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ANSIEDADE E GESTALT TERAPIA

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28/04/2018 ANSIEDADE E GESTALT-TERAPIA
http://www.redalyc.org/html/3577/357735503027/ 1/8
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Como citar este artigo
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Sistema de Información Científica
Red de Revistas Científicas de América Latina y el Caribe, España y Portugal
ANSIEDADE E GESTALT-TERAPIA 1
Letícia Pimentel Santos 2
Luiz Alberto de Freitas Faria 3
Resumo: O artigo aborda o fenômeno da ansiedade sob o ponto de vista da Gestalt-terapia. O
contato, entendido como processual e cíclico, é correlacionado com o tema da ansiedade em
seus aspectos funcionais e disfuncionais. Dessa forma, com base no ciclo do contato, a ansiedade
é apontada como fator constituinte da existência humana. A compreensão da ansiedade, em
termos gestálticos, possibilita uma peculiar estratégia terapêutica sobre o fenômeno em seu
perFl disfuncional.
Palavras-chave: ansiedade, Gestalt-terapia, ciclo do contato, temporalidade.
Alguns conceitos fundamentais
Do ponto de vista da abordagem gestáltica, a experiência humana apresenta-se
na fronteira de contato entre o organismo e o seu ambiente. As fronteiras são proces -
sos de separação e ligação, os quais possibilitam a diferenciação entre o organismo e
o seu meio, bem como a seleção dos elementos nutritivos daqueles que são tóxicos,
sendo que essa diferenciação ocorre por meio dos órgãos sensoriais e pelas respostas
motoras frente ao ambiente. É na fronteira de contato entre o indivíduo e o meio que
ocorrem os eventos psicológicos, sem excetuar o fenômeno da ansiedade. (Perls, He-
fferline & Goodman 1997; Perls, 1988; Yontef, 1998).
Segundo a abordagem gestáltica, a experiência, presente na fronteira de con -
tato, ocorre em conFgurações inteiras e com signiFcado para o organismo. O que não
se apresenta com essas características está fora da fronteira, podendo ser no máximo
uma abstração ou uma potencialidade (Perls et al, 1997; Ribeiro, 1997).
O organismo, no processo de contato com o ambiente, seleciona e assimila os
elementos nutritivos e rejeita os elementos tóxicos. A manutenção de um organismo
supõe uma permanente interação organismo-ambiente. A assimilação de novos ele -
mentos possibilita o seu crescimento (Yontef, 1998).
O processo de contatar o meio, de forma satisfatória, ocorre através da awa-
reness. Awareness é uma especial maneira de experienciar o meio. Segundo Yontef
1 Estudo apresentado em maio de 2006, no XII Encontro Goiano da Abordagem Gestáltica e I Encontro
de Fenomenologia do Centro-Oeste , em Goiânia-GO.
2 Psicóloga pela Universidade Católica de Goiás, Pós-Graduada pelo Instituto de Treinamento e Pesquisa
em Gestalt-terapia (ITGT-UCG), psicoterapeuta.
3 Psicólogo pela Universidade Católica de Goiás, Pós-Graduado pelo Instituto de Treinamento e Pesquisa
em Gestalt-terapia (ITGT/UCG), psicoterapeuta e chefe do setor de saúde da Justiça ±ederal de Goiás.
Santos, L. P.; Faria, L. A. F. v. XII: pp. 267-277, 2006
(1998), a awareness “é o processo de estar em contato com o evento mais importante
do campo indivíduo/ambiente com apoio energético, cognitivo, emocional e sensório-
-motor totais” (p. 236).
O contato abrange tanto ir ao encontro do objeto necessário ao organismo, quan-
to a capacidade de estabelecer limites, rejeitar objetos, retirar-se, afastar-se4. Quem não
consegue suportar o afastamento, tampouco conseguirá estabelecer um nível de con -
tato satisfatório. Nas palavras de Perls (1988), “este contato com o meio e fuga dele,
esta aceitação e rejeição do meio, são as funções mais importantes da personalidade
global” (p. 36).
A Gestalt-terapia deFne o self como a fronteira de contato em movimento.
Quando alguém toca algo no mundo, nesse exato momento também é tocado. Essa
experiência fundamenta a deFnição dinâmica de self, a saber, o self é a experiência
de contato com o mundo no aqui e agora, através da fronteira, momento a momento.
