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Revista Brasileira de Geociências 15(2 ): 97-10 2, j unh o de 1985 o PREENCHIMEN TO DO RIFT-VALLEY NA BACIA DO RECONCAVO ANTONIO S~RGIO T ElXERA NETTO' e JESUS J ERÓNIMO DE OLIVEIRA • ABSTRACT Rec ôncavo Basin is a Cretaceous r íft -valley filled up by three ty pes of sub-lacustrian fans: Gomo turb idites, Maracangalha f'luxo-turbidit es and Ilhas shallow fans. When the eastern deep trough was fulfilled the bottom of the lake was f'lattened and prograded by river dom inated hi&..hly cons truc t ivc deltas which reach the northcrn bou ndaries of Tod os os San to s Bay (Pojuca de ltas). Fluvial depo sits of São Sebastião Forma t ion fo llowed behind th e deltas. Explorator y wells drilled within Todo s os Santo s Bay show in the rift-sect ion a seq uence of t urbiditcs (Gomo and Maracanga lha memb ers) and canyon-fill deposits - Taquipe Formatio n, here form alized, upon which it comes Recent bay filling depo sits. Th e Lowcr-Cretaccous deltaic and fluvial sediments are confined to th e nor th , and they did not reach Tod os os Santo s Bay. Therefore, th e bay itself can be considered as a downstream deepest part remaind er o f the rift-va lley lake. RESUMO A reconstitu ição paleogeográfica da Amér ica do Sul no J urássico Super ior co nfigura a existência, na altura do atua l para lelo de Salvador, de uma grande bacia denominada de Depressão Afro-Brasileira. Durante o Cretáceo Infer ior esta bacia exper imentou alguns estágios de convulsão distensional, diferenciando um aulacógeno or ientado SE-NW, cuja part e sul consti tui a atua l Bacia do Recôncavo. Duran te o Andar Rio da Serra o aulacógeno passou por uma fase de subsidência acentuada, desenvolvendo a fisiografia de um lago alongado. O preenchimento deste lago se inicia com uma seqüêncía de uplap for malmente reconhecida como os membro s Gomo e Maracangalha da Formação Candeias, seqüência esta qu e comporta leques de tu rb ldi tos nos quai s se es tima um potencial geológico da orde m de 700 milhões de barr is de petró leo. Quando o lago se tornou raso, ao final do Andar Rio da Serra , a sedimentação em uplap cedeu lugar a um padrão prograda nte , evidenciado pelo co mportamento dos refletores sísmicos representat ivos dos sedimentos deltáicos da Form ação Poju ca. As jazidas de petr óleo cont idas na seqüência progradante têm co ntrole est rutura l, são associadas a falhas de crescimento e diapirismo, e contam com um volume provado de apr oximadamente 1,3 bilhão de barris de petró leo. Durant e o Andar Aratu, no sudoeste da Bacia do Recôncavo, ocorre a implantação de um cany an alongado ; com comprimento mapeado de 60 km , largura variável, abr indo para o sul onde é hoje a Baía de Todos os Santo s. A base erosional deste cany an é bem evidenciada com sísmica de reflex ão , e seu preenchiment o deu-se co m os sedimentos fino s da Fo rmação Taqui pe, aq ui formalizada. A Formação Taq uipe é co nsti tuída por folhelho cinza, com estratificação paralela, localmente piritoso, contendo níveis de rnarga castan ha, mo le. Subordinada mente ocorrem lent es de arenito mu ito fino, rico em carapaça s de ostracodes e com estrati ficação horizon tal. Propõe se como scçâo-tipo o intervalo 565 -915 m no poço . J·TQ·J-BA (Taquipe). Co mo seção de referência oferecem-se os afloramentos entre o km 53,5 e o km 56 ,0 da BR-324 . Ao final do And ar Aratu iniciou-se uma compar timentação estrutural da Bacia do Recôn cavo que, ao nível do co nhecimento atual, está d ivid ida em três sub-bacias separadas por duas falhas transcorrentes bem evidenciadas. O