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0 Unidade I: Unidade: Arquitetura Clássica – Civilizações Grega e Romana 1 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Unidade: Arquitetura Clássica – Civilizações Grega e Romana Apresentação Um dos grandes momentos da arquitetura mundial é, sem dúvida, a arquitetura produzida pelas civilizações grega e romana. As obras construídas no estilo que denominamos “clássico” foram responsáveis pela consolidação de uma linguagem arquitetônica que dominou o cenário ocidental por pelo menos 5 séculos, sendo facilmente encontradas ainda nos dias de hoje, mesmo nos tempos de nanotecnologia, viagens espaciais e internet (GLANCEY, 2001, p. 25). Ao longo deste curso, você verá a presença da arquitetura clássica em muitas das próximas unidades, embora sempre com variações importantes. A marca do clássico é sua atemporalidade. Fig. 1: O Partenon, na Acrópole de Atenas. Fonte: http://1.bp.blogspot.com/_rNLB0-Q8z7c/ScvGwXLqjhI/AAAAAAAAACM/- _PSe8amGwE/s1600/acropolis-athens.JPG Mas o que significa a palavra “clássico”, principalmente em termos de arquitetura? O conceito “clássico”, como tantos outros, possui vários significados em diversos contextos, daí a importância de conhecer adequadamente o significado de “clássico” no âmbito da arte e da arquitetura. 2 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a No cotidiano, usamos a expressão “clássico” para nos referirmos a determinadas manifestações culturais que são consideradas o apogeu de seu estilo ou época. Com isso, adquirem um status de qualidade, de atemporalidade. Por exemplo, ouve-se falar que determinado carro é um clássico, ou que Elvis Presley é um clássico, ou que tal filme é um clássico. Neste sentido, o que se quer dizer é que aquele carro, cantor ou filme consistem no que há de melhor em suas respectivas épocas e estilos, e acabaram rompendo as barreiras de tempo e espaço, sendo apreciados por diversas gerações. Estas manifestações culturais nada têm a ver com o sentido que estamos usando aqui, embora também se possa afirmar que outros tipos de construções que não sejam greco-romanas, como as pirâmides egípcias, sejam um clássico da arquitetura. Não há dúvida de que todos reconhecem sua importância estética e histórica para a arquitetura. Mas clássico no contexto da arte e da arquitetura possui outro sentido, e, neste caso, uma pirâmide egípcia, embora seja um clássico, não é uma construção clássica. Conforme John Summerson, em seu livro A Linguagem Clássica da Arquitetura, “um edifício clássico é aquele cujos elementos decorativos derivam direta ou indiretamente do vocabulário arquitetônico do mundo antigo – o mundo „clássico‟, como muitas vezes é chamado. Esses elementos são facilmente reconhecíveis, como, por exemplo, os cinco tipos padronizados de colunas que são empregados de modo padronizado, os tratamentos padronizados de aberturas e frontões, ou, ainda, as séries padronizadas de ornamentos que são empregadas nos edifícios clássicos” (SUMMERSON, 2006, p. 4). Ou seja, a arquitetura clássica é aquela que se vincula, necessariamente, à arquitetura da Grécia antiga, e que foi posteriormente apropriada e reinterpretada pelos romanos. Não se trata, obviamente, de apenas aplicar os elementos que são facilmente reconhecíveis como colunas e frontões, mas de toda uma forma racional e harmônica de composição que é a essência da arquitetura clássica. “... Encontramos ao longo da história da arquitetura clássica, uma série de afirmações sobre os aspectos essenciais da 3 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a arquitetura que nos permitem dizer que o objetivo da arquitetura clássica sempre foi alcançar uma harmonia inteligível entre as partes. Tal harmonia foi vista como parte integrante dos edifícios da Antiguidade” (ibidem). Construir segundo os preceitos da arquitetura greco-romana é muito mais complexo do que possa parecer à primeira vista, e certamente vai muito além da mera utilização de elementos como colunas e frontões – e é isso o que veremos nas próximas páginas deste texto. Contextualização Antes de procurarmos definir, afinal, o que são as cinco ordens clássicas, ou mesmo o que são as tais “colunas” e “frontões” e outros elementos arquitetônicos tidos como clássicos, é necessário contextualizarmos no tempo as civilizações grega e romana, e entendermos como tudo começou. A Grécia Antiga se iniciou por volta de 1.900 a.C., enquanto que, segundo a lenda, a cidade de Roma teria sido fundada em 753 a.C. Portanto, a civilização grega é mais antiga que a romana – e muito da cultura grega foi apropriada pelos romanos durante o processo de formação de sua própria cultura, fruto de uma fusão entre o saber dos gregos e dos povos etruscos, os quais habitavam a península itálica antes do domínio romano. É fácil perceber esta continuidade cultural em muitos aspectos, como por exemplo na mitologia: os romanos cultuam essencialmente os mesmos deuses – Vênus é a versão romana de Afrodite, a deusa grega do amor; Cupido é o nome romano de Eros; Netuno é a versão romana de Posêidon; Baco, o deus romano do vinho e do prazer, é Dionísio para os gregos; Júpiter, o deus dos deuses, é Zeus na mitologia grega; e assim por diante. Isso também é notável particularmente em termos de arte e arquitetura, em que o parentesco é evidente. No caso das artes plásticas, mais especificamente no caso da escultura, os romanos reproduziam cópias de estátuas originalmente gregas. Como muitas destas estátuas originais se perderam, graças às reproduções romanas, nós pudemos conhecer muitas das realizações artísticas dos gregos, tão admiradas pelos romanos. Mas existem, também, diferenças vitais entre ambas as civilizações. Para notar o contraste, começaremos primeiro estudando a civilização grega e suas realizações. 4 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Grécia Antiga Situada na região sul da Península Balcânica, o território da Grécia Antiga não corresponde exatamente à abrangência da Grécia atual, e correspondia a três regiões: a Grécia Continental, a Grécia Central e a Grécia Insular. Esta última diz respeito a diversas ilhas que estão espalhadas pelo Mar Egeu. Além desta região mais concentrada, os gregos estabeleceram assentamentos e colônias em muitas áreas próximas, como é possível perceber no mapa a seguir. Fig. 2: Mapa esquemático mostrando a colonização de diversos povos na época da civilização da Grécia Antiga, comparando os domínios dos gregos (em marrom), com as dos fenícios. Nota-se que os gregos chegavam a ocupar o sul da atual Itália, a costa da França e o norte da África. Fonte: http://www.juserve.de/rodrigo/atlas%20historico/Coloniza%E7%E3o%20Grega %20e%20Fen%EDcia.jpg A civilização grega é dividida em diversos períodos, mas podemos considerar que a civilização da Grécia antiga iniciou-se por volta de 1.900 a 1.100 a.C., quando estavam se desenvolvendo as civilizaçõesegeias, no Mar 5 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga eR om an a Egeu. É o caso das civilizações Cretense ou Minoica, na ilha de Creta, e a Micênica (continental), com sede na cidade de Micenas, ao sul de Atenas. O povo cretense só é conhecido por nós a partir de 1870, quando o pesquisador alemão Heinrich Schliemann encontrou vestígios da antiga cidade de Troia. As ruínas das cidades de Micenas e Tirinto, da civilização micênica, só foram encontradas em 1876. Estas duas civilizações não são, ainda, o povo que dará origem à civilização helênica, mas sim seus antecessores. Entre os anos 1.100 a 700 a.C., que são narrados nos versos do poeta Homero, em suas obras Ilíada e Odisseia, houve uma série de invasões de povos como os dóricos, jônicos e aqueus, formando o que mais tarde seria a civilização conhecida por nós como sendo da Grécia Antiga. É nesta época, por exemplo, que ocorre a famosa guerra contra Troia, narrada por este mesmo poeta. Supõe-se que os inimigos de Troia não tenham sido os gregos, mas sim os povos micênicos, pois os locais descritos por Homero são bastante semelhantes aos locais onde mais se encontram vestígios da civilização micênica. O período da Grécia Antiga abrange de cerca de 1.000 a.C. até a morte de Alexandre, o Grande, no ano de 323 a.C. Este período é dividido em dois: Período Arcaico: de 1.000 a.C até 490 a.C. Período Clássico: de 490 a.C. até 323 a.C. Depois da morte de Alexandre, o Grande, deu-se início ao período mais grandioso da civilização grega: o Período Helenístico, que terminou em 30 a.C., quando a Grécia Antiga se dissolve e acaba se fundindo a outras culturas mediterrâneas. Apesar dos gregos antigos terem vivido há mais de 2.000 anos, a sua importância para a cultura ocidental é enorme. Além de seu indiscutível