O sutil processo de o organismo buscar no meio a satisfação da necessidade ou
objeto mais importante, em um determinado lugar e tempo, relaciona-se, ainda, com o
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conceito de auto-regulação organísmica. Trata-se do processo de interação entre o orga-
nismo e o meio, onde o organismo busca o seu equilíbrio homeostático (Cardella, 2002).
Apesar da auto-regulação organísmica ser um processo natural de busca de
equilíbrio, o movimento de assimilação de um novo elemento, pelo fato de ser algo
novo, apresenta-se sob a in±uência da ansiedade. O problema surge quando o nível de
ansiedade compromete
o natural processo de contato com os elementos necessários ao organismo. Aqui,
o organismo se torna adoecido por ser incapaz de satisfazer suas necessidades e, assim,
se mantém num estado de desequilíbrio.
O indivíduo ansioso inibe o processo natural de contato e assimilação dos no -
vos elementos necessários ao seu próprio crescimento, devido ao receio antecipado
dos efeitos desses elementos, quando integrados no seu organismo. Em outras pala-
vras, sob a presença da ansiedade, diante da natureza sempre renovada do meio e sua
permanente relação dialética com o indivíduo, este não consegue, espontaneamente,
eleger o objeto hierarquicamente mais importante, no aqui e agora, e se mover rumo
ao mesmo, no sentido de assimilá-lo, aliás, para aGestalt-terapia “a ansiedade é o vá-
cuo entre o agora e o depois. Se você estiver no agora não pode estar ansioso, porque
a excitação ±ui imediatamente em atividade espontânea” (Perls, 1977, p. 15). Dessa
forma, a ansiedade antecipatória ao contato inibe a possibilidade de assimilação e, con-
seqüentemente, o crescimento do organismo.
4 Esta “rejeição do meio”, grafada com o termo “afastamento” na linguagem gestáltica, relaciona-se com a
capacidade do indivíduo em conviver com a própria solidão. Paradoxalmente, a capacidade de encontro
está intimamente ligada à coragem de suportar o afastamento. Quem consegue conviver com a sua soli-
dão consegue ir, genuinamente, ao encontro do outro. Ao contrário, quem busca o encontro para fugir da
solidão, de fato não busca ao outro, mas a si mesmo, e o outro passa a ser um mero “isso” em função da
sua insegurança e ansiedade frente ao mundo (²romm, 1995; May, 1975; Buber, 1974). O outro passa a
ser uma tábua de salvação para o náufrago de si mesmo. ..
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Ansiedade e gestalt-terapia
O transtorno se agrava quando se transforma em um círculo vicioso, ou seja, o
organismo se interrompe e se sobrecarrega com tantas situações incompletas que não
pode prosseguir satisfatoriamente com o processo de viver e se nutrir de forma eFciente.
O ciclo do contato
O contato com o ambiente, segundo a visão da Gestalt-terapia, geralmente
ocorre em uma seqüência ordenada e lógica denominada Ciclo do Contato. Esta lei -
tura do fenômeno do contato desempenha o papel de um mapa para a compreensão
do terapeuta frente às habilidades e inabilidades do cliente no seu manejo em relação
ao meio, bem assim proporciona a seleção de intervenções psicoterápicas pertinentes,
ou seja, aquelas que possibilitam incrementar o contato do cliente com o ambiente e,
desta forma, contribua para o seu crescimento (Zinker, 2001).
A primeira fase do Ciclo do Contato, segundo Zinker (2001), conFgura-se no
processo de formação daawareness. Nesse estágio, inicialmente, a necessidade do in-
divíduo ainda não foi claramente estabelecida e, portanto, está difusa e sem contornos
deFnidos, apesar de haver um elemento do fundo em rudimentar processo de forma -
ção5. À medida que a necessidade aumenta, o referido elemento começa a se destacar
de uma forma mais evidente. Tal elemento passa a ser a Fgura, ougestalt, frente a um
fundo que contém uma inFnidade de possibilidades.
A segunda etapa do Ciclo refere-se à fase da energia/ação. Após oindivíduo
divisar uma Fgura de interesse, começa a fase energética e motora, rumo à manipula-
ção do ambiente, no sentido de alcançar a Fgura desejada e fechar, dessa forma, ages-
talt aberta. Nessa fase há deliberação e escolha do indivíduo em relação ao ambiente.
