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DESCUBRA OS SEGREDOS DOS CÓDIGOS E SÍMBOLOS DE TODOS OS TEMPOS. São mais de 1.000 signos e símbolos. Cada um com seu ideograma, explicações e aplicações. /editoraescalaoficial Ou acesse www.escala.com.br JÁ NAS BANCAS! editorial Ser mãe é vivenciar contrações e contradições Gláucia Viola, editora 3ER�MÎE�NÎO�Ï�UMA�PROlSSÎO�� NÎO�Ï�NEM�MESMO�UM�DEVER��Ï�APENAS�UM� DIREITO�ENTRE�TANTOS�OUTROS� Oriana Fallaci A maternidade é, sem dúvida, a construção de um novo papel na vida da mulher. Acredito que mesmo já tendo passado por esse momento mais de uma vez, cada gravidez tem a sua particu- laridade de sentimentos e emoções. O fato é que a idealização da maternidade faz parte da nossa cultura. Ela já começa antes da gestação, com um movimento punitivo e de muito julgamento às mulheres que defendem o seu direito de NÎO�QUERER�SER�MÎE��¡�DIFÓCIL�A�SOCIEDADE�ENTENDER�O�DESEJO�DE�NÎO�TER�lLHOS��/�CONCEITO�DE�SER�COMPLETO�POR� meio da maternidade manifesta-se ainda durante a infância através das brincadeiras de boneca. /�MITO�DE�QUE�ESSE�Ï�O�PERÓODO�MAIS�LINDO�DA�VIDA�DE�UMA�MULHER�PERMANECE��PELO�MENOS�ATÏ�O�lNAL�DA� INFÊNCIA�E�A�ENTRADA�DA�ADOLESCÐNCIA�DO�lLHO��.OS�PRIMEIROS�ANOS��TUDO�Ï�UMA�NOVA�DESCOBERTA��O�ANDAR�� O�FALAR��O�COME¥O�DA�ESCRITA��ENTRE�OUTROS�ENCANTAMENTOS��/�FOCO�Ï�SEMPRE�A�CRIAN¥A��-AS�ONDE�lCA�A�MÎE� nesse processo? Seus medos, suas inseguranças, suas dúvidas? Permanece tudo pra- ticamente invisível, diluído em meio aos cuidados do bebê e na luta emocional de conciliar maternidade, carreira, vida afetiva e individualidade. Sim, porque a perda da identidade da mulher diante da vivência materna é um fenômeno aceito socialmente. Frente a esse cenário, esta edição da Psique Ciência & Vida, convidou a psicóloga perinatal Raquel Jandozza para debater esse paradoxo que envolve intensa felicidade EM�SER�MÎE�E�OS�CONmITOS�GERADOS�PELA�hINVISIBILIDADEv�DA�PRØPRIA�IDENTIDADE�A�PARTIR�DAÓ�� h!O�ENGRAVIDAR�� A�MULHER� SE�VÐ�DIANTE�DE�MUDAN¥AS� FÓSICAS�E�BIOLØGICAS�COMUNS�� contudo, ao mesmo tempo, passa a ocupar um papel social investido de uma série de VALORES�E�CONCEP¥ÜES�QUE�A�ENGESSAM�EM�UM�hMODELOv�NO�QUAL�SØ�LHE�RESTA�SE�ADE- QUARv��EXPLICA�2AQUEL�NO�ARTIGO�DA�PÉGINA���� Essa adequação, porém, é custosa em muitos sentidos e possui questões muito sub- jetivas da mulher. É por essa razão que a maternidade passou a ser estudada e com- PREENDIDA�POR�DIFERENTES�CAMPOS�DO�SABER��INCLUSIVE�PELA�0SICOLOGIA��.ESSE�SENTIDO��O� texto apresenta também a discussão sobre o modelo obstétrico tradicional e a imple- mentação de alternativas como o Parto Humanizado. Para a psicóloga, esse procedi- mento oferece à mulher a possibilidade de retomar seu lugar de protagonista ativa tanto na sua gravidez, no parto diferenciado e, consequentemente, no exercício materno. Que esse artigo contribua para que as contrações e as contradições da maternidade sejam vividas em equilíbrio aos outros aspectos também importantes da vida. Boa leitura! Gláucia Viola WWW�FACEBOOK�COM�0ORTAL%SPACODO3ABER 12 3R F CAPA sumário 07/03/2017 13:17:5 9 MATÉRIAS ENTREVISTA Para Cristiana Facchinetti, a Psicanálise precisa descobrir novos caminhos para enfrentar alterações profundas nas subjetividades humanas SEÇÕES 06 EM CAMPO 16 IN FOCO 18 PSICOPOSITIVA 20 PSICOPEDAGOGIA 22 UTILIDADE PÚBLICA 30 PERFIL 32 COACHING 34 LIVROS 48 NEUROCIÊNCIA 50 RECURSOS HUMANOS 52 CIBERPSICOLOGIA 54 SEXUALIDADE 64 DIVà LITERÁRIO 66 CINEMA 80 EM CONTATO 82 PSIQUIATRIA FORENSE Dislexia em pauta Não se trata de um problema comportamental ou educacional, AINDA�QUE�ESSES�POSSAM�DIlCULTAR�A� IDENTIlCA¥ÎO�E�MELHORA 08 Afetividade rompida !�DIFÓCIL�ACEITA¥ÎO�DO�lM�DA�RELA¥ÎO� ESBARRA�EM�CONmITOS�PSICOLØGICOS� COMO�O�AMOR�PRØPRIO�E�O�RESGATE� de quem somos como indivíduos Diagnósticos incerto Equívocos sobre a Dislexia ainda a relacionam às questões de hereditariedade e à possível maior incidência em meninos 24 74 IM AG EM D A CA PA : S HU TT ER ST OC K Combate à invisibilidade /�MERGULHO�NO�UNIVERSO� MATERNO�DA�GRAVIDEZ� e na criação de um lLHO�FAZ�COM�QUE�A� mãe vivencie a perda da identidade de mulher Dossiê: NOVOS MECANISMOS DE APRENDIZAGEM Habilidades socioemocionais SÎO�FERRAMENTAS�DE�APRENDIZADO� E�DEVEM�SER�ALVO�ESTRATÏGICO�DA� atenção de educadores e familiares www.portalciencia evida.com.br psique ciência&vid a 35 E d u c a ç ã o e P s ic o lo g ia Pesquisadores como Jean Piag et dedicaram sua obra para compreen der e explicar o mu ndo da criança e o seu desenvolvimen to emocional, além do tanto que e sses fatores influenc iam no processo de aprendizado d o s s i ê E d u c a ç ã o e P s ic o lo g ia O universo da COGNIÇÃO e o ato de aprender SH UT TE RS TO CK 23/02/2017 12:50:32 35 70 56 www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 5www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 5 CONSCIÊNCIA FEMININA REVISTA FILOSOFIA – EDIÇÃO 124 giro escala Em artigo da edição 124 da revista Filosofia Ciência&Vida , Isaque Trevisam Braga, mestre em Filosof ia pela Pontif ícia Universi- dade Católica de São Paulo e espe- cialista em Filosof ia Clínica pelo Instituto Interseção de São Paulo, destaca como a Filosof ia tem o ob- jetivo de liberar o homem daquilo que é denominado imprevisível, além de indicar os limites de qual- quer classif icação, acabando por oferecer ao homem a liberdade que, em uma situação de ordena- mento total, coincide com a indi- cação do espaço do possível. Para ele, em consonância com ESSE� PAPEL� ATRIBUÓDO� Ì� &ILOSOlA�� A� &ILOSOlA� 0RÉTICA� COMO� ACONSELHA- MENTO� lLOSØlCO� SURGE� COMO� UMA� atividade bastante conhecida na %UROPA� E� NO�MUNDO�� NA� QUAL� O� l- lósofo, com seu olhar através da &ILOSOlA�� PROPORCIONA� A� ASCENSÎO� às dimensões de mundo e do eu, introduzindo a procura por um dis- cernimento daquilo que se subtrai, daquilo que não é, mas poderia ser, lembrando seu papel fundamental de orientar o outro com a investi- GA¥ÎO�DO�lLOSOFAR� COMO�UMA�CHA- ma que acende improvisadamen- te na alma. Não perca esse ótimo conteúdo presente na edição 124 da revista &ILOSOlA, além de arti- gos sobre política, ética, socieda- de, comportamento e economia, todos elaborados por especialistas e desenvolvidos com base em uma AMPLA�VISÎO�lLOSØlCA�E�ACADÐMICA� O LEGADO DE BAUMAN REVISTA SOCIOLOGIA – EDIÇÃO 68 No início do mês de janeiro, o mundo perdeu um de seus prin- cipais intelectuais do século XX e XXI. Aos 91 anos, o sociólogo polonês Zygmunt Bauman mor- reu em Leeds, na Inglaterra, cida- de onde vivia desde a década de 1970. Bauman deixou uma exten- sa e relevante obra, sendo mun- dialmente reconhecido pelo con- ceito de modernidade líquida. A importância e a peculiaridade de seus pensamentos despertaram, no início dos anos 2000, o inte- resse de Dennis de Oliveira, pro- fessor associado da Universidade de São Paulo, jornalista e doutor em Ciências da Comunicação. Para Dennis de Oliveira, Bau- man discutia estruturas sociais, analisando os impactos nas rela- ções entre as pessoas como con- sequências dos ordenamentos sociais contemporâneos. O pro- fessor acompanhou toda a trajetó- RIA� LITERÉRIA�DO� SOCIØLOGO�POLONÐS� e tem ideias consolidadas a res- peito do legado deixado por ele. Destaca que a teoria crítica e o marxismo apresentam referências importantes para se compreenderO� MUNDO� ATUAL�� AO� CONTRÉRIO� DE� muitos que acham que essas teo- rias morreram. Em entrevista ao número 68 da revista Sociologia, /LIVEIRA� ABORDA� VÉRIAS� QUESTÜES� que diziam respeito ao universo e às ideias de Zygmunt Bauman e fala sobre o legado deixado por sua extensa e rica obra. TON MARAR A sinergia entre as várias disciplinas do saber para a exposição da matemática REFLEXÃO E PRÁTICA: Ética e julgamento sobre o prisma da escolha A filosofia prática como um importante exercício terapêutico na contemporaneidade ÓDIO A PRIMEIRA VISTA A correspondência entre afeto e razão na construção da tolerância BELEZA PURA? Em meio aos padrões, como pensar sobre questões de autenticidade ANO X No 124 – www.portalespacodosaber.com.br EQUILÍBRIO CONSTANTE �(',d2�������35(d2�5������� RENATO JANINE RIBEIRO A dura realidade da supressão do ensino das matérias humanas O LEGADO NADA LÍQUIDO DE BAUMAN, POR DENNIS DE OLIVEIRA, DA ECA www.portalespacodosaber.com.br O VERDADEIRO DESENVOLVIMENTO Em Sala de Aula: Discuta o trabalhismo e seus desdobramentos atuais Os aspectos que o infl uenciam e como o Estado pode promovê-lo, na teoria e na prática Mundo na era Trump Ações do novo presidente dos EUA podem TF�DPOm�HVSBS� enormes paradoxos, B�TVSQSFFOEFS�� os reacionários F�B�FTRVFSEB� Quem é o novo intelectual? Pensadores precisam rever TFV�QBQFM� frente aos novos cenários sociopolíticos Política na modernidade 3FHSBT � JOTUJUVJªFT�F� atores políticos DPOTBHSBEPT� não mais respondem isoladamente às demandas na BUVBMJEBEF 6 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br em campo EDUCAÇÃO EMOCIONAL Competências socioemocionais são a aposta de iniciativa mundial na educação com vistas a uma formação diferencial no novo milênio. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) encabeça a construção de instrumentos que meçam tais competências no ensino público, e quem auxilia nesse trabalho é uma entidade brasileira, o Instituto Ayrton Senna. Resiliência, autocontrole, perseverança, protagonismo, entre outras características já são conteúdo ensinado na escola estadual Chico Anysio, no Rio de Janeiro, referência em competências emocionais. A instituição continua, pelo terceiro ano executivo, sendo indicada como colégio de excelência na rede pública nacional, apresentando excelentes resultados acadêmicos e na gestão de vida de seus alunos. EMPRESAS POSITIVAS Pelo menos três grande empresas brasileiras perceberam que bem-estar e produtividade caminham juntas e aplicaram conhecimentos da Psicologia Positiva em seus treinamentos e gestão. Natura, Elektro e 3M já colhem excelentes resultados, que extrapolam as suas instalações e contribuem na gestão pessoal de vida de seus funcionários. A taxa de retorno do investimento nesse tipo de iniciativa é sempre positiva, segundo estudos do especialista norte-americano em Psicologia Positiva Shawn Archor. No Brasil não tem sido diferente e a aplicação da abordagem nas companhias tende a ser um novo paradigma na condução dos por Jussara Goyano FORMA X CONTEÚDO ANATOMIA DO CÉREBRO ESTÁ ASSOCIADA A PERSONALIDADE E DOENÇAS PSIQUIÁTRICAS, DIZ ESTUDO #ADA�VEZ�MAIS�ACHADOS�DEMONSTRAM�COMO�A�ANATOMIA�E�A�lSIOLOGIA�DO�CÏREBRO� determinam nossos comportamentos. Altos níveis de neuroticismo, que predispõem as pessoas a distúrbios neuro-psiquiátricos, por exemplo, foram associados com o aumento da espessura e à área reduzida em algumas regiões do córtex, como pré- -frontal e temporal. Por outro lado, uma personalidade mais aberta, ligada à curiosi- dade, à criatividade e ao gosto por novidade, foi associada com o padrão oposto: re- duzida espessura e um aumento na área do córtex pré-frontal. Um estudo a respeito, CONDUZIDO�PELA�5NIVERSIDADE�DO�%STADO�DA�&LØRIDA��FOI�PUBLICADO�NA�REVISTA�CIENTÓlCA� Social Cognitive and Affective Neuroscience. A pesquisa baseou-se em neuroimagens de mais de 500 indivíduos, disponíveis através do Human Connectome Project, uma iniciativa dos Institutos Nacionais de Saú- de dos EUA para mapear vias neurais de funcionamento do cérebro humano. O arquivo do projeto contém imagens de indivíduos saudáveis entre 22 e 36 anos de idade, sem histórico de graves problemas médicos neuro-psiquiátricos ou outros. Os pesquisadores explicam que a relação entre a estrutura do cérebro e traços de personalidade em pessoas jovens e saudáveis pode mudar à medida que as pessoas envelhecem, como indicado em estudos anteriores conduzidos pela mesma equipe, incluindo a colaboração de especialistas da Universidade de Cambridge. PARA SABER MAIS: Roberta Riccelli, Nicola Toschi, Salvatore Nigro, Antonio Terracciano, Luca Passa- monti. 3URFACE BASED�MORPHOMETRY�REVEALS�THE�NEUROANATOMICAL�BASIS�OF�THE�lVE- -factor model of personality. Social Cognitive and Affective Neuroscience, 2017; nsw175 DOI: 10.1093/scan/nsw175 www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 7 IM AG EN S: 1 23 RF EXERCÍCIO E VISÃO ATIVIDADE FÍSICA PODE INTERFERIR NO PROCESSAMENTO VISUAL Bom para a depressão e o coração, determi- nante da longevidade, excelente para a memória: o exercício f ísico é remédio e terapia para uma série de distúrbios e parece interferir, também, em nossa visão, embora ainda não seja possível determinar, com precisão, em que nível ele é capaz de aumentar nossa acuidade visual. Estudos anteriores já haviam determinado re- lação entre a ativação dos mecanismos de proces- samento visual de ratos e a atividade f ísica, em nível cerebral e, agora, pesquisadores da Univer- sidade de Santa Barbara trataram de verif icar se o mesmo acontece no cérebro humano, quando praticamos esporte. Um experimento baseado em neuroimagem e testes comportamentais, envolvendo também ati- vidade f ísica, resultou na descoberta de que exer- cícios de baixa intensidade impulsionam a ativação do córtex visual e podem mudar a forma como a informação visual é processada. O estudo foi publi- cado no Journal of Cognitive Neuroscience. PARA SABER MAIS: Tom Bullock, James C. Elliott, John T. Serences, Barry Giesbrecht. Acute Exercise Modulates Feature-selective Responses in Human Cortex. Journal of Cognitive Neuroscience, 2016; 1 DOI: 10.1162/ jocn_a_01082 AR Q UI VO P ES SO AL Jussara Goyano é jornalista e coach certificada pelo Instituto de Psicologia Positiva (IPPC). Atua com foco em performance e bem-estar. Estudou Medicina Comportamental na UNIFESP. COGNIÇÃO NA DEPRESSÃO ESTUDO IDENTIFICA PROTEÍNAS POSSIVELMENTE RELACIONADAS AOS PROBLEMAS DE MEMÓRIA E CONCENTRAÇÃO EM QUADROS DA DOENÇA Quase 7% da população mundial (apro- ximadamente 400 milhões de pessoas) é afetada pela depressão, considerada pela Organização Mundial de Saúde a doença mais incapacitante da atualidade. Tristeza, fadiga e pensamentos obsessivamen- te negativos fazem parte do quadro, que também engloba disfunções cogni- TIVAS��$IlCULDADE�DE�CONCEN- tração, de memória e tomada de decisões são sintomas que tendem a se arrastar até mesmo quando os outros sintomas desaparecem, o que carateriza o potencial incapacitante da doença. O pesqui- sador Marco A. Riva e seus colegas determinaram, por meio de pesquisa em animais, como a depressão cerebral pode afetar a COGNI¥ÎO�EM�UM�NÓVEL�MOLECULAR��IDENTIlCANDO�SUBSTÊNCIAS�QUE� sinalizam as mudanças ocasionadas pelo distúrbio. Certas proteínas foram encontradas em maior quantidade nogrupo de ratos de controle em resposta a um teste cognitivo normal, de reconhecimento de objetos, e em menor frequência no grupo de ratos com sintomas característicos de depressão humana. Outros estudos recentes sugeriram que essas proteí- nas (oligophrenin-1 e Bmal1) desempenham funções nos pro- cessos cognitivos. A descoberta servirá de base para futuras pesquisas sobre tratamentos para depressão maior e transtor- nos relacionados ao estresse, que também ocasiona as mesmas disfunções cognitivas. PARA SABER MAIS: Francesca Calabrese, Paola Brivio, Piotr Gruca, Magdalena Lason-Tyburkiewicz, Mariusz Papp, Marco A. Riva. Chronic Mild Stress-Induced Alterations of Local Protein Synthesis: A Role for Cognitive Impairment. ACS Chemical Neuroscience, 2017; DOI: 10.1021/acschemneuro.6b00392 8 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br CRISTIANA FACCHINETTI CR ÉD IT O DA F OT O: D IV UL GA Çà O Cristiana acredita que os conceitos permanecem, mas ela não concorda com a ideia de comparar as diversas linhas existentes da Psicanálise www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 9 Lucas Vasques é jornalista e escreve nesta publicação. Na opinião de Cristiana Facchinetti, por isso mesmo a Psicanálise deve se repensar para lidar com esse novo cenário contemporâneo, com as subjetividades adquirindo formas muito distintas daquelas produzidas desde o século XVII E N T R E V I S T A O documentário Hestórias da Psicanáli- se – Leitores de Freud discorre sobre a apropriação brasileira da obra de Sigmund Freud e da Psicanálise e foi elaborado a partir de entrevistas com leito- res de Freud espalhados por cidades brasileiras e europeias. O f ilme toca em temas como história, tradução, cultura, linguagem e, principalmen- te, Freud. A partir da obra do diretor e também psicanalista Francisco Capoulade, a psicóloga e psicanalista Cristiana Facchinetti, uma das con- vidadas a participar do documentário, fala sobre esses e outros temas. Cristiana possui graduação em Psicologia (1993) e mestrado (1996) e doutorado (2001) em Teoria Psicanalítica, todos pela Universidade Fe- deral do Rio de Janeiro (UFRJ). Tem um estágio de pós-doutoramento em História das Ciências e da Saúde (2006) pela Fiocruz. Atualmente é pes- quisadora do Departamento de Pesquisa e pro- fessora do Programa de Pós-Graduação em His- tória das Ciências e da Saúde, ambos da Casa de Oswaldo Cruz (Fiocruz), além de professora do Programa de Mestrado Prof issional em Atenção Psicossocial do IPUB (UFRJ) e coordenadora da Rede Iberoamericana de Investigadores em His- tória da Psicologia. É especializada nas áreas de Psicanálise e de História, atuando como orienta- dora principalmente nos seguintes temas: Brasil, Psicanálise, Psiquiatria e Psicologia. ESTAMOS VIVENDO UM MOMENTO DE MUDANÇAS NAS SUBJETIVIDADES Por Lucas Vasques 10 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br mento é construído com os instrumen- tos dados pela língua, pela cultura e pela história social e familiar que antecedem o sujeito, de onde ele surge, como efei- to dos discursos que o atravessam. Se os sujeitos não têm imanência e não ante- cedem os discursos, mas são produzidos por eles, o que dizer dos objetos? Pode- mos dizer que há um referente externo? Não é o que parece. Eles são tão variáveis quanto é variável a compreensão sobre eles. Por isso, usos e leituras dos objetos é que determinam seu sentido. E tal leitu- ra, que é psíquica, é também limitada por uma determinada Weltanschauung. ATUALMENTE, COM TANTAS COMPLEXI- DADES QUE NORTEIAM O COMPORTAMEN- TO HUMANO, O MÉTODO DE FREUD AIN- DA É INDICADO PARA OS MESMOS CASOS DE SUA ÉPOCA? EM CASO POSITIVO, POR QUAIS RAZÕES? CRISTIANA: Mais uma pergunta difícil. As complexidades do comportamento humano sempre existiram; sempre exis- tirão. A questão é que o que é patológico ou anormal em um período pode deixar de ser em outro. Mais do que biológica, então, a questão do comportamento é uma questão cultural. Por exemplo, até algumas décadas atrás a homossexuali- dade era considerada patologia (inver- são sexual) pela Medicina mental. Hoje não mais, graças ao movimento social e político que lutou pela capitulação da Medicina nesse caso. Desde o século XIX, muitos indivíduos, especialmente mulheres com crises histéricas graves, adentravam os asilos e os consultórios médicos. Além disso, mulheres que não QUERIAM� CASAR�� QUE� NÎO� QUERIAM�lLHOS�� que estudavam muito etc. foram toma- das como alienadas. Mas essas moças, frequentemente diagnosticadas como histéricas, desapareceram dos prontuá- rios ainda na primeira metade do século XX, dando lugar no asilo para a psicose maníaco-depressiva e para a degenera- ção. Mudou a cultura, mudou o tempo. Com a entrada da Psicanálise no discur- so da Psiquiatria dinâmica, em meados DO�SÏCULO�88��MUDOU�O�PERlL�DOS�SUJEI- tos internados, mapeados nos prontuá- rios como neuróticos ou psicóticos. Essa FORMA�DE�IDENTIlCAR�O�SOFRIMENTO�PSÓQUI- co ganhou a opinião pública, as artes, os jornais, gerando em muitos lugares aqui- lo que se concebeu como cultura psica- nalítica. A partir do DSM-III (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders) e com o crescimento da Psiquiatria dita biológica, certamente diminuiu o núme- ro de mulheres que chegam ao consul- tório do analista se intitulando como histérica. Por outro lado, o DSM ganhou circulação social: os pacientes que nos chegam ao consultório hoje já nos che- gam frequentemente anunciando serem portadores de síndromes e transtornos, lidos nas revistas femininas ou obtidos através de questionários para medica- mentos, ou mesmo dados pelo ginecolo- gista, ou clínico geral... às vezes até pelo psiquiatra (rs.). Os diagnósticos, por sua vez, criam – eles próprios – uma identi- dade de doente para o paciente. Então, sem dúvida, a Psicanálise precisa hoje lidar com os novos sujeitos advindos das condições da cultura do nosso tempo; e também com a nova/velha maneira de perceber o sujeito e seu sofrimento psí- quico como resultado de uma disfunção IMA GE NS : D AN IE L IS AI A/ AG ÊN CI A BR AS IL E 1 23 RF BASICAMENTE, SOBRE O QUE FOI SEU DE- POIMENTO NO DOCUMENTÁRIO HESTÓRIAS DA PSICANÁLISE? CRISTIANA: Tratamos de diversos as- suntos. A minha entrevista foi feita em diálogo com Sérgio Paulo Rouanet. Então, falamos bastante de literatura, romantismo, iluminismo e Psicanálise. Mas eu diria que o que mais apareceu DA�MINHA�FALA�NO�lLME�FOI�A�DIMENSÎO�DA� Hestória da Psicanálise, tanto no sentido das apropriações singulares – a história pessoal de encontro com esse Estranho mundo do Inconsciente e as apropria- ções sociais – quanto no sentido das condições locais de apropriação. Quem SABE�NA�CONTINUA¥ÎO�DO�lLME�A�DIMEN- são estética e cultural por nós dois assi- nalada seja mais sublinhada. A PSICANÁLISE ESTÁ SEMPRE EM EVOLU- ÇÃO. MESMO ASSIM, VOCÊ CONSIDERA QUE AS IDEIAS DE FREUD AINDA SÃO ATUAIS? COMO ADAPTAR OS PRINCIPAIS CONCEITOS FREUDIANOS PARA OS DIAS DE HOJE? CRISTIANA: Vamos começar pela ideia de evolução, que eu considero equivocada, porque remete a progresso, melhoria. Eu não acho que a Psicanálise esteja sempre em evolução. Eu acho que ela é sempre apropriada de acordo com os contextos – temporais, sociais, culturais – e que o referente “Psicanálise”, isto é, aquilo que Freud realmente pensou ao escre- ver seu trabalho, seu sentido último, está para sempre perdido; a escritura é sem- pre apropriada e reapropriada de modo particular, incessantemente. No capítulo sete da Interpretação dos Sonhos (1900), &REUD� AlRMA�QUE� AS�MARCAS�MNÐMICAS� sempre tendem a seguir as mesmas Bah- nungen, facilitadas que são, mas que, ao mesmo tempo, sempre se produz um diferencial, mesmo quando se trata de repetir o idêntico. Assim, ainda que se pense que os conceitos são universais e atemporais, como alguns o propõem, a Psicanálise também se faz marcar pelo contingente e pela historicidade. Só é possível compreender aquilo que passa pelo aparelho psíquico. Esse entendi- Ainda que se pense que os conceitos são universais e atemporais, como alguns o propõem, a Psicanálise também se faz marcar pelo contingente e pela historicidade. Só é possível compreender aquilo que passa pelo aparelho psíquico www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 11 te, não se trata de necessidade de atuali- zações, mas da existência de circulação e apropriações diferenciadas. EXISTEM NOVAS PESQUISAS SENDO DESEN- VOLVIDAS HOJE EM DIA A RESPEITO DA EFI- CÁCIA DO MÉTODO FREUDIANO, E SE EXIS- TEM, COM QUAIS OBJETIVOS? CRISTIANA: A pesquisa em Psicanálise que se realiza atualmente traz a marca de sua historicidade. De fato, desde Freud se questiona sobre o estatuto da Psica- nálise. Sua Interpretação dos Sonhos (1900) foi muitas vezes considerada como ad- VINDA�DO� CAMPO�DA�lC¥ÎO�� ASSIM� COMO� sua Metapsicologia (Strachey, 1975; Ellenberger, 1976). Já Legrand (1973) a contrapôs à ciência empírica, propondo a Psicanálise como uma terceira via de conhecimento. Tais debates sobre o esta- tuto da Psicanálise ganharam particular interesse primeiro na França e depois no Brasil, especialmente a partir da década de 1990, quando passaram a ser sistema- tizados nas universidades – em particu- lar nas pós-graduações. De lá para cá, um número muito grande de pesquisas vem sendo desenvolvido no campo. Nes- sa tradição, fazer pesquisa em Psicaná- LISE�Ï�RECONHECER�SUAS�ESPECIlCIDADES��O� legado da clínica e a centralidade do su- jeito do Inconsciente, para começar; sua metodologia; e o retorno aos textos que formulam suas teorias para a construção de novas perguntas, a partir de interes- ses particulares de pesquisas e dos novos contextos históricos e culturais. Já com RELA¥ÎO�Ì�ElCÉCIA��ALGUNS�OUTROS�ESTUDOS� – em sua maioria advindos de uma tra- dição anglo saxã – buscam estabelecer e comprovar os resultados positivos da te- rapia psicanalítica, como indica Wallers- tein (2001). Entretanto, é bom chamar atenção que tais investigações parecem estar mais preocupadas com dados para a assistência e para os planos de saúde, assim como com bons argumentos para os consumidores, do que propriamente com a singularidade do sujeito do In- consciente, pesquisa essa que não pode SER�QUANTIlCADA��#OMO�JÉ�APONTOU�,ACAN� neuronal, hormonal etc. Mas enquanto houver esse sujeito moderno – dividi- DO�� EM� CONmITO��MARCADO�PELO� RECALQUE� e pelo inconsciente, mas também pela liberdade –, a Psicanálise também conti- nuará a existir. COMO PESQUISADORA DA HISTÓRIA DA PSICANÁLISE, VOCÊ ACREDITA QUE É POS- SÍVEL COMPARAR AS DIVERSAS LINHAS DE FREUD, LACAN, WINICOTT, MADALAINE ETC., EM TERMOS DE CONCEITOS E PRÁTI- CAS CLÍNICAS? CRISTIANA: Alguns conceitos permane- cem, mas não compreendo a ideia de comparação; são apropriações diversas, que valorizam determinadas partes da teoria freudiana sob a luz de interesses e entendimentos locais e particulares. LACAN, APESAR DE ADEPTO DE FREUD, DESENVOLVEU ALGUMAS RELEITURAS E REFORMULOU TEORIAS QUE SÃO MUITO CONCEITUADAS HOJE. ISSO NÃO SIGNIFICA QUE AS IDEIAS DE FREUD PRECISAM SER ATUALIZADAS? CRISTIANA: Considero que Lacan, ao se dizer freudiano, ao propor um retorno a Freud, o faz dando plena legitimidade PARA� AQUILO� QUE� OUTROS� lZERAM�� TALVEZ� sem perceber: ele reconhece essa apro- priação e faz dela sua própria escritura. E é justamente o reconhecimento dessa apropriação personalíssima – marca da circulação da Psicanálise na França de seu tempo e de seus círculos intelectuais – que faz a obra dele ganhar a originali- dade e a dimensão que possui. E por ou- tro lado, é por isso também que ele pode AlRMAR�SUA�LEITURA�COMO�FREUDIANA��SEM� hesitar. Assim, como disse anteriormen- Se os sujeitos não têm imanência e não antecedem os discursos, mas são produzidos por eles, o que dizer dos objetos? Podemos dizer que há um referente externo? Não é o que parece. Eles são tão variáveis quanto é variável a compreensão sobre eles Cristiana cita que, até algumas décadas atrás, a homossexualidade era considerada patologia. Hoje não mais, graças, principalmente, ao movimento social e político 12 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br As complexidades do comportamento humano sempre existiram; sempre existirão. A questão é que o que é patológico em um período pode deixar de ser em outro. Mais do que biológica, então, a questão do comportamento é uma questão cultural (1998), tal preocupação com o sucesso pode levar à tentativa de vender a Psica- nálise dentro de um regime de exigência de felicidade, o que seria mesmo uma to- tal renegação da Psicanálise. QUAIS OS IMPACTOS DO LEGADO DE FREUD PARA OS PROFISSIONAIS DA PSICANÁLISE E POR QUE HÁ TANTOS ESPECIALISTAS QUE DIVERGEM DE SUAS IDEIAS? CRISTIANA: Freud reabriu a ferida narcí- sica que a Medicina positiva e tecnológi- ca, apoiada na promessa de cura, sempre insistiu em fechar. O legado de Freud é justamente essa insistência de se apontar para o mal-estar estrutural do sujeito na cultura. É esse chamado mal-estar, que não é sempre o mesmo, ainda que pos- tulemos e saibamos de sua insistência permanente, assim como esse método OBSCURO��QUE�ESCAPAM�Ì�QUANTIlCA¥ÎO�E� à objetivação e que atraem as críticas. Os especialistas desejam um modelo experi- mental de observação e teste, para ade- quar o saber psicanalítico à ciência po- sitiva. Como se o humano coubesse em uma expressão matemática. Ou numa estatística. Não cabe. E isso incomoda. Como Freud mesmo observou, isso fez – e faz – com que a Psicanálise perca “a simpatia de todos os amigos do pensa- MENTO� CIENTÓlCOv� �&REUD�� ������ P�� �� �� Além disso, suas teorias sobre a sexua- lidade ganham até hoje certa resistência. HÁ UMA PSICANÁLISE BRASILEIRA? E HÁ UMA PREVALÊNCIA DA PSICANÁLISE NO BRASIL FRENTE A OUTROS PAÍSES? CRISTIANA: No caso da primeira resposta, PODEMOS�AlRMAR�QUE�OS�CONCEITOS�DE�CIR- culação e apropriação implicam sempre em considerar a existência de estilos pró- prios e preferências, dependendo de con- textos culturais e estilos pessoais, como disse anteriormente. No caso da segunda hipótese, a Psicanálise é hoje muito cen- tralizada nos países latinos: França, Ar- gentina, Brasil são centrais não apenas no uso do método, mas na circulação de uma cultura psicanalítica, difundida por grande parte da sociedade letrada. Por OUTRO�LADO��DIlCILMENTE�PODERÓAMOS�FALAR� do método de Freud hoje sem estar atra- vessado pelos discursos pós-freudianos, como o de Lacan, por exemplo. QUAIS SÃO AS PERSPECTIVAS FUTURAS DAS TÉCNICAS DA METODOLOGIA FREUDIANA? CRISTIANA: Creio que estamos vivendo um momento de muitas mudanças nas subjetividades. Alguns apostam que, nessa modernidade tardia, os sujeitos vêm exacerbando determinadas carac- terísticas modernas, e que se desdobram no aumento do individualismo, numa cultura da imagem, no abuso de substân- cias psicoativas. Nesse sentido, a Psica- nálise deve se repensar para lidar com as subjetividades contemporâneas. Outros, ENTRETANTO��APOSTAM�NO�lM�DA�MODERNI- dade. No cenário da pós-modernidade, as subjetividades podem adquirir formas muito distintas daquelas produzidas des- de o séculoXVII. Para estes, o processo de interiorização que caracterizou o su- jeito moderno pode estar acabando, com a construção desses sujeitos em rede, na SUPERFÓCIE��SEM�TANTA�DElNI¥ÎO�ENTRE�O�IN- terior e o exterior, assim como uma apos- TA�NO�lM�DA�SEPARA¥ÎO�ENTRE�O�PÞBLICO�E� o privado, como já discutiu Joel Birman (2000) ao tratar do lugar da Psicanálise nesse imbróglio. Nesse caso, as marcas na pele pelas tatuagens viriam substituir as marcas simbólicas. As redes sociais SUBSTITUIRIAM�A�REmEXÎO�SISTEMÉTICA����EN- lM��ESSAS�E�TANTAS�OUTRAS�MUDAN¥AS�VÐM� colocando em questão a manutenção do sujeito como o conhecemos.... nesse futuro, a Psicanálise poderia funcionar como resistência... e insistência, me pa- rece. Ou, como querem alguns, poderia desaparecer. Espero que não. Falar do Na visão de Cristiana, Lacan, ao propor um ��������G�!