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ECONOMIA E FINANÇAS PÚBLICAS II PARTE Formas de intervenção concreta do Estado na economia portuguesa Capítulo 2 – A intervenção pública no mercado de trabalho Paulo Marques 1 Capítulo 2 – A intervenção pública no mercado de trabalho 2.1. Razões teóricas para a intervenção pública no mercado de trabalho (proteção no desemprego). 2.2. Modelo Social Europeu; 2.3. A estratégia do invesGmento social; 2 • Porque é que a proteção no desemprego é obrigatória? • Porque é que a proteção no desemprego é organizada pelo Estado? 2.1 Argumentos teóricos para a intervenção pública no mercado de trabalho (proteção no desemprego) 3 • Sobre o facto da proteção no desemprego ser obrigatória • O principal argumento é o de que se não exisGsse essa obrigatoriedade, no caso dos indivíduos que não aderissem a seguros privados, os custos de não estar abrangido por um sistema de proteção no desemprego seriam (também) suportados por outros indivíduos... • Pelos contribuintes, tendo em conta que, em situações em que os indivíduos são elegíveis para benePcios não contribuGvos (assistência social), o benePcio social será financiado pelos impostos de todos. • Pelas famílias dos indivíduos, na medida em que os dependentes também são afetados pela inexistência de rendimento. Quando os indivíduos ficam desempregados, deixam de ter rendimento e essa situação afeta também os seus filhos e o cônjuge. 2.1 Argumentos teóricos para a intervenção pública no mercado de trabalho 4 • Sobre o facto da proteção no desemprego ser organizada pelo Estado • Esta é uma área em que existem muitos problemas de informação assimétrica (SGglitz, 2002) que impedem os mecanismos de mercado de funcionar normalmente. Nomeadamente: • Seleção adversa (’adverse selec*on’)*: embora as seguradoras possam perguntar aos indivíduos sobre a sua história profissional, o processo é muito dispendioso e a verificação diPcil de concreGzar. Como consequência, os indivíduos possuem um nível informação sobre a sua carreira profissional incomparavelmente superior. Por outro lado, há indivíduos que simplesmente não possuem uma carreira profissional. * Quando o cliente tem mais informação do que a seguradora. Nestas situações os bons clientes saem do mercado porque o preço que têm de pagar para estarem ‘segurados’ é muito elevado. Como consequência, apenas os maus clientes permanecem no mercado porque só para eles é que o preço é vantajoso. A longo prazo, este processo inviabiliza a existência destes mercados. (Barr, 2004: 108) -> ver exemplo do mercado de carros usados. 5 2.1 Argumentos teóricos para a intervenção pública no mercado de trabalho • Risco moral (‘moral hazard’)*: os indivíduos têm a capacidade para influenciar (i) a probabilidade de ficarem desempregados e (ii) podem influenciar a probabilidade de deixarem o desemprego, isto é, a duração do desemprego. * Acontece quando os indivíduos podem manipular a ocorrência do evento que está a ser ‘segurado’ (Barr, 2004: 108). • Como consequência, ao contrário do que sucedeu em outras áreas onde tradicionalmente o Estado teve uma forte intervenção (e.g. educação), no caso da proteção para o risco de desemprego não existem praGcamente mercados privados. 6 2.1 Argumentos teóricos para a intervenção pública no mercado de trabalho 2.2 Modelo Social Europeu • Acesso generalizado à educação e à formação; • Acesso generalizado à proteção social e à saúde; • Regulação das relações de trabalho e diálogo social; • Predomínio de financiamento público dos sistemas de saúde e educação via impostos ou contribuições sociais, com efeitos redistribuGvos; • Polí%cas a%vas de inclusão social. (Fonte: Rodrigues, 2009: 109) Aspetos comuns 7 • Reformas para refutar a ideia que o Estado Social contribui para a estagnação do crescimento económico defende que é possível e desejável conjugar elevados níveis de crescimento económico com coesão