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Oligopólio na comunicação - Um Brasil de poucos [Vilson Vieira Jr]

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Oligopólio na comunicação: um Brasil de poucos
Durante os debates sobre o funcionamento da TV Digital no Brasil que aconteceram no 
decorrer da Conferência Nacional Preparatória de Comunicações: Uma Nova Política 
para a Convergência Tecnológica e o Futuro das Comunicações, promovida 
recentemente pelas Comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática do 
Senado e Câmara Federal, o diretor da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e 
Televisão (Abert) Evandro Guimarães afirmou acreditar que não existe no Brasil 
monopólio ou oligopólio de emissoras abertas de TV e rádio, uma vez que, segundo ele, 
não são poucos os grupos atuando no setor. De acordo com Guimarães, no país há 458 
emissoras de TV aberta. Desse total, 99 transmitem a programação da TV Globo e 48 do 
SBT. 
Todavia, os argumentos do diretor da Abert são extremamente passíveis de serem 
questionados com diversos estudos e pesquisas realizados ao longo dos últimos anos no 
Brasil, os quais comprovam a existência de oligopólio em âmbito nacional e de 
monopólios regionais, estes praticados por grupos de mídia ligados a grandes redes de TV 
aberta.
Dos anos de 1990 até recentemente, o que se configurou de maneira acentuada foi o 
movimento ascendente de concentração da mídia nacional e a conseqüente redução 
drástica de grupos (em sua maioria, empresas familiares) no controle dos principais 
veículos de comunicação do país. Algo em torno de nove grupos familiares controlavam a 
grande mídia no decorrer da última década: Abravanel (SBT), Bloch (Manchete), Civita 
(Editora Abril), Frias (Folha de S. Paulo), Levy (Gazeta Mercantil), Marinho 
(Organizações Globo), Mesquita (O Estado de S. Paulo), Nascimento Brito (Jornal do 
Brasil) e Saad (Rede Bandeirantes). 
Segundo pesquisadores do assunto, foi detectado um movimento ascendente de 
concentração da mídia nacional nos últimos anos e, por conseqüência, uma redução 
drástica de grupos no comando dos principais veículos de comunicação do Brasil. 
Atualmente, o número de mandatários da grande mídia de abrangência nacional encolheu 
para seis grupos apenas. Isso porque foram retiradas da lista as tradicionais famílias 
Bloch, Levy, Nascimento Brito e Mesquita, que não exercem mais controle direto sobre 
seus veículos de comunicação. Civita, Marinho, Frias, Saad e Abravanel - além dos 
Sirotsky, à frente da Rede Brasil Sul (RBS) nos estados de Santa Catarina e Rio Grande 
do Sul - são os clãs que comandam o oligopólio midiático no Brasil. 
As famílias da comunicação brasileira, uma vez que não enxergam quaisquer limites para 
expandir seus negócios, estendem seus tentáculos às principais modalidades de 
comunicação de massa, e o fazem através das grandes redes de televisão aberta. Como é o 
caso de Globo, SBT e Bandeirantes. Um importante estudo feito em 2002 pelo Instituto 
de Estudos e Pesquisas em Comunicação (Epcom), intitulado Os donos da Mídia, sobre 
os meios de comunicação no Brasil mostra que a essas três redes nacionais, além de 
Record, Rede TV! e CNT, estão aglutinados 668 veículos em todo o país. São 309 canais 
de televisão, 308 canais de rádio e 50 jornais diários. Os chamados “donos da mídia” no 
Brasil, então, são as famílias que controlam as redes privadas nacionais de TV aberta e 
seus 138 grupos regionais afiliados, que são os principais grupos de mídia nacionais. 
