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Urbanização e Meio Ambiente Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Dra. Vivian Fiori Revisão Textual: Profa. Esp. Márcia Ota Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente • Introdução • Processo de Urbanização no Brasil • A Formação das Redes Urbanas Conurbadas e das Regiões Metropolitanas • As Concepções Sistêmica e Crítica e a Interface Urbano-Ambiental · Discutir as diferentes concepções sobre urbanização e meio ambiente; · Evidenciar algumas problemáticas urbano-ambientais no Brasil. OBJETIVO DE APRENDIZADO Nesta Unidade, vamos aprender um pouco mais sobre o processo de urbanização brasileira, bem como algumas concepções sobre questões urbano-ambientais. Procure ler, com atenção, o conteúdo disponibilizado e o material complementar. A leitura é um momento oportuno para registrar suas dúvidas; por isso, não deixe de registrá-las e transmiti-las ao professor-tutor. Além disso, para que a sua aprendizagem ocorra num ambiente mais interativo possível é fundamental assistir às videoaulas e realizar as atividades propostas de fórum e sistematização. Cada material disponibilizado é mais um elemento para seu aprendizado. ORIENTAÇÕES Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente UNIDADE Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente Contextualização Como se observa na tabela 1, de “População total e urbana do Brasil”, desde os censos de 1940 até 2010, a população brasileira foi crescendo, mas já em ritmos menores, principalmente entre 1991-2010. Tabela 1: População total e urbana no Brasil Ano do Censo População Total População Urbana Índice de Urbanização Índice de Crescimento Populacional 1940 41.326.000 10.891.000 26,35 % 33,46 % 1950 51.944.000 18.783.000 36,16 % 25,7 % 1960 70.191.000 32.004.817 45,52 % 35,13 % 1970 93.139.000 52.904.744 56,80 % 32,69 % 1980 119.099.000 82.013.375 68,86 % 27,87 % 1991 150.400.000 110.875.826 73,80 % 26,28 % 2000 169.799.170 137.755.550 81,0% 15,6 % 2010 190.732.694 160.925.792 84,0 % 12,3 % Fonte: Séries Históricas, IBGE. Censos Demográficos, IBGE. Elaborado por Vivian Fiori, 2015. Já a população urbana e o índice de urbanização também foram se ampliando, alcançando 84% em 2010. Isso significa que, hoje, a maior parte da população brasileira vive em áreas urbanas. Cabe ressaltar que algumas dessas áreas, do ponto de vista da existência real, não são tão urbanas assim, principalmente no caso das sedes de municípios, cuja população é contada como urbana, embora, muitas vezes, tenham atividades mais relacionadas ao campo. De qualquer forma, o Brasil urbanizou-se e forma cada vez mais redes urbanas de diferentes tipos. Há aquelas formais como as Regiões Metropolitanas, onde há concentrações de população com grandes desigualdades urbano-ambientais em relação às formas de moradia, espaços livres e áreas verdes, entre outras. Leia o texto da disciplina para conhecer mais sobre o processo de urbanização no Brasil ao longo da história. 6 7 Introdução Nesta unidade, vamos abordar algumas concepções sobre a relação sociedade- natureza na perspectiva ambiental crítica e sistêmica, evidenciando que existe uma mediação natural, política, social e técnica na interface entre os processos de urbanização brasileira e a questão ambiental. Traremos, inicialmente, um panorama sobre o processo de urbanização no Brasil e citaremos alguns problemas urbano-ambientais nas cidades brasileiras. Por fim, abordaremos alguns conceitos relativos à questão urbana e também algumas concepções sobre a interface urbano-ambiental. Processo de Urbanização no Brasil Ao longo da história, as formas de ocupação no Brasil foram passando por inúmeras mudanças do ponto de vista social, técnico, político e normativo. Numa primeira fase do período colonial (séculos XV-XVIII), havia poucas cidades e uma urbanização bastante incipiente. No final do século XVIII, devido à descoberta de ouro na região de Minas Gerais, houve um processo de urbanização mais intenso nas regiões de descobertas de minerais, a partir do qual fundaram cidades como Mariana, Sabará, Ouro Preto (antiga Vila Rica), entre outras. Na maior parte do território brasileiro, as atividades econômicas estavam relacionadas principalmente ao campo, com o extrativismo vegetal e animal e, posteriormente, em algumas localidades com agricultura e pecuária extensiva. Só no final do século XIX, novas regiões tornam-se mais importantes economicamente e observa-se um momento da urbanização em torno de algumas atividades