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Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 40 Unidade II 5 10 15 20 25 O agir ético é buscar a ação desinteressada, a universalidade de valores e homens como portadores de história e de dignidade. Ser ético é ser responsável. 3 ética profissional Se entendermos ética como a conduta do ser humano em sua comunidade e em sua classe profissional, uma reflexão mesmo que superficial, pode nos levar a ponderar que um tipo de conduta nem sempre tem o mesmo valor social nos diferentes tempos históricos. Algumas normas de conduta desaparecem, uma vez que o conhecimento científico nos convence de que tal atitude, longe de proteger o tecido social, pode levar ao esfacelamento da sociedade. Isso porque a ética não é imutável. Sendo racional por excelência, tudo que a ciência nos prova como erro altera nossa maneira de pensar uma determinada atitude. Por exemplo, até a segunda guerra o valor “coragem” era entendido como a capacidade do homem de matar em defesa de seu país ou nação. A tolerância era vista como fraqueza e falta de honra, tanto que qualquer ofensa era motivo para duelo entre dois homens. Hoje, não só se alterou o sentido, como coragem tornou-se um valor também feminino. Coragem hoje é a luta metafórica. É buscar agir de acordo com o coração, para pôr em prática projetos pessoais, independentemente do que outras pessoas pensem. É ir além dos limites físicos e psicológicos para promover o bem. E a Tolerância (assim mesmo com letra maiúscula) é para muitos filósofos a virtude ética fundamental, num período histórico em que pessoas das mais diversas etnias, culturas e religiões devem (imperativo ético) cooperar entre si, para defender a vida de nosso maior bem comum: o planeta Terra. A coragem e a tolerância são exemplos de virtudes cujo sentido foi alterado com o tempo. 5 10 15 20 25 30 Unidade II Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 41 Ética Geral e Profissional Como é sabido, o Brasil faz parte do que se convencionou chamar civilização ocidental. No ocidente, as ações consideradas éticas são dirigidas por valores construídos durante o processo civilizatório. Tal processo inclui desde o decálogo mosaico, passando pelas inovações cristãs de caridade, solidariedade, igualdade e fraternidade, até as contribuições do pensamento humanista cuja ideia de moral se funda na razão, e, portanto, o agir ético é buscar a ação desinteressada, a universalidade de valores e os homens como portadores de história e de dignidade. Assim, construiu-se no ocidente capitalista e liberal a convicção de que cada pessoa é portadora em sua humanidade de todo o universo civilizatório, sendo insubstituível e livre, mesmo quando suas ações são contrárias às leis e aos costumes. Foram essas reflexões que permitiram ao Ocidente a promoção de constituições de direito pleno e de órgãos internacionais e nacionais de defesa dos direitos da pessoa humana, denunciando internacionalmente as nações, instituições e pessoas que os desrespeitam. Por exemplo: Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana - ONU, 1948. Uma pessoa ética não só deve pautar seu comportamento dentro de normas de conduta consideradas civilizadas, mas estar sempre em busca de uma reflexão teórica que analisa, critica ou legitima os fundamentos e princípios que regem um determinado sistema moral. Não é raro na história o surgimento de filósofos ou profetas que propõem um sistema ético criticando a moral vigente e propondo uma revolução nos valores e normas estabelecidos na sociedade. Sócrates, por exemplo, questionou, com sua filosofia, os valores da democracia ateniense; Jesus, com sua prática e ensinamentos, criticou profundamente a moral judaica do seu tempo; os filósofos iluministas e os reformadores protestantes demonstraram que a sociedade cristã, nos séculos XVI e XVII, havia se afastado dos valores morais cristãos. Na verdade, a experiência ética fundamental para os dias de hoje é justamente essa sensação de “estranhamento” frente Uma pessoa ética não só deve pautar seu comportamento dentro de normas de conduta consideradas civilizadas, mas estar sempre em busca de uma reflexão teórica que analisa, critica ou legitima os fundamentos e princípios que regem um determinado sistema moral. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 42 Unidade II à realidade. É uma capacidade que vem da reflexão sistemática e metódica sobre o que é o bem comum e que nos faz perceber que algo está fora da normalidade, isto é, o modo como funciona a sociedade ou até mesmo o modo de ser e agir de outrem não têm coerência com aquilo que a ética nos ensina como modo de vida que produza o bem comum. Se antes essa experiência ética fundamental ocorria a cada milênio ou séculos, hoje, devido à velocidade de tudo, ela é uma constante, sobretudo na esfera profissional; portanto, ser ético hoje é mais do que nunca estar refletindo entre o que eu devo fazer e como eu devo agir em tal situação, quando tenho que escolher entre meu desejo e o meu dever, entre um bem comum e o bem de alguns. Essa situação de escolha é o dilema ético, companheiro constante de um profissional no mundo pós-moderno. 3.1 as origens da ética profissional A experiência ética fundamental para os protestantes puritanos nos séc. XVI e XVII inaugura a ética profissional moderna. Eles perceberam que a práxis dos cristãos, nessa época, era bem diferente daquilo que a Bíblia pregava. Naquele tempo, devido ao poder político da Igreja Católica, moral confundia-se com religião e com ética. Isso foi provado por Weber em seu livro A ética protestante e o espírito do capitalismo (1996). Diz ele que o que denominamos ‘vocação’, ou seja, o sentimento de amor e realização em algum tipo de trabalho, é que nos leva a um plano de vida; nem os povos predominantemente católicos, nem a Antiguidade Clássica conheceram um termo equivalente. Os protestantes, nesse período, e só eles ao longo da História, ao traduzir a Bíblia, alteraram o sentido da palavra para justificar a nova mentalidade burguesa. Na Bíblia, a palavra vocação significava um chamamento, uma ordem divina para sair do mundo e dedicar a vida a Deus em conventos e monastérios. Devido à mentalidade – de reforma da religião cristã - do Dilema ético consiste na dúvida de escolha entre o que desejo fazer e o que devo fazer. É uma escolha entre um bem e outro bem. 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 43 Ética Geral e Profissional tradutor, ela passa a ser interpretada como chamamento divino, para agir no mundo e transformá-lo para a glória de Deus; construir o reino de Deus no mundo, por meio do trabalho. Desse modo, a palavra vocação ganha um novo sentido, o sentido que damos a ela até hoje, e o valor que até então era dado ao trabalho é alterado. O trabalho deixa de ser uma punição para se tornar (até hoje o vemos assim) uma salvação e um projeto coletivo de promoção do bem comum e da felicidade geral. Portanto, essa mentalidade que resultará no espírito do capitalismo é produto da Reforma Religiosa Protestante. Também é produto da Reforma a valorização do cumprimento do dever nas profissões, ao se fazer o trabalho da forma mais perfeita possível, como se o labor cotidiano demonstrasse a presença divina na execução das tarefas; e mais, comose todo o trabalho fosse feito para o próprio Deus. Como acreditavam que a qualquer momento o Cristo encarnado poderia voltar para julgar os seres humanos de acordo com sua conduta, era imprescindível que o crente estivesse sempre trabalhando segundo uma disciplina rígida. Os valores de disciplina ascética, poupança, austeridade e dever foram incorporados ao mundo do trabalho, relacionando-se assim o conceito de competência à ética profissional do mundo capitalista até os dias atuais. Quando Kant escreveu Crítica da razão prática, em 1788, em que desenvolve sua reflexão sobre o desinteresse e a universalidade como pilares da moral para construir sua noção de dever. Tais valores já eram praticados na vida cotidiana dos protestantes puritanos. Os textos orientam as diversas práticas profissionais, quando definem profissão como “trabalho que se pratica com habitualidade a serviço de terceiros” ou quando reforçam que a profissão além da utilidade para o indivíduo é uma rara expressão social e moral; ou, ainda, considerando-a alta expressão de humanidade. A profissão A palavra vocação significava um chamamento, uma ordem divina para sair do mundo e dedicar a vida a Deus em conventos e monastérios. Ela passou a ser interpretada como chamamento divino sim, mas para agir no mundo e transformá-lo para a glória de Deus. Construir o reino de Deus no mundo, por meio do trabalho. Os valores de disciplina ascética, poupança, austeridade e dever serão incorporados ao mundo do trabalho, relacionando-se assim o conceito de competência a ética profissional do mundo capitalista até os dias atuais. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 44 Unidade II permite ao indivíduo ao mesmo tempo status social e realização plena. Por meio da profissão provamos nossa capacidade, habilidade, sabedoria e inteligência. Ela treina nossa personalidade para vencer os obstáculos, entre eles o domínio de nossos desejos e paixões. Na verdade, tais textos desenvolvem um raciocínio de acordo com a ética kantiana: liberdade, virtude da ação desinteressada (boa vontade) e preocupação com o interesse geral definem as modernas morais do dever. Como vimos acima, essa ideia do dever gerou de maneira indelével na cultura ocidental a ideia do mérito, pois só as pessoas são capazes de compreender a importância do dever. Se a alguém consegue vencer seus interesses privados e praticar ações que levem ao interesse comum, ela se supervaloriza, ela se torna competente. A competência, sobretudo a profissional, é um valor fundamental da ética profissional na civilização ocidental. 3.2 a competência como valor fundamental da ética profissional Competência, na sua raiz etimológica, significa saber fazer bem. E se procurarmos o significado do advérbio, “bem” indica algo que diz respeito tanto à verdade, do ponto de vista do conhecimento, como ao valor, do ponto de vista da atitude que se exige do profissional. Ser competente é saber fazer bem o dever. Ao dever articulam-se, além do saber, o querer e o poder. É fundamental um saber, o domínio dos conteúdos específicos da atividade profissional, mas esse saber perde seu significado se não estiver ligado a uma vontade política (no sentido de vida em sociedade), a um querer que determina a intencionalidade do gesto para com o outro no espaço do trabalho. Esse gesto não se exerce, se não se contar com a liberdade enquanto poder de direcionamento do processo. Somos seres sociais e, desta maneira, nosso caráter, nosso espírito e atitudes são construídos socialmente, isto é, tudo o que sentimos, pensamos e nossos valores (o certo e o errado, o bem e o mal, o belo e o feio) nos foram ensinados. E, não só pelas nossas famílias, cursos, Por meio da profissão provamos nossa capacidade, habilidade, sabedoria e inteligência. Ela treina nossa personalidade para vencer os obstáculos, entre eles o domínio de nossos desejos e paixões. Ser competente é saber fazer bem o dever. Ao dever se articulam, além do saber, o querer e o poder. 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 45 Ética Geral e Profissional grupos, mídia, mas também por todo o nosso entorno social. Alguns filósofos têm representado os seres humanos como aprendentes. Assim, a competência profissional, que é um valor ético profissional, foi, durante toda a modernidade, ensinada pelas gerações de profissionais anteriores à nossa na carreira que escolhemos. Enfim, quando se ingressava numa carreira, os profissionais mais velhos ensinavam o habitus ético da categoria profissional a que iríamos pertencer por toda nossa vida. Carreira significava originalmente, na língua inglesa, uma estrada para carruagens, e, como acabou sendo aplicada ao trabalho, terminou por ter o sentido que hoje damos ao conceito: um canal para as atividades econômicas de alguém durante a vida inteira (Sennet,1999, p. 9). O conceito de habitus foi criado pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu para a análise da realidade social, hoje tão fragmentada e com um tão grande número de subculturas, que o conceito de classe social não é mais confiável. O conceito de classe social foi um instrumento de análise social até mais ou menos a década de 80 do século XX. Até esse momento, a inserção individual era bem definida na esfera da produção da sociedade capitalista. Aprendia-se uma profissão trabalhando nela. Até a instalação do capitalismo flexível, entre as décadas de 80 e 90 do século XX, havia três possibilidades de se inserir no mundo do trabalho; a carreira na indústria, onde se entraria como aprendiz de operário aos 14 anos ou menos, com instrução elementar (as séries iniciais bastavam desde que se soubesse ler e escrever e realizar as quatro operações); como profissional técnico burocrático, com educação de nível médio/ técnico; ou profissional liberal, para aqueles de famílias com recursos econômicos suficientes para bancar os estudos até a universidade. Havia ainda a classe dos donos do capital, como consequência direta do poder político que tinha uma educação elitista, quase 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 46 Unidade II sempre na Europa ou mais recentemente nos Estados Unidos. Essas classes se reproduziam por meio da ideologia que permeia a cultura de classe. O setor de serviços era exclusividade e dever do Estado, que era forte e regulava com rigidez as relações entre capital e trabalho, por meio de leis construídas historicamente, com a luta política da classe trabalhadora e dos partidos políticos com ela comprometidos. Denominado “welfaire state” ou Estado do bem-estar social, o Estado democrático estava compromissado com as classes que o apoiavam politicamente. Todos os setores sociais tinham compromissos e obrigações que as estruturavam por meio da cultura. Costuma-se definir cultura como um conhecimento coletivo que pode ser percebido nas interações sociais, mas também como um conjunto de conhecimentos, ideias e crenças que foram acumulados na memória social. Por isso, cultura implica princípios, modelos, esquemas de conhecimento geradores, conservadores e, muitas vezes, regeneradores1 de ideologias que dirigem a consciência coletiva. Ora, a linguagem e o mito são elementos constituintes da cultura; então A cultura não contém somente uma dimensão cognitiva; ela é um instrumento cognitivo, cuja prática é de natureza cognitiva. Neste sentido,poderíamos dizer – metaforicamente – que a cultura de uma sociedade é uma espécie de complexa mega-unidade de cálculo que armazena todas as entradas (informações) cognitivas e, por dispor de propriedades quase lógicas, (...) formula normas praticas, éticas e políticas dessa sociedade (Ortiz,1994, p. 72-73). Assim, cada indivíduo ao ingressar no mundo do trabalho adquiria não só a competência, mas a produtividade, a sociabilidade, a honestidade, fidelidade, o zelo, e o sigilo – valores essenciais da ética profissional com seus companheiros no próprio cotidiano de labor e durante uma vida inteira. Vivemos, hoje, na era da informação e do capitalismo flexível, fragmentam-se a burocracia e a rotina do trabalho, mudando-se até a terminologia O setor de serviços era exclusividade e dever do Estado, que era forte e regulava com rigidez as relações entre capital e trabalho, por meio de leis construídas com a luta política da classe trabalhadora e dos partidos políticos com ela comprometidos. 