social. • Desde o início da década de 1990: • 1993 – Livro Branco sobre Crescimento, CompeGGvidade e Emprego; • 1994 – Livro Branco sobre a Proteção Social Europeia; • 1997 – Relatório da Comissão “Modernizar e Melhorar a Proteção Social na União Europeia”; • 1999 – Comunicação da Comissão “Uma Estratégia Concertada de Modernização da Proteção Social” + cimeira do Luxemburgo; • 2000 – Estratégia de Lisboa: “tornar-se a EBC mais compe%%va e dinâmica do mundo, capaz de assegurar um crescimento económico sustentável com mais e melhores empregos e maior coesão social”; • 2005 – Revisão da Estratégia de Lisboa (manutenção de objeGvos, criação de novas insGtuições e programas); • 2010 – Estratégia Europa 2020. Evolução recente 2.2 Modelo Social Europeu 8 • Desde o final dos anos 90, emergiram novas ideias e estratégias associadas ao papel e à forma do Estado Social na Europa • desafios sociais atuais: necessidades sociais não saGsfeitas, aumento das desigualdades, trabalhadores-pobres, desemprego persistente, dimensão dos encargos • Proposta de um novo paradigma para a políGca social europeia de forma a promover a “nova economia baseada no conhecimento” e a responder aos novos riscos sociais não respondidos pelo “anGgo Estado Social” • Ideia central: preparar em vez de reparar! 2.3 Estratégia do investimento social 9 2.3. As várias etapas até à estratégia do invesGmento social 2.3.1. A era Keynesiana • A teoria económica Keynesiana considera que as causas da desaceleração da economia e do crescimento do desemprego se devem a um nível de procura insuficiente e às flutuações cíclicas do capitalismo; • A despesa em políGcas sociais era vista como um instrumento parGcularmente úGl para equilibrar a economia em períodos de recessão. • A construção e expansão do Estado Social, assim como a redução significaGva das desigualdades na distribuição do rendimento era vista como um ingrediente essencial para qualquer estratégia que Gvesse em vista a dinamização do crescimento económico. 2.3 Estratégia do investimento social 10 2.3.2 A era neoliberal • Após a crise económica dos anos 70 e da incapacidade da teoria Keynesiana em explicar o crescimento simultâneo do desemprego e da inflação, as teorias económicas Keynesianas foram fortemente atacadas. • Para os economistas neoclássicos, o nível elevado de desemprego e os baixos níveis de crescimento eram uma consequência da rigidez do mercado de trabalho. O desemprego passou a ser visto como um problema microeconómico de distorções de mercado provocadas pela elevada proteção no emprego, elevados salários mínimos e de uma generosa proteção no emprego. 2.3 Estratégia do investimento social 11 • Embora as políGcas sociais não tenham sido completamente desmanteladas, elas passaram a ter uma nova orientação, a aGvação dos indivíduos. Em vez de garanGr o rendimento, as novas políGcas sociais procuraram criar incenGvos para que os indivíduos regressem rapidamente ao mercado de trabalho. 2.3 Estratégia do investimento social 12 2.3.3 A perspeGva do invesGmento social • A emergência da perspeGva do invesGmento social: – A viragem neoliberal coincidiu com um aumento da pobreza e da desigualdade, incluindo níveis elevados de pobreza entre os que trabalham; 2.3 Estratégia do investimento social 13 – No entanto, os defensores de uma intervenção maisforte do Estado também reconheciam que as políGcas sociais Keynesianas não eram suficientemente adequadas para lidar com a as necessidades da nova economia (economia baseada no conhecimento). • Estes autores defendiam que o desemprego está ligado ao facto de uma parte dos indivíduos não ter as qualificações necessárias para preencher as vagas disponíveis no mercado de trabalho. Neste senGdo, o crescimento económico e a criação de emprego depende decisivamente da resolução desse problema. 