deslocamento horizont al das transcorr êncías at ingiu seu máximo durante o Andar Buracica, quando a sub-bacia central, deslocada para sudeste, promoveu por " efeito de gaveta" a imp lantação do Baixo de Alagoinhas, preenchido por espessa seção de sedimentos do Grupo Massacará. A Formação São Sebastião, tida como o fácies fluvial do Grupo Massacará, progradando , vem a se constituir no at erro que colmato u o rlft-valley do Recôncavo. INT RODUÇÃO A Bacia do Recô ncavo é uma provín- cia geológica preenchida por uma seção juro-cretácea com seis quilôm etros de sedimentos nas áreas de maior espessura (Fig . I) . Ela contém quase 4000 poços perfurados para exploração de pet róleo distrib uídos em la 000 km' . ~ cor- tad a por cerca de 19 000 km de sísmica de reflexão. Passou por uma revisão estratigráfica em 197 1 (Viana et aL 1971) , quando foi formalizada uma coluna lito-b io e cron oestrati· grãfica, Duran te a década de 70, as reservas de petróleo e a pro- dução da bacia passaram por uma fase de declfnio acentua- do , o que gerou a necessidade de reavaliar as potencialída- des explora tó rias. Esta reavaliação foi consubsta nciada nu- ma revisão do arcabouço eslrutural (Nelto et 01. 1984) e uma análise estratigráfica enfocando int ervalos genéticos, aqui apresentada. A Figura 2 ilustra as relações entre a estratigrafia form al e a estratigrafia genética. São diferenciados sete int ervalos genéticos na seção que comporta o preenchimento do rift-volley. A parte basal, en- globand o o Grupo Brotas, a Form ação Itaparica e o Mem- bro Tau á da Fo rmação Candeias, configura uma sedimenta- ção subaérea, dominada por leques aluviais em clima árido e seqüências fluviais que registr am um a transição climáti ca, todos aqu i considerados como seq üência pré-ríft. A conti- nuidade desta seção pré-rifl fo i mapeada numa recon stitui- ção paleogeológica ao nível do pré-Cretáceo, por Nelto ( 1978, Fig, 3, p. 513), oportu nidade na qual ficou defin ida a Depressão Afro-Brasileira, incluin do não só a Bacia do Recõncavo, como tam bém as bacias de Tu cano, Jatobá, Almada, Sergipe, A1agoas, Gabão e Cabinda. Durante o Cretáceo Inferior, no início do registro do Andar Rio da Petrobrás, Dexba (Departam ent o de Exp loração da Bahia) - Av. Freder ico Pon tes, 220 - CEP 40 .00 0, Salvador, BA, Brasil. 98 Revista Brasileira de Geociências, Volume 15 , 1985 SALVAOOR E m TURBIDI TOS DO GO~O [TI FANGLOMERAD OS DA BORDA LESTE w Figura 3 - Seção transversal esquemática na Bacia do R e- côncavo. Note o perfil assimétrico do pacote sedimentar na seqüência-rift , com depocentro deslocado para leste, onde os fa lhamentos qu e delimitam a bacia são contemporáneos com a sedimentação. ESTRATIGRAFIA GEN~T1CA No lago do Recôncavo são hoje reconhecidas sete seqü ências genéticas, bem dife- renciadas tanto na sucessão vertical quanto na distribuição horizontal. Apresenta-se a seguir a caracterização de cada uma delas (vide Fig. 2 para posição estratigráfica). [TI SÃO SEBASTIÃO mDELTAS 00 POJUCA mCANIONS ce TAQUIPE W LEQUES RASOS DO ILHAS mFLUXOTURBIDITOS DO lIIARACANGALHA Fanglomerados da borda leste Ocorrem numa faixa com largura média de 10 km , acompanhando o limite leste da bacia. No compartimento sul, os conglomerados mais an- tigos estão ju stapostos ao topo da seção pré-rift. Para nor- deste, os conglomerados ficam gradativamente mais novos, tendo como caráter marcante sua interdigitação com os sedio mentos das outras seqüências, alimentados de oeste (Fig. 3) . Distalmente os fanglomerados da bord a leste diminuem o teor de cascalho, configurando os arenitos reconhecidos co- mo