legado arquitetônico e artístico, os gregos também contribuíram com a filosofia (Sócrates, Platão, Aristóteles), a lógica, a retórica, a democracia, avanços matemáticos significativos (lembram do teorema de Pitágoras?), as primeiras reflexões científicas (o primeiro modelo de átomo é grego: de Demócrito e Leucipo, por exemplo); o desenvolvimento da Medicina (Hipócrates); as 6 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Olimpíadas e as práticas esportivas; a criação do teatro; a valorização do ser humano e seu potencial intelectual para compreender o mundo. Sem dúvida, podemos afirmar que os gregos são a raiz de toda a cultura que se desenvolveu no mundo ocidental posteriormente. Arquitetura Grega O teórico Nikolaus Pevsner afirma, logo nas primeiras frases de seu livro Panorama da Arquitetura Ocidental, que “o templo grego é o exemplo mais perfeito já alcançado de uma arquitetura que se realiza na beleza plástica” (PEVSNER, 2002, p. 6). O mais importante e conhecido dos templos gregos, o Partenon, é certamente conhecido como o edifício mais influente de todos os tempos, inspirando cópias e versões ao longo da história, e ao redor do mundo. E, certamente, representa o paradigma das realizações dos gregos na arquitetura (GLANCEY, 2001). Os gregos nos trouxeram diversas inovações importantes no campo da arquitetura, já em termos de reflexão teórica. A primeira delas, segundo José Ramón Pereira, é a delimitação de seu território própriodentro das artes. Enquanto que no Egito as artes costumavam ser produzidas de forma unívoca (por exemplo, a pintura e os alto-relevos murais não eram considerados à parte da arquitetura), na Grécia o arquiteto voltará sua atenção apenas para o problema da construção. Com isso, a arquitetura passa a ser fruto de reflexões para ser compreendida, e começam a surgir suas primeiras leis, como se fosse uma forma de ciência. “Aqui se origina a distinção entre as artes (arquitetura, escultura, pintura, etc.) que se consideram categorias permanentes e absolutas da atividade humana. Para qualquer uma delas se supõe que existam algumas regras objetivas, análogas às leis da natureza, e que o valor de cada obra particular consiste em se adequar a elas (...) Em arquitetura, essas regras são conhecidas pelo nome de ordens” (PEREIRA, 2010, p. 51). As ordens são a base da arquitetura grega, que estabelece pela 7 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a primeira vez na história um instrumento de controle que estipula todo o processo de produção de arquitetura. Já foi dito que uma ordem é “a disposição regular e perfeita das partes, que concorrem para a composição de um conjunto belo” (PEREIRA, ibidem). Esta é a essência de todo o pensamento grego, que busca a realização de seu ideal de beleza – e para atingir este objetivo decodifica a arquitetura em uma série de elementos necessários para que ela obtenha a harmonia, a proporção e a combinação de elementos de modo que ela seja, de fato, uma bela arquitetura. Estes elementos são basicamente compostos por colunas e o entablamento, sendo que este último, funciona como uma estrutura horizontal que sustenta o telhado, como uma viga. Mas antes de definirmos quais são estes elementos construtivos, e quais são as ordens gregas, é necessário entender que os gregos eram notáveis pela tendência de compreender o mundo através da razão, e não se limitavam às explicações meramente espirituais para os fenômenos que observavam. Os gregos eram o que se chama de humanistas, pois celebravam o homem e sua capacidade racional, de entender e interpretar o mundo através da lógica e da filosofia. Com relação a este fato, Pereira nos conta que: “No início do século V a.C., Parmênides dirá: „o homem é a medida de todas as coisas(...)‟ Com um claro relativismo axiológico, o homem grego decide que ele mesmo é o ponto de referência da realidade, o valor objetivo para a referência de todas e cada uma das coisas que o rodeiam, tanto na sua impressão sensorial, quanto na sua valoração: a verdade, a justiça, a bondade, a beleza” (PEREIRA, op. cit., pp. 47-48). Esta posição influencia a arquitetura, pois este antropocentrismo1 leva ao desenvolvimento de um sistema de medidas baseados no corpo humano, entendido como cânone de beleza e proporção. Este sistema de medidas determinará uma das grandes contribuições dos gregos para a arquitetura: a escala humana. 1 Etimologicamente, a palavra antropocentrismo significa colocar o homem no centro do mundo (antropo = homem), ou seja: avaliar o universo e seus fenômenos a partir de sua relação ao homem. Designa uma postura geralmente oposta uma visão teocentrista (deus no centro do mundo). 8 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Como vocês já devem conhecer, uma escala é um sistema de medidas, uma relação entre diferentes dimensões, de modo a manter uma relação de proporção. A escala humana parte das relações do próprio corpo humano: a medida dos pés em relação às pernas, a medida de um polegar, a altura em relação às dimensões da cabeça. Partindo do princípio de Delfos – “conhece-te a ti mesmo” – os gregos passaram a medir o corpo humano e a estipular uma relação de proporções entendida como harmoniosa e bela. É a partir deste raciocínio que surge o sistema de medida que mede as coisas por polegadas ou palmos, ou a distância em pés, passos ou jardas. Os edifícios passam a ser medidos e construídos a partir damesma relação dimensional do corpo humano, passam a se adaptar às medidas do homem: “A escala é tanto um elemento de compatibilidade quanto de medida, uma vez que relaciona as edificações e os conjuntos urbanos com nossa capacidade de compreensão, agindo como parâmetro ara aqueles elementos cujo tamanho familiar nos proporciona uma referência. Sem conhecer essas medidas e esses parâmetros, ou sem levá-los em conta, pode-se fazer arquitetura, mas não em escala humana” (PEREIRA, op. cit., p. 48). Esta concepção dos gregos chegou ao ponto dos matemáticos gregos, através de cálculos, obterem um número (Phi, representado pela letra grega ) que representa uma proporção facilmente encontrada na natureza: nas voltas de uma concha, nas proporções dos ossos humanos, nos anéis de crescimento de uma árvore, e até na proporção entre machos e fêmeas de diversas espécies. Este número foi chamado de seção áurea2, e demonstra haver uma razão matemática existente na natureza3. Os desdobramentos deste cálculo foram mais tarde desenvolvidos pelos romanos, e publicados em um importante tratado escrito por Marcus Vitruvius Pollio, mais conhecido como somente Vitruvius (voltaremos a ele logo mais nesta mesma unidade, quando falarmos dos romanos). No tratado, Vitruvius enumerou uma série de relações 2 A seção áurea também poderá ser denominada proporção áurea, razão áurea, razão de ouro, divina proporção, proporção em extrema razão, divisão de extrema razão, dependendo do autor. (Wkipédia – verbete Proporção áurea). 3 Para saber mais sobre estas relações matemáticas da seção áurea, e todos os desdobramentos deste cálculo, ver Wikipédia – verbete “Proporção áurea” – disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Propor%C3%A7%C3%A3o_%C3%A1urea. 9 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a de proporção no corpo humano, e afirmou que a imagem de um homem perfeitamente proporcional, segundo estas leis matemáticas, poderia estar perfeitamente circunscrito em um círculo e um quadrado – as duas formas geométricas consideradas perfeitas matematicamente. Quando o texto de Vitruvius foi redescoberto quinze séculos depois, não havia uma figura no texto que demonstrasse essas relações matemáticas, mas Leonardo da Vinci realizou os cálculos corretos e conseguiu ilustrar o Homem Vitruviano, como esta famosa imagem ficou conhecida. 11 Fig. 3: O homem vitruviano, segundo desenho de Leonardo da Vinci. Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/22/Da_Vinci_Vitruve_Luc_Via tour.jpg Racionalistas, os gregos então tomaram como partida a proporção áurea para a produção de suas obras de arte, buscando reproduzir a imagem do homem perfeito, Belo, que reside apenas no mundo das ideias. Um exemplo é a estátua Doríforo (fig. 4), de um importante escultor grego, Policleto, esculpida por volta de 440 a.C., nos traz um princípio de proporção entre as medidas tidas como perfeitas no corpo humano. 