��� 9��������G�����������������G�9��� �����G��I�������������I����hG����G�G������GhÔ�� e faça dela sua escritura Segundo a psicanalista, Freud reabriu a ferida narcísica que a Medicina positiva e tecnológica, apoiada na promessa de cura, sempre insistiu em fechar Joel Birman, ao tratar do lugar da Psicanálise, discutiu a separação entre público e privado, ou seja, as marcas na pele pelas tatuagens substituem as marcas simbólicas www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 13 A Psicanálise precisa hoje lidar com os novos sujeitos advindos das condições da cultura do nosso tempo; e também com a nova/velha maneira de perceber o sujeito e seu sofrimento psíquico como resultado de uma disfunção neuronal, hormonal etc. lM� DO� SUJEITO�MODERNO� PODE� SIGNIlCAR� O�lM�DO�SUJEITO�LIVRE��DETERMINADO�PELO� cérebro e pela hereditariedade. QUAL A SUA AVALIAÇÃO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE PSICANÁLISE E CULTURA? É POSSÍ- VEL TRAÇAR UM PARALELO ENTRE TEORIA E VERDADE A PARTIR DESSE TEMA? CRISTIANA: Lacan dizia que “o incons- ciente é o social”. Por quê? Desde a desco- berta do inconsciente, suas implicações para a reformulação social e seu impacto na constituição das subjetividades têm convocado a Psicanálise a pensar seu lugar na cultura. Com a circunscrição do conceito de recalque como parte dos traços de moralidade existentes em uma dada cultura, não é possível pensar no sujeito do inconsciente sem pensar na- quilo que o circunda e que, nessa fricção, produz e é produzido. Assim, o analista, ao ocupar-se de questões clínicas e dos regimes de verdade que se estabelecem de maneira singular nesse processo, não precisa produzir qualquer ruptura fren- te a um pensamento mais amplo e que abarca o campo sociocultural ou abrir MÎO�DAS�FERRAMENTAS�DA�&ILOSOlA� A RELAÇÃO ENTRE PSICANÁLISE E CUL- TURA PODE SER UMA TRADUÇÃO DA DU- ALIDADE RECEPÇÃO X APROPRIAÇÃO E, TAMBÉM, SOBRE A CIRCULAÇÃO TRANSNA- CIONAL DOS SABERES? CRISTIANA: A relação da Psicanálise com a cultura é completamente íntima, já que o sujeito é efeito dela, dos poderes e sa- beres que a conformam. Por outro lado, os indivíduos são capazes de seleção e de dar sentido próprio àquilo que rece- bem, se apropriando do conhecimento e criando a partir dele também. EM SUA OPINIÃO, DO PONTO DE VISTA DA PSICANÁLISE, EXISTE, DE FATO, UM POVO BRASILEIRO, OBSERVANDO OS ASPECTOS CULTURAIS PRÓPRIOS? EM CIMA DISSO, QUAL O VALOR QUE O POVO ATRIBUI, POIS O BRASILEIRO É CONHECIDO COMO UMA NAÇÃO QUE NÃO DÁ O REAL VALOR PARA A SUA CULTURA? CRISTIANA: A Psicanálise – tal como pen- sada hoje – se difere da Sociologia ou Antropologia. Não está voltada para dis- cutir valores sociais comuns ou buscar uma marca identitária única nem forjar uma entidade psíquica permanente que nos reúna como povo. Ao contrário, a 0SICANÉLISE�CHAMA�ATEN¥ÎO�DA�lC¥ÎO�QUE� constitui a identidade. Trata-se muito MAIS�DE�DESCONSTRUIR�A�lC¥ÎO��PERMITIN- do novos arranjos do sujeito em análise. PODE EXPLICAR, EM LINHAS GERAIS, A AFIRMAÇÃO DE QUE A PSICANÁLISE ESTÁ SEMPRE IMERSA NA CULTURA NA QUAL SE INSERE E QUE GUARDA MARCAS DESSE CON- TEXTO LOCAL, COLOCANDO EM QUESTÃO A UNIVERSALIDADE E A NEUTRALIDADE COS- TUMEIRAS E CONSIDERANDO AS APROPRIA- ÇÕES ATIVAS COMO POSSIBILIDADES LEGÍTI- MAS, AINDA QUE NEM SEMPRE NA DIREÇÃO DO NOSSO DESEJO? CRISTIANA: Não existe a possibilidade de efetuarmos o uso da Psicanálise de maneira asséptica, neutra e objetiva. Ela sempre é lida e compreendida a partir de um psiquismo (no caso individual) e de UM�CONTEXTO�ESPECÓlCO��0OR�OUTRO� LADO�� isso não implica numa recepção passiva: a apropriação desse saber é ativa, e os indivíduos se apropriam da Psicanálise a partir de seus referenciais, problemas de pesquisa e interesses. COMO A PSICANÁLISE PENETRA HOJE NA SOCIEDADE, SENDO APROPRIADA POR COLU- NAS SENTIMENTAIS, NOVELAS, PROPAGAN- DAS ETC.? CRISTIANA: É possível notar que além de um modelo de escuta, leitura do mundo e tratamento, a Psicanálise se articulou a um processo de “psicologização” da sociedade. Esse conceito foi utilizado por um grupo de antropólogos do Mu- seu Nacional (UFRJ), quando buscaram analisar cidades urbanas brasileiras. O grupo, iniciado por Gilberto Velho, pro- duziu diversas análises, nas décadas de 1970 e 1980, que investigaram a amplia- ção dos discursos psi por toda a socie- dade. Nessa linha de análise, Jane Russo (2002), por exemplo, utiliza o conceito quando trata do boom psicanalítico entre as classes médias urbanas da década de 1970. Embora a sociedade brasileira te- nha sofrido essa expansão vertiginosa da Psicanálise na década de 1970, a cir- culação social da Psicanálise começou a ocorrer a partir dos anos 30, em revistas femininas e manuais de educação, alcan- çando certo espaço simbólico no sistema de valores, noções e práticas sociais das cidades urbanas. EM SUA AVALIAÇÃO, MANIFESTAÇÕES COMO O CINEMA PODEM SER CONSIDERADAS ARTE OU COMUNICAÇÃO? ELE DEVE SER UM FIM EM SI MESMO, EXPLORANDO SUA PRÓPRIA LINGUAGEM PARA FORNECER UMA VISÃO DE MUNDO, OU USAR A POPULARIDADE DO MEIO PARA TRANSMITIR UMA MENSAGEM ÚTIL À SOCIEDADE? CRISTIANA: A arte transmite mensagens, ainda que não necessariamente voltadas para a utilidade. O cinema é hoje, talvez, aquilo que a literatura representou nos sé- culos XIX/XX: é a possibilidade de nos experimentarmos no outro como outro, ampliando, assim, nossas possibilidades de nos aproximarmos da alteridade. Não acho que a arte deva estar a serviço do so- cial, embora seja sempre social/cultural. IM AG EN S: 12 3R F 14 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br O QUE SÃO TEORIAS BIODETERMINISTAS E O QUE VOCÊ QUER DIZER QUANDO FALA QUE HOJE EXISTEM EMBATES ENTRE A PSI- CANÁLISE E ESSAS TEORIAS? CRISTIANA: !�0SIQUIATRIA�SURGIU�EM�lNS�DO� século XVIII, com o emblemático gesto de Philippe Pinel (1745-1826). Com ela, organizou-se o asilo como instrumento de cura e nele a clínica psiquiátrica foi mar- cada pelo tratamento moral. Assim, desde esse momento, a Psiquiatria se constituiu como disciplina médica sem, entretan- to, jamais ter se enquadrado plenamente em sua metodologia, permanecendo em constante diálogo com saberes do cam- po biomédico e, ao mesmo tempo, com o campo moral, ou das humanidades. Até os dias de hoje, podemos observar essa oscilação: ora busca em cada (psico)pato- logia o mecanismo biopatológico carac- terístico e curso da doença que permitam a construção de categorias diagnósticas generalizáveis, ora emoldura o sofrimen- to humano a partir das mais diversas in- mUÐNCIAS��QUE�NECESSARIAMENTE�INCLUEM�AS� dimensões psíquicas, sociais e culturais para o adoecimento. Tal oscilação pode ser acompanhada ao longo dahistória DESSA�DISCIPLINA��NO�lNAL�DO� SÏCULO�8)8�� as explicações de cunho moral perderam a hegemonia, dando espaço para teorias organicistas, que passaram a explicar a loucura exclusivamente a partir de fatores biológicos – o que, nesse contexto, impli- cava necessariamente considerar fatores hereditários e degenerativos. Já a partir do segundo pós-guerra, quando as teorias eugênicas e a Psicologia dos povos pas- saram a ser consideradas como um erro, após o massacre do holocausto, ganharam novamente destaque as teorias de cunho psicológico e/ou humanista, como a Psi- canálise ou o existencialismo, por exem- plo. Nesse período, conceitos como os de neurose, recalque, édipo, inconsciente, perver- sidade polimorfa, entre outros, passaram a circular não apenas no campo mesmo da Psiquiatria, mas foram sendo difundidos pelo corpo social, sendo apropriados pela educação, pela literatura e por diversos outros setores da sociedade, construindo paulatinamente a cultura psicanalítica de QUE�TRATAMOS�ACIMA��%NTRETANTO��AO�lNAL� do século XX, as matrizes biológicas da Medicina mental voltaram a ser privile- giadas. Como consequência, a sociedade passou também a utilizar tais referenciais para pensar as relações humanas e inter- vir nessas relações. Apesar de podermos AlRMAR�QUE�NO�"RASIL�HÉ�UMA�DISPUTA�EN- tre os dois modos de pensar o sujeito e a sociedade, não é possível negar que hou- ve, a partir desse período, a ascensão das teorias biomédicas nas ciências neuropsi- quiátricas assim como na opinião pública. Vale lembrar, a retomada do viés biológi- co ganhou ímpeto principalmente a partir do surgimento da vertente da Psiquiatria biológica norte-americana, consolidada internacionalmente a partir da publicação do DSM-III, em 1980. UMA DE SUAS ÁREAS DE ESTUDO É A HIS- TÓRIA DA CIÊNCIA PSIQUIÁTRICA, DE SUAS PRÁTICAS E TECNOLOGIAS. COMO VOCÊ OBSERVA A INFLUÊNCIA NA TECNOLOGIA E SEUS AVANÇOS QUASE DIÁRIOS NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DO INDIVÍDUO? CRISTIANA: Bem, cada época tem a sua tecnologia psiquiátrica. Mas o movimen- to para a retomada de um referencial exclusivamente biológico ou organicista das doenças mentais articula os desen- volvimentos de pesquisas realizadas (e lNANCIADASå � NO� CAMPO� DA� "IOQUÓMICA�� com a tentativa de enquadramento da Psiquiatria dentro do campo médico mais geral, além, é claro, do surgimen- to dos psicofármacos, a partir dos anos 50, e o fortalecimento dessa indústria farmacêutica, que passou a estimular e lNANCIAR� PESQUISAS� QUE� VIABILIZASSEM� diagnósticos que pudessem ser associa- dos a medicamentos. Em consequência de tais estímulos e investimentos, essa abordagem começou a ser difundida também na opinião pública, e tal circula- ção passou a produzir e responder a uma demanda dos próprios sujeitos na busca de dar um sentido (mais) “objetivo”, mais médico e menos psicológico “mais real E�MENOS�IMAGINADOv�PARA�SEUS�CONmITOS� e sofrimentos. Segundo George Weisz (2005), essa aproximação da Psiquiatria das ciências de laboratório corresponde- ria ao objetivo de dar maior autoridade à Medicina mental, aliando seus resultados a tecnologias a partir das quais dados es- tatísticos poderiam ser recombinados em múltiplas formas de pesquisa, dando maior visibilidade ao seu conteúdo, cons- truindo regimes de verdade, marcados PELAS�IMAGENS�NEUROCIENTÓlCAS�E�POR�SEUS� dados quantitativos, bem de acordo com A� IDEOLOGIA� DA�-EDICINA� CIENTÓlCA� CON- temporânea, que considera as ciências básicas como a principal fonte de inova- ção em Medicina (Löwy, 1994). UMA DE SUAS PESQUISAS MAIS RECENTES É SOBRE A APROPRIAÇÃO, INTERNALIZAÇÃO E NEGOCIAÇÃO DOS SABERES MÉDICO-MEN- TAIS NOS MODOS DE SER, SENTIR E FAZER DOS INDIVÍDUOS EM UM DADO CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL. A QUE CONCLU- SÕES VOCÊ CHEGOU? CRISTIANA: Atualmente estou coordenan- do uma pesquisa bem grande a partir de documentos clínicos do antigo Hospício Nacional (apoio: Proep, CNPq/Fiocruz). Essa pesquisa a que você alude, e que ob- teve apoio da Faperj, já terminou. Para a investigação, utilizei como fonte cartas de leitores e de conselheiros em revistas de grande circulação. A ideia era justa- mente avaliar até que ponto e de que for- ma os saberes psi eram apropriados pe- las pessoas comuns na capital brasileira na Era Vargas (1930-1945). O resultado Enquanto houver esse sujeito moderno – DIVIDIDO��EM�CONmITO�� marcado pelo recalque e pelo inconsciente, mas também pela liberdade –, a Psicanálise também continuará a existir www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 15 permitiu acessar formas de apropriação das novas ideias psi que circulavam pe- las revistas e o modo como impactaram DE�MANEIRA�DIVERSIlCADA�A�PRODU¥ÎO�DOS� sujeitos concretos e da cultura urbana DO� PERÓODO�� 0UDE� IDENTIlCAR� DISPUTAS� E� negociações pela hegemonia discursiva na construção do ideal de mulher e de homem modernos, em que o processo DE�APROPRIA¥ÎO�DOS�SABERES�CIENTÓlCOS�SE� mostra sempre relativo e parcial nos dis- cursos do público leitor leigo, permitindo refutar a ideia de um controle biopolítico ABSOLUTO�NO�PROCESSO�DE�REDElNI¥ÎO�DOS� papéis sociais. VOCÊ É UMA ESTUDIOSA ESPECIALISTA NA HISTÓRIA DA PSICANÁLISE. EM LINHAS GERAIS, O QUE MUDOU EM TERMOS DE CONCEITOS E PRÁTICAS PSICANALÍTICAS AO LONGO DOS ANOS? CRISTIANA: Não trabalho com a episte- mologia da Psicanálise, mas com a his- tória social da Psicanálise. Nesse sentido, faço parte de um grupo de autores que, nos últimos anos, vem chamando aten- ção para a importância de se considerar a Psicanálise como um fenômeno social, cultural e político, seja como saber, mo- vimento internacional ou epifenômeno mesmo da modernidade, sua crítica. Isso implica alertar para os efeitos que a Psi- canálise adquire em cada contexto. No caso da América Latina, de passado co- lonial (de fato e cultural), a discussão ga- nha novos contornos. Trata-se, aqui, de considerar também as discussões mais amplas acerca das ciências instituídas no mundo europeu, principalmente francês, germânico ou anglo-saxão, e sua recep- ção em países tradicionalmente conside- rados na periferia da modernidade. Esse interesse é movido pela compreensão de que o campo intelectual tem apenas cer- ta autonomia frente aos determinantes sociais particulares, como busquei desta- car ao longo dessa entrevista. Por meio DESSA�CHAVE�DE�LEITURA�Ï�POSSÓVEL�VERIlCAR� QUE� PAUTAS� POLÓTICAS� ESPECÓlCAS�� ASSIM� como contextos sociais, impactam na apropriação de um saber. ESPECIFICAMENTE NO QUE SE REFERE À PRÁTICA CLÍNICA DAS DOENÇAS MENTAIS, QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS AVANÇOS? CRISTIANA: O desenvolvimento das Neu- rociências e de suas tecnologias possibili- tou a aproximação da Psiquiatria da Me- dicina somática geral, sonho acalentado desde Pinel, que já sonhava com o dia em QUE� SE� CHEGARIA� Ì� CAUSALIDADE� lSICALISTA� das perturbações psíquicas. Nesse diapa- são, o funcionamento psíquico se aproxi- ma cada vez mais da idealização de uma subjetividade reduzida ao cérebro e aos seus neurotransmissores. Em resposta, no campo das terapêuticas, os psicotrópicos se tornaram o centro do tratamento, ao passo que as psicoterapias foram relega- das a segundo plano, ou mesmo recu- sadas como importantes. A Psicanálise PERDEU�ESPA¥O�SIGNIlCATIVO�NO�CAMPO�DA� Psiquiatria, portanto. Se entre as décadas de 1950 e 1970 ela era o discurso teórico central da Psiquiatria, após o DSM-III e seu paradigma biológico o processo de autonomização da Psiquiatria frente à Psicanálise se radicalizou. De acordo com alguns autores, como Birman (2005), teria ocorrido uma inversão de planos: a Psica- nálise estaria enfrentandoum processo de medicalização, passando a ser atravessa- da por discursos advindos das Neurociên- cias e do cognitivismo. Além disso, teria passado a ocupar um plano secundário no campo da intervenção terapêutica. Inves- tigar tais acontecimentos históricos, não como avanços ou evoluções, mas como essa luta de forças em que o somático e o psíquico se tensionam (no sentido de tensão mesmo), e entender os contextos que os fazem mover-se é o interesse do historiador dos saberes psi. Compreender por que a Psicanálise permanece resistin- do em alguns contextos culturais é outro DESAlO��4EMOS�MUITO�O�QUE�ESTUDAR� A pesquisa em Psicanálise que se realiza atualmente traz a marca de sua historicidade. De fato, desde Freud se questiona sobre o estatuto da Psicanálise. Sua Interpretação dos Sonhos foi muitas vezes considerada como ADVINDA�DA�lC¥ÎO O cinema é o que a literatura foi nos séculos XIX/XX, a chance de experimentar no outro como outro, ampliando as chances de aproximação da alteridade 16 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br in foco por Michele Müller DESAFIOS da comunicação O PAPEL DA LINGUAGEM INFLUENCIA NA FORMA COMO NOS RELACIONAMOS E ENXERGAMOS O MUNDO, E O SEU EXERCÍCIO ENVOLVE CAPACIDADES QUE NÃO SÃO ESQUECIDAS A LINGUAGEM PODE NÃO NOS SALVAR DA CONDIÇÃO SOLITÁRIA DE PERCEBER O MUNDO DE UMA PERSPECTIVA ÚNICA. MAS NOS OFERECE O ALÍVIO DE COMPREENDER E SER COMPREENDIDO pensamentos e sentimentos continu- am desordenados, incomunicáveis e, muitas vezes, indecifráveis. Outros são desf igurados por uma comunicação não apenas incompleta, mas suscetível a inúmeras falhas, sendo que muitas delas estão fora do nosso controle e ja- mais serão esclarecidas. A linguagem pode não nos salvar da condição solitária de perceber o mun- do de uma perspectiva única. Mas nos oferece o alívio de compreender e ser compreendido em um nível que, mesmo dando acesso à beirada do mar de per- cepções da nossa mente, favorece cone- xões profundas e signif icativas. Além disso, ao tornar mais nítido aquilo que percebemos e sentimos, nos permite ter um maior domínio sobre as emoções e ações. Sobre esse poder das palavras, a psicóloga e escritora americana Tara Brach, uma das mais populares professoras de mindfulness no Ocidente, ensina, em uma de suas meditações guiadas: “Aquilo que você nomeia passa a ter menos controle so- bre você. Nomeie um medo e será mais forte que ele. Dê nome a uma ref lexão e você sairá do meio da nuvem de pen- samento e estará aberto a algo maior”. Ao ganharmos familiaridade com determinados conceitos, eles passam a fazer parte da forma como opera- mos. Se integram aos pensamentos, sidade vital de conexão, é um dos aspec- tos mais fundamentais daquilo que nos faz humanos. A linguagem, assim como a capacidade de interpretar a mente do outro, partindo dos mais sutis e incons- cientes sinais, é uma derivação da nossa interdependência, da busca pelo amor, aceitação e aprovação. A comunicação representa a busca fundamental pelo conforto de termos testemunhas da nossa experiência nes- se mundo. Mas mesmo com toda a sua complexidade, transforma apenas uma pequena parte desse f ilme mental ca- ótico e subjetivo em informações que podem ser compartilhadas e que façam sentido aos outros. Muitos dos nossos N ão foi a necessidade de apren- der sofisticadas fórmulas mate- máticas ou de construir espa- çonaves que obrigou a evolução a nos privilegiar com um cérebro tão complexo. Foi a necessidade de conviver e de interagir com tantas mentes dife- rentes da nossa. A natureza sabiamente poupou espécies mais individualistas ou que vivem em grupos pequenos de carregar o peso de um cérebro volumo- so e que consome tanta energia. E nos diferenciou com um equipamento bio- lógico que permite criar vínculos e re- solver conf litos, ao custo de incontáveis desaf ios psicológicos, como ansiedade, solidão, perdas afetivas e rejeição. Com a ajuda de uma nova tecnologia, conhecida como agent based modeling, foi f inalmente possível comprovar que espé- cies que vivem em grupos precisam de cérebros maiores e as que vivem em gru- pos muito grandes e complexos precisam de um que comporte recursos altamente sofisticados, como a linguagem. A in- vestigação foi feita por pesquisadores da Universidade de Oxford para avaliar a demanda cognitiva das decisões sociais, simuladas por uma ferramenta que re- produz situações com muitas variáveis e que não podem ser explicadas com a precisão de uma fórmula. Nossa extraordinária habilidade de comunicação, resultado de uma neces- www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 17 IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K E AR QU IV O PE SS OA L oferecem novas formas de interpretar o mundo e modif icam ou formam os padrões de expectativas que temos em relação aos outros e a nós mesmos. Somam-se à nossa própria essência, que a f luidez da língua tem o poder de remodelar. “(...) as palavras têm por característica fundamental serem um ref lexo generalizado do mundo. Este aspecto da palavra conduz-nos ao li- miar de um tema muito mais profundo e mais vasto – problema geral da cons- ciência. As palavras desempenham um papel fundamental, não só no de- senvolvimento do pensamento mas também no desenvolvimento histórico da consciência como um todo. Cada palavra é um microcosmos da cons- ciência humana”, coloca Vygotsky em Linguagem e Pensamento. Passamos a enxergar injustiças e desigualdades, a identif icar melhor sentimentos como mágoa e remorso e a entender comportamentos movidos pelo orgulho ou ganância depois que esses conceitos são incorporados ao nosso vocabulário. Essa compreensão não ocorre de uma forma restrita e den- tro de um tempo limitado. Depende de conhecimentos dominados em níveis variados – mesmo dentro de uma mes- ma faixa etária e contexto cultural – e aprimorados no decorrer de toda a vida, nas diversif icadas formas de interação social e troca de informações. E por não se reduzirem a um conjunto de regras que podem ser transmitidas por meio de métodos sistemáticos, com resultados facilmente medidos, acabam trabalha- dos no meio acadêmico apenas de for- ma indireta e não planejada. A educação formal, em geral, es- pera que estudantes ganhem natural- mente a capacidade de compreensão necessária para assimilar uma quan- tidade de informações crescente em volume e complexidade. Desconsidera que a comunicação, com suas possibi- lidades ilimitadas, representa um desa- f io para muitos e envolve capacidades que podem ser exercitadas no ambiente escolar. Práticas que estimulam o de- senvolvimento das habilidades verbais são fundamentais na superação de di- f iculdades acadêmicas. Mais que isso, ajudam na formação do pensamento crítico e da consciência da intenção por trás dos discursos. E, mesmo en- tre aqueles que não se intimidam com a f lexibilidade que a linguagem exige, exercem um grande impacto na forma como se relacionam com o mundo. Michele Müller é especialista em Neurociências e Neuropsicologia da Educação. Pesquisa e cria ferramentas para o desenvolvimento da linguagem. É autora do blog www.leituraesentido.blogspot.com 18 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br psicopositiva por Lilian Graziano Mas vejamos até onde consegue ir a nossa incoerência. E para isso, per- mita-me, leitor, recorrer novamente ( já o f iz na coluna anterior) à f igura de Jesus. Observe que não o faço aqui (como não of iz anteriormente) a partir de uma perspectiva religiosa, nem mesmo espiritual. Recorro aqui à imagem de Jesus como elemento cultural e f igura importante da cultura ocidental. Nesse sentido, é inegável que a f igura de Jesus Cris- to seja vista como ícone de bondade e de humildade. Na coluna anterior falei sobre a bondade, razão pela Sendo assim, vamos direto ao ponto. Imagine a seguinte situação: você está conversando com uma pes- soa em uma festa e, dentro de um determinado e pertinente contex- to dessa conversa, a pessoa lhe diz: “Eu sou muito inteligente”. Seja sin- cero(a): você diria que essa pessoa é humilde? Muito provavelmente não. E, pior, diria tratar-se de alguém ar- rogante, não é mesmo? Pois saiba que você pode estar errado, sendo def ini- tivamente vítima de uma cultura po- pular que absolutamente desconhece o signif icado da palavra “humilde”. As FORÇAS incompreendidas (parte II) DE TODAS AS FORÇAS PESSOAIS ELA É A MAIS INCOMPREENDIDA. E VOCÊ, SABE O QUE SIGNIFICA HUMILDADE? É realmente incrível. Apesar de sua signif icativa importância para a Psicologia Positiva, algumas das forças pessoais ainda são bastante incompreendi- das, seja por parte do público leigo quanto, pasmem, dos prof issionais. Nesse sentido, demos início, na edição passada, a uma série de três textos que têm por objetivo discu- tir sobre o que chamamos de as três forças mais incompreendidas da Psi- cologia Positiva: a bondade (sobre a qual falamos na coluna passada), a humildade e a perspectiva. www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 19 Lilian Graziano é psicóloga e doutora em Psicologia pela USP, com curso de extensão em Virtudes e Forças Pessoais pelo VIA Institute on Character, EUA. É professora universitária e diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento, onde oferece atendimento clínico, consultoria empresarial e cursos na área. graziano@psicologiapositiva.com.br IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K / A CE RV O PE SS OA L qual f icaremos apenas com a humil- dade. Jesus é símbolo de humildade. Não obstante isso, disse, de acordo com a Bíblia: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Se utilizarmos os mesmos padrões de julgamento que utilizamos naquela festa hipotética do parágrafo anterior, a conclusão seria inevitável: Jesus era um tremen- do arrogante! Por que então essa incoerência? Por que Jesus permanece há milê- nios como símbolo de humildade enquanto nós não podemos sequer reconhecer publicamente nossas qualidades sem que sejamos julga- dos como arrogantes? Porque ao longo dos séculos, e mui- to provavelmente pela própria ação das religiões, o conceito de humilda- de foi sendo distorcido até chegarmos nos dias de hoje, quando confundimos humildade com insegurança, com falta de assertividade e, por vezes, com au- sência de autoestima. Eu o desaf io, leitor, a relacionar as pessoas do seu círculo social que você costumeiramente classif icaria como humildes. Você poderia af ir- mar com toda certeza não se tratar de sujeitos inseguros? Pois é, essa distorção talvez tenha feito de nós uma sociedade pouco humilde. Não admiramos os humildes. Temos pena deles. Isso porque, def initivamente, não sabemos o que é humildade. Para a Psicologia Positiva, humil- AO LONGO DOS SÉCULOS O CONCEITO DE HUMILDADE FOI SENDO DISTORCIDO ATÉ CHEGARMOS NOS DIAS DE HOJE, QUANDO CONFUNDIMOS HUMILDADE COM INSEGURANÇA E FALTA DE ASSERTIVIDADE dade corresponde à característica daquele que deixa que as suas rea- lizações falem por si, sem procurar estar o tempo todo em evidência. Trata-se do sujeito despretensioso, que não se considera mais especial que os demais, e, o mais importante, alguém que possui uma percepção correta – e não aquém – de si mesmo. Confesso, com um pouco de constrangimento, que demorei mais de 40 anos para entender precisa- mente o conceito de humildade. E como a vida acontece para além dos estereótipos, quem me ensinou sobre isso foi um CEO de uma grande em- presa, rico e com MBA em Harvard. Ele era meu último paciente da noi- te, razão pela qual o estacionamen- to do meu prédio estava sempre fe- chado. Nunca reclamou por ter que parar seu carro na rua, nem sobre as confusões que o guarda da noite fazia, tentando substituir o porteiro do meu prédio. “Isso acontece com todo mundo. Por que não acontece- ria comigo?”, dizia. Eu sorvia essas e outras manifestações de humildade com a avidez de uma aluna dedica- da. Mas senti que a lição estava com- pleta no dia em que, durante uma sessão, eu disse a ele: “...Mas você é muito inteligente!”; ao que ele me respondeu com f irmeza: “Eu sei”. Sim, ele sabia. Mas não precisava f ingir. Porque a verdadeira humilda- de não precisa de falsa modéstia. Loja Acesse www.escala.com.br e aproveite! ACOMPANHE OS MOVIMENTOS DO MERCADO e reconheça as boas oportunidades para o caminho do sucesso profi ssional 20 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br psicopedagogia por Maria Irene Maluf Desenvolvimento INFANTIL OS MARCOS IMPORTANTES DE CADA FASE NUNCA DEVEM SER NEGLIGENCIADOS, POIS OS SINAIS DE QUE HÁ ALGO ERRADO APARECEM SEMPRE NO DIA A DIA E NÃO APENAS NO CONSULTÓRIO MÉDICO cer sozinha uma escada, chutar uma bola com objetivo, assim como aos 36 meses completos deve copiar um círculo dese- nhado em um papel e andar de triciclo. Não ser capaz de copiar uma cruz ao completar 4 anos, e um quadrado aos 5, assim como abotoar seu casaco, amarrar os cadarços do tênis, usar talheres para comer, não desenhar como esperado para essa idade levantam a suspeita de um problema de coordenação motora. Existem pequenas variáveis no tempo dessas aquisições, devido às oportunida- des de treino, mas a avaliação da gravi- dade em atrasos de mais de 6 meses deve SER�FEITA�POR�PROlSSIONAIS� No 5º aniversário, a criança é capaz de armar um quebra-cabeça de 4 peças em até 20 segundos, pode abotoar seis botões em até 70 segundos, pula com os pés juntos uma corda, e aos 6 anos avança em linha reta com os olhos abertos, colo- cando alternadamente o calcanhar do pé que avança contra a ponta do que apoia. Nessa idade também pula bem corda, se equilibra em um pé só por 15 segundos, distingue direita e esquerda e recorta cor- retamente com a tesoura. Outra aquisição muito importante é a da linguagem. Bebês muito quietos, que não vocalizem antes dos 12 meses e À parte o amor que temos pelos lLHOS��HÉ�TAMBÏM�UMA�GRANDE� responsabilidade por seu de- senvolvimento sadio. Assim, o acompanhamento pediátrico é muito importante, mas o olhar diário da famí- lia é imprescindível. Para além de problemas emocionais e comportamentais, inclusive aqueles que merecem atenção redobrada, há uma pergunta que os pais sempre se fa- zem: essa aquisição está de acordo com a faixa adequada de desenvolvimento ou existe um atraso? Algumas áreas podem ser de im- portância vital no amadurecimento da criança e alguns sinais estão presentes desde os primeiros meses de vida. São alertas que podem ajudar famílias a pro- CURAREM� PROlSSIONAIS� E� ASSIM� IMPEDIR� DANOS�MAIORES�AOS�lLHOS��ANTES�DA�ENTRA- da no ensino fundamental. A primeira aquisição que exige aten- ção diz respeito ao desenvolvimento motor dos bebês. Segurar a cabeça, o TRONCO��SENTAR SE�E�AlNAL�INICIAR�O�ANDAR� são etapas esperadas do crescimento que acontecem sucessivamente antes dos 12 ou até 15 meses de idade. Ao entrar na pré-escola, aos 2 anos, a criança deve ser capaz de subir e des- só falem mamãe e papai no seu segundo aniversário, ou que cheguem aos 3 anos e não formem frases com linguagem com- preensível pela maioria das pessoas, de- vem serlevados para uma avaliação, pois esses atrasos repercutem de modo decisi- vo na aquisição da alfabetização. O próprio desenvolvimento cognitivo pode ser avaliado, em parte, pela riqueza e tipo de linguagem que a criança utiliza e também por seus desenhos, mas entre 3 e 4 anos espera-se que já domine algumas FORMAS�E��NO�lNAL�DESSE�PERÓODO��SEU�DE- senho tenha intenção clara de reproduzir um ser humano reconhecível, com ca- beça, pernas, braços e tronco. Estimular essas formas de linguagem é muito im- portante também para o incremento de novas habilidades indispensáveis para a escolarização. Por volta dos 6 anos, a criança já re- corda uma historinha, sabe explicar um fato ocorrido, fala articulando muito bem todos os sons, ordena objetos de acordo com determinada qualidade (grossura, cor, tamanho). Reconhece os números www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 21 Maria Irene Maluf é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É autora de artigos em publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K/ A RQ UI VO de 1 a 10 associando-os com as quanti- dades que representam e faz somas sim- ples. Distingue palavras escritas singelas como seu nome, mamãe e papai. Até completar 7 anos, é capaz de ex- plicar o porquê de um raciocínio seu, e as diferenças principais entre um homem e um cachorro, por exemplo. Faz analogias (por exemplo: um irmão é um menino, uma irmã é...), conta moedas fracionárias e notas de dinheiro, mostra rápida pro- gressão do pensamento. É um ser curio- so, de lógica concreta e pronto para a al- FABETIZA¥ÎO�E�OS�DESAlOS�ESCOLARES� Voltando à fase de bebê, ressalto a im- portância do aspecto social. Aos 3 meses a criança de desenvolvimento adequado mostra interesse pelo rosto das pessoas que cuidam dela, por objetos em movi- mento, e até os 6 meses deve reconhecer a mãe de modo especial, demostra curio- sidade por coisas, e aos 9 meses mostra sentir angústia perto de estranhos en- quanto em seu rosto já se percebem ex- pressões variadas de acordo com a situa- ção vivenciada. Ao assoprar a primeira velinha, uma de suas brincadeiras favoritas consiste em brincar de se esconder com sua mãe, mostra preferência por um ou outro brin- quedo, enquanto engatinha ou anda ex- plora o espaço a sua volta. Perto dos 2 anos, a criança estabelece contato visual O PRÓPRIO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO PODE SER AVALIADO, EM PARTE, PELA RIQUEZA E TIPO DE LINGUAGEM QUE A CRIANÇA UTILIZA E TAMBÉM POR SEUS DESENHOS mais continuado, sorri quando alguém sorri para ela, responde ao ser chamada, imita ações e compartilha interesses. Aos 3 anos já brinca em grupo de crianças e procura se enturmar. Por volta dos 6 anos é esperado que tenha um melhor amigo E�PRElRA�BRINCAR�SOZINHA�OU�COM�DOIS�OU� três companheiros da mesma idade do que em grupos numerosos. É conhecendo nossas crianças e ob- servando seu desenvolvimento que as TORNAMOS� APTAS� AOS� PRIMEIROS� DESAlOS� da vida. Qualquer atraso no desenvolvi- mento até essa fase é de suma importân- CIA�� DEVE� SER� AVALIADO�POR�PROlSSIONAIS�� pois vai atuar de modo a prejudicar todo o aproveitamento pessoal e acadêmico subsequente, além de diminuir sua auto- estima e ter repercussão na sua seguran- ça emocional. www.portalcienciaevida.com.br IM AG EN S: 1 23 RF A NEUROCIÊNCIA TEM SE POSICIONADO COMO O PRINCIPAL ADVOGADO DE DEFESA DOS GAMES. PESQUISAS RECENTES MOSTRAM OS EFEITOS POSITIVOS DOS JOGOS SOBRE AS FUNÇÕES COGNITIVAS utilidade pública Por Tiago J. B. Eugênio O APRENDIZADO ENVOLVE A REPETIÇÃO POR UM PERÍODO DE TEMPO E FAZER ISSO NOS GAMES LEVA O CÉREBRO A CRIAR NOVAS CONEXÕES NERVOSAS LIGADAS À ATIVIDADE CEREBRAL 22 psique ciência&vida Estímulo à perseverança nejamento, a inibição comportamental e o raciocínio abstrato. Estudos anteriores mostraram que essa área desempenha um papel importante na forma como pro- cessamos decisões complexas, tais como aquelas que envolvem opções que incluem a realização de objetivos de curto prazo com implicações a longo prazo. O FEF é responsável pela elaboração de julgamen- tos sobre como lidar com os estímulos ex- ternos. Também é importante na tomada de decisão, uma vez que permite ao cére- bro atentar ao tipo de reação mais adequa- DA�FRENTE�A�UM�ESTÓMULO�ESPECÓlCO�� Juntos, DLPFC e FEF são cruciais no sistema de tomada de decisão executivo do nosso cérebro. Maior espessura nessas áreas do cérebro (em outras palavras, mais conexões entre as células cerebrais) indica maior capacidade de lidar com diversas variáveis e as implicações dessas de for- ma imediata e a longo prazo. Resultados de estudos como esse podem representar a base biológica e os efeitos da sociedade gamer sobre nossos cérebros. É como se estivéssemos descobrindo uma nova aca- demia e encarando o cérebro como um novo músculo que precisa ser exercitado e DESAlADO��!SSIM�SENDO��SE�HOJE�O�personal trainer�Ï�O�PROlSSIONAL�MAIS�ADEQUADO�PARA� elaborar exercícios para o corpo, pode ser que no futuro o designer de games seja o PROlSSIONAL� MAIS� ADEQUADO� PARA� ELABO- rar exercícios para nossos cérebros. As gião mostrou perda da espessura cortical em associação com o uso dos jogos. O DLPFC é uma das áreas do cór- tex pré-frontal mais recentes do cérebro primata, que sofre mudanças estruturais e funcionais por um longo período – até o início da vida adulta. Relaciona-se às funções executivas, como a memória de TRABALHO�� mEXIBILIDADE� COGNITIVA�� O� PLA- J ogos de videogame são feitos de de- SAlOS��/�SUCESSO�Ï�MEDIDO�QUASE�QUE� totalmente pela destreza do jogador, sobretudo a coordenação. Se alguém acredita que jogar videoga- me é uma atividade passiva, pode ser que desconheça ou subestime o poder ativo do cérebro necessário para integrar todas AS�A¥ÜES�E�CONlGURAR�A�VITØRIA�DO�JOGADOR� SOBRE� OS� DESAlOS� CRIADOS� PELO� DESIGNER� do game. Acredite, jogar videogames é a nova academia para nossos cérebros. A Neurociência tem se posicionan- do como o principal advogado de defesa dos games. Pesquisas recentes mostram um efeito positivo dos jogos sobre as fun- ¥ÜES�COGNITIVAS��%SSA�INmUÐNCIA�TEM�SIDO� relacionada a mudanças de massa cin- zenta dos jogadores, especialmente no córtex pré-frontal. Em estudo publicado na revista PLoS ONE, 152 adolescentes foram submetidos à ressonância mag- nética enquanto jogavam videogame. O experimento estimou a espessura corti- cal e relacionou com o tempo (horas) de jogatina dos participantes por semana. Os cientistas observaram uma correla- ção positiva entre a espessura cortical e o tempo em contato com os jogos no córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo (DLPFC, sigla em inglês para dorsolateral prefrontal cortex) e o campo visual do lobo frontal esquerdo (FEF, sigla em inglês para LEFT� FRONTAL� EYE� lELDS . Nenhuma re- www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 23 escolas devem ser as próximas instituições A�ABSORVEREM�ESSE�NOVO�PERlL�PROlSSIONAL� capaz de criar um ambiente de aprendiza- GEM�MAIS�ElCAZ�E�DIVERTIDO�� Porém, segundo um artigo publica- do na revista Neurology Now, o contato excessivo com jogos causa mudanças no comportamento dos adolescentes. %SSA�MODIlCA¥ÎO�SE�DEVE�AO�EXCESSO�DE� produção de dopamina pelo cérebro, neurotransmissor relacionado à depen- dência em jogos, inclusiveos eletrônicos. A estrutura de recompensa dos games é similar ao de máquinas de um cassino. O jogador insiste em bater um recorde, a solucionar um quebra-cabeça, matar um inimigo, coletar um item raro, conquistar mais territórios, passar aquela fase difícil. A vitória e a conquista fazem o cérebro produzir dopamina enquanto joga. A produção de dopamina aumenta quando o jogador vê a possibilidade de conquistar UM�DESAlO�MAIOR�AINDA��.