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CÂNDIDO, Antônio. O estudo analítico do poema. São Paulo: Humanitas Publicações. FFLCH/USP. 1996 Escritor, crítico literário, sociólogo e professor, Antônio Cândido de Mello e Souza (1918 – 2017) é autor de obras fundamentais dentro da crítica literária brasileira, possui um legado extenso e respeitado nas principais universidades do país e fora, que ajudaram a moldar a forma de estudo e interpretação de nossa literatura. Foi professor emérito na Usp e Unesp e foi durante seu exercício na licenciatura que a obra Estudo analítico do poema surgiu. A obra resenhada faz parte de um curso ministrado pelo autor em 1963, para o 4º ano de Letras, tendo sido reaproveitado mais tarde. Na explicação do curso, o autor afirma que adotou um formato mais expositivo, apresentando em cada aula um resumo contendo as ideias principais e elementos necessários para entendimento do conteúdo. Esse livro tornou-se um clássico na análise poética, frequentemente lembrado pelos alunos de Cândido e utilizado por professores universitários de todo o país. Antes de começar o curso, propriamente dito, Cândido explica que o curso não versará sobre a poesia, mas sobre o poema, para não trabalhar com criação poética em sua forma abstrata, sendo assim o curso dispõe-se trabalhar com a poesia manifestada no poema, em sua forma concreta, em versos metrificados ou livres, estudando o que o poema transmite, o seu conteúdo, chegando à poesia através de manifestações palpáveis. O autor também apresenta uma distinção entre análise e interpretação, sendo a primeira um método geral e pragmático, que utiliza a interpretação como etapa, enquanto que a segunda, apesar de dizer que todo estudo real da poesia pressupõe a interpretação, essa seria demasiada pessoal para constituir objeto de ensino e sistematização e deve surgir como um reforço do encantamento da poesia. Cândido, em seu livro, coloca o comentário, que forma a maior parte da análise, ao lado da interpretação como etapas para o desenvolvimento do estudo do poema na universidade, segundo a posição de Benno Von Wiese, que afirma que o comentário corretamente entendido inevitavelmente antecede a interpretação. O livro apresenta a parte teórica, na qual o autor discorre sobre os conceitos comentados a seguir, posteriormente ele aplica esses conceitos por meio de análises, buscando poemas de nomes consagrados na literatura, focalizando os brasileiros, tais como Manuel Bandeira, Gonçalves Dias, Carlos Drummond de Andrade, entre outros. Dessa forma possibilita ao leitor acompanhar o procedimento da leitura crítica. O autor afirma que em seu curso irá investigar o poema em duas etapas, comentário e interpretação, intimamente ligados, todavia que podem dissociar, levando em conta que não há comentário válido sem interpretação, embora essa possa ocorrer sem o comentário. O comentário é o começo da obra, a análise, propriamente dita começa já mais próximo da interpretação, tanto a análise quanto a interpretação necessitam da manifestação do gosto. Todavia, para compor a análise, o autor afirma que não se pode prender exclusivamente à forma nem ao conteúdo, bem como não emprestar sentimentos e ideias pessoais à obra. Para a análise do poema, Cândido utiliza dois caminhos, primeiro emprega os elementos básicos à análise, que são os fundamentos do poema, nessa parte ele apresenta a sonoridade, o ritmo, o metro e o verso, em relação a cada um, o autor discorre sobre a sua importância, classificação e uso. Fundamentos do poema é o capítulo que aborda a análise do poema na sua forma concreta. O segundo capítulo é a análise das Unidades expressivas, que constituem a linguagem poética, as palavras e combinações de palavras dotadas de significados dados pelo poeta, é a análise de sua parte semântica. A sonoridade, uma das camadas mais perceptíveis do poema, é percebida pelo leitor antes de qualquer aspecto mais profundo, mas também pode ser discreta a ponto de não se diferenciar da prosa. Cândido pondera sobre esse recurso, que teve seu uso diminuído na modernidade, apresentando que todo poema exala uma individualidade sonora própria. O autor também apresenta a teoria de Grammont, que afirma a existência de uma conexão entre a sonoridade e o sentimento, embora Grammont ressalte que o som não produz efeito quando não estiver ligado ao sentido. O texto aborda os valores sensoriais e emocionais expressos por cada fonema, mas apresenta que o mais interessante é o efeito dessas sonoridades parciais e combinadas, que podem ser praticamente ilimitados. A rima é um dos recursos mais utilizados na obtenção de efeitos sonoros no poema, que consiste na igualdade ou semelhança na parte final das palavras. Começou a surgiu em razão da decadência da métrica quantitativa, embora a métrica rítmica nunca tenha sida abandonada no modernismo. A rima é o esqueleto sonoro do poema e cria a recorrência do som de modo marcante, estabelecendo uma sonoridade contínua e perceptível. Outro recurso utilizado na poesia moderna é a repetição de palavras, frases e versos. Os elementos sonoros do poema estão interligados e subordinados ao fenômeno chamado ritmo, que organiza a sonoridade das combinações dos fonemas. Pode ser definida como uma regularidade de sons que fere e agrada nossos ouvidos. É uma alternância de sons mais fracos e mais fortes, formando uma unidade configurada. O autor ressalta a importância do ritmo no poema, sendo considerado o esqueleto que ampara o significado e a alma do movimento sonoro. Quando queremos estudar o ritmo, separamos o verso em segmentos rítmicos. Ao número de sílabas poéticas de um verso, chama-se metro; ao número de segmentos rítmicos, ritmo. Verso, último fundamento do poema, é uma unidade significativa que podemos cortar em partes, desarticular, emendar, para analisar os fenômenos que constituem a sua realidade sonora – metro e ritmo. O segundo caminho proposto por Antônio Cândido na análise do poema é a partir das unidades expressivas. Nesse capítulo o autor expõe a linguagem poética propriamente dita, palavras e combinações de palavras dotadas de um significado próprio que se tornam condutoras do significado do poema. O autor afirma que, quando o poema se encontra apenas na camada sonora e rítmica, o poeta ainda não terminou a sua obra, pois é preciso trabalhar com o significado das palavras. É na correspondência, na semelhança entre coisas diferentes, que o poeta cria o significado que busca concentrar em seu trabalho, criando analogias, imagens, metáforas, alegorias, símbolos, entre outros. O verso, mais do que apresentação da sonoridade do poema, é a realidade que requer uma linguagem mais trabalhada e que possua significado variado, de acordo com o tratamento oferecido pelo poeta. Para obter esse efeito o poeta lança mão de recursos para manipular as palavras, recursos esses que Cândido expõe, como a linguagem figurada e o conceito figurado. Nessa obra o autor apresenta esses conceitos, dentro do discurso, para a poesia, chamados de adornos, tropos e figuras, apresentando a metáfora, alegoria, ironia, metonímia, onomatopeia, hipérbole, perífrase e outras figuras que são exploradas na obra como forma de ampliar a compreensão dos recursos utilizados pelos poemas na busca de diferentes significados e significantes. O autor defende que o poeta que sabe fazer bem seu trabalho não apresenta a racionalidade em seus poemas, mas através de uma riqueza emocional, ele consegue colocar nas palavras a experiência, vívida e palpável, tornando a análise do poema, e consequentemente a sua produção, uma experiência filosófica. O posicionamento da obra de Cândido apresenta o estudo do poema a partir de dois aspectos distintos, sua estrutura e seu significado, em suas análises ele apresenta essas duas abordagens como necessárias para a análise do poema, apresentando elementos imperativos para esse estudo, assim as unidades vão se organizando e dando lugar a unidades maiores, e por fim, ao poema.