1 Segundo Adorno, essa capacidade da cultura de regenerar mitos e crenças, às vezes muito antigas, pode ter sido a responsável pela barbárie do nazismo e o consequente holocausto dos judeus. Cada indivíduo ao ingressar no mundo do trabalho adquiria não só a competência, mas a produtividade, a sociabilidade, a honestidade, fidelidade, o zelo, e o sigilo – valores essenciais da ética profissional com seus companheiros no próprio cotidiano de labor e durante uma vida inteira. 5 10 15 20 25 30 35 5 10 15 20 25 30 35 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 47 Ética Geral e Profissional que usamos para ele. A palavra “job” (serviço, emprego), em inglês do século XIV, queria dizer um bloco ou parte de alguma coisa que se podia transportar numa carroça de um lado para outro. “A flexibilidade hoje traz de volta esse sentido arcano de job, na medida em que as pessoas fazem blocos, partes de trabalho, no curso de uma vida” (Sennet,1999, p. 9). Atualmente, o mundo do trabalho não permite que tenhamos planos de uma carreira para a vida toda e, muito menos, as certezas de nossos avós que, devido à certeza que uma sociedade estruturada em valores duros lhes dava, poderiam prever toda uma vida. Tomemos, por exemplo, um operário. Aos 14 anos, ele poderia planejar sua vida: ingressar como aprendiz numa grande fábrica e sonhar com ascensão profissional, chegar a chefe de secção, casar-se, morar na vila operária, pagar mensalmente as prestações da casa; enquanto os filhos cresciam, ensinar-lhes sua profissão e os atributos morais ligados a ela; instruí-los na luta sindical, a votar nos partidos da classe trabalhadora, ter a carteira assinada e os direitos de assistência social. Esse trabalhador (junto com outros) construiá uma rede de solidariedade geralmente ligada ao sindicato, às associações de bairro ou a comunidades religiosas. Poderia ter acesso a um conjunto de orientações burocráticas para organizar suas experiências a longo prazo. As leis estruturavam rigidamente salários, benefícios e pensões. Assim, ao final da vida, podia aposentar-se e ingressar numa velhice achacada por doenças profissionais, mas tranquila dentro dos mesmos valores morais, religiosos e éticos, da mesma vila e junto à mesma comunidade em que nascera ou para onde migrara. Em São Paulo, podemos perceber ainda essas vilas em regiões de grande concentração de fábricas no início do século XX. Por ex.: Brás, Barra Funda Jaçanã, Mooca, entre outros. A competência é um valor ético fundamental do mundo profissional. De nada adianta praticar todos os princípios éticos, se não tivermos a competência necessária para nosso trabalho. Afinal, é impossível até ser honestos no campo profissional É impossível até ser honestos no campo profissional se não tivermos competência, pois faremos os mais simples registros contábeis com erros graves, prejudicando o erário público, a empresa e nós mesmos enquanto profissionais. 5 10 15 20 25 30 35 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 48 Unidade II se não tivermos competência, pois faremos os mais simples registros contábeis com erros graves, prejudicando o erário público a empresa e nós mesmos enquanto profissionais. Cada vez que eu faço um trabalho ele me lança desafios novos que só poderão ser resolvidos ao buscar novas teorias. Sempre foi assim nessa sociedade, em que, desde o início, tudo é feito em termos de balanço e de previsão dentro de operações racionais, em que toda a ação individual é baseada em cálculo. Hoje, ainda mais, pois o novo é novo para todos e não podemos contar, como as gerações anteriores, com que os mais velhos de profissão e ou de empresas nos ensinem competências. A “descoberta” da perspectiva ética presente na competência profissional pode contribuir para uma melhoria na qualidade do trabalho que fazemos, se formos competentes em nosso espaço profissional. Isso se consegue vivendo de maneira relacional entre teoria e práxis na nossa profissão. A teoria se consegue por meio do saber cientifico historicamente acumulado; ao aplicá-la (a práxis) vou ter que buscar novos saberes que me possibilitarão outras formas de ação competentes e assim sucessivamente. Há uma relação dialética entre saber e fazer. Outro valor ético fundamental nas relações de trabalho dentro da burocracia capitalista é o zelo, que consiste no cuidado amoroso com os instrumentos do trabalho, e na própria execução da tarefa como se estivéssemos trabalhando para a própria divindade. Faz parte do zelo profissional o cuidado com a higiene pessoal e com tudo que se relaciona com o corpo do profissional e com sua aparência dentro dos hábitos do grupo de trabalho de que faz parte. Além disso, deve haver em cada um de nós o sigilo, que é a capacidade de não revelar a ninguém que não componha os quadros da empresa as informações que só interessam aos profissionais da organização. Ao sigilo se refere o falar baixo e claro dentro da empresa, bem como evitar comentários da vida privada, tanto nossa como de outrem. O zelo que consiste no cuidado amoroso com os instrumentos do trabalho, e na própria execução da tarefa como se estivéssemos trabalhando para a própria divindade. O sigilo é a capacidade de não revelar a ninguém que não componha os quadros da empresa as informações que só interessam aos profissionais da organização. 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 49 Ética Geral e Profissional Por fim, temos a honestidade como valor ético profissional fundamental. Do latim, honestus, sinônimo de honoris status, tem a ver com o homem íntegro e virtuoso. A honestidade é diferente da coação externa, feita, por exemplo, por medo ou culpa. Não é o mesmo que sinceridade. Valor de respeito ao outro e ao coletivo é construído a partir de várias formas de educação que recebemos. Ninguém nasce honesto. A honestidade é uma construção do entorno social. Honestidade significa a capacidade de respeitar a propriedade alheia. Por propriedade alheia se entende desde o dinheiro até o computador e tudo que a ele se refere. É antiético colocar, por exemplo, fotos de parentes nossos no computador, onde deveria estar o logotipo da empresa. Não existe meia honestidade. Todo o material da empresa está sob nossa guarda para ser utilizado apenas e tão somente em serviços profissionais, jamais em trabalhos pessoais. Até inconscientementeas pessoas pressentem o risco de caos que seria viver entre desonestos. A competência, o zelo, a honestidade e o sigilo se relacionam de maneira dialética. Quando desenvolvemos um desses valores acabamos por desenvolver todos os outros. Além disso, lembramos que ética é conduta e que conduta se muda pelo exemplo. Pode ocorrer que, se cada um de nós tiver valores éticos fortes, possamos elevar o nível de conduta e de aspiração para o grupo de trabalho a que pertencemos. 