econômicas, principalmente na região amazônica, com a borracha e o crescimento urbano de Manaus e Belém e, em São Paulo, com a expansão cafeeira, a partir da qual cresceram ou surgiram várias cidades, incluindo-se a capital paulista. Embora já houvesse uma pequena industrialização no Brasil no final do século XIX e início do século XX, circunscrita principalmente ao estado de São Paulo, somente no governo Vargas (1930-1945), em sua primeira gestão federal, foi colocado em prática um projeto nacionalista que objetivava dotar o território brasileiro de infraestrutura (transporte e energia) e também fomentar a existência da indústria nacional, numa primeira fase de substituição de importações, buscando-se a soberania nacional. Neste governo, houve ênfase na indústria de base ou de bens de produção, caso da siderurgia e da petroquímica, cujos produtos finais servem de base para outras 7 UNIDADE Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente indústrias. Neste período, criaram a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), em 1941, em Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro; a Companhia do Vale do Rio Doce (CVRD), em 1942, originalmente em Minas Gerais e, em seu segundo mandato, Vargas (1951-1954) criou a Petrobrás, em 1953. A existência das ferrovias em algumas cidades brasileiras facilitou a implantação da indústria. Este foi o caso de São Paulo, onde havia o binômio ferrovia-indústria, já que a atividade industrial era instalada próxima às ferrovias, o que facilitava a circulação de matérias-primas e de mercadorias, além do próprio trabalhador. Havia uma relação entre o crescimento da indústria, como motor da urbanização em certos lugares do país, concentrados principalmente na Região Sudeste, nas aglomerações urbanas e no entorno das metrópoles. Após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), houve várias mudanças no mundo que atingem também o território brasileiro. Neste período, sobretudo pós anos 1960, ocorrem novas revoluções técnico-científicas e a expansão das multinacionais para os países subdesenvolvidos latino-americanos, entre eles o Brasil, ocorrendo uma nova fase de industrialização que foi importante para uma nova e crucial fase da urbanização principalmente das metrópoles do Sudeste do Brasil. Importante lembrar que a urbanização mais intensa no Brasil ocorre pós anos 1960 e só após os anos 1970 a maioria da população brasileira passa a viver em áreas urbanas. Nessa nova fase de industrialização, principalmente pós governo JK (1956- 1961), o Brasil privilegiou o modo modal de transporte rodoviário, como forma de integrar as regiões brasileiras, optando por um modal de transporte que ampliou os problemas ambientais no Brasil devido à poluição do ar decorrente da queima de combustíveis. Nesta época, a Região Sudeste, cujos estados mais importantes eram São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, foi a que alcançou maior industrialização, tornando as cidades de Belo Horizonte, São Paulo e Rio de Janeiro atrativas para mão de obra, principalmente de nordestinos. Foi a fase de grande crescimento das grandes cidades e metrópoles, especialmente do Sudeste e também da transferênciada capital do Brasil para Brasília. É essencial ressaltar o papel da indústria automobilística neste período, pois são criados parques industriais, com grandes montadoras automobilísticas, caso da Volkswagen e da Mercedes Benz, ambas multinacionais alemãs, em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. Esta lógica da industrialização incorporou novas áreas do território brasileiro, sobretudo nas regiões Sudeste e Sul do Brasil, intensificando a urbanização e a ampliação dos serviços existentes, mas criando problemas com a poluição de mananciais, contaminação do solo, poluição do ar e sonora em muitas cidades do Sudeste-Sul. 8 9 A região Sudeste, especialmente SP, MG e RJ, que já vinha de um processo de industrialização anterior, foi a região que mais se beneficiou destas novas implantações, atrelado a um processo de urbanização que criou um mercado urbano crescente no país, principalmente no Estado de São Paulo. O eixo Rio-São Paulo, através da rodovia Dutra, as Regiões Metropolitanas de São Paulo e Belo Horizonte (criadas na década de 1970 pelo governo federal) também vão receber várias indústrias multinacionais, devido à existência de atrativos que interessavam a indústria da época, formando parques industriais, forma de disposição mais comum até os anos 1990, ou dispostas no entorno de eixos rodoviários. A