAIZ DE SALSAPARRILHA: ESPECIARIAS AMAZÔNICAS EM TRATADOS MÉDICO-BOTÂNICOS DA EUROPA (SÉC. XVII E XVIII) ................................................................................................ 529 Karl Heinz Arenz (UFPA) GOVERNOS MILITARES E O PROJETO DE INTEGRAÇÃO NACIONAL: O MINISTÉRIO DAS COMUNICAÇÕES NAS PÁGINAS DO JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO (1967-1974) ................................................................. 543 Rafael Patrick Flores Edvaldo Correa Sotana TRABALHO E MODERNIZAÇÃO: BELÉM DA BORRACHA E A RESISTÊNCIA DOS TRABALHADORES, 1900-1907 ....................................................... 559 Sérgio da Silva do Nascimento DAS NOVIDADES TÉCNICAS: BORRACHA, CIÊNCIA, POLÍTICA E A REPRESENTAÇÃO PARAENSE NA EXPOSIÇÃO INTERNACIONAL DA INDÚSTRIA E DO TRABALHO EM TURIM (1911) .......................................................... 577 Anna Raquel de Matos Castro AN PU H AN PU H BARÃO NA ESTRADA DE NAZARÉ: O ESTUDO DE CASO DE UMA AÇÃO DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA E.E.E.I.F. BARÃO DO RIO BRANCO – BELÉM PARÁ ............................................................................................. 595 Patrícia Carvalho Cavalcante Raimundo Justiniano do Carmo Neto “FOI NO BAIRRO DO JURUNAS”: ESTUDO DE CASO DE UMA AÇÃO DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL E DE MAPEAMENTO CULTURAL NA E.E.M HONORATO FILGUEIRA – BELÉM, PA ........................................ 609 Ângela Sánchez Leão Raimundo Justiniano do Carmo Neto A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL NA IMPRENSA PARAENSE: CIDADE E COTIDIANO (1914-1918) ........................................................................................... 621 Aline Luiza Fernandes Gomes “O MAIOR RIO DO ORBE”: O RIO AMAZONAS E A COLONIZAÇÃO AQUÁTICA DA AMAZÔNIA PORTUGUESA ........................................................................... 635 Elias Abner Coelho Ferreira (IN)VISIBILIDADE RELIGIOSA: O USO DE IGREJAS EVANGÉLICAS COMO ESPAÇO DE SOCIABILIDADE POR HOMOSSEXUAIS NA CIDADE DE BELÉM-PA ............................................................. 651 Alan Silva de Aviz Orientador: Prof. Dr. Fabiano de Souza Gontijo REPRESENTAÇÕES DA AMAZÔNIA NA REVISTA INFANTIL O TICO TICO: ENSINO E PESQUISA EM HISTÓRIA, ENTRE TEXTOS E IMAGENS ............................. 665 Isadora Bastos de Moraes (Mestranda do programa de pós-graduação em História Social da Amazônia Universidade Federal do Pará) UM SONHO DE LIBERDADE: ESCRAVIDÃO, RESISTÊNCIA E A FORMAÇÃO DE QUILOMBOS EM OURÉM DO GRÃO-PARÁ (1778-1823) ................... 675 A DREAM OF FREEDOM: SLAVERY, RESISTANCE AND THE FORMATION OF QUILOMBOS IN OURÉM DO GRÃO-PARÁ (1778-1823) Rozemberg Ribeiro de Almeida Universidade Federal do Pará TRILHAS COTIDIANAS: ESCRAVIDÃO NEGRA EM SANTARÉM (1860-1888) ............ 691 Maria Elizabete Carmo da Silva (Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA) A FORMAÇÃO DO CAMPESINATO CABOCLO NA AMAZÔNIA DOS OITOCENTOS .......................................................................................... 701 THE FORMATION OF CABOCLO PEASANTRY IN THE AMAZON OF THE EIGHT HUNDREDS Rebeca S. Nunez Lopes AN PU H AN PU H ENTRE CARTAS E JORNAIS: O CONFLITO DE CANUDOS E A CONSTRUÇÃO DO MEDO .................................................................................................... 715 Daniel da Silva Costa (Centro Universitário AGES) SEMEANDO A CIVILIZAÇÃO: DIVERGÊNCIAS EM TORNO DA INSTALAÇÃO DA ESTRADA DE FERRO DE BRAGANÇA NOS FINAIS DO SÉCULO XIX ..................................................................................................... 735 Franciane Gama Lacerda (UFPA) OS RASTROS DEIXADOS PELO CRIME: UM ESTUDO DO PERFIL DAS MULHERES DEFLORADAS NA COMARCA DE SANTARÉM-PA (1880-1940) ................ 745 Andrecy Nancy (Universidade Federal do Oeste do Pará) HISTÓRIAS DA EDUCAÇÃO NA AMAZÔNIA: O INSTITUTO SANTANA E AS IRMÃS VICENTINAS DA CARIDADE NO MUNICÍPIO DE IGARAPÉ-MIRI (PA) .................................................................................. 765 Ernane de Jesus Pantoja Neto (UFPA) Jadson Fernando Garcia Gonçalves (UFPA) “CRIMES CABANOS” NA REGIÃO DO BAIXO TAPAJÓS: ANÁLISE DE FONTES DOCUMENTAIS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ – FÓRUM DE SANTARÉM (1835-1840) .......................................... 779 Fabíola Caroline Siqueira Araújo Universidade Federal do Oeste do Pará OS TRILHOS E O DISCURSO DO PROGRESSO EM MANAUS (1889 a 1930) ................. 797 Wanderlene de Freitas Souza Barros (UFAM – Universidade Federal do Amazonas) CAPITANIA DO GRÃO-PARÁ E AS CAPITANIAS DO BRASIL: CONEXÕES A PARTIR DE MOBILIZAÇÕES INDIGENAS E MILITARES PARA DEFESA NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XVIII ............................................. 813 Wania Alexandrino Viana (Instituto Federal do Pará-Campus/Breves) PROFESSORES EM CONSTRUÇÃO - A IMPORTÂNCIA DO PIBID NA FORMAÇÃO DOCENTE EM HISTÓRIA ........................................................ 827 Leandro Tavares Furtado (UNAMA) Sabrina Gomes de Oliveira (UNAMA) Taynara Nacly Abenassiff Azevedo (UNAMA) PIBID-HISTÓRIA-UFOPA: EXPERIÊNCIAS SOBRE O TRABALHO COM PATRIMÔNIO MATERIAL E IMATERIAL NO ENSINO FUNDAMENTAL EM SANTARÉM-PA ............................................................... 837 Gabriel Augusto Wanghan da Silva (UFOPA) Verônica Lima da Silva (UFOPA) AN PU H AN PU H CONSCIÊNCIA NEGRA: UM OLHAR PARA AS MULHERES DO SÉCULO XIX AO XXI .............................................................................................................. 849 Otávio Vítor Vieira Ribeiro (UFPA) Amanda Danniely Proença Gonçalves (UFPA) A EXPERIÊNCIA DISCENTE NO ESTÁGIO SUPERVISIONADO III: NARRATIVAS DA REGÊNCIA NA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO PROFª. TEREZINHA DE JESUS RODRIGUES, SANTARÉM – PA .............................................................................................................................. 863 Andrecy Nancy Fabíola Caroline Siqueira Araújo Universidade Federal do Oeste do Pará A DISCIPLINA ESTUDOS AMAZÔNICOS: OS LIVROS DIDÁTICOS E O SABER ESCOLAR ................................................................... 881 Davison Hugo Rocha Alves AVANÇOS E LIMITAÇÕES NO CAMPO DA EDUCAÇÃO NA LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL EM CONTEXTO DE DEMOCRACIA NO BRASIL: DO CAPÍTULO III DA CF/88 E LEI 9.394/96 AOS DESAFIOS NO ENSINO DE HISTÓRIA NO CENÁRIO ATUAL .......................................... 893 ADVANCES AND LIMITATIONS IN THE FIELD OF EDUCATION IN EDUCATIONAL LEGISLATION IN THE CONTEXT OF DEMOCRACY IN BRAZIL: FROM CHAPTER III OF CF / 88 AND LAW 9.394 / 96 TO THE CHALLENGES IN TEACHING HISTORY IN THE CURRENT SCENARIO. Tullyo Robson Furtado Lobato (Universidade Federal do Pará - UFPA) ENSINO DE HISTÓRIA E PATRIMÔNIO: BREVES REFLEXÕES SOBRE PATRIMÔNIO IMATERIAL EM SALA DE AULA .................................................... 907 Renato Miranda da Silva Layane de Souza Santos A AMAZÔNIA E A DITADURA MILITAR SOB OS OLHOS DA GRANDE IMPRENSA .............................................................................................................. 925 Camila Barbosa Monção Miranda (PPGH-UFAM) REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NA CIDADE DE BELÉM: HISTÓRICO, AVANÇOS E DESAFIOS ........................................................................................ 939 Edivania Santos Alves – Doutora em Sociologia (PPGSA/UFPA). Secretaria Estadual de Educação (SEDUC) e Escola Superior Madre Celeste (ESMAC) O RECONHECIMENTO DA IDENTIDADE CULTURAL POR MEIO DA EDUCAÇÃO PATRIMONIAL: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA ................................ 955 THE RECOGNITION OF THE CULTURAL IDENTITY BY MEANS OF HERITAGE EDUCATION: A REPORT OF EXPERIENCE Carlos Eduardo Miranda da Conceição AN PU H AN PU H NATUREZA E ENSINO DE HISTÓRIA EM ANANINDEUA ............................................ 971 NATURE AND HISTORY TEACHING IN ANANINDEUA Victória Emi Murakami Vidigal Wendell Presley Machado Cordovil Wesley Oliveira Kettle OS MILITARES E A LEI DOS ARQUIVOS NA DÉCADA DE 1990 ................................... 