Membro Morro do Barro. sões semelhantes ao Lago Turkana, no Quênia, África Oriental. Estes sedimentos têm sido objeto de estudo específico por Allard & Tibana (1966) , Miura (1967) e Carozzi et aI. (1976) ; a inferência de uma deposição gravitacional sub- aquosa, à semelhança de um fan-delta com forte empilha- mento vertical, é a interpretação comumente invocadapara explicar esta cunha elástica na Bacia do Recõncavo, Leques de turbiditos do Gomo Este intervalo apresenta como característica mais marcante a presença de camadas de intramicrito impuro, as quais promovem no perfil eletro- indução o desenvolviment o de valores altos de resistivida- de, configurando o que se reconhece na bacia como a "bar- rigado Candeias", A razão elástica é a mais baixa dentre todo s os intervalos da seção-rif t , Rc = 8. A litologi a domi- nante é a de folhelhos e margas e a presença de arenitos é restrita à part e mais funda do lago (Fig. 4) . Os arenitos são dominantemente finos, e configuram geometri a de leques. A seqüência é empilhada em uplap, e infere-se que durante sua deposição a bacia experimentou uma taxa de subsidência maior que a taxa de deposição. Aliás, esta inferência é necessária, uma vez que o registro evolui desde a seção pré-rift , com uma sedimentação sub- t. . t '~.rn· •• • •• • .:L_±. aOROA DA SACIA ~FAlHA~ IRA~ ·CQRRfIlTE~ _ .. _ .. ~ 11; ~ tlfla DOGOMO .' ./ \ ,/ , i Figura J - Situação e arcabouço estrutural da Bacia do Recôncavo, mostrando a compartimentação em sub-bacias do nordeste (N) , central (C) e do Sul (S). Serra, a Depressão Afro-Brasileira compartimentou-se, diferenciando um aulacógeno de subsidência acentuada na área que hoje equivale especificamente às bacias do Recõn- cavo e Tucano Sul. Este aulacógeno tomou a configuração de um rift-valley alongado, com áreas altas a leste no Alto de Salvador, e, devido a uma inversão climática registrada na composição e na geometria dos corpos de arenitos, o rift-valley foi inundado, configurando um lago de dimen- Figura 2 - Coluna estrat igráfic a da Bacia do R ecôn cavo. A litoestratigrafia formal é utilizada para acompanhamento de poços, durante a perfuração. A estratigraf ia genética é utili- zada para orientar a exploração. principalmente no caso de armadilhas estrat igráf icas. Revista Brasileira de Geociéncías, Volume 15, 1985 99 Figura 4 - Mapa de isólitas de arenito dos leques de "Turbi- ditos do Gomo " Observe que acima da linha de charneira as isólitas de arenito têm valor zero, indicando que a Plata- forma de Quiricó era uma zona de by-pass. aérea, até o intervalo seguinte, os fluxo turbiditos do Mara- cangalha, quando o lago passou pela condi ção de maior lâmina d'água , da ordem de algumas centenas de metros. Fluxoturbiditos do Maracangalha Compõem sedimen- to s elásticos terrlgenos com razão arenito /folhelho de 1/ 12. A correlação dos estratos neste intervalo mo stra como regra geral uma fo rte variação faciológica. Os arenitos do Membro Pitanga da Formação Candeias, comple tamente inclusos no in tervalo, têm base erosional, convexa para baixo, e exibem estruturas in ternas que permitem inferir uma sucessão de fluxos de areia como processo deposicional (Klein et aI. 1972). O restante da seção arenosa é const itu ída por turbi- dit os comuns muito bem exposto s na parte norte da llh a de Itaparica (Zalan et ai. 1981), e que são reconhecidos na es- tratigrafia formal como "Camadas Caruaçu". Os fluxotu rbí- ditos de Maracangalha são caracterizados em perfil elét rico devido ao pad rão serrilhado dos arenitos no perfil SP e às baixas 'resist ividades dos folhelhos no perfil de