urbanização existente no Sudeste foi bastante incrementada pelo processo de industrialização, nesta fase, devido ao binômio rodovia-indústria. Se no antigo processo a ferrovia teve um papel de destaque, agora a rodovia iria induzir a ocupação urbana, a localização dos polos ou parques industriais e também a circulação de mercadorias. Aumentando, assim, a venda de caminhões, ônibus e automóveis. Nesse período (1956-1973), essas cidades ainda possuíam terrenos mais baratos, o que permitia que parte dos que migravam conseguisse trabalho e comprasse pequenos lotes para a construção de suas casas. Geralmente, tais casas eram feitas pelos próprios proprietários, num modelo que se denomina autoconstrução. Trata-se do período predominantemente “fordista”, de indústria de linhas de produção, de execução e montagem e, nestas circunstâncias, foram surgindo, portanto, as periferias, com loteamentos baratos e populares, alguns regulares e outros não. Isso ocorria, por exemplo, na cidade de São Paulo, bem como em Santo André, São Bernardo, São Caetano, região conhecida como ABC Paulista, todas elas inseridas na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). No Brasil, essa situação econômica vai se alterar na década dos anos 1970- 1980, sobretudo pós 1973, pós-crises internacionais do petróleo. Nesse período (1973-1994), houve uma desaceleração econômica no Brasil, que resultou em vários problemas socioeconômicos. Derivam dessas condições o aumento do número de favelas, alta inflação e desemprego. Nesse período, vai haver um crescimento grande das metrópoles, da Região Sudeste. Logo, tornam-se cidades gigantes, em termos populacionais, mas, aos poucos, cada vez mais precárias do ponto de vista da urbanização. Nos anos 1970, o governo federal criou 9 Regiões Metropolitanas no Brasil. A ideia, no período, era que algumas questões como abastecimento de água, resíduos sólidos, entre outros, pudessem ser definidas no âmbito regional; por isso, a criação das Regiões Metropolitanas, formalmente: 9 UNIDADE Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente No Brasil, foram criadas, na década de 70, nove regiões metropolitanas: Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. Não resta dúvida de que se tratava de reconhecer, formalmente, a existência de metrópoles de fato. Mesmo Belém, cuja região metropolitana era, à época, restrita a dois municípios (além de Belém, Ananindeua) e não possuía complexidade lá muito grande, apresentava grande centralidade, pois sua hinterlândia (região de influência) se espraiava pela imensa área da Amazônia. A razão desse reconhecimento formal das metrópoles era dupla: explicitamente, tornar mais racional, sob o ângulo econômico, a prestação dos chamados serviços de interesse comum, isto é, serviços que interessam a mais de um município e que podem ser mais inteligentemente oferecidos por meio de uma gestão integrada, como a destinação do lixo, o abastecimento de água, a proteção ambiental e outros mais; para isso foi criada, em cada região metropolitana, um órgão de planejamento e gestão (SOUZA, 2007, p. 35). Desse modo, as cidades das Regiões Metropolitanas (RMs) vão crescer dos anos 1960 até os anos 1990, sobretudo as metrópoles. É importante lembrar que pós anos 1960, o Brasil vai se interiorizando mais. Além disso, os processos de urbanização vão se tornando mais variados, tanto de urbanização das antigas regiões industrializadas, que vão se tornando espaços metropolitanos densamente povoados, quanto de novos territórios incorporados ao processo capitalista, principalmente do Centro-Oeste. Nesta região, ocasionada pela dinâmica econômica e pela existência das rodovias, que criaram uma rede de cidades interligadas pelo sistema rodoviário. A Formação das Redes Urbanas Conurbadas e das Regiões Metropolitanas Com o crescimento urbano no Brasil pós anos 1970-1980, formaram-se várias áreas conurbadas em torno de algumas metrópoles. Conurbação é aquele processo urbano, no qual as cidades vão se urbanizando, dotando-as de infraestrutura urbana e vão se integrando a ponto de não distinguirmos na paisagem onde começa uma e termina outra. Um exemplo comum no Brasil é a conurbação existente entre a cidade de São Paulo e Guarulhos, Santo André, São Caetano, São Bernardo, ou seja, juntas formam áreas conurbadas. Cabe ainda explicar a diferença entre metrópole e Região Metropolitana. Quando afirmamos que São Paulo é uma metrópole nacional, partimos do princípio que São Paulo é uma grande centralidade em termos de atividade de serviços, de gestão de negócios, de serviços especializados, entre outros, e que várias cidades no Brasil se utilizam dos serviços de São Paulo, por isso ela é uma metrópole. 