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Lei de terras no Brasil e nos Estados Unidos

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LEI DE TERRAS NO BRASIL E NOS ESTADOS UNIDOS 
 
Por volta da metade do século XIX, Estados Unidos e Brasil 
passaram ambos por uma Lei de Terras. Mas a diferença entre uma e 
outra é de caráter diametralmente oposto. No Brasil, em 1850, a 
chamada Lei 601 apresentou novos critérios com relação aos direitos e 
deveres dos proprietários de terra. Esta lei visava, em primeiro lugar, 
impedir aos negros seu acesso, posse e propriedade, pois ocorreu 
justamente quando o tráfico negreiro e a escravidão vinham sendo 
fortemente questionados. Embora o Brasil devesse esperar ainda mais 
de três décadas para a abolição da escravatura (último país a fazê-lo, em 
1888), a dita lei se antecipou. 
Enquanto os trabalhadores eram escravos, a terra poderia ser 
livre. Primeiramente, desde os tempos da doação de grandes sesmarias, 
ainda no séulo XVI, pertencia como privilégio a quem tinha algum 
merecimento diante da metrópole, ou simplesmente estava em boas 
relações de amizade ou parentesco com os senhores do poder. Após a 
independência, em 1822, a terra poderia passar às mãos de quem 
estivesse disposto a explorá-la. Porém, com a liberação dos negros à 
vista, era necessário evitar que estes a tomassem de assalto, dada a 
abundândia de terras devolutas por todo o território nacional. 
Disso decorre que, quando tudo fazia crer que, mais ano menos 
ano, os trabalhadores iriam se tornar livres, a terra tinha que ser 
escravizada. Ou seja, a nova lei exigia um preço para adquirir 
propriedade rural de forma regular e "civilizada”. A terra tornou-se uma 
mercadoria, tanto quanto o inham sido (e continuavam sendo) o pau-
brasil, o algodão, o açúcar, a borracha, o cacao, o café, o minério, e 
assim por diante. Como mercadoria, somente podia ser comprada por 
quem dispusesse de dinheiro vivo ou de suficiente crédito no mercado, o 
que evidentemente não era o caso dos afro-brasileiros. Resulta daí a 
pertinente análise do sociólogo José de Souza Martins no livro O 
cativeiro da terra. 
Segundo o autor, os senhores é que se libertaram dos escravos, e 
não o inverso. De fato, com a entrada maciça dos colonos italianos em 
substituição à mão-de-obra escrava, estava tornava-se um peso morto a 
ser sustentado pelos redimentos das fazendas. A Revolução Industrial, 
juntamente com o sistema de produção capitalista, vinha acelerando 
transformações profundas nas relações trabalhistas e na 
implementação do trabalho assalariado. Nesse contexto de mudança, 
liberando os negros, os fazendeiros e em especial os barões do café 
ironicamente transferiam esse "peso morto” para os ombros dos homens 
agora "livres”. Libertos, mas sem condições de arcar com a própria 
sobrevivência, ver-se-ão forçdos a debandar para a cidade "com uma mão 
na frente e outra atrás”. 
Nos Estados Unidos, a Lei de Terras seguiu um caminho bem 
diverso. Tratava-se aqui da conquista do oeste, tão celebrada 
(folclorizada e distorcida) nos filmes de far-west ou bag-bag. Em 20 de 
maio de 1862, o então presidente Abraham Lincoln sanciona o 
Homestead Act (Lei da fazenda rural). O objetivo era conceder terras a 
baixo custo aos pequenos produtores, desde que fossem chefes de 
família e tivessem 21 anos ou mais. Como garantia deviam trabalhar e 
permanecer na terra por ao menos cinco anos e pagar uma pequena taxa 
de administração. O preço da terra era marcadamente simbólico, uma 
vez que o objetivo da lei era facilitar sua propriedade ao maior número 
de trabalhadores camponeses. Nada menos e nada mais do que uma 
reforma agrarian dentro dos limites do capitalismo liberal. O fato é que, 
com tanta terra agricultável à disposição neste país de dimensões 
continentais, nem esse passo mínimo o Brasil foi capaz de empreender. 
Semelhante cenário revela como os latifundiários e as oligarquias 
rurais brasileiras se mantiveram, ao longo dos séculos – Colônia, 
Império ou República que fosse – retrógrados e obtusos a qualquer tipo 
de mudança. O mesmo caminho vem sendo trilhado pelas mineradoras, 
empresas agrícolas, criadores de gado, cultivadores de soja e cana-de-
açúcar, enfim, e pelo chamado agronegócio. Ainda hoje permanence 
vigente, sob novas roupagens, o tripé da economia brasileira: latifúndio, 
trabalho escravo e monocultivo de exportação (Caio Prado Júnior e 
Celso Furtado). Não se trata de uma chave de leitura somente para 
entender a história do passado – aquela que as escolas não contam – e 
sim para entender, em boa medida, a situação atual da economia. 
Bons exemplos de tal situação (e nos baste citar apenas alguns) 
podem ser, respectivamente, o "latifúndio” dos meios de comunicação de 
massa, as condições análogas ao trabalho escravo em boa parte do 
território nacional e o destino internacional da produção brasileira de 
alimentos. Tudo isso em detrimento de um nível de vida mais justo, 
digno e solidário para grande parte da população de baixa renda, onde, 
apesar dos sinais de crescimento e da participação no grupo dos países 
emergentes (BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), a 
pobreza e a miséria, a subnutrição e a fome resistem em solo brasileiro 
como erva daninha. Como se vê, não são poucos os entraves para 
extirpá-la de uma vez por todas! 
Continua, portanto, o desafio da reforma agrária e agrícola. A luta 
pela terra e na terra, em território nacional, data do século XVI. Índios, 
negros, camponeses e comunidades colombolas têm sido, 
simultaneamente, seus protagonistas, suas vítimas e muitas vezes seus 
mártires. As revoltas de Canudos, Contestado, Catolé, Cabanas, 
Quebra-quilos – entre tantas outras – constituem testemunhos vivos 
dessa resistência e teimosia históricas. Do outro lado, porém, o 
latifúndio resiste com igual teimosia. Porém, enquanto neste último 
persiste a ganância e o acúmulo de capital, sendo o solo um simples 
meio a esse fim, a multidão dos sem terra parte do bom senso de que as 
riquezas naturais de um país deveríam, em primeiríssimo lugar, estar a 
serviço das necessidades básicas de sua própria gente. Além disso, para 
muitos povos indígenas e afro-brasileiros, a terra tem um valor que vai 
além de seu preço de mercado. 
Com o compromisso de adaptar-se às exigências mais urgentes dos 
tempos atuais, a reforma agária e agrícola segue sendo uma das 
bandeiras proritárias de uma verdadeira política econômica em termos 
sérios, amplos e duradouros – em direção a um futuro social e 
ecologicamente sustentável. 
 
Los Angeles – CA (USA), 2 de agosto de 2014

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