ÎO�Ï�Ì�TOA�QUE� o level design dos jogos segue uma lógica UNIVERSAL�� AUMENTO�GRADATIVO�DA�DIlCUL- 25 e 30 anos, esse tipo de problema é ain- da mais preocupante nos jovens. -ESMO� DIANTE� DESSE� DESAlO�� NÎO� Ï� a melhor estratégia proibir os jovens de jogar videogames. Isso porque eles tam- bém trazem benefícios. Jogos são uma ótima ferramenta de aprendizado e de estímulo à perseverança. Tiago J. B. Eugênio é coordenador do curso de pós-graduação em Games e Tecnologias da Inteligência aplicados à Educação da Capacitar. Mestre em Psicobiologia pela UFRN e licenciatura e bacharelado em Ciências Biológicas pela UNESP. Possui formação em Game-Based Learning na Quest to Learn (NY - EUA) É professor STEAM e de projetos relacionados a produção de jogos e ciências forenses do Colégio Bandeirantes. tiagoeugenio20@gmail.com DADE��.OSSO�CÏREBRO�ADORA�SER�DESAlADO� e a resposta neuroquímica será mais efe- tiva quando as tarefas tendem a se tornar mais difíceis com a progressão do jogo. Como o cérebro gosta de dopamina, não é difícil compreender a preferência das pessoas pelos bons games que exigem mais do jogador paulatinamente. O córtex pré-frontal é um dos princi- pais alvo da dopamina. No entanto, em excesso, pode desativá-lo. Como essa re- gião é ligada à tomada de decisões, jul- gamentos e autocontrole, o aumento de dopamina no pré-frontal faz com que os jogadores percam a noção de tempo, de- DICANDO SE�HORAS�A�lO�AO�GAME�E�DEIXAN- do de lado outras tarefas. Ainda, como essa região do cérebro completa sua for- mação apenas quando a pessoa tem entre REFERÊNCIAS KÜHN, S.; LORENZ, R.; BANASCHEWSKI, T.; BARKER, G. J.; BÜCHEL, C.; CONROD, P. J.; HEINZ, A. Positive association of video game playing with left frontal cortical thickness in adolescents. PLoS ONE, v. 9, n. 3, p. 1-6., doi:10.1371/journal.pone.0091506 PATUREL, A. Game theory: how do video games affect the developing brains of children and teens? Neurology Now, v. 10, n. 3, doi: 10.1097/01.NNN.0000451325.82915.1d 24 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br RELACIONAMENTO Andreia Calçada é psicóloga, psicoterapeuta com formação em Gestalt, psicoterapia breve, terapia cognitivo-comportamental, hipnose ericksoniana, pós-graduada em Psicopedagogia, especialista em Psicologia Clínica e Psicopedagogia Clínica. Professora de cursos sobre avaliação psicológica e experiência de 10 anos em Psicologia Jurídica, como assistente técnica ou perita. Autora dos livros Falsas Acusações de Abuso Sexual – o Outro Lado da História. Coautora do livro Guarda Compartilhada – Aspectos Psicológicos e Jurídicos. Por Andrea Calçada 12 3R F COMO ACEITAR O O ser humano ainda encontra muitas dificuldades no sentido de saber lidar com alguns desafios afetivos, como, por exemplo, como amar ou ser amado ou como enfrentar questões relacionadas ao amor-próprio Este é um tema univer-sal! Entra ano e sai ano e apenas muda de tom em suas abordagens e apresenta novas roupa- gens; seja ele com enfoque presencial ou virtual, entre adolescentes, jovens adultos ou na maturidade. Hetero, homo ou bissexual. É sobre o amor enquanto este existe e sua felicidade. Sobre o amor quando finaliza e suas dores! Das depressões advindas des- sas rupturas aos crimes passionais que nos impressionam. A ideia desse artigo é abordar através da pesquisa de alguns autores, bem como da experiência psicológica clínica, as diferentes formas como as pessoas lidam com o rompimento afe- tivo nos relacionamentos amorosos, bem como esclarecer essas dinâmicas, a fim de explorar formas mais equili- bradas para lidar com esse tipo de si- tuação. Quem dera se pudesse sempre lidar com perdas conforme o poema de Fernando Pessoa. FIM Dificilmente encontra-se alguém que não tenha tido tal tipo de vivência. Os consultórios psicológicos e psiqui- átricos estão cheios de pacientes que os procuram após um rompimento, seja para lidar melhor com o luto, seja para controlar uma crise mais grave que foi disparada. Bielski e Zordan (2014) definem que “o relacionamento amoroso é com- preendido como um fenômeno afetivo social que abrange os sentimentos e os processos de comunicação na dinâmi- ca das relações amorosas. Abrange o cotidiano e os hábitos dos relaciona- mentos, o processo histórico de cons- trução dos papéis na conjugalidade e sua dimensão jurídica, a consciência do valor atribuído aos vínculos nas re- lações afetivas, como também os senti- mentos e os processos de comunicação envolvidos na dinâmica das relações amorosas” (Cruz; Maciel, 2012). Ainda segundo os autores: “O desejo pessoal de encontrar o par- ceiro ideal corresponde à principal característica das relações amorosas. Atualmente, esse desejo convive com a facilidade em desistir da relação frustrada e seguir buscando uma nova relação prazerosa, o que é estimulado por fatores externos, tais como mídia, novas tecnologias e artes em geral, que enfatizam a busca de uma grande paixão. Todos são influenciados des- de o nascimento com a informação de que, se não encontramos no outro a felicidade, deixamos de vivenciar o www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 25 Eu amo tudo o que foi Tudo o que já não é A dor que já me não dói A antiga e errônea fé O ontem que a dor deixou, O que deixou alegria Só porque foi, e voou E hoje é já outro dia (Fernando Pessoa) 26 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br RELACIONAMENTO Dificilmente encontra-se alguém que não tenha tido tal tipo de vivência. Os consultórios estão cheios de pacientes que os procuram após um rompimento, seja para lidar melhor com o luto ou para controlar uma crise mais grave que foi disparada desejado bem-estar subjetivo” (Silva Neto; Mosmann; Lomando, 2009). Assinalam que, de acordo com a literatura, o luto é uma resposta natu- ral ao rompimento de um vínculo sig- nificativo para o indivíduo, e quanto mais dependente e intenso for o vín- culo, e a dependência, mais difícil po- derá ser o processo de luto. Durante e após esse processo a pessoa precisará se reorganizar. A pesquisa desses autores buscou identificar os sentimentos predomi- nantes em adultos jovens após o tér- mino de relacionamentos amorosos. Nesse estudo, constatou-se o seguin- te: após o fim do relacionamento amo- roso, houve uma predominância de sentimentos positivos tanto para ho- mens como para as mulheres, embora em intensidades diferentes, pois o ní- vel de sentimentos positivos para eles foi superior ao delas. Além disso, as mulheres atingiram níveis mais eleva- dos de sentimentos negativos quando comparadas aos homens, o que indica um maior sofrimento por parte delas. Esses achados podem estar relaciona- dos a aspectos culturais que caracteri- zam a diferenciação de gênero, pelos quais as mulheres ainda são educadas com uma maior valorização do rela- cionamento amoroso, estimuladas a encontrarem um parceiro, enquanto os homens são educados com maior ênfase no aspecto predominantemen- te profissional, preponderando a ex- pectativa de que eles devam exercer maior autocontrole, não se envolven- do tanto nos relacionamentosamoro- sos e, também, não expressando sofri- mento quando dessas rupturas. Para eles, o fato de prevalecerem os sentimentos positivos e não os ne- gativos, como era esperado em outros tempos, pode estar relacionado aos novos valores que regem a sociedade contemporânea, dentre eles a repulsa ao sofrimento, o consumismo, o hedo- nismo, a descartabilidade e a efemeri- dade. Ao mesmo tempo, a sociedade está mais permissiva, aceitando, com maior naturalidade, a troca de parcei- ros e a vivência de relacionamentos amorosos seriais. Na visão de Marcondes, Trierwei- ler e Cruz (2006), a ruptura é a quebra de vínculos, de laços emotivos, sexu- ais e afetivos, criados tanto pelo amor como pelo ódio, pelas brigas e pelas reconciliações. Embora seja uma vi- vência dolorosa para ambos, geral- mente sofre mais aquele que se perce- be como preterido (Gikovate, 2008). Essa dor é, com frequência, sentida fisicamente. São comuns dores no pei- to, sensação de sufocamento, falta de ar, disfunção sexual, incapacidade de trabalhar efetivamente, alterações no peso, insônia e outros transtornos do sono (Pereira et al., 2012). Esses autores investigaram os sen- timentos que predominam após o rom- pimento de relacionamentos amorosos e as diferenças de intensidade quanto ao gênero, iniciativa de término e du- ração do relacionamento em pessoas entre 17 e 44 anos, ampliando a amos- tra do estudo citado anteriormente. De um modo geral, a separação provoca abalo emotivo tanto em homens como em mulheres, nas diferentes situações. Conclusões Dessa forma, segundo os resulta-dos obtidos com a pesquisa, o sofrimento causado pelo término de um relacionamento amoroso indepen- de do tempo de duração deste. Além Existem diferentes maneiras de se lidar com o rompimento afetivo nas relações amorosas, e o objetivo é descobrir formas mais equilibradas para isso www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 27 Pesquisas investigaram os sentimentos que predominam após o término de relacionamentos e as diferenças de intensidade quanto ao gênero, iniciativa de término e duração em pessoas entre 17 e 44 anos, ampliando a amostra do estudo disso, há uma predominância de atitu- des negativas tanto para homens como para mulheres, embora em intensida- des diferentes. Nesse ponto, as mulhe- res atingiram níveis maiores quando comparadas aos homens, mas, quan- do analisadas as atitudes positivas nas mesmas situações, os níveis foram se- melhantes para ambos. Com relação à diferença na intensidade de sofrimento entre homens e mulheres, é interessan- te considerar o contexto sociocultural em que essas pessoas estão inseridas, já que este pode estar interferindo nas respostas dos sujeitos. Levy e Gomes, no artigo “Rela- ções amorosas: rupturas e elabora- ções”, fazem uma reflexão sobre os sentimentos que eclodem quando do rompimento de uma relação amorosa. para a superação das dores de amor e de uma separação conjugal e aspectos que a inviabilizam. Freud, em Luto e Melancolia ([1917] 1969), indica a ne- cessidade de um tempo determinado para o trabalho de luto ser concluído e o ego se ver novamente livre e desini- bido para novas investidas libidinais. O desinvestimento amoroso sobre o ex-parceiro se faz concomitantemen- te com a recuperação das partes de si que foram projetadas no outro; e isso só pode vir acompanhado por uma possibilidade de integração egoica de cada um dos envolvidos, o que sig- nifica quebrar com a idealização do modelo fusional de relacionamento (sem diferenciação e limites entre os parceiros). Com isso, a energia poderá ser canalizada para outras áreas ou re- lacionamentos. A capacidade de reorganização in- terna está intimamente ligada com a forma como foi estruturada a persona- lidade das pessoas envolvidas em um relacionamento e sobre a percepção de si mesmo: dependente/independente, capaz/incapaz, ser uma pessoa capaz de ser amada ou não. Enfim, como foi estruturada a autoestima. �Luto e Melancolia Na obra Luto e Melancolia, Sigmund Freud procura desenvolver considerações sobre a natureza da melancolia, traçando um parale- lo com o afeto normal do luto e buscando discutir suas manifestações de origem psi- cogênica. A correlação utilizada por Freud entre luto e melancolia se justifica pela semelhança no cenário geral dos dois ele- mentos. O luto se caracteriza pela reação normal à perda de um ente querido e a me- lancolia hoje atinge boa parte da população mundial, sob o nome de depressão. IM AG EN S: 1 23 RF MEDEIA, UMA HISTÓRIA DE AMOR E ÓDIO PARA SABER MAIS M edeia é uma das personagens mais fascinantes da mitologia grega. Diz a lenda que ela foi uma feiticeira que ajudou Jasão, o líder dos argonautas, a conquistar o velocino de ouro (a lã de ouro do carneiro alado Crisómalo), que pertencia a seu pai, Aetes, rei da Cólquida. Neta do Sol, Medeia se apaixonou por Jasão e movida pelo amor traiu seu pai. Fugiu de sua terra com o grupo do amado para Iolcos, na Tessália. Depois de dez anos de casamento, Jasão se G�G�����������"�P�I�G9�G� �������G� ���������9������� ���������9���GHG� ����� G�������������������G�G�������I����������G���:� $�I������G G����G���G�hÔ���� ������G G9������I���� ��` �������GH�������G�����^��������G�hG:�/�����G� �¢��� ��������� ����9��G���������������������G�I���%G�Ô���������������G����G��I��� um manto mágico, que se incendiou ao ser vestido, matando Gláucia. O destino de Jasão é incerto. Depois disso, Medeia se casou com o rei Egeu, pai de Teseu, I�������� �����������9�(� ��:���`��I������G�� I����G� G��� G� ��.����9� ���� �H���G G� G� ��� ������G�� ��� ����G�9� ����G� �9� ��� ����� G9� �G�G� �`���� G:� -�G� ��� G�������� �����G��G�G�����G���H�G��G��^���IG���� �����P��G�9� G����G���G��G��� I����I� G�\�G���G�\ �G�Medeia, de Eurípedes. Abordam principalmente os efeitos da perda do amor para a mulher no lugar que ocupa como mãe e nas exigências feitas ao parceiro nessa reflexão. Enfo- cam que muitas vezes, nesses casos, a paixão se torna perversão do amor e a perda do objeto amado assemelha- -se à perda de partes de si, impedindo a superação da dor. Se a mulher pre- cisa ser amada para “ser”, a falta de amor do parceiro e o rompimento da relação provocam reações de intensa carga destrutiva. A personificação de Medeia em crimes passionais e em processos tramitando em Varas de Fa- mília ilustra seu “enlouquecimento” diante da perda do amor. Em seguida, as autoras abordam algumas contribuições teóricas que nos ajudam a compreender o caminho 28 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br RELACIONAMENTO Neurociência afetiva Maria Tereza Maldonado, na apre-sentação do livro Labirinto de Espelhos, aponta que os conhecimen- tos recentes da Neurociência afetiva e as pesquisas sobre as origens da cons- trução do vínculo entre mãe e filho desde a gravidez mostram a possibili- dade de desenvolver, desde os primei- ros anos de vida, as sementes do amor, da empatia e da capacidade de cuidar. Criando, assim, condições para que desenvolvam habilidades e competên- cias a partir da construção de uma base sólida de boa autoestima. Essa base só- lida permite percorrer, de modo mais seguro, os labirintos da vida, com suas dificuldades e possibilidades, surge como alicerce de força de vida. Acredi- tar em si mesmo, em sua força, em suas possibilidades de ser bem-sucedido é ingrediente básico da autoestima, que influencia o grau de autodeterminação. A formação da boa autoestima depen- de profundamente do olhar amoroso de apreciação, do ser visto como pes- soa de valor, com competência, no mí- nimo por uma pessoa significativa nos círculos de convivência.Quando esse olhar estruturantefalha, a pessoa tenta alicerçar-se externamente no parceiro, procurando nele a segurança (e a auto- da estrutura de personalidade de cada um, a reação será mais ou menos agres- siva, mais ou menos depressiva, e a di- ficuldade em responsabilizar-se pelo término, culpabilizando o outro, se im- põe. Muitas vezes o ódio se manifesta pela ferida aberta e o estrago é feito na vida de quem está em volta. Do ex-par- ceiro (a), dos filhos, enfim chegando a tragédias como vemos estampadas em jornais do nosso país e do mundo. Interessante pensar a partir dos resultados das pesquisas apresentadas anteriormente: em adultos jovens há a predominância de sentimentos po- sitivos tanto para homens como para as mulheres, embora em intensidades diferentes, pois o nível de sentimentos positivos para eles foi superior ao de- las. Além disso, as mulheres atingiram níveis mais elevados de sentimentos negativos quando comparadas aos ho- mens, o que indica um maior sofrimen- to por parte delas. Constata-se que as mulheres ainda possuem a maior dificuldade em fazer o luto, bem como lidar com a separa- ção, principalmente quando do lugar de mãe e as exigências feitas ao ex- -parceiro. Como já relatei neste arqui- vo sobre a imagem das Medeias, Levy e Gomes levantam a questão das que “matam” seus filhos nas Varas de Famí- lia após separações. Embora não seja este o objetivo do artigo, é importante vincular aqui a questão da alienação parental, ensejando a morte psicológi- ca dos filhos envolvidos nesses litígios. A necessidade, porém, de uma análise histórico-cultural se faz imprescindí- vel para que se entenda que essa não é uma questão de gênero, mas da contex- tualização da mulher no mundo e nas relações e seus vínculos com o poder. O quanto a questão das relações vinculares significativas e seu olhar de valorização e respeito sobre a crian- ça são fundamentais na estruturação da autoestima e da personalidade. O quanto a desvalorização da mulher por séculos ainda pesa na estruturação de O sofrimento causado pelo término de um relacionamento amoroso independe do tempo de duração deste. Além disso, há uma predominância de atitudes negativas tanto para homens como para mulheres, embora em intensidades diferentes As mulheres alcançaram níveis mais elevados de sentimentos negativos se comparadas aos homens, o que mostra maior sofrimento por parte delas estima) que lhe falta. Quando, então, o rompimento se dá a insegurança e as instabilidades internas surgem à tona, além do luto esperado para a fi- nalização de um relacionamento. Estas estavam apenas tamponadas pelo rela- cionamento. Dependendo do tamanho da insegurança e da instabilidade, além www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 29 REFERÊNCIAS ALMEIDA, Thiago de. Relacionamentos Amorosos: o Antes, o Durante... e o Depois, v. 2. São Paulo: Polo Books, 2014. ASSIS, S. G. de; AVANCI, J. Q. Labirinto de Espelhos: Formação da Autoestima na Infância e na Adolescência. Coleção Fiocruz Criança Mulher e Saúde. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, BIELSKI, D. C.; ZORDAN, E. P. Sentimentos Predominantes, após o Término do Relacionamento Amoroso, no Início da Adultez Jovem, v. 38, n.144, p. 17-24, dezembro/2014, Perspectiva, Erechim. LEVY, L.; GOMES, I. C. Relações amorosas: rupturas e elaborações. Tempo Psicanalítico, v. 43, n.1, jun. 2011, seção temática, Rio de Janeiro. MARCONDES, M. V., TRIERWEILER, M.; CRUZ, R. M. Sentimentos predominantes após o término de um relacionamento amoroso. Artigo 94 da Psicologia: Ciência e Profissão, v. 26, n. 1, p. 94-105, 2006. Com relação à diferença na intensidade de sofrimento entre homens e mulheres, é interessante considerar o contexto sociocultural em que essas pessoas estão inseridas, já que este pode estar interferindo nas respostas dos sujeitos IM AG EN S: 1 23 RF sua autoestima. Quanto mais bem es- truturadas encontram-se a autoestima e a personalidade, maior a flexibilidade e melhor a forma como cada um vai li- dar com os rompimentos de relaciona- mentos amorosos. (� G�hG� Percebem-se mudanças contempo-râneas quando se analisa o resul- tado da pesquisa com adultos jovens que demonstram reações positivas às separações, diferentemente do que era esperado anteriormente. Segundo os autores, podendo estar relacionado aos novos valores que regem a sociedade contemporânea, dentre eles a repulsa ao sofrimento, o consumismo, o hedonis- mo, a descartabilidade e a efemeridade. À dificuldade em fazer contato e viven- ciar emoções mais negativas, bem como lidar com as frustrações e a realidade do cotidiano de um relacionamento mais duradouro. Ao mesmo tempo, a socie- dade está mais permissiva, aceitando, com maior naturalidade, a troca de par- ceiros com maior frequência. Sobre formas melhores de lidar com rompimentos não foram encontra- dos textos de cunho acadêmico que fa- lem sobre o assunto diretamente, como diversos sites o fazem. Tais dicas vão desde “deixar fluir” as emoções e fazer o luto até encontrar hobbies, estar com fa- miliares e amigos. A internet e as redes sociais devem ser evitadas bem como ambientes que fazem lembrar-se do ex- -parceiro. Apesar dessas dicas (que por vezes soam como parte de livros de au- toajuda) que são importantes, necessá- rio se faz um mergulho interno de cada um em busca do resgate de partes de si que se perderam no relacionamento e projetadas no ex-parceiro, das necessi- dades que foram procuradas externa- mente ao invés de serem desenvolvidas internamente. Da busca de autonomia interrompida, que deverá ser resgatada, que ajudará cada um a não se sentir tão frágil e vulnerável frente a uma separa- ção. A autonomia e autoconfiança que impedirão que medos infantis, senti- mentos de rejeição e abandono surjam em uma regressão devastadora. Que dos rompimentos venham a tristeza, o luto e a saudade. A experiência agre- gada que fará buscar novas experiên- cias evitando repetições prejudiciais ao crescimento individual. E também à monotonia de um casamento falido, bem como aprendendo a lidar com as frustrações normais a um relaciona- mento. Enfim, quem se encontra não se perderá frente a um rompimento. Inúmeras vezes o ódio se impõe pela ferida aberta e o estrago é feito na vida de quem ���P��������G9�I�����������9� chegando a tragédias sociais relativamente comuns 30 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br Era extremamente católica e dedicava grande respeito e veneração pela memória de seu pai PERlL Por Anderson Zenidarci A TRAJETÓRIA DA RAINHA DE PORTUGAL, D. MARIA I, MOSTRA UM GOVERNO COM GRANDES FEITOS, MAS OS CAPÍTULOS DE DESAGREGAÇÃO PSÍQUICA COM DELÍRIOS PARANOIDES TAMBÉM MARCAM SUA HISTÓRIA De GENEROSA a LOUCA mias dos vários países onde estiveram. !O� CHEGAREM� Ì� TERRA� NATAL� ENCONTRAM� NO� PODER�� NOMEADO� PELA� RAINHA�� UM� HOMEM�QUE�� PELA� SUA� LONGA� RESIDÐNCIA� EM� ,ONDRES�� ADQUIRIRA� O� GOSTO� PELOS� MELHORAMENTOS� E� PELO� PROGRESSO� INTE- LECTUAL��,UÓS�0INTO�DE�3OUSA�#OUTINHO�� A estes homens se devem os méritos que honram o reinado de D. Maria I, FUNDA¥ÜES� DE� ESTABELECIMENTOS� DE� CI- ência e instrução, como a Academia 2EAL�DAS�#IÐNCIAS��A�!CADEMIA�DE�-A- RINHA�� A� !CADEMIA� DE� &ORTIlCA¥ÎO�� A� #ASA� 0IA�� A�"IBLIOTECA� 0ÞBLICA� ETC��%LA� apoiava e propiciava a criação desses ESTABELECIMENTOS�� SOBRETUDO� QUANDO� ENVOLVIAM��TAMBÏM��lNS�DE�CARIDADE�E� AJUDA�Ì�POPULA¥ÎO��ERA�CONHECIDA�COMO� MUITO�BONDOSA��/�SEU�ESPÓRITO�RELIGIOSO� A� FEZ� CONSTRUIR� MAGNÓlCAS� EDIlCA¥ÜES� RELIGIOSAS� E� MONUMENTOS� QUE� HOJE� VI- SITAMOS�ENCANTADOS��0ORTUGAL�RESSURGIU�COM�RENOVA¥ÜES�E�MELHORIAS�� #OMO� MUITO� RELIGIOSA�� TINHA� UM� CONFESSOR�PESSOAL��DURANTE�DÏCADAS�FOI�O� ARCEBISPO�DE�4ESSALØNICA��HOMEM�POUCO� ILUSTRADO��MAS� DE� UM� CARÉTER� CORRETO� E� de bom senso, que não usava o fato de SER�CONFESSOR�DA�RAINHA�PARA�INmUENCIÉ- LA� POLITICAMENTE� OU� MANIPULÉ LA� POR� MEIO�DA�RELIGIÎO��3UA�INmUÐNCIA�ERA�PARA� ACALMAR� A� CONSCIÐNCIA� ENFRAQUECIDA� DE� $��-ARIA� E� LHE� SERENAR� OS� CONmITOS� DE� CONSCIÐNCIA� PELA� CULPA� DE� hTER� TRAÓDO� O� reinado de seu pai”. Foi um choque para ELA�SABER�DE�SUA�MORTE�� D. Maria I nasceu em Lisboa EM�������lLHA�DO�REI�$��*OSÏ�)� e da rainha consorte D. Ma- riana. Em 1777, com a morte DO�PAI��FOI�A�PRIMEIRA�RAINHA�DE�0ORTUGAL�� Por não haver príncipe varão, e por não EXISTIR�EM�0ORTUGAL�A�,EI�3ÉLICA��QUE�AFAS- TAVA�AS�MULHERES�DO�GOVERNO�DO�ESTADO �� foi coroada e empunhou o cetro, carre- gando um governo de extrema respon- SABILIDADE��!TÏ�ENTÎO�TODAS�AS�hRAINHASv� tinham conquistado esse posto por meio de casamento com o rei, portanto não POSSUÓAM�ESSE�PRIVILÏGIO��4AMBÏM�O�TÓ- TULO�DE�PRINCESA�DO�"RASIL�PASSOU�A� SER� DELA��$EVIA��POR�PROTOCOLO��SE�CASAR�COM� um príncipe português. Apesar da gran- de diferença de idade, casou-se com o tio D. Pedro, irmão do pai. Mesmo sendo um casamento de interesses, afeiçoou- SE�AO�MARIDO��E�ELE�A�ELA �� TORNANDO SE� AMIGOS� E� PRØXIMOS�� TIVERAM� SETE� lLHOS� �TRÐS�HOMENS�E�QUATRO�MULHERES ��QUATRO� MORRERAM� ANTES� DE� COMPLETAR� UM� ANO�� Dos três que sobreviveram: o príncipe HERDEIRO�$��*OSÏ��FALECEU�COM����ANOS�DE� VARÓOLA��$��*OÎO��QUE�PASSA�A�SER�O�HERDEI- ro, é mais tarde coroado como João VI, e A�INFANTA�$��-ARIANA�6ITØRIA��QUE�CASOU� COM�O�INFANTE�DE�%SPANHA�$��'ABRIEL�� !� RAINHA� ERA� EXTREMAMENTE� CATØLI- ca e dedicava grande respeito e vene- RA¥ÎO�PELA�MEMØRIA�DE� SEU�PAI��%NTROU� EM�CONmITO�COM�O�-ARQUÐS�DE�0OMBAL�� poderoso grande ministro no reinado do pai, mas tinha mais interesses pesso- AIS�DO�QUE�PELO�REINO��%LE�EXILOU�VÉRIOS� duques, marqueses, pensadores que de forma direta ou não se opunham ao seu COMANDO��%XPULSOU�OS�JESUÓTAS�DO�PAÓS�E� tomou seus bens. Fosse porque D. Maria TIVESSE�ANTIPATIA�PELO�-ARQUÐS�DE�0OM- BAL� QUE� O� SEU� ESPÓRITO� DEVOTO� HAVIA� DE� sentir contra o perseguidor dos jesuítas ou porque juntasse o rancor motivado PELO�CONHECIMENTO�DE�SEUS�PLANOS��O�DE- mitiu oito dias depois de subir ao trono, TRAZENDO�DE�VOLTA�OS�JESUÓTAS�E�OS�OUTROS�� A partir daí ocorre uma mudança RADICAL�NO�PODER�E�NAS�CABE¥AS�PENSAN- TES��OS�EXILADOS�VOLTAM�TRAZENDO�NOVAS� IDEIAS� E� INFORMA¥ÜES�DAS�POLÓTICAS�� HÉ- BITOS��NOVIDADES� TECNOLØGICAS�E�ECONO- www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 31 Lidava com uma tristeza profunda pelas perdas do marido, G��Ô���� ������ ��� ������:�%��\:�*�� lutos desorganizaram seu estado emocional totalmente IM AG EN S: W IK IP EI DA / A RQ UI VO P ES SO AL NAS CAMINHADAS DIÁRIAS, SEMPRE MONITORADAS POR DAMAS DE COMPANHIA, DEVIDO AO ESTADO ALTERADO DE CONSCIÊNCIA, APRESENTAVA-SE ALIENADA DE TUDO AO REDOR, DAÍ VEM !�&2!3%��h-!2)!�6!)� COM AS OUTRAS” �� ������4��� G�I��\�����������+��I�����G����G�+/�¢-+9�������������� �G�����G���:����� ��G ��������������� ��I����� �� ���I�G���GhÔ����� .�G�����������+G������G��+�^���IG�����G�!GI��9����������� ���`�¢��G �GhÔ����� I����� ��+��I�����G� ��-Gb ��#�����G�G���G�+/�¢-+:����G��P��G��� ��>;�G���� ���G��� �������I�^��I����� ������������������ G�+��I�����G9�I�������I�G�� � �IGhÔ��O����I�����P��IG9���G������������G������G����^���IG�:� SEM��SEM�OPOSI¥ÎO��ALIENADA�DE� TUDO�AO� REDOR��DAÓ�VEM�A�FRASE��h-ARIA�VAI�COM�AS� OUTRASv��-ORREU�EM�������NO�#ONVENTO�DO� Carmo, no Rio de Janeiro, aos 81 anos de IDADE��%M������SEUS�RESTOS�MORTAIS�FORAM� TRANSLADADOS�PARA�,ISBOA�E�SEPULTADOS�NO� MAUSOLÏU�DA�"ASÓLICA�DA�%STRELA��UMA�DAS� igrejas que mandou erguer. respeito à mãe, a conservou até a morte COM�O� TÓTULO�DE� RAINHA��-ARIA� VIVEU�NO� "RASIL� POR� OITO� ANOS�� SEMPRE� EM� ESTADO� ALTERADO�DE�CONSCIÐNCIA�E�DEMONSTRANDO� PROFUNDA�PERTURBA¥ÎO�DELIRANTE��.AS�SUAS� caminhadas diárias, sempre monitoradas POR�DAMAS�DE�COMPANHIA��ELA�SE�SEGURAVA� NELAS��QUE�A�CONDUZIAM�PARA�ONDE�QUISES- )NCLUIU�ESSA�TRISTEZA�ÌS�OUTRAS�PERDAS�� DO�MARIDO�� DA�MÎE� E� DO�lLHO�HERDEIRO� $�� *OSÏ��/S� LUTOS� A� DESORGANIZARAM� TO- TALMENTE�� 3EU� CONFESSOR� PASSOU� A� SER� O� BISPO� DO�!LGARVE�� UM� FANÉTICO� E� DESTI- tuído de bom senso, que não fazia senão AGRAVAR�O�ESTADO�DE�DESEQUILÓBRIO�DA�RAI- NHA��MOSTRANDO LHE�OS�PECADOS�E�CRIMES� QUE�COMETIA��5SAVA�SUA�FRAGILIDADE�PARA� lNS�PRØPRIOS�E�DE�SEUS�PROTEGIDOS��!�LUTA� QUE�TRAVAVA�NO�SEU�EMOCIONAL�ENLUTADO�� OS�MEDOS�RELIGIOSOS�DE�PUNI¥ÎO�ETERNA�E� AS�PRESSÜES�POLÓTICAS�CADA�VEZ�MAIS�ACIR- radas produziram uma desagregação PSÓQUICA�COM�DELÓRIOS�PARANOIDES�E�ALUCI- NA¥ÜES�COM�FATOS�OCORRIDOS�EM�PÞBLICO�� $E� h2AINHA� 'ENEROSAv�� PASSOU� AOS� 58 anos de idade, quase duas décadas de REINADO�� A� SER� DESIGNADA� COMO� h!