983 Ronaldo Almeida Carneiro (UFPA, Mestrando) A LUTA PELA POSSE DA TERRA NA AMAZÔNIA CONTEMPORÂNEA: RESISTÊNCIA DOS TRABALHADORES RURAIS DO BAIXO TOCANTINS E SEUS CONFLITOS COM O ESTADO E A LEGISLAÇÃO AGRÁRIA DO PARÁ (1961-1981) ..................................... 991 Adriane Dos Prazeres Silva Apresentação Apresentamos os anais do X Simpósio Regional de História da ANPUH-Pará que teve como tema “As crises da República e o ensino de História: a democracia brasileira em questão” e ocorreu em Belém no período de 28 a 30 de novembro de 2016. Nesta edição pretendemos debater a construção de uma cultura política fragilizada, que caminha para uma polarização semelhante a que ocorreu no Brasil antes do golpe civil-militar de 1964. As conferências e mesas redondas discutiram a conjuntura política decorrente da crise institucional que se instalou no Brasil desde as manifestações de junho de 2013, quando diversos setores da sociedade começaram a reivindicar mais direitos, o combate sistemático da corrupção e colocaram em xeque a democracia representativa e o sistema presidencialista de coalizão brasileiro. Tais questões foram discutidas com foco na questão do ensino de História e suas relações com temas sensíveis e lugares de consciência no Brasil contemporâneo. Queremos com isso apresentar reflexões que os historiadores e professores de História podem fazer na sala de aula e fora dela sobre o recente processo traumático que foi a ditadura militar brasileira e suas leituras no século XXI, especificamente no que diz respeito às manifestações ocorridas entre março de 2013 a março de 2016. Esta é ainda uma oportunidade de levar professores, alunos da educação básica e historiadores a debaterem sobre os direitos humanos no Brasil. Essa reflexão norteou os trabalhos do X Simpósio Regional de História, promovido pela ANPUH-Pará, em parceria com a Universidade Federal do Pará (Campus Universitário do Guamá e o Campus Universitário de Ananindeua), Faculdade de História (FAHIS/Belém), Programa de Pós-graduação em História Social da Amazônia (PPHIST/UFPA), o mestrado profissional em Ensino de História (Prof. História-UFPA Ananindeua). O nosso evento contou com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O evento deveria ser realizado na Universidade Federal do Pará (Campus Guamá – Belém), mas em virtude da ocupação promovida pelos estudantes universitários a partir do dia 07 de novembro de 2016, destinada a protesta e tentar barrar a tramitação da PEC 55, e outras medidas do governo Michel Temer, foi realizado na Universidade da Amazônia (UNAMA – campus Senador Lemos). A diretoria da ANPUH seção Pará agradece à UNAMA pelo apoio ao evento, inclusive pela isenção de custos. Nessa edição foram apresentadas 33 propostas de Simpósios Temáticos, dos quais 70 trabalhos completos foram aprovados neste livro e-book reunindo cerca de 290 comunicações orais de profissionais da área de História e áreas afins, além de trabalhos de alunos da graduação e pós-graduação de História, o livro-ebook também tem 2 trabalhos completos que foram apresentados em mesas redondas durante o evento. Contamos com o apoio de todas as universidades públicas do estado do Pará (Ufopa, Unifesspa, Uepa e da Ufpa-Bragança). O evento teve uma diversificada participação de trabalhos inscritos nos diversos simpósios, por exemplo, debates sobre aspectos específicos do ofício do historiador por meio de seus grupos de pesquisas, bem como a realização de debates ocorridos em torno da prática pedagógica do professor de História. O livro em formato e-book que apresentamos possui 72 trabalhos completos que foram apresentados nos simpósios temáticos e mesas redondas sobre diversos temas. Belém, 8 de agosto de 2017 Profa. Dra. Edilza Joana Oliveira Fontes Presidente da ANPUH-Pará (2015-2016). Professora do PPHIST-UFPA. Coordenadora do ProfHistória-Ananindeua/UFPA. 15 Filippe Patroni: independentista, abolicionista e republicano. História e Historiografia José Alves de Souza Junior Faculdade de História/UFPA Resumo Fillipe alberto Patroni Martins Maciel Parente, paraense, estudante de Direito na Universidade de Coimbra desde 1816, onde entrou em contato com o ideário libeal português, viu, quando da eclosão da Revolução Constitucionalista do Porto de 1820, a oportunidade de realizar o projeto de se tornar uma figura política importante no Grão-Pará, ou como deputado extraordinário nas Cortes de Lisboa, ou como membro da Junta de Governo instalada após o Movimento de 1º de Janeiro de 1821, que proclamou a adesão da província ao constitucionalismo português. Sua atuação política produziu uma memória que foi transformada em história por uma historiografia que remonta ao século XIX, chegando ao século XX. É sobre essa relação entre memória e história que este trabalho pretende tratar. Palavras-chave: Fillipe Patroni, memória, história, historiografia Filippe Patroni: independence, abolitionist and republican. History and Historiography Abstract Fillipe Alberto Patroni Martins Maciel Parente, a student of Law at the University of Coimbra since 1816, where he came into contact with the portuguese liberal ideology, saw, at the outbreak of the Constitutionalist Revolution of the Port of 1820, the opportunity to carry out the project to become an important political figure in Grão-Pará, or as an extraordinary deputy in the Cortes of Lisbon, or as a member of the Government board after the January 1, 1821 Movement, which proclaimed the province's adherence to portuguese constitutionalism. Its political action produced a memory that was transformed into history by a historiography that goes back to century XIX, arriving at century XX. It is about this relationship between memory and history that this work intends to deal with. Key words: Fillipe Patroni, memory, history, historiography Filippe Patroni: independencia, abolicionista y republicano. Historia e Historiografía Resume Fillipe Alberto Patroni Martins Maciel Parente, Pará, un estudiante de derecho en la Universidad de Coimbra desde 1816, donde entró en contacto con las ideas libeal portugués vio cuando el estallido 16 de la Revolución Constitucionalista de Porto de 1820, la posibilidad de realizar el proyecto convertirse en una importante figura política en el Gran-Pará, o como adjunto extraordinario en las Cortes de Lisboa, o como miembro de la junta de gobierno instalado después de que el Movimiento del 1 de enero de 1821, que proclamó la adhesión de la provincia a constitucionalismo portugués. Su acción política produjo una memoria que se ha transformado en la historia por una historiografia que se remonta al siglo XIX, llegando hasta el siglo XX. Es esta relación entre la memoria y la historia que este trabajo va a tratar. Palabras clave: Fillipe Patroni, la memoria, la historia, la historiografía Apesar do reduzidíssimo tempo em que permaneceu no Pará, entre 1820 e 1823, Filippe Patroni foi consagrado pela historiografia amazônica, ora positiva ora negativamente em diferentes interpretações, como o principal protagonista e/ou mentor dos eventos lá ocorridos nesse período, os quais tiveram início com a proclamação do constitucionalismo português, a 1º de janeiro de 1821. Visto como introdutor do ideário vintista na Capitania, teria sido responsável pela disseminação de ideais independentistas e abolicionistas, através de escritos publicados na imprensa portuguesa e no jornal “O Paraense”, por ele fundado em Belém, ou de panfletos e pasquins anônimos que circulavam pela cidade, cuja autoria lhe era atribuída. O primeiro trabalho historiográfico acerca de tais acontecimentos foi publicado em 1829, com o título “Compêndio das Eras da Província do Pará”, de autoria de Antonio Ladislau Monteiro Baena. Nele, Baena pretendeu narrar os fatos ocorridos no Pará, entre 1615 e 1823, com a intenção de perpetuar a obra colonizadora desenvolvida pelos portugueses no Norte do Brasil. Português de nascimento, chegou à Capitania em 1803, na qualidade de Ajudante de Campo do Governador e Capitão-General D. Marcos de Noronha, Conde dos Arcos. Embora não se encontrasse em Belém quando do Movimento de 1º de janeiro de 1821, Baena o descreveu como alguém que tivesse participado ativamente dele, registrando o seguinte comentário sobre Patroni: Patroni que sempre se moveu debaixo de maos principios reguladores das suas faculdades intellectuais, largou a votiva carreira dos seus estudos da Jurisprudência Civil para também figurar na melindrosa e arriscada scena política, que se havia aberto em Portugal: fallou e incumbio-se de estender por meios immoraes e insidiosos a insurreição nacional à Província do Pará, que vivia em seo socego usado sem embargo que lhe fossem odiosos os procedimentos illegaes e arbitrários do Governo Provisional, e sem disposição alguma na generalidade se seos habitantes para tomar parte em revoluçoens sediciosas: e conseguio unir um ranchinho de promotores do novo Systema Constitucional, os quaes logo cuidarão de alliciar e athrair ao seo intempestivo e perfido projecto João Pereira Villaça e Francisco Rodrigues Barata, ambos Coronéis Comandantes, um do Primeiro Regimento de Infantaria de Primeira Linha, e o outro do Segundo (1970, p. 319 e 320). 