2.3 Estratégia do investimento social 14 • A perspeGva do invesGmento social baseia-se em políGcas públicas orientadas para: – Desenvolver o capital humano (invesGmento em educação pré- primária, invesGmento em formação, invesGmento na aprendizagem ao longo da vida); – Tornar a uGlização do capital humano mais eficiente, nomeadamente apoiando a presença das mulheres no mercado de trabalho, apoiando as políGcas aGvas do mercado de trabalho e, finalmente, as políGcas que combinam a flexibilidade e a segurança (‘flexigurança’ – job security vs employment security). 2.3 Estratégia do investimento social 15 ! Keynesian!paradigm! Neoliberal!paradigm! Social!investment!perspective! Diagnosis( on( unemployment( Unemployment( and( slow( growth( due(to(insufficient(demand(( ( Unemployment( and( inflation( due( to( constrained( supply(because(of(labour(market(rigidities((excessively( high( labour( costs,( too(much( labour( regulation,( social( benefits(acting(as(work(disincentives);( Unemployment( linked( to( lack( of( adequate( skills( to( fill( today’s(jobs(and(to(create(the(jobs(of(tomorrow.(( Social( Policy( and( the(economy( Positive( economic( role( of( social( policy:( development( of( social( insurances(to(prop(up(demand(and( stimulate(growth( Negative( economic( role( of( public( social( expenditure:( the(welfare( state( as( a( cost( and( as( the( cause( of( slow( growth(and(inflation.(( Positive( economic( role( of( new( forms( of( social( policy:( social( policies( that( invest( in( human( capital( to( increase( employability( and( employment( levels;( to( support( labour( market( fluidity( (flexGsecurity);( to( prepare( for( the( ‘knowledgeGbased’(economy.(( ( Social'policy'as'a'precondition'for'economic'growth'and' job'creation' Key( values( and( principles( ! Social(equality;(! (Jobs(for(all((men);(! Decommodification;( ! Individual(responsibility;(! Any(jobs;((! Activation.(( ! Social(inclusion;(! Quality(of(jobs;(! Capabilities(approach.(( Key( norms( for( public(action( ! Big(state;(! Central( economic( planning;(! Welfare( state( development.(( ! Lean(state;(! Deregulation;((! Dismantling(of(the(Welfare(State;(( ! Empowering(state;((! Investment;(! Recasting(of(the(welfare(state.(( ( Key(instruments( ! Policies( to( support( demand;(! Development( of( social( insurance( schemes( for( income(maintenance;(! Development(of(the(public( sector;(! Unemployment( compensation.((( ! Monetarist( economic( policies( to( fight( inflation;(! (Deregulation(of(the(labour(market;(! (Privatisation( of( social( and( health( services,( development( of( capitalisation( to( finance( pension(schemes;((! Activation(and(workfare.((( ! Human( capital( investment( policies( to( increase( competitiveness(and(job(creation;(! Development( of( social( services( and( policies( to( support( the( labour( market:( early( childhood( education( and( care;( higher( education( and( lifeG long( learning;( active( labour( market( policies;( policies(to(support(women’s(employment;((! FlexGsecurity(" (Morel et al, 2012:12-13) 2.3 Estratégia do investimento social 16 • Assim, podemos concluir que existem dois Gpos de políGcas de aGvação: • As que encaram as políGcas sociais num senGdo posiGvo e pretendem ‘ajudar’ os indivíduos a regressarem ao mercado de trabalho (inspiradas pela perspeGva do invesGmento social); • As que encaram as políGcas sociais num senGdo negaGvo e que pretendem ‘obrigar’ os indivíduos a regressarem ao mercado de trabalho o mais rapidamente possível (inspiradas pela perspeGva neoliberal). • Estas são as duas orientações que inspiram atualmente as políGcas públicas no mercado de trabalho na Europa. 17 2.3 Estratégia do investimento social • Segundo o Eurostat, as políGcas aGvas do mercado de trabalho (senGdo posiGvo) incluem: • Training; • Employment incenGves; • Supported employment and rehabilitaGon; • Direct job creaGon; • Start-up iniGaGves. • Enquanto que as políGcas passivas incluem: • Out-of-work maintenance and support; • Early reGrement. 