�,OU- ca”. Não mais recuperou a capacidade de governar. Em 1807 embarcou fugida COM�TODA�A�FAMÓLIA�REAL�PARA�O�"RASIL��POR� ocasião da invasão dos franceses em Por- TUGAL��&OI�LEVADA�Ì�FOR¥A�PARA�BORDO�E�PELO� caminho gritava de dentro da carruagem QUE�A�QUERIAM�LEVAR�AO�SUPLÓCIO��AO�INFER- no, que eram demônios que vieram rou- BÉ LA��%SSE� COMOVENTE� EPISØDIO�OCORREU� depois de quinze anos da manifestação do transtorno esquizofrênico severo, o QUE�OBRIGOU�SEU�lLHO��O�PRÓNCIPE�$��*OÎO�� A�ASSUMIR�A�REGÐNCIA�DO�REINO��O�QUAL��POR� 32 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br coaching por Eduardo Shinyashiki A VIDA É FEITA DE NOVAS EXPERIÊNCIAS, SEJA NA ÁREA PROFISSIONAL OU PESSOAL E, DESDE AS SITUAÇÕES SIMPLES ÀS COMPLEXAS, É IMPRESCINDÍVEL QUE POSSAMOS NOS MARAVILHAR COM AS NOVIDADES CONSTANTEMENTE. ESSE JÁ É UM APRENDIZADO Aprenda a APRENDER H á sempre mais para ser ex- plorado! Esse talvez seja o pensamento que deve- ríamos ter ao menos uma vez por dia, para colocar sempre em pauta a necessidade de olharmos por cima do muro do cotidiano e encon- trar possibilidades onde antes acre- ditávamos existir apenas o trivial. Vamos a um exemplo prático? Imagine que está escrevendo uma carta sobre a sua vida para um ami- go que não vê há muito tempo. Logo num primeiro momento, não lhe vêm à cabeça apenas as coisas que já são conhecidas, ou seja, o que já realizou e faz no presente? Dif icilmente a pri- meira ideia a apresentar nessa carta será o seu planejamento para o futuro e as descobertas que tem feito ao lon- go dos dias. Por uma característica www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 33 de “sedentarismo mental”, buscamos sempre o estado de equilíbrio ba- seado nos fatos e nas situações que já nos são familiares e confortáveis, ainda que dentro desse cenário exis- tam situações desagradáveis. Ref letindo sobre essa questão, é imprescindível que a gente possa se maravilhar com as novidades da vida constantemente. Deixe de lado, ain- da que por alguns instantes no dia, todas as certezas e busque as pergun- tas em vez de respostas. Lembre-se de que na história da humanidade ti- vemos a queda de grandes verdades, entre as quais o pensamento de que a Terra era plana. Bem, se a curiosida- de – e o empenho em saná-la – nos fez evoluir nesse caso, por que não utilizá-la a nosso favor também nas demandas de nossa existência? Fe- lizmente, não temos a capacidade de aprender algo a ponto de dominá-lo, o que exige uma renovação periódica do que acreditamos conhecer. Contudo, quando deixamos de in- vestir energia e tempo na tarefa de redescobrir, corremos o riscode cair no mar do “conhecimento ignoran- te”. Essa é a situação vivenciada pe- los prof issionais que viajam o mun- do todo a trabalho sem se darem a oportunidade de explorar de forma concreta as regiões por onde passam. Após algum tempo, eles até pode- rão ter muitas histórias interessantes para contar sobre suas idas e vindas, mas poucas terão realmente algo de original, pois é bem provável que não saibam falar sobre a experiência da culinária local ou de como o povo se comporta. Quantas vezes na semana você faz uma parada para pensar como es- tão se relacionando os fatos ligados a diferentes dimensões da sua vida? Por exemplo, a sua última promoção no trabalho se deu em um momen- to positivo no âmbito familiar? Além disso, como seu comportamento com amigos e pessoas queridas é modif i-IMA GE NS : 1 23 RF /A CE RV O PE SS OA L Eduardo Shinyashiki é palestrante, consultor organizacional, especialista em Desenvolvimento das Competências de Liderança e Preparação de Equipes. É presidente do Instituto Eduardo Shinyashiki e também escritor e autor de importantes livros como Transforme seus Sonhos em Vida (Editora Gente), sua publicação mais recente. www.edushin.com.br cado quando algo não está bem no escritório? Essas questões podem parecer simples, mas escondem algo importante: a existência do plano macro, ou seja, de uma forma de visualizar o mundo que está direta- mente relacionada à sua totalidade e às conexões que se fazem presentes por trás dos fatos. Como sempre, é necessário um bom planejamento, e essa visão ma- cro o auxilia nesse processo. Estabe- leça seus objetivos e pontue as metas sem deixar de lado os efeitos que elas terão no plano geral. Para isso, uma boa dica é ouvir a sua intuição. O que muitos chamam de “aquela voz que fala comigo mesmo” pode ser, quan- do estimulada da forma correta, uma potente ferramenta para as tomadas de decisão. Em outras palavras, de- vemos conf iar em nossa intuição, deixando que ela nos guie e, à me- dida que essa relação se tornar mais contínua, os insights serão mais preci- sos e constantes. Quando ouve a sua própria voz, você vê o que mais ninguém pode ver. Se o caminho para o sucesso pudesse ser escrito de forma simples, encon- traríamos a sua síntese ao dizer que ele chega para os que enxergam o que ninguém viu, ainda que olhando para um mesmo referencial. Inovações tecnológicas, novas formas de com- portamento e tendências no mercado surgem dessa forma. É fácil compro- var essa situação. Há poucos anos, ninguém precisava de um telefone celular para dar conta de sua existên- cia. Atualmente, ninguém mais sai de casa sem seu aparelho pessoal, nem mesmo para ir até a padaria. Para os QUE�ESTÎO�PENSANDO��OK��ISSO�JÉ�NÎO�Ï� mais uma novidade”, f ica o convite: qual será o próximo meio de comu- nicação da humanidade? Vislumbre essa resposta e você pode ser a mais nova personalidade do mundo. Aprenda a aprender! “Viver e não ter a vergonha de ser feliz. Cantar e cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz.” Eternizada na voz de tantos talentos da nossa música, a canção de Gonzaguinha é o resu- mo do que há por trás de pessoas que unem sonho e vontade de fazer a diferença. Por isso, deixo aqui um pedido: crie um ambiente bem acon- chegante em sua casa para realizar o café da manhã do aprendizado, deixe essa canção de fundo e escreva tudo o que você deve reaprender, abordando tópicos complexos ou simples, como “aproveitar o amanhecer em um dia de folga”. O importante é que você se reconecte com o espírito da boa des- conf iança e aprenda o novo, mesmo que ele já seja muito conhecido pelo hábito. Há sempre algo de novo para conhecer e enxergar! Fazer diferente para fazer a diferença! SE O CAMINHO PARA O SUCESSO PUDESSE SER ESCRITO DE FORMA SIMPLES, ENCONTRARÍAMOS A SUA SÍNTESE AO DIZER QUE ELE CHEGA PARA OS QUE ENXERGAM O QUE NINGUÉM VIU, AINDA QUE OLHANDO PARA UM MESMO REFERENCIAL 34 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br IM AG EN S: D IV UL GA Çà O Por Lucas Vasques Atuação do psicólogo jurídico (comunicação entre Psicologia e Direito) No livro Psicologia Jurídica no Processo Civil Brasileiro, a autora, Denise Maria Perissini da Silva, psicólo- ga clínica e jurídica, atualiza o panorama geral da atuação do psicólogo jurídico nas ações de Família e )NFÊNCIA��TRAZENDO�NOVAS�JURISPRUDÐNCIAS��REVISÎO�BIBLIOGRÉlCA�E�AS�INOVA¥ÜES�DAS�LEGISLA¥ÜES�REFERENTES� à Guarda Compartilhada e novo Código de Processo Civil. A perícia psicológica será enfocada quanto AOS�ASPECTOS�LEGAIS�E�lNALÓSTICOS��RESSALTANDO SE�A�IMPORTÊNCIA�DAS�IMPLICA¥ÜES�ÏTICAS�NO�EXERCÓCIO�PRO- lSSIONAL�DO�PSICØLOGO��BEM�COMO�A�ATUA¥ÎO�DO�PSICØLOGO�JUDICIÉRIO�NAS�6ARAS�DA�&AMÓLIA�E�NAS�6ARAS� DA�)NFÊNCIA��$ISCUTE�TAMBÏM�A�COMUNICA¥ÎO�ENTRE�A�0SICOLOGIA�E�O�$IREITO��QUESTIONANDO�A�lGURA�DO� juiz e a imagem do Judiciário frente à sociedade, e analisando a contribuição de ambos para a compre- ensão do ser humano, a busca do ideal de Justiça e a construção da cidadania. Psicologia Jurídica no Processo Civil Brasileiro Autora: Denise Maria Perissini da Silva Editora: Forense Número de páginas: 592 O que é hipnoterapia? (técnica traz benefícios) %SSE�PEQUENO�GUIA�ENSINA�NÎO�SØ�O�QUE�Ï�A�HIPNOSE��MAS�TAMBÏM�PARA�QUE�SERVE�E�SEU�USO�NAS�VÉRIAS� ESPECIALIDADES��PRINCIPALMENTE�COMO�FERRAMENTA�NAS�TERAPIAS�ALTERNATIVAS��6OCÐ�SABE�O�QUE�Ï�SER�HIP- notizado? E para que serve a hipnose nos tratamentos em Psicoterapia, Medicina e Odontologia? A PSIQUIATRA�E�PSICANALISTA�3OlA�"AUER��AUTORA�DO�LIVRO�Para Entender a Hipnoterapia, EXPLICA�O�CONCEITO� E�COMO�ELA�Ï�FEITA��#LARIlCA�TAMBÏM�DOIS�PONTOS�IMPORTANTES��QUANDO�USAR�E�COM�QUEM��!�DOUTORA� POSSUI����ANOS�DE�EXPERIÐNCIA�NO�USO�DA�HIPNOTERAPIA�NAS�SESSÜES�E�O�LIVRO�FOI�UMA�MANEIRA�DE�LEVAR�AO� público o conhecimento dessa alternativa que vem acumulando ótimos resultados em seus pacientes. /�GUIA�TAMBÏM�ABORDA�OS�MITOS�SOBRE�A�HIPNOSE��AS�DIFEREN¥AS�ENTRE�HIPNOSE�DE�PALCO�versus hipno- TERAPIA��A�HISTØRIA�DA�FAMOSA�HIPNOTERAPIA�ERICKSONIANA��FALA�SOBRE�A�AUTO HIPNOSE�E�TRAZ�TÏCNICAS�EM� hipnose. Um material rico e completo para quem quer entender a hipnoterapia. Para Entender a Hipnoterapia �����Gd�-�G��G���� Editora: Wak Número de páginas: 124 Compulsão precoce (comportamento na infância) Estudos revelam que o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) afeta cerca de 2% a 3% da população geral; em cifras, estima-se que mais de 100 milhões de pessoas no mundo INTEIRO�SEJAM�PORTADORAS�DA�DOEN¥A��QUE�TAMBÏM�ACOMETE�O�PÞBLICO� INFANTIL��/�TEMA� Ï�O�FOCO�CENTRAL�DO�LIVRO�TOC: Aprendendo sobre os Pensamentos Desagradáveis e os Com- portamentos Repetitivos. Escrito pelas especialistas em terapia cognitivo-comportamental *ULIANA�"RAGA�'OMES�E�#RISTIANE�&LÙRES�"ORTONCELLO��A�OBRA�ABORDA��DE�MANEIRA�LÞDICA��O� transtorno que, muitas vezes, inicia na infância ou adolescência e tende a se manter ao LONGO�DA�VIDA�SE�NÎO�TRATADO��TRAZENDO�PREJUÓZOS�SIGNIlCATIVOS�NA�QUALIDADE�DE�VIDA��/� LIVRO�TEM�COMO�OBJETIVO�AUXILIAR�NA�PSICOEDUCA¥ÎO�DO�TRANSTORNO�E�NO�TRATAMENTO��APRE- sentando os principais tipos de sintomas que podem surgir na infância ou adolescência. TOC: Aprendendo sobre os Pensamentos Desagradáveis e os Comportamentos Repetitivos Editora: Sinopsys �����G�d�%���G�G���G�G�"�������������G���!�Ï����������I���� Número de páginas: 32 livros www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 35 E d u c a ç ã o e P s ic o lo g ia Pesquisadores como Jean Piaget dedicaram sua obra para compreender e explicar o mundo da criança e o seu desenvolvimento emocional, além do tanto que esses fatoresinfluenciam no processo de aprendizado d o s s i ê E d u c a ç ã o e P s ic o lo g ia O universo da COGNIÇÃO e o ato de aprender SH UT TE RS TO CK d o s s i ê 36 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br A regulação das emoções constitui uma habilidade fundamental para a intera-ção social, influenciando diretamente na expressão de senti- mentos e no comportamento de cada pessoa. A regulação das emoções tem sido definida como estratégia cons- ciente ou inconsciente dirigida a man- ter, aumentar ou diminuir um ou mais componentes dos comportamentos e respostas fisiológicas que constroem as emoções (Mauss; Evers; Wilhelm; Gross, 2006), em cada indivíduo. As diferenças individuais resultam em dimensões de traços pessoais, de ní- veis de ansiedade e de tendências com- portamentais, assim como se alteram as ativações cerebrais que influenciam a capacidade de regular as emoções ou que resultam no surgimento de patolo- gias mentais, como no caso do estres- se, que pode se desdobrar em diversos comprometimentos psicofisiológicos. Como a aprendizagem ocorre a partir de processamentos cognitivos, a regulação das emoções que atuam nos comportamentos é alvo de interesse dos estudos, sendo importante que se voltem para essa questão que, tradi- cionalmente, não se liga aos currículos escolares, nem ocupa a preocupação com o bom desempenho do aluno, embora esteja presente em cada mo- mento do aprendizado. Considera-se, portanto, que a cognição e as habilida- des socioemocionais sejam ferramen- tas de aprendizagem e devem ser alvo de atenção de educadores e familiares. Cognição e emoção Nos anos 80, o encontro entre a Psicologia e as Neurociências proporcionou um canal de comunica- ção e pesquisas em conjunto. Desde então, a parceria denominada neurop- sicologia cognitiva tem incrementado a demanda de produções a partir da troca de informações, material teórico e experiência clínica (Andrade et al., 2004, p. 6). A terapia cognitivo-comporta- mental (TCC) baseia-se numa postura construtivista de que nossas represen- tações de eventos internos e externos determinam nossas respostas emocio- nais e comportamentais. Nossas cog- nições ou interpretações sobre os fatos refletem formas de processar informa- ção. Assim, um objeto qualquer tem um significado diferente para cada pessoa: ir à escola pode ser uma aven- tura de descobertas ou pode ser uma tortura de cobranças, especialmente, se existe uma dificuldade particular em atingir as expectativas avaliativas. Por isso, uma das técnicas iniciais da terapia cognitiva consiste em iden- tificar e corrigir as conceituações distorcidas e crenças disfuncionais, substituindo-as por outras crenças e ideias que possibilitem ao indivíduo experimentar novos comportamen- tos e emoções menos prejudiciais a ele mesmo e, como consequência, aos outros (Valle, 2015).A partir do apro- fundamento dos pensamentos auto- máticos, é possível chegar às crenças centrais do indivíduo, que são as ideias mais fixas e enraizadas, oriundas do processo de desenvolvimento, das ex- periências e da formação do indivíduo desde a infância, aceitas por eles como verdades absolutas. Pensamentos já definidos, independentemente dos acontecimentos situacionais, que con- cluem simplesmente: “eu sou assim”, “eu não consigo”, “eu tenho que”, “eu Cognição e habilidades socioemocionais são importantes mecanismos de auxílio no que se refere ao aprendizado das pessoas e, por isso, devem ser alvo estratégico da atenção de educadores e familiares FERRAMENTAS de aprendizagem Por Luiza Elena L. Ribeiro do Valle Luiza Elena L. Ribeiro do Valle é psicóloga, mestre em Psicologia Escolar e Educacional, com especialização em Psicopedagogia e Psicologia Clínica. É autora do livro Cérebro e Aprendizagem – um Jeito Diferente de Viver (Wak Editora). www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 37 E d u c a ç ã o e P s ic o lo g ia não gosto” e assim por diante, podem resultar em comportamentos que ini- bem a iniciativa de tentar, caracterís- tica de uma constante capacidade de “vencer” limites que caracteriza o ser humano. Essas conclusões pessoais se referem a pensamentos automáticos, que definem resultados de processos cognitivos e se aplicam de forma ge- neralizada a todas as outras situações. Por exemplo, a partir de não ter bons resultados em uma prova, o indivíduo pode ficar convencido de que isso sig- nifica que ele é assim, que não conse- gue e não vai gostar da experiência etc. O comportamento consequente será rejeitar tentativas que possam mudar a posição, fortalecendo aqueles pen- samentos e, em vez de modificá-los, essas experiências passam a ter uma função limitadora.A pesquisa de Al- bert Bandura (2008) sobre modelos de processamento de informações e aprendizagem, e as evidências empí- ricas na área do desenvolvimento da linguagem, suscitou questões sobre o modelo comportamental tradicio- nal disponível até então, e apontou as limitações de uma abordagem com- portamental não mediacional para explicar o comportamento humano. O modelo baseado nos reforçadores de respostas com premiação e punição propôs uma compreensão da aprendi- zagem sem tentativa, conhecida como “modelação”, que ocorre pela observa- ção de um modelo, sem a necessária reprodução do comportamento, com reforços automáticos. Michael Maho- ney (1946-2006) foi um importante precursor do movimento cognitivista. Em uma publicação intitulada Cogni- tion and Behavior Modification (Maho- ney, 1974), ele enfatiza a importância do processamento cognitivo. Os con- ceitos cognitivos foram estudados in- tensamente por diferentes correntes, como autores russos, com destaque para Lev Semenovich Vygotsky (1896- 1934), que verificou que crianças eram bem-sucedidas na aprendizagem de regras gramaticais, independente- mente de reforço (Vygotsky, 1962; 1991). O papel do mediador se dife- rencia nas questões de inteligência, porque orienta, sem executar os cami- nhos da aprendizagem, uma vez que 123 RF A habilidade imprescindível para a interação social se chama regulação das emoções, que interfere diretamente na expressão de sentimentos e no comportamento d o s s i ê 38 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br propôs o raciocínio teórico subjacente da terapia cognitiva de que o afeto e o comportamento de um indivíduo são amplamente determinados pelo modo como ele olha o mundo (cognições/ pensamentos). Embora vindo de uma tradição psicanalítica, Albert Ellis (1913-2007) também revelou insatis- fações com os resultados práticos do trabalho psicanalítico (Ellis, 1997). Segundo Jacobson (1987), a incorpo- ração das teorias e terapias cognitivas à terapia comportamental foi assumi- da por diversos terapeutas e teóricos comportamentais. Uma “revolução cognitiva” começou a emergir, embora os primeiros textos centrais sobre mo- dificação cognitiva tenham aparecido somente na década de 1970. A memória operacional susten- ta o processo de cognição por tempo suficiente para que as informações sejam retidas pela memória de longa duração, ao mesmo tempo que oferece subsídios para o gerenciamento de ati- vidades correntes de cognição, entre elas a atenção e suas diferentes formas. Psicofisiologia do estresse O organismo, ao receber um es-tímulo, desencadeia uma res- posta, uma preparação para fuga ou reação de enfrentamento da situação. Conforme a vulnerabilidade indivi- dual e abrangendo a esfera física e psi- cossocial ocorrem alterações orgânicas e mentais, de uma maneira ampla e diversificada (Albert; Ururahy, 1997). A reação do estresse decorreda ativação de uma série de eventos, ini- ciando na estrutura do sistema nervo- so central (SNC), interagindo com o sistema nervoso autônomo (SNA) e o sistema límbico, desencadeando uma cadeia de reações e com ativação do eixo hipotálamo-hipófise, liberando o hormônio adreno-corticotrópico (ACTH) na corrente sanguínea, esti- mulando as glândulas supra-adrenais, que vão produzir, principalmente, a adrenalina e os corticosteroides, Como a aprendizagem ocorre a partir de processamentos cognitivos, a regulação das emoções do comportamento é alvo de interesse dos estudos, sendo importante que se voltem para essa questão que, tradicionalmente, não se liga aos currículos escolares aprender é uma mudança cognitiva que independe do outro. Outro nome significativo em seus achados teóricos foi Jean Piaget (1978), um os principais representan- tes da Psicologia Cognitiva, porque construiu uma teoria do desenvolvi- mento mental humano. Segundo Pia- get, a aprendizagem é entendida como mudanças que ocorrem na estrutura do cérebro e só acontece quando as es- truturas cerebrais se modificam (o que se comprova, hoje, em exames neuro- lógicos). Em outras palavras, para que alguém aprenda, ocorrem mudanças no cérebro com reconfiguração da estrutura cognitiva (através de esque- mas de assimilação e acomodação) do indivíduo, resultando em novos esque- mas de adaptação, para seu equilíbrio. Foi Beck (1967), no entanto, quem �Fundamentos da aprendizagem O psicólogo canadense Albert Bandura é dono de uma extensa lista de contri- buições nas áreas de Psicologia Social, Cognitiva, psicoterapia e pedagogia. Em 1968, aos 48 anos, foi eleito o presiden- te mais jovem da Associação America- na de Psicologia (APA). A fase inicial de uma de suas principais pesquisas anali- sou os fundamentos da aprendizagem de crianças e adultos, particularmente, em imitar o comportamento observa- do em outros, especialmente compor- tamentos agressivos. ��� ������hG���� ��� �G���G����G��G��G���Gh���I���H�G������������I�G���������������� �����H���G�� psicológicos, como no caso do estresse www.portalcienciaevida.com.br Educação e Psicologia PARA SABER MAIS PROCESSO PSICOFISIOLÓGICO O encontro entre a Psicologia e as Neurociências proporcionou comunicação e pesquisas em conjunto. Desde então, a parceria denominada neuropsicologia cognitiva tem incrementado a demanda de produções a partir da troca de informações levando o indivíduo ao estado de aler- ta, pronto para lutar ou fugir, uma ma- nifestação instintiva (veja quadro Pro- cesso psicofisiológico). No hipotálamo estão vários con- glomerados de neurônios, respon- sáveis por tarefas diversas, regulan- do processos fisiológicos contínuos como respiração, pressão sanguínea, digestão e equilíbrio entre as diversas IM AG EN S: 1 23 RF E W IK IP ED IA funções orgânicas. É o núcleo para- ventricular que libera a corticotropina (CRH), estimulante que desencadeia a reação ao agente de estresse. O estímulo do hipotálamo sobre o sistema nervoso simpático, via suprar- renal, libera o hormônio adrenocorti- cotrópico (ACTH), que, por sua vez, ativa as glândulas adrenais para liberar hormônios glicocorticoides no san- gue. Os níveis de glicocorticoides, nor- malmente, seguem um ritmo diário: alto no começo da manhã e baixo no fim do dia, porque uma de suas prin- cipais tarefas é aumentar a glicose no sangue para fornecer energia aos mús- culos e nervos.A regulação de diversas funções do organismo são controladas pelos hormônios por um mecanismo de feedback ao hipotálamo, que pode acertar o sistema de produção de adre- nalina e noradrenalina. A adrenalina aumenta o suprimento de sangue para o coração, músculos e cérebro; dilata as coronárias e aumenta a frequência cardíaca. Já a noradrenalina causa va- soconstrição e aumenta a pressão arte- rial (veja quadro Hormônios: mecanis- mo de feedback ao hipotálamo) A liberação hormonal no sangue atua em vários órgãos e sistemas, regi- ões distantes do seu local de origem, ocorrendo uma redistribuição sanguí- nea, com menor fluxo sanguíneo para pele e vísceras e maior para os músculos e cérebro (Goldstein, 1995). As altera- ções se fazem sentir em todo o organis- mo, interferindo nos diversos sistemas. São eles: Sistema cardiorrespiratório – No sistema respiratório ocorrem o au- mento da frequência da respiração e a dilatação dos brônquios para facilitar maior captação de oxigênio pelo orga- nismo. O organismo, com excesso de Córtex Sistema límbico Sistema reticular Hipófise Glândulas Fonte: França e Rodrigues (1999:, p. 29) Hipotálamo Sistema nervoso vegetativo /�G�����GhÔ��I���������G�������������IG �� ����������G�G�IG G������G9�I�������O���I��G9������� �� ser uma aventura de descobertas ou uma tortura de cobranças d o s s i ê 40 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br adrenalina, pode desencadear, no sis- tema cardiovascular, manifestações de crise hipertensiva, palpitações, infarto do miocárdio, arritmias; no cérebro, arteriosclerose, acidente vascular cere- bral (AVC); nos pulmões, a dilatação crônica dos brônquios e predisposição à infecção por vírus, fungos, bactérias, bacilos e outros micro-organismos. As manifestações cardiorrespiratórias consistem na elevação da pressão ar- terial, palpitações, respiração ansiosa, acompanhadas de extremidades frias e suadas. Nos olhos, há aumento da pressão intraocular e dilatação nas pupilas, preparando uma resposta fi- siológica de adaptação do corpo. Se as circunstâncias externas estimulam o sistema que provoca o estresse repetidamente, conforme a suscetibilidade pessoal e a intensidade das mudanças, a tensão crônica pode- rá tornar o sistema vulnerável a danos, causando o adoecimento. Se ocorrer a persistência do agente e/ou ambien- te agressor, o organismo poderá ser sobrecarregado, resultando no apa- recimento de inúmeras repercussões psicofisiológicas, por sobrecarga de adrenalina e cortisol. A liberação excessiva de cortisol acarreta alterações metabólicas, com aumento da destruição das proteínas, diminuição de massa muscular e, em relação aos carboidratos, haverá au- mento da produção de glicose, dimi- nuição dos receptores de insulina, me- nor utilização da glicose pelos tecidos e, no metabolismo dos lipídeos, au- mento da lípase e lipídeos na corrente sanguínea e redistribuição da gordura corporal (Goldstein, 1995). O sistema cardiovascular sofre o efeito potencializador do corticoide com a adrenalina, com o aumento da hipercoagulabilidade sanguínea, favo- recendo o infarto do miocárdio (Al- bert; Ururahy, 1997). Sistema imunológico – Nesse sistema, há diminuição da defesa do organismo, pela diminuição dos gló- bulos brancos e menor síntese de an- ticorpos, observando uma involução A TCC baseia-se numa postura construtivista de que nossas representações de eventos internos e externos determinam respostas emocionais e comportamentais. As cognições ou interpretações sobre os fatos refletem formas de processar informação PARA SABER MAIS A regulação cognitiva da emoção é muito usada na terapia cognitivo-com-portamental (TCC), que pressupõe uma relação entre pensamento, emoção e comportamento (Rangé, 1998). De acordo com essa abordagem terapêutica, as emoções são, em grande parte, determinadas pela forma como cada um interpreta as situações, e as interpretações dos fatos e situações estão direta- mente relacionadas às crenças do indivíduo acerca de si mesmo, do mundo e do futuro. Uma das estratégias comumente empregadas é a da reestruturação cognitiva, que visa ajudar o pacientea interpretar as situações de modo mais adaptativo. A regulação emocional focalizada na resposta comportamental ou supressão emocional considera que, após a emoção já ter sido instalada, é possível inibir as respostas emocionais, de maneira que as outras pessoas não percebam o que se está sentindo (Gross, 2001). Tal inibição aconteceria sobre os sinais de saída das emoções, de modo que o indivíduo não expressasse o que está sentindo (Butler et al., 2003; Gross, 2001;). TCC USA A REGULAÇÃO COGNITIVA COM FREQUÊNCIA Para Piaget, a aprendizagem é entendida como mudanças que acontecem na estrutura do cérebro e �`��I�������G� �����G����������G��I���H�G�������� �IG� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 41 E d u c a ç ã o e P s ic o lo g ia �Mudanças de paradigmas Nascido em Neuchâtel, na Suíça, Jean Piaget (1896-1980) foi um dos mais relevantes pesquisadores de educa- ção e pedagogia. Especializou-se em Psicologia Evolutiva e no estudo de epistemologia genética. Seus traba- lhos sobre pedagogia revolucionaram a educação, pois alterou paradigmas e teorias tradicionais referentes à aprendizagem. As ideias de Piaget es- tão presentes em inúmeros colégios no mundo todo e suas teorias procu- ram implantar uma metodologia ino- vadora, que busca formar cidadãos criativos e críticos. Uma das técnicas iniciais da terapia I�������G�I������������ ����IG����I��������G�� conceituações distorcidas e crenças disfuncionais, substituindo-as por outras crenças e ideias que possibilitem ao indivíduo experimentar novos comportamentos e emoções do timo. As repercussões no SNC, por destruição de proteínas e glicose, levam a alterações psíquicas e compor- tamentais; no sistema musculoesque- lético, ocorrência de atrofias e astenias musculares; no tecido ósseo, a com- petição do cortisol com a vitamina D, impedindo a absorção de cálcio, levan- do à osteoporose. Ao nível hepático, ocorre maior liberação de glicose na corrente sanguínea a partir do glicogê- nio, para o fornecimento de mais fonte energética para os músculos. Paralela- mente, o baço sofre contração e libera mais glóbulos sanguíneos para facili- tar a captação de oxigênio, e há, ainda, um aumento de números de linfócitos para reparar possíveis danos nos teci- dos (Goldstein, 1995). Possibilidade de aparecimento de obesidade, de dia- betes mellitus, de câncer (diminuição do sistema imunológico). Sistema gastrointestinal e repro- dutivo – O sistema gastrointestinal apresenta aumento do ácido clorídrico e pepsinogênio, com diminuição do muco protetor intestinal. Os ovários e os testículos diminuem a produção, respectivamente, da progesterona e testosterona, interferindo no sistema reprodutivo (Albert; Ururahy, 1997). No sistema gastrointestinal, as pertur- bações interferem tanto na má digestão como no surgimento de gastrite, úlcera, colite, até diarreia crônica, e, na pele, com a erupção de micose e psoríase. In- cide, também, no envelhecimento dos órgãos sexuais, levando à impotência e à frigidez. O estresse provoca tensão física e psicológica, queda de capacida- de intelectual, perturbações do sono, levando à fadiga (Goldstein, 1995). Em síntese, o estresse ocorre em resposta psicobiológica ao agente es- tressor interno ou externo, por meio da ação integrada dos sistemas nervo- so, endócrino e imunológico, em um processo de alteração e recuperação do equilíbrio homeostático. REFERÊNCIAS BECK, J. S. Terapia Cognitiva. Teoria e Prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. LURIA, A.; VYGOSTKY, L. S.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, Desenvolvimento e Aprendizagem. São Paulo: Ícone, 2001. MAHONEY, M. J. ����������G� ����G�����(� �IG����. Cambridge: Ballinger Publishing Company, 1974. VYGOTSKY, L. S. Thought and language. Cambridge: M.I.T, 1962. A liberação hormonal no sangue atua em vários sistemas, provocando redistribuição sanguínea, com �����������G�G���������^�I��G�����G�����G�G��b�I�������I\��H�� IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K E W IK IP ED IA d o s s i ê 42 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br Jean Piaget revolucionou a edu-cação. Uma de suas maiores re-alizações dentro da abordagem da aprendizagem foi a realiza- ção de testes avaliativos em crianças, um processo que possibilita a exis- tência de experiências significativas para quem as vivencia. Piaget teve princípios epistemológicos comuns com Vygotsky e Wallon e elaborou a epistemologia genética, observando o processo da criança ao estabelecer relações da parte com o todo dos ob- jetos e situações envolvidos. A partir daí iniciou o estudo do processo do conhecimento. Algumas fases de desenvolvimento infantil são descritas por Piaget como pré-opera- tório, operatório concreto e operató- rio formal. Já Vigotsky tem sua ideia centrada em algumas teorias, como zona de desenvolvimento proximal, que se refere ao desenvolvimento atual da criança (nível de desenvolvi- mento efetivo ou real) e o desenvol- vimento que poderá atingir (nível de desenvolvimento potencial). Para Vigotski, o ser humano precisa ser interdependente nesse processo. Ele questiona se as divi- sões entre as dimensões cognitivas e afetivas do desenvolvimento psi- cológico, para Wallon, são genéticas e organicamente sociais. A estrutu- ra orgânica do ser humano supõe a intervenção da cultura para uma atualização. Assim, a teoria do de- senvolvimento cognitivo de Wallon tem como foco a psicogênese da pessoa completa. Os estágios de desenvolvimento do ser humano (impulsivo-emocio- nal, sensório-motor e projetivo, per- sonalismo, categorial e adolescência), apresentados por Wallon, sucedem-se em fases com predominância afetiva e cognitiva. A reflexão pedagógica sobre um homem dotado de razão, afetividade, inteligência, corpo e de- sejo possibilitará a criação de um es- paço educativo, que será o lugar de construção dos saberes, por meio de diálogo, de reflexão, de pesquisa e da troca entre os pares de maneira críti- ca e politizada. Jean Piaget formou-se em Biolo- gia e procurou utilizar os princípios biológicos na compreensão dos pro- blemas epistemológicos. No desen- volvimento cognitivo, ele ressaltou Esquemas cognitivos do adulto são derivados dos esquemas sensório-motores da criança e os processos responsáveis pelas mudanças são assimilação e acomodação que, no desenvolvimento biológico, a inteligência é construída sobre um equipamento biológico inato e se desenvolve numa sequência prede- terminada. É um processo ativo e interativo, construído pelo sujeito em interação contínua com o meio. Descreveu estágios de desenvolvi- mento cognitivo – a inteligência vai mudando profundamente ao longo do desenvolvimento; o sujeito passa por períodos de reorganização pro- funda, seguidos de períodos de inte- gração, durante os quais um novo es- tágio é alcançado e as mudanças são assimiladas. A cada estágio de desen- volvimento corresponde um sistema cognitivo específico, que determina todo o funcionamento do sujeito, ou seja, cada estágio resulta do anterior e prepara o seguinte. Suas contribuições foram incon- táveis: a construção do conhecimen- to ocorre quando acontecem ações físicas ou mentais sobre objetos que, provocando o desequilíbrio, resultam em assimilação ou acomodação e as- similação dessas ações e, assim, em construção de esquemas ou conhe- cimento. Em outras palavras, uma vez que a criança não consegue assi- milar o estímulo, ela tenta fazer uma acomodação e, após a assimilação, o equilíbrio é, então, alcançado. Aprendizagem cognitiva PERCEPTIVA Por Yago Felipe Hennrich Yago Felipe Hennrich elaborou este artigocomo Trabalho de Processos Psicológicos Básicos 2, apresentado no curso de Psicologia das Faculdades Integradas do Vale do Iguaçu – Uniguaçu, como requisito parcial para obtenção de nota do 1º bimestre do 2º período. Sua professora foi Darciele Mibach www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 43 E d u c a ç ã o e P s ic o lo g ia SH UT TE RS TO CK Josiane Lopes (revista Nova Esco- la, ano XI, n. 95) cita que para quando o equilíbrio se rompe, o indivíduo age sobre o que o afetou, buscando se re- equilibrar. E para Piaget, isso é feito por adaptação e por organização. Teorias Alguns autores sugerem que ima-ginemos um arquivo de dados na cabeça. Os esquemas são análo- gos às fichas desse arquivo, ou seja, são as estruturas mentais ou cogni- tivas pelas quais os indivíduos inte- lectualmente organizam o meio. São estruturas que se modificam com o desenvolvimento mental e que se tornam cada vez mais refinadas, à medida que a criança se torna mais apta a generalizar os estímulos. Por esse motivo, os esquemas cognitivos do adulto são derivados dos esque- mas sensório-motores da criança, e os processos responsáveis por essas mudanças nas estruturas cognitivas são assimilação e acomodação. Assimilação é o processo cog- nitivo de colocar (classificar) novos eventos em esquemas existentes. É a incorporação de elementos do meio externo (objeto, acontecimento etc.) a um esquema ou estrutura do sujei- to. Em outras palavras, é o processo pelo qual o indivíduo cognitivamente capta o ambiente e o organiza, possi- bilitando, assim, a ampliação de seus esquemas. Na assimilação o indiví- duo usa as estruturas que já possui. Já a acomodação é a modificação de um esquema ou de uma estrutu- ra, em função das particularidades do objeto a ser assimilado. Pode ser de duas formas, visto que se podem ter duas alternativas: criar um novo esquema, no qual se possa encaixar o novo estímulo, ou modificar um já existente, de modo que o estímulo possa ser incluído nele. Após ter havido a acomodação, a criança tenta novamente encaixar o estímulo no esquema e aí ocorre a assimilação. Por isso, a acomoda- ção não é determinada pelo objeto, e sim pela atividade do sujeito sobre este, para tentar assimilá-lo. O balan- ço entre assimilação e acomodação é chamado de adaptação. Em outras palavras, é o processo pelo qual o in- divíduo cognitivamente capta o am- biente e o organiza, possibilitando, assim, a ampliação de seus esquemas. Na assimilação, o indivíduo usa as es- truturas que já possui. /�G� G����G���Gh��� ��+�G�������G���������������I��G�hG�9�������I��������������H����G�G������È�I�G� ��������È�I�G�������IG���G���G�G������G�������I�G d o s s i ê 44 psique ciência&vida As contribuições de Piaget foram incontáveis, como, por exemplo, uma vez que a criança não consegue assimilar o estímulo, ela tenta fazer uma acomodação e, depois da assimilação, o equilíbrio é, então, alcançado A equilibração, por sua vez, é o processo da passagem de uma situa- ção de menor equilíbrio para uma de maior equilíbrio. Uma fonte de de- sequilíbrio ocorre quando se espera que uma situação ocorra de determi- nada maneira, e esta não acontece. Segundo Matui (1995), para res- ponder como