17 O recurso a uma história e a um tempo sempre iguais possibilitou a Baena atribuir a Patroni um lugar privilegiado nos acontecimentos e uma forma repetitiva de atuação - “sempre se moveu debaixo de maos princípios reguladores das suas faculdades intellectuais”-, caracterizando-a como irresponsável, mal intencionada, efetivada por meios vis, o que confirmaria, segundo o autor, as dúvidas acerca de sua integridade mental. Vale ressaltar que o halo de loucura com o qual Baena envolveu a figura de Patroni, com a intenção de comprometer o valor dos seus escritos e da sua prática política, foi retirado de uma “denúncia” encaminhada a Junta Provisória do Governo do Grão-Pará por José Ribeiro Guimarães, em novembro de 1821, contra a agitação política que por ele teria sido promovida na Província. No texto da “denúncia” já são encontradas expressões do tipo “esquentada imaginação, que, tentando traduzir o seu inquieto comportamento, acabaram por colocar dúvidas sobre sua sanidade mental. Alicerçado na concepção da história dos personagens, considerados como promotores dos acontecimentos e de mudanças, Baena atribuiu à ação de Patroni um poder desestabilizador da ordem provincial, opondo-a à falta de disposição generalizada dos seus habitantes em tomar parte em revoluções sediciosas e à unidade de pensamento existente nas hostes militares, já que havia conseguido “alliciar e athrair ao seu intempestivo e perfido projecto” apenas alguns de seus membros. Baena enfatiza a ambição política de Patroni, que, não conseguindo convencer a Junta Provisória a nomeá-lo como deputado provincial extraordinário às Cortes de Lisboa, trata de ser menos largo em língua, de medir os termos e adoçar os comprimentos. Com reptil lisonja, complacencias e assiduidades solicita e obtém da mesma Junta ir com o Alferes Miliciano Domingos Simões da Cunha em commissão a Lisboa perante a Regencia de Portugal, e dar-se-lhe uma ajuda de custo (1970, p 323). Quando da prisão dos Irmãos Vasconcelos, ao chegarem em Belém provenientes de Lisboa, sob a acusação de propagarem idéias independentistas constantes em documentos anônimos trazidos de Portugal, Baena, ao narrar o fato, denunciou Patroni como o autor desses documentos, considerando-o “como o primeiro Cabeça ou Demagogo da revolução, a qual este filantropo de caráter nimiamente vivo, pouco reflexivo, e amante de novidades, pretendia actuar com o auxílio da escravatura” (BAENA, 1970, p. 328). Apropriando-se de termos utilizados pela Junta Provisória nos documentos em que fazia menção a Patroni, Baena o acusava de pretender utilizar a escravaria na revolução pela independência. Fundamentou tal denúncia na existência de uma pretensa circular encontrada com os Irmãos Vasconcelos que teria “na fronte por divisa duas mãos dadas uma branca e outra preta” e onde Patroni recomendaria “que o esperassem porque brevemente vinha mudar a ordem das cousas”, e no nº 10 do Indagador Constitucional, jornal editado em Lisboa, também encontrado em poder dos referidos irmãos, Patroni havia publicado o seu plano para as eleições no Pará, propondo no artigo 18 10 que: “Um Deputado deverá corresponder a cada trinta mil almas, entrando neste número os escravos, os quaes mais que ninguem devem ter quem se compadeça delles, procurando-lhes uma sorte mais feliz, até que um dias se lhes restituão seus direitos”. Essas eram, segundo Baena, provas mais que suficientes da extrema periculosidade de Patroni, indivíduo cujas intenções malévolas dirigiam-se à desestabilização política da Província do Grão-Pará, com o intuito de mergulhá-la num caos revolucionário, com vistas a separá-la de Portugal. Para reforçar seus argumentos, Baena cita um trecho de um discurso dirigido por Patroni às Cortes, onde evoca o nome de Thomas Penn: “Delaware he o rio que banha a bella Província aonde o famoso Penn manteve os direitos da humanidade, não consentindo lá escravatura. Ah! Quem me dera ser o Penn do Pará” (1970, p. 328). Domingos Antonio Raiol publicou, em 1865, o primeiro dos cinco volumes que viriam a constituir a obra “Motins Políticos ou História dos Principais Acontecimentos Políticos da Província do Pará Desde o Ano de 1821 até 1835”. Segundo o próprio autor, com essa obra se começaria “a dar publicidade à narração dos principais acontecimentos políticos da Província do Pará (no) período mais importante da história política da província (...), quando nela se tornaram mais freqüentes as convulsões populares, dirigidas quase sempre pelos agentes do poder público” (1970, p. 7). Paraense de nascimento, o autor buscou recuperar os acontecimentos que, no seu entender, faziam parte do processo de construção de uma identidade nacional no Pará e resgatar a importância da atuação política de determinados personagens, modeladora dessa identidade. O trabalho de Raiol enquadra-se dentro dos parâmetros historiográficos que nortearam as obras produzidas pelos historiadores ligados ao Instituto Histórico e Geográfico Paraense e Brasileiro, entre os quais o que atribuía ao historiador a tarefa fundamental de preservar a identidade nacional, pelo domínio que tinha do passado. Raiol dividiu sua obra em três partes: “a primeira compreende os sucessos ocorridos desde a convocação das Côrtes Gerais em Portugal até a proclamação da independência do Brasil. A segunda compreende os sucessos ocorridos desta época em diante até a abdicação de D. Pedro I. A terceira, enfim, compreende os sucessos que tiveram lugar desde a revolução de 7 de abril até os lutuosos dias de 1835” (1970, p. 07). Enfatizando seu desinteresse por glórias e recompensas, Raiol alegava que o incentivo que o levou a escrever tal obra “foi o desejo de evitar que o tempo apagasse a memória de acontecimentos tão graves como foram esses, que por muito tempo agitaram a sociedade paraense” (RAIOL, 1970, p. 7) e ressaltava ser esta a primeira a tratar de tais assuntos. Ao ressaltar o caráter pioneiro de sua obra, Raiol procurava apagar da memória a obra de Antonio Ladislau Monteiro Baena, por não concordar com a versão por ele construída sobre os acontecimentos. Apesar disso, e contraditoriamente, Raiol recorreu com freqüência à obra de 19 Baena, usando-a como banco de dados, por isso encontram-se inúmeras referências à ela em seu trabalho. É na primeira parte do texto, ao narrar os fatos relacionados à proclamação do Vintismo no Pará, que o autor se refere a Filippe Patroni. Nas poucas páginas que lhe dedicou, dividiu sua atuação política em duas fases: a primeira, iniciada com sua chegada a Belém a 10 de dezembro de 1820, após abandonar seus estudos de Direito na Universidade de Coimbra, na qual Patroni teria se empenhado em divulgar os ideais vintistas na Província. Seu objetivo era o de levá-la a aderir ao constitucionalismo português, beneficiando-se do projeto da Regeneração, na esperança de que isto pudesse tirá-la da situação de obscurantismo e atraso secular em que se encontraria; a segunda, em que Patroni, percebendo as intenções hostis das Cortes em relação ao Brasil no período em que permaneceu em Lisboa como Procurador da Província do Pará, dedicar-se-ia a propagar ideais independentistas. Nas palavras de Raiol: Sempre que se convoca uma Assembléia Constituinte, apodera-se dos espíritos a fagueira