10 11 Contudo, isso não significa a mesma coisa que Região Metropolitana. As Regiões Metropolitanas (RMs) são unidades territoriais formais, que inicialmente foram criadas legalmente no Brasil, em 1973, pelo governo militar de Médici, na época com 9 regiões: Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. Posteriormente, pós a Constituição de 1988, delegou-se aos Estados a possibilidade de criação das RMs, o que ampliou muito seu número e as suas características. Figura 1: Região Metropolitana do Rio de Janeiro Fonte: IBGE Observe o mapa (fig. 1) da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ), formada por 19 municípios, inclu- Campinas Oceano Atlântico Oceano Atlântico Oceano Pacífico Campinas - 2.798.477 São Paulo - 19.672.582 Regiões Metropolitanas e População As Dez Maiores Regiões Metropolitanas do Brasil em População - 2010 Rio de Janeiro - 11.711.233 Belo Horizonte - 5.413.627 Porto Alegre - 3.960.068 Recife - 3.688.428 Fortaleza - 3.610.379 Salvador - 3.574.804 Curitiba - 3.168.980 Manaus - 2.210.825 Figura 2: As Dez Maiores Regiões Metropolitanas do Brasil em População 2010 Fonte : IBGE, 2010 / Emplasa, 2014 sive alguns com menor nível urba- nização, como é o caso dos muni- cípios de Itaguaí e Seropédica. Portanto, nem sempre a Região Metropolitana é formada por uma área intensamente urbanizada de todos os municípios membros. Observando-se o mapa da fi- gura 2, das dez maiores Regiões Metropolitanas do Brasil em po- pulação, verifica-se que a maioria se concentra próximo do litoral, na região Sudeste e nas capitais dosestados, uma das exceções é a Re- gião Metropolitana de Campinas. Contudo, apesar de concentrar a maior parte da população, pós 1991, as taxas de urbanização di- minuem segundo o IBGE, especial- mente nas metrópoles. 11 UNIDADE Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente No período de 1991-2000, intensifica-se a urbanização das cidades de porte médio quando comparada ao crescimento das grandes cidades e/ou das metrópoles, o que leva alguns autores a denominar este processo de desmetropolização ou involução da metrópole (SANTOS, 2008). De qualquer forma, há uma intensa urbanização no Brasil, mas essa urbanização se dá de maneiras distintas. Primeiramente, as regiões mais densamente urbanizadas situam-se na Região Concentrada (Sudeste-Sul) e estas, nas últimas décadas, passaram por um processo de novas funções e atividades, principalmente relacionadas ao setor de serviços e atividades comerciais. Assim, o Brasil vai passar por várias mudanças no final do século XX e início do século XXI, pois uma nova forma de divisão territorial do trabalho vai modernizar o território brasileiro, no caso do Centro-Oeste, principalmente a partir da produção de soja, mas também no oeste da Bahia, sul do Piauí, criando novas pequenas cidades ou antigas cidades que foram ressignificadas por esse processo do agronegócio. Há, pois, um processo de urbanização, cujo indutor não se dá somente pelo processo de industrialização, mas também ocasionada pelas atividades no campo, que criam núcleos urbanos mais adensados, sejam provenientes de demandas dos commodities agroindustriais, sejam em núcleos oriundos de uma urbanização em torno de garimpos, das grandes empresas mineradoras etc. Por outro lado, a Região Sudeste, pós ano 1990, vai passar por novas mudanças. As cidades médias vão ter um crescimento maior, enquanto as grandes cidades e metrópoles acabam recebendo menos imigrantes do que recebiam nas décadas de 1960-1980 e passam a ter um menor crescimento populacional. Além disso, também vamos ter outras transformações em relação à divisão territorial do trabalho, pois em cidades como São Paulo, que no passado tinham uma grande importância, devido à indústria, passam a ter principalmente atividades ligadas ao chamado Setor Terciário, isto é, de serviços e comércio, como suas principais atividades. Desse modo, no final do século XX e começo do século XXI, a urbanização ocorre também a partir das atividades rurais, o que leva alguns autores dizerem que estamos passando por um processo de “ruralização da cidade” e de desmetropolização, ou seja, as metrópoles já não crescem como nas décadas de 1960-1980. A seguir, vamos tratar das características do que seria o urbano. O que é Urbano? Definir o que é cidade e urbano, bem como rural e campo, pode ser algo complexo. Atualmente, ambos os espaços