10 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Fig. 4:Doríforo, de Policleto (c. 440 a.C.). A altura de um ser humano proporcional deve equivaler a 7 vezes o comprimento da cabeça. Fonte: http://n.i.uol.com.br/licaodecasa/ensfundamental/artes/greek2.jpg O mesmo raciocínio era transferido também para a arquitetura, procurando produzir construções que seguissem as mesmas proporções. “Se a natureza dispõe o corpo do homem de tal forma que cada membro se relaciona com o todo, os gregos querem que exista também essa mesma correspondência de medidas entre as partes e a obra inteira de arquitetura” (PEREIRA, op.cit., p. 49).Seguindo a escala humana e a proporção áurea, a arquitetura seria, também, Bela. As ordens gregas Como mencionamos antes, os gregos criaram um sistema de regras que teriam como objetivo desencadear a beleza e as proporções da natureza, que são chamadas de ordens arquitetônicas. A arquitetura grega é composta por um sistema ortogonal de elementos: colunas ou paredes (vertical) encimadas por vigas (horizontal), sustentando um telhado. Supõe-se que estes elementos tenham sido resultado da transposição à pedra de um processo construtivo anterior em madeira (PEREIRA, op.cit., p. 53). As colunas são compostas por três partes: o fuste (corpo da coluna); a base, na qual o fuste se apoia; e o capitel, que é o elemento decorativo no topo da coluna, que costuma ter diferentes aparências de acordo com a ordem a que pertence. A coluna sustenta o entablamento, que faz a função da viga estrutural e sustenta a cobertura. 11 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a O entablamento é composto por três elementos: a arquitrave, que é o elemento horizontal que se apoia diretamente sobre o capitel da coluna; o friso, que é a faixa em que as vigas transversais se apoiam para sustentar o telhado. O friso poderá ser uma faixa contínua, decorada com altos-relevo, ou poderá ser uma alternância de elementos chamados tríglifos (correspondente às vigas transversais que se apoiam sobre a arquitrave) e métopas (que é o espaço entre estas vigas). Por cima do friso, há um último elemento chamado cornija, que sustenta o telhado e avança um pouco para escoar as águas pluviais. É correspondente aos beirais de um telhado. Como os telhados são sempre de duas águas, os seus ângulos formam um espaço triangular na parte frontal, chamado frontão, que costuma ser ricamente decorados com relevos escultóricos. Nos fundos, este mesmo espaço é chamado de tímpano. Sob as colunas, no caso da arquitetura não ser implantada diretamente no chão, há uma base ou plataforma sobre a qual se ergue a edificação, chamada estilobata. Para fazer a conexão e o acabamento entre a coluna e a estilobata, é colocada a base sob o fuste da coluna. Da mesma maneira, o capitel funciona como um elemento de ligação entre a coluna e o entablamento, de forma a garantir um encaixe e acabamento perfeito entre os elementos arquitetônicos. Para entender melhor estes elementos e como eles se encaixam uns aos outros, observe atentamente o diagrama abaixo: Fig. 5: Composição dos elementos arquitetônicos na ordem dórica. Fonte: http://greek.hp.vilabol.uol.com.br/ordemdoric a.gif 12 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a São três as ordens gregas: a dórica, a jônica e a coríntia. Cada uma destas ordens surgiu em locais diversos, e portanto trazem o mesmo nome de alguns dos povos oriundos destas mesmas regiões. Cada uma destas ordens tem sua estética distinta. Nós podemos reconhecer as ordens facilmente por suas colunas, ou, mais especificamente, pelo capitel das colunas – mas todos os outros elementos (arquitraves, frisos, cornijas, bases, etc.) também têm configurações diferentes de acordo com a ordem a que pertencem. 11 Fig. 6: As três ordens gregas, de cima para baixo: dórica, jônica e coríntia. Note a diferença entre o nível de rebuscamento da decoração de fustes e capitéis. Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/co mmons/thumb/6/6a/Classical_orders_from_the_Encyclopedie.png/250px- Classical_orders_from_the_Encycloped ie.png Quando o arquiteto opta por uma das ordens para compor seu edifício, todos estes elementos já são pré-determinados. Não se pode usar uma coluna dórica com um entablamento jônico. Não se pode usar um capitel coríntio num fuste com dimensões dóricas. As ordens são relativamente rígidas e servem como orientação para a composição, resultando numa economia de tempo e energia, pois as escolhas de detalhes já foram feitas – e, ao mesmo tempo, não deixam de oferecer uma margem de liberdade para se adaptar a cada caso particular. 13 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a De forma simplificada, a principal diferença reside nas colunas – a relação entre a altura da coluna e o diâmetro de seu fuste. É principalmente esta razão que vai determinar se tal edifício pertence ao sintagma dórico ou jônico, sendo que a ordem coríntia é uma variação do sintagma jônico. “A ordem dórica era simples e maciça. Os fustes das colunas eram grossos e firmavam-se diretamente no estilóbata [sem ter base]. Os capitéis, que ficavam no alto dos fustes, eram muito simples. A arquitrave era lisa e sobre ela ficava o friso que era dividido em tríglifos – retângulos que podiam ser lisos, pintados ou esculpidos em relevo.” (PROENÇA, 2001, pp. 30-31) O dórico foi relacionado, a partir de Vitruvius, com o gênero masculino – exemplifica a “proporção, força e graça do corpo masculino” (VITRUVIUS apud SUMMERSON, 2006, p. 11). Segundo um arquiteto e teórico renascentista, Sebastião Serlio, responsável pela elaboração de um tratado que orientava as construções no estilo clássico no séc. XVI, a ordem dórica deveria ser utilizada em igrejas dedicadas aos santos mais extrovertidos e a figuras combativas em geral (SUMMERSON, ibidem). A ordem jônica, mais elegante, é mais esbelta e sugeria mais leveza – seu diâmetro é menor em relação à sua altura e as colunas se firmavam sobre uma base decorada, colocada sobre a estilobata. Seu capitel é em voluta, e “a arquitrave [é] dividida em três faixas horizontais. O friso também é dividido em partes ou então decorado por uma faixa esculpida em relevo. A cornija é mais ornamentada e podia apresentar trabalhos de escultura”(PROENÇA, ibidem). Vitruvius associava o jônico à “esbelteza feminina”, e mais tarde foi associada por Serlio também a homens do saber, sendo muito utilizado em universidades e tribunais de justiça. A ordem coríntia não é exatamente uma ordem em si, mas uma variação da jônica, que costumava ter tratamento mais livre para mudanças do que o dórico, por exemplo. Mais elaborada, a ordem coríntia surgiu mais tardiamente e traz um capitel elaborado, em forma cônica, todo esculpido representando folhagens de acanto. Normalmente a ordem coríntia é associada a cornijas ricamente elaboradas com relevos e elementos escultóricos. Vitruvius associava a ordem coríntia à “figura delgada de uma 14 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a menina”, e posteriormente sofreu diversas associações até contraditórias: enquanto alguns teóricos consideravam a ordem coríntia “virginal”, outros já a consideravam “lasciva”, “ataviada como uma cortesã” – talvez em virtude da associação de Corinto – região que dá o nome a esta ordem – com imoralidade. De qualquer forma, Serlio recomendava que a coríntia era a ordem mais adequada para igrejas mais femininas, como as consagradas à Virgem Maria (SUMMERSON, ibidem). É importante ressaltar que essas associações de gênero não são regras, mas apenas interpretações arbitrárias – encontramos edificações dóricas dedicadas a deusas, como o próprio caso do Partenon, dedicado à deusa Palas Atenas; assim como construções coríntias consagradas a santos masculinos. Fig. 7: Caracteriza ção das três ordens gregas,co m todos seus elementos. Fonte: http://lh4.ggpht.com/_5ZVfrqNx7ZM/SyAH7rUhJzI/AAAAAAAAO5k/weG9Uz6_F 9g/s640/Arquitetura%20Grega.jpg 15 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Principais construções As principais edificações gregas são cívicas, destinadas a uso público, como os templos, os anfiteatros, as pinacotecas. Devido ao calor excessivo da região mediterrânea, o homem grego passa a maior parte do tempo fora de casa, circulando pela pólis (a cidade grega), socializando e discutindo política, celebrando seus deuses e filosofando. Tanto que o interior dos templos gregos não eram espaços de reunião de pessoas para um culto, como são as igrejas cristãs. Os gregos costumavam realizar seus ritos religiosos em suas casas, mas se encontravam no templo para as procissões públicas e festividades nacionais. Havia um espaço determinado para essas congregações: um espaço circundante, em torno do templo, chamado temenos – o templo era apenas um recinto sagrado para guardar a imagem divina, acessado apenas de maneira processual para depositar as oferendas e louvar as estátuas que representavam os deuses. Mesmo o altar ficava no lado de fora da construção. É por esta razão que se costuma afirmar que a arquitetura produzida pelos gregos tem um foco maior na sua composição externa