esperança de melhoramentos; e homem há, que aplaudem de ordinário as inovações sem refletir muitas vezes nas suas conseqüências. Felipe Alberto Patroni pensou que as Cortes seriam favoráveis aos seu país natal, e deixando a Universidade de Coimbra, onde estudava, fêz-se de vela na mesma galera Nova Amazonas; e chegado ao Pará, constituiu-se defensor do novo sistema constitucional que a Metrópole pretendia estabelecer com o apoio dos portugueses, por parecer dar seguras garantias às liberdades pátrias” (1970, p. 14 e 15). Para o autor, o entusiasmo que tomou conta de Patroni quando da proclamação do constitucionalismo em Portugal, levou-o a acreditar que isso poderia também significar progresso e desenvolvimento para o Pará e a aderir irrefletidamente ao movimento, sem ter noção de suas conseqüências. Raiol não faz qualquer referência às acusações de Baena de que a ação de Patroni era movida por uma grande ambição política, que o levou a propor a Junta Provisória Provincial a eleição de um deputado extraordinário as Cortes de Lisboa e a se insinuar como a pessoa talhada para o cargo. Ao contrário, atribuiu a sua atuação à um sentimento eminentemente patriótico e desinteressado. Embora acuse Baena de tendenciosidade, Raiol repõe os seus juízos de valor sobre a ação de Patroni nos acontecimentos ocorridos no Pará, entre 1820 e 1823, mas dando-lhe um novo significado. Na opinião de Raiol, a desilusão com as intenções recolonizadoras das Cortes de Lisboa em relação ao Brasil teriam convencido Patroni “de que nada havia que esperar da metrópole” e a “começar a preparar os ânimos de seus conterrâneos para a grande obra da emancipação de sua pátria” (1970, p. 19). Através da circular presumivelmente encontrada em poder dos Irmãos Vasconcelos, cuja autoria Raiol não tem dúvida ser de Patroni, este concitava os paraenses a imitar o exemplo dado por Pernambuco, em 1817, e prometia para breve o seu regresso. Assinala o autor 20 que, de volta a Belém, em janeiro de 1822, Patroni iniciou a publicação de “O Paraense” - o 1º jornal editado na Província -, “no qual começou a fazer severa análise à administração dos negócios públicos, esforçando-se por desenvolver certas opiniões políticas entre os seus conterrâneos, opiniões por certo favoráveis ao regime livre dos povos, mas de alguma forma ameaçadoras do sistema até então seguido pelos agentes do poder” (1970, p. 23). Em “Adesão do Grão-Pará À Independência e Outros Ensaios”, publicado em 1922, João de Palma Muniz, engenheiro e 1º Secretário do Instituto Histórico e Geográfico Paraense, procurou resgatar a importância do processo de adesão do Pará à independência dentro do contexto nacional e recuperar a verdade histórica dos acontecimentos. Palma Muniz acreditava que o tempo confere ao historiador o domínio do passado, pois um século depois dos acontecimentos, já icineradas as paixões coevas, extintos também os interesses individuais, que sempre atuam para empanar o brilho da verdade histórica, pode fazer-se serena narrativa dos fatos e isento comentário sobre o que escreveram os autores contemporâneos; e à luz dos documentos deixados pelos que intervieram, com amor ou forçosamente, nos acontecimentos, estudá-los com imparcialidade, concatená-los e dar ao futuro historiador dos fatos paraenses uma coletânea de documentos, que lhe permitam, sobre o período de 1820-1823, fazer exposição certa e crítica eficiente (1973, p. 16). O autor propõe-se a privilegiar o “fato singular” ou “acontecimento”, pois considerava-o como irrepetível e individual, e como agente criador de mudanças. Desse modo, os documentos, considerados como espelhos da realidade, se transformam em prova inconteste dos fatos históricos, cabendo ao historiador recolhê-los - já que nos documentos tais fatos se encontram de forma transparente -, concatená-los numa cadeia linear de causalidade e efeito, para poder apresentá-los numa síntese. A “imparcialidade” ou “objetividade” deve se constituir numa postura indispensável do historiador, que quanto mais distante estiver dos acontecimentos, mais fiel será na sua narração. O estudo de Palma Muniz inicia pelo Movimento de 1º de janeiro de 1821, considerado como de fundamental importância no processo que culminou com a adesão do Pará à independência, já que teria lançado a semente dos ideais independentistas, despertando a Província de séculos de adormecimento. Segundo o autor: ... não se pode pôr em dúvida que as idéias do sistema constitucional vieram desadormentar o povo do Grão-Pará, nas suas classes mais cultas, permitindo desenvolverem-se os primeiros sintomas do nativismo, que logo tendeu para a conquista dos postos da administração pública, pretendendo a exclusão do elemento reinol. A semente então lançada germinou e produziu o fruto das idéias de independência, em período relativamente curto, logo que a imprensa surgiu em conseqüência das primeiras concessões libertárias(1973, p. 29). 21 Na opinião de Palma Muniz, o Movimento de 1º de janeiro de 1821 trazia em si, potencialmente, o germe dos ideais emancipacionistas, na medida em que teria despertado a elite local para questões prementes, como a do monopólio português dos cargos públicos. O autor classifica os participantes do referido movimento em três espécies: os das idéias, os conspiradores e os executores. Filippe Patroni foi enquadrado na primeira espécie, pois, apesar de ter sido o principal propagador dos ideais vintistas no Pará, não teria tido participação ativa nos atos políticos que consumaram a proclamação do constitucionalismo português na Província. Ao se referir ao constitucionalismo difundido por Patroni no Pará, Palma Muniz afirma que, num primeiro momento, não apresenta teor independentista, pois o projeto de Regeneração por ele concebido para a Província estaria subjacente à permanência dos vínculos entre Brasil e Portugal, embora reivindicasse igualdade de direitos para os portugueses dos dois hemisférios: “um só rei, uma só Constituição para os reinos unidos do Brasil e Portugal” (1973, p. 18). Quanto a tão propalada ambição política de Patroni, o autor afirma não ter encontrado na documentação nenhuma prova “de haver esse patriota tentado fazer parte do governo interino da Província”. Mesmo assim, ao se referir a carta enviada por Patroni ao Senado da Câmara, onde sugeriu que “o Senado com a Junta Provisória convoquem as pessoas de caráter, e por uniforme vontade se elejam vinte ou trinta eleitores, os quais com madureza e pensada deliberação escolham um deputado, cujas qualidades devem ser “Ciência”, “Probidade”, “Religião” e mais de tudo Amor a Pátria” - carta que para alguns historiadores evidenciaria as pretensões políticas de seu autor -, Muniz não considera “que isso pudesse constituir um crime em um jovem talentoso, cheio de esperança e de patriotismo, como o ilustre paraense, muito embora o seu temperamento ardoroso, não refreado ainda pela experiência” (1973, p. 64 e 64). Observa Muniz que a nomeação de Patroni para a função de Procurador dos interesses do Pará junto as Cortes teria se constituído num fato decisivo para a evolução dos acontecimentos no sentido da independência. Argumenta que: a ida de Patroni para Lisboa concorreu para o apressamento da introdução da imprensa em Belém, deu azo ao patriota de verificar quais as idéias predominantes, em relação ao Brasil, nas Cortes Portuguesas, permitiu-lhe transformar as suas idéias de constitucionalismo subordinado a Portugal em idéias de emancipação política e independência; fê-lo regressar à sua pátria com tendências de realizar uma revolução separatista (1973, p. 73). É nesse sentido que, para Muniz, a atuação política de Patroni adquire relevância, já que abriu caminho para o processo que integraria o Pará ao Império Brasileiro. Depois de Palma Muniz, outros autores paraenses, sempre ligados ao Instituto Histórico e Geográfico Paraense, produziram obras sobre os acontecimentos ocorridos no Pará, entre 1821 e 22 1823, recorrendo a sua obra e as de Baena e Raiol como banco de dados. Embora se propusessem a reelaborar as interpretações dos três autores, na verdade repuseram-nas, cristalizando-as como verdades históricas. Em 1971, Vicente Salles publicou um estudo, intitulado “O Negro