3.3 construir uma vida ética profissional factível A ética ocidental nos impõe um conjunto de valores que norteiam nossa conduta e que fundamentam as nossas opções entre o bem e o mal, o justo e injusto. Tais opções correspondem à única forma possível de liberdade. Liberdade que gera a responsabilidade por nossos atos e pelo “bem viver” dos outros, sobretudo os mais fracos e dependentes. Isso será possível se cumprirmos bem nosso dever. Agir de acordo com os nossos 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 50 Unidade II deveres como cidadãos, profissionais e pessoas nos levará a gerar laços de solidariedade. Para melhorar o mundo hoje, o viver solidário é o traço fundamental para recuperarmos o “viver” ético nas relações de trabalho, nas organizações empresariais públicas ou privadas e na sociedade como um todo. Agimos quase automaticamente dentro daquelas normas de conduta que nos foram ensinadas pelo nosso entorno social ao longo de nossas vidas. As normas de conduta que dirigem nossas ações no cotidiano (ética que temos) são pautadas em valores. Tais valores formam as crenças que foram construídas ao longo de nossas vidas pelas convicções políticas, pelo exemplo de comportamento de família, pela educação escolar, pelos amigos, pela TV e pelo rádio, pela religião, pela cultura e pelos companheiros mais velhos de profissão, entre outros. No Brasil, hoje, há duas éticas distintas e antagônicas: de um lado, a ética do capitalismo neoliberal (que inverteu a ética protestante original e colocou o poder no lugar do dever) competitivo, narcisista, individualista e centrado nas leis do mercado e regido pelo lucro; por outro lado, a ética da solidariedade, do amor ao próximo, da compaixão não só pelos seres humanos, mas por toda forma de vida, da tolerância com o outro que, sendo diferente, não deixa de ser fraterno para mim. É a ética pela qual clama a sociedade civil, os movimentos pelos direitos sociais e as religiões. É urgente que reflitamos sempre sobre a diferença entre o que temos a fazer e o que devemos fazer. Examinando constantemente as questões que se encontram em jogo nas nossas ações quer pessoais, profissionais ou políticas, de preferência em comum com os mais diversos grupos a que pertençamos, podemos nos tornar profissionais mais livres e justos e promotores do bem comum. Para evitar a rede da antiética que está por todos os lados e que pode nos seduzir com facilidades e “jeitinhos” e que nos pode levar à escravidão dos vícios e à prisão por crimes, É urgente que reflitamos sempre sobre a diferença entre o que temos a fazer e o que devemos fazer. 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 51 Ética Geral e Profissional longe, portanto, da felicidade pessoal que os fundadores do capitalismo e da ética profissional sonharam para nossa época. Somente por meio dessa reflexão constante e profunda é possível favorecer um projeto mais consistente de sociedade e de trabalho condizentes com a essência humana de busca da felicidade, o que só será possível se houver plenitude da tolerância e do respeito à dignidade humana. Precisamos ter coragem para colocar a ética em primeiro lugar, para não permitir que nossas mentes se fechem para o sofrimento do outro. Coragem para estar abertos às mudanças e pensar em novas questões que a princípio possam parecer extremadas; e, acima de tudo, precisamos ter coragem de agir e de buscar soluções para as nossas preocupações políticas e sociais. Coragem para tomar decisões éticas que contribuam para o planejamento de nosso futuro comum, participando ativamente em nossa comunidade. Isso é essencial para todos os profissionais e cidadãos. Afinal, vivemos numa sociedade em rede cujo valor fundamental é a tolerância. Cuidando do outro como de nós mesmos, pode nascer uma revolução, porque esse modo de agir toca o outro, que se interroga e sente o desejo de começar e experimentar também. Desse modo, são recuperadas as razões da convivência e as motivações das exigências éticas. Somente os valores éticos, já que são uma síntese de todo o processo civilizatório, podem fortalecer o tecido social e melhorar a convivência humana. Na verdade, a ética necessita ser construída e reconstruída em cada pessoa e em cada geração, no dia-a-dia da vida, a partir das pequenas coisas. Como diria Renato Russo: “disciplina é liberdade e compaixão é fortaleza”. 3.4 os desafios e propostas para a prática da ética profissional Hoje, parafraseando Edgar Morin, a única certeza que temos é que não temos certeza. O campo de trabalho criou uma cultura, se é que o podemos chamar por esse nome, onde tudo é efêmero: 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 52 Unidade II as comunicações eletrônicas substituíram o senso de comunidade e os contratos substituem o conjunto burocrático. Há uma frequência de mudança de emprego que põe em cheque a noção de responsabilidade. A carreira tradicional, que avança passo a passo pelos cargos de uma ou duas instituições ao longo da vida, e também a utilização de um único conjunto de qualificações no decorrer de uma vida de trabalho estão fenecendo. Como construir no mundo atual a competência? E como desenvolver em curto prazo os compromissos de lealdade e solidariedade? De que maneira é possível o sigilo, como valor ético, se a posse de uma informação nova é capital para ingresso em uma empresa concorrente e com salários mais altos? A “descoberta” da perspectiva ética presente na competência profissional pode contribuir para uma melhoria na qualidade do trabalho que fazemos? Nada se fez até agora com base apenas no fervor e na espera. É preciso agir de outro modo, entregar-se ao trabalho e responder as exigências de cada dia – tanto no campo da vida comum, como no campo da vocação. Este trabalho será simples e fácil, se cada qual encontrar e obedecer ao demônio que tece as teias de sua vida (Weber, 2000, p. 52). Ao obedecermos ao demônio que tece as teias da vida, aceitamos o desafio de lecionar ética profissional para uma geração que está constantemente ensinada pelo entorno social, inclusive religioso, para uma verdadeira civilização do indivíduo; em que se privilegiam o narcisismo, o consumismo de objetos tornados pessoas e pessoas objetos, além de uma competitividade exacerbada. Para isso, tivemos de primeiro saber o significado da palavra “desafio”. O dicionário dá o seguinte conceito de desafio: “ato de proposição de combate de luta”. Se o relacionarmos com a 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 35 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 53 Ética Geral e Profissional ética profissional, tem razão de ser a proposição do tema, considerando, de um lado, que irá tratar de uma situação que inspira cuidados, de uma circunstância que prenunciaum mal para alguém ou para alguma coisa e, de outro, que, sendo tal consideração, deverá desembocar consequentemente num incitamento a um combate, a uma luta. Cremos que insistir em determinadas ideias é de fundamental importância num momento como o atual. Hoje, as organizações operam como estruturas de rede flexível, frouxa, e não têm um comando de cima para baixo que determinar um código ético a ser seguido. As empresas tendem a deixar para o profissional a culpa por deslizes no campo ético. A cobrança social e as possíveis punições recairão sobre o contador. É o profissional que recebe as demandas por ética de parte dos cidadãos, atualmente vistos por tais organizações apenas como consumidores ou clientes. Propomos uma ética profissional que esteja voltada para a ideia de que somos seres culturais por excelência e que os seres humanos constroem essa cultura, ao mesmo tempo em que são por ela construídos, graças ao recurso cognitivo da linguagem. Ela mesma foi historicamente elaborada a partir dos conhecimentos adquiridos, aptidões desenvolvidas, experiências vividas, consciência histórica e crenças místicas, em íntima solidariedade – portanto corpórea – com os demais membros da sociedade em que vivemos. Dessa maneira, os ‘simbolismos coletivos’, ‘consciência coletiva’ e ‘universo imaginário coletivo’ constroem as linguagens e são por elas, ao mesmo tempo, construídos. Como dissemos acima, a cultura determina não só as regras e normas que organizam a sociedade, como também o comportamento individual. Por isso, ao mudar as linguagens, mudam-se os comportamentos e, além de o inverso ser verdadeiro, ocorre um íntimo intercâmbio complexo entre conduta, visão de mundo e linguagens usuais. A linguagem, sendo respeitosa e ética, pode contribuir para uma ação ética no mundo do trabalho, uma vez que não é mais possível construir a ética profissional como era construída pelas gerações anteriores. As empresas tendem a deixar para o profissional a culpa por deslizes no campo ético. A cobrança social e as possíveis punições recairão sobre o contador. É o profissional que recebe as demandas por ética de parte dos cidadãos. 