A seqüência do Ciclo leva à fase do contato, ou terceira fase. No contato o in-
divíduo, via fronteira de contato, assimila o novo elemento anteriormente objetivado.
Nesta fase há menos deliberação e mais espontaneidade. Para a assimilação do novo, o
indivíduo deve ser capaz de se arriscar rumo a algo desejado e ainda não devidamente
integrado. Deve ser capaz, portanto, de lidar com a ansiedade inerente a esse processo
de assimilação de um novo elemento.
Na mesma seqüência entra em cena a quarta fase da resolução/fechamento. A
gestalt divisada no ambiente é fechada, ou seja, a necessidade é satisfeita. Aqui há
equilíbrio do organismo, ou homeostase, conforme assevera a teoria organísmica. A
energia e o interesse diminuem. Há repouso e retraimento, característica da quinta fase,
5 Os termos “Fgura” e “fundo” são conceitos teóricos utilizados pela gestalt-terapia, os quais são oriundos
da psicologia da gestalt . A psicologia da gestalt, ou gestaltpsicologia, contesta a visão atomista da psico-
logia estrutural, bem como da psicologia associacionista, onde a realidade é percebida via fragmentações
de seus elementos. Assim, a psicologia da gestalt compreende os fenômenos sensoriais e comportamen-
tais, entre outros, sob o ponto de vista de estruturas ou totalidades organizadas, as quais são denomina -
das de “Fgura”, em contraposição a um “fundo”, onde o observador participa ativamente, via interesse
(Burow & Scherpp, 1985).
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sendo esta a última etapa do Ciclo do Contato. O fundo volta a ser difuso e indiferen-
ciado até o surgimento de uma outra necessidade, via nova fgura, com a abertura de
uma outra gestalt. O Ciclo volta ao seu estágio inicial.
Esse funcionamento perfeito do Ciclo do Contato, infelizmente e não raro, en-
contra obstáculos, interrupções. As reFeridas interrupções relacionam-se signifcativa-
mente com fenômeno da ansiedade.
Aprofundando a compreensão da ansiedade em termos gestálticos
A ansiedade, na ótica gestáltica, é entendida como a interrupção da excitação.
O organismo humano obtém a sua energia através do alimento e da respiração, sendo
que esta energia Foi denominada por ±reud de libido (Laplanche e Pontalis, 1986). O
termo “excitação” designa o correlato de energia para a abordagem gestáltica. ReFerida
energia não é entendida apenas sob o ponto de vista interno ao organismo, apesar de
estar relacionada com o seu aspecto fsiológico. A excitação invariavelmente está em
Função de um objeto presente no mundo (Rodrigues, 2000). Assim, por exemplo, a raiva
relaciona-se com um obstáculo. É importante ressaltar que a Gestalt-terapia não frag-
menta a realidade em “externa” e “interna”. Assim, por exemplo, o conceito de Fundo
abrange a totalidade das potencialidades presentes, sem a dicotomia externo-interno.
Em situações nas quais as excitações não encontram um caminho rumo ao
mundo, em outras palavras, quando não são expressas, ou seja, quando não se trans -
Formam em atividades, com a mobilização muscular via sistema motor, o resultado é
o surgimento da ansiedade.
A ansiedade é, portanto, uma grande excitação contida, encapsulada, aliás, a
palavra latina angústia signifca “estreiteza, limite de espaço ou de tempo” (±erreira,
1999, p. 142). Na ansiedade há contenção e estreitamento de aspectos fsiológicos, tais
como a retenção da respiração e do sistema muscular, como também do sistema sen -
sorial, entre outros (Perls, 1977).
A respiração é um ato fsiológico e ao mesmo tempo de relação com o mundo.
A respiração é expressão clara da íntima relação entre o homem e o seu meio. A con-
tenção da respiração, nessa perspectiva, sugere um hábito apreendido no decorrer da
história do indivíduo, quando o mundo se apresentou por demais invasivo, opressor
e, por isso, inassimilável.
A mencionada presença inóspita e hostil do mundo veio do passado até o pre -
sente, congelada através de um hábito. Portanto, diante desse mundo que uma vez Foi
experienciado como pouco acolhedor e que se mostrou sem perspectivas positivas, o
indivíduo volta-se para si mesmo, recolhe-se e delimita as suas Fronteiras em uma pe-
quena área de interação. Um mundo uma vez hostil e opressivo empurrou as Fronteiras
do indivíduo, tornando-as estreitas. A respiração, então, apresenta-se como contida, ou
melhor, torna-se cronicamente contida.