no Pará sob o regime da escravidão”, em que pretendeu analisar a sociedade escravocrata do Norte do Brasil, a partir da presença do negro “como força de trabalho, como fator étnico, como elemento plasmador da cultura amazônica; o negro agindo e interagindo neste contexto - suas lutas e vicissitudes”. Em um breve capítulo onde analisa a participação dos negros nas lutas sociais ocorridas na Província, Salles fez algumas referências à atuação política de Filippe Patroni, procurando demarcar a distância entre sua análise e as anteriores. Afirmou que a atuação política de Patroni, ao contrário da linearidade e coerência que lhe tem sido atribuída nos trabalhos que precederam o seu, caracterizou-se por inúmeras contradições, que acabaram por reduzir a sua importância nos acontecimentos históricos dos quais participou. Ao mesmo tempo em que reconhece ter sido Patroni o primeiro a formular os princípios ideológicos que nortearam a ação da facção nacionalista provincial, considera sua atuação política “desastrosa”, “inconseqüente”, “individualista”, resultado de um oportunismo político exacerbado, que o fazia separar o seu pensamento de sua ação. Observemos o que diz Salles: Patroni, na sua ação política, tinha qualquer coisa de caudilhesco, imperativo e arbitrário. A causa era superior à sua personalidade. Assim foi fácil multiplicar os sectários. Mas estes logo perceberam seu oportunismo e a liderança escapou do seu controle... Todavia, o jovem Patroni contribuiu com suas idéias para despertar, em outros, uma consciência de luta. Dois fatos, pelos menos, merecem destaque: a carta que enviou de Lisboa pelos Irmãos Vasconcelos, um documento realmente revolucionário, e a fundação da imprensa no Pará... (1970, p 248). A leitura do trabalho de Salles evidencia que sua proposta teórico-metodológica aponta para a tentativa de utilização das categorias do materialismo histórico, o que o levou a adotar em sua análise a perspectiva da luta de classes. No entanto, o tratamento esquemático dado pelo autor a estas categorias, levou-o a repor freqüentemente explicações já recorrentes, como as que dissociam idéia e ação, procedimento que transforma as idéias em entidades que, independentemente dos seus autores, interferem na realidade histórica. É partindo dessa premissa que Salles afirmou terem as idéias de Patroni contribuído para despertar, “em outros”, uma consciência de luta. Em “Poder e Independência no Grão-Pará. 1820-1823”, de 1975, Mário Barata retomou o tema da adesão do Pará à independência, “considerando que vários aspectos desse período permanecem mal conhecidos, enquanto um impressionante acervo documental continua inédito nos arquivos” (1975, p. 13). Assinalou o autor que, escrevendo sobre o período após a publicação das 23 grandes obras de Raiol e Palma Muniz, só lhe resta oferecer à historiografia brasileira “várias novas contribuições, com o modesto mas possível passo a frente no conhecimento do passado, em relação às obras fundamentais das gerações de cem anos ou de meio século atrás” (1975, p. 14). Isto, na opinião do autor, se tornou possível pelo fato de ter, em suas pesquisas, encontrado “documentos inéditos importantes para a compreensão do processo histórico estudado ou para a ratificação de uma ou outra informação corrente na bibliografia existente ou para estabelecer a verdade entre assertivas divergentes, em autores importantes” (1975, p. 13 e 14). Barata justificou a ampla citação que faz de textos por ele compilados “diretamente de códices de arquivos”, afirmando que a reprodução dos documentos no seu trabalho constituía-se em fator de fundamental importância, porque “os documentos originais exprimem o fato histórico ao vivo” (1975, p. 16). Barata iniciou seu estudo a partir do marco histórico consagrado pela historiografia - o Movimento de 1º de janeiro de 1821. Ao analisar os antecedentes de tal movimento, o autor assinalou que antes da chegada de Patroni a Belém, já se tinha conhecimento da Revolução do Porto de 1820, sendo isso comprovado pelo Ofício nº 6, datado de 9 de novembro de 1820, do Governo de Sucessão que substituiu o Conde de Vila Flor, Capitão-General da Capitania, a Tomás Antonio Vilanova Portugal. No ofício, a Junta comunicava que “haverá um mês ou mais ou menos que se soube aqui da insurreição de Portugal: era natural fazer esta novidade alguma impressão; assim mesmo há algum sintoma que denote o poder ela alterar-se” (1975, p. 68). Ao mencionar esse documento, o autor pretendia retificar “tudo o que até hoje os historiadores da Independência e da Revolução Constitucionalista no Pará tem afirmado” (1975, p. 67), pois os mesmos consideram ser Patroni o difusor da notícia. Citando as afirmações feitas por Raiol nos “Motins Políticos”, Barata confirmou a relevância do papel desempenhado por Patroni na proclamação do Vintismo no Pará, cuja atuação foi um “elemento catalítico” para o desfecho do movimento, mas acrescentou que a pregação ideológica feita por ele só produziu grande efeito porque já havia na Capitania, antes da sua chegada, “um consenso nas próprias classes dirigentes de que o fim do absolutismo e a mudança das instituições - mesmo moderada - se impunham para garantir os indispensáveis direitos humanos, tornados conquista das nações civilizadas, desde o século XVIII ao menos, e muito mais no albor do XIX” (1975, p. 70). Ao ver as coisas desse modo, Barata homogeneizou as “classes dirigentes”, atribuindo-lhes unidade ideológica e de interesses - contrárias ao absolutismo e imbuídas de ideais iluministas - esmaecendo possíveis divergências políticas internas a essas “classes dirigentes” e conferindo à ação polít ica de Patroni uma natural coerência, despojando-a de qualquer conflito ou contradição. O autor conservou a pecha de loucura lançada sobre Patroni por Baena, porém com uma leitura muito diversa daquela feita pelo mesmo, assinalando que sua atuação política no Pará ocorreu no período em que ele estava “no esplendor de 24 suas qualidades de inteligência, que pouco a pouco infelizmente declinariam pela perturbação mental” que o acometeria após 1835. Em “Cabanagem. A Revolução Popular da Amazônia”, de 1986, Pasquale Di Paolo se propôs a resgatar o sentido eminentemente popular do movimento, recorrendo, para isso, também às categorias analíticas do materialismo histórico. Nesse sentido, afirma o autor que: as inúmeras agitações urbanas ocorridas no Pará no século XIX, tiveram como epílogo a Cabanagem, que, muito mais que um simples motim político, constituiu- se numa sangrenta luta de classes, já que o caboclo paraense identificou na luta armada um meio de reformulação das estruturas básicas da sociedade. A Cabanagem é revolução por ter sido um movimento histórico de conquista do poder pela base e pelo vértice-não-dominante, caracterizado pela ruptura com os padrões vigentes e pela abertura para novos horizontes políticos e sociais (1986, p. 367). Torna-se evidente que o autor quer encontrar no Movimento Cabano os indícios de uma tentativa organizada de transformação da sociedade paraense pela base e, por isso, utiliza-se de categorias marxistas, como “revolução”, “classe”, deslocando-as no tempo, destruindo sua historicidade e procurando moldar a realidade estudada a elas. Desse modo, propõe-se Di Paolo a fazer a “história do povo”, rompendo com aqueles que reduzem a história “a relatos - excessivamente descritivos - que visam satisfazer a curiosidade ou homenagear determinados personagens” (1986, p. 15). Esse tipo de historiografia é elitista, “pois ignora a “outra história”, a história do povo” (1986, p. 15). Ao analisar as lutas pela independência política e social da Amazônia, Di Paolo se referiu à atuação política de Filippe Patroni, classificando-o de patriota idealista e assinalando que as “grandes causas políticas de sua vida pública foram: independência, abolição e república” (1986, p. 89). Além de repor as imagens de independentista e abolicionista desenvolvidas pela historiografia por ele denominada descritiva, episódica e laudatória, o autor criou mais um traço para a figura histórica de Patroni: a de “republicano”. Ângela Maroja Silveira publicou, em 1986, os primeiros resultados de sua pesquisa sobre o ideário patroniano, num pequeno ensaio intitulado “O Pensamento Político de Filippe Patroni”, o qual tem como objetivo maior a tarefa de tirar o pensamento político de Patroni do ostracismo a que foi condenado pela historiografia das idéias políticas que constituíram o arcabouço ideológico conformador do Estado Imperial Brasileiro. O trabalho de Silveira pode ser visto como uma tentativa de desmontagem do discurso patroniano, procurando compreendê-lo por dentro, embora a autora tenha concentrado seu interesse nas obras produzidas por Patroni no período posterior ao que estamos tratando, e que contém idéias relacionadas à um outro contexto histórico, em que a independência brasileira já era um fato consumado. 