indução . Em seção sísmica fica evidente o empilhamento em uplap, local- mente truncado pela mobilização de massas diap írica s que se iniciam dentro do Maracangalha e eventualmente conti- nuam até a superfície . Leques Rasos do ' Ilhas Este intervalo se diferencia do ante rior principalmente pela resposta que as areias apresen- tam no per fil SP. Aqui se observa um padrão digitiforme em seqüêncía thinning-up , A correlação regional é boa, e o ma- pa de percentagem de areia mo stra uma distribuição unifor- me po r tod a a bacia, com percentagem média de arenito em 40%. Este intervalo é fácil de rastrear, e inclui o que é formalment e reconhecido como Membro Catu da Formação Marfim e a parte basal da Formaç ão Pojuca, Em afloramen- 26 - RL-491 .0 0 .0 .........=~l~Km NEo 26 - RL- 491 PA- I FM. POJUCA ~ ~ ~ ~F~MAAF IM~ fM . TAQUIPE - FM. CANDEIAS -, SECÃO P~ ~IFT 1 ~ ~ EMBASAMENTO '\ o sw 1,0 0.0 Canyon de Taquipe Na part e sudoeste da Bacia do Re- côncavo, no compartimento sul da Figura I, os sedimentos que compõem os Leques Rasos do Ilhas são tru ncados ero- sionalmente ( Fig. 5) , o que promove uma brusca mudança faciológica. 2, 2P Figura 5 - Seç ão sismica de reflexão eviden ciando o trun - camento erosional dos refletores pertencentes ao sistema de Leques Rasos do Ilhas. A parte inferior da f igura é uma in t erpretação sismoestratigráfica do registro da linha 26-RL-491. O exagero vert ical da seção é da ordem de duas vezes. Para posição da seção vide Figura 6. Observe os refle- tores da Formação Marfim e da Formação Candeias trun ca- dos pelo canyon que, após abandono, f oi preenchido pe los sedimentos lamosos da Formação Taquipe. Escala vertical em segundo s. to no km 43 da BA-093, e em testemunhos corta dos em poços do Campo de Miranga, as camadas de arenito exibem , est ratificação cruzada acanalada e estratifi cação horizontal, configurando portanto processo de tração no transporte das areias. Bioturbação é comum. O int ervalo é interpretado como repre sent ativo de leques subaquosos num lago raso, uma inferência consistente com as caracter ísticas observa- das) porém até o mom ento carentes de um modelo recente convenientement e descrito. Os Leques Rasos do llhas são arqueados por compactação diferencial e na parte cen tral e sul da Bacia do Recô ncavo são truncados por folhelhos diapirizado s, com rai zes no Membro Maracangalha, sotoposto. Na parte oeste do com- partiment o sul são truncados erosionalmente pelos canyons de Taquipe, preenchidos com lama. Estas configurações per- mitem muitas possibilidades de fechamento, e, como os arenito s são bons reservatórios) suas perspectivas explorató- rias são boas. Som ente os campos de Miranga e Taquipe , produtores de petróleo no intervalo, tém volumes provados da ordem de 850 milh ões de barri s. • L E GEN DA • -'OO-ISOllTA DE IIRElllfO ~TRA~SCO RR r IlCIA -0- CHAR ~EI RA f lSIDGRAflCA 'loCC' • .. " • 100 o truncamento é rastreado com a malha de sísmica at ira- da na área delimitada na Figur a 6, a qual config ura a feição de um canyon orientado N-S, e, como é de se esperar, preenchido após abandono, por uma sucessão em onlap de sedimentos lamosos. Estes sedimentos foram considerados até 1983 como a "seção anómala" do Andar Aratu. Têm identidade Iitolôgica própria, continuidad e mapeável e límí- tes definidos, razões pelas quais estão sendo adiante forma- Iizados como Formação Taquipe, Deltas do Pojuca Prograda ndo em offlap" por sobre o canyon de Taquipe, preenchido no compartimento sul, e por sobre os Leques Rasos do Ilhas em todo o restante 'da Bacia do Recôncavo, implantam-se os lôbulos