se dá a construção do conhecimento no adulto, partindo da biologia do bebê, Piaget elabo- rou a epistemologia genética, uma teoria evolutiva do conhecimento. Elaborando testes de inteligência para crianças francesas, Piaget ob- servou o processo da criança em estabelecer relações da parte com o todo dos objetos e situações envol- vidos. A partir daí, iniciou o estudo da construção do conhecimento, observando que, na interação com o meio externo, o indivíduo busca sua melhor sobrevivência, visando uma constante equilibração. De acordo com Coll, Marchessi, Palacios; Cols (2004), para Piaget a meta sempre é a adaptação. A adapta- ção leva o indivíduo a procurar uma resposta adequada aos problemas que encontra em cada momento. No entanto, segundo Piaget in Pozo (1998), a aprendizagem seria ORGANIZAÇÃO INTELECTUAL PARA SABER MAIS Piaget descreve o desenvolvimento como um processo de estágios suces-sivos. Se a criança explica em parte o adulto, pode-se dizer também que cada período do desenvolvimento anuncia em parte os períodos. a característica de um objeto, é ne- cessário modificar o esquema prévio para restaurar o equilíbrio (veja qua- dro Organização intelectual). Piaget tem algumas outras con- tribuições, como: a organização e a adaptação, os esquemas, a assimila- ção e acomodação, a teoria da equili- bração. A organização e a adaptação se justificam. Jean Piaget, para expli- car o desenvolvimento intelectual, partiu da ideia de que os atos bioló- gicos são atos de adaptação ao meio físico e organizações do meio am- biente, sempre procurando manter um equilíbrio. Assim, ele entende que o desenvolvimento intelectual opera do mesmo modo que o desen- volvimento biológico (Wadsworth, 1996). Para Piaget, a atividade in- telectual não pode ser separada do funcionamento “total” do organis- mo (1952, p. 7). Do ponto de vista biológico, or- ganização é inseparável da adaptação. São dois processos complementares de um único mecanismo, sendo que o primeiro é o aspecto interno do ci- clo, do qual a adaptação constitui o aspecto externo. Ainda segundo Piaget (Pulaski, 1986), a adaptação é a essência do funcionamento intelectual, assim como a essência do funcionamento biológico. É uma das tendências bá- produzida quando houvesse um dese- quilíbrio ou conflito cognitivo entre dois processos complementares: a as- similação e acomodação. Piaget define a acomodação como qualquer modifi- cação de um esquema assimilador ou de uma estrutura. “Esquema é aquilo que é generalizável numa determinada ação” Piaget in Matui (1995, p. 122). Se há um desequilíbrio, ou seja, um esquema não correspondente, Desenvolvimento intelectual das crianças Psicólogo renomado, o bielo-russo Lev Semenovich Vygotsky (1896- 1934) foi descoberto nos meios aca- dêmicos ocidentais somente após sua morte, aos 38 anos. O intelectual foi pioneiro na ideia de que o desenvol- vimento intelectual das crianças acon- tece em consequência das interações sociais e condições de vida. Segundo conceito de Vygotsky, a evolução mental da criança é um processo con- tínuo de aquisição de controle ativo sobre funções inicialmente passivas. Fonte: Piaget e Inhelder (2003, p. 11). Período Faixas etárias aproximadamente Sensório-motor Nascimento até 1 1/2 a 2 anos Pré-operatório 2 a 6-7 anos Operatório-concreto 6-7 anos a 11-12 anos www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 45 E d u c a ç ã o e P s ic o lo g ia LIMITAÇÃO DO PENSAMENTO PARA SABER MAIS Piaget descreve o desenvolvimento como um processo de estágios suces-sivos. Se a criança explica em parte o adulto, pode-se dizer também que cada período do desenvolvimento anuncia em parte os períodos. Após ter havido a acomodação, a criança tenta novamente encaixar o estímulo no esquema e aí ocorre a assimilação. Por isso, a acomodação não é determinada pelo objeto e, sim, pela atividade do sujeito sobre este, para tentar assimilá-lo sicas inerentes a todas as espécies. A outra tendência é a organização, que constitui a habilidade de integrar as estruturas físicas e psicológicas em sistemas coerentes. Ainda de acordo com o autor, a adaptação acontece através da organização, e assim o or- ganismo discrimina entre a miría- de de estímulos e sensações com os quais é bombardeado e as organiza em alguma formade estrutura. Esse processo de adaptação é, então, reali- zado sob duas operações, a assimila- ção e a acomodação. Desenvolvimento No desenvolvimento sensório--motor (0 a 2 anos), Piaget chamou de inteligência sensório- -motora um tipo de inteligência baseada na percepção da realidade e na ação motora sobre ela. Nes- sa etapa, a criança faz uso de per- cepções sensoriais (por exemplo, a sucção) para explorar o mundo que a rodeia e suas ações são práticas: pegar, jogar, morder. pessoas ou objetos na ausência deles. Nesse estágio, a criança elabora uma estrutura cognitiva para que possa dar a ela um suporte a futuras cons- truções e atitudes que irá cometer, construções perceptivas e intelectu- ais. O mesmo se dá sobre a afetivida- de subsequente, que é determinada por certo número de reações afetivas elementares. No desenvolvimento Para Piaget e Inhelder (2003), na falta de função simbólica, o bebê ain- da não apresenta pensamento, nem afetividade ligada a representações que permitam fazer evocações de Fonte: Coll; Marchesi; Palacios e Cols (2004, p. 144) Aparência perceptiva / traços não observáveis: Centração / descentração Estados / transformações Irreversibilidade / reversibilidade Raciocínio transdutivo / pensamento lógico A criança não realiza inferências a partir de propriedades não observáveis diretamente O foco está em um só ponto de vista (o próprio), evitando outras possíveis dimensões Não faz relação dos estados iniciais e finais de um processo Não refaz mentalmente o processo seguido até voltar ao estágio inicial Faz associações imediatas entre as coisas raciocinando do particular ao particular Durante o desenvolvimento sensório-motor, a criança faz uso de percepções sensoriais, como a sucção, para explorar o mundo que a cerca IM AG EN S: 1 23 RF E W IK IP ED IA d o s s i ê 46 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br O balanço entre assimilação e acomodação é a adaptação. É o processo pelo qual o indivíduo cognitivamente capta o ambiente e o organiza, possibilitando a ampliação de seus esquemas. Na assimilação, o indivíduo usa as estruturas que já possui dade não presente. A linguagem para a criança é enriquecida rapidamente e as respostas adequadas já serão ra- ciocínios. São desarticulados e ainda precisam de lógica, porque a criança só consegue ver o mundo a partir dela mesma. Para Coll, Marchesi, Palacios e Cols (2004), nesse período, o pen- samento infantil é descrito por Piaget como um período de espera das nove grandes transformações operatórias, que acontecerão nas próximas etapas. Por isso, ressaltou as limitações da criança nessa fase (veja quadro Limi- tação do pensamento). Estágio lógico formal Esse período é onde o pensamen-to lógico alcança sua expressão máxima e é aplicado de forma coe- rente e sistemática. A representação agora permite a abstração total. A criança não se limita mais à repre- Psicologia do desenvolvimento Henri Paul Hyacinthe Wallon (1879-1962) foi um psicólogo, filósofo, médico e político francês que se tornou muito conhecido em função de seu intenso trabalho científico a respeito da Psico- logia do desenvolvimento, direcionada, principalmente, à infância, na qual assume uma postura interacionista. A obra de Wallon é caracterizada pela ideia de que o processo de aprendizagem é dialético, ou seja, não é aconselhável afirmar ver- dades absolutas. O caminho correto é revitalizar perspectivas e possibilidades. pré-operatório (2 a 7 anos), estágio também chamado de inteligência ver- bal ou intuitiva, a criança se vê envol- ta em uma realidade existencial, que é um mundo interior de representa- ções. A função simbólica da criança permite a ela a formação de símbolos mentais, que representam objetos, pessoas ou acontecimentos ausentes. Desse modo, a criança pode antecipar um resultado, utilizando represen- tações (signos, símbolos, imagens e conceitos) como substitutas da reali- sentação imediata, nem somente às relações previamente existentes, mas é capaz de pensar em todas as rela- ções possíveis, logicamente buscan- do soluções a partir de hipóteses e não apenas pela observação da rea- lidade. Em outras palavras, as estru- turas cognitivas da criança alcançam seu nível mais elevado de desenvol- vimento e tornam-se aptas a aplicar o raciocínio lógico a todas as classes de problemas. Um exemplo: Se pedem para a criança analisar um provérbio, como “de grão em grão a galinha enche o papo”, ela trabalha com a lógica da ideia (metáfora) e não com a imagem de uma galinha comendo grãos. REFERÊNCIAS COLL, César; MARCHESI, Álvaro; PALACIOS, Jésus e colaboradores. Desenvolvimento Psicológico e Educação – Psicologia Evolutiva, v. 1. Porto Alegre: Artmed, 2004. MATUI, Jiron. Construtivismo – Teoria Construtivista Sócio-histórica Aplicada ao Ensino. São Paulo: Moderna, 1995. PIAGET, Jean; INHELDER, Bärbel. A Psicologia da Criança. Rio de Janeiro: Difel, 2003. PULASKI, Mary Ann Spencer. Compreendendo Piaget. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e �����^I��9�<DCA: WADSWORTH, Barry. Inteligência e Afetividade da Criança. 4. ed. São Paulo: Enio Matheus Guazzelli, 1996. PRINCÍPIOS DA TEORIA COGNITIVA PARA SABER MAIS A teoria cognitiva foi desenvolvida pelo suíço Jean Piaget e os princípios que foram base para o seu trabalho são conhecidos como o conceito da adaptação biológica, portanto não foram ideias originais. Piaget tomou esse conceito preexistente e o aplicou sabiamente ao desenvolvimento da inteligência dos indivíduos, à medida que amadurecem, da infância até a vida adulta, baseado em sua própria conclusão de que a atividade intelectual não pode ser separada do funcionamento “total” do organismo. A teoria de Piaget sobre o desenvolvimento cognitivo classifica o desenvolvimento em quatro etapas, e comprova que os seres humanos passam por uma série de mudan- ças previsíveis e ordenadas. Ou seja, geralmente todos os indivíduos viven- ciam todos os estágios na mesma sequência. Porém, o início e o término de cada estágio sofrem variações, dadas as diferenças individuais de natureza biológica ou do meio ambiente em que o indivíduo está inserido. W IK IP ED IA Bíblia do Churrasco Caixa box com quatro livros Editora Escala É o mais completo guia para quem quer preparar e saborear o melhor da carne as- sada na brasa. A coleção traz quatro livros FRP� XPD� LQÀQLGDGH� GH� RSo}HV� GH� SUDWRV�� acompanhamentos e formas de servir um saboroso churrasco com pleno domínio. Bom Apetite! MOMENTO DO LIVRO À venda nas livrarias e na loja Escala www.escala.com.br Alcatra Maminha & Fraldinha – Estão entre os cortes mais magros do boi e são H[WUHPDPHQWH�VDERURVRV��FRP�XPD�WH[WXUD� PDFLD��H�SRGHP�VHU�SUHSDUDGRV�QD�JUHOKD�RX� no espeto. Picanha – Sinônimo de churrasco para RV�EUDVLOHLURV��WHP�XPD�FREHUWXUD�JHQHURVD� de gordura e textura marmorizada e pode ser preparada inteira ou em cortes. Neste li- vro selecionamos receitas incríveis para você preparar um delicioso churrasco de picanha com um sabor bem brasileiro. Cortes Especiais – Os cortes da região GR�FRQWUDÀOp�RIHUHFHP�XPD�YDULHGDGH�GH�VD- bores nobres e texturas que são garantia de sucesso no churrasco. Costela & Cia – A costela e os cortes dianteiros são extremamente suculentos e muito apreciados. Precisam de muitas horas QD�FKXUUDVTXHLUD��SRU�LVVR�D�FRFomR�QR�EDIR� RX�HQYROWD�HP�SDSHO�DOXPtQLR�RX�FHORIDQH�p� usada para acelerar o processo. saboroso churrasco com pleno domínio. BOX - COLEÇÃO 48 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.brneurociência por Marco Callegaro A EMPATIA SOMENTE PODE LEVAR A CONSEQUÊNCIAS INDESEJADAS COMO AGRESSÃO E CRUELDADE, EXAUSTÃO EMOCIONAL E BURNOUT. PRECISAMOS DE MAIS COMPAIXÃO NO MUNDO EM QUE VIVEMOS Empatia ou compaixão? A EMPATIA ENVOLVE A EXPERIÊNCIA DE SENTIR O QUE PENSAMOS QUE A OUTRA PESSOA ESTÁ SENTINDO E TEM SIDO APONTADA COMO CRUCIAL PARA MOVER O COMPORTAMENTO MORAL #OMO�EXISTEM�VÉRIAS�DElNI¥ÜES�DE�EM- patia, torna-se necessário um breve exame DE� SEUS� PRINCIPAIS� SIGNIlCADOS��5MA� DAS� DElNI¥ÜES�SE�REFERE�Ì�EMPATIA�COGNITIVA��A� capacidade de imaginar o que se passa na mente do outro, a “teoria da mente” como se designa em Psicologia cognitiva. Esse tipo de empatia pode levar um psicopata A�PLANEJAR�SUAS�MANIPULA¥ÜES�E�CRUELDADES� COM�GRANDE�ElCÉCIA��PORTANTO�NÎO�Ï�EXATA- mente aquilo que mais precisamos na so- ciedade. Outro sentido da palavra empatia Ï�O�QUE�PODEMOS�CHAMAR�DE�EMPATIA�hAFE- tiva”, quando sentimos o que a outra pes- soa está sentindo, ou, pelo menos, aquilo QUE� INFERIMOS� QUE� A� PESSOA� SENTE�� &INAL- mente, temos um conceito de empatia que SE�FUNDE�COM�O�SIGNIlCADO�DE�COMPAIXÎO�� ternura ou gentileza. Nesse caso, a empa- TIA� ENVOLVE� SENTIMENTOS� POSITIVOS� FRENTE� aos outros. Nesse sentido, desejo que um AMIGO�ANSIOSO�lQUE�MELHOR�E�CALMO��MAS� NÎO�ME�SINTO�ANSIOSO�JUNTO�COM�ELE��COMO� ACONTECE�NA�EMPATIA�AFETIVA��2ESERVAREI�O� TERMO� hCOMPAIXÎOv� PARA� DESCREVER� ESSA� ATITUDE��ENQUANTO�MANTEMOS�A�DESIGNA¥ÎO� de “empatia” para a ressonância emocio- nal com o outro. !� EMPATIA� AFETIVA� OU� EMOCIONAL� ESTÉ� LIGADA� Ì� ATIVA¥ÎO� DOS� CIRCUITOS� CEREBRAIS� da dor na pessoa que empatiza com quem ESTÉ�SOFRENDO��5M�EXPERIMENTO�COM�NEU- roimagem examinou os circuitos cerebrais DO�CØRTEX�ANTERIOR�CINGULADO��REGIÎO�QUE�SE� ativa com a experiência de dor. Os parti- CIPANTES�FORAM�EXPOSTOS�A�VÓDEOS�EXIBINDO� PESSOAS�SOFRENDO�COM�!IDS��E�VERIlCOU SE� que sentiam mais empatia e apresentavam MAIOR�ATIVA¥ÎO�NO�CØRTEX�CINGULADO�ANTE- rior quando se descrevia que as pessoas TINHAM�CONTRAÓDO�A�SÓNDROME�POR�MEIO�DE� TRANSFUSÎO� DE� SANGUE�� BEM� MAIS� DO� QUE� quando a narrativa era de contágio pelo USO�DE�INJE¥ÜES�INTRAVENOSAS�COM�DROGAS� A empatia está sujeita a vieses morais, COMO�FOI�DEMONSTRADO�NO�ESTUDO�EUROPEU� EM�QUE�TORCEDORES�DE�UM�TIME�DE�FUTEBOL� RECEBIAM�UM�CHOQUE�NA�MÎO�E�ASSISTIAM� A� OUTRO� HOMEM� RECEBER� O� MESMO� CHO- QUE��1UANDO�O�OUTRO�HOMEM�ERA�DESCRITO� como sendo do mesmo time, acontecia muito mais resposta neural empática de dor do que quando era do time concor- RENTE��.ÎO�Ï�DIFÓCIL�IMAGINAR�QUE�A�EMPA- E M�������EM�UMA�FALA�MUITO�CITA- DA��O�ENTÎO�SENADOR�"ARACK�/BA- MA�AlRMOU�QUE�TEMOS�UM�DÏlCIT� em empatia, reivindicando um SENSO�DE�EMPATIA�PARA�INSPIRAR�A�POLÓTICA� e a sociedade. Segundo esse movimen- TO��QUANTO�MAIS�EMPATIA��MELHOR� SERÉ�O� MUNDO�� E� O� FOCO� Ï� PROMOVER� INTERVEN- ¥ÜES� VOLTADAS� PARA� AUMENTAR� A� EMPATIA� EM�INDIVÓDUOS�E�COMUNIDADES��4AMBÏM� EXISTE�PREOCUPA¥ÎO�COM�PESSOAS�QUE�TÐM� FALTA�DE�EMPATIA�E�COM�SITUA¥ÜES�QUE�PO- DEM�ENFRAQUECÐ LA�� %MBORA�SEJA�UM�GRANDE�AVAN¥O�CON- SIDERAR�A� IMPORTÊNCIA�DA�EMPATIA��Ï�NE- CESSÉRIO� ENTENDER� EM� MAIS� DETALHES� A� RELA¥ÎO�QUE�EXISTE�ENTRE�COMPORTAMENTO� MORAL�E�EMPATIA��POIS�NÎO�Ï�ALGO�TÎO�SIM- ples como parece. Considere as recen- tes pesquisas mostrando que a empatia PODE�MOVER�A�AGRESSÎO��3E�EMPATIZAMOS� com uma pessoa ou grupo, o comporta- MENTO� AGRESSIVO� FRENTE� A� OUTRAS� PESSO- as ou grupos por ser turbinado quando “tomamos as dores” dos outros. Ao in- mUENCIAR�NOSSAS�EMO¥ÜES�� A�EXPERIÐNCIA� empática pode nos levar a vieses morais e comportamento cruel para aqueles que supostamente merecem ser punidos. Po- DEMOS�PONDERAR�TAMBÏM�QUE�A�EMPATIA� PODE�ACARRETAR�EXAUSTÎO�EMOCIONAL�E�ES- TRESSE�� E� OS� PROlSSIONAIS� QUE� TRABALHAM� COM�SOFRIMENTO�HUMANO�COMO�MÏDICOS�� PSICØLOGOS�E�ENFERMEIROS�FREQUENTEMENTE� DESENVOLVEM�A�SÓNDROME�DE�"URNOUT�EM� SEU�TRABALHO�DEVIDO�Ì�EMPATIA� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 49 IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K/ AR QU IV O PE SS OA L Marco Callegaro é psicólogo, mestre em Neurociências e Comportamento, diretor do Instituto Catarinense de Terapia Cognitiva (ICTC) e do Instituto Paranaense de Terapia Cognitiva (IPTC). Autor do livro premiado O Novo Inconsciente: Como a Terapia Cognitiva e as Neurociências Revolucionaram o Modelo do Processamento Mental (Artmed, 2011). Referências: Bloom, P. Against Empathy: The Case for Rational Compassion. Nova York: Ecco Press, 2016. Vachon, D. D. et al. The (non)relation between empathy and aggression: surprising results from a meta-analysis. Psychological Bulletin, v. 140, p. 751, 2014. TIA�COM�AQUELES�QUE�SÎO�DE�NOSSO�GRUPO� PODE�MOVER�A�CRUELDADE�E�ATÏ�O�GENOCÓDIO� COM�AQUELES�QUE�SÎO�DE�OUTRO�GRUPO��%SSE� PONTO� TEM� IMPORTANTES� IMPLICA¥ÜES� NO� mundo atual, onde aumentam a migra- ¥ÎO� E� O� NÞMERO� DE� REFUGIADOS�� LEVANDO� Ì� NECESSIDADE�DE� INCLUSÎO�DE� GRUPOS� DE� estrangeiros na sociedade. 0ODEMOS�PENSAR�QUE�A�FALTA�DE�EMPATIA� LEVA�Ì�AGRESSÎO��E�QUE�SE�ESTIMULARMOS�A� empatia reduziremos os problemas em um mundo violento. No entanto, uma análise DOS� ESTUDOS� QUE� RELACIONAM� AGRESSÎO� E� FALTA� DE� EMPATIA� DESCOBRIU� QUE� SOMENTE� ���DA�VARIA¥ÎO�EM�AGRESSIVIDADE�PODERIA� SER�ATRIBUÓDA�Ì�FALTA�DE�EMPATIA��2ESULTADO� surpreendente, em um estudo que con- SIDEROU� AGRESSÎO� VERBAL�� SEXUAL� E� FÓSICA�� CONCLUINDO�QUE�OUTRAS�EMO¥ÜES�E�FATORES� eram mais importantes. Outra pista vem DOS�AUTISTAS��QUE�SABEMOS�TER�FORTES�DÏlCITS� EM�EMPATIA��/S�PORTADORES�DE� SÓNDROME� DE�!SPERGER��UMA�ESPÏCIE�DE�AUTISMO�LEVE�� NÎO�APRESENTAM�NENHUMA�PROPENSÎO�PARA� AGRESSÎO�OU�EXPLORA¥ÎO��E�SÎO�CONHECIDOS� POR�SEGUIREM�PRINCÓPIOS�MORAIS�RÓGIDOS�� !� EMPATIA� ENVOLVE� EMO¥ÜES�� E� ESTAS� podem nos desviar de julgamentos mo- RAIS�PONDERADOS��LEVANDO�A�DECISÜES�IMO- rais. Uma alternativa mais razoável para A�EMPATIA�Ï�A�COMPAIXÎO��QUE�PODE�NOS� MOVER� A� FAZER� O� BEM� E� AUXILIAR� AS� PES- soas sem as desvantagens da empatia. -ESMO�A�COMPAIXÎO�NÎO�SUBSTITUI�A�RE- mEXÎO� CONSCIENTE� E� DELIBERADA� SOBRE� OS� DIREITOS�E�DEVERES�ENVOLVIDOS�NA�SITUA¥ÎO�� E�A�APLICA¥ÎO�DE�UMA�ESCALA�DE�VALORES�NO� JULGAMENTO�MORAL��BEM�COMO�PRINCÓPIOS� DE�MORALIDADE��.ÎO�PODEMOS�DELEGAR�DE- CISÜES�MORAIS�QUE�AFETAM�A�VIDA�DAS�PES- soas unicamente aos sentimentos empáti- COS��5MA�PONDERA¥ÎO�QUE�USE�PRINCÓPIOS� morais pode ser mais justa e equilibrada COMO�GUIA�PARA�NOSSAS�A¥ÜES��AINDA�MAIS� SE�ENDOSSADA�PELA�COMPAIXÎO� 50 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br recursos humanos por João Oliveira Relações PRODUTIVAS A s relações institucionais es- tão cheias de valorações que, na maioria das vezes, é mais de ordem subjetiva do que realmente material. Toda instituição mantém uma relação de troca com seus clientes, seja no próprio mercado interno (corpo laboral e fornecedores principalmente) e no mercado externo (clientes e concorrentes principalmen- te), e os resultados positivos só são al- cançados quando essa relação de va- lores está adequada aos interesses das partes envolvidas no processo. Dessa forma, sempre que ocorre a aquisição de um produto ou serviço, existe um valor simbólico que é agre- GADO� AO� lNANCEIRO�� 5MA� PESSOA�� POR� exemplo, pode comprar uma roupa 5-�02/#%33/�).34)45#)/.!,� 0/335)�5-�3)'.)&)#!$/�-!)/2�$/� 15%�3)-0,%3-%.4%�/�.·-%2/� !02%3%.4!$/�.!�0,!.),(!�$%�6%.$!3�� 15!.$/�%33%�6!,/2�!42)"5°$/�¡� #/-02%%.$)$/�%�2%,!#)/.!$/�±� .%'/#)!§/��/�!4%.$)-%.4/�¡�%&)#!: www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida51 João Oliveira é Doutor em Saúde Pública, psicólogo e diretor de Cursos do Instituto de Psicologia Ser e Crescer (www.isec.psc.br). Entre seus livros estão: Relacionamento em Crise: Perceba Quando os Problemas Começam. Tenha as Soluções!; Jogos para Gestão de Pessoas: Maratona para o Desenvolvimento Organizacional; Mente Humana: Entenda Melhor a Psicologia da Vida; e Saiba Quem Está à sua Frente – Análise Comportamental pelas Expressões Faciais e Corporais (Wak Editora). IM AG EN S: 1 23 RF /A CE RV O PE SS OA L PARA� SE� SENTIR� MAIS� BONITA�� PARA� lCAR� MAIS� AUTOCONlANTE� EM� BUSCA� DE� UMA� promoção no trabalho, ou para um encontro com uma pessoa especial. %SSE�VALOR�NÎO�ESTÉ�NA�ROUPA�EM�SI��ELE� pertence ao consumidor que possui mUÐNCIAS� EMOCIONAIS� RELACIONADAS� AO� UNIVERSO�EM�QUE�VIVE��5M�CASAL�PODE� ir a um restaurante não pela comida ou pelo menor preço, mas porque aquele foi o restaurante onde se encontraram pela primeira vez e, para eles, isso tem UM� SIGNIlCADO� MUITO� ESPECIAL�� 5M� funcionário pode obedecer uma ordem dada por um gestor sem sequer anali- sar seu conteúdo e resultados apenas porque esse gestor criou laços de com- prometimento que geram segurança à equipe de trabalho. 0ENSANDO�ASSIM��TODO�ELEMENTO�NA� INSTITUI¥ÎO�SE�TRANSFORMA�EM�PROlSSIO- nal de atendimento, pois sempre que se comunica está na posição de uma pes- soa que atende outra pessoa, buscando acolher uma determinada necessidade E�SOLUCIONANDO�UMA�DEMANDA��/�ATEN- dimento, portanto, torna-se sinônimo DE�COMUNICA¥ÎO�CLARIlCADA�QUE�DÉ�VA- lor ao que está sendo negociado. 3ÎO� ALGUMAS� CARACTERÓSTICAS� BÉSI- cas que devem receber investimento para que essa valoração dos processos possa ocorrer de forma natural entre o elemento que apresenta a situação (comunicação, produto ou serviço) e o cliente (qualquer pessoa dentro ou FORA� DA� EMPRESA �� 3ÎO� ELAS�� � �$ESEN- volver um bom relacionamento e con- lAN¥A�� COM�O� TEMPO��O�OUTRO�PASSA� A� dar respostas mais rápidas por saber COM�QUEM�ESTÉ�LIDANDO��� �!TENDER�AS� NECESSIDADES� DOS� CLIENTES�� SOLUCIONAR� DEMANDAS� EXISTENTES�� lNALIZANDO� OS� PROCESSOS� ABERTOS�� � � 3UPERAR� AS� EX- PECTATIVAS��IR�ALÏM�DO�ESPERADO�SEMPRE� ofertando algo que surpreende positi- VAMENTE�O�OUTRO��� �3ER�EMPÉTICO��SER� capaz de prever as necessidades que O�OUTRO� PODE� TER� DIlCULDADE� DE� APRE- SENTAR�� � � 3ER� SIMPÉTICO�� A� ATEN¥ÎO� dedicada ao outro está mais ligada à MENOS�IMPORTANTE��.OSSO�PAÓS�GUARDA� muitos preconceitos que estão enraiza- dos na cultura e passam, muitas vezes, ocultos ou aceitáveis pela maior parte DA�POPULA¥ÎO��&A¥A�DIFERENTE�SENDO�ÏTI- co e correto com todos, independente- MENTE� DO� PERlL� QUE� APRESENTE�� SENDO� PRESTATIVO�E�PROATIVO���� �'ERENCIAR�AS� EMO¥ÜES�E� TER� INTELIGÐNCIA�EMOCIONAL�� SE�FOR�O�CASO�DE�SENTIR�DIlCULDADE�NESSE� ASPECTO��PROCURE�UM�PROlSSIONAL�TERA- peuta ou coach que possa auxiliá-lo no processo de alinhamento emocional; �� �3ER�COMPROMETIDO�COM�A�EMPRESA�� com seu trabalho e com a satisfação do OUTRO��UM�BOM�CAMINHO�PARA�A�FUTURA� VALORA¥ÎO�POSITIVA�Ï�O�INÓCIO�DO�CAMI- NHO��/�BÉSICO�JAMAIS�DEVE�SER�ESQUECI- DO���� �3ABER�SEPARAR�O�PESSOAL�DO�PRO- lSSIONAL��MANTENDO�O�PROlSSIONALISMO�� PROVAVELMENTE� O� DETALHE� MAIS� DIFÓCIL� de todas as dicas aqui apresentadas. -UITOS�ACREDITAM�QUE�SEREMOS�NA�VIDA� PROlSSIONAL�UM�ESPELHO�DO�QUE�SOMOS� NA�VIDA�PESSOAL��0OR�OUTRO�LADO��OUTROS� confundem os processos e misturam a VIDA�PESSOAL�COM�A�PROlSSIONAL��GERAN- do problemas de ordem emocional ou invés de ter um bom relacionamento interpessoal com todos à sua volta; 15) 6ESTIR SE� DE� MODO� CONDIZENTE� COM� O� LOCAL�DE�TRABALHO��POR�ÞLTIMO�MAS�NÎO� MENOS�IMPORTANTE��AlNAL�A�EMBALAGEM� DIZ�MUITO�SOBRE�O�PRODUTO��%STAR�ADE- quadamente vestida com o padrão da instituição coloca a pessoa mais próxi- ma de adquirir uma boa credibilidade com o outro. 0ORTANTO�� PARA� TER� RELA¥ÜES� PRODU- tivas é necessário um investimento constante em vários e pequenos deta- lhes que, com o tempo, podem fazer uma grande diferença no resultado das ações de uma pessoa ou instituição. LINGUAGEM�NÎO�VERBAL��� �3ER�ASSERTIVO�� buscar ser objetivo nas colocações sem aprofundamentos e detalhes desneces- SÉRIOS��� �3ER�ORGANIZADO��ADMINISTRA- ção do tempo e informações relevantes são os elementos-chave de qualquer pessoa que deseje passar uma imagem de organização ao outro; 8) Transmitir segurança sobre a informação passa- DA��O�CONHECIMENTO�DO�TEMA�Ï�IMPRES- CINDÓVEL��3E�NÎO� TEM�DOMÓNIO� SOBRE�O� assunto, delegue a quem tem para a condução do processo comunicacional DA�NEGOCIA¥ÎO��� �3ER�CONlÉVEL��NUNCA� prometa o que não tem certeza de po- DER�CUMPRIR�NO�FUTURO��.ÎO�HÉ�ESPA¥O� para possibilidades e, se essa for a úni- ca opção de comprometimento, deixe isso claro para o outro; 10) Demons- TRAR� SENSIBILIDADE� E� RESPEITO�� ENTENDER� claramente as questões que os clientes APRESENTAM��3AIBA�OUVIR� E�NO� CASO�DE� dúvida pergunte para que o entendi- MENTO�SEJA�PLENO���� �3ABER� LIDAR�COM� DIFERENTES�TIPOS�DE�PESSOAS��NINGUÏM�Ï� 5-�"/-�#!-).(/� 0!2!�!�&5452!� 6!,/2!§/� 0/3)4)6!�¡�/�).°#)/� $/�#!-).(/��/� "£3)#/�*!-!)3�$%6%� 3%2�%315%#)$/�� #/-02/-%4)-%.4/� #/-�!�%-02%3!�� #/-�/�42!"!,(/� %�#/-�!�3!4)3&!§/� $/�/542/ 52 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br ciberpsicologia Por Igor Lins Lemos A ERA DA BUSCA PELO HEDONISMO, FREQUENTEMENTE, DO NARCISISMO NAS REDES SOCIAIS E DA DEPENDÊNCIA PELA TECNOLOGIA TRAZ UMA PERCEPÇÃO DE FELICIDADE BASEADA NA AVALIAÇÃO DE TERCEIROS SOBRE NÓS. QUE FELICIDADE É ESSA? Espelho, espelho MEU... T rago este mês provocações ancoradas em uma série te- levisiva que tem íntima relação com esta coluna. Mui- tos devem estar familiarizados com o nome Black Mir- ror. Para os que não conhecem, trata-se de uma série que traz a temática tecnológica e suas reverberações, em alguns momentos, trágicas. O nome Black Mirror, traduzido livremente como “espelho negro”, pode ser compreendido, no sentido literal, como a forma que enxergamos o nosso aparelho celular, televisor, computador, ou seja, uma tela que está em stand-by. São esses milhões de espelhos que estão ao nosso redor e, como debatido em diversos outros textos nesta coluna, permitimos que eles se tornassem papel central nos lares, nos locais de trabalhos, nas es- colas, nas faculdades, nas ruas, nos ambientes culturais, nos mo- mentos de lazer, no trânsito e em diversas outras circunstâncias. A temática de Black Mirror se refere a uma sociedade que utiliza amplamente os recursos eletrônicos, com diversas www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 53 IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K/ AC ER VO P ES SO AL DIVERSOS APLICATIVOS GERAM NOTA PARA OS USUÁRIOS, DESDE OS DE TRANSPORTE ATÉ OS DE PAQUERA. O NÚMERO DE CURTIDAS EM UMA FOTO TAMBÉM RETRATA, DE FORMA INDIRETA, A NECESSIDADE DE ESTARMOS SENDO SEMPRE VISTOS E VALIDADOS outros tópicos igualmente importantes se referem à busca do prazer, de ser avaliado positivamente pelo próximo, e a relação com nossos traços narcisistas. Imagine- mos que você alcance um número absur- damente alto de curtidas em sua foto. O que ocorre após? Manter o número alto de curtidas o tempo inteiro o torna natu- ral ou será que vai precisar adaptar suas fotos e mensagens para que elas sejam divulgadas no molde que a sociedade as valida? A dependência tecnológica, tema que enfatizo em diversos momentos, não será discutida nesse momento, mas sim em um último ponto: a felicidade. Cer- tamente avaliamos e interpretamos con- ceitos sobre o que é felicidade de forma distinta.Mas tentemos nos aproximar de uma interseção: qual a relação da felici- dade com o uso de tecnologia? Se sente feliz, realizado(a), acolhido(a) nas redes SOCIAIS��!� FELICIDADE�� EM� DElNITIVO�� NÎO� está nas redes sociais. Ela se relaciona a realizações pessoais muito mais nobres e subjetivas que, mesmo variando de sujei- to para sujeito, sabemos que é alcança- da apenas de forma momentânea. Nos- sa sorte é exatamente essa, a busca pela felicidade permanente (e encontrada na internet) na verdade nos tornaria mortos- -vivos-digitais acomodados diante des- sa tela, que, quando olham diretamente para ela, a única coisa que enxergam é O� SEU� REmEXO�MORTO��/S� ELETRÙNICOS� SÎO� fantásticos, mas eles são apenas um dos diversos recursos que existem em nossa vida. Momento de sair do piloto automá- TICO��$ESAlO�ACEITO� Igor Lins Lemos é doutor em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental Avançada pela Universidade de Pernambuco (UPE). É psicoterapeuta cognitivo-comportamental, palestrante e pesquisador das dependências tecnológicas. E-mail: igorlemos87@hotmail.com que essa mídia não nos traz felicidade. Em relação ao primeiro ponto: quantas vezes você percebe que está no looping “Whatsapp-Facebook-Instagram”? O meca- nismo é simples: visualizamos quais reca- dos chegaram no Whatsapp, os responde- mos, entramos no Facebook para ler o feed de notícias, aguardamos as mensagens do Whatsapp fazendo hora no Instagram e en- tão voltamos ao primeiro aplicativo (isso não é novidade alguma, concorda?). Esse tipo de sistema é descrito apenas para três redes sociais, porém atendo pacientes que usam entre 12 e 16 redes no mesmo celular. Precisamos estar on-line o tempo todo? Se sim, por qual motivo? Se não, en- tão o uso se refere a quê? Escapismo? Dois Referências: ROSE, S.; DHANDAYUDHAM, A. Towards an understanding of internet-based problem shopping behaviour: the concept of online shopping addiction and its proposed predictors. Journal of Behavioral Addictions, v. 2, 2014. TAVARES, H.; LOBO, D. S. S.; FUENTES, D.; BLACK, D. W. Compras compulsivas: uma revisão e um relato de caso. Revista Brasileira de Psiquiatria, v. 30, 2008. . *.4& 9�+:e�-.� �& 9�&:e�('' 9��:e�� �)�9�(:�+G�������IG��H�������������G��G����I�I��������� internet addiction: a model-based experimental investigation. PLoS One, v. 10, 2015. temáticas: uso de mídia, tecnologia na força militar, realidade virtual, crimes virtuais etc. A série é rica na abertura de possibilidade de debates no campo da Psicologia, porém irei me deter apenas no primeiro capítulo da terceira tempo- rada, intitulado “Nosedive”. Nesse mun- do futurístico (será que tão distante de nós?), as pessoas avaliam qualquer outra pessoa (do funcionário de uma loja de sorvete até o colega de trabalho) por meio de um aparelho que se assemelha a um celular. Mas o que isso realmen- te implica no cotidiano? Em tudo. As nossas estrelas, assim como no conhe- cido Uber, que compreende uma escala de um a cinco, servem como referên- cia para que possamos ser convidados a postos maiores de trabalho, viajar de avião com melhores possibilidades de horários e conforto, alugar um carro, comprar uma casa mais bonita, entre diversas outras situações que são avalia- das pelo aparelho. Pensemos: se é por meio da avaliação digital de terceiros e com essa nota que obtemos deles, quais serão os comportamentos que desenvol- veríamos para sempre alcançarmos altas notas? Será que seríamos transparentes ou iríamos vestir diversas máscaras so- ciais para que possamos estar sempre no topo? Infelizmente isso já está sendo feito – há um bom tempo! A reação de alguns alunos ao assistir a esse capítulo é de que esse futuro não irá ocorrer, que não iremos permitir que simples avalia- ções guiem nossa vida. Porém, será que não devemos nos preocupar? Diversos aplicativos geram nota para os usuários, desde os de transporte até os de paque- ra. O número de curtidas em uma foto também não retrata, de forma indireta, a necessidade de estarmos sendo sem- pre vistos e validados? Temas que são discutidos neste capí- tulo são: a necessidade de estarmos em redes sociais virtuais constantemente; a avaliação de terceiros sobre nossos hábi- tos, corpo e gostos; a busca pelo hedo- nismo frequentemente; o narcisismo; a DEPENDÐNCIA� E�� POR� lM�� A�PERCEP¥ÎO�DE� 54 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br sexualidade Por Giancarlo Spizzirri e Carla Pereira A PRESENÇA DE DOR DURANTE AS RELAÇÕES SEXUAIS É MAIS COMUM NAS MULHERES, PORÉM, COM MENOR FREQUÊNCIA, TAMBÉM É REFERIDA POR ALGUNS HOMENS Dispareunia masculina prepúcio não pode ser retraído, surge a dor ao tentar a penetração ou também durante a masturbação; 2) Língua presa: o frênulo do pênis é a pequena dobra de tecido que liga o prepúcio à cabeça da glande; em alguns homens essa dobra é menor, de modo que pode ocorrer uma lSSURA�DURANTE�A�PENETRA¥ÎO�� CAUSANDO� queimação intensa, dor e às vezes san- gramento. 3) Doença de Peyronie: é a curvatura anormal do pênis durante a ereção. Esse processo ocorre por for- mação de cicatrizes no revestimento do corpo cavernoso do pênis. 