5 10 15 20 25 30 35 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 54 Unidade II O ser humano desenvolveu uma linguagem, diferente de outros animais, para solucionar as situações-problema do presente por meio de um conjunto de representações simbólicas que foram herdadas do passado – individual e/ou coletivo. Toda sua compreensão de um fenômeno qualquer envolve perspectivas de futuro. Dessa maneira, a linguagem, que é o veículo do pensamento, se tornou, com o tempo, um conjunto complexo. Nossas linguagens se estabeleceram em comunidades, voltadas ao trabalho ou para as festas das atividades agrícolas, o início de tudo. Comunidades eram voltadas aos ritos de passagem das fases da vida humana. Elas se fizeram e fizeram os seres humanos ao mesmo tempo. A linguagem é produto dos seres humanos, devido a nossa própria incapacidade de vivermos sós e nossa capacidade de previsão de nossas necessidades futuras. Resgatando-se a linguagem cordata, elegante, mansa e eficaz, talvez possa se resgatar a moral de nossos ancestrais na atividade profissional. Dessa maneira, devemos, sim, nos indignar eticamente quando as linguagens, aparentemente inocentes, utilizadas pelos nossos companheiros de trabalho ou por nós mesmos, denotarem um desrespeito à vida, de qualquer espécie. As regras e normas culturais geram os processos sociais e os regeneram, nem sempre para um mundo melhor, em critério global e dentro de uma complexidade social própria dessa cultura mundializada. Cuidar da linguagem, então, pode ser uma outra forma de zelo profissional. Cultura e sociedade, então, estão em interdependência generativa e, nessa interdependência, as pessoas nas suas interações umas com as outras estão, constantemente, produzindo uma nova cultura, que por ser nova nem sempre traz o melhor. Essas interações podem regenerar a sociedade, tal como se apresenta, mas podem também promover o retorno à barbárie que Adorno anunciava. Não podemos nos esquecer de que os dois males do mundo do escritório hoje, o assédio moral e o assédio sexual, têm sua origem em linguagens inapropriadas Resgatando-se a linguagem cordata, elegante, mansa e eficaz, talvez se possa resgatar a moral de nossos ancestrais na atividade profissional. 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 55 Ética Geral e Profissional às relações trabalhistas. Seria uma barbárie, um caos, numa sociedade da comunicação, uma linguagem fora dos padrões morais de conduta civilizada. Para aceitar o desafio de sermos éticos em nossa vida profissional, civilizando a Terra, primeiro temos que tomar consciência de que estamos no mesmo barco, isto é, o que acontece em qualquer lugar do planeta nos diz respeito. Se a angústia de tantos sofrimentos que temos causado aos filhos da Terra e seus ecossistemas e a incerteza com relação ao nosso futuro comum nos acercam, é importante lembrar que, como diria o próprio Morin, é o amor o antídoto à angústia. E, se só posso amar aquele em que me reconheço, a saída possível para civilizar a Terra é treinar nossos espíritos para reconhecermo-nos nos outros. Vê-los como nossos irmãos. É estar solidários com toda a criatura humana e ser responsáveis com a civilização. A salvação que o intelectual busca sempre é uma salvação de ‘aflição íntima’ e, por isso, por um lado de caráter mais estranho à vida, porém, por outro, de caráter mais profundo e sistemático do que a salvação da miséria concreta que é própria das camadas não-privilegiadas. O intelectual, por caminhos cuja casuística chega ao infinito, procura dar a seu modo de viver um sentido. (...) Quanto mais o intelectualismo reprime a crença na magia, ‘desencantando’ assim os fenômenos do mundo, e estes perdem seu sentido mágico, somente ‘são’ e ‘acontecem’, mas nada ‘significam’, tanto mais cresce a urgência com que se exige do mundo e da ‘condução da vida’, como um todo, que tenham uma significação e estejam ordenados segundo um sentido (Weber,1994, p. 343-4). 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 56 Unidade II 5 10 15 20 4 a ética profissional EM contabilidadE 4.1 o conceito de ética profissional Denomina-se ética profissional um conjunto ou série de normas que impulsionem o indivíduo à aquisição de hábitos e à formação do seu caráter de tal maneira que passe a agir em conformidade com o tipo de profissional que a sociedade construiu, ao longo da história, para uma determinada profissão. Tais normas constam de um código que inclui os deveres e os direitos que cada profissional deve possuir. Além do mais, tais normas contribuiriam para o viver harmônico do profissional com os seus pares de profissão dentro de uma organização. Algumas profissões estão tão intrinsecamente ligadas à ética – e a contabilidade é uma delas – e, muito antes de a sociedade pós-moderna clamar por valores éticos nas condutas de profissionais, elas já tinham um código normatizado para o agir profissional. Hoje, as pesquisas têm revelado que o comportamento ético ainda é o melhor caminho para o sucesso profissional de qualquer trabalhador e que a fama de profissional íntegro alarga a rede de relações com outros profissionais e empresas, promovendo a empregabilidade, fator tão importante em nossosdias. Se tais verdades valem para todos os profissionais ainda mais o seriam para profissões em que a ética é quase sinônimo de competência. Tal profissional contador ganhará, por certo, a confiança dos clientes e empregadores. Os valores estruturantes da ética profissional não surgiram da vontade de alguns empresários ou órgãos de classe. Eles possuem um respaldo filosófico construído ao longo da história da humanidade, sobre o qual foram desenvolvidos determinados padrões de comportamento especificos para determinadas atividades. Tais padrões podem ser utilizados, inclusive, como parâmetro para definir os limites de um Ética profissional é um conjunto de normas reunidas em um código que inclui os deveres e os direitos que cada profissional deve possuir. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 57 Ética Geral e Profissional determinado tipo de trabalho e o que se esperar ou não de determinada profissão. 4.2 a profissão contábil A profissão contábil é uma das profissões liberais. É uma profissão de vocação, isto é, conforme Weber (1997, p. 151), uma ocupação contínua do homem sob a divisão do trabalho, que é normalmente sua fonte de renda e, a longo prazo, a base econômica de sua existência. É expressa dentro de um conteúdo ético e derivada das obrigações compulsórias da velha comunidade cívica. O contabilista, por sua formação, pode ser designado contador. E, são assim chamados os bacharéis de ciências contábeis que, portanto, obtiveram formação em nível superior. Podem ser assim designados, também, os técnicos em contabilidade, aqueles que têm formação em nível médio e, no âmbito de sua profissão, podem atuar de muitas e diferentes formas. O código de ética profissional dos contabilistas especifica alguns tipos de trabalho que são privativos dos contadores. Aponta como área de atuação dos contabilistas: contabilidade privada ou pública, perícia contábil, auditoria interna ou independente, controladoria e consultoria. Nessas áreas, o contabilista pode atuar tanto como empregado quanto como empregador e, adicionalmente, como profissional liberal. Por força da profissão, a contabilista lida diariamente com aquele que é hoje apontado como um dos bens mais preciosos de uma economia: a informação, e, normalmente, informação relacionada com negócios pertencentes a terceiros. Tal fato, por si só, já é suficiente para demonstrar que esse profissional quase sempre se encontra com dilemas éticos. A profissão contábil é uma das profissões liberais. É expressa dentro de um conteúdo ético e derivada das obrigações compulsórias da velha comunidade cívica. Por força da profissão, o contabilista lida diariamente com aquele que é hoje apontado como um dos bens mais preciosos de uma economia: a informação, e, normalmente, informação relacionada com negócios pertencentes a terceiros. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 58 Unidade II Atuando no setor privado, o contador tem conhecimentos de informações estratégicas dentro de qualquer empresa como, por exemplo, custo unitário de produtos, taxa de juros praticada, seja como aplicador, seja como captador de recursos, no planejamento operacional e estratégico e nas decisões de investimentos. No setor público, o contador tem conhecimentos abrangentes do orçamento do órgão ao qual se acha vinculado, aqui incluídos os projetos, nível de despesas correntes ou de capitais. Enquanto auditor, o contador é chamado a opinar a respeito de trabalhos elaborados por profissionais de sua própria classe e sobre as demonstrações contábeis das empresas por ele auditadas, pois deve ter conhecimento completo de todas as informações relevantes da empresa. O comportamento esperado do contabilista, enquanto administrador de pessoas, iguala-se ao comportamento esperado de qualquer outro profissional na mesma situação. A discussão a respeito da administração de pessoas passa, obrigatoriamente, pela discussão da questão da liderança. Muitas características são normalmente apontadas como componentes necessários à personalidade de um líder, como honestidade, carisma, coragem, honradez, denodo, polidez e, sobretudo, a capacidade de perceber os talentos de seus colaboradores. Em qualquer ramo de atividade humana (artes, ciência, política, religião) podem ser encontrados exemplos de liderança. Qualquer que seja a definição dos papéis de um líder, é certo que ele terá sempre a responsabilidade de conduzir pessoas com o intuito de alcançar determinado objetivo. O contador pode muito bem assumir a liderança em qualquer tipo de empresa, sobretudo nos dias atuais, em que a tecnologia o libertou do trabalho exaustivo de guarda-livros. Hoje, vivemos no que se convencionou chamar sociedade da informação, em que a informação é capital e mercadoria. São componentes necessários à personalidade de um líder: honestidade, carisma, coragem, honradez, denodo, polidez e, sobretudo, a capacidade de perceber os talentos de seus colaboradores. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 59 Ética Geral e Profissional Todas as decisões tomadas, envolvendo as atividades de uma empresa, qualquer que seja o nível dessa decisão, têm por base algum tipo de informação. Nesse contexto, o papel do contabilista é importante, uma vez que as informações relacionadas ao capital e aos bens da empresa estão sob seu controle. Muitas pessoas necessitam e, efetivamente, fazem uso de informações que cotidianamente são elaboradas pelos contabilistas. Entre os principais usuários das informações contábeis estão: os proprietários de empresas, seus administradores, o governo, os fornecedores de produtos e serviços, os clientes das empresas, as instituições financeiras e os investidores. Cada usuário requer um tipo específico de informação, que é utilizada para tomada de decisões dentro de seus interesses econômicos. Os proprietários das empresas buscam, junto aos contabilistas, informações que lhes indiquem maior rentabilidade para seus investimentos. Administradores de empresas necessitam de informações confiáveis que lhes permitam conduzir com segurança o negócio administrado. Mas, não é só isso, também os órgãos governamentais buscam informações sobre andamento de projetos sociais. É no aspecto tributário que os contadores são essenciais: na provisão, na distribuição e no recolhimento de impostos que financiem o bem comum. Cabe ao contabilista um papel preponderante na licitação de obras públicas a cargo de empresas privadas. O papel do contador é suprir, com as informações desejadas, cada um desses usuários de informações, sem buscar o benefício ou o privilégio de qualquer um em particular. Para alcançar a excelência profissional, o contabilista deve comportar-se de maneira irrepreensível, probo e, acima de qualquer tipo de corrupção. Sempre que se achar em dilema ético, o profissional deve buscar refúgio no código de ética profissional e na ética de Entre os principais usuários das informações contábeis estão: os proprietários de empresas, seus administradores, o governo, os fornecedores de produtos e serviços, os clientes das empresas, as instituições financeiras e os investidores. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 60 Unidade II modo geral, uma vez que, assinando os documentoscontábeis, é sobre ele que recairão as punições cabíveis. Não é possível mentir para todos, o tempo todo, já diriam os antigos, e a mídia, o quarto poder de uma sociedade democrática, tem constantemente denunciado os casos de corrupção, improbidade e sonegação fiscal1. Devemos lembrar que os órgãos de defesa da profissão existem para nos proteger, pois é muito difícil a luta do trabalhador sozinho frente ao Capital. Costuma-se denegrir a imagem do contabilista, mas muitas vezes injustiças ocorrem com o profissional. É por isso que os órgãos de classe só admitem como contador aqueles que apresentarem sua habilitação legal para o exercício da profissão. O exercício da profissão do contabilista na Brasil exige, além da formação escolar em nível médio ou em nível superior, que o profissional esteja devidamente registrado em um conselho regional de contabilidade, autarquia federal a quem compete o registro e fiscalização da profissão. O exercício da profissão, sem que o profissional se encontre devidamente registrado em seu Conselho Regional de Contabilidade (CRC) de origem, configura crime e sujeita o infrator às penalidades impostas pelo CRC, sem prejuízo de outras penalidades civis ou criminais. Mais que isso, coloca em dúvida a validade das informações por ele elaboradas. Devemos lembrar que esses órgãos defendem a profissão e como vimos acima o princípio ético de qualquer profissão é a competência. Sem um saber fazer, provado pelo diploma, é impossível exercer com competência uma profissão. O profissional não capacitado que aceita a tarefa de executar determinado trabalho coloca em risco não apenas sua reputação, mas a da própria categoria profissional que um dia pretende assumir, pois, sem as competências necessárias, pode induzir 1 Corrupção: quando se recebe algo para fazer ou deixar de fazer alguma coisa. Improbidade: quando o funcionário público ganha algum valor para fazer algo em favor de alguém. Sonegação fiscal: a não-contabilização de recursos monetários. Os órgãos de defesa da profissão existem para nos proteger, pois é muito difícil a luta do trabalhador sozinho frente ao Capital. 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 61 Ética Geral e Profissional os usuários das informações por ele elaboradas a decisões equivocadas. Como sabemos, dentro da nova administração está o conceito de otimização de recursos, e , no Brasil, tal conceito significa: pagar o menor salário possível. Assim, muitos gestores admitem estagiários para fazer o trabalho de profissionais. Infelizmente para a categoria, vários não formados fazem o trabalho e só um formado assina. Essa prática, do “jeitinho” brasileiro, acaba concorrendo para o aviltamento da profissão contábil. Atuando como contador nas empresas, o profissional contador, seja ele um bacharel em ciências contábeis, seja um técnico em contabilidade, como empregado ou por conta própria, precisa conhecer de maneira profunda os princípios fundamentais de contabilidade, tanto os em vigor no Brasil, como aqueles em vigor no país de origem da empresa, quando for o caso de ela não ser brasileira. Vale destacar que esse conhecimento implica atualização constante: conhecer profundamente o sistema tributário do país, especialmente no que diz respeito aos tributos inerentes à atividade da empresa; conhecer de forma ampla a atividade da empresa, aqui incluído o seu mercado de atuação; conhecer de maneira clara o modelo de decisão dos usuários das informações contábeis. Sendo portador dos conhecimentos apontados, e dos outros mais específicos para cada caso, resta ao profissional aplicá-los de forma adequada. Nesses termos, um princípio de orientação geral seria elaborar as informações contábeis respeitando as regras a elas inerentes, tanto as externas à empresa (princípios fundamentais de contabilidade e leis do país), quanto as internas, baseadas no modelo de decisão da empresa. 