25 A propósito do halo de loucura que envolve a figura de Patroni, Silveira atribuiu ao próprio personagem parte da responsabilidade, alegando ser ele resultado da utilização em seus discursos de simbologias extravagantes, como a do fogo presente num discurso proferido por ele ante as Cortes de Lisboa, em abril de 1821. Ao comentar o conteúdo ideológico desse discurso, a autora lhe confere “ressonâncias iluministas”, considerando-o como repetidor de “uma tendência da época que vemos aflorar no Discurso sobre as Ciências e as Artes de Rousseau ou nas Cartas Inglesas (Sobre Descartes e Newton) de Voltaire”, tendência essa relacionada ao exercício do poder político por aqueles “que falam em nome da “linguagem da razão” e da “voz da natureza” (1986, p. 06). Segundo a autora, a dúvida sobre a integridade mental de Patroni já constava da documentação oficial e constituía uma estratégia política das autoridades provinciais para desacreditá-lo perante a opinião pública local, a fim de neutralizar o incômodo impacto que suas idéias poderiam provocar. O interesse “do grupo que se instalou no poder após o Movimento de 1º de janeiro de 1821, de alijar Patroni da vida política na Província” (1986, p. 07), viabilizou-se através da sua nomeação para a função de Procurador dos interesses do Pará junto a Regência do Reino, o que teria representado uma sutil deportação. Na opinião de Silveira, “não é surpreendente que a figura de Patroni tenha sofrido tantas deturpações e seu pensamento ficado tão esquecido. Não é novidade na história da crítica brasileira prestigiar-se pensadores que não põem em risco a noção de continuidade histórica. Essa tendência que entre nós tenta reduzir a história do Brasil a um processo pacífico, incruento, regado pelo espírito político da “conciliação” (que soube inventar na Constituição de 1824 o Poder Moderador), só poderia abafar um pensamento assistemático, contraditório e que já traz consigo um anarquismo lavar como o de Patroni” (1986, p. 09). “O Vintismo no Gão-Pará: Relações entre Imprensa e Poder (1820-1823)”, tese de doutorado apresentada na Universidade Nova de Lisboa, em 1986, por Geraldo Mártires Coelho e publicada em 1993, com o título Anarquistas, Demagogos e Dissidentes: a imprensa liberal no Pará de 1822, constitui-se no trabalho mais recente sobre os fatos políticos ocorridos no Pará, entre 1820 e 1823. Conservando o Movimento de 1º de janeiro de 1821 como marco inicial do período, o autor aponta como proposta do se trabalho: o estabelecimento de algumas relações entre a processualidade inerente a esse fato, as condições concretas nascidas com as projeções do discurso liberal da Regeneração sobre a sociedade local, e o estabelecimento da imprensa no Grão- Pará como materialização de um dos arquétipos dominantes nesse mesmo discurso (1987, p. 91). Na opinião do autor, a história da Amazônia, entre 1820 e 1850, insere-se num “processo social e político fundado na transição da antiga ordem colonial para as novas condições ditadas pela 26 emancipação política do Brasil, e pela formação do Estado Nacional brasileiro” (1987, p. 92), emancipação essa que teria representado uma mudança política, mas não estrutural, dada a sobrevivência do compromisso com o passado colonial. Foi nesse quadro que Coelho inseriu a atuação política de Filippe Patroni, procurando contextualizar suas idéias e evidenciar os fundamentos teóricos que à matizavam. Acrescentando ao arcabouço documental sobre o período documentos inéditos encontrados no Arquivo Ultramarino de Lisboa, o autor rejeitou as interpretações que atribuem a Patroni ideais independentistas e abolicionistas, e vê sua ação como produto da assimilação do discurso vintista e das contradições geradas pela tentativa de aplicação dessas idéias, por ele reelaboradas, numa situação colonial. Para Coelho, a adesão do Pará ao Vintismo português não resultou apenas do proselitismo político desenvolvido por Patroni, mas, também, da conjuntura econômica, política e mental provincial, que teria condicionado o reconhecimento pela pequena burguesia local do novo estado de constitucionalismo instaurado em Portugal pela Revolução do Porto de 1820. Essa conjuntura seria marcada pelo declínio econômico da Província - acelerado, a partir de 1808, com a vinda da Corte para o Brasil - pela sucessão de governos corruptos e autoritários, e pela presença de uma “inteligentsia” conhecedora da ideologia iluminista, na sua expressão vintista. Segundo Coelho, “a inteligentsia provincial já tinha conhecimento das matrizes da retórica vintista (...) antes mesmo da Capitania reconhecer a instauração de um estado de constitucionalismo em Portugal” (1987, p. 102). Acrescentou que, para Patroni, a proclamação do Vintismo no Pará não representaria a quebra do vínculo entre a Província e a Metrópole, pois a transposição do projeto regenerador português para o Pará só se viabilizaria com a conservação de tal vínculo. Concluiu o autor que: o discurso que (se) desenvolveu nos meios da pequena burguesia local não comportava qualquer forma de “inconfidência” para com o poder metropolitano. Em outras palavras, a ação arquitetada por Patroni contribuiu para que o Vintismo fosse aceito pelos militantes políticos e pelos comandantes militares do Grão-Pará, como procedimento necessário para que a Capitania, integrada por identidade de objetivos com o constitucionalismo metropolitano, pudesse “regenerar-se” por meio de mudanças que as idéias estruturantes do Vintismo apontavam serem necessárias à economia e à sociedade (1987, p. 96). Desse modo, embora pontue a distância de seu trabalho em relação aos anteriores, considerando que o acesso a uma documentação inédita encontrada no Arquivo Ultramarino Português lhe possibilitou uma melhor compreensão dos fatos, Coelho repõe a visão unifacetada do processo político analisado, privilegiando uma das possibilidades por ele apontadas e um momento da luta político-ideológica, em que uma fração da elite dominante acreditava ser a Regeneração a solução para os problemas da Província do Pará. Em outras palavras, apesar de sua análise resgatar 27 a acirrada luta política pelo poder travada na Província, essa luta decorreria do fato de terem as frações da elite dominante feito leituras diferentes do discurso vintista. Ou seja, o autor contemplou, em sua análise, apenas um dos elementos do intrincado jogo político, no qual diversos projetos foram sendo construídos, apontando para múltiplas possibilidades de resultado do processo histórico. Coelho enfatizou a condição de Patroni de introdutor da imprensa no Pará, com a publicação do jornal “O Paraense” (1822), ressaltando que a instalação da imprensa na Província significava a transposição do principal arquétipo do discurso vintista - a liberdade de expressão. Na visão de Patroni e do próprio autor, a imprensa seria o componente que viabilizaria o seu projeto político de assumir o poder no Pará. Sua proposta era de um governo “voltado para a criação de uma administração esclarecida pelas “luzes” do tempo, razão pela qual a idéia de (levá-la) para o Grão- Pará era inerente a esse projeto, e dizia respeito à necessidade de instrumentalizar a execução dessas mesmas “luzes”, haja vista a posição que os vintistas conferiam à imprensa como parte necessária da própria administração pública” (1987, p. 132 e 133). Acrescentou o autor que a introdução da imprensa no Pará também não representou uma simples “projeção mecânica do vintismo no norte do Brasil”, nem a “transposição linear das idéias