do que nos espaços internos. Os temenos não eram destinados apenas a fins religiosos, mas também políticos, e, assim como os templos mais notáveis, situam-se numa região da cidade grega denominada de acrópole. A acrópole é a parte da cidade situada na região mais alta, normalmente em morros ou colinas. A altura da região atende a duas funções: simbólica e militar. Simbolicamente, a altura representa a elevação dos valores humanos e a supremacia sobre outras partes da cidade, dado a importância das edificações que lá estavam. Já em termos militares, a altura tornava a região mais fácil de defender de ataques. No princípio, como nas civilizações micênicas, as acrópoles atendiam apenas a funções militares e eram geralmente cercadas por muralhas, e reuniam os templos e edifícios públicos mais importantes. De todas as acrópoles gregas, a de Atenas é certamente mais célebre, pois é lá que estão as ruínas das mais imponentes construções gregas que ainda existem, como o Partenon e o Erecteion. Há registros da presença humana no morro da Acrópole ateniense desde o neolítico, mas é certo que a civilização micênica estabeleceu lá um 16 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a megaron4, inclusive com uma muralha extensa e várias edificações de cunho religioso e civil. No período arcaico, foi erigido nesta colina um templo dedicado a Palas Atenas, que é a deusa padroeira da cidade, em meados do séc. VI a.C. Um novo templo em mármore, o "Antigo Partenon", foi iniciado ao fim da Batalha de Maratona, em 490 a.C. Para acomodá-lo, a porção sul do planalto foi liberada de obstáculos antigos e nivelada com a adição de cerca de 8.000 blocos de pedra do Pireu, em alguns locais com 11 metros de profundidade, formando um muro de arrimo cheio com terra batida. O portão micênico foi substituído pelo "Propileu Antigo", colunata monumental com propósito mais cerimonial que defensivo. No entanto, com as invasõespersas em 480 a.C, a maior parte das construções arcaicas da Acrópole foram destruídas. Fig. 8: A acrópole de Atenas, atualmente. Foto aérea. Fonte: http://belokanweb.free.fr/wezb/images/antiquite/acropole.jpg A maior parte das construções que nós conhecemos e admiramos hoje na Acrópole datam do período do reinado de Péricles, quando este monarcapatrocinou a reconstrução do que os persas tinham destruído, “agora construídos em mármore e com um esplendor jamais vistos” (GOMBRICH, 2008, p. 82). Para tanto, ele designou o arquiteto Ictino para planejar e definir o traçado dos templos, e o escultor Fídias para esculpir os deuses e decorar os templos com relevos. A acrópole construída por Ictino é a que hoje está reduzida a ruínas, conforme é possível ver na fig. 8. As construções mais intactas são o Partenon 4 Um mégaron é uma construção simples, composta de uma sala retangular precedida de um pórtico de colunas, típica dos Micênicos. 17 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a e o Erecteion (também conhecido como Erecteu), e parte do Propileu e do templo de Atena Niké. No entanto, as prospecções arqueológicas tornaram possível a identificação das seguintes edificações na Acrópole em ruínas: Fig. 9.Fonte: http://www.notapositiva.com/trab_professores/textos_apoio/historia/mundohele nico2.jpg Dentre todas, destacaremos dois templos para análise mais profunda. O primeiro, como não poderia deixar de ser, é o Partenon – obra emblemática e referencial, e que desde o primeiro momento ocupou posição de destaque na Acrópole, como é possível notar na figura acima. Segundo Jonathan Glancey, “o Parthenon talvez seja o maior e mais influente edifício de todos os tempos. É de uma beleza imensa, tão atemporal em seu encanto quanto o pode ser um edifício (...) o Parthenon assinalou o zênite da arquitetura grega antiga” (GLANCEY, 2001, p. 26). Construído pelos arquitetos Ictino e Calícrates entre 447-436 a.C., durante a reconstrução da 18 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Acrópole de Atenas, o Partenon é o principal templo da cidade de Atenas, dedicado à deusa padroeira da cidade, Palas Atenas e é o melhor exemplo das ideias gregas a respeito de arquitetura, sendo talvez um dos edifícios mais imitados ao longo de toda a história, por ser modelo do ápice da linguagem clássica. Fig. 10: O Partenon hoje. Fonte: http://1.bp.blogspot.com/__wxMuRo0EDk/SDC7VqyEmkI/AAAAAAAAEKI/ZIAX KN5xuvA/s400/ABA_partenon.jpg Construído integralmente em mármore pentélico branco, com teto de madeira, o Partenon é um edifício relativamente simples em sua composição: sua planta é retangular, com uma estilobata (o recinto total) medindo 60m x 30m, ou seja, seu comprimento é exatamente o dobro de sua largura. Na fachada principal, voltada para o leste, o frontão se assenta sobre oito colunas dóricas (octastilo) de cerca de 10m de altura, enquanto que nas laterais são 17 colunas, perfazendo um total de 46 colunas ao todo. Esta colunata (também chamada de peristilo) composta por oito colunas é uma evolução dos arquitetos citados em relação aos templos dóricos que se costumavam construir na época, geralmente em hexastilo (seis colunas frontais). “A característica mais evidente dos templos gregos é a simetria entre o pórtico da entrada – o pronau – e o dos fundos – o opistódomo. O núcleo do templo era formado pelo pronau, pelo naos (recinto onde ficava a imagem da divindade) e pelo opistódromo. Esse núcleo era cercado por uma colunata 19 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a chamada peristilo. Em algumas cidades muito ricas, o peristilo chegou a ser formado por duas séries de colunas em torno do núcleo do templo” (PROENÇA, 2000, p. 30). 11 Fig. 11: Planta do Partenon. Nota-se a composição de dois retângulos: o externo é o peristilo, e a caixa interna é composta por colunas nas extremidades, e paredes nas laterais, formando o naos. No interior do naos, mais colunas para garantir a sustentação. Fonte: http://www.xtec.cat/~jarrimad/grecia/partenon%20planta.png A cela que se encontra no interior do Partenon, o naos, onde ficava a imagem da deusa, tem exatamente o mesmo comprimento que a fachada frontal: 30m. A cela interna era composta por dois ambientes. O naos abrigava a colossal estátua representando a deusa Palas Atenas, esculpida por Fídias, descrita como tendo cerca de 11 metros de altura, e feita em madeira e revestida com ouro e marfim.A estátua original foi levada para Constantinopla no séc. V a.C.,e destruída no séc. 11 – só conhecemos a sua réplica feita pelos romanos. O segundo ambiente era um rico opistódomo posterior, que era servia como armazém do tesouro da deusa, e onde também se guardava o tesouro público (PEREIRA, op.cit., p. 65). Fig. 12: Cópia romana da estátua de Athenas Parthenos, esculpida originalmente por Fídias. Fonte: http://3.bp.blogspot.com/_zWtIZe98a9M/ShS7u6- V7_I/AAAAAAAAABw/o8M_qbiayi4/s320/Atena_Fidias.jp g 20 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Fig. 13: Esquema em 3D mostrando a composição do Partenon. Fonte: http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/img/pericles3.jpg Além da estátua de Atena, Fídias esculpiu uma série de relevos e esculturas que ornamentavam o frontão e o friso do templo. É especialmente conhecido o Friso das Ergastinas, que media originalmente 159 metros, percorrendo todo o perímetro do templo. Nós só conhecemos alguns fragmentos destas esculturas, as quais estão espalhadas por diversos museus na Europa. Como se pode observar pela figura 13, os templos não eram monocromáticos, todo em branco, como normalmente se presumiu ao longo de séculos, ao observar as ruínas de mármore. Os frisos, capitéis e o frontão eram, depois de esculpidos, pintados com cores fortes, como azul, vermelho e amarelo. O fundo do frontão era azul, e as imagens esculpidas por Fídias saltavam aos olhos com esse destaque. O aspecto mais interessante sobre os templos gregos, e que é possível perceber no Partenon, é o mecanismo de correção ótica que os gregos empregavam. Esta técnica, conhecida como êntase, mostra a obsessão pelos gregos pela perfeição matemática na construção de seus templos. “Para assegurar que o templo parecesse perfeito – perfeitamente reto e na proporção perfeita – ao olho humano, Ictino e Calícrates usaram a técnica conhecida como êntase para deformar levemente as colunas e a arquitraves nas fachadas e laterais do edifício. Essa distorção (não há nenhuma reta verdadeira na construção do Parthenon) faz o olho enxergar linhas retas quando, de outra maneira, elas pareceriam curvas. É um recurso brilhante e 21 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a exigia não apenas grande raciocínio matemático dos arquitetos, mas também imensa habilidadedos pedreiros” (GLANCEY, ibidem). Pereira explica