4) Assoalho pélvico espástico: hipertonia da mus- culatura do assoalho pélvico, prejudi- cando a função dessa região e levando A�UMA�DIlCULDADE�DE�CONTRAIR�E�RELAXAR� esse grupo de músculos. Outros fatores que levam à dispareu- NIA� EM� HOMENS� SÎO� OS� PROCESSOS� INmA- matórios como, por exemplo, a prostatite �INmAMA¥ÎO�DA� PRØSTATA �� URETRITE� �INmA- mação da uretra), epididimite (edema do epidídimo – via pela qual as secreções dos testículos para os canais deferentes e dutos ejaculatórios são despejados), con- diloma (infecção viral que causa verru- gas na mucosa da glande), herpes (lesão da mucosa que gera dor intensa), proces- sos alérgicos ocasionadas por produtos D ispareunia é o termo técnico utilizado para a dor antes, du- rante ou após a relação sexual e, em alguns casos, presente na masturbação. $E� ACORDO� COM� A�#LASSIlCA¥ÎO�%S- tatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, 1993 (CID-10), a dispareunia é uma dor inten- sa durante o intercurso sexual, podendo ocorrer em homens e mulheres, tendo como causa uma condição patológica local ou uma causa emocional. A dispareunia ocorre, aproximada- mente, em 15% a 20% das mulheres e na população masculina não excede 5%; ainda assim, essa não é uma situação que deva ser ignorada pelos homens, uma vez que há tratamento praticamen- te para todos os casos. É importante observarmos que as relações sexuais dolorosas não são uma doença, mas sim um sintoma que pode estar associado a alterações anatômicas, PSICOLØGICAS��INFECCIOSAS�OU�INmAMATØRIAS� Entre as causas anatômicas e/ou mecânicas podemos destacar: 1) Fimo- SE�� Ï� A� DIlCULDADE� E�OU� INCAPACIDADE� de se expor a glande, a parte terminal do pênis, pois a pele que a recobre não APRESENTA� ABERTURA� SUlCIENTE�� #OMO� O� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 55 IM AG EN S: S HU TT ER ST OC K E AR QU IV O PE SS OA L Giancarlo Spizzirri é psiquiatra doutor pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina da USP, médico do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do IPq e professor do curso de especialização em Sexualidade Humana da USP. �G��G�+�����G�\�������G����G9� �����G� G�������������G�!GI�� G �� ����È�I�G�� Médicas da Santa Casa de São Paulo. Especialização em SexualidadeHumana (FMUSP); Fisioterapia em Gerontologia e Oncologia. Fisioterapeuta do Serviço de Fisioterapia Pélvica (Santa Casa de SP). ����È�I�G�d� ABDO, C. H. N. Descobrimento Sexual do ��G���d�para Curiosos e Estudiosos. São Paulo: Summus, 2004. DISPAREUNIA É UMA DOR INTENSA DURANTE O INTERCURSO SEXUAL, PODENDO OCORRER EM HOMENS E MULHERES. NOS HOMENS AS DORES PODEM OCORRER NOS GENITAIS, PÊNIS OU TESTÍCULOS, TENDO COMO CAUSA UMA CONDIÇÃO PATOLÓGICA LOCAL, ALTERAÇÃO MUSCULOESQUELÉTICA OU UMA CAUSA EMOCIONAL experiências sexuais podem ser dolo- rosas, produzindo evitação de aproxi- mações sexuais na sequência, e sempre estão associadas a outras condições psi- cológicas relacionadas à falta de asser- TIVIDADE��DIlCULDADE�EM�EXPRESSIVIDADE� emocional e de relacionamento social, com poucas habilidades sociais e de re- lacionamento afetivo. O tratamento da dispareunia mas- culina depende da causa, uma vez que pode ser física, orgânica ou emocional. Dessa forma, o tratamento poderá ser farmacológico, cirúrgico, psicoterapêu- TICO� E�lSIOTERÉPICO� E�� EM�ALGUNS� CASOS�� uma intervenção interdisciplinar. Para o sucesso do tratamento é im- portante que o homem quebre para- digmas, tabus e preconceitos e, quan- do apresentar dor na relação sexual e/ ou na masturbação, peça ajuda para o seu médico, o qual poderá investigar e direcionar a melhor opção de trata- mento, visando sempre a cura e o bem- -estar do indivíduo. DE�HIGIENE�CORPORAL�� LUBRIlCANTES�OU� LÉ- tex, doenças fúngicas e doenças sexual- mente transmissíveis (DSTs). Com relação às causas emocionais, essas podem estar relacionadas a causas PSICOLØGICAS�� DECORRENTES� DOS� CONmITOS� inconscientes que provocam esse tipo de dor. Embora menos comum em ho- mens do que nas mulheres, podemos ci- tar como fonte de certos problemas re- ceber uma educação familiar repressiva, responsável pela transferência de tabus, preconceitos e sentimentos negativos. Histórico de abuso ou violência sexual, que ocorrem geralmente na infância, TAMBÏM� PODE� � GERAR� CONmITO� INTENSO� e negação do prazer. É importante in- vestigar e analisar a dinâmica do casal, UMA�VEZ�QUE�CONmITOS�CONJUGAIS�PODEM� agravar / despertar a dor durante a re- lação sexual. Observa-se que os aspectos psico- lógicos chegam a representar, como causa, aproximadamente 50% dos ca- sos. Em muitos casos, a dor pode estar presente em homens que tiveram pouca atividade sexual até a terceira década de idade. Não se masturbavam, não têm muitas experiências de namoro e de in- timidades físicas. Assim, as primeiras 56 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br GRAVIDEZ INVISIBILIDADE SH UT TE RS TO CK GRAVIDEZ www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 57 Raquel Jandozza é psicóloga perinatal formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, especializada em Psicanálise Lacaniana pela PUC-SP; doula e coach ontológica MATERNA Por Raquel Jandozza Além da intensa felicidade proporcionada pela maternidade, a missão de ser mãe traz como consequência aspectos biopsicossociais envolvidos na perda da identidade da mulher após o nascimento do bebê MATERNA pppppppppppppppprrrrrrrrrrrrrrroooooooooooopppppppppppppppooooooooooooooorrrrrrrrrrrrrrrcccccccccccciiiiiiiiiiiiooooooooooooonnnnnnnnnnnnnnnaaaaaaaaaaaaaaaadddddddddddddddddaaaaaaaaaaaaaa pppppppppppppppeeeeeeeeeeeeeeeeelllllllllllllllaaaaaaaaaaaaaa mmmmmmmmmmmmmmmmaaaaaaaaaaaaaaaattttttttttttttttteeeeeeeeeeeeeeerrrrrrrrrrrrrrnnnnnnnnnnnnniiiiiiiiiiiiiiiddddddddddddddddaaaaaaaaaaaaaaadddddddddddddddddeeeeeeeeeeeeeeee,,,,,,, aaaaaaaaaaaaaaaa mmmmmmmmmmmmmmmiiiiiiiiiiiiiisssssssssssssssssssssssssssãããããããããããããããããoooooooooooooooo ddddddddddddddddeeeeeeeeeeeeeee sssssssssssssssseeeeeeeeeeeeeeeerrrrrrrrrrrrrr mmmmmmmmmmmmmmmmãããããããããããããããããeeeeeeeeeeeeeeeee ttttttttttttttttrrrrrrrrrrrraaaaaaaaaaaaaazzzzzzzzzzzzzz cccccccccccccooooooooooooommmmmmmmmmmmmmmoooooooooooooo cccccccccccccooooooooooooonnnnnnnnnnnnnnssssssssssssssseeeeeeeeeeeeeeeeqqqqqqqqqqqqqqquuuuuuuuuuuuuuêêêêêêêêêêêêêêêêênnnnnnnnnnnnnnccccccccccccccciiiiiiiiiiiiaaaaaaaaaaaaaa aaaaaaaaaaaaaaaaassssssssssssssspppppppppppppppeeeeeeeeeeeeeeeeecccccccccccccccttttttttttttttttooooooooooooossssssssssssss bbbbbbbbbbbbbbbbiiiiiiiiiiiiiiiiooooooooooooooppppppppppppppsssssssssssssiiiiiiiiiiiiiiiccccccccccccccoooooooooooosssssssssssssssssssssssssssoooooooooooooooccccccccccccccciiiiiiiiiiiiiaaaaaaaaaaaaaaaiiiiiiiiiiiiiiissssssssssss eeeeeeeeeeeeeeeeennnnnnnnnnnnnnvvvvvvvvvvvvvvvooooooooooooollllllllllllllvvvvvvvvvvvvvvvviiiiiiiiiiiiiiddddddddddddddddoooooooooooooossssssssssssss nnnnnnnnnnnnnnaaaaaaaaaaaaaaa ppppppppppppppppeeeeeeeeeeeeeeeeerrrrrrrrrrrrrrddddddddddddddddaaaaaaaaaaaaaa ddddddddddddddddaaaaaaaaaaaaaa iiiiiiiiiiiddddddddddddddddeeeeeeeeeeeeeeeennnnnnnnnnnnnntttttttttttttttttiiiiiiiiiiiiddddddddddddddddaaaaaaaaaaaaaaadddddddddddddddddeeeeeeeeeeeeeeeee ddddddddddddddddaaaaaaaaaaaaaa mmmmmmmmmmmmmmmuuuuuuuuuuuuuullllllllllllllhhhhhhhhhhhhhhhhheeeeeeeeeeeeeeeerrrrrrrrrrrrrr aaaaaaaaaaaaaaaaapppppppppppppppóóóóóóóóóóóóóóóósssssssssssss ooooooooooooo nnnnnnnnnnnnnnnaaaaaaaaaaaaaaaasssssssssssssscccccccccccccciiiiiiiiiiiimmmmmmmmmmmmmmeeeeeeeeeeeeeeeennnnnnnnnnnnnntttttttttttttttttoooooooooooooo ddddddddddddddddoooooooooooooo bbbbbbbbbbbbbbbbeeeeeeeeeeeeeeeebbbbbbbbbbbbbbbbêêêêêêêêêêêêêêêêêê AAAAAAAAAAAAAAAAAlllllllllllléééééééééééééééémmmmmmmmmmmmm ddddddddddddddddaaaaaaaaaaaaaa iiiiiiiiiinnnnnnnnnnnntttttttttttttttteeeeeeeeeeeeeennnnnnnnnnnnnsssssssssssssaaaaaaaaaaaaaa fffffffffffffffffeeeeeeeeeeeeellllllllllllllliiiiiiiiiiiccccccccccccciiiiiiiiiiidddddddddddddddaaaaaaaaaaaaaadddddddddddddddddeeeeeeeeeeeeeee Além da intensa felicidade proporcionada pela maternidade, a missão de ser mãe traz como consequência aspectos biopsicossociais envolvidos na perda da identidade da mulher após o nascimento do bebê Por Raquel JandozzaPor Raquel JandozzaPPPPPPPPPPPPPPPPoooooooooooooorrrrrrrrrrrrrrrr RRRRRRRRRRRRRRRRaaaaaaaaaaaaqqqqqqqqqqqqqqqquuuuuuuuuuuuuuueeeeeeeeeeeeeeellllllllllllll JJJJJJJJJJJJJJaaaaaaaaaaannnnnnnnnnnnndddddddddddddddddooooooooooooozzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzaaaaaaaaaaPPPPPPPPPPPPooooooooorrrrrrrrrrr RRRRRRRRRRRRaaaaaaaaaaqqqqqqqqqqquuuuuuuuuuuueeeeeeeeeeeellllllllllll JJJJJJJJJJaaaaaaaaaannnnnnnnnndddddddddddddoooooooooozzzzzzzzzzzzzzzzzzzzaaaaaaaaaPPPPPPPoooooorrrrrrr RRRRRRRRaaaaaaqqqqqqquuuuuuuueeeeeeeellllllll JJJJJJaaaaaannnnnnddddddddooooooozzzzzzzzzzzzzaaaaaaPPPPPPPoooooorrrrrrr RRRRRRRRaaaaaaqqqqqqquuuuuuuueeeeeeeellllllll JJJJJJaaaaaannnnnnddddddddooooooozzzzzzzzzzzzzaaaaaaPor Raquel Jandozza 58 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br GRAVIDEZ po, essa mesma mulher passa a ocupar um papel social investido de uma série de valores e concepções que a engessam em um “modelo” no qual só lhe resta se adequar. Essa adequação, porém, é cus- tosa em muitos sentidos, uma vez que o social pode, em certa medida, ser o pano de fundo da vivência materna; entretan- to, no campo subjetivo e emocional, cada mulher vai vivenciá-la de modo singular. A gravidez, portanto, deixou de per- tencer somente ao campo do orgânico e a maternidade passou a ser compreendida por diferentes campos do saber, inclusi- ve pela Psicologia, que tem buscado o entendimento acerca dos principais fe- nômenos psíquicos correlacionados ao ciclo gravídico-puerperal. Dentre os fe- nômenos psicossociais observáveis nesse ciclo, destacamos um – a “invisibilidade e perda da identidade materna”. Padecimento A “invisibilidade e perda de identida-de” das mulheres diante da vivên- cia materna se trata de um fenômeno a ser compreendido sob um prisma tam- bém social. Consideram-se aspectos in- dividuais da mulher nesse processo de apagamento. Contudo, não recai sobre ela a total responsabilidadepelo fato. Pelo contrário, por vezes as mães sequer reconhecem tal padecimento. Frequen- temente, ouve-se das mães a menção de alguns chavões, reclamações e queixas de sintomas físicos e emocionais que, muitas vezes, caem em descrédito por serem já tão comuns à ideia que se tem da figura materna e, por isso, passam a ser naturalizados ou, pior, banalizados. A crescente valorização da infância, Há anos, acredita-se que a “maternidade” é um dom inato à mulher. Que há uma imensi-dão de afeto na relação materna, não se pode negar. Contudo, sócio-historicamente, sabe-se que nem sempre essa relação se deu dessa forma. A partir de uma compreensão sociológi- ca, pode-se dizer que “amor materno” é conquistado e construído. Dois grandes autores e historiadores, Elizabeth Badinter e Philippe Ariès, vão apresentar em suas obras, Um Amor Con- quistado: o Mito do Amor Materno (1985) e História Social da Criança e da Família (1981), respectivamente, a concepção de que o amor materno não é inato e que a infância é uma construção recente. Para ambos, o “sentimento de infância” surge em meados do século XVIII, momento em que a criança passa a ser incluída na cena e convívio familiar e seus cuidados – antes delegados a amas de leite – tor- nam-se função da família, mais direta- mente da mãe. Para Ariès, as famílias não se apegavam afetivamente às crianças e tampouco lhes dispensavam maiores cuidados, uma vez que o índice de mor- talidade infantil era muito alto. Já para Badinter, a mortalidade infantil seria jus- tamente reflexo desse distanciamento e ausência de cuidados familiares efetivos. Um dos objetivos principais desses O sentimento de infância surge em meados do século XVIII, momento em que a criança passa a ser incluída na cena e convívio familiar e seus cuidados – antes delegados a amas de leite – tornam-se função da família, mais diretamente da mãe estudos é apontar que naturalizamos algo que foi socialmente construído – infância e maternidade. Quais os re- flexos dessa concepção para as mães na atualidade? Ora, vejamos: a concepção de amor materno, inclusive propagado como “instintivo”, lança na maternidade uma enorme expectativa do exercício de funções e características balizadas por um ideal social e cultural. Dentre as transformações sociais, não se pode esquecer os avanços tecno- lógicos e medicinais que propiciaram à mãe e ao bebê receber tratamentos res- ponsáveis por diminuir os riscos e mor- tes materno-fetais. Sendo assim, se antes gravidez e parto significavam também possibilidade de risco e morte, um novo cenário obstétrico e neonatal trouxe um oposto positivo de vida, mas não menos complexo e por vezes ainda doloroso. Ao engravidar, a mulher se vê diante de mudanças físicas e biológicas comuns às mamíferas, contudo, ao mesmo tem- Houve mudanças em relação ao entendi- mento do processo da “maternidade”, pois hoje existe uma compreensão sociológica de que “amor materno” é construído www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 59 como explicitado nos estudos de Àries (1981), também contribui de modo com- plexo na dinâmica de esmaecimento da mulher e, nesse caso, dentre as persona- gens da cena da vida materna, o bebê é quem ganha maior destaque e importân- cia social. Sendo assim, uma vez grávida, a mulher perde seu status individual – ela não só deixa de falar em nome próprio como tampouco é ouvida como um in- divíduo para além da sua condição gra- vídica. Em geral, quando a sociedade se preocupa com essa mulher é para obter acesso e informações acerca do bebê em detrimento do indivíduo que o carrega. Tomando isso como premissa, a ideia não é desqualificar os cuidados ne- onatais, mas agregar a compreensão de que, sendo essencial a presença da mãe tanto para os cuidados físicos como para o acolhimento e estabelecimento da saú- de emocional do bebê, uma vez que ela “desapareça”, a quem ou a que recorre esse bebê?IMAG EN S: 1 23 RF Antes das transformações sociais, a gravidez e o parto significavam também possibilidade de risco e morte, mas um novo cenário obstétrico e neonatal trouxe um oposto positivo de vida, mas não menos complexo e por vezes ainda doloroso partir da idealização estética feminina, não desaparece somente o “belo corpo feminino”, com a tal concepção se esvai também a autoestima da mulher. É no parto em que, atualmente, mais pode ser visto o “desaparecimento” da mulher. Com os avanços da Medicina obstétrica, as mulheres têm sido subme- tidas a procedimentos que antes eram delegados ao corpo que naturalmente cumpria sua função durante o trabalho de parto, como, por exemplo, as “cesáreas eletivas”. A cirurgia cesárea – que, segun- do a História, foi praticada pela primeira vez no ano de 1500 por um homem sim- ples que, em um ato de coragem, salvou mãe e bebê durante um trabalho de parto complicado, cortando a barriga da mãe com uma lâmina de barbeiro – teve sua prática ampliada e exclusiva ao uso médi- co obstétrico somente no século XVIII. Entretanto, só se tornou rotineira no sé- culo XX. Anteriormente, o procedimen- to apresentava altíssimas taxas de morta- lidade materno-fetal e só era considerado quando realmente todas as alternativas para um parto normal vaginal não tives- sem obtido sucesso. A cirurgia cesárea salva vidas de mu- lheres e bebês e quando bem sugerida �Manobra de Kristeller O procedimento obstétrico chamado ma- nobra de Kristeller consiste na aplicação de pressão na parte superior do útero, com o intuito de facilitar a saída do bebê. O pro- fissional junta as mãos no fundo do útero, sobre a parede abdominal, com os polegares voltados para frente, tracionando o fundo do útero em direção à pelve, no momento em que ocorre uma contração uterina durante o parto natural ou cesárea. A técnica traz riscos para mãe e filho e é desaconselhada pela Or- ganização Mundial da Saúde. Ao engravidar, a mulher se vê diante de mudanças físicas e biológicas, mas passa a ocupar um papel investido de valores e concepções que a engessam em um “modelo” E como as mães desaparecem? Há um preditivo? Ela recebe algum tipo de ameaça de um “rapto” social e identitá- rio? Ela sequer deixa um bilhete de so- corro ou de volto logo? Não! Toda a cena materna tem se investi- do de um primado de beleza. Ao longo da gravidez, a mulher “tem que” ganhar cada vez menos peso e curvas e, quando inevitavelmente a barriga ganha con- torno e total expansividade, “coitada” da mulher que ganhar as linhas das temíveis estrias. Se, ainda assim, com sobrepeso, ela não “desaparecer”, que ao menos esconda as estrias. O mesmo vale para a recuperação do peso e forma física no pós-parto. “Fique linda para seu parceiro e seu bebê, afinal quem vai querer uma esposa ou uma mãe toda largada?” Muitas mulheres ouviram isso, internalizaram e acreditam ser de- las mesmas essa cobrança estética – e, claro que é delas, mas para atingir um padrão e expectativa que a precede! A 60 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br GRAVIDEZ A gravidez deixou de pertencer só ao campo do orgânico e a maternidade passou a ser compreendida por diferentes campos, como a Psicologia, que busca o entendimento dos fenômenos psíquicos correlacionados ao ciclo gravídico-puerperal evita danos e traumas maiores para to- dos. Contudo, o cenário atual apresenta uma realidade no mínimo alarmante. Em julho de 2016, a ANS (Agência Na- cional de Saúde Suplementar) publicou dados do Mapa Assistencial e constatou que o Brasil apresenta taxas de cesaria- nas três vezes superior à média de países como EUA, Espanha, Alemanha, Fran- ça, entre outros que compõem a OCDE (Organização paraa Cooperação e De- senvolvimento Econômico). Segundo esses dados, a cada 100 nascimentos no Brasil 84,6 foram de partos cesáreos. Em contrapartida, a taxa média dentre os 34 países que compõem a OCDE foi de 27,6. Realidade alarmante Com toda certeza, as mulheres no Brasil não são anatomicamen- te diferentes das outras mulheres do mundo. Então, o que realmente acon- tece, para que as cesáreas no Brasil sejam a primeira alternativa de parto para médicos e mulheres? Uma das hipóteses, inclusive que baseou novas medidas por parte da ANS, era de que o parto normal, por sua imprevisibilidade e longa duração, tornava-se desvantajoso economica- mente para os médicos. Como uma das medidas para diminuir o número de cesáreas previamente agendadas, baseadas nesses motivos, a ANS, des- de 2015, determinou que os médicos recebessem três vezes mais pelo aten- dimento ao parto normal. É curioso que, mesmo nesse texto, ao se falar de parto, logo se faz alusão à cena médica hospitalar, taxas, modelos de parto, esforço e, por último, fala-se da escolha da mulher. Diniz e Duarte (2004) observaram em seus estudos, a partir de evidências científicas a respei- to do modelo médico intervencionis- ta nos partos no Brasil, que as equipes médicas e hospitalares passaram a ter domínio sobre o corpo da mulher, que, por sua vez, deixou de ser protagonista ativa no momento do parto e passou a ser “paciente” dependente das escolhas e condutas médicas. “Nesse modelo tradicional conside- ra-se o corpo feminino sempre depen- dente da tecnologia, frágil e potencial- mente perigoso para o bebê. Isso é o que muitos pesquisadores chamam de viés de gênero, um olhar preconcebido sobre a mulher, em que seu corpo é por defini- ção imperfeito e ameaçador, e não poten- cialmente adequado e saudável” (Diniz; Duarte, 2004, p. 19). Muitas mulheres sequer arriscam entrar em trabalho de parto. Temem a dor e possivelmente uma nova frustração ou constatação de uma “fraqueza”, pois infelizmente é essa a cultura que come- ça a permear o cenário do parto. Muitas mulheres que conseguiram ter seus par- tos normal, natural e humanizado, por vezes, passam a desqualificar as que não tiveram e as provocações do lado oposto também acontecem. Lamentavelmente, dos dois lados, quem acaba perdendo é a mulher que, informada ou não, empo- derada ou não, fez ou foi induzida a uma escolha. E não esqueçamos as mulheres que nem escolhas tiveram ou, pior, que sofreram diversas violências obstétricas. Humanização Contrapondo tais cenários é que uma rede de profissionais se uniu em 1993 em prol da humanização do parto e nascimento. A ReHuNa concentra pro- fissionais de diferentes partes do Brasil e busca disseminar conhecimento ba- seado em evidências científicas e, dessa forma, promover impacto e mudanças no modelo obstétrico tradicional, imple- mentando o que hoje já nomeia-se como “parto humanizado”. Esse movimento de “humanização” busca promover os cuidados à mulher e ao bebê, respeitando o protagonismo feminino em seus aspec- tos emocionais, sociais, naturais e fisioló- gicos, diminuindo, assim, a quantidade de intervenções médicas, já comprova- das cientificamente desnecessárias e por vezes danosas e letais para mãe e bebê, como é o caso da manobra de Kristeller, Inúmeras mulheres, quando ficam grávidas, perdem o “rumo profissional”, pois frequentemente a licença maternidade não é bem-vista no mundo corporativo www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 61 hoje totalmente desaconselhada no par- to, mas ainda muito utilizada no Brasil (Diniz; Duarte, 2004). Com o parto humanizado, a mulher tem a possibilidade de retomar seu lugar de protagonismo ativo tanto na sua gravi- dez como parto e, consequentemente, no exercício da maternidade. As informa- ções e acompanhamento que a mulher deve receber no modelo humanizado priorizam as evidências científicas em detrimento da opinião médica, que, por vezes, poderia ser enviesada (ReHuNa, 2016; Diniz; Duarte, 2004). Em conjun- to, equipe e a mulher podem discutir o “plano de parto” dela e, juntas, optarem pelas melhores alternativas. Desse modo, o médico, com toda sua expertise, fica a serviço da mulher e não o contrário. Contudo, não é somente pelo parto que a mulher vai travar batalhas para impedir seu “desaparecimento”, pois são diversas as situações que facilitam que o mesmo aconteça ao longo da gra- videz, puerpério e maternidade. Um dos raptos mais recorrentes é o da dignida- de e independência financeira. Muitas mulheres, ao se verem grávidas, perdem o “rumo profissional”, pois comumente a licença maternidade não é bem-vista no mundo corporativo. Se empreender ou administrar a própria empresa, a mulher irá se desdobrar mais uma vez para dar conta da maternidade, renda e finanças de seu negócio. Por isso, mui- tas mulheres não conseguem conceber trabalho e maternidade em um mesmo plano de vida e carreira. Desigualdade Não se pode esquecer, inclusive, que o mercado de trabalho já é desfa- vorável para as brasileiras. Como é possí- vel constatar em pesquisas mais recentes do IBGE (outubro, 2015), as mulheres foram as mais afetadas pelo aumento do desemprego no Brasil. De acordo com a Pesquisa Nacional de Domicí- lios (Pnad/IBGE 2015), 4,6 milhões de brasileiras estão desempregadas, o que representa 52% do total de desocupados no país e, dentre os que estão emprega- dos, a mulher recebe um salário médio inferior ao salário médio de homens ocupando a mesma função e cargo (Mu- lheres - R$ 1.567 e Homens - R$ 2.058). Ao perder a colocação no mercado de trabalho, ou mesmo ao receber um salário inferior, a mulher deixa de ter po- tência financeira e, para algumas famí- lias, isso significa a perda de uma renda fundamental. A estabilidade financeira ameaçada pode deflagrar situações de es- tresse não só para mulher, mas para todo conjunto familiar. Então, em algum momento a mu- lher se depara com uma temida decisão: retornar ao mercado formal ou informal de trabalho. Contudo, essa escolha pres- supõe perdas, pois, se optar por estar mais próxima do filho, perde a possibili- dade de renda e, optando por ter renda e trabalhar, terá que delegar os cuidados do filho a terceiros. Feita uma das esco- lhas, a mulher poderia seguir cuidando a seu modo da sua própria vida e filho. Mas não. Mediante as cobranças sociais, a mãe não pode sentir que fez a escolha certa em nenhuma das hipóteses. Se per- manecer em casa, não tem ambição sufi- ciente para um crescimento profissional e financeiro; o que fica nas entrelinhas é que “nasceu para ser dona de casa”, en- tendendo tal atividade de modo depre- ciativo. Caso ela reassuma o cargo, “fez o PARA SABER MAIS S egundo Plon e Roudinesco (1998), o complexo de Édipo é uma noção central na Psicanálise. Seu inventor, Sigmund Freud, teorizou o dito complexo a partir de um personagem da tragédia grega de Sófocles, a saber, o jovem Édipo. O complexo de Édipo seria para Freud (1909) a representação inconsciente do “desejo sexual” da criança pelo genitor do sexo oposto e sua rivalidade e hostilidade com o genitor do mesmo sexo. Para Freud, esse complexo ocorreria entre os três e cinco anos de idade da criança e sua resolução se daria após a puberdade, na concretização de uma nova escolha de objeto amoroso. “O complexo de Édipo desempenha papel fundamental na estruturação da personalidade e na orientação do desejo humano. Para os psicanalistas, ele é o principal eixo de referência da psicopatologia” (Laplanche; Pontalis, p. 77). COMPLEXO DE ÉDIPO TEVE INSPIRAÇÃO EM TRAGÉDIA GREGA Um dos dilemas da mulher é que se ela permanecer em casa, cuidando do filho, pode dar a impressão de que não temambição suficiente para um crescimento profissional IM AG EN S: 1 23 RF 62 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br GRAVIDEZ Grávida, a mulher perde seu status individual – ela não só deixa de falar em nome próprio. Em geral, quando a sociedade se preocupa com essa mulher é para obter acesso e informações acerca do bebê em detrimento do indivíduo que o carrega NAS BANCAS! filho para os outros ou o governo criar”. A essa altura, o “desaparecimento” já passa a ser considerado boa alternativa. O cenário apresentado, acrescido de um cinismo ao final, resulta da jun- ção inclusive de diferentes momentos e construções históricas. O apego e a im- portância da função materna na estru- turação psíquica do sujeito passaram a ser mais amplamente estudados no final do século XIX com Freud teorizando o Complexo de Édipo. Estrutura psíquica As teorias freudianas, embora desen-volvidas em conformidade com as características fundamentais da família burguesa, ainda ressoam suas constata- ções para a compreensão da maternida- de contemporânea que, em muitos mo- mentos, refletem os aspectos tipicamente burgueses. Sendo assim, é preciso com- parar e contrastar também os valores atuais com os da sociedade vitoriana na qual Freud teorizou. Se antes a mulher apenas cuidava dos filhos, hoje ela está no mercado de trabalho e acumula funções. Se por um lado ela é cobrada para competir de igual para igual com os homens, profissionalmente falan- do, por outro, ela segue ganhando menos e ainda tendo funções extras – ditas como próprias “da mulher” (tarefas domésticas, cuidado com os fi- lhos etc.). As mulheres da época de Freud eram responsáveis principais pela edu- cação e criação dos filhos. No entanto, se atualmente, como já mencionado, as funções e papéis da mulher na sociedade mudaram, nem por isso a teoria freudia- na deixou de ter sua importância para a compreensão da psique humana. Alguns autores pós-freudianos, como Lacan, também vão teorizar sobre a mulher e a maternidade e sua impor- tância na constituição psíquica do su- jeito. Lacan (1969), em seu texto “Nota sobre a criança”, vai ressaltar a importân- cia da função materna, relacionando tal função aos cuidados marcados por um interesse particularizado da mãe pelo bebê, dando a ele um lugar específico em seu desejo e interesse. Para além de todos os cuidados físicos essenciais para a sobrevivência do bebê, como alimen- tação, higiene etc., a mãe terá que prover outras necessidades de ordem psíquica, para que o bebê possa advir como sujeito. Tais necessidades devem ser ao mesmo tempo articuladas ao campo simbólico, o campo da linguagem. Para Lacan (1960), é por meio da linguagem Ao decodificar o choro do bebê, a mãe ocupa o lugar de interlocutor desse bebê, e é nesse sentido que Lacan refere-se à mãe como o Outro primordial IM AG EN S: 1 23 RF /D IV UL GA Çà O www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 63 www.escala.com.br REFERÊNCIAS ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, 2016. In: http://www.ans.gov.br/aans/noticias-ans/ numeros-do-setor/3402-ans-publica-dados-sobre-assistencia-prestada-pelos-planos-de-saude-2 ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família. Rio de Janeiro: LTC Editora, 1981. BADINTER, Elisabeth. Um Amor Conquistado: o Mito do Amor Materno. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1985. DINIZ, Simone Grilo; DUARTE, Ana Cristina. Parto Normal ou Cesárea? O que Toda Mulher Deve Saber (e Todo Homem Também). São Paulo: Editora Unesp, 2004. FARIA, Michele Roman. 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In: http://www.rehuna.org.br/ ROUDINESCO, Elisabeth; PLON, Michel. Dicionário de Psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. que o grito da criança pode adquirir um significado, isso através da significação dada pela mãe para esse grito. Ao deco- dificar o choro do bebê, por exemplo, a mãe vai ocupar o lugar de interlocutor ou intérprete desse bebê, e é nesse sen- tido que Lacan refere-se à mãe como o Outro primordial. Esse “‘banho de lin- guagem” (Faria, 2010) impõe à criança uma condição de assujeitamento, ou seja, para ter suas necessidades atendi- das, a criança totalmente dependente precisa que seus gritos, balbucios e cho- ros sejam interpretados por esse Outro materno. A função materna não termina aqui, mas já é possível perceber, a partir dessa pequena explanação, a tamanha importância e implicação psíquica de uma mãe diante do desenvolvimento físico e emocional de seu bebê. Os recortes históricos, sociais e psicológicos feitos para este artigo bus- caram dar visibilidade à importância e complexidade que recaem sobre a mu- lher que figura a maternidade contem- porânea. O termo “figurar” foi proposi- talmente escolhido, pois, de fato, pouco se sabe dessa mulher, já que, uma vez “mãe”, ela só agregou para si mais fun- ções, estereótipos, demandas e expec- tativas internas e externas a que vemos sucumbir seus desejos, necessidades e essência, que não deixaram de existir, mas podem estar timidamente ou sufo- cadamente pedindo por socorro. Resga- temos essas mulheres! �ReHuNa A Rede pela Humanização do Parto e Nas- cimento (ReHuNa) é uma organização da sociedade civil que atua em todo o Brasil. O objetivo é a divulgação de cuidados peri- natais, com base em evidências científicas. A rede tem um papel relevante na estruturação de um movimento denominado humanização do parto/nascimento. Pretende diminuir as intervenções desnecessárias e promover um cuidado em relação ao processo de gravidez/ parto/nascimento/amamentação, com base na compreensão do processo fisiológico. 64 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br IM AG EN S: 1 23 RF / D IV UL GA Çà O E AR QU IV O PE SS OA L divã literário por Carlos São Paulo A segurança da LOUCURA LER O CONTO O HORLA E TORNAR-SE A TERCEIRA PESSOA QUE PODE DISTINGUIR O EXERCÍCIO DA PRÓPRIA RAZÃO, COMO AFIRMA FOUCAULT, É A FORMA DE PERCEBER QUE O LOUCO NÃO PODE SER LOUCO PARA SI MESMO G uy de Maupassant, contista francês, no curso de sua do- EN¥A�MENTAL�PROVOCADA�PELA�SÓlLIS��ESCREVEU�UMA�SEGUNDA� versão do seu conto “O Horla”, acentuando a verossimi- lhança e, como em um diário, contando o seu estado de enlouquecimento. O escritor nasceu em 1850 e, ao terminar esse conto, tentou suicídio, foi internado num hospício e veio a falecer aos 43 anos, um ano depois do seu internamento. h/�(ORLAv�� LINGUISTICAMENTE�� SIGNIlCA�PRESENTE��MAS�NÎO� AQUI�� ONDE�TEM�O�SEGUINTE�SIGNIlCADO��O�QUE�NÎO�ESTÉ�EM�MIM�NÎO�SOU� EU��.ARRADO�NA�PRIMEIRA�PESSOA��O�CONTO�TRAZ�COMO�PERSONAGEM�UM� cidadão que convive com a presença de uma entidade invisível. Ele inicia suahistória escrevendo a data como em um diário, admiran- DO�O�DIA�E�MOSTRANDO�O�QUANTO�GOSTA�DA�CASA�ONDE�CRESCEU��6AI�AOS� POUCOS�MOSTRANDO�UM�ESTADO�PROGRESSIVO�DE�DILUI¥ÎO�DA�FRONTEIRA� www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 65 entre o que ele é e as formas pelas quais ele se representa. /�NARRADOR�CONVIVE�ANGUSTIADO�COM� os limites dos sentidos humanos. Diz no SEU�RELATO��h.ÎO�PODEMOS�ENXERGAR�NEM� os habitantes de uma estrela e nem os HABITANTES�DE�UMA�GOTA�D�ÉGUA��%�NOS- SOS�OUVIDOS�QUE�NOS�ENGANAM��POIS�NOS� transmitem as vibrações do ar em notas SONORASv�� %M� SEGUIDA�� VIAJA� PARA� OUTRA� cidade e lá presencia a prima submeten- DO SE�Ì�SUGESTÎO�HIPNØTICA�� !� SUGESTÎO� HIPNØTICA�� APLICADA� A� essa prima rica, a faz precisar tomar- -lhe um empréstimo e, com isso, ne- NHUM� ARGUMENTO� LØGICO� FAZ� SENTIDO� para ela. Convencida dessa necessidade, ela suplica-lhe, sem saber que atende a um comando hipnótico do qual não tem consciência, enquanto ele, que assistiu ao transe hipnótico, sabia que não havia NENHUMA� LØGICA�PARA�ESSE�PEDIDO��%SSA� EXPERIÐNCIA�FAZ�O�NARRADOR�ASSOCIAR�TUDO� que viu à criatura Horla. No século XIX, época em que viveu Maupassant, a Medicina passou a admi- TIR� A� AMEA¥A� INVISÓVEL� DOS�MICRORGANIS- mos causadores de doenças. Medicina e 0SICOLOGIA�JUNTAS�COME¥AVAM�A�CONSIDE- rar o invisível. Sabemos que há muitas coisas em nós E�NO�MUNDO�EM�NOSSA�VOLTA�QUE�INEXISTEM� PARA�NØS�MESMOS��!