de 1820 para aquela Província de Portugal no Brasil”, mas o produto organizado da forma pela qual Filippe Patroni assimilou as estruturas ideológicas do vintismo, e como buscou materializar essas estruturas através da síntese de sua própria processualidade - a palavra, veículo pelo qual a Regeneração organizou e conferiu substância ao ideário burguês do progresso, da ciência, da liberdade, da tolerância, em síntese, das “luzes” do século XVIII que fundamentavam a visão de mundo dos liberais vintistas (1987, p. 165). Na opinião de Coelho, o sentido eminentemente crítico imposto por Patroni à linha editorial de “O Paraense”, conferindo à imprensa o papel de porta-voz da opinião pública na defesa dos interesses da comunidade junto ao poder público, transformou o jornal em um espaço aberto à crítica da administração provincial. Isto fazia com que, freqüentemente, aparecessem matérias que questionavam a eficiência da gestão colonial na Província, fazendo com que as autoridades locais atribuíssem ao seu editor ideais independentistas, vinculando-o ao projeto emancipacionista que se desenvolvia nas províncias do Centro-Sul do Brasil. As abordagens feitas sobre a participação de Patroni no processo que culminou com a independência do Grão-Pará privilegiaram sua atuação à frente do Jornal O Paraense (entre março e junho de 1822). Todavia, o momento mais elucidativo de seu desempenho individual aconteceu antes, em 1821, quando participou das Cortes Portuguesas como representante (não oficializado) da Junta Provisória de Governo, designada em janeiro de 1821, quando da proclamação da adesão da 28 Capitania ao vintismo. Ali Patroni demonstrou todas suas habilidades políticas, instrumentalizando os recursos do discurso liberal no sentido da realização de um ambicioso projeto próprio - o de tornar-se Governador do Pará. Foi nesse período que o impetuoso acadêmico descreveu, quando se deu conta que seus planos haviam se frustrado, um percurso estonteante: de fiel defensor do vintismo, foi, à medida que as Cortes também se tornavam mais conservadoras, com o retorno do Rei a Portugal e o afastamento dos grupos liberais mais radicais, admitindo a hipótese de, no limite, realizar a autonomia do Pará rompendo com Portugal, por meio de uma revolução da independência. Embora produzidas em tempos históricos diferentes, o que lhes atribui uma historicidade que reflete o contexto em que foram escritas, as obras analisadas criticamente neste trabalho repõem, de forma recorrente, a imagem produzida sobre Fillipe Patroni pelos documentos, cujos autores, no calor da luta política travada no Grão-Pará na primeira metade do século XIX, foram transformando Patroni num independentista, abolicionista e republicano. Essa memória foi apropriada pela historiografia aqui comentada e transformada em história. Apesar de se constituir no elemento a partir do qual o historiador constrói a sua explicação sobre o passado recente ou remoto estudado e de se constituir num campo de luta, em função de possibilitar múltiplas instrumentalizações políticas, a memória pode pregar peças aos historiadores, caso não estejam atentos ao que ela representa: reminiscências, rastros do passado, com os quais devemos estabelecer uma relação de estranhamento, já que foram produzidos em um tempo e em um espaço diferentes dos do historiador. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BAENA, A. L. M. Compêndio das Eras do Pará. Belém: Editora da UFPa., 1970. 2. RAIOL, Domingos A. Motins Políticos. Belém: Editora da UFPa., 1970. 3. MUNIZ, João Palma. Adesão do Pará à Independência e outros ensaios. Belém: Conselho Estadual de Cultura, 1973. 4. SALLES, Vicente. O Negro no Pará. Belém/Rio de Janeiro: UFPA./Fundação Getúlio Vargas, 1971. 5. BARATA, Mário. Poder e Independência no Grão-Pará. 1820-1823. Belém: Conselho Estadual de Cultura, 1975. 6. PAOLO, Pasquale Di. Cabanagem. A Revolução Popular no Pará. Belém: Conselho Estadual de Cultura, 1986. 29 7. MAROJA, Ângela, O Pensamento Liberal de Filippe Patroni. Belém: Editora da UFPa., 1986. 8. COELHO, Geraldo Mártires. Anarquistas, Demagogos e Dissidentes: a imprensa liberal no Pará de 1822. Belém: Cejup, 1993. 30 31 A “invisibilização dos caboclos”: o pensamento pseudorracista oitocentista e o projeto republicano na Amazônia Karl Heinz Arenz Faculdade de História/UFPA Resumo O projeto republicano, no intuito de levar a cabo a modernização do Brasil, com base na lógica racional do positivismo, negou aos povos indígenas e às populações rurais de matriz ameríndia uma participação ativa. Na Amazônia, região com a maior concentração de índio-descendentes, dentre os quais os chamados “caboclos”, mas também cenário de uma das mais extensas expansões econômicas no último quartel do século XIX, a marginalização desses últimos foi sistemática. O pensamento pseudorracista, então em voga, e a manutenção do princípio tutelar na política indigenista pela jovem República contribuíram para este processo de “invisibilização” que o presente artigo se propõe a analisar. Palavras-chave: caboclos, pseudorracismo, integração, República, Amazônia Abstract: The Republican project, in order to carry out the modernization of Brazil, based on the rational logic of positivism, denied the Indigenous peoples and the rural populations of Amerindian origin an active participation. In the Amazon, region with the highest concentration of Indian descendants, among them those known as Caboclos, but also scenario with one of the most extensive economic expansions in the last quarter of the nineteenth century, the marginalization of the latter was systematic. Pseudo-racist thought, then in vogue, and the maintenance of the tutelary principle in indigenous affairs by the young Republic contributed to this process of “invisibilization” that the present article intends to analyze. Key words: Caboclos, pseudo-racism, Integration, Republic, Amazon region Resumen: El proyecto republicano, con el fin de llevar a cabo la modernización de Brasil, basado en la lógica racional del positivismo, negó a los pueblos indígenas y a las poblaciones rurales de matriz amerindia una participación activa. La Amazonia, región con la mayor concentración de indio-descendientes, entre ellos los que son conocidos como caboclos, pero también área de una de las más largas expansiones económicas en el último cuarto del siglo XIX, la marginación de estos últimos fue sistemática. El pensamiento pseudo-racista, entonces muy difundido, y el mantenimiento del principio de tutela en la política indígena de la joven República contribuyeron a este proceso de “invisibilização” que este artículo tiene como objetivo de analizar. Palabras clave: caboclos, pseudo-racismo, integración, República Amazonía Introdução O projeto republicano que se articulou no Brasil, desde o início da década de 1870, não previu uma modificação ou revogação das medidas anteriores referentes às populações indígenas do país. Ao contrário, manteve-se uma política de confinamento, integração e assimilação, parecida àquela que já havia sido praticada nos tempos colonial e imperial. Como não bastasse, a lógica inerente à filosofia positivista, base teórica do projeto republicano, e a aplicação do evolucionismo 32 de Darwin ao pensamento social deram às teorias racistas, amplamente difundidas na segunda metade do século XIX, um status “científico”. A reflexão de muitos intelectuais e a fundação de novas instituições, como os museus de História Natural ou as escolas de Medicina e Direito, contribuíram, para divulgar estas ideias no Brasil (Schwarcz, 1993; Cunha, 1992). Assim, o pensamento pseudorracista do médico Raimundo Nina Rodrigues é produto desta conjuntura político-intelectual. Telmo Renato da Silva Araújo (2007, p. 110) observa a respeito: Com a proclamação da República (1889), no Brasil, nascem novos paradigmas para a construção da identidade nacional. Seus intelectuais tentaram forjar, desvendar e qualificar esses paradigmas. É nesse contexto que a influência de Nina Rodrigues se fez presente e que se concretizou na formação de uma “escola”, na qual se encontram aqueles que compartilharam a idéia de que o conhecimento do corpo humano e das formas que o constituem eram fundamentais