o processo, que pode ser observado na figura 14. “As estilobatas passam a ser ligeiramente curvadas; os intercolúnios são diferentes; nas quinas as distâncias entre os eixos diminuem e as colunas se tornam mais grossas. Além disso, os eixos das colunas se inclinam levemente para o interior do edifício; as colunas das fachadas menores são mais grossas do que as colunas dos outros lados; os fustes das colunas engrossam na meia altura, etc.” (PEREIRA, op.cit., pp. 62-63). Fig. 14: Esquema demonstrando as curvaturas encontradas no Partenon, a fim de corrigir as deformações provocadas na visão do observador pela curvatura do globo ocular. Fonte: http://saberporsaber.files.wordpress.com/2008/11/9- curvatura_partenon.jpg A preocupação com a perfeição das medidas é evidente também nas proporções do templo, que se encaixam quase que perfeitamente na proporção áurea. O Partenon ficou em perfeito estado durante muitos séculos. “Ainda no ano de 1300, Pedro III de Aragão ordenou que a protegessem como „a joia mais bela que existe no mundo‟” (PEREIRA, op.cit., p. 65). Porém, após nova invasão dos turcos, o Partenon foi convertido em uma mesquita “completa, com 22 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a a cúpula em forma de bulbo brotando incongruentemente do teto” (GLANCEY, op.cit., p. 26), em 1458, depois em uma igreja católica no fim do séc. VI, e por fim fora convertido em um armazém de pólvora. Em 1687, após ataque dos venezianos, o Partenon explodiu e acabou se fragmentando na ruína que conhecemos hoje. Porém o maior dano é provocado pela poluição industrial dos últimos anos – as toxinas emitidas pelas indústrias, em contato com a umidade, se transformam em ácidos que corroem lentamente o mármore do monumento. Literalmente, o Partenon está derretendo diante dos nossos olhos (GLANCEY, ibidem). 11 Fig. 15: O Erecteion hoje. Fonte: http://blogvasari.files.wordpress.com/2009/06/erecteion.jpg O segundo templo impressionante que veremos também se encontra na Acrópole de Atenas: o Erecteion. Este templo jônico foi construído um pouco depois do Partenon, entre 420 e 405 a.C. pelo arquiteto Filócles, e é dedicado a três deuses: Palas Atenas, Posêidon e o mítico rei Erecteu, cujas imagens haviam ficado sem local para armazenagem após a construção do novo Partenon. Ao contrário das outras construções da Acrópole, que eram erigidas sobre uma base plana, o Erecteion é a única que se adaptou a irregularidades do terreno, que não pôde ser planificado por algumas razões de ordem mitológica, que atribuíam significados sagrados a determinadas partes do morro. Assim nasce um edifício diferente dos restantes, com uma planta mais complexa com três pórticos esbeltos e elegantes, como costumam ser as edificações da ordem jônica. O Pórtico Sul merece destaque, pois suas seis 23 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a colunas foram substituídas por cariátides, que são estátuas representando mulheres que fazem o papel estrutural das colunas, sustentando a arquitraves com suas cabeças. Se as esculturas fossem masculinas, seriam denominadas atlantes. As cariátides são impressionantes e também foram muito imitadas ao longo da história da arquitetura. 11 Fig. 16: As cariátides no Pórtico Sul do Erecteion. Fonte: http://4.bp.blogspot.com/_NDE3cTJyInk/SSrlbvnR4xI/AAAAAAAAA_w/NLEOce omkkU/s400/atenas.jpg Existem outros templos dóricos e jônicos relativamente intactos em outras regiões da Grécia, mas a maioria tende a repetir as mesmas formas do Partenon, que é considerada uma evolução natural da cabana clássica. No entanto, existiam outras formas de edificações religiosas, como é o caso do Altar de Zeus, construído entre 164-156 a.C., ou seja, já no período helenístico da história grega. Os fragmentos desta magnífica escultura foram encontrados na cidade grega de Pérgamo (atualmente Bergama, na Turquia), por uma expedição arqueológica liderada pelo alemão Carl Humann. A construção, que sofrera muito com o tempo e estava destruída, foi escavada, no final do século XIX, em seu sítio original, e suas partes enviadas para a Alemanha. O altar foi então abrigado no Museu Pergamon em Berlim, onde foi inteiramente reconstruído e nos mostra o nível a que a arquitetura e a decoração escultórica chegaram durante o período helenístico. As esculturas lutando ao longo da estilobata são impressionantes pela realidade e vivacidade que exprimem. 24 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a “O grupo [de esculturas] representa a luta entre os deuses e os gigantes. É um trabalho suntuoso (...) O artista pretendeu, obviamente, obter fortes efeitos teatrais (...) Para tornar o efeito ainda mais impressionante, o relevo deixou de ser achatado contra o plano de fundo para se compor de figuras quase soltas, as quais, em sua luta, parecem transbordar para os degraus do altar” (GOMBRICH, 2008, p. 108). 11 Fig. 17: O Altar de Zeus montado no museu em Berlim. Fonte: http://www.musicweb-international.com/Aho/Pergamon_Alt_of_Zeus.jpg Os anfiteatros são um tipo de arquitetura muito importante para a Grécia Antiga. Foram os gregos que inventaram o teatro. Através da encenação de autores de cenas mitológicas ou de passagens literárias, era possível a transmissão de ideias e conceitos, muito caros aos gregos.O teatro surgiu dos rituais de culto ao deus Dionísio, e acabou estendendo-se para culto de outros deuses. De qualquer forma, o teatro grego sempre tinha conexão com um rito religioso. Os anfiteatros consistiam em arquibancadas semiesféricas, dispostas em degraus, em volta do espaço onde eram representadas as tragédias ou comédias. O grande desafio dos gregos era encontrar uma colina com inclinação adequada para a acústica e visibilidade do espetáculo. Como os gregos não tinham desenvolvido técnicas construtivas suficientemente 25 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a elaboradas para construir os anfiteatros independentemente da topografia, muitas vezes os teatros ficavam afastados da cidade. No período clássico, era dada muita importância ao coro (que representavam a ação de um povo ou de grupos humanos), ou seja, à representação de grupos de atores. Já no período helenístico, que preconizava um individualismo maior em detrimento da coletividade, os atores individuais são mais valorizados, e seu desempenho é objeto de observação e análise constante dos espectadores. Isso levou a algumas importantes modificações de ordem técnica na construção dos locais de encenação desses espetáculos. No período clássico, o teatro grego era composto por três partes principais: a orquestra: local onde o coro e os atores representados, que era um grande espaço circular disposto no centro; a arquibancada: assentos colocados em forma semicircular, na encosta de uma colina, onde os espectadores se sentavam; o palco: local ao fundo da orquestra,onde osatores se preparavam para entrar no palco, e onde eram guardados os cenários e figurinos. Com o advento do teatro do período helenístico, a arquitetura dos anfiteatros também sofreu algumas alterações. A principal mudança foi no palco. No período clássico, havia uma construção de um andar chamado proscênio, onde eram afixados os cenários. Toda a ação se desenrolava somente na orquestra.No séc. II a.C., os atores já se apresentam mais isolados do público e do coro, e sua ação ganha destaque. O telhado do proscênio passa a ser convertido num piso para a atuação dos atores (o nosso palco moderno, mais elevado). Atrás do proscênio ergue-se outro andar, em cuja fachada são afixados os cenários. Com essa mudança, a orquestra deixa de ser um círculo completo, e a arquibancada se aproxima mais do palco. Assim, não é mais um espaço dividido em três partes, mas um único espaço unitário – que será melhor desenvolvido posteriormente pelos romanos. Um exemplo de anfiteatro grego é o Anfiteatro de Epidauro, projetado por Policleto e construído por volta de 350-330 a.C. Um dos maiores e mais eficientes do período, o anfiteatro media 112 m de diâmetro e acomodava 26 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a cerca de 14.000 espectadores, acomodados em 55 degraus encostado em uma colina. A sua acústica era considerada perfeita na época, e ainda hoje é utilizado. Além de templos e anfiteatros, os gregos também construíam ginásios, estádios, salões de assembléias, lojas e escritórios nas suas cidades. A maior parte dessas edificações, por serem bastante eficientes e utilizáveis, já foram destruídas ou desfiguradas por séculos de uso, porém é possível ainda encontrar exemplos ao longo do Mediterrâneo e do Mar Egeu. Roma Antiga A civilização romana é outro grande momento da história mundial. Suas contribuições culturais têm parentesco direto com a cultura