18 2.3 Estratégia do investimento social Despesa em políticas ativas do mercado de trabalho (em % PIB) 19 GEO/TIME 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 EU15 : : : : : 0,589 0,542 0,502 0,469 0,462 0,524 0,534 0,473 : : : Belgium : 0,650 0,644 : : 0,455 0,471 0,451 0,464 0,492 0,528 0,553 0,630 0,577 0,510 : Denmark 1,841 1,691 1,655 1,669 1,556 1,453 1,218 1,165 0,984 0,939 1,127 1,361 1,380 1,316 1,301 1,420 Germany 1,100 1,048 1,046 1,059 0,986 0,906 0,813 0,647 0,546 0,550 0,619 0,519 0,432 0,342 0,298 0,291 Ireland 0,831 0,629 0,692 0,620 0,537 0,487 0,469 0,451 0,468 0,526 0,620 0,696 0,690 0,731 0,724 : Greece 0,226 0,227 0,240 0,164 0,085 0,135 0,056 0,140 0,148 0,139 0,210 0,220 : : 0,188 : Spain 0,617 0,643 0,590 0,549 0,546 0,536 0,568 0,612 0,611 0,590 0,637 0,707 0,689 0,558 0,412 : France 1,012 0,979 0,932 0,870 0,796 0,708 0,645 0,668 0,696 0,622 0,710 0,803 0,652 0,631 0,666 : Italy 0,516 0,539 0,615 0,679 0,685 0,521 0,457 0,402 0,360 0,363 0,350 0,318 0,304 0,336 0,322 : Netherlands 0,914 0,903 0,942 0,992 0,934 0,860 0,808 0,730 0,675 0,670 0,749 0,743 0,676 0,604 0,584 0,551 Austria 0,397 0,375 0,414 0,392 0,436 0,421 0,443 0,523 0,493 0,498 0,641 0,641 0,554 0,553 0,586 0,624 Portugal 0,353 0,577 0,511 0,464 0,484 0,512 0,486 0,425 0,359 0,393 0,607 0,536 0,444 0,384 0,461 : Finland 0,880 0,724 0,659 0,653 0,718 0,759 0,700 0,706 0,680 0,640 0,711 0,830 0,821 0,838 0,868 0,913 Sweden 1,853 1,409 1,251 1,154 0,844 0,813 0,893 0,952 0,770 0,635 0,674 0,840 0,911 1,007 1,066 1,078 United Kingdom : : : : : 0,055 0,047 0,035 0,043 0,037 0,054 0,075 : : : : 2.3 Estratégia do investimento social GEO/TIME 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 EU-15 1,331 1,176 1,165 1,250 1,343 1,348 1,259 1,116 0,943 0,965 1,411 1,379 1,227 : : : Belgium 2,309 2,067 2,094 2,271 2,393 2,338 2,284 2,132 1,951 1,948 2,310 2,201 2,036 2,021 2,041 : Denmark 2,509 2,322 2,213 2,248 2,595 2,592 2,281 1,804 1,458 1,175 1,671 1,740 1,608 1,665 1,662 1,441 Germany 2,034 1,810 1,830 2,032 2,166 2,190 1,922 1,628 1,188 1,011 1,455 1,282 0,988 0,946 1,004 0,942 Ireland 1,094 0,777 0,690 0,801 0,850 0,857 0,794 0,820 0,881 1,289 2,489 2,829 2,510 2,409 2,204 : Greece 0,374 0,378 0,342 0,320 0,354 0,388 0,399 0,370 0,326 0,456 0,680 0,713 : : 0,638 : Spain 1,410 1,319 1,339 1,439 1,426 1,465 1,429 1,409 1,422 1,840 2,908 3,053 2,803 2,992 2,822 : France 1,471 1,337 1,367 1,532 1,682 1,656 1,543 1,348 1,206 1,142 1,395 1,408 1,362 1,416 1,464 : Italy 0,635 0,623 0,595 0,601 0,618 0,678 0,747 0,733 0,665 0,778 1,335 1,403 1,313 1,564 1,577 : Netherlands 1,790 1,509 1,430 1,464 1,716 1,831 1,746 1,439 1,146 1,033 1,382 1,447 1,360 1,616 1,949 2,202 Austria 1,291 1,157 1,159 1,218 1,341 1,382 1,460 1,348 1,197 1,121 1,433 1,365 1,247 1,248 1,402 1,410 Portugal 0,769 0,784 0,929 0,897 1,130 1,171 1,240 1,151 1,012 0,951 1,257 1,334 1,281 1,605 1,660 : Finland 2,251 2,021 1,898 1,9631,981 1,954 1,820 1,634 1,374 1,288 1,791 1,710 1,414 1,400 1,620 1,831 Sweden 1,559 1,284 1,063 1,065 1,219 1,317 1,220 1,008 0,699 0,545 0,863 0,756 0,601 0,632 0,677 0,617 United Kingdom 0,353 0,293 0,256 0,244 0,223 0,182 0,180 0,179 0,156 0,194 0,327 0,292 : : : : 20 Despesa em políticas passivas do mercado de trabalho (em % do PIB) 2.3 Estratégia do investimento social Referências bibliográJicas • Barr, N. (2004) Economics of the Welfare State, Oxford, Oxford University Press. (cap. 8). • Morel, N., Palier, B. and Palme, J. (eds.) (2012) Towards a social Investment Welfare State? Ideas, policies and challenges, Bristol: Policy Press. (cap. 1]. • Rodrigues, M. J. (2009) ‘The influence of the European socio- economic model in the global economy’. In: Teló, M. (ed.) The European Union and Global Governance. (cap. 5). • SGglitz, J. (2002) ‘InformaGon and the Change in the Paradigm in Economics’, American Economic Review, 92(3): 460-501. 21
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