No Brasil, são detectados pelo menos quatro tipos de concentração no ramo das 
comunicações. São elas: a concentração horizontal, quando o monopólio e o oligopólio se 
manifestam em um mesmo setor, a exemplo do que ocorre com a TV aberta e paga; a 
concentração vertical, que consiste na integração de etapas diversas da cadeia de 
produção e de distribuição, cujo controle é feito por uma única empresa; a concentração 
em propriedade cruzada, quando um mesmo grupo detém a propriedade de diferentes 
meios de comunicação, como TV aberta e paga, jornal, revista, rádio e internet, por 
exemplo; e o monopólio em cruz, definido pela reprodução, nos níveis local e regional, da 
prática de monopólio e de oligopólio pelos grandes grupos de mídia observados em nível 
nacional. 
Em pesquisa realizada em 2005 pelo Fórum Nacional pela Democratização da 
Comunicação (FNDC), foi concluído um estudo referente às principais redes de televisão 
do Brasil. De acordo com os dados coletados, o sistema brasileiro de televisão é 
composto, atualmente, de 332 emissoras, sendo que 263 estão vinculadas às redes Globo, 
SBT, Record, Bandeirantes, Rede TV! e CNT. Segundo a pesquisa, Globo e SBT 
possuem, respectivamente, 20 e 11 emissoras próprias, o que não é permitido pelo 
decreto-lei 236/67 em seu artigo12, o qual determina que uma mesma entidade só pode 
deter um máximo de 10 concessões de radiodifusão de sons e imagens (TV aberta) em 
todo o território nacional.
Outro estudo, divulgado pelo Epcom em 2006, destaca uma relação direta existente entre 
o poder econômico de uma região e o grau de concentração e de pluralidade dos meios de 
comunicação, o que, consequentemente, leva a uma distribuição extremamente desigual 
no que se refere ao acesso desses meios a toda a sociedade. Quanto mais pobre é a região 
maior é o nível de concentração da mídia, ou seja, menor é o número de agentes que 
detém veículos como rádio e TV, sendo que o Produto Interno Bruto (PIB) está 
diretamente relacionado à quantidade de emissoras de radiodifusão e operadoras de TV 
por Assinatura nos estados. Neste caso, as regiões Sul e Sudeste abrigam, segundo a 
pesquisa, o maior número de emissoras e retransmissoras de TV (cerca de 4 mil, de um 
total de 10.514 no País), 1,6 mil rádios comerciais e educativas (de 4.392 no total), 900 
emissoras comunitárias (de 2.513 em todo o País) e mais da metade das operadoras de 
TVs a cabo (55% das 298 em todo o país).
Outra relevante característica que revela a “vocação” concentradora da estrutura dos 
meios de comunicação no Brasil é a atuação e a influência marcante de um único 
conglomerado midiático em âmbito nacional: a Rede Globo, de propriedade da família 
Marinho. O conglomerado é líder com 223 veículos próprios ou afiliados – mais que SBT 
e Record juntos, em segundo e terceiro lugar, respectivamente. A Globo detém ainda 
33,4% do total de veículos ligados às redes privadas nacionais de TV e controla o maior 
número de veículos em todas as modalidades de mídia: 61,5% de TVs UHF; 40,7% dos 
jornais; 31,8% de TVs VHF; 30,1% das emissoras de rádio AM e 28% das FM.
A maioria dos principais grupos regionais de mídia são afiliados da Globo, e seu 
conglomerado é o único presente em todos os tipos de veículos de comunicação. 
Naturalmente, a Rede Globo de Televisão abocanha mais da metade do mercado 
publicitário brasileiro destinado ao meio televisivo, ou seja, quase 80% do total destinado 
às emissoras de TV aberta, além de liderar os índices de audiência em praticamente todos 
os horários.
Ao deslocarmos o poder da Globo para o nível regional, também é possível constatar sua 
predominância, uma vez que na maioria dos Estados brasileiros as redes de comunicação 
são formadas por duas forças principais – geralmente aliados ao grupo dos Marinho - e 
figuram na posição de líderes nos segmentos de jornal diário, rádio e televisão. A situação 
detectada nos estados por alguns estudiosos é a seguinte: uma emissora de TV, em grande 
parte afiliada à Rede Globo, predomina na audiência local; e a presença de, pelo menos, 
dois jornais diários, sendo que, na maioria dos casos, um deles está vinculado a um canal 
de TV (geralmente afiliado à Rede Globo de Televisão), que é também ligado a uma rede 
de emissoras de rádio AM e FM. Como se não bastasse tamanha penetração nos âmbitosnacional e local, outra constatação é a de que os noticiários em nível nacional veiculados 
por emissoras de rádio e TV da Rede Globo, e também seus jornais, são reproduzidos por 
todos os veículos dessa teia de comunicação então criada localmente.