Ansiedade e gestalt-terapia
O mundo, então, uma vez inassimilável, torna-se distante, nebuloso e muitas ve-
zes, distorcido e adulterado. Tendo em vista que a excitação não pode ser expressa na
relação imediata com o mundo, essa mesma energia busca alívio, ou expressão, através
da construção de uma “realidade” à parte, projetada e alucinatória em diversos graus.
Tal fato ocorre pois, como não háself sem contato, também não há homem sem mundo,
e quando o mundo torna-se intragável, o homem vê-se obrigado a criar a sua própria
“realidade”, mesmo que seja de fantasmas e de fantasias. Nesse entendimento, Berg
(1994) aFrma que “o paciente que sofre de alucinações, tem objetos que lhe pertencem
exclusivamente. Tem o seu próprio mundo como resultado do seu isolamento” (p. 91).
Em indivíduos com esse perFl, a espacialidade do mundo é experienciada de for-
ma reduzida em vários aspectos. Assim, por exemplo, há redução dos contatos sociais,
sobretudo em situações em que os “olhos do mundo” irão se voltar para o indivíduo.
A clínica descritiva da fobia social é um exemplo proeminente desse fato. Tais indiví-
duos buscam fugir de situações onde serão objeto de maior contato social, como o ato
de comer com outras pessoas, assinar um cheque ou falar em público (Nardi, 1999).
Outro exemplo é a claustrofobia, onde os indivíduos evitam ambientes fechados, os
quais são experienciados como geradores de mal estar e opressão. A claustrofobia é
uma projeção, no ambiente, da experiência de um mundo que é vivenciado como es -
treitado e opressivo (Perls, 2002).
O tempo, para o indivíduo ansioso, da mesma forma, apresenta-se contraído.
O tempo é vivenciado como por demais estreito para conter satisfatoriamente o de-
senrolar dos fenômenos espaciais. Nas palavras de Dalgalarrondo (2000), “pacientes
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muito ansiosos descrevem uma ‘pressão’ do tempo, como se o tempo que dispõe fosse
sempre insuFciente” (p. 79). Em algumas situações sociais esse fato torna-se evidente
como, por exemplo, entrar em uma Fla de banco. Esta experiência é bastante penosa,
pois a vivência subjetiva do tempo, ou seja, a temporalidade, apresenta-se mais clara
no sentido do estreitamento, rigidez ou congelamento, em consonância com a espacia-
lidade, percebida como penosamente contida.
Outro exemplo é a gagueira, onde a ansiedade apresenta-se como excitação,
com ausência de suFciente suprimento de oxigênio, pois o indivíduo tenta falar en -
quanto inspira (Perls, 2002). Assim, a pessoa que gagueja atropela as palavras, pois o
tempo contraído é insuFciente para a construção das frases. O plano da temporalida -
de, onde deverá proferir o seu discurso, é experienciado em dimensões reduzidas. O
resultado é uma Fla apertada e tensa de palavras, uma atropelando a outra, levando o
indivíduo a retornar ao início de uma palavra várias vezes na esperança de conseguir
pronunciá-la satisfatoriamente.
Dessa forma, esta redução espaço-temporal se apresenta como uma diminuição
generalizada do campo vivencial do indivíduo. Sob o pontode vista sensório, esta redu-
ção se apresenta como uma signiFcativa dessensibilização, traduzida em pontos cegos ou
escotomas, os quais são variadas formas de evitação do contato. Segundo Perls (1977),
“se a excitação não puder ±uir para a atividade por intermédio do sistema motor, então
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procuraremos dessensibilizar o sistema sensorial para reduzir a excitação” (p. 95). A rela-
ção com o mundo passa a ser efetivada através de mecanismos de interação resistente. O
ciclo do contato é, então, interrompido por uma série de mecanismos que comprometem o
seu funcionamento normal, sendo a conFuência um exemplo de interação via resistência.
A ansiedade nos mecanismos de interação resistente
A conFuência é o mecanismo no qual o organismo não consegue distinguir o
que é seu e o que é do outro, pois as fronteiras são confusas. Há uma perda da subje -
tividade, pois é comum o organismo deixar que os outros decidam por ele. Constan -
temente, o indivíduo faz o que lhe desagrada para obedecer ao outro, e mesmo assim
±ca ansioso temendo a desaprovação (Perls, 1977; Zinker, 2001). No Ciclo do Conta-
to, a conFuência ocorre antes do início da excitação rumo a um determinado objeto.