para entender as “raças”. No que diz respeito aos indígenas e às populações tradicionais de matriz ameríndia daquele tempo, manteve-se a divisão em grupos e indivíduos, uns supostamente em vias de assimilação e outros tidos como incivilizáveis. O “grau de civilização” foi, portanto, o critério fundamental para medir a suposta capacidade de integração como sujeito dócil e útil na sociedade nacional. Na verdade, durante muitos anos, o fundadores e teóricos da República deram relativamente pouca atenção à “questão indígena”. Só no contexto de novas expansões para os vastos interiores do país, como aquela impulsionada pela crescente produção da borracha na Amazônia, no final do século XIX, surgiram novas discussões acerca de uma política pública em relação aos povos nativos da terra. Os debates encontraram um certo fecho com a fundação do Serviço de Proteção ao Índio, em 1910, mas a momento algum questionou-se o princípio do antigo regime tutelar (Lima, 1992, p. 155-156). Este, implantado desde os primórdios da colonização, encontrou uma continuidade enquanto “paradoxo ideológico”, conjugando práticas protetivas com mecanismos de repressão e dominação (Oliveira, 2006, p. 117). A mesma ambiguidade marcou, embora não institucionalizada como no caso dos índios, a relação das autoridades e elites com as chamadas populações tradicionais, muitas vezes, compostas por mestiços. No que diz respeito à Amazônia, a região brasileira com a maior concentração de povos indígenas e grupos de matriz ameríndia, a questão da integração destas populações nativas ao projeto colonial e, posterior, nacional se colocou como uma questão vital. No entanto, a Cabanagem e as campanhas de retaliação que a seguiram (1835-1840) puseram fim aos esforços integracionistas, engendrando, antes, um crescente “estranhamento” entre a minoritária elite branca e a grande massa de índio-descendentes, além de outros grupos étnicos marginalizados. De fato, Magda Ricci (2010, p. 159) observa, referindo-se aos impactos do movimento revolucionário nos 33 interiores do Pará, que os cabanos “deixaram trás de si uma Amazônia cabocla que exaltava o poder das novas lideranças [populares]”. Anos após as lutas sangrentas, nem sequer uma nova conjuntura econômica – a do boom da borracha –, acompanhado pela chegada maciça da mão de obra nordestina, entre 1870 e 1910, conseguiu reaproximar as populações tradicionais que ficaram ainda mais marginalizadas. Com base nessas observações, visa-se, no presente artigo, analisar o processo de “invisibilização” da população ribeirinha de origem ameríndia, genericamente conhecida como “caboclos”. Em um primeiro momento, procura-se elucidar os diferentes termos que surgiram para designar os indígenas “atrelados”, durante os séculos XVII e XVIII, ao projeto colonial mediante uma rotina de catequese e trabalho compulsório. Em seguida, já referente ao século XIX, enfoca-se um texto de José Veríssimo sobre as populações indígenas e mestiças da Amazônia, redigido e publicado às vésperas da Proclamação da República, na perspectiva pseudorracista então corrente. Enfim, num terceiro momento, atenta-se para o desenvolvimento posterior da situação social dos ribeirinhos amazônicos, sistematizando as reflexões a seu respeito nas diferentes fases da história da República. Caboclos e índios cristãos no período colonial Antropólogos, sociólogos, linguistas e historiadores não fornecem uma definição consentida do termo “caboclo” enquanto etnônimo. Sobretudo, seu uso variado em contextos específicos, além do teor discriminatório, estereotipado ou meramente polêmico que lhe é inerente dificultam qualquer unanimidade. A mesma estende se também à etimologia do termo. O economista amazonense Samuel Isaac Benchimol (2009, p. 25) deriva-o, com referência ao geógrafo e historiador baiano Theodoro Fernandes Sampaio (1855-1937), do vocábulo tupi caa-boc, que significa “tirado ou proveniente do mato”, destacando, assim, o habitat supostamente natural como critério primordial para identificar o morador tradicional do interior da Amazônia. Não obstante, o emprego do termo suscita polêmicas, tanto entre as populações concernidas quanto entre os cientistas que as estudam. O antropólogo franco-brasileiro Florent Kohler (2009, p. 43-45) constata que, enquanto “caboclo” é corriqueiramente aplicado “na intimidade”, a expressão mais recente “ribeirinho” representa uma “designação cômoda”, por ser isenta de qualquer conotação depreciativa. Também sua colega brasileira Deborah de Magalhães Lima (1999, p. 29) sublinha que a denominação “caboclo” não condiz mais com as formas como “‘eles’ mesmos se apresentam/representam”, mas ela admite que termos novas, como “trabalhadores rurais”, “ribeirinhos” ou “pequenos agricultores”, também contêm “algumas incongruências”. 34 Mas, apesar da falta de marcadores de identidade claramente definidos e o uso de diversas alcunhas no decorrer da história, não se contesta o fato de que o termo “caboclo” está diretamente associado às populações ribeirinhas que tradicionalmente habitam as várzeas do rio Amazonas e de seus afluentes, embora, no decorrer das últimas décadas, um grande número de integrantes destas comunidades rurais tenha se instalado nas áreas periféricas das cidades. Esses deslocamentos recentes resultam da rápida urbanização e de seus impactos no mundo rural. Embora constituam, numericamente, uma população considerável, os ribeirinhos de matriz ameríndia encontram-se, nas estatísticas demográficas oficiais subsumidos na categoria “pardos”. Esta opacidade oficial se deve também ao fato que, durante muito tempo, eles foram percebidos pela sociedade circundante como indivíduos “incompletos”, tanto em termos étnicos, pois tidos como índios não genuínos, quanto políticos, porque vistos como pessoas deficitariamente “civilizadas” ou integradas. Na definição de seu status social, prevalecem até hoje fatores ecológico-culturais que os imaginam quase exclusivamente como moradores das beiradas e várzeas, vivendo em pequenos núcleos isolados e estagnados em decorrência de um sistema relacional endogâmico e um regime econômico de autarquia comunitária (Nugent, 1993; Harris, 1996). Historicamente, a termo “caboclo” é documentado desde meados do século XVIII. O jesuíta alemão Johannes Joseph Breuer, missionário residente na aldeia de Ibiapaba, escreve, em 9 de dezembro de 1747, isto é, na fase final dos aldeamentos religiosos, que os índios “brasilianos” poderiam ser divididos em duas categorias: “em os Cabocullos ou Tabajaras, o que significa: Senhores da Aldeia, e em Tapuyas, o que significa Bárbaros”. Na mesma missiva, o padre fornece um indício de que os dois grupos já se conceberam como diferentes, pois “se misturam raramente, exceto na minha missão” (apud Stöcklein et al., 1761, p. 30-31). Conforme esta informação, os próprios índios teriam incorporado a diferenciação entre índio “manso” e “bravo” estabelecida pelos colonizadores. Pouco depois, a introdução das reformas sociopolíticas e econômicas do Marquês de Pombal constitui um novo contexto no qual o termo é citado. O alvará régio de 4 de abril de 1755 o divulga, diferente da carta inaciana, no sentido de “mestiço”. Esta lei que decretou a igualdade de todos os indígenas do Estado do Grão-Pará e Maranhão em relação aos vassalos reinóis, proíbe que os filhos de pais brancos e mães índias, como também os seus descendentes, fossem chamados “com o nome de caboucolos, ou outro similhante” (apud Varnhagen, 1857 p. 243). A interdição categórica de termos depreciativos fez parte do esforço da Coroa de emancipar o grande contingente de trabalhadores indígenas amazônicos já incorporados no intuito de transformá-los progressivamente em colonos (Souza Jr., 1993). De fato, a rotina cotidiana de catequese rudimentar e trabalho compulsório que havia sido instaurada nos aldeamentos sob administração dos missionários (Arenz, 2014), não sofreu 35 modificações significativas com a aplicação do Diretório dos Índios, promulgado em 3 de maio de 1757. No entanto, esta lei-quadro ordenou expressamente tirar dos índios aldeados a “lastimosa rusticidade, e ignorancia, [...], propondo-lhes não só os meios da
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