4.2.1 Exemplos de pressão do patronato sobre o profissional contador O profissional, especialmente quando na condição de empregado da empresa, não deve deixar que sua eventual Atuando nas empresas, o profissional contador precisa conhecer de maneira profunda os princípios fundamentais de contabilidade. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 62 Unidade II dependência econômica ao empregador o obrigue a divulgar informações não verdadeiras. Atualmente, ocorrem muitos exemplos de situação em que o profissional pode pensar estar obrigado a atuar de maneira oposta a sua competência profissional. Vejamos alguns exemplos e de que maneira é possível encontrar saídas éticas: a. Alegando um suposto “planejamento tributário”, a direção da empresa resolve praticar determinadas transações que se caracterizam por verdadeira elisão de tributos. Portanto, o contador é convidado a “maquiar” o efeito das transações. Nessa situação, o profissional deve orientar a direção da empresa sobre os riscos que as transações trazem, mas, acima de tudo, deve recusar-se a seguir a orientação que lhe foi dada. b. Os dirigentes de uma empresa de capital aberto, para assegurar o sucesso de uma captação de recursos no mercado de valores mobiliários por meio da emissão de um lote de debêntures, resolvem divulgar para o mercado um prospecto com demonstrações que não refletem a realidade da empresa. Em situação dessa natureza, além de o profissional recusar-se a assinar as demonstrações, ele deve comunicar o fato aos órgãos competentes, entre eles, o conselho regional de contabilidade e a comissão de valores mobiliários. c. Um contador, por meio de suas análises de rotina, descobre que determinada transação realizada no mercado financeiro acarretou prejuízos para a empresa. Nesse caso, o profissional não pode agir privilegiando suas amizades pessoais, e, portanto, a operação deve ser imediatamente comunicada à direção da empresa. d. O contador de uma companhia de capital aberto sabe que a iminente divulgação do balanço da companhia demonstrará um ótimo resultado financeiro no exercício 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 63 Ética Geral e Profissional anterior. Tais resultados provocarão uma alta no valor das ações da companhia e, dias antes de a informação ser divulgada para o mercado, ele fornece essas informações para que pessoas ou empresas de suas relações pessoais comprem essas ações de maneira privilegiada. Nesse caso, o profissional estará agindo de má-fé, sujeitando-se às penalidades previstas nas leis, inclusive, quando for o caso, as penais. Este exemplo, de tanto acontecer nos mercados de capitais mundiais, recebeu até um conceito próprio em Inglês: é o insider information. 4.3 função social da profissão contábil na era da informação2 Na atual sociedade da informação, uma revolução está começando a ocorrer no seio das organizações, porque, apesar de não serem produtoras da informação, somente as empresas são capazes de transformar informação em produtividade e competitividade, em benefício dos clientes, colaboradores e parceiros. Na sociedade da informação conhecimento é poder. Mas, o verdadeiro poder não está na capacidade de produzir e operar a tecnologia de manipulação da informação e sim na capacidade de usar a informação para promover diferenciais e benefícios aos seus usuários. O contador é uma categoria das mais privilegiadas nessanova sociedade, uma vez que há muito tempo é o responsável pelas empresas para as quais presta serviços. A ampliação, bem como a solidificação do papel do contador, passa por duas formas distintas, mas interligadas de atividade: contribuir com a produtividade e contribuir com a competitividade dos seus clientes, além da otimização dos recursos. O contador pode contribuir de muitas maneiras para aumentar a produtividade de seus clientes. Vejamos alguns exemplos: 1. Redução de custos: são inúmeros os custos que o contador pode ajudar a reduzir para os seus clientes. Conseguem-se reduzir desde aqueles custos mais notórios, como por A ampliação, bem como a solidificação do papel do contador, passa por duas formas distintas, mas interligadas, de atividade: contribuir com a produtividade e contribuir com a competitividade dos seus clientes, além da otimização dos recursos. 2 Foi utilizado como base o texto de Milton Santos publicado na revista do SESCON, SP, ano 10, n° 120, nov/98. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 64 Unidade II exemplo, os custos fiscais e tributários, por meio da oferta de um bom planejamento tributário, até aqueles relacionados à operação do negócio pelo fornecimento de informações e análise crítica da estrutura de custos da empresa do cliente. Isso é possível por meio de relatórios bem estruturados, disponibilizados em tempo hábil e acompanhados de análises comparativas dentro do próprio segmento em que trabalha o cliente e de indicadores gerais de desempenho econômico-financeiro. 2. Racionalização das atividades: é a capacidade de interligar os processos executados internamente pela empresa e aqueles executados pelo contador externo, visando reduzir as duplicações de informações e retrabalhos. Neste tópico, o contador pode e deve lançar mão de todo o aparato tecnológico de equipamentos e programas disponíveis, hoje em dia, para oferecer simplificação de processos e agilidade aos seus clientes. Interligar computadores e sistemas de clientes e contadores, oferecendo em troca serviços adicionais, é um grande benefício para o cliente e garante a fidelidade do gestor, em relação ao seu contador. 3. Adequação de informações: embora legalmente existam padrões que devam ser seguidos, nada impede que o contador, utilizando uma mesma base de informações que possui, gere relatórios gerenciais adequados à linguagem e características culturais de seus clientes. A linguagem econômico-financeira não é o forte da maioria dos dirigentes de pequenas e médias empresas. Uma vez que o cliente percebe no contador uma fonte confiável de informações, análise e críticas de seu negócio, é possível estabelecer-se entre as partes um vínculo afetivo. É possível que a empresa do cliente cresça e se desenvolva. Uma das características do mundo atual é a rede de informação, assim, ao manter seu cliente satisfeito, pode-se contar com mais clientes. O contador pode contribuir, também, na construção ou no 5 10 15 20 25 30 35 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 65 Ética Geral e Profissional reforço da competitividade do seu cliente. Compreendemos, aqui, competitividade como a capacidade de uma empresa para manter-se e crescer no nicho do mercado com o qual e para o qual ela trabalha. Nesse aspecto, a contribuição do contador pode ser muito significativa e pode ocorrer de diversas maneiras. Vejamos alguns exemplos: 1. Elaboração de cenários: o contador é o profissional, por excelência, competente na compreensão e interpretação dos ambientes legal, fiscal, trabalhista e econômico do país. Elaborar, fornecer e discutir tendências sobre estes aspectos junto aos seus clientes permite que eles se preparem melhor diante dos riscos e aproveitem melhor as oportunidades que se apresentam no horizonte. 