Quando a excitação é aceita e o ambiente é confrontado, há emoção, e se a in -
terrupção ocorrer nesta etapa, o resultado será a projeção. Ela é a principal resistência
ao contato na fase de awareness (Perls et al, 1997; Zinker, 2001). A projeção ocorre
quando o indivíduo atribui aos outros as responsabilidades, fracassos e di±culdades
que são dele próprio. Aqui a pessoa coloca a responsabilidade nos outros no sentido
de atenuar a sua ansiedade (Perls, 1977; Romero, 1994).
Na introjeção, o indivíduo obedece e aceita opiniões arbitrárias, normas e va -
lores que pertencem a outros, engolindo conceitos sem nenhum critério, além de não
conseguir defender seus direitos por receio da sua própria agressividade e da possível
agressividade dos outros. Com esta estratégia, administra os níveis de ansiedade em
patamares suportáveis. Tal mecanismo ocorre na fase energética ou de excitação do
Ciclo do Contato.
O indivíduo com o mecanismo denominado de retroFexão faz consigo o que
gostaria de fazer aos outros, ou seja, trata a si mesmo como desejaria tratar às outras
pessoas. A ansiedade é controlada via evitação do confronto direto com o meio. Esse
mecanismo incide no Ciclo do Contato na fase de conFito ou destruição, quando uma
nova con±guração poderia surgir.
O lidar da Gestalt-terapia frente a clientes portadores de ansiedade
Para a abordagem gestáltica, como evidenciado acima, nos transtornos de an -
siedade a excitação não Fui imediatamente para a ação. O indivíduo, sob ansiedade,
não consegue permanecer no “aqui e agora” e, dessa forma, há comprometimento no
processo normal de contato com o meio. Viver no presente é por si só terapêutico, uma
vez que possibilita ao organismo a satisfação de suas necessidades de forma hierárqui-
ca e ordenada, via Ciclo do Contato.
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A iê i li f i di íd i i d i
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A experiência, a peculiar forma em que o indivíduo vivencia o mundo, no aqui
e agora, constitui-se na estratégia terapêutica fundamental da Gestalt-terapia frente à
ansiedade. O gestalt-terapeuta, então, na sua prática clínica, não objetiva enfatizar as
causas que justiFcariam o comportamento ansioso do seu cliente. Seu esforço se con-
centra no sentido de trazer para o primeiro plano a experiência desse indivíduo único
e inédito na sua relação com o mundo, sobretudo com o mundo compartilhado durante
as sessões, na sua relação com o terapeuta. Concentrar-se no “como” o indivíduo ex -
periencia a sua realidade, esforçando-se para diminuir as interrupções do contato com
o presente, pode, pouco a pouco, reformar o processo sutil e espontâneo daawareness
no contexto do Ciclo do Contato, diminuindo o raio de ação da ansiedade disfuncio -
nal, uma vez que esta medra exatamente nas fugas do contato.
A Gestalt-terapia é uma abordagem fenomenológica e existencial. A sua ênfase,
dessa maneira, recai sobre a forma de perceber e processar os fenômenos do campo viven-
cial do cliente, sobretudo na sua relação com o terapeuta. Perls (1988) sintetizou o lidar
terapêutico daGestalt-terapia em cinco perguntas de cunho fenomenológico-existencial,
são elas: “O que você está fazendo?”, “O que você sente?”, “O que você quer?”, “O que
você evita?”, e “O que você espera?” (p. 87). Tais perguntas buscam as interrupções da
experiência imediata, próprias de racionalizações sobre os fatos da vivência do cliente.
As interrupções impedem que a excitações do indivíduo ±uam de forma imediata para a
ação, sendo esta a deFnição principal da abordagem gestáltica sobre o fenômeno da an-
siedade. Assim, estas indagações devem nortear o olhar clínico do terapeuta, como uma
bússola na sua relação com o cliente, no sentido de propiciar a reconstrução do processo
de awareness, sendo esta uma ação terapêutica eFciente sobre a ansiedade.