deltaicos da Formação Pojuca. Este intervalo caracteriza-se na seqüêncía vertical por mostrar um padrão thickening-up e coarsen- ing-up muito claro , que cont rasta com o padrão thlnning-up dos Leques Rasos do Ilhas, permi tindo quebrar a seção sem dificuld ades quando se usam perfis elét ricos. Os Delt as do Pajuca apresentam-se espetacularmente em afloramentos perto de Salvador (Medeiros & Ponte 1981, p. 22·25). São const itu ídos por intercalações de folhelhos e arenitos com razão a/f = 1/3 e contêm subordinadamente níveis de car- vão e camadas de calcário ostracoidal, com fauna que posi- ciona estes sedimentos como contidos no Andar Aratu na maior parte da bacia, subindo para o Andar Buracica nas áreas equivalentes aos baixos regionais no compartimento central, os quais, por disporem de espaço maior, suportaram por tempo mais pro longado o processo de preenchimento. O mapa de isópacas do intervalo "De ltas do Pojuca " tem uma curva zero que se posiciona subparalelamente a uma distância de 5 km para norte dos limites atuais da Baía de Todos os Santos, indicando a seu modo que a Baía de To- dos os Santos representa o resquício do que foi a parte mais profunda do lago implantado no rift-valley cretãceo . Os po- ços perfurados na baía mostram queaí o preenchim ento do rift fez-se com os fluxoturbid itos do Maracangalha e com as lamas do canyon de Taquipe, seq üências estas particular- mente pobres no sentido de conterem rochas-reservat órios. Em contraste, os Deltas de Pojuca, cujas maiores espessuras ocorrem no compartimento central da bacia, são ricos em reservatórios de boa qualidade, conte ndo até o mom ent o cerca de 40 milhões de barris de petróleo em armadilhas estruturais. Como os folhelhos associados aos reservatórios do intervalo não são gerad ores, os prospectos para petróleo nos Deltas do Pojuca devem prever a po ssibilidade de migra- ção de hidrocarbonetos por planos de falha s que at injam os níveis geradores estratigraficamente abaixo. Sistema fluvial do São Sebastião Este inte rvalo genét i- co não contém petróleo, mas se constitui em excelente aqüífero aberto que, po r estar sat urado com água doce até algumas cen tenas de metros, propicia a exp loração de águas termais em balneários tur ísticos na Bacia do Tucano. Na Bacia do Recôncavo a Formação São Sebastião é do- minada por arenito fino a médio compondo ciclos fining-up em camadas com est ratificação cruzad a acanala- da. Na sucessão vertical os ciclos vão ficando mais grosseiros para cima, sendo o topo da form ação conglomerá tico . Potter et aI. (1977) realizaram 281 medidas de paleocor- rentes em 48.afloramentos distribuídos em toda a bacia; • Para definições e figuras dos padrões de preenchimento de ba- cias, vide Brown & Flsber , 1977 , figuras 13 e 14 . Revista Brasileira de Geocíéncias, Volume 15, 19 85 eles concluíram que a Formação São Seb asti ão representa o registrode um complexo fluvial meandrante, como resulta- dos das paleocorrentes no azimute N 175 . Assim, o preen- chimento final do rift-valley do Recõncavo deu-se por um sistema fluvial que dren ava para sul as áreas alta s do oeste, norte e leste, progradando sobre os Delta s do Pojuca até o limite norte da Baía de Todos os Santos. ESTAGIO TER MINAL O topo da Formação São Se- bastião é truncado por discordãncia regional que esculpiu uma superfí cie ondul ada por sobre a seção-rif l da Bacia do Recônc avo. Esta superfície ondulada estabilizou o nível da bacia em relação às áreas-fonte adjacentes, interrompendo o ciclo sedimentar que colmatou o rift-valley abortado à mar- gem da Depressão Afro-Brasileira. Para