são cada vez mais integrados e complementares em algumas partes do mundo, entre elas no Brasil. Alguns autores (BERNADELLI, 2006) definem o que é urbano e rural considerando-se alguns critérios, a saber: tamanho demográfico e número de 12 13 habitantes; densidade da ocupação; aspectos morfológicos do espaço; os tipos de atividades desenvolvidas; o modo de vida; a geração de inovações, entre outros (ver quadro 1). Quaisquer destes critérios podem ser discutíveis, mas em conjunto podem ajudar a compreender algumas características destes espaços. Atualmente, os recursos de imagem de satélite do Google Maps, do Google Earth ou do Google Street View permitem ter uma maior proximidade com as formas espaciais dos lugares (morfologia espacial), mesmo à distância (imagem remota). Por meio destas imagens é possível observar o desenho, por exemplo, das ruas, do padrão de ocupação etc., permitindo, em princípio, precisar que tipo de atividade econômica predomina entre outras características. Quadro 1: Alguns critérios de Definição entre Rural e Urbano Critérios Rural Urbano Tamanho demográfico e número de habitantes Menor Maior Densidade da ocupação Menor Maior Aspectos morfológicos Maior extensão, mas menor densidade. Maior número de arruamentos, com ocupação mais concentrada. Os tipos mais comuns de atividades desenvolvidas Agropecuária e Extrativismo. Indústria, Comércio e Serviços O modo de vida Mais próximo à natureza e, em geral, mais atrelado a uma vida familiar. Mais dinâmico, atrelado principalmente ao modo capitalista. Fonte: BERNARDELLI, 2006. Elaborado por Vivian Fiori, 2015. Levando-se em conta tais critérios, podemos ter certa ideia sobre urbano e rural; contudo, há várias situações que, no mundo de hoje, sobretudo com o processo de globalização e com a inserção do capitalismo no campo, em que tais critérios podem ser questionados. É o caso, por exemplo, das atividades econômicas, já que há também agroindústria no campo, caso da produção de álcool e açúcar, entre tantas outras. Com o capitalismo no campo e o agronegócio, por exemplo, tais técnicas, caso da biotecnologia chegam também mais ao campo. Considerando-se os aspectos técnico-formais, cabe à Prefeitura Municipal a definição do perímetro urbano. Com o perímetro urbano definido pela prefeitura, caberá ao município dotá-lo de infraestrutura urbana, caso da coleta de lixo (resíduos sólidos urbanos), arruamento, limpeza das ruas, aprovação de loteamento urbano, obras públicas municipais etc. Se há um imóvel na área definida como perímetro urbano, a prefeitura poderá, considerando-se seus critérios, cobrar o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). Entretanto, se o imóvel se encontrar em área rural será cobrado o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR), pago ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), órgão do governo federal. 13 UNIDADE Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente Impostos e Área Urbana: Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município. § 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público: I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; II - abastecimento de água; III - sistema de esgotos sanitários; IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar; V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado. § 2º A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior. Ex pl or Fonte: Trecho literal extraído de BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Brasília, 1966. Disponível em: https://goo.gl/8SmLeA Pode também ocorrer casos de propriedade aparentemente rural, caso de chácaras, cuja localização possa ser urbana, pois esta definição é da Prefeitura. Portanto, é fundamental separar os processos do que seria urbano e rural da definição técnica. Cabe a prefeitura municipal a definição do perímetro urbano de um município e de dotá-lo de infraestrutura urbana. No quadro 2, a seguir, há uma síntese da definição técnica e administrativa da questão sobre urbano e rural no Brasil. Quadro 2: Alguns critérios Técnico-Administrativos sobre Rural e Urbano Critérios Detalhamento Responsável Definição do Perímetro Urbano Define a áreaurbana formalmente. Prefeitura Municipal Imposto Territorial Se é lote urbano é o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). Se o terreno é rural é cobrado o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR). Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) Sede do Município Toda sede de município no Brasil pelo Decreto-Lei 311/1938 é cidade e sua população contada como urbana. Decreto-Lei Federal Divisão de terras e formalização Se urbana- lote urbano (m²) Prefeitura Municipal Se rural- hectares, alqueires etc. INCRA Fonte: Elaborado por Vivian Fiori, 2015. 14 15 Observe que há diferenças entre os impostos urbano e rural, a divisão da terra, que na área urbana formalmente é denominada lote urbano. Cada prefeitura define o modo que os lotes urbanos serão desmembrados e os tamanhos destes para cada porção do município em sua área urbana. A seguir, vamos tratar de algumas concepções sobre a questão urbano-ambiental. As Concepções Sistêmica e Crítica e a Interface Urbano-Ambiental Existem diferentes concepções teórico-metodológicas sobre a interface urbano- -ambiental. Vamos utilizar duas concepções neste material. A primeira é a visão sistêmica, observando-se que tudo que existe no mundo e no planeta Terra está interligado. Se existe um sistema natural de vertentes (encostas) e há uma ocupação humana, certamente isto irá alterar os processos naturais existentes. Logo, tanto os processos naturais são sistémicos, quanto as alterações promovi- das pela vida do homem em sociedade também alteram este sistema. Uma cidade em si é um grande sistema, onde interagem processos naturais, antrópicos (da ação humana), transformando a primeira natureza ou o meio natural. As transformações existentes com o processo de urbanização tornaram as cidades cada vez mais artificiais que é até complicado definirmos em tais espaços se ainda há natureza. Um rio que foi retificado, canalizado é natural? Os processos de urbanização vêm transformando o modo de vida e as condições existentes no espaço, de modo que, com as transformações técnicas existentes hoje, alcançamos uma verdadeira revolução técnico-científica, ou seja, o mundo muda a cada momento, então, cabe-nos compreendê-lo como um processo de produção constante, em cada tempo social, em diferentes contextos sociais, políticos e espaciais, que redundam em transformações ambientais. Isto é a visão crítica! Neste sentido, é fundamental entender o contexto, em que as situações acontecem. Contextualizar é palavra-chave! Se eu discuto, por exemplo, um problema ambiental, em qual contexto ocorre? Quais os atores envolvidos? Quais os papéis que cada um dos atores envolvidos tem? Contextualizar do ponto de vista, social, econômico, político, ou seja, considerando-se a questão ambiental em suas diversas dimensões. Entender as temáticas ambientais como processo histórico, já que os fenômenos não são isolados, muito menos devem analisados como processos que têm um começo e um fim. Não são produções acabadas: há sempre um devir, o mundo sempre muda e, ao mesmo tempo, algumas situações são mais duradouras. 15 UNIDADE Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente É importante considerar o meio ambiente como um sistema integrado (biológico, físico, social, econômico, cultural etc.) e, ao mesmo tempo, analisar as questões da interface ambiental-urbana do ponto de vista crítico. A abordagem crítica visa a esclarecer a relação entre a sociedade-natureza, baseando-se principalmente na lógica dialética. Considera a dinâmica política e socioeconômica que induz a condições ambientais de degradação, diferentes usos e problemas ambientais. Ao estudar ou analisar uma questão urbano-ambiental é fundamental procurar ser interdisciplinar e também destacar os papéis sociais que cada agente tem, contextualizando esta relação como um processo cheio de contradições. Uma proposta crítica-dialética considera a complexidade do mundo, buscando evidenciar o papel dos diversos atores sociais e sua relação com a questão ambiental nas diversas dimensões (sociais, econômicas, políticas, culturais e naturais). Exemplifica-se: um rio, em princípio, é natural. Contudo, seu uso é social, econômico e político. De quem é competência de cuidar dos rios no Brasil? Depende, se for um rio que corre só em um município será municipal (prefeitura), se for em vários municípios de um só Estado ele será estadual e se passar por vários Estados será federal. Por isso, o rio Tietê é estadual (SP) e o rio Paraná (federal). Desse modo, o uso do rio é político! Em outras palavras, a expressão de um fenômeno ou problema ambiental não pode ser compreendida somente na escala da política nacional, nem tampouco deve ser analisada como algo inerente apenas à dimensão natural. O que dizer, por exemplo, da construção de uma hidrelétrica numa região brasileira? Há mudanças na dimensão natural do território, com a construção de