que se originou na Europa a partir daí – e, por conseguinte, a nossa. Vieram de Roma antiga a maior parte das nossas palavras e mesmo a base do nosso idioma, que é de origem latina. Os romanos tiveram realizações incomparáveis na área jurídica, militar, artística, política, dentre muitas outras.Roma é o berço do Cristianismo, que a princípio foi duramente combatido, e que, já no fim do Império, foi estabelecida como religião oficial pelo Imperador convertido Constantino – tanto que a sede da Igreja Católica, o Vaticano, se situa dentro do perímetro urbano de Roma. A civilização durou cerca de 12 séculos ao todo, surgindo a partir da fundação da cidade de Roma, e chegou a dominar grande parte do território europeu, e da bacia mediterrânea da Ásia e da África durante seu período imperial. A cidade de Roma tem sua fundação envolta em mistérios e lendas (por exemplo, a de que Roma teria sido fundada por dois irmãos – Rômulo e Remo – que teriam sido criados por uma loba), e atribui-se ao ano de 753 a.C. sua fundação. Sua população era formada basicamente pelos gregos e os etruscos (povos itálicos que habitavam a península itálica a partir de 1200 a 700 a.C.). No início, Roma foi uma monarquia, e três dos seus últimos reis foram etruscos.Depois de longas lutas, finalmente Roma venceu a Etrúria em torno de 200 a.C., paulatinamente anexando novos territórios ao seu Império, dando origem à vasta e poderosa civilização no mapa a seguir. 27 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a 11 Fig. 18: Mapa demonstra ndo as regiões que faziam parte do Império Romano à época do nascimento de Cristo. Fonte: http://scriptures.lds.org/pt/biblemaps/map8.jpg “Os romanos foram os „durões‟ do mundo antigo: práticos, trabalhadores, belicosos. Conquistaram todo o mundo ocidental conhecido, ligaram suas extensas regiões por meio de uma rede de excelentes estradas e deram às suas grandes cidades água corrente – trazida de colinas e montanhas a mais de 80 km de distância por meio de grandes aquedutos. Ofereceram banhos públicos, lavatórios públicos, esgoto e transporte público. Construíram blocos de apartamento (insulae ou ilhas) feitos originalmente de madeira e tijolos de barro, mais tarde, de concreto, chegando à altura de oito andares. Fizeram grande uso de aquecimento subterrâneo e, de modo geral, seus edifícios e sua infraestrutura de engenharia foram superiores aos até então conhecidos e permaneceram insuperáveis muitos séculos após a queda do Império Romano, em 476 d.C.” (GLANCEY, 2001, p. 30). Por esta citação de Glancey, podemos notar que a praticidade dos romanos levou a um grande desenvolvimento na construção civil, notadamente no desenvolvimento de novas técnicas (o que mais tarde seria denominado engenharia), e no surgimento de uma noção de planejamento urbano. Tanto 28 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a que o termo “urbano” deriva de urbe, palavra latina que designa a cidade. Veremos um pouco destas práticas urbanísticas a seguir. A arte produzida pelos romanos sofre duas influências bastante diversas: por um lado, a forte influência da arte grega e seu ideal de beleza e harmonia; por outro lado, a inclinação aos princípios etruscos de praticidade e expressão da realidade. De fato, os romanos, descendentes dos etruscos, tinham personalidade diferente dos gregos, e eram um povo mais prático, menos voltado às questões teóricas. Essa diferença é facilmente notável em sua arquitetura. Arquitetura romana Embora a arquitetura romana se vincule em grande parte à arquitetura produzida pelos gregos, e que vimos anteriormente, são várias as contribuições dos romanos. A primeira grande contribuição dos romanos é a pluralidade de programas construtivos, o que reflete em grande medida a complexidade da sociedade romana. As edificações públicas se tornam mais variadas, oferecendo uma infinidade de equipamentos de lazer e funcionais na urbe. A cidade é, na essência, pública. Com isso, a arquitetura amplia as respostas aos problemas técnicas que se apresentam, aumentando seu território de aplicação. Além dos tradicionais templos e edificações cívicas, os romanos constroem termas e basílicas (que, na sociedade romana, eram edifícios cívicos e não religiosos, como ficaram conhecidos depois); teatros, anfiteatros e circos; cisternas, aquedutos, pontes, e construções utilitárias de todo tipo – que passam a ser incorporados no campo da arquitetura. “Poucas vezes se deu na história uma revolução mais transcendental do que a ocasionada por essa ampliação do território da arquitetura romana dentro do mundo clássico” (PEREIRA, op.cit., p.71). Além desta inovação, os romanos trouxeram outras, como a imensa criatividade – as construções romanas exploram diferentes composições volumétricas e formas arquitetônicas, numa escala monumental, apropriando- 29 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a se poderosamente do espaço externo e interno produzido pela construção – rompendo os limites morfológicos anteriores. Isto foi em grande parte ocasionado pelo desenvolvimento de novas técnicas construtivas, herdada dos etruscos: o arco, e, por consequência, a abóbada. Estatecnologia possibilita que as forças exercidas pelo peso das pedras e das estruturas que o arco suporta (como as coberturas e vigas transversais do pórtico grego) sejam distribuídas uniformemente pelo arco e os pilares. Quando o arco se desdobra em vários, formando uma espécie de “túnel”, ele se transforma numa abóbada, que faz as vezes de teto. O mecanismo de distribuição de forças é o mesmo, possibilitando a ampliação da distância entre os elementos verticais de sustentação. Estes elementos permitiam que os romanos construíssem amplos espaços internos, livres dos excessos de colunas, típico dos gregos. “Antes da invenção do arco, o vão entre uma coluna e outra era limitado pelo tamanho da travessa. E esse tamanho não podia ser muito grande, pois quanto maior a viga, maior a tensão sobre ela. E a pedra, que era o material mais resistente usado nas construções, não suporta grandes tensões. É por isso que os templos gregos eram repletos de colunas, o que reduzia muito o espaço de circulação” (PROENÇA, op.cit., p.37) 11Fig. 19: Arco romano na cidade de Cabanes, na Espanha. Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipe dia/commons/thumb/2/21/Arco_ro mano_de_Cabanes.jpg/ Os romanos também inventaram o concreto, o que aumentava a possibilidade de moldar plasticamente novas formas arquitetônicas e em grande escala. Segundo Glancey, 30 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a “Foram os romanos que usaram o concreto pela primeira vez, misturando areia vulcânica com calcário e outro material, muitas vezes ladrilhos quebrados. O concreto permitia que fizessem grandes estruturas – como cúpulas – cobrindo vastas áreas sem sustentação direta. O concreto romano não era reforçado como o equivalente moderno e, portanto, não podia sustentar carga direta. Sua invenção, porém, revolucionou a forma e as possibilidades da arquitetura” (GLANCEY, op.cit., p. 30). Diante dessas inovações técnicas, o sistema construtivo de colunas e dintel, no qual se baseava a arquitetura clássica, se torna obsoleto e deixa claro os limites dos sistemas compositivos e de controle da arquitetura grega. As ordens gregas, neste caso, perdiam o peso de seu caráter normativo – pois as colunas acabam sendo incorporadas aos arcos, porém com uma função mais estética do que estrutural. Como o concreto era amplamente utilizado pelos romanos, construindo cúpulas e abóbadas, e portanto necessitavam menos de colunas para exercer a função estrutural, os romanos muitas vezes usavam as colunas como elementos decorativos em templos, banhos e arenas. Acabaram por desenvolver uma coluna plana ou meia-coluna embutida no elemento vertical do arco, à qual chamamos de pilastra(GLANCEY, op.cit., pp. 31-32). Longe de perderem importância, a linguagem clássica da arquitetura ganhou maior fôlego e qualidade plástica. Os romanos, portanto, não abandonaram as ordens – muito pelo contrário. “Os romanos, ao adotarem arcos e abóbadas em seus edifícios públicos, fizeram questão de empregar as ordens da forma mais visível possível. Talvez achassem que, sem as ordens, um edifício não poderia ser significativo. Talvez procurassem transferir o prestígio da arquitetura religiosa para projetos seculares importantes (...) Apesar de serem, na maioria dos casos, estruturalmente inúteis, as ordens, com cerimônia e grande elegância, dominam e controla a composição à qual estão associadas, tornando os edifícios expressivos” (SUMMERSON, 2006, pp. 17-18). 