Ainda no âmbito regional da comunicação, tem-se a presença predominante do grupo 
Rede Brasil Sul de Comunicações (RBS), que abrange os estados sulinos do Rio Grande 
do Sul e Santa Catarina. É o maior conglomerado regional de (multi)mídia do Brasil, 
atuando nos segmentos de TV, rádio, impressos, internet, entre muitos outros ramos da 
economia em geral. Informações disponibilizadas na página da internet da RBS 
comprovam a prática da concentração dos meios de comunicação em propriedade 
cruzada. São 26 emissoras de televisão aberta (afiliadas à Rede Globo de Televisão), e 
duas de âmbito local; sete jornais diários (Zero Hora, Diário Gaúcho, Pioneiro, Diário de 
Santa Maria, Diário Catarinense, Jornal de Santa Catarina e A Notícia); 26 emissoras de 
rádio que atendem a diversos públicos; dois portais de internet; uma unidade corporativa 
multimídia voltada para o agronegócio (RBS Rural), que engloba o Canal Rural, a Rádio 
Rural e o site Agrol, além de um centro de meteorologia e uma empresa especializada em 
gestão rural (a Planejar); uma editora (a RBS Publicações); uma gravadora (a Orbeat 
Music); uma empresa de logística (a ViaLOG); um empresa de marketing para jovens e 
uma fundação de responsabilidade social. 
Recentemente, procuradores da República decidiram entrar com uma ação na Justiça 
Federal, em Santa Catarina, contra a prática de monopólio pela RBS no estado. O grupo 
detém no estado seis emissoras de televisão, o que vai de encontro às leis que regem o 
setor no país (Código Brasileiro de Telecomunicações, de 1962, e o Decreto-Lei 236/67, 
que permitem duas emissoras de TV por estado), além de possuírem três jornais também 
no mesmo estado (A Notícia, Diário Catarinense e Jornal de Santa Catarina). 
Número de jornais denuncia concentração e não traduz diversidade
A crescente concentração da informação no Brasil também se repete no caso dos jornais. 
Um seleto grupo composto pelas Organizações Globo, Grupo Folha, Grupo Estado, Rede 
Brasil Sul (RBS) e Companhia Brasileira Multimídia (CBM) é o responsável pela 
concentração de maior parte de toda a circulação diária de notícias impressas em todo o 
Brasil, algo em torno de 56% de tudo o que é veiculado de informação impressa no país. 
Não obstante, apenas três estados, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, são as 
sedes dessas empresas de mídia. 
Para medir o grau de concentração da propriedade dos veículos de comunicação 
brasileiros, no ano de 2005 foram contabilizados 535 jornais de periodicidade diária em 
todo o território nacional. Deste total, um grupo restrito composto de 10 jornais, 
distribuídos entre os três estados citados acima, lideram o ranking de circulação nacional 
de informação diária (Folha de S. Paulo, O Globo, Extra, O Estado de S. Paulo, Zero 
Hora, Correio do Povo, Diário Gaúcho, O Dia, Lance e Agora São Paulo). No mesmo 
ano, verificou-se uma circulação média diária de 6 milhões e 789 mil exemplares de 
jornais diários no Brasil. Somando a circulação média diária dos dez maiores jornais 
brasileiros, eles respondem sozinhos pela fatia de um milhão 935 mil e 084 exemplares do 
total de impressos em circulação diária no ano de 2005. 