�0SICOLOGIA�CHAMA�DE� COMPLEXos essas subpersonalidades que, assim como na demonstração hipnótica, nos fazem viver sem compreender muitas das decisões que tomamos. Mas à luz da ANÉLISE�� ALGUÏM� PODE� COMPREENDER� POR� que sua vida afetiva é sofrida e não repe- tir o erro em casamentos sucessivos. Ou pode resistir a mudar uma vida sofrida por entender que, como um torturado habitu- ADO�A�DETERMINADO�TORTURADOR��lCARÉ�COM� Bola de Sebo (conto “O Horla”) Autor: Guy de Maupassant Editora: Artes e Ofícios Número de páginas: 96 Ano de edição: 2011 medo se lhe aparecer um torturador novo, POIS�O�ANTIGO�LHE�DÉ�MAIS�SEGURAN¥A� Para nos darmos conta do nosso próprio eu, precisamos ter um funciona- MENTO� SAUDÉVEL� DE� NOSSO� EGO��!� SÓlLIS�� COM�OS�SEUS�AGENTES�MICROSCØPICOS�� FOI� capaz de produzir uma disfunção no EGO�DE�-AUPASSANT�A�PONTO�DE�DEIXÉ LO� em condições de maltratar a si mesmo e buscar saída na tentativa de suicídio. %M� SUA� DESCRI¥ÎO�� DIZ� O� PERSONAGEM�� h6IVER�COM�A�LOUCURA�Ï�COMO�SENTIR�QUE� o monstro invisível, como um vampiro, SØ�SE�SACIA�DEPOIS�QUE�SUGA�A�VIDA�QUE�HÉ� EM�MIM�E�ME�DEIXA�SEM�ENERGIA�E�ENFRA- quecido”, ou similarmente diz na voz do COCHEIRO��h!S�NOITES�ME�COMEM�OS�DIASv� 4OMANDO� A� MITOLOGIA� PARA� MELHOR� ENTENDERMOS�A�LOUCURA��DESTACO�QUE�EXIS- tia para os romanos o deus Baco (Dio- NÓSIO�PARA�OS�GREGOS ��QUE�REPRESENTAVA�A� intensidade emocional capaz de dissolver os limites do eu. Ele era descrito como um eterno adolescente, devorado pelas emoções e que, por essa razão, vivia em BUSCA�DE�SEXO�OU�DROGAS��3ABEMOS�QUE�AO� cérebro adolescente, ainda incompleto, Carlos São Paulo é médico e psicoterapeuta junguiano. É diretor e fundador do Instituto Junguiano da Bahia. carlos@ijba.com.br / www.ijba.com.br FALTA�O�DESENVOLVIMENTO�PLENO�DO�CØRTEX� pré-frontal para lhe permitir encontrar OBJETIVIDADE� EM� MEIO� ÌS� SUAS� PAIXÜES�� Assim, os seus pais precisam fazer o pa- PEL� DESSE� CØRTEX� PRÏ FRONTAL�� %RASMO� DE� Rotterdam, em Elogio da Loucura��NOS�DIZ�� h3Ø�A�LOUCURA�TEM�A�VIRTUDE�DE�PROLONGAR� A�JUVENTUDE��EMBORA�FUGACÓSSIMA��E�DE�RE- tardar bastante a malfadada velhice […]. Baco tem sempre, como um rapazinho, o ROSTO�RUBICUNDO�E�A�LONGA�CABELEIRA�LOU- ra? É porque passa a vida fora de si, em- BRIAGADO� NOS� BANQUETES�� NOS� BAILES�� NAS� FESTAS��NOS�FOLGUEDOS��RECUSANDO�QUALQUER� relação com Minerva”. Outro mito que descreve a loucura é o mito de Cassandra. Apolo, cativo à JOVEM�#ASSANDRA��LHE�DEU�O�DOM�DE�AN- TEVER�TRAGÏDIAS�E�FAZER�PREVISÜES��.O�EN- TANTO��A�BELA�JOVEM�SE�NEGOU�A�DEITAR SE� com o deus. Como punição, Apolo fez com que as pessoas não acreditassem na previsão de Cassandra e esta passou a ser vista como louca. Ai de quem for PREPARADO� PARA� ENXERGAR� MAIS� LONGE� quando as demais pessoas ainda não CONSEGUEM�ACOMPANHÉ LO��POIS�TAMBÏM� será um louco. Somos loucos quando in- tuímos uma escolha e insistimos nela enquanto os outros em nossa volta nos FOR¥AM�A�SEGUIR�OUTRO�CAMINHO�� 4ODOS� OS� DIAS�� NESSE� MUNDO� GLOBA- lizado, nos deparamos com notícias e PROGNØSTICOS� E� NÎO� SABEMOS� O� QUANTO� Cassandra nos amedronta com sua lou- CURA��.INGUÏM�OUVIU�#ASSANDRA�QUANDO� ela previu uma crise econômica, moral, ética e institucional nessas dimensões NO�"RASIL�� !GORA� QUE� JÉ� ACONTECEU�� PRE- CISAMOS�CONTEMPLAR�SEM�PAIXÎO�O�NOSSO� modo de ver os candidatos liderarem a nação e evitar sentirmo-nos impoten- TES�DIANTE�DE�UM�"RASIL�AINDA�NO�ESTÉGIO� h"ACOv��O�QUAL�NÎO�SE�DÉ�CONTA�DE�QUE�JÉ� é hora de sair da adolescência e enfrentar Minerva, a deusa da sabedoria. NO SÉCULO XIX, ÉPOCA EM QUE 6)6%5�-!50!33!.4�� A MEDICINA PASSOU A ADMITIR A AMEAÇA ).6)3°6%,�$/3� MICRORGANISMOS CAUSADORES DE DOENÇAS. MEDICINA E PSICOLOGIA *5.4!3�#/-%!6!-� A CONSIDERAR /�).6)3°6%, www.portalcienciaevida.com.brwwwwwwwwwwwwwwwwwwwwwwww poopopop.po.portatartartartartartartartal ilcilcilcilcilclcilcilciencncencenencencencnnenciaeiiaeiiaeaeiaeeaaia idvidvidvidvidvidvidvidda ca ca ca caa cca.ca.comomomommomom.om.omo bbrbrbrbbrbrbrbrbr O SERIADO�NACIONAL�DE�PRODU¥ÎO�DA�.ETmIX�E�"OUTIQUE� Filmes estreou recentemente e vem a calhar de for- ma assustadora com o momento social. O “piloto” lLMADO�EM������INSPIROU SE�NA�PRØPRIA�VIVÐNCIA�DE� seus criadores como jovens em um mundo altamente compe- TITIVO�E�EXCLUDENTE�E�QUE��INCLUSIVE��EM�UM�PRIMEIRO�MOMENTO� disse não para a produção. #HEGA�AO�ESPECTADOR�EM�UMA�ÏPOCA�NACIONAL�EM�QUE�A�JUVEN- TUDE�LUTA�MAIS�DO�QUE�OS�BRAVOS����DO�ROTEIRO�E�CONTRA�PERIGOS�TÎO� REAIS�E�hCONTROLADOSv�QUANTO��-OMENTO�NO�QUAL�O�MUNDO�DISCUTE�� ABISMADO��DADOS�QUE�APONTAM�PARA�UM�PERCENTUAL�MUITO�PEQUENO� DE�INDIVÓDUOS�QUE�DETÐM�A�GRANDE�MAIORIA�DOS�RECURSOS�MONETÉRIOS� DO�PLANETA�E�QUE��PORTANTO��TÐM�UM�MODO�DE�VIDA�MUITO�PRIVILEGIA- DO�COM�ACESSO�A�BENS�E�CUIDADOS��MAS�A�MAIORIA�DA�POPULA¥ÎO�NÎO� TEM�ESSE�DIREITO�ASSEGURADO��.ADA�MUITO�LONGE�DO�QUE�VEREMOS�NES- SA�INTERESSANTE�PRODU¥ÎO��A�PRIMEIRA�BRASILEIRA�DA�.ETmIX��QUE�PARECE� TER�CONTADO�COM�UM�OR¥AMENTO�PRØXIMO�AOS�2�����MILHÜES��O�QUE� Ï�COMPATÓVEL�COM�AS�PRODU¥ÜES�NACIONAIS��MAS�BEM�MENOS�POLPUDO� PERTO�DE�OUTRAS�PRODU¥ÜES�BANCADAS�PELA�.ETmIX�� -¡2)4/3�).%'£6%)3 %MBORA�NÎO�TRAGA�UMA�GRANDE�NOVIDADE��UM�MISTO�DE�FRANQUIAS� como Jogos Vorazes e Divergente�� ENTRE� OUTRAS�MENOS� CONHECIDAS�� APRESENTA�MÏRITOS�INEGÉVEIS��!LGUMAS�CRÓTICAS�POSSÓVEIS�NO�SENTIDO� APENAS�DE�ALCAN¥AR�MAIS�QUALIDADE��PRINCIPALMENTE�DE�DIRE¥ÎO��ELEN- CO�E�DUBLAGEM��/� ROTEIRO�ORIGINAL� FOI� CRIADO�EM������POR�0EDRO� !GUILERA� COM�A�PARCERIA�DE�$AINA�'IANNECCHINI��$ANI�,IBARDI� E� *OTAGÉ�#REMA��E�QUE�PARA�A�SÏRIE�CONTA��ALÏM�DE�!GUILERA��COM�OS� ROTEIROS�DE�#ÉSSIO�+OSHIKUMO����������E�� �E�*OTAGÉ�#REMA��TODOS �� %SSA�PRIMEIRA�TEMPORADA�FOI�DIRIGIDA�PELO�URUGUAIO�#ESAR�#HARLONE�� /�3%2)!$/�.!#)/.!,�3%�¡� $%3#2)4/�0%,/�)$%!,):!$/2�%� 0%,!�-°$)!�%30%#)!,):!$!�#/-/� 5-!�$)34/0)!��-!3�./3�&!:�0%.3!2� 3%�%34!-/3�4§/�,/.'%�!33)-�$!� 2%!,)$!$%�15%�!02%3%.4! cinema Por Dr. Eduardo J. S. Honorato e Denise Deschamps A era da “pós-verdade” WWW�PORTALCIENCIAEVIDA�COM�BR PSIQUE�CIÐNCIA�VIDA��������� INDICADO� AO� /SCAR� DE� MELHOR� FOTOGRAlA� emCidade de Deus��/�PRODUTOR�EXECUTIVO�Ï� 4IAGO�-ELO��QUE�ACREDITOU�NO�PROJETO� /UTRO� FATOR�QUE�CATIVA�NA� SÏRIE�Ï� TER� sua trilha sonora composta por uma va- RIEDADE�DA�NOSSA�MÞSICA��CADA�UMA�DELAS� MUITO�BEM�ESCOLHIDA�PARA�AS�SEQUÐNCIAS�� em alguns momentos comovem tanto QUANTO��OU�ATÏ�MAIS��QUE�A�CENA��COMO�OU- VIR� EM�DETERMINADO� TRECHO�%LZA� 3OARES� cantando A Mulher do Fim do Mundo��ESSA� MULHER�QUE�POR�TANTOS�ANOS�TEM�MARCADO� a cena nacional por sua ousadia e fortes POSICIONAMENTOS� COMO�� POR� EXEMPLO�� QUANDO� CANTA� PARA� O� PÞBLICO� A Carne (Negra)�� .AS� SEQUÐNCIAS� PODEMOS� TAM- BÏM�OUVIR�A�BELA�INTERPRETA¥ÎO�DE�-ONI- CA�3ALMASO�E�!NDRÏ�-EHMARI�DA�MÞSICA� Último Desejo� DO� MESTRE� .OEL�� ALÏM� DO� BELO�CANTO�DE�ABERTURA�DE�-ARCELO�0RET- TO��3ÎO�MOMENTOS�MARCANTES� 3ERÉ� QUE� ACREDITAR� EM� UMA� SUPOSTA� MERITOCRACIA� Ï� ALGO� RAZOÉVEL�� -AIS� DO� QUE�NUNCA�A�ATUALIDADE�PEDE�QUE�SE�PEN- SE�NISSO��SOB�O�RISCO�DE�ENTERRARMOS�QUAL- QUER�POSSIBILIDADE�DE�UM�PAÓS�OU�MESMO� DE�UM�MUNDO�MAIS�JUSTO��!�PAISAGEM�DE� FAVELA� ONDE� VIVEM�OS� ����DA� POPULA¥ÎO� contrasta com o mundo futurístico dos SELECIONADOS� PARA� PARTIREM� PARA� O� -A- Eduardo J. S. Honorato é psicólogo e psicanalista, doutor em Saúde da Criança e da Mulher. Denise Deschamps é psicóloga e psicanalista. Autores do livro �����G���G��Gd� ���� �� ���������: Participam de palestras, cursos e workshops em empresas e universidades sobre este tema. Coordenam o site www.cinematerapia.psc.br RALTO� ONDE� HABITAM�� DISTANTES� DA� PLEBE�� OS�SUPOSTAMENTE�MAIS�CAPAZES�QUE�COM- PÜEM�OS�����%SSE�ESQUEMA�SUPOSTAMENTE� perfeito como modelo de sociedade foi FUNDADO�POR�UM�CASAL�QUE�Ï�CULTUADO�POR� TODOS�QUASE�COMO�DIVINDADES��PORÏM�HÉ�O� GRUPO�QUE�TENTA�ROMPER�COM�ESSE�MODE- LO�APARENTEMENTE�AVAN¥ADO��MAS�QUE�NÎO� PASSA�DE�UMA�NOVA�FORMA�DE�SE�ORGANIZAR� EM�CASTAS��/S�QUE�PARTICIPAM�DESSE�MO- VIMENTO�DE�RESISTÐNCIA�SE�NOMEIAM�COMO� h!�#AUSAv��%�NA�EDI¥ÎO�DE�SELE¥ÎO�QUE�O� ROTEIRO� ABORDA�� O�MOVIMENTO� TENTA� INlL- TRAR�UM�DE�SEUS�MEMBROS��A�BRAVA�-ICHELE� �"IANCA�#OMPARATO ��PARA�FAZER�COM�QUE� IM AG EN S: D IV UL GA Çà O seja aprovada e assim começar a operar o movimento contra esse modelo social de DENTRO�DAQUILO�QUE�SE�QUER�DERRUBAR�� .).(/�$%�6%30!3� h6OCÐ�Ï�O�CRIADOR�DO�SEU�PRØPRIO�MÏ- RITOv�� REPETE� EM� TOM� CONDESCENDENTE� O� COORDENADOR�DO�0ROCESSO��%ZEQUIEL��*OÎO� -IGUEL ��QUE�CONHECEREMOS�O�DRAMA�ÓNTI- MO�QUE�VIVE�AO�LONGO�DA�PRIMEIRA�TEMPO- RADA��SEU�PRØPRIO�CONmITO�ALIMENTARÉ�A�INS- TABILIDADE�DAQUILO�QUE�UM�MODELO�QUE�SE� pretende perfeito defende como a melhor VIA��/�GRUPO�QUE�CONDUZ�A�PARTE�PRINCIPAL� DA� TRAMA��ALÏM�DE�-ICHELE�E�%ZEQUIEL��Ï� /�$%"!4%�¡�3/"2%�/�0%2#%.45!,�0%15%./� $%�).$)6°$5/3�15%�$%4º-�!�-!)/2)!�$/3� 2%#523/3�-/.%4£2)/3�$/�0,!.%4!�%�15%� 0/335)�5-�-/$/�$%�6)$!�-5)4/�02)6),%')!$/� #/-�!#%33/�!�"%.3�%�#5)$!$/3��-!3�!� 0/05,!§/�.§/�4%-�%33%�$)2%)4/�!33%'52!$/ A série apresenta um mundo pós-apocalíptico e devastado em que faltam água, comida, energia e outros recursos. Aos 20 anos, todo cidadão pode participar do Processo, uma seleção para passar para o Maralto, onde há oportunidades de uma vida digna ���������PSIQUE�CIÐNCIA�VIDA www.portalcienciaevida.com.br����������� ��� PSPSPPSPSPSP IQUIQUIQUIQUIQUQ E�CE�CCCCIÐNIÐNIÐNIÐIÐNIÐNCIACIACIAIAACCC ��V�VI�VI�V�VI�VI��VI�VIDDDDDDADDADADA wwwwwwwwwwwwwwwwwwwww popopopopopo.po.po trtartarrrtartartartalcil ilcilcilciilcilcilciencencencencncencencenciaeiaeiaeiiaeiaeiaeiaeiaeeia idvidvidvididvidvidvidda ca ca ca cca ccaa.ca.comomomommommmom.omom brbrbrbrbrbrrbrbr 3%2£�15%�!#2%$)4!2� %-�5-!�350/34!� -%2)4/#2!#)!�¡� !,'/�2!:/£6%,�� -!)3�$/�15%�.5.#!� !�!45!,)$!$%� 0%$%�15%�3%�0%.3%� .)33/��3/"�/�2)3#/� $%�%.4%22!2-/3� 15!,15%2� 0/33)"),)$!$%�$%�5-� 0!°3�/5�-%3-/�$%�5-� -5.$/�-!)3�*534/ A meritocracia é a questão principal da série e explorada com uma crítica interessante. A premissa de 3% é muito atual. Nesse contexto, o sucesso é uma bússola cruel COMPOSTO�POR�&ERNANDO��-ICHEL�'OMES �� 2AFAEL� �2ODOLFO� 6ALENTE �� *OANA� �6ANEZA� /LIVEIRA �� -ARCO� �2AFAEL� ,OZANO �� !LICE� �6IVIANE� 0ORTO �� -ATHEUS� �3ÏRGIO� -AM- BERTI �E�.AIR��:EZÏ�-OTA � !� .ETmIX� JÉ� DIVULGOU� NOTAS� SOBRE� O� COMPROMISSO� DE� PRODUZIR� UMA� SEGUNDA� TEMPORADA�� NOTÓCIA� QUE� AGRADOU� A� QUEM� apreciou a primeira e provocou surpresa EM�QUEM�NÎO�CONSEGUIU�VER�MUITOS�MÏRI- TOS�NELA��/�FATO�Ï�QUE�PARA�UMA�SÏRIE�INI- CIANTE�A�CRÓTICA�n�E�TEXTOS�EM�BLOGS�n�FOI�� EM�MUITOS�CASOS��BASTANTE�DURA��ALGUMAS� VEZES�POLÓTICA�MESMO�� REmETINDO�ASSIM�O� VERDADEIRO�NINHO�DE�VESPAS�QUE�A�QUESTÎO� CENTRAL�DO�ROTEIRO�ABORDA��%M�UM�PAÓS�QUE� SE�RECUSA�A�PASSAR�A�LIMPO�SEUS�ERROS�HISTØ- RICOS�E�QUE�SUSTENTA�A�DESIGUALDADE�SOCIAL� COMO�UMA�QUESTÎO�DE�MÏRITO��A�SÏRIE�PODE� MESMO�SE�CONSTITUIR�EM�UMA�ElCIENTE�BO- fetada e em um palco de acirradas dispu- TAS�IDEOLØGICAS�� !� JUVENTUDE� REBELA SE� MUNDO� AFORA�� PERDIDA�EM�PERSPECTIVAS�NADA�FAVORÉVEIS�� O mundo atravessa um momento de pro- FUNDAS� MUDAN¥AS� QUANTO� AO� MODO� DE� PRODU¥ÎO��FALA SE�JÉ�NO�QUE�SERIA�NOMEA- DO�DE�UMA���2EVOLU¥ÎO�)NDUSTRIAL��&ATO� Ï� QUE� COM� A� AUTOMA¥ÎO� CADA� VEZ�MAIS� RÉPIDA�E� FRENTE�A�UMA�POPULA¥ÎO�QUE�SØ� AUMENTA��E�O�NÞMERO�DE�VAGAS�DE�EMPRE- GO� DIMINUI� CONSIDERAVELMENTE�� LEVANDO� com elas a esperança de uma vida dig- NA� DE� AMOR� E� TRABALHO�� OS� VÓNCULOS� VÎO� se formando com um quantum a mais de competitividade e de uma impulsão inve- JOSA��/�SUCESSO�Ï�UMA�BÞSSOLA�CRUEL��AIN- DA�MAIS�QUANDO�PERDE�DE�VISTA�O�SENTIDO� DE�BEM ESTAR�E�PASSA�SEU�NORTE�PARA�UMA� orientação consumista em um mundo QUE�SE�DElNE�CADA�VEZ�MAIS�PELO�DESCAR- TÉVEL�� PELA� OBSOLESCÐNCIA� PROGRAMADA�� 5M�lLME�MUITO�EMOCIONADO�QUE�TOCA�NO� EMBATE�ENTRE�O�MUNDO�DE�ANTES�E�O�QUE� JÉ�SE�ANTECIPA�Ï�O�As Neves do Kilimanjaro �Les Neiges du Kilimandjaro����� ��DE�2O- BERT�'UÏDIGUIAN��O�QUAL� RECOMENDAMOS� COM�VEEMÐNCIA�� '!4),(/3�$%�$)3#533§/ /�GRUPO�DE�JOVENS�QUE�CONDUZ�A�TRA- ma da série representa de certo modo algumas das principais formas de posi- cionar-se frente a esse mundo altamente EXCLUDENTE��3UAS�VIDAS�DIRECIONADAS�A�UM� OBJETIVO� QUE� CUMPREM� COMO� UM� RITUAL�� ALGUMAS�VEZES�ATÏ�MACABRO��A�RESOLU¥ÎO� do resto de seus dias. Cada um leva para a COMPETI¥ÎO�TRA¥OS�DE�SUA�HISTØRIA�AFETIVA�� DO�ABANDONO�POR�PAIS�QUE�SAÓRAM�PARA�O� 0ROCESSO�INDO�PARA�O�-ARALTO�E�MORRENDO� NELE��AOS�QUE�VIRAM�SEUS�PAIS�RETORNAREM�� agora tomados pela fatalidade da falta DE�ESPERAN¥A�E�DO�CONFORMISMO��OUTROS�� COMO�O�PAI�DE�&ERNANDO�� SUBLIMANDO�O� desamparo em uma espécie de fanatismo QUANTO�AO�0ROCESSO��!S�NUANCES�QUE�VE- mos na série são muito interessantes se OBSERVADAS�Ì�PARTE��PODEM�SER�BONS�GATI- LHOS�DE�DISCUSSÎO�QUE�DARÎO�VOZ�A�MUITAS� DAS�ANGÞSTIAS�QUE�HOJE�ATRAVESSAM�PRINCI- PALMENTE�NOSSOS�JOVENS��MAS�TAMBÏM�ÌS� GERA¥ÜES�PASSADAS��QUE�FORAM�VENDO�SEUS� SONHOS�CAPTURADOS�E�ESTERILIZADOS�� .A�HORA�DO�CLÓMAX�DA�SÏRIE�PODEMOS� VER�AS�TESES�DE�,E�"ON�TÎO�BEM�ESTUDADAS� POR�3IGMUND�&REUD��Psicologia das Massas e Análise do Eu�� ���� �� SOBRE� SUGESTÎO� E� CONTÉGIO�� OPERANDO� DE� FORMA� MARCANTE� QUANDO�UM�GRUPO�PERDE�SUA�CARACTERÓSTICA� de coletivo e se entrega a um movimento DE�MULTIDÎO�BRUTALIZADA��%M�OUTROS�MO- mentos podemos ver operando muito do QUE�UM�DOS�GRANDES�TEØRICOS�SOBRE�GRU- POS��7ILFRED� "ION�� NOMEOU� COMO� PRES- SUPOSTOS� BÉSICOS�� QUE� FUNCIONAM� COMO� MOMENTOS� lXOS� QUE� GRUPOS� COSTUMAM� ATRAVESSAR�� DEPENDÐNCIA�� ACASALAMENTO�� LUTA� E� FUGA��!�APROXIMA¥ÎO�AMOROSA�DE� -ICHELE�E�&ERNANDO�E�A�CATEGØRICA�CREN¥A� QUE�LHES�Ï�LAN¥ADA�COMO�MALDI¥ÎO�DE�QUE� NAMOROS�QUE�SURGEM�DURANTE�O�0ROCESSO� NÎO�PERMANECEM�NA�VIDA�NO�-ARALTO��/� COLETIVO�QUE�SE�DESMANCHA�EM�MULTIDÎO� CEGA�E�EMBURRECIDA�DEVE�SER�UMA�QUESTÎO�www.portalcienciaevida.com.brwwwwwwwwwwwwwwwwwwwwwwwww popopopopoppo.po.portartartartartartartart lcilcilclcilcilciiclciencenncencencencenciaeiaeiaeiaeiaeiaeiaevidvidvidvidvidvidvidvida caaa ca cca.ca.commoomomomom.om.brbbrbrbrbbrbrbr IM AG EN S: D IV UL GA Çà O !�0!)3!'%-�$%�&!6%,!�/.$%�6)6%-�/3����� $!�0/05,!§/�#/.42!34!�#/-�/�-5.$/� &5452°34)#/�$/3�3%,%#)/.!$/3�0!2!� 0!24)2%-�0!2!�/�-!2!,4/�n�/.$%�(!")4!-�� $)34!.4%3�$!�0,%"%��/3�350/34!-%.4%�-!)3� #!0!:%3�15%�#/-0%-�/3��� >Ú: Criado por Cesar Charlone, Pedro Aguilera. Ano de produção - 2016. ���GhÔ��¢�?B��������:�"È�����¢���G�G9�!�IhÔ��I����^IG9�-�������:�+G^�� �� origem - Brasil A�SER�MUITO�DEBATIDA�DAQUI�POR�DIANTE�SE� QUISERMOS�ENCONTRAR�ALGUMA�SAÓDA�SAUDÉ- vel para nossos impasses. .AS� GRANDES� LIDERAN¥AS� QUE� AQUELE� TIPO� DE� ORGANIZA¥ÎO� POSSUI� HÉ� UM� BELO� TOQUE� TAMBÏM�A�RESPEITO�DAS�MAIS�ANTI- GAS�FORMAS�DE�PODER�E�AS�NOVAS�QUE�SUR- GEM� COM� %ZEQUIEL� E� !LINE�� BEM� MAIS� AGRESSIVOS� QUE� .AIR� E� -ATHEUS�� DOS� LÓ- deres acolhedores e incentivadores indo DIRETO� AOS�QUE�MOTIVAM�A� AGRESSIVIDADE� como o tom para alcançar o mais alto DESEMPENHO�DA�COMPETITIVIDADE�E�DA�El- CÉCIA��6EREMOS�O�MODELO�DE�MUNDO�QUE� AS�ÞLTIMAS�GERA¥ÜES� FORAM� TENDO�QUE� LI- DAR��QUANTO�MAIS�VELHOS�MAIS�DIFÓCIL�LIDAR� com essa nova aceleração e pragmatismo QUE�SE�INSEREM�NO�ATO�MAIS�BANAL�LIGADO� Ì�VIDA�E�QUE��RECONHE¥AMOS��ACABAM�POR� TAMBÏM�IMPRIMIR�OUTRO�RITMO�AOS�VÓNCU- LOS��CADA�VEZ�MAIS�OBJETIlCADOS�EM�METAS� E�CAPACIDADE�INTRÓNSECA�DE�UTILIZA¥ÎO� 6!,% 45$/� Nossos concorrentes entendem em al- GUM�MOMENTO�QUE�GRUPOS�DENTRO�DO�CO- letivo são uma forma de aumentarem suas CHANCES��E�SERÉ�ASSIM�QUE�O�ENREDO�REUNIRÉ� OS�PERSONAGENS�PRINCIPAIS�EM�BUSCA�DE�SEU� LUGAR� NOS� DESEJADOS� ���� %STARÉ� VALENDO� �QUASE � TUDO�PARA� ALCAN¥AR� ESSE�OBJETIVO�� OS�AMORES��OS�LA¥OS�COLABORATIVOS��A�ÏTICA�� ATÏ�MESMO�A�MORAL�PODERÎO�SER�hmEXIBILI- ZADOSv� EM�NOME�DO� INTERESSE�MAIOR��UM� VALE TUDO�ONDE�A�ARTE�IRONIZA�A�VIDA�EM�SEU� MUNDO�DE�NEGØCIOS�NA�ATUALIDADE�� -AIS� AO� lNAL� lCAREMOS� SABENDO�QUE� como último degrau de comprometimen- TO� PARA� ENTRAREM�� OU� SEJA�� IREM� PARA� O� -ARALTO��SERÉ�NECESSÉRIO�ABRIR�MÎO�DE�SUA� CAPACIDADE� REPRODUTIVA� n� NÎO� HÉ� CRIAN- ¥AS�ENTRE�OS�HABITANTES�DO�LADO�DE�LÉ��/S� ����QUE�VIVEM�NA�ESCASSEZ� SÎO� TAMBÏM� RESPONSÉVEIS�PELA�PRODU¥ÎO�DE�NOVOS� IN- DIVÓDUOS� QUE� TERÎO�� DESDE� O� NASCIMENTO�� A�META�DE�ALCAN¥AREM�AOS����ANOS�A� IDA� PARA�O�GRUPO�DOS�MAIS�APTOS��-UITAS�DES- SAS�CRIAN¥AS�ABANDONADAS�Ì�PRØPRIA�SORTE�� UMA� VEZ� QUE� SEUS� JOVENS� PAIS� SUMIRAM� ENGOLIDOS�PELO�0ROCESSO��POR�ÐXITO�OU�FRA- CASSO�NELE��#OMO�ÞLTIMO�OBSTÉCULO�A�SER� superado encontra-se a capacidade do aprovado nas etapas anteriores de aceitar O� PROCESSO� DE� ESTERILIZA¥ÎO� OBRIGATØRIO� PARA�A�PASSAGEM�PARA�O�-ARALTO��4ALVEZ� a infância não possa ser tolerada com seu caos criativo em uma sociedade cuja as- SEPSIA� DE� CREN¥AS� NÎO� INCLUI� EMO¥ÜES� E� EXPERIÐNCIAS�IMPULSIVAS��REPLETAS�DE�CHORO� E�GARGALHADAS��DE�AMOR�E� FÞRIA��0OR�AQUI� ANDAMOS�A�MEDICÉ LA�EM�EXCESSO�� #OMO�ALERTAVA�,AO�4SÏ��SØ�A�mEXIBI- LIDADE�FALA�DE�VIDA��O�QUE�Ï�RÓGIDO�FALA�DE� MORTE��E�ESSA�SÏRIE�VEM�SUBLINHAR�ISSO�DE� FORMA�BEM�ASSINADA��DEVEMOS�REJEITAR�SI- MULACROS� DE�MOBILIDADE� COMO�PRETENDE� UM�MODELO� DE�MUNDO� TÎO� BEM� CARICA- TURADO�PELO�ROTEIRO��3ERIA�MAIS�PRUDENTE� ABRA¥ARMOS�A�mEXIBILIDADE�QUE�DAN¥A�NOS� corpos vivos e saciados de algo muito MAIOR�QUE�A�MERA�SOBREVIVÐNCIA��NENHUM� DOS�LADOS�DEVE�PERDER�ESSA�DIMENSÎO�QUE� PODE�ATÏ�SER�VISTA�PARA�ALÏM�DA�ESTÏTICA�� DE� UMA� ÏTICA��#OMO�DIZ� UMA� FRASE� QUE� roda sem autor determinado em bytes DAS�REDES�SOCIAIS��h%M�TEMPOS�DE�ØDIO�Ï� PRECISO�ANDAR�AMADOv��-ICHELE�E�&ERNAN- DO�TRAZEM�A�FOR¥A�DESSA�QUESTÎO��h¡�QUE� A�FOR¥A�E�A�RIGIDEZ�SÎO�COMPANHEIRAS�DA� MORTE��%�A�DOCILIDADE�E�A�mEXIBILIDADE�SÎO� AMIGAS�DA�VIDA�v&ATO�Ï�QUE�NESTA�ERA�� JÉ� IRONICAMENTE�APELIDADA�DE�hPØS VERDADEv�� NÎO� Ï� MAIS� TÎO� FÉCIL� LOCALIZARMOS� ONDE� CADA� FOR¥A� SE� ENCONTRA�� OS� DISFARCES� DE� uma sociedade perversa são múltiplos e VÐM�SEMPRE�EM�VOZ�DOCE�E�PLENA�DE�PRO- MESSAS��%�SE�HÉ�ALGO�QUE�%ZEQUIEL�PERSO- NIlCA�BEM�Ï�A�VERDADE�IMPRECISA��DA�QUAL� até ele mesmo duvida. -�������>Ú� ��� candidatos são aprovados no Processo, que testa os limites dos participantes em provas físicas e psicológicas e os coloca diante de dilemas morais 70 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br DISTÚRBIO Renata Mousinho é professora associada, mestre, doutora e pós-doutora em Psicologia, todas pela UFRJ. Coordenadora do Projeto ELO: escrita, leitura e oralidade (UFRJ). Autora do livro Dislexia: Novos Temas, Novas Perspectivas, ao lado de Luciana Mendonça Alves e Simone Capellini (Wak Editora). Um transtorno específico de leitura, que traz dificuldades na aprendizagem ou desenvolvimento dessa habilidade. Não se trata de um problema comportamental ou educacional, ainda que esses possam dificultar a identificação e melhora O QUE HÁ POR TRÁS DA DISLEXIA? Por Renata Mousinho SH UT TE RS TO CK Dislexia é um transtorno específico de leitura, e disortografia um trans-torno específico de escrita. A dislexia vem acompanhada da disortografia, mas essa última pode vir sozinha (ou seja, pro- blema de escrita, mas com leitura ade- quada). Não se trata de uma dificuldade comportamental, apesar de ser possível que coexista ou apareça em consequên- cia de suas dificuldades escolares. É im- portante também destacar que, para ser considerado dislexia, o nível de leitura não pode ser compatível nem com o ní- vel de leitura de seus colegas que tiveram as mesmas oportunidades educacionais nem com o nível do seu próprio desen- volvimento em outras áreas, como po- tencial cognitivo, por exemplo. Não cus- ta reforçar que não se trata de um déficit intelectual. O potencial para aprender está totalmente intacto. As pessoas com dislexia têm consci- ência das dificuldades que apresentam, mas não necessariamente do diagnós- tico. E sofrem muito por isso. A dúvida do que têm, do porquê dessa aparente limitação, fora as pressões externas, que fazem com que ele próprio questione suas possibilidades, impacta muito sua autoestima. Não é incomum serem cha- mados de pouco inteligentes ou pouco esforçados, o que se reflete diretamente na motivação e em sua autoimagem. Talvez por essa razão existam vários estudos internacionais mostrando que a população com transtornos de apren- dizagem que não tem apoio terapêutico, familiar e/ou educacional torna-se mais vulnerável à criminalidade, provavel- mente pela saída mais precoce do siste- ma escolar ou pela menor possibilidade de emprego. Em compensação, aqueles bem estimulados, com ambiente favorá- vel e/ou resilientes, apresentam todas as possibilidades de desenvolvimento e su- cesso, apesar de um certo esforço inicial. A questão passa a ser a seguinte: se é um déficit específico, por que esses estu- dantes apresentam outras dificuldades? A leitura, há anos, vem sendo a base do ensino formal. Ela é boa parte do aces- so à informação, e sua limitação pode atrapalhar o rendimento em outras matérias. Vale lembrar que não há uma dificuldade para aprender. O problema é que se o único caminho para o conte- údo for a leitura, ela pode servir como um gargalo ou funil, limitando o acesso. Além disso, o erro na leitura de enuncia- dos pode provocar respostas aparente- mente sem nexo, o que não aconteceria na linguagem oral. Outro exemplo são os problemas matemáticos, que podem ser um grande desafio, mesmo quando não há dificuldade em cálculo, pois é necessário ler e interpretar a questão. A escrita também pode ser um limitador, visto que nem tudo oque pensa, o que é elaborado mentalmente, consegue ser explicitado através desse instrumento. Como se fala no dia a dia: fica difícil co- locar as ideias no papel. Déficit linguístico A dislexia, definitivamente, não tem origem na má qualidade da educa- ção. Mesmo em países em que a educa- ção apresenta altos índices de sucesso a dislexia existe, e apresenta a mesma porcentagem de países onde estes não são uma realidade. Trata-se de um déficit linguístico, fortemente associado a uma tendência familiar. O processamento fonológico está prejudicado, bem como www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 71 seguinte: estratégias na escola para que todas as crianças consigam aprender (ca- mada 1), estimulações em pequenos gru- pos para aquelas que estão apresentando dificuldades (camada 2). Então, será possível observar dois grupos: aquele das crianças que superaram as dificuldades iniciais (podem ser descartados diagnós- ticos como dislexia) e aquele com difi- culdades persistentes, o que pode se con- firmar como dislexia, e deve seguir para atendimento especializado (Veja quadro esquema simplificado de RTI). Confirmação Para confirmar a presença da disle-xia ou dificuldades similares são necessárias avaliações clínicas, mas é possível desconfiar através de alguns sinais. Tanto na leitura quanto na es- crita há impasses que fazem parte do processo. Mas a persistência deles pode indicar dificuldade. No caso da leitura, por exemplo, ler sob esforço no início é comum, mas manter um ritmo muito devagar por um tempo prolongado não é esperado. Exatamente por essa razão, os manu- ais diagnósticos mais modernos, como o DSM-5, propõem que, para um diag- nóstico seguro de dislexia, haja um teste terapêutico ou proposta de resposta à in- tervenção (RTI). O que, em um país de tanta diversidade como o nosso, torna-se ainda mais importante. A proposta é a sua relação com o processamento visual. Mas é claro que uma má qualidade da educação prejudica. Ela pode ou poten- cializar as dificuldades dos disléxicos ou causar dificuldades de aprendizagem de outra ordem (que podem até parecer em um primeiro momento, mas não são ca- sos de dislexia realmente). Os manuais diagnósticos mais modernos propõem que, para um diagnóstico seguro de dislexia, haja um teste terapêutico ou proposta de resposta à intervenção (RTI). O que, em um país de tanta diversidade como o nosso, torna-se ainda mais importante 72 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br DISTÚRBIO tal vocabulário mental que foi explicado acima, o léxico. Mas continuar errando ao longo da escolaridade, sem que isso nem cause ao menos alguma estranhe- za, pode ser um sinal. Além das questões ortográficas, sempre considerando que apenas a per- sistência em padrões anteriores é pro- blemática, podem existir falhas no nível da frase, truncadas, sem pontuação ou sem letra maiúscula iniciando, ou ainda no nível do texto, que parece restrito se compararmos com o potencial de lingua- gem oral e tempo de escolarização. A seguir é possível observar um tex- to, na versão digitada, de uma menina de 10 anos, filha de professores. É rele- vante lembrar que o perfil pode ser bas- tante heterogêneo, portanto nem todos apresentarão exatamente os mesmos tipos de erros: “Mamãe agetou (ajeitou) a cossi- nha (cozinha) e o cão pagunsol (ba- gunçou) A a mamãe gegou (chegou) na cosinha (cozinha) e viu duto (tudo) Bagusado (bagunçado) e viu o cão ali Bagusado (bagunçando) a mamãe não codou (acordou) e Pegol (pegou) o cão E pretel (prendeu) o cão mais (mas) o cão coziquil (conseguiu) fugir e vodo (voltou) Para a cossinha (cozinha) mais (mas) como a mamãe esdava (es- tava) na cozinha ele não gozegel (con- seguiu) fim”. Crianças sem dificuldade vão ganhan- do fluência progressivamente, o que não acontece com quem tem dislexia. O es- talo, ou o clique, como alguns chamam, não acontece sem uma ajuda adicional. E tem mais: a leitura laboriosa prejudica secundariamente a compreensão do tex- to lido, mesmo que a compreensão oral seja boa. Isso acontece porque a criança lê em pedaços, segmentando muito, e no final não consegue mais lembrar do que leu. É possível imaginar melhor vendo o quadro Diferença de leitura. Escrita Na escrita há algumas trocas que, mesmo precocemente, são sinais de alerta. Não que indiquem 100% uma dislexia ou disortografia, mas, em alta porcentagem, sim. E são trocas raras para a maior parte dos escolares. Como exemplo há a substituição entre letras que representam os fonemas homorgâ- nicos, como P/B, T/D, K/G, F/V, S/Z, X/J. Mesmo em palavras regulares, ou seja, que se escrevem exatamente como se fala, as primeiras a serem dominadas, os erros se mantêm. As inversões nas se- quências das letras também são comuns, especialmente em sílabas mais longas (cravo para carvo, por exemplo). As regras ortográficas, que são do- minadas progressivamente por todos os escolares, tornam-se um grande desafio para quem tem dislexia. Para ilustrar, é possível falar de M antes de P e B, S–SS ou R–RR entre duas vogais ou G e C an- tes de A, O e U, que têm som diferente de quando colocado antes de E e I. A di- ficuldade do disléxico não é entender as regras, e sim aplicá-las, pois é necessário prever o som que vem depois, antes de optar pelo que vem antes. Então, ele consegue completar lacunas para com- pletar M ou N antes das consoantes, já que as visualiza e conhece a regra. Mas na hora de escrever ele deve recuperar a letra que vem depois, para optar pela que vai colocar antes. Já fazer opções que explicitam di- ficuldades ortográficas do português, sem nenhuma regra que explique (um som com várias possibilidades de gra- fia), como X ou CH, por exemplo, de- manda um tempo ainda maior. Essa demora se dá, pois é necessária experi- ência de leitura para que se estruture o CARACTERÍSTICAS ESQUEMA SIMPLIFICADO DE RTI Intervenção escolar Pequenos grupos de estimulação I���I��G�hG��I��� �I�� G �� Somente aqueles escolares com dificuldades persistentes PARA SABER MAIS PARA SABER MAIS s, ou omo adas, as se- muns, ngas o do- os os safio rar, é S–SS C an- In P I S e d p www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 73 Para confirmar a presença da dislexia são necessárias avaliações clínicas, mas é possível perceber alguns sinais. Tanto na leitura quanto na escrita há impasses que fazem parte do processo Providências Valorizar os pontos fortes do aluno com dislexia (raciocínio científico, habilidade matemática ou dom artísti- co, por exemplo) e evitar colocá-lo em evidência em suas fragilidades, como ler alto diante do grupo ou colocar sua produção de texto em um mural, são orientações que parecem ser de senso comum. Mas, além disso, há condutas importantes tanto no que se trata do sis- tema de avaliação quanto das estratégias para favorecer a aprendizagem na escola. Em sala de aula muitos são os recursos que o professor pode lançar mão. A re- 12 3R F tendo em vista que sua leitura é mais len- ta. Depois, apenas um prazo mais flexí- vel de prova pode ser suficiente. No que diz respeito à escrita, deve-se considerar o que é o mais importante para aquela avaliação específica: o conteúdo ou a forma. Não parece justo um aluno com dislexia, que acerte uma resposta, perder pontos superiores ao valor de uma ques- tão, que acertou, por conta de falhas na ortografia. Às vezes, a prova oral pode ser mais eficiente como forma de medir a aprendizagem de alguns, em determi- nadas disciplinas. Ou seja, por mais que existam orientações gerais, essasadap- tações são sob medida. Elas não servem para favorecer um escolar com dislexia, mas para lhe dar as mesmas oportunida- des de seu colega em determinada fase do seu desenvolvimento. Por definição, ledor é aquele que gosta de ler. No entanto, é muito mais do que isso. Ledor é aquele que empresta aos cegos, deficientes visuais e outras pessoas com problemas de leitura, por meio de sua voz, a possibilidade de leitura de diferentes textos, especialmen- te em avaliações, concursos e vestibulares. A função ganha cada vez mais importância no cenário educacional, em consequência do movimento inclusivo na educação. Esse pro- fissional é fundamental para assegurar acessi- bilidade aos conteúdos escolares. �Ledor alização de gráficos ou organogramas para auxiliar na compreensão de textos ou na organização da informação, o uso frequente de recursos visuais, o acesso à informação para além da leitura. Recur- sos que a família também pode usar em casa. Além desses, os horários fora da es- cola podem ser aproveitados para visita a museus, para assistir a filmes e docu- mentários, além de animações sobre os assuntos tratados na escola. Adaptações das avaliações escolares devem ser consideradas, e minimizadas, à medida que a criança vai evoluindo. Por exemplo, em um primeiro momento, um ledor (alguém que leia a prova para ele) é útil. Mais à frente, ela já poderá ler sua própria prova (se ouvindo, de preferên- cia), pedindo auxílio quando necessário, e com mais tempo para sua realização, DIFERENÇA DE LEITURA PARA SABER MAIS A mesma frase pode ser lida de forma diferente por dois escolares. No primeiro caso a criança tem que recuperar sete informações, sendo várias delas pala- ��G��I��������IG �9��������GI����G�������G����`��G:�������� G9����I����G�G���- da, tem que tentar lembrar quase do dobro, sendo que esses 13 segmentos não �È�������IG �:�$������H��IG����G����������I�G�G� �����`��G� ����GHG���9�G���- la de curto prazo, mas que é indispensável para o sucesso de algumas tarefas. �IG� ��G������� ��^I��� ���������G����G� ������GhÔ��������������������Ô���� �� ���� ���H�G G:�,�G� �������G��I��� ������G�I���������������G��������G �Ô�9� elas passam a entender o que leem quando ouvem, pois o canal auditivo ainda é ��I���P�����G�G� ������� �G����������I����:���������G������I���G����������GI����� direto ao léxico, nosso dicionário mental. É quando conseguimos ler de forma G����P��IG9���I����I�� �����HG�������G���G�G��G����I���G�: REFERÊNCIAS MOUSINHO, R.; ALVES, L.; CAPELLINI, S. Dislexia: Novos Temas, Novas Perspectivas III. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2015. AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders9�!���� Edition (DSM-V). Arlington: American Psychiatric Publishing, 2013. KETTERLIN-GELLER, L. R. Knowing what all students know: procedures for developing Universal Design for Assessment. The Journal of Technology, Learning and Assessment, v. 4, n. 2, nov. 2005. MARCHESAN, I.; SILVA, H.; TOMÉ, M. Tratado das Especialidades em Fonoaudiologia. São Paulo: Book Toy, 2014. TALBOT, J. Experiences of the criminal justice system by prisoners with learning disabilities and ��I������:�Prison Reform Trust, 2008. 