fora da Bacia do Recõncavo, isto é, para fora da Baía de Todos os Santos, ocorrem, tanto ao sul quanto ao norte, por sobre a Série do Recôncavo e ainda no Cretáceo Inferior, os evaporitos que registram a primeira incursão de águasmarinhas do Oceano Atlântico, com circulação restrita; o estertor crustal que permitiu a entrada do Proto-Oceano na Depressão Afro- Brasileira completou as transcorrências que afetaram a Ba- cia do Recôncavo, fazendo deslocar, por efeito de gaveta, o compartimento central da bacia (Fig . I). Após cessar a mo- vimentação estrutural, a superfície ondulada da cicatriz foi aplainada, nas proximidades do Alto de Aporá, pelos leques aluviais da Formação Marizal, que hoje compõe os tabulei· ros do Recôncavo Central. FORMALIZAÇÃO DA FORMAÇÃO TAO UIPE Con- form e foi abordado na Introdução, a notícia aqui apresenta- da constitui um sumário dos resultados obtidos com a revi- são estrat igráfica da Bacia do Recôncavo. Tal revisão (Ne Uo el ai. 1984) foi orien tada para a compreensão dos intervalos genét icos, os quais foram rastreados e mapeados sem qual- quer vinculação necessária aos intervalos da estratigrafia for- mal. A coluna estrat igráfica de Viana et ai. (1 971 ) para as bacias do Recôncavo e Tucano está perfeitamente válida, exceto pela ind ividualização litoest rat ígráflca do intervalo aqui apresentado como "Canyo ns de Taquípe", cujos sedi- mentos vêm sendo descritos na rotina da exploração de petróleo com a "Seção Anômal a" do Andar Aratu. A " Se- ção Anômala" na estrat igrafia de Viana et ai. (1971 ) ficou incluída na Formação Pojuca, porque os limites entre as unidades formai s eram balizados pelos marcos elétricos de correlação. No intervalo tido como "anõmalo" estes marcos se perdem, mas o assunto só mereceu atencão especial em 1978, quando a " Seção Anômala" passou a ser reconhecida informalmente. Propõe-se aqui a denominação formal de Formaç ão Ta- quipe para as rochas sedimentares que ocorrem no intervalo 565-915 metros no poço pioneiro I·TQ-I -BA (Taquipe n.o I, Bahia, Figs. 6 e 7). Como seção de referência ofe recem-se os afloramentos entre os km 53 ,S e 56,0 da BR-324 . A For- mação Taquipe é co nst ituída por folhelho cinza, com estra- tific ação paralela, localmente piritoso , conte ndo níveis de marga castan ha, mole. Subordinad amente ocorrem lentes de arenito muito fino, rico em carapaças de ostracodes e com estratificação horizontal . Na seção de referência estes sedi- mentos tem strike N 330 e mergulham entre 100 e I SOpar a NE. O poço I-TQ-I-BA, a seção de refer ência e os limites da Fo rmação Taquipe , mapeados com con troles de 30 poços exp loratórios e cerca de I 000 km de linh as sísmicas de reflexã o, estão apre sentados na Figura 6. R evista Brasileira de Geoci éncias, Volume 15, 1985 101 I 600 900 1100 ' 00 , 00 10 00 POJUC A T A Q U t, I P " E • , o , u c • MARFIM Figura 7 - Perfis elétricos da Formação Taquipe na seção- tipo do 1-TQ-1-BA (Taquip e n.o 1, Bahia}, poço locado no ponto de alti tude + 90 m em relação ao nível do mar e com coordenadas geográfi cas >jf = 120 27' 12 "S e À = 380 29 ' JO"w. Observe o contraste na curva de resistividade entre os sedimentos da Formação Taquipe e suas encaixantes, bem como os valores computados do perfil de mergulho, indicando o caráter discordant e da base. + Km Ip? -200-ISÓPACA ~ AfLORAMEN TOS DA SE- ÇAD OE REfER ENCIA SANTO S , , o I) BAlA ~c:; D TODO S OS Figura 6 - Mapa de isópacas da seqüência genética "Canyons de Taquip e", Observe a geome tria geral do canyon e o alinhamento do talvegue delineado pelo eixo das maiores espessuras. Dentro