A presença e o poder marcante desses oligopólios de mídia (em especial os que atuam 
também no segmento de impressos) no mercado de comunicação brasileiro são 
constatados também por meio de uma análise breve dos dados de circulação referentes às 
maiores tiragens de jornais entre os anos de 2001 e 2005, divulgados pela Associação 
Nacional dos Jornais (ANJ). Considerando o universo das dez maiores tiragens do país 
durante esse período, em pelo menos três anos consecutivos (de 2001 a 2003) figuravam 
nessa lista os oito jornais de propriedade dos cinco maiores conglomerados de informação 
do Brasil: Folha de S. Paulo, pertencente ao grupo Folha; O Estado de S. Paulo, do grupo 
Estado; Extra, O Globo e Diário de S. Paulo, propriedades das Organizações Globo; Zero 
Hora e Diário Gaúcho, da RBS; e a Gazeta Mercantil, propriedade do grupo CBM. 
A abordagem dos dados nos anos consecutivos (2004 e 2005) confirmam mais uma vez a 
predominância desses veículos e, consequentemente, de seus respectivos proprietários 
sobre os leitores brasileiros, como também a hegemonia que exercem no mercado 
brasileiro de jornais impressos. Nesses dois anos, entre as 10 maiores tiragens 
contabilizadas, verificou-se que sete periódicos pertenciam às mesmas cinco empresas de 
informação detectadas nos três anos anteriores (Folha, Estado, Organizações Globo, RBS 
e CBM). À exceção do grupo Rede Brasil Sul (RBS), que tem sede no Rio Grande do Sul, 
o eixo Rio - São Paulo abriga as cinco demais empresas. 
Como se pode perceber, ainda que na agenda atual do campo da comunicação social 
predomine temas como convergência tecnológica, TV e rádio digital, entre outros, 
questões oriundas do século passado – como a concentração de diversos segmentos de 
mídia em escassos setores ou grupos – ainda permeiam a estrutura do sistema de 
comunicação brasileiro, desafiam a Constituição Federal e as legislações do setor e se 
apresentam como um grande empecilho na luta da sociedade organizada pela 
democratização da comunicação e da informação no Brasil. Vale lembrar que sem meios 
de comunicação democráticos e plurais, tornam-se vazios e falaciosos os discursos da 
liberdade de expressão e da democracia no país. Em suma, existem dados mais que 
suficientes para afirmar que a prática do oligopólio nos meios de comunicação em terras 
brasileiras se configura em uma realidade das mais preocupantes, e que demanda da 
sociedade civil organizada e dos poderes constituídos ações no sentido de conceder um 
caráter verdadeiramente democrático e plural ao setor em sua totalidade. E a realização de 
uma Conferência Nacional de Comunicação ampla, participativa e democrática pode ser 
um importante passo para a conquista de tais objetivos. 
Vilson Vieira Jr.
Jornalista
Referências
01- LIMA, Venício A. de. Comunicações no Brasil: novos e velhos atores. In: Mídia: Teoria e Política. 2. 
ed. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2004, p. 91- 115.
02- ______. Mídia no Brasil: Concentrada e Internacionalizada. In: Mídia: Crise política e poder no 
Brasil. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2006, p. 93- 117.
03- HERZ, Daniel. Quem são os donos da mídia no Brasil. Entrevista a Luiz Egypto. Disponível em: 
<http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/cadernos/cid240420021.htm>. 
04- PITTHAN, Júlia. Pobreza alimenta concentração nas comunicações brasileiras. Disponível em: 
<http://www.fndc.org.br/internas.php?p=noticias&cont_key=54610>. 
05- PROJETO Donos da Mídia. Disponível em: <http://www.fndc.org.br/arquivos/donosdamidia.pdf>.
06- REDES privadas controlam 80% das emissoras de TV. Disponível em: 
<http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=339IPB002>.
07- Informações sobre os jornais de maior tiragem do Brasil de 2001 a 2005 
<http://www.anj.org.br/?q=node/177> e <http://www.anj.org.br/?q=node/13>.
08- Emissoras já fazem experiências com a TV digital.
Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/homeagencia/materias.html?pk=110395>
09- Procuradores da República acusam RBS de monopólio ilegal. 
<http://www.direitoacomunicacao.org.br/novo/content.php?option=com_content&task=view&id=1519>

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