74 psique ciência&vida DISTÚRBIO DESVENDANDO DISTÚRBIO DISL DESVENDANDO DISL www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 75 Lou de Olivier é multiterapeuta, psicopedagoga, psicoterapeuta, especialista em Medicina Comportamental, bacharel em Artes Cênicas e Artes Visuais. Portadora do distúrbio da dislexia adquirida, é precursora da multiterapia e criadora do método terapia do equilíbrio total/universal. É também dramaturga e escritora. Recentemente participou como oradora on-line do Congresso de Psicólogos Clínicos Globais, na Malásia, abordando dislexia adquirida e multiterapia. Site oficial dislexia adquirida: http://dislexiaadquirida.com Existem muitos equívocos a respeito desse distúrbio, mas os mais comuns são questões relacionadas à hereditariedade, à troca de letras e à possível maior incidência em meninos, em função do excesso de testosterona da mãe MITOS SOBRE Por Lou de Olivier 12 3R F EXIA MITOS SOBRE EXIA EEEEEEEEEExxxxxxxxxxxxxiiiiiiissssssssstttttttttttteeeeeeeeeeemmmmmmmmmmm mmmmmmmmmmmuuuuuuuuuuiiiiiiiittttttttttttoooooooosssssssss eeeeeeeeeeeqqqqqqqqqquuuuuuuuuuííííííííívvvvvvvvvvvvooooooooccccccccccoooooooosssssssss aaaaaaaaaa rrrrrrrrrreeeeeeeeeeessssssssspppppppppppeeeeeeeeeeeeiiiiiiiittttttttttttoooooooo ddddddddddeeeeeeeeeeesssssssssssssssssseeeeeeeeeee dddddddddddiiiiiiiiissssssssstttttttttttúúúúúúúúúrrrrrrrrrrbbbbbbbbbbbiiiiiiiiioooooooo,,,,,, mmmmmmmmmmaaaaaaaaaasssssssss oooooooosssssssss mmmmmmmmmmaaaaaaaaaaaiiiiiiiisssssssss ccccccccoooooooommmmmmmmmmuuuuuuuuuunnnnnnnnnnsssssssss sssssssssãããããããããããoooooooooooo qqqqqqqqqquuuuuuuuueeeeeeeeeeesssssssssstttttttttttõõõõõõõõõõõeeeeeeeeeeesssssssss rrrrrrrrrrreeeeeeeeeeellllllllaaaaaaaaaacccccccccciiiiiiooooooooonnnnnnnnnnaaaaaaaaaaddddddddddaaaaaaaaaasssssssss àààààààààà hhhhhhhhhhheeeeeeeeeeerrrrrrrrrrreeeeeeeeeeeddddddddddiiiiiiiiittttttttttttaaaaaaaaaarrrrrrrrrrriiiiiiieeeeeeeeeeedddddddddddaaaaaaaaaaddddddddddeeeeeeeeeee,,,,, àààààààààà ttttttttttttrrrrrrrrrrrooooooooccccccccccaaaaaaaaaaa dddddddddddeeeeeeeeeee lllllleeeeeeeeeeettttttttttttrrrrrrrrrrraaaaaaaaaasssssssss eeeeeeeeeee àààààààààà pppppppppppooooooooossssssssssssssssssíííííííívvvvvvvvvvveeeeeeeeeeelllllllll mmmmmmmmmmmaaaaaaaaaaiiiiiiiioooooooorrrrrrrrrrr iiiiinnnnnnnnnnccccccccciiiiiidddddddddddêêêêêêêêêêênnnnnnnnnnccccccccciiiiiiiaaaaaaaaaa eeeeeeeeeeemmmmmmmmmm mmmmmmmmmmeeeeeeeeeeennnnnnnnnniiiiiiiinnnnnnnnnnooooooooosssssssss,,,,,,, eeeeeeeeeeemmmmmmmmmmm fffffffffffuuuuuuuuuunnnnnnnnnnççççççççççãããããããããããooooooooooo ddddddddddooooooooo eeeeeeeeeeexxxxxxxxxxxxcccccccceeeeeeeeeeesssssssssssssssssssooooooooo ddddddddddeeeeeeeeeee ttttttttttteeeeeeeeeeesssssssssstttttttttttoooooooosssssssssttttttttttteeeeeeeeeeerrrrrrrrrrroooooooonnnnnnnnnnaaaaaaaaaa ddddddddddaaaaaaaaaaa mmmmmmmmmmmãããããããããããeeeeeeeeeee Existem muitos equívocos a respeito desse distúrbio, mas os mais comuns são questões relacionadas à hereditariedade, à troca de letras e à possível maior incidência em meninos, em função do excesso de testosterona da mãe PPPPPPPPPPPPPPooooooooooooorrrrrrrrrrrrrr LLLLLLLLLLLLLoooooooooooouuuuuuuuuuuuuu ddddddddddddddeeeeeeeeeeeeee OOOOOOOOOOOOOllllllllllliiiiiiiiiiiivvvvvvvvvvvvvvviiiiiiiiieeeeeeeeeeeeeerrrrrrrrrrrrrrPor Lou de Olivier SH UT TE RS TO CK 76 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br DISTÚRBIO A identificação da dislexia ocorreu pela primeira vez em 1881, pelo médico alemão Oswald Berkhn. O termo dislexia foi oficialmente utilizado por um oftalmologista, também alemão, Rudolf Berlin, em 1887 te reconhecida pela Ciência da Saúde, a partir de 2011/2012. Lamentável que esse tipo de desconhecimento ou omissão ainda exista. Já em relação à troca de letras, tra- ta-se de outro equívoco que tem sido amplamente difundido, classificando o problema como sendo supostamen- te característica da dislexia. Baseado em pesquisas, posso afirmar que o distúrbio não provoca troca de letras. O que ocorre com o cérebro do dislé- xico é uma dificuldade de entender os sinais das letras, ele não identifica o que é letra, ele apenas não distingue uma letra de outra e acaba não conse- guindo ser alfabetizado ou perdendo a capacidade de leitura, no caso da dis- lexia adquirida. Isso é muito diferente de trocar “p” por “b” ou “d” por “q”, ou seja lá qual for a troca. Quando uma criança faz essas trocas de letras, o mais provável é que tenha uma dificuldade auditiva Há anos tem sido di-vulgada uma série de equívocos sobre dis-lexiae isso torna não só o entendimento falho como confunde os leigos e até os profissionais que tratam o distúr- bio. São três os principais mitos, que precisam ser explicados a respeito do transtorno: hereditariedade, troca de letras e a questão da testosterona. Há alguns meses um programa de TV en- trevistou supostos especialistas abor- dando dislexia. Na sequência, muitos outros veículos de comunicação pas- saram a abordar o tema e os vídeos na internet viralizaram. Isso continua repercutindo de forma negativa pelos diversos erros que foram veiculados. Daí a necessidade de esclarecimento. A questão da hereditariedade/ genética tem sido amplamente difun- dida. Não se pode negar que exista um tipo de dislexia possivelmente hereditária/genética, que faz com que algumas famílias sejam propensas ao distúrbio, ou seja, se o pai ou a mãe tem dislexia, os filhos têm mais proba- bilidade de apresentarem o problema. Mas é preciso frisar que este é apenas um dos tipos de dislexia. Há outras Como o termo já diz, dislexia: dificuldade ou ausência da aquisição do conjunto de palavras de um determinado idioma. De forma simplista pode-se dizer que seja di- ficuldade na aquisição da leitura. Ou a per- da da capacidade de leitura, em casos de acidentes que causem dislexia adquirida. Entre tantos dicionários e livros que pre- tendem definir a dislexia, a definição mais precisa e simples é a de Gutenberg: “di- ficuldade de ler e compreender a escrita”. �Conceito classificações que dependem, inclusi- ve, da linha de pesquisa adotada pela Neuropsicologia, pela psicopedago- gia, pela multiterapia e outras linhas de pesquisa que classificam os diver- sos tipos de dislexia. De todos os tipos, o que gera mais confusão tem sido o causado por trauma, ou seja, a dislexia adquirida. Essa dislexia quase sempre é renega- da e, quando citada, geralmente é de forma equivocada. Em certo debate televisivo, um médico citou fatores que podem causar dislexia adquirida, mas omitiu o principal que é anoxia perinatal/hipoxia neonatal. Em 1998, diversos sites de Saúde e/ou Educação e também meu portal publicaram essa pesquisa na íntegra, tanto no Brasil quanto na Europa, onde se comprova a aquisição de distúrbios, especifica- mente dislexia e disgrafia, por anoxia. Inúmeras pesquisas fizeram com que a dislexia adquirida fosse oficialmen- A questão da hereditariedade/genética se faz presente em alguns casos de dislexia, mas é importante ressaltar que existem vários outros tipos do transtorno www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 77 Apesar da descoberta e do termo ser citado na Alemanha desde 1881, demorou a ser usado em outros países, especialmente no Brasil, onde, até algumas décadas atrás, ainda se intitulava “cegueira verbal” e, ao passar por ditado, escute errado e, na sequência, escreva errado. Pode também ser uma dificuldade visual, que a faz inverter letras ou enxergá-las de forma espelhada. Nessa forma de es- crita espelhada, deve-se citar também que é comum a quase todas as crianças em fase de alfabetização inverterem le- tras e, com a continuidade dos estudos, passarem a escrever de forma normal. Portanto, trocar letras não pode ser classificado como “dislexia”. Mais polêmica Outro ponto polêmico é no que se refere à possível maior incidência em meninos, em função do excesso de testosterona da mãe durante a gestação, o que já há tempos se descartou. Essa linha de raciocínio iniciou-se em 1982, com a publicação de The Testosterone Hypothesis: Assessment since Geschwind and Behan, de Albert M. Galaburda. O resumo dessa publicação é o seguinte: “A hipótese de Geschwind propõe uma interação causal entre imparcialidade não direita, doenças imunológicas e de- ficiência, inclusive dislexia, através da ação intra-uterina do hormônio mascu- lino (testosterona). Alguns estudos epi- demiológicos têm apoiado, pelo menos, uma associação estatística entre os três traços; outros não têm. As associações entre distúrbios de aprendizagem e do- ença imune e entre os transtornos de aprendizagem e lateralidade direita não parecem ser mais bem apoiadas do que IMAG EN S: 1 23 RF tar que não havia nenhum dado con- clusivo e considerar o fator genético isentando as características da mãe, esses estudos americanos foram feitos em autópsias de humanos disléxicos e em animais e, além da crueldade a que se expunham animais que sequer têm o mesmo organismo e reações hu- manas, as pesquisas “mais avançadas” nessa época (1982) eram feitas em cé- rebros de disléxicos mortos. Enquan- to isso, países como a Alemanha já estudavam casos de pacientes. A teoria do excesso de testoste- rona seguiu até que, em 2007, ou- tro estudo – “No relation between 2D : 4D fetal testosterone marker and entre doenças imunológicas e imparcia- lidade não direita. No entanto, nenhum dos dados acumulados até o momento é conclusivo, porque não é claro que as amostras estudadas foram verdadei- ramente representativas. A evidência neuropatológica, tanto em estudos de autópsia em disléxicos humanos e em modelos animais de anormalidades cor- ticais de desenvolvimento, é coerente, mas não um diagnóstico de patologia imunológica. Mecanismos são discuti- dos porque um sistema imunitário anor- mal poderia, assim, ferir o cérebro em desenvolvimento, com ênfase nas intera- ções materno-fetais anormais, incluindo doença autoimune materno e incompa- tibilidade materno-fetal. Uma origem genética também possível em que o pa- pel materno é menos significativo”. O que precisa ser frisado e enten- dido é que, além do próprio autor ci- MULTITERAPIA PARA SABER MAIS U�G� G������G���I������� �������G�G��G� ������G�\�G���������G��G9���G� ��hÔ�� �����G��G�:�U�G����G�G�9�G�G���G� ����I�� G� �� ��IG G�IG���I����b��I��������G �:� �G G��GI���������������G�G����������I^I�:� ����HG�G��P��G�� �����I��� G����G9� (� �I��G� �������G����G�9� )�������I�����G9� ������ ����G�� �\I��IG�� �� +��IG�P����9� G�\�� ��G������G��G9�����I����G��G9�H�� G�hG9����I� �G�G9�G G��G G��I�� ���G���- ���G�IG G�IG��9�����������G�����G�G������G����G�G���G����P�� �9��I����������P��I�:� +G�G�IG G�IG����Ô���������G G��G������������\I��IG����P��G��G����������I�G G�:� ��`��G�G�G��������G�P����� ���I�G�9�������G����G�H������ ���GI��������I����I��G� ��� G �9�����IG����������G�����G��� G�hG��I����� ������G����HG�:� A possível maior incidência de dislexia em meninos, em função do excesso de testosterona da mãe durante a gestação, já foi descartada por especialistas 78 psique ciência&vida DISTÚRBIO as intervenções educacionais que formaram a base do ensino multissen- sorial, que, até hoje, são usadas para ensinar crianças disléxicas. Já em 1951, G. Mahec fez experi- mentos em que percebeu que crianças sem dislexia leram da esquerda para a direita mais facilmente e crianças dis- léxicas leram na mesma velocidade, independentemente do sentido, e 10% dos disléxicos leram melhor da direi- ta para a esquerda. Isso deu início à ideia do hemisfério direito ser maior nos portadores de dislexia. Essa ideia seguiria por muitos anos, mas, na ver- dade, após muitos anos de pesquisas teóricas e práticas, consegui compro- var que o que ocorria com o cérebro dos disléxicos (assim como de outros distúrbios) era uma maior excitação no hemisfério direito e maior inibição no hemisfério esquerdo. E isso nada tinha a ver com o tamanho dos hemisférios. Nos anos 70, enfim, entendeu-se a importância da consciência fonoló- gica na dislexia. Como portadora de dislexia adquirida, a partir de um afo- gamento, eu mesma defendia a tese do surgimento do distúrbio por meio de um acidente em que ocorra diminuiçãoou ausência de oxigênio no cérebro, o que inclui AVC, anoxia por afogamen- to, por enforcamento, entre outros. +G��I�9��G���Ô��\ São diversos os distúrbios que se assemelham, mas não são disle- xia. Os mais confundidos são: dis- grafia – desordem de integração visual-motora. De origem grega, dys = dificuldade; difícil, e graphos = gra- fia, entende-se que é a dificuldade ou ausência na aquisição da escrita. Ge- ralmente, o portador de disgrafia é desatento, pode tornar-se hiperativo e o principal é que a dificuldade se es- tende a todas as formas de escrita (le- tras, sinais e até desenhos). Por essas características, é comum diagnosticar crianças como disléxicas, sendo que seu distúrbio é, na verdade, disgrafia. Uma das formas eficientes de se tratar a dislexia é a multiterapia. Engloba as áreas de psicopedagogia, Medicina Comportamental, Neuropsicologia, entre outras técnicas de Psicanálise, além de arteterapia, musicoterapia, biodança e psicodrama IMAGE NS : 1 23 RF dyslexia – Boets, Barta b”, de Smedt, Berta; Wouters, Janb; Lemay, Katrie- na; Ghesquière, Pola (Neuroreport, v. 18, n. 14, p. 1487-1491, 17 September, 2007) – publicou o seguinte: “Tem sido sugerido que os níveis elevados de exposição pré-natal à testostero- na estão implicados na etiologia da dislexia e seus frequentes problemas sensoriais. Este estudo examinou 2D: 4D relação dígitos (um marcador de exposição à testosterona fetal) em crianças disléxicas e normais de leitu- ra. Foram observadas 4D: há diferen- ças entre os grupos em 2D. Mas não mostraram a relação postulada com leitura, escrita, habilidade fonológica, a percepção da fala, processamento auditivo e processamento visual. Es- ses resultados desafiam a validade das teorias que atribuem um papel proe- minente à exposição à testosterona fetal na etiologia da dislexia e suas de- ficiências sensoriais. *����� A identificação da dislexia ocorreu pela primeira vez em 1881, pelo médico alemão Oswald Berkhn. O termo dislexia foi oficialmente uti- lizado por um oftalmologista, tam- bém alemão, Rudolf Berlin, em 1887. Apesar da descoberta e do termo ser citado na Alemanha desde 1881, de- morou a ser usado em outros países, especialmente no Brasil, onde, até algumas décadas atrás, ainda se inti- tulava “cegueira verbal” e até hoje há quem defenda apenas a causa heredi- tária/genética, negando-se a aceitar a evolução das pesquisas de diversos profissionais e pesquisadores de disle- xias no mundo todo. O termo “cegueira verbal” surgiu em 1896, com W. Pringle Morgan, que descreveu a “cegueira de palavra congenital”, publicado em British Me- dical Journal. De 1890 a 1900, James Hinshelwood publicou vários artigos sobre dislexia e sugeriu que o maior problema no distúrbio era a deficiência na memória visual de palavras e letras. Lesão cerebral era outra causa muito estudada, mas, em 1925, Sa- muel T. Orton escreveu que a dislexia não dependia de lesão ou dano cere- bral. Orton, em parceria com a psicó- loga Anna Gillingham, desenvolveu Quando dois ou mais distúrbios se mani- festam no mesmo indivíduo chama-se de comorbidade. Geralmente, há um distúrbio principal e outro(s) que se desenvolve(m) em paralelo. É preciso prestar atenção, pois muitas das comorbidades acabam se manifestando após algum tempo de trata- mento, o que pode representar um proce- dimento errado ou ineficaz. �Comorbidades www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 79 As crianças que reproduzem letras, si- nais e desenhos, mas não reconhecem ou conseguem ler o que escreveram, podem ser consideradas disléxicas. Já as que não conseguem nem ler nem escrever devem ser consideradas dis- léxicas e disgráficas. Outro caso passível de confusão é a disortografia – dificuldade na expres- são da linguagem escrita. A ortografia é a parte da gramática que ensina a es- crever palavras corretamente, portanto a disortografia é o escrever incorreta- mente. Esse é um distúrbio específico na aquisição e reprodução de letras (es- crita de um idioma) e diferencia-se da disgrafia, que é generalizada. '������ � �I�G� A síndrome de Irlen (S.I.), por sua vez, é uma alteração visuopercep- tual, causada por um desequilíbrio da capacidade de adaptação à luz, que pro- duz alterações no córtex visual e déficits na leitura. A síndrome tem caráter here- ditário e se manifesta sob maior deman- da de atenção visual. samente verificada, devem entender que, de suas publicações, surgem re- publicações, fundamento de teses, dissertações, TCCs e tudo isso pode perpetuar um equívoco, como tem sido por tantos anos a troca de letras e outros nessa linha. Cabe também aos profissionais clínicos buscarem boas informações, livros e palestras de qualidade, sempre questionando as informações que chegam, de forma a entender em profundidade os distúr- bios e suas características. Aos pais e professores cabe a responsabilidade de conversar com seus filhos/alunos, percebendo alterações no comporta- mento e/ou na aprendizagem, reco- nhecendo o momento de encaminhar o indivíduo a um tratamento adequa- do às suas necessidades. Descrita em 1983 pela psicóloga Helen Irlen, a síndrome tem como manifestações, além da fotofobia, problemas na resolução visiospacial, dificuldades na manutenção do foco, estresse visual, alteração na percep- ção de profundidade e cefaleias. Durante a leitura, segundo pa- cientes, o brilho ou reflexo do papel branco contra o texto causam irrita- bilidade, assim como a luz natural ou fluorescente. Eles possuem ainda sen- sação de movimentação das letras que “pulsam, tremem, vibram, confluem ou desaparecem”, e a leitura passa a ser fragmentada. Além disso, queixam de insegurança ao dirigir, estacionar, com esportes com bola ou em outros movimentos, como descer e subir es- cadas rolantes. A questão da dislexia necessita ur- gentemente de uma nova abordagem. Os profissionais tanto pesquisadores quanto clínicos devem ter mais aten- ção ao que se publica. Em especial, os pesquisadores devem perceber a importância da informação minucio- Existem algumas indicações de como se deve agir em relação às pessoas disléxi- cas: não forçar a alfabetização; encaminhar a pessoa ao psicopedagogo; incentivar sua criatividade; o acompanhamento neurológi- co também é fundamental; e havendo co- morbidades, outros profissionais devem fa- zer parte da equipe de atendimento, como psiquiatra, psicólogo, fonoaudiólogo etc. �Como agir REFERÊNCIAS Vídeo de Lou de Olivier, abordando os três principais equívocos sobre dislexia: https:// youtu.be/326yylCXxDQ Vídeo de Lou de Olivier, abordando a dislexia adquirida: https://youtu.be/mdsj7e7-1nU OLIVIER, Lou de. R (ebook). São Paulo: e, 2015. OLIVIER, Lou de. Distúrbios de Aprendizagem e de Comportamento. Rio de Janeiro: Editora Wak. . Transtornos de Comportamento e Distúrbios de Aprendizagem. Rio de Janeiro: Editora Wak. Outro caso passível de confusão é a dificuldade na expressão da linguagem escrita. A ortografiaé a parte da gramática que ensina a escrever palavras corretamente, portanto a disortografia é o escrever incorretamente 80 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br em contato O EXAGERO NA MIRA A Psicologia é mesmo surpreendente. Na edição 132, um dos artigos mostra uma relação direta entre algumas características comportamentais, que, comumente, são chamadas apenas de vícios. Então, dependência química, jogo patológico, dependência da internet, o comprar compulsivo e ATÏ�MESMO�O�SEXO�EXAGERADO�SÎO�CLASSIlCADOS�COMO�TRANSTORNOS�DO�EXAGERO��%SSE�Ï�UM�CAMPO�QUE� PROPÜE�UM�DESAlO�IMPORTANTE�PARA�OS�PROlSSIONAIS�ESPECIALIZADOS��4ODOS�ESSES�QUADROS�COMPRE-ENDEM�UM�TIPO�DE�CONmITO�ENTRE�O�PRAZER�NA�REALIZA¥ÎO�DA�A¥ÎO�EXAGERADA�E�O�PREJUÓZO�QUE�CAUSA� EM�FUN¥ÎO�DE�SEU�DESCONTROLE��%�Ï�POSSÓVEL�IDENTIlCAR�NA�SOCIEDADE�VÉRIAS�PESSOAS�QUE�SE�ENQUA- DRAM�NO�PROBLEMA��0ARA�SE�TER�UMA�IDEIA��POR�OBSERVA¥ÎO��POSSO�DIZER�QUE�Ï�DIFÓCIL�ENCONTRAR�UMA� pessoa que não conheça alguém próximo que sofra de uma das formas desse transtorno. Leandro Quadros, por e-mail 4%-�15%�#/22%2 E não é que a ciência vem provando, ao longo dos anos, que a saúde do cérebro também depende do exercício físico? A CORRIDA�� ESPECIlCAMENTE�� VEM� MOLDANDO� a evolução do ser humano ao longo dos anos. O texto que saiu no número 132 da Psique mostra bem que, em dado momen- to da evolução humana, a própria seleção natural favoreceu a capacidade das pessoas em aguentar longos períodos de estresse cardiovascular. Não no que se refere à po- TÐNCIA�OU� RAPIDEZ��MAS�� SIM�� Ì� RESISTÐNCIA�� Historicamente, estudiosos defendem a tese de que os humanos evoluíram em con- sequência da necessidade de correr longas distâncias em busca de alimentos, o que ACABOU�ADAPTANDO�A�ANATOMIA�E�A�lSIOLOGIA�� %M�RESUMO��O�MOVIMENTO�FOI�RESPONSÉVEL� por determinar a estrutura e a função ce- rebrais. Portanto, a inatividade e o sedenta- rismo tornam os humanos doentes física e mentalmente. Parabéns! Sérgio Ricardo Andrade, por e-mail #/-/§/�.!#)/.!, Mais uma personagem interessante foi es- colhida para a entrevista da revista Psique. .A�VERDADE��DESSA�VEZ��NA�EDI¥ÎO������NÎO� foi uma personagem, mas duas. As especia- LISTAS�!NA�0AULA�2EIS�DA�#OSTA�E�-ANOELA� -ICHELLI� ESCLARECERAM� VÉRIOS� ASPECTOS� A� respeito de um tema bem difícil de se lidar: o luto. Descobri, por exemplo, que frente ao primeiro impacto de uma tragédia, como a que ocorreu com o voo da delegação DO� TIME� DE� FUTEBOL� DA� #HAPECOENSE�� QUE� MATOU� DEZENAS� DE� PESSOAS�� A� SOCIEDADE�� em geral, se relaciona mais com o medo, a constatação do sentimento de fragilidade da vida, a impotência e a revolta. Acredito, inclusive, que são sentimentos que surgem mesmo em pessoas que não têm nenhuma relação direta com as vítimas. Além disso, também creio que um tipo de curiosidade MØRBIDA��INERENTE�ÌS�PESSOAS��FAZ�COM�QUE� acidentes com essa magnitude ganhem muita repercussão na mídia. Selena de Alencar, por e-mail O LADO BOM DA VIDA *É�TINHA�OUVIDO�FALAR�DA�0SICOLOGIA�0OSITI- VA��MAS�APENAS�SUPERlCIALMENTE��0OR�ISSO�� gostei muito do material publicado no nú- mero 132 da revista, que explicou, de for- ma mais aprofundada, as características DESSA� LINHA� DE� PENSAMENTO�� 4RATA SE� DE� UM�MOVIMENTO�CIENTÓlCO��QUE�ESTUDA�FELI- cidade e bem-estar, além de mostrar como implementar esses elementos no cotidia- NO�DAS�PESSOAS��5M�MÏTODO�QUE�PRETENDE� ISSO�SØ�PODE�SER�INTERESSANTE�E�FAZER�O�BEM�� !�0SICOLOGIA�0OSITIVA�FAZ�COM�QUE�O�LADO� SAUDÉVEL� E� BOM�DO� INDIVÓDUO� SEJA� LEVADO� a sério, sempre, é claro, com os parâme- TROS�QUE�A�CIÐNCIA�TRAZ��%�HOJE�ME�PARECE� QUE�HÉ�UM�CENÉRIO�BEM�PROPÓCIO�PARA�SUA� A¥ÎO��POIS�COM�OS�AVAN¥OS�TECNOLØGICOS�HÉ� uma sociedade, especialmente as crian- ¥AS��NAS�MÎOS�DAS�CHAMADAS�NOVAS�BABÉS�� como tablets, smartphones e videogames. A consequência é um empobrecimento de relações sociais positivas. #AROLINA�#ASTRO��POR�e-mail "%.%&°#)/3�$/�2)3/ A revista Psique provou, na edição 132, QUE�A�FRASE�hRIR�FAZ�BEM�PARA�A�SAÞDEv�NÎO� Ï� UMA� lGURA� RETØRICA�� 0ODE� SER�� INCLUSI- ve, uma forma de terapia para combater inúmeros problemas físicos e emocionais. %XISTEM� DIVERSAS� EXPLICA¥ÜES� CIENTÓlCAS� PARA�ESSES�BENEFÓCIOS��5MA�DELAS�DIZ�QUE� a sensação provocada pelo bom humor AJUDA�NO�TRATAMENTO�DE�DOENTES��POIS�FAZ� AUMENTAR� A� SECRE¥ÎO� DE� ENDORlNA�� QUE� é uma substância que relaxa as artérias, MELHORA�A�CIRCULA¥ÎO�E�BENElCIA�E�REA¥ÎO� imunológica. Em contrapartida, “pessoas mal-humoradas, impacientes, irritadas, CONTRARIADAS�� RÓGIDAS�E�AUTORITÉRIAS�ESTÎO� mergulhadas num processo de tensão, que promove uma grande descarga de adrenalina, o que aumenta a predisposi- ¥ÎO�PARA�ACIDENTES�VASCULARESv��EXPLICA�O� texto. Então, o remédio é sorrir sempre e procurar olhar o lado bom da vida. Sem DÞVIDA��FAZ�BEM�PARA�A�SAÞDE� !NA�#ÏLIA�#ORRÐA��POR�e-mail www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 81 CONSELHO EDITORIAL AICIL FRANCO é psicóloga, mestre e doutora em Psicologia #LÓNICA�PELA�530��0ROFESSORA�NO�)*"!�E�NA�%SCOLA�"AHIANA� de Medicina e Saúde Pública, Savador, BA. ANA MARIA FEIJOO é doutora em Psicologia pela 5NIVERSIDADE�&EDERAL�DO�2IO�DE�*ANEIRO��AUTORA�DE� LIVROS�E�ARTIGOS�CIENTÓlCOS��PARECERISTA�DE�DIVERSAS� REVISTAS�E�RESPONSÉVEL�TÏCNICA�DO�)NSTITUTO�DE�0SICOLOGIA� Fenomenológico-Existencial do RJ. ANA MARIA SERRA é PhD em Psicologia e terapeuta COGNITIVA�PELO�)NSTITUTE�OF�0SYCHIATRY��5NIVERSIDADE�DE� ,ONDRES��$IRETORA�DO�)NSTITUTO�DE�4ERAPIA�#OGNITIVA��)4# �� ATUA�EM�CLÓNICA��FAZ�TREINAMENTO��CONSULTORIA�E�PESQUISA�� 0RESIDENTE�HONORÉRIA��EX PRESIDENTE�E�FUNDADORA�DA�!"0#�� ANDRÉ FRAZÃO HELENE é biólogo, mestre e doutor EM�#IÐNCIAS�NA�ÉREA�DE�.EUROlSIOLOGIA�DA�-EMØRIA E�!TEN¥ÎO�PELA�5NIVERSIDADE�DE�3ÎO�0AULO� onde também é professor no curso de Biociência e COORDENA�O�,ABORATØRIO�DE�#IÐNCIAS�DA�#OGNI¥ÎO�NO� Instituto de Biociências. CLÁUDIO VITAL DE LIMA FERREIRA é psicólogo, DOUTOR�EM�3AÞDE�-ENTAL�PELA�5NICAMP��PØS DOUTORADO�EM� 3AÞDE�-ENTAL�PELA�5NIVERSIDADE�DE�"ARCELONA %SPANHA�� PROFESSOR�ASSOCIADO�DE�0SICOLOGIA�DA�5NIVERSIDADE�&EDERAL� DE�5BERLÊNDIA��!UTOR�DE�Aids e exclusão social. DENISE TARDELI, graduação em Psicologia e Pedagogia. Mestrado em Educação e doutorado em Psicologia %SCOLAR�E�DO�$ESENVOLVIMENTO�(UMANO��AMBOS�PELA�530�� 0ESQUISADORA�NA�ÉREA�DA�0SICOLOGIA�-ORAL�E�%VOLUTIVA�� 0ROFESSORA�UNIVERSITÉRIA� DENISE GIMENEZ RAMOS é coordenadora do Programa DE�%STUDOS�0ØS 'RADUADOS�DA�05# 30�E�MEMBRO�DA� Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica. KARIN DE PAULA��PSICANALISTA��DOUTORA�PELA�05# 30�� PROFESSORA�E�SUPERVISORA�CLÓNICA�UNIVERSITÉRIA�E�DO�#%0�� autora do livro $em? Sobre a inclusão e o manejo do dinheiro numa psicanálise��E�DE�VÉRIOS�OUTROS�ARTIGOS�PUBLICADOS� LILIAN GRAZIANO é psicóloga e doutora em Psicologia PELA�530��COM�PØS GRADUA¥ÎO�EM�0SICOTERAPIA�#OGNITIVA� #ONSTRUTIVISTA��¡�PROFESSORA�UNIVERSITÉRIA�E�DIRETORA�DO� )NSTITUTO�DE�0SICOLOGIA�0OSITIVA�E�#OMPORTAMENTO��!TUA� em clínica e consultoria. LILIANA LIVIANO WAHBA, psicóloga, PhD, professora da 05# 30��0RESIDENTE�DA�3OCIEDADE�"RASILEIRA�DE�0SICOLOGIA� !NALÓTICA��#OEDITORA�DA�revista Junguiana. Diretora de 0SICOLOGIA�DA�3ER�EM�#ENA� �4EATRO�PARA�!FÉSICOS� MARISTELA VENDRAMEL FERREIRA é doutora em Audiologia PELA�5NIVERSITY�OF�3OUTHAMPTON�n�)NGLATERRA��MESTRE�EM� $ISTÞRBIOS�DA�#OMUNICA¥ÎO�PELA�05# 30��ESPECIALISTA�EM� 0SICOTERAPIA�0SICANALÓTICA�PELO�)NSTITUTO�DE�0SICOLOGIA�DA�530� MÔNICA GIACOMINI, presidente da Sociedade Brasileira de 0SICOLOGIA�(OSPITALAR�n�BIÐNIO����������%SPECIALISTA�EM� Psicologia Hospitalar, psicóloga clínica junguiana, psicóloga DO�)NSTITUTO�DE�/RTOPEDIA�E�4RAUMATOLOGIA�DO�(#&-530� e supervisora titular do Aprimoramento em Psicologia Hospitalar em Ortopedia. PAULA MANTOVANI é graduada em Psicologia pela 5NIVERSIDADE�0AULISTA��PSICANALISTA��CONSULTORA�EDITORIAL� DO�PROGRAMA�DE�ENTREVISTAS�DA�&.!#�E�MEMBRO� CORRESPONDENTE�DO�%SPA¥O�-OEBIUS�DE�0SICANÉLISE�DE� 3ALVADOR��"! � PEDRO F. BENDASSOLLI é editor da GV Executivo, psicólogo GRADUADO�PELA�5NIVERSIDADE�%STADUAL�0AULISTA��5NESP �E� DOUTOR�EM�0SICOLOGIA�3OCIAL�PELA�530��¡�TAMBÏM�PROFESSOR� da Fundação Getúlio Vargas e da ESPM. LINHA DIRETA IM AG EN S: 1 23 RF /A RQ UI VO C IÊ NC IA E V ID A CANAL FACEBOOK A revista Psique� TRAZ� MUITAS� INFORMA¥ÜES� INTERESSANTES� TAMBÏM� NAS� REDES� SOCIAIS�� !CESSE�A�&ANPAGE��WWW�FACEBOOK�COM�2EVISTA0SIQUE#IENCIAE6IDAAo longo da história, a loucura vem GANHANDO� CADA� VEZ� MAIS� ESPA¥O� NO� ambiente de discussões acadêmicas e CIENTÓlCAS�� %XISTEM� ALGUMAS� IDEIAS� QUE� passam de geração a geração e, apesar de serem desmascaradas com o tempo, SEGUEM�POVOANDO�O�IMAGINÉRIO�POPULAR�� 5M�DOS�MITOS��REFOR¥ADO�AINDA�HOJE�POR� algumas crenças religiosas, que segue com muitas de suas características ori- ginais é o mito da possessão demonía- ca, que surgiu na Idade Média. Pessoas AINDA� FAZEM� PRECES�� SE� BENZEM� DIANTE� de pessoas em crises psicóticas e até MESMO� NOS� MEIOS� DE� COMUNICA¥ÎO� HÉ� rituais de exorcismo aplicados em quem ESTÉ�SOB�SOFRIMENTO�PSÓQUICO��0ARA�ESSAS� pessoas, em seus mitos, a loucura não se distingue do mal. Ela é o mal, a fonte do pecado, o próprio demônio. Maté- RIA� COMPLETA� DA� EDI¥ÎO� ���� ESTÉ� NO� SITE� http://portalespacodosaber.uol.com.br/ Rua Santo Ubaldo, 28 – Torre C – CJ. 12 – Vila Palmeira – São Paulo – SP CEP: 02725-050 – Telefone - (11) 4114-0965 REALIZAÇÃO PSIQUE CIÊNCIA & VIDA é uma publicação mensal da EBR _ Empresa Brasil de Revistas Ltda. ISSN 1809-0796. A publicação não se responsabiliza por conceitos emitidos em artigos assinados ou por qualquer conteúdo publicitário e comercial, sendo esse último de inteira responsabilidade dos anunciantes. REALIZAÇÃO EDITORA: Gláucia Viola EDIÇÃO DE ARTE E DIAGRAMAÇÃO: Monique Bruno Elias COLABORARAM NESTA EDIÇÃO: Andreia Calçada; Lou de Olivier; Lucas Vasques Peña; Luiza Elena L. Ribeiro do Valle; Raquel Jandozza; Renata Mousinho; Tiago J B Eugênio; Yago Felipe Hennrich. Revisão: Jussara Lopes. COLUNISTAS: Anderson Zenidarci; Carla Pereira; Carlos São Paulo; Denise Deschamps; Eduardo J. S. Honorato; Eduardo Shinyashiki; Giancarlo Spizzirri; Guido Arturo Palomba; Igor Lins Lemos; João Oliveira; Jussara Goyano; Lilian Graziano; Marco Callegaro; Maria Inere Maluf; Michele Muller. O Conselho editorial e a Redação não se responsabilizam pelos artigos e colunas assinados por especialistas e suas opiniões neles expressas. www.portalespacodosaber.com.br Ano 11 - Edição 133 Março/2017 Ethel Santaella DIRETORA EDITORIAL Denise Gianoglio COORDENADORA EDITORIAL PUBLICIDADE DIRETORA DE PUBLICIDADE: Rosana Diniz GRANDES E MÉDIAS AGÊNCIAS GERENTE DE NEGÓCIOS: Claudia Marin PEQUENAS AGÊNCIAS E DIRETOS GERENTES DE CONTAS: Diogo Telles PROJETOS ESPECIAIS: Mayra Benini REPRESENTANTES Interior de São Paulo: L&M Editoração, Luciene Dias – Paraná: YouNeed, Paulo Roberto Cardoso – Rio de Janeiro: Marca XXI, Carla Torres, Marta Pimentel – Rio Grande do Sul: Totali Soluções em Mídia, Ivanir Antonio Curi – Santa Catarina: Artur Tavares – Regional Brasília: Solução Publicidade, Beth Araújo. www.midiakit.escala.com.br COMUNICAÇÃO, MARKETING E CIRCULAÇÃO GERENTE: Paulo Sapata – paulosapata@escala.com.br IMPRENSA – comunicacao@escala.com.br VENDAS DE REVISTAS E LIVROS AVULSOS (+55) 11 3855-2142 – atendimento@escala.com.br ATACADO DE REVISTAS E LIVROS (+55) 11 3855-2147 – adm.atacado@escala.com.br Av. 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Não existe patologia dual, mais uma invenção da decadente Psiquiatria contemporânea, em que os ataques aos princípios fundamentais da especialidade ocorrem por todos os lados, lembrando que já “mataram” a psicopatolo- gia, substituída pelos infantis inventários e protocolos, os quais alargam os diagnósticos, a permitir que cada vez mais pessoas tenham algum transtorno mental e, consequentemente, a justi- lCAR�MAIS�RECEITAS�E�MAIOR�VENDA�DE�REMÏDIOS��/�ATUAL�ACINTE�Ì� nosologia vai no mesmo sentido: agora, em vez de um transtor- no psiquiátrico, dois. AR QU IV O PE SS OA L/ SH UT TE RS TO CK N O�lNAL�DA�DÏCADA�PASSADA�NASCEU�NA�%SPANHA�E�EM�0OR- tugal a curiosa ideia de que um paciente pode ter dois diagnósticos principais ao mesmo tempo, por exemplo, esquizofrenia e toxicomania, epilepsia e alcoolismo, transtorno depressivo e vício em jogos de azar, transtorno ob- sessivo-compulsivo e dependência de tabaco, café, comida e daí por diante. A isso deram o nome de patologia dual. E hoje já é POSSÓVEL�IDENTIlCAR�SOCIEDADES�E�ASSOCIA¥ÜES�PROMOVENDO�VÉRIOS� eventos em diversos países sobre o assunto. Para se ter uma ideia, em março de 2017 ocorrerá o primeiro congresso mundial na Espanha sobre esse tema. Os inventores dessa concepção mos- tram-se, com todo o respeito, totalmente leigos em nosologia, que é uma ciência com regras, preceitos e leis, nascida da neces- sidade de organizar racionalmente os sinais e sintomas clínicos de uma doença, disciplinando a massa caótica e desorganizada das inúmeras moléstias e manifestações patológicas existentes. Em outras palavras, a nosologia é uma forma sintética para con- centrar e nominar a essência da moléstia, cujo conceito começou com Carlo Lineu (1707-1778, pai da taxonomia moderna) e foi se lapidando no correr dos séculos. A proposta da patologia dual é fracionar a doença, e isso BATE� DE� FRENTE� COM�O� PRIMORDIAL� PRINCÓPIO� DAS� CLASSIlCA¥ÜES�� segundo o qual é preciso colocar o máximo possível de sinais e sintomas clínicos em uma única entidade nosológica e não SUBDIVIDI LOS��0ARA�EXEMPLIlCAR��NO�SARAMPO�OBSERVA SE�INFEC- ção pulmonar, coriza, tosse com catarro, anorexia, conjuntivite e as características lesões maculopapulares eritematosas. Se o sarampo passasse pela avaliação dos “médicos duais”, certa- mente uns diriam que o paciente tem transtorno pulmonar e dermatopatia, enquantooutros acrescentariam transtorno do apetite e conjuntivite também. É preciso recordar que muitas doenças e perturbações men- tais podem apresentar-se com adições de todo o gênero. Hoje DIAGNÓSTICO partido em dois 100 projetos incríveis, com metragens e estilos dos mais variados para você se inspirar. 8ə�6ʝɻKɛ�ȫɏ�VɼʍUDGɛ� Loja /editoraescalaoficial Acesse www.escala.com.br e aproveite! /editoraescalaoficial Ou acesse www.escala.com.br APRESENTA JÁ NAS BANCAS! RESOLVER OS PROBLEMAS E MELHORAR O VISUAL DO SEU LAR FICOU AINDA MAIS FÁCIL.