31 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Os romanos acrescentaram às ordens dórica, jônica e coríntia mais duas ordens próprias: a toscana (uma ordem similar à dórica, mais simplificada e robusta, vinda dos etruscos), e a compósita, que é uma combinação das ordens jônica e coríntia, e que, na antiguidade romana, só aparece no Coliseu. Portanto, as ordens clássicas que conhecemos são cinco – e continuarão a ser utilizadas muitos e muitos séculos depois. Além disso, as abóbadas, domos (colunas semiesféricas) e pilastras também passam a incorporar o repertório da linguagem clássica da arquitetura. O Tratado de Vitruvius Diante de tantas inovações técnicas, a transmissibilidade dos novos conhecimentos da arquitetura se tornou um desafio, principalmente em um Império que expandia seu domínio territorial e temporal. Não bastava transmitir os conhecimentos oralmente. Já no fim do helenismo, surgiram os primeiros textos sobre arquitetura – manuais ou tratados – que tentam resumir, codificar e sistematizar o conhecimento arquitetônico, e assim ampliar seu alcance. Surgem, neste período, os primeiros tratados sobre arquitetura. Todos desapareceram, à exceção de um, de autoria de um arquiteto da época de Augusto, chamado Marcus Vitruvius Pollos, ou apenas Vitruvius. O texto, embora singelo e reinterpretado inúmeras vezes desde que foi redescoberto pelos renascentistas, deixa evidente o saber profissional dos arquitetos do período. É justamente a partir do Renascimento que o Tratado de Vitruvius é cultuado praticamente como uma bíblia laica, consultada sempre para decodificar e compreender a linguagem clássica. Composta por dez volumes, o texto entitulado “De Architettura” ou Os Dez Livros de Arquitetura, exploram diversos aspectos da arquitetura romana, estabelecendo tipos e normas construtivas para os diversos tipos de edificações e aglomerados urbanos dos romanos. A principal contribuição do texto de Vitruvius é a tríade que afirma que “em toda arquitetura deve-se levar em conta sua solidez, sua utilidade e sua beleza” (VITRUVIUS apud PEREIRA, op.cit., p. 72). Estas três palavras – 32 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a firmitas, utilitas e venustas são os componentes vitruvianos da arquitetura e até hoje continuam presentes na forma como entendemos arquitetura. Firmitas se refere à materialidade, a natureza técnica da construção – sua estabilidade, suas condições ambientais e de conforto, o material construtivo, suas soluções tecnológicas. Utilitas se refere ao fato de que a arquitetura, ao contrário de outros tipo de arte, tem sempre uma função, uma utilidade. Ou seja, a utilitas é a capacidade da obra arquitetônica realizar perfeitamente a função a que se destina. Por fim, venustas é a forma, a volumetria, a aparência estética, enfim, o caráter artístico inerente à obra de arquitetura. Toda boa arquitetura é entendida, ainda hoje no séc. XXI, à luz da tríada vitruviana – estes três elementos devem estar em equilíbrio. “Uma obra carente de venustas pode ser uma edificação, mas nunca arquitetura. Uma obra carente de utilitas será escultura ou macroescultura, mas não poderemos nos referir a ela como arquitetura propriamente dita. Uma obra que desdenhe a firmitas não passará de uma arquitetura de papel” (PEREIRA, op.cit., p. 73). Principais construções “O Panteão está para Roma antiga assim como o Parthenon está para a Grécia antiga” (GLANCEY, op.cit., p. 30). Com esta frase, Glancey apresenta o edifício considerado o ápice da qualidade arquitetônica dos romanos – o qual, assim como o Partenon, também é um templo, dedicado a todos os deuses do panteão romano – daí seu nome. Situado bem no centro da cidade de Roma, o Panteão foi construído entre 118-128 d.C.,e talvez tenha sido projeto do próprio imperador Adriano. O Panteão representa o ápice do projeto e da engenharia estrutural dos romanos e explicita a diferença clara entre a arquitetura grega e romana: ao passo em que o Partenon nos mostra o caráter extrovertido e matemático da composição grega; o Panteão exibe o cuidado com os espaços internos e a plasticidade dos volumes dos romanos. “[O Panteão] é uma estrutura impressionante, uma obra de construção fenomenal, que faz uso brilhante do concreto, mas que nunca poderia ser descrita como bela. Impressionante, sim; fascinante, naturalmente; mas enquanto o Parthenon é requintadamente belo, o Panteão, em comparação, é 33 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a bruto. Por quê? Porque para os romanos a arquitetura era algo muito mais prático que para os gregos” (GLANCEY, op.cit., p. 30). 11 Fig. 20: Planta do Panteão. Fonte: http://www.vivercidades.or g.br/publique_222/web/me dia/temploHuman_Pantea o.jpg Ao contrário dos tipos construtivos que costumavam dominar a arquitetura romana, o Panteão é um edifício único em sua configuração. Sua planta centralizada é composta por um vasto salão encimado por uma imensa e ambiciosa cúpula de cerca de 43 metros de diâmetro. Esta cúpula se assenta sobre um cilindro, que são as paredes, com altura correspondente ao raio da cúpula, potencializando o efeito esférico do ambiente principal. A entrada ao Panteão é feita por um pórtico em estilo grego, com colunas e frontão. Sob o frontão, uma curiosa inscrição nos conta um pouco da história desta edificação. O Panteão que nós conhecemos foi uma nova construção no lugar de um outro templo, construído em 27 a.C., durante a República Romana, durante o terceiro consulado de Marco Vipsânio Agripa, e destruído por um incêndio em 80 d.C. Há a seguinte inscrição no pórtico da fachada principal: M.AGRIPPA.L.F.COS.TERTIUM.FECIT, que significa: "Construído por Marco Agripa, filho de Lúcio, pela terceira vez cônsul". Quando Adriano reconstruiu o Panteão, ele manteve a inscrição original, embora não se trate do mesmo edifício. 34 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Fig.21: Vista do Panteão atualmente. Fonte: http://1.bp.blogspot.com/_4syvkRx rivk/Ss- CXFXXbJI/AAAAAAAACrQ/Nypcv 8ALkCk/s400/Pante%C3%A3o+(R oma+-+It%C3%A1lia).JPG Fig. 22: O espaço interno do Panteão. Fonte: http://i.olhares.com/data/big/253/2530529.jpg Pela primeira vez na arquitetura clássica, deu-se maior destaque ao espaço interno do que o externo. O templo deixa de ser apenas um local inacessível, a morada dos deuses, onde apenas se depositavam as oferendas, e passa a agregar o público no seu interior, isolando-os do espaço externo. Este salão interior é iluminado apenas através da luz que penetrava por um orifício zenital, o óculo, o que confere uma certa atmosfera mágica ao espaço. 35 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Os edifícios públicos são de extrema importância para os romanos, que também valorizavam o convívio fora de suas casas. Os edifícios cívicos eram importantíssimos e costumavam ser agrupados em fóruns. O mais soberbo deles é o Fórum de Trajano, inaugurado em 112 d.C., construído pelo arquiteto principal do imperador, Apolodoro. Enquanto que os gregos concebiam a arquitetura com regularidade matemática apenas nos edifícios isolados, os romanos aplicavam os critérios de desenho também nos espaços externos. Assim, o Fórum de Trajano combina princípios da arquitetura grega com uma imponente organização axial e simétrico. Os edifícios eram acessados através de um propileu arqueado, que dava entrada a uma praça quadrada de 126m de cada lado, rodeada de pórticos com colunatas e presidida pelo monumento ao imperador. De cada lado da praça, dois semicírculos prolongavam o espaço, destacando, ao fundo, a Basílica Ulpia. Fig. 23: Fórum Imperial de Trajano, como está hoje. Fonte: http://i.olhares.com/data/big/253/2530529.jpg A basílica romana não é, como já foi dito, uma igreja – visto que a Igreja Católica ainda era incipiente nesta época. A basílica era um edifício cívico, laico, que costumava ser usado principalmente para o comércio e a justiça. Outro equipamento público urbano extremamente representativo da arquitetura romana são as termas, ou banhos públicos, onde a população complementava sua higiene com as atividades desportivas e sociais. As termas 36 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a eram fundadas pela iniciativa privada, mas seus serviços eram gratuitos e frequentados por multidões. As termas romanas tinham uma série de serviços: “nas termas romanas existiam também o frigidarium (ou piscina de água fria), o tepidarium (ou sala com calefação), o caldarium (dedicado a banhos de água quente e vapor) e as salas de massagem, além do estádio e do alojamento para atletas, inclusive salas de reunião e biblioteca” (PEREIRA, op.cit., p. 79). Pode-se afirmar que as termas romanas são a versão romana dos clubes de hoje em dia, e podem ser considerados os edifícios mais complexos de toda a antiguidade. Outros equipamentos de lazer