do canyon é registrada a ausên- cia de três subzo nas da bioestratigrafia do R ec ôncavo, as subzonas 005.2, 005.3 e 005.4 Os sedimentos dentro do canyon contêm fósseis da subzo na 005.5 , que nas áreas mais escavadas se assentam discordantemente sobre sedi- mentos do Andar Rio da Serra. o limite inferior da Formação Taquipe é erosional e dis- cordante sobre as formações Marfim e Candeias, e o limite superior é concordante e transicional à Formação Pojuca. Para oeste, a ocorrência da Formação Taquipe é limitada por uma feição estrut ural que contro la localmente a fisio- grafia da bacia, a Falha de Paranaguá, de padrão normal e com o bloco baixo para leste (F ig. 6). A Formação Taquipe é aqui interpretada como o preen- chimento de um canyon alongado à semelhança com o des- crito por Coleman et al (1983) para uma feição recente observada no Golfo do México. O registro sedimentar tradu- zido pela posição dos corpos de arenito indica que o cany on foi preenchido por onlap, í.e., de baixo para cima (Fig. 8). A parte mais profund a do cany on cretáceo nunca foi com- plet amente preenchida, e seu resquício modificado é hoje a Baía de Todos os Santos. Figura 8 - Esquema de sedimentação em onlap postulado para a Formação Taquipe. O desenvolvimento do canyon é condicionado po r escorregamento das encostas. O preen- chimento da superfície erosional, de baixo para cima, propi- cia que as camadas mais novas subam no tempo e no espa- ço, em car âter retrogradante. CONCLUSÕES A estratigrafia da Bacia do Recôncavo começou a ser montada no século XIX, quando Samuel Allport (1860) identificou fósseis não marinhos e Hartt (1868) datou os sedimentos como cretáceos. Pouco antes da criação da Petrobrá s, Ben Barnes (194 9), à frente de uma equipe de geologia de superfície, reconheceu três fases de 102 preenchimento da "fossa baiana";a pr é-tect ónica, contendo os sedimentos do Grupo Brotas, a sintectônica, aqui discuti- da em detalhe, e a pós-tectónic a, representada pelos sedi- mentos terciários da Formação Barreiras. A introdução do perfil elét rico permitiu a composição da coluna est ratigráfi- ca de Viana et ai. (1971). E, finalmente, a sismoest ratigrafia permi te a formalização da Formação Taquipe. Pode parecer surpreendente que numa bacia com uma densidade média Revista Brasileira d e Geociências, Volum e 15 , 19 85 de um poço por cada 2,5 km' ainda se façam inovações es- tra tigráficas. Mas se o leitor for analisar em detalhe, vai per- ceber que este t rabalho exige bem menos percepção e arte do que o reconhecimento pioneiro de Ben Barnes. Ovolume de dados e conhecimentos hoje disponíveis exigem apenas que os novos conceitos sejam mais precisos e permitam redi - recionar a pesquisa para a prospecção de armadilhas est rati- gráficas e reexploração. REFER~NCI AS BIBLlOGRÀFICAS ALLARD, G. & TIBANA, P.- 1966 - Extensão pré-cretácea e petro- grafia da Série Estância reconstruída pelo estudo dos conglome- rados cretáceos do Recôncavo. BoL Tec. Per.• 9 (1) : 174 5. ALLPORT, S. - 1860 - On the discover y of some fossils remains near Bahia inSouth Am érica, Geai. Soe. London. Quart. J•• 16 : 263-268. BARNES, B. - 1949 • Súmu la dos progressos da geologia de superfl- cte do Reeôneavo em 1949. Cons. Nac, Petrol, (ReL Int, s/n). BROWN, L. F. & FlSHER, W. L.. 1977 - Seismic - stratigraphic interpretation of depositional systems:examples from Brazilian rift and pullapart basins. ln: PAYTON, C. E. (ed.}, Seismic stratigraphy applications to hydrocarbon exploration. Amer. A ssoe. Petrol; Geol. Memoir, 26: 213-248. 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