represas e outros objetos, que alteram a dinâmica dos rios, da hidrologia, da vegetação e da fauna, que serão modificados em virtude da construção da barragem, mas também se alteram as relações sociais, as formas espaciais, as moradias etc. Logo, esta visão crítica aponta os usos do espaço urbano e por quais agentes e com quais intenções. Um agente ou ator social pode ser o Estado (governo), os grupos excluídos, os donos de indústrias, os promotores imobiliários etc. Cada um tem um papel social, uma intenção e condição de poder na cidade. O espaço urbano tem diferentes usos. Tanto os usos do ponto de vista das atividades existentes tais como para moradia, uso industrial, para atividades comerciais e de serviços, assim como também os usos do ponto de vista da apropriação das classes sociais. Por isso, existem diferentes atores ou agentes sociais que atuam no espaço urbano. Roberto Lobato Corrêa (2011) define que os principais agentes do espaço urbano são os proprietários dos meios de produção, os proprietários fundiários (donos de terra), os promotores imobiliários, o Estado e os grupos sociais excluídos: 16 17 São eles os proprietários dos meios de produção, os proprietários fundiários, os promotores imobiliários, o Estado e os grupos sociais excluídos. A partir de sua ação, o espaço é produzido, impregnado de materialidades, como campos cultivados, estradas, represas e centros urbanos com ruas, bairros, áreas comerciais e fabris, mas também pleno de significados diversos, como aqueles associados a estética, status, etnicidade e sacralidade (CORRÊA, 2011, p. 44). Cada um desses atores ou agentes sociais têm um papel. No caso dos proprie- tários dos meios de produção (donos de indústrias, por exemplo), utilizam-se do território, sobretudo como meio de produção e nesse caso buscam terrenos mais amplos e baratos na cidade, mas comumente nas periferias menos valorizadas, onde geralmente ainda há mais espaço e terrenos baratos. Contudo, necessitam de acessibilidade tanto para que sua mão de obra possa ter acesso ao trabalho quanto para a circulação de mercadorias, não podendo se localizar numa periferia onde não exista um sistema de transporte. Já os proprietários fundiários, ou seja, os proprietários de terra, no espaço urbano procuram auferir a maior renda possível e obter lucros a partir desta propriedade. Há casos em que os proprietários fundiários fazem especulação fundiária, ou seja, esperam que a região onde suas terras estejam inseridas seja valorizada, para que possam auferir maior lucro. Outro ator importante, sobretudo nas grandes cidades e metrópoles, são os promotores imobiliários. Tais atores são formados por construtoras, incorporadoras, grupos técnicos de arquitetos e engenheiros, sistema financeiro de habitação, entre outros. Os promotores imobiliários,em muitos casos, só se interessam por produzir imóveis para as famílias de renda mais alta, sobrando ao Estado construir moradia aos mais pobres. Os grupos excluídos usam o espaço principalmente como abrigo, para morar. Em geral, vivem em áreas menos valorizadas, com menor infraestrutura urbana e onde existem vários problemas socioambientais. Já o Estado é o principal agente do espaço urbano, pois, cabe ao Estado, por meio do governo (municipal, estadual e federal), sobretudo da prefeitura, definir as normas e leis existentes, bem como produzir planos e projetos para a cidade. Além disso, tem como função realizar obras de drenagem, de arruamentos, coletar os resíduos sólidos urbanos, entre outras atividades. Nas cidades brasileiras, existem vários problemas ambientais urbanos, entre eles podemos destacar alguns: · A poluição do ar ocasionada pelas indústrias e queimadas e em muitas das grandes cidades brasileiras e também pelo uso do automóvel e dos transportes automotores. · A poluição das águas, as quais em alguns casos deveriam abastecer a cidade e, muitas vezes, encontram-se poluídas por cargas derivadas das indústrias e também do esgoto doméstico. 