são os destinados a espetáculos, como os teatros, anfiteatros e circos. O teatro é similar aos gregos, embora os romanos tenham dado menos importância ao coro e, por conta disso, diminuíram a orquestra, como já havia ocorrido no período helenístico. Os circosnão são a mesma coisa que os circos atuais, mas sim espaços abertos retangulares, com arquibancadas em ambos os lados maiores, destinados a corridas e competições de atletismo, correspondentes ao estádio grego. Mas o edifício para espetáculo mais paradigmático da arquitetura romana é o anfiteatro, destinado a combates, lutas e outros espetáculos similares.O povo romano apreciava muito as lutas de gladiadores, que poderia ser apreciado de qualquer ângulo. Assim, os romanos deixaram de dispor a arquibancada em semicírculo, e sim em formato elíptico. O espetáculo acontece na arena, na parte central, sob a qual existem uma série de corredores e câmaras por onde saíam as feras, gladiadores e atores. A partir do uso dos arcos na construção, foi possível para os romanos construírem anfiteatros muito mais amplos que os dos gregos, e sem precisar encontrar colinas com a inclinação exata, podendo construí-los onde bem desejavam.Através do uso de fileiras concêntricas de arcadas, umas sobre as outras, os romanos construíam um declive artificial sobre o qual dispunham os assentos do auditório, acomodando assim muitas pessoas. O exemplo mais famoso de anfiteatro romano é o Coliseu, construído ao longo de 8 a 10 anos.Foi iniciado no reinado do Imperador Vespasiano e concluído em 82 d.C., durante o reinado de Domiciano. Seu nome tem a mesma origem que a palavra “colossal”, pois tem dimensões gigantescas: os 37 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a eixos da elipsemedem 190m (o mais longo) e 155m, e 48 metros de altura. O Coliseu tinha capacidade para cerca de 40.000 pessoas sentadas, e mais 5.000 em pé. Fig. 24:O Coliseu hoje. Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/5/53/Colosseum_in_Ro me%2C_Italy_-_April_2007.jpg/800px-Colosseum_in_Rome%2C_Italy_- _April_2007.jpg A fachada do Coliseu era ornamentada externamente com esculturas, inseridas dentro dos arcos, que ficavam entre as colunas em cada um dos pavimentos.Estas colunas eram em diversas ordens gregas. “No Coliseu, temos quatro ordens: dórica, no andar inferior; jônica, no seguinte; coríntia, no último andar aberto; e, no andar superior, uma ordem indeterminada (a qual tem sido chamada compósita, mas que, na verdade, só existe no Coliseu)” (SUMMERSON, op.cit., p. 19). Essa sobreposição das ordens, aliadas com o uso de pilastras para garantir expressividade a uma empena quase sem janelas, foi um dos elementos da linguagem clássica da arquitetura mais imitadas séculos depois. Cada ordem foi aplicada respeitando as regras, e se houvesse qualquer alteração nas medidas e proporções, a perfeição da composição seria perdida. Estas colunas nas fachadas não tinham nenhuma função estrutural, mas eram apenas decorativas, dando ritmo e elegância a uma fachada que poderia ter sido rude. 38 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a Fig. 25: Vista aérea do Coliseu e suas arcadas concêntricas. Fonte: http://api.ning.com/files/1d1SYnz7BhJ2Lc2CjOjMM1N8Bh3AuPqv*S45*sfpSPI_ /RomaANtigaColiseu.jpg Fig. 26: Vista de três ordens superpostas no Coliseu: a dórica, jônica e coríntia. Fonte: http://www.vroma.org/images/scaife_images/023b.jpg Um tipo de construção que surgiu com os romanos é o monumento, ou edifícios que têm um fim memorial ou celebrativo. Dentre elas, destacam-se dois: os arcos de triunfo e as colunas isoladas. As colunas comemorativas são colunas isoladas, elevando-se a grandes alturas (a de Trajano chega a medir 35m), e traziam entalhadas em seu fuste esculturas ilustrando as batalhas nas quais o Imperador celebrado saíra vitorioso. Os arcos de triunfo, por sua vez, são um fragmento de muro, divididos em três seções – cada uma com um arco. Os dois laterais são secundários, menores e mais estreitos. O arco principal é o do meio. No espaço entre os arcos e nas laterais haviam quatro colunas sobre pedestais, e sobre elas se sobressai um entablamento com figuras esculpidas, que sustenta uma superestrutura chamada atiço, geralmente decorada com esculturas e dizeres comemorativos em alto-relevo. Os dois arcos mais famosos são o de Septimius Severo e Constantino, e 39 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a inspiraram muitas construções a partir de sua forma simétrica e bem resolvida de composição. Fig. 27: Arco de Septimius Severus, em Roma. Fonte: http://historiadaarte.pbworks.co m/f/800px- RomeForumRomanumArchofS eptimiusSeverus01.jpg Com relação às construções domésticas, as casas romanas merecem destaque. Existiam três tipos de residências: a domus, ou residências dos cidadãos; as insulae, que eram edifícios de apartamentos coletivos; e a villa, que são casas de campo ou nas áreas rurais da cidade. A casa romana comum é a domus, que nós pudemos conhecer melhor a partir da escavação de duas cidades que haviam sido soterradas com a erupção do Monte Vesúvio em 79 d.C., chamadas Pompeia e Herculano.As ruínas só foram descobertas no séc. XVIII, e hoje muito do que conhecemos do modo de vida dos romanos se deve aos resquícios encontrados nestes sítios arqueológicos, hoje integralmente preservados.Além da própria arquitetura (foram descobertos anfiteatros, casas, banhos), artefatos como vasos, e arte como as pinturas murais, muitos corpos humanos dos antigos moradores foram conservados intactos pela lava vulcânica, surpreendidos nas mais variadas práticas. As domus eram casas de um ou dois pavimentos, e eram praticamente fechadas para o exterior. Os cômodos se voltavam para o interior, ordenadas de forma axial em volta do átrio e de um ou pais pátios com peristilos. O átrio era um elemento importante da casa: com claraboia zenital, este recinto comportava a lareira. A sala de jantar e estar se abrem para o átrio, que também tem acesso ao cômodo conjugal. A partir do séc. II a.C., a influência 40 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a dos gregos transformou o pátio aberto como o espaço mais importante da casa. A beleza da casa romana reside nessa transição entre ambientes abertos e fechados. As casas em Pompeia e Herculano nos mostram que a maior parte dos cômodos eram decorados com pinturas murais Fig. 28: Diagrama de uma casa romana. Fonte: http://bp3.blogger.com/ _NpO3QhD0sGU/SHG m6p5OzRI/AAAAAAAA AXc/WfI5wlKIizA/s400/ 4.casa+romana1.jpg As insulae, por sua vez, tende a ser relacionada com as áreas metropolitanas, e eram constituídas por várias habitações idênticas sobrepostas, separadas entre si por pisos de madeira. “Até o grande incêndio de Roma, em 64 d.C. (quando, dizem, Nero tocou sua lira enquanto via a capital pegar fogo), estas eram, em boa parte, edificações baratas de madeira e tijolos de barro, feitas por construtores inescrupulosas: a morte por incêndio ou desabamento era comum” (GLANCEY, op.cit., pp. 32-33). A altura dessas edificações não era definida nem limitada até que um decreto de Augusto determinou a altura máxima de 25 metros, buscando controlar a densidade demográfica da cidade. A partir da reconstrução de Roma após o incêndio, as insulae foram dispostas de forma simétrica ao longo de ruas com colunatas e ao redor de praças públicas, melhorando suas características urbanas. Também foi determinado que, a partir dali, estas edificações fossem 41 U ni da de : A rq ui te tu ra C lá ss ic a – C iv ili za çõ es G re ga e R om an a construídas em concreto à prova de fogo. Estas edificações, como se pode notar, formaram a base do moderno edifício de apartamentos. As villas, por estar disposta livremente num terreno, tinham uma maior variedade de plantas e formas, e costumavam estar mais voltadas para a área externa. Os exemplos mais luxuosos, as casas de campo de famílias abastadas, tinham uma arquitetura mais elaborada, adornadas por pórticos e colunatas e cômodos voltados para a contemplação da paisagem em torno. As cidades romanas, as urbes, são, como se pode notar, relativamente bem planejadas. Enquanto que os gregos se preocupavam com a expressão perfeita dos edifícios isolados, o modo com que os edifícios eram dispostos no espaço urbano da cidade do período clássico costumava ser mais caótica, sem uma ordenação tão racional quanto a que orientava a construção de seus edifícios. Somente com Hipódamo de Mileto, no séc. V a.C., os gregos demonstraram alguma preocupação com um plano da cidade, que deveria, segundo este filósofo e arquiteto, representar e dar forma à ordem social. Hipódamo então principa a ordenação urbana sobre uma retícula
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