O indivíduo ansioso está sempre interrompendo a sua experiência imediata com
o mundo, inclusive a sua relação com o terapeuta e consigo mesmo. Essas interrupções
ocorrem através de uma série de mecanismos de evitação do contato. Para ele, Fcar no
aqui e agora é penoso e fator gerador de ansiedade. O terapeuta almeja, diante desse
quadro, criar uma especial relação de conFança e de aceitação do cliente, visto que o
terapeuta começa a fazer parte signiFcativa desse mundo. Assim, a pedra de toque da
Gestalt-terapia, em bases dialógicas, refere-se à região do “entre”, na qual a singula -
ridade do outro é respeitada e conFrmada, (Hycner & Jacobs, 1997).
Esse mundo do cliente, em indivíduos com ansiedade signiFcativa, não raramen-
te, apresenta-se abalado por uma série de desencontros oriundos da sua história (Yontef,
1998). Há, também, uma perspectiva sombria em relação ao futuro. Aliás, o “agora”
se apóia nas duas colunas do passado e do futuro, de maneira que quando uma é aba-
lada, a outra também se torna vacilante e o presente perde a sua ±uidez (Dalgalarron-
do, 2000). Nas palavras de Costa (2004), “A existência, portanto, não é uma realidade
sem referência a um futuro, mas não o é também sem a retenção do passado” (p. 35).
A cura desse mundo ferido e estreitado passa pelo encontro, conforme asseve-
ra a psicoterapia dialógica (Hycner, 1995; Buber, 1974). O terapeuta deve se colocar
como alguém que recebe a existência, ou melhor, a experiência do outro de forma
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completa e incondicional, na medida de suas possibilidades (do terapeuta). Aqui, há
uma peculiar impressão no cliente de que ele não será devidamente aceito novamente,
na sua posição existencial inédita e única. O acolhimento propiciado por uma espe -
cial relação terapêutica, colocada no centro do próprio processo psicoterápico, abre
a esperança para o contato com esse mundo, em certa medida inédito para o próprio
cliente. Esse especial contato é dinâmico e terapêutico, conforme assevera a Teoria
Paradoxal da Mudança de Beisser, a qual afrma que “a mudança ocorre quando uma
pessoa se torna o que é, não quando tenta converter-se no que não é” (Fagan & She -
pherd, 1980, p. 110).
Segundo essa compreensão, os momentos de interrupção do contato devem ser
especialmente acolhidos pelo terapeuta, visto que também ±azem parte da realidade
existencial do cliente. Aliás, tais interrupções são um testemunho vivo do momento
em que o diálogo com o mundo desse indivíduo ±oi bruscamente interrompido na sua
história. São, portanto, a tentativa ansiosa e desesperada de proteger suas ±eridas mais
pro±undas e sensíveis. O terapeuta, então, deve buscar aceitar e compreender esta lin-
guagemda resistência, como uma autêntica mensagem existencial da pessoa na sua
totalidade. Esta aceitação viabiliza o contato e o diálogo genuínos. Inicia-se, então, não
sem difculdades e desencontros, o resgate do diálogo interrompido (Hycner, 1995).
Trata-se de um árduo trabalho construído a partir da região do “entre” terapeuta-cliente.
Nessa perspectiva, o mundo relacional do cliente, parcialmente interrompido,
evitado, nebuloso, distante, ±rio, rígido, sob o impacto desta relação de confrmação
e inclusão, começa a ser resgatado, no aqui e agora do encontro terapêutico de perfl
±enomenológico e existencial.
Para a construção e manutenção desta especial relação terapêutica, as técnicas
terapêuticas, denominadas de experimentos, estão sempre em ±unção de incrementar
a experiência do cliente. Tais técnicas devem surgir espontaneamente da relação te -
rapêutica, no aqui e agora das sessões. A Gestalt-terapia está aberta para uma infni -
dade de técnicas, desde de que as mesmas estejam a serviço da experiência do cliente
na sua relação com o meio, estando incluso nesse meio o próprio terapeuta. Assim, o
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ç , p p p ,
diálogo como mundo pode ser expresso de diversas ±ormas, tais como, a ±ala, a pro -
posição de exercícios respiratórios, o desenho livre, a expressão do sorriso, do choro,
do silêncio, dos gestos, da escrita, da dramatização de cenas signifcativas, etc. (Pols-
ter & Polster, 2001). Para clientes com ansiedade signifcativa, as técnicas expressivas
merecem especial atenção, tendo em vista que o mundo de tais pessoas se apresenta
contido sob diversos ângulos. Expressar-se livremente, seja através de desenhos, tex-
tos, gestos, pode assegurar um apoio à expressão por excelência, a saber, a ±ala autên-
tica. Os exercícios respiratórios também podem ser incluídos, visando a harmonização
desse ato fsiológico e psicológico de extrema importância para indivíduos portadores
de transtornos de ansiedade.
É importante ressaltar que o terapeuta, nessa ótica, apresenta-se da ±orma como
realmente é, ou seja, uma pessoa comum, aliás, a relação terapêutica é, antes de mais
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Ansiedade e gestalt-terapia
nada, um contato humano. Dessa maneira, a sua relação com o cliente busca ser au -
têntica e sincera, esforçando-se para se apresentar sem nenhuma fachada por simples
aparência, ou objetivando ser apenas um receptáculo passivo das projeções do clien -
te. Isso signiFca dar notícias ao cliente de como ele (o cliente) o afeta, mesmo, por
exemplo, quando se sente aborrecido, triste, entusiasmado, alegre, ou mesmo quando
demonstra a sua própria insegurança e ansiedade. Ser uma pessoa autêntica e asserti -
va está a serviço da estratégia básica da Gestalt-terapia de incrementar a experiência
do cliente na sua relação imediata com o mundo.
O incremento da experiência do cliente, a princípio, pode aumentar os níveis
de ansiedade, no entanto, a satisfatória relação terapêutica possibilita que a excitação
siga o caminho rumo à Fgura mais importante em um dado contexto, favorecendo des-
sa forma, o retorno ao funcionamento satisfatório daawareness e do Ciclo do Contato,
sempre no aqui e agora.
Viver no aqui e agora é viver sem ansiedade patológica.
Considerações fnais
A ansiedade é parte integrante da constituição do fenômeno humano. O homem é
um ser biocultural. A sua capacidade de participar ativamente da construção do mundo
o coloca sob a pressão de optar, escolher, tomar decisões, eleger umagestalt, sobretudo
na sociedade hodierna, tendo, ainda, que se realizar dentro de um período limitado: o
homem tem consciência da sua própria Fnitude. Esta realidade o torna ansioso. Trata-
-se, no entanto, de uma ansiedade que o impulsiona para o crescimento e a criatividade.
Esta problemática se agrava quando a ansiedade paralisa o seu desenvolvimen-
to. Sob ansiedade disfuncional, o mundo desse homem se torna reduzido, estreitado. O
mundo, então, está fora de foco, ou fora de contato, na linguagem gestáltica. Seja em
seu aspecto existencial ou disfuncional, a ansiedade é companheira do homem desde
o berço até o seu último suspiro.
Sob o ponto de vista metodológico, frente à ansiedade patológica, a Gestalt-
-terapia está aberta a uma série de técnicas denominadas de experimentos que buscam
exatamente ampliar o nível de contato com a experiência de estar no mundo, inerente
a cada um. O experimento visa, então, trazer para o campo da vivência imediata, con-
centrada e intensiFcada, aquilo que antes era apenas objeto de vagas re±exões e racio-
nalizações e, não raro, de rotas de fuga.
Esse processo de conFrmação da experiência do cliente ocorre sobre o que é
evidenciado em primeiro plano, ou seja, o que é constatado fenomenologicamente.
Não se trata, portanto, do terapeuta exercer o papel daquele que sabe diante daque -
le que nada sabe, mas de uma construção conjunta de conhecimento experiencial, no
aqui e agora. Isso resgata o cliente como co-terapeuta de si mesmo, o que contribui
para diminuição da tendência de buscar apoios ambientais, centrando-se mais em seu
Santos, L. P.; Faria, L. A. F. v. XII: pp. 267-277, 2006
auto-suporte e incrementando a sua auto-estima, fatores bastante comprometidos nos
distúrbios de ansiedade.
A estratégia básica daGestalt-terapia, a saber, a reconstrução da capacidade de
contato via ampliação da awareness, ataca a ansiedade em suas raízes mais profun-
das. Muito pode contribuir, portanto, no combate desse distúrbio tão presente na so -
ciedade contemporânea.
28/04/2018 ANSIEDADE E GESTALT-TERAPIA
http://www.redalyc.org/html/3577/357735503027/ 7/8
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277Revistada Abordagem Gestáltica – Volume XII

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