17 UNIDADE Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente · O destino inadequado dos resíduos sólidos urbanos, os quais em muitas cidades brasileiras são jogados em terrenos baldios e nas ruas e, por muitas vezes, mesmo pela prefeitura tem um destino final inadequado. · A falta de espaços livres e áreas verdes, que compromete ainda mais as condições ambientais urbanas, sobretudo nas grandes cidades. · As áreas de risco, tanto em encostas mais íngremes quanto em áreas próximas a corpos hídricos, tais como rios, córregos, lagos e represas, ficando a população que vive em tais lugares expostos a riscos de vida. Algumas questões, como resíduos sólidos, abastecimento de água e esgoto são importantes serem pensadas de uma forma integrada, sobretudo nos municípios que são conurbados ou que integram Regiões Metropolitanas (RMs). Muitas vezes, as medidas ou soluções para essas questões têm de ser tratadas de forma regional, em consócios intermunicipais, e não apenas no nível municipal. Como diz o pesquisador Wagner Costa Ribeiro: Temas como o destino final de resíduos sólidos, abastecimento hídrico, saneamento básico, fornecimento de energia e a poluição, em suas diversas formas de manifestação, exige a reflexão integrada de pesquisadores, de políticos, de movimentos sociais e de cidadãos. Do contrário, será difícil encontrar soluções viáveis pela melhoria da qualidade de vida da população de baixa renda, a ampla maioria que vive em grandes aglomerações humanas de países de industrialização tardia e que apresentam índices de urbanização extremamente elevados, como é o caso das metrópoles brasileiras (RIBEIRO, 2004, p. 165). Portanto, nestes casos, é fundamental que existam planejamento integrado e parceiras intermunicipais ou dos municípios membros das Regiões Metropolitanas para se resolver problemas relativos ao abastecimento da água, dos resíduos sólidos, entre outros. Do ponto de vista ambiental, considerando-se a relação sociedade-natureza, as políticas ambientais, no Brasil, tornaram-se mais efetivas, sobretudo na década de 1980, quando foi criada a Política Nacional de Meio Ambiente (1981), mas com outras alterações pós-Constituição Federal (1988). Finalizando esta unidade, verificou-se que a urbanização brasileira vem passando por mudanças pós anos 1990, com um processo de crescimento maior nas cidades médias, mas que as maiores aglomerações urbanas estão ainda concentradas em torno das grandes metrópoles, principalmente no Sudeste e próximas ao litoral Existem inúmeros problemas ambientais nas cidades brasileiras, sendo fundamental compreendê-los do ponto de vista social, econômico e político e não apenas pela dimensão natural. 18 19 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Leitura Regiões de influências das cidades 2007. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Regiões de influências das cidades 2007. Rio de Janeiro, 2008. https://goo.gl/vgpO9i O que é urbano no mundo contemporâneo. MONTE-MÓR, Roberto Luís. O que é urbano no mundo contemporâneo. Belo Horizonte: UFMG/Cedeplar, Jan. 2006, p. 1-14. https://goo.gl/mDPW0y Dinâmica urbano-regional: rede urbana e suas interfaces. PEREIRA, Rafael Henrique Moraes; FURTADO, Bernardo Alves (orgs.). Dinâmica urbano-regional: rede urbana e suas interfaces. Brasília: IPEA, 2011. https://goo.gl/9ftRU6 Sites Produção e consumo do e no espaço: problemática ambiental urbana. RODRIGUES, Arlete Moysés. Produção e consumo do e no espaço: problemática ambiental urbana. S/d. https://goo.gl/GjQfRb 19 UNIDADE Processo de Urbanização no Brasil e a Interface com o Meio Ambiente Referências BERNARDELLI, Maria Lúcia Falconi da Hora. Contribuição ao debate sobre o urbano e o rural. In: SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão; WHITACKER, Artur Magon (orgs.). Cidade e campo: relações e contradições entre urbano e rural. São Paulo: Expresso Popular, 2006. BOTELHO, Adriano. O urbano em fragmentos: a produção do espaço e a moradia pelas práticas do setor imobiliário. São Paulo: Annablume; FAPESP, 2007. BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Brasília, 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm CARLOS, Ana Fani A. A cidade. São Paulo: Contexto, 1992. CORREA, Roberto Lobato. Sobre agentes sociais, escala e produção do espaço. In: CARLOS, Ana Fani Alessandri; SOUZA, Marcelo Lopes; SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão (orgs.). A produção do espaço urbano: agentes e processos, escalas e desafios. São Paulo: Contexto, 2011, p. 41-52. RIBEIRO, Wagner. Gestão das águas metropolitanas. In: Carlos, Ana Fani Alessandri e Oliveira, Umbelino de - Orgs. Geografias de São Paulo: as metrópoles do século. São Paulo: Contexto, 2004. SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008. SOUZA, Marcelo Lopes de. ABC do desenvolvimento urbano. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. SPOSITO, Maria Encarnação Beltrão; WHITACKER, Arthur Magon (orgs.). Cidade e campo: relações e contradições entre urbano e rural. São Paulo: Expressão Popular, 2006. 20
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