2. Informação sobre o segmento: num aprofundamento da qualidade e quantidade de informações que o contador fornece ao cliente devem ser incluídas perspectivas do segmento do mercado no qual o cliente é especializado. No seu trabalho cotidiano, o contador deve manter- se atualizado, buscando o maior número possível de informações sobre o mercado e que possam ser úteis aos seus clientes. Ao estruturar, interpretar e disponibilizar tais informações ao cliente, o contador contribuirá para que ele se torne mais capacitado e preparado para a competição no mercado. 3. Fornecimento de ferramentas gerenciais: todo aparato de gestão econômico-financeira que o contador possui por formação pode e deve ser disponibilizado a seus clientes, sobretudo às pequenas e médias empresas. Isso porque quase nunca elas podem dispor de um economista ou administrador de empresas em seus quadros de profissionais. Esses conhecimentos possibilitarão aos seus clientes melhor gestão de seus negócios e tomar decisões que favoreçam a vida da empresa e o emprego de seus funcionários. Além do mais, conhecimento é o grande 5 10 15 20 25 30 O contador é o profissional por excelência, competente na compreensão e interpretação dos ambientes legal, fiscal, trabalhista e econômico do país. Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 66 Unidade II capital da sociedade da informação e em rede em que vivemos. E, por mais paradoxal que possa parecer, pela primeira vez na História temos um capital que, quanto mais se dá, mais se tem. 4.4 ética profissional em contabilidade Certas profissões não podem perder os valores éticos sob pena de perder sua própria definição enquanto trabalho específico. A contabilidade é uma delas. Como sempre, como polo dinâmico da economia capitalista, foi dos Estados Unidos o clamor mais veemente para um retorno à conduta pautada na moral ocidental por parte de profissionais da contabilidade. Os reclamos por ética profissional passam a ser ouvidos, sobretudo, a partir dos escândalos financeiros em que se envolveu a empresa Enron. Hoje se fala muito em intuição, em sensibilidade para perceber os desejos e as tendências do mercado para tal tomada de decisão. Contudo, só a intuição não basta; para além dela é preciso bom senso, isto é, um bom juízo pautado em valores. É preciso uma preparação adequada, atualizada e objetiva e isso se consegue por meio do dever de estudar sempre, isso porque, nos momentos de crise, hoje os ciclos de crise capitalista estão cada vez mais próximos um do outro, é preciso estar bem alicerçado em valores morais. Muitas vezes é necessário escolher entre os empregos dos homens e as técnicas. Decidir entre o que é devido e o que é indevido. Entre o que deve ser feito e o que não deve ser feito. Pautar a tomada de decisões de uma maneira ética é optar pelos direitos das pessoas e respeitar as decisões da justiça. Nesse sentido, a ética profissional é uma arte que deve ser aprendida dia após dia. Uma das formas de dominação na sociedade capitalista, segundo Max Weber, é a “competência”. Isso porque a autoridade democrática é a autoridade burocrática, e essa autoridade advém da posição hierárquica que o cargo tem na organização societária do trabalho. Assim, profissão passa a significar nas sociedades 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 67 Ética Geral e Profissional modernas, dever de “fidelidade” ao cargo, uma vez que a finalidade das ações, nessetipo de sociedade, é sempre impessoal e objetiva, porque racional e voltada a interesses subjetivos. Para que possa agir da maneira acima exposta no seu cotidiano profissional, o contador precisa ser, antes de tudo, um profissional ético. Entendemos ética profissional como a relação dialética entre as seguintes virtudes: zelo, sigilo, honestidade e competência. Por competência entendemos a relação dialética entre teoria e prática. Assim, não é possível ser competente sem estar constantemente refletindo sobre as questões do nosso tempo, denunciando a injustiça, defendendo o bem comum – mesmo o bem da categoria profissional da qual fazemos parte – preservando a vida e a liberdade individual e coletiva. Numa palavra: ética profissional. As informações confiadas ao profissional contador devem ser inteiramente sigilosas, isto é, só interessam aos usuários das informações. A situação financeira de uma empresa, por exemplo, só interessa aos acionistas, e o comportamento sigiloso do contador quanto à divulgação desses dados é de caráter imprescindível para um comportamento ético e, consequentemente, competente. O zelo é uma virtude essencial à competência profissional do contador e consiste no trabalho feito com lisura, buscando a perfeição, por mais simples que possa parecer uma tarefa. É a virtude da execução dos serviços confiados ao profissional, de modo perfeito, como se tais serviços nos fossem confiados pelo próprio Deus. A honestidade é uma virtude inteiramente relacionada com confiança, respeitabilidade, bom nome, todos os atributos muito caros ao capitalismo. Isso porque sem confiança e respeitabilidade não é possível o investimento, o financiamento e os acordos comerciais a prazo. E, sem esses mecanismos, o capitalismo não funciona. Esses valores interagem dentro de nossa consciência de Entendemos ética profissional como a relação dialética entre as seguintes virtudes: zelo, sigilo, honestidade e competência. Por competência, entendemos a relação dialética entre teoria e prática. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 68 Unidade II modo dialético, isto é, à medida que desenvolvemos o zelo, por exemplo, seremos mais honestos. E, sendo mais honestos, seremos mais sigilosos. Sendo sigilosos, seremos mais competentes. Mais competentes, seremos mais zelosos. Contudo, há uma forma de “organizarmos racionalmente”3 nossa consciência para o agir ético. É a ética da responsabilidade e consiste nos seguintes pontos: buscar acreditar em algum valor intangível, de alto significado para a civilização, como a bondade, a caridade, a fraternidade, a tolerância e a esperança, entre outras; desenvolver a capacidade de reflexão antes de qualquer ação, ponderando quais serão os efeitos de todas as nossas ações; procurar atuar, sempre, com espírito de comunidade. É bom lembrar que as empresas nasceram de organizações familiares e comunitárias e delas guardam os princípios da colaboração mútua e da inter-relação entre seus agentes. O trabalho do contador sempre deve ser pautado pela ética profissional, já que, perante a sociedade, toda a classe é elogiada pela boa conduta de um unico profissional. Como já disse Santo Agostinho em seu livro célebre, Confissões, apenas uma falha ética cometida por um profissional pode gerar a desconfiança da sociedade nos serviços de todos os outros profissionais. A responsabilidade pela ética profissional é de todos, mediante uma atuação séria, consciente e íntegra de cada contabilista em seu cotidiano profissional, objetivando a respeitabilidade da contabilidade brasileira no mundo globalizado e da sociedade da informação. 4.4.1 Ética na profissão contábil Há certas características próprias de determinadas profissões. Devido ao fato de que na execução de suas tarefas ordinárias o contador está constantemente tomando decisões que envolvem bens de pessoas e organizações, o contabilista sempre se verá envolvido com questões e dilemas éticos. Por isso, é necessário O trabalho do contador sempre deve ser pautado pela ética profissional, já que, perante a sociedade, toda a classe é elogiada pela conduta de um único profissional. O contador representa todos os contadores. 3 A consciência forma-se em relação com os outros desde o nosso nascimento até por volta dos sete anos. É aquilo que as pessoas comuns denominam “ética de berço”. E os filósofos, ética da convicção, que não é possível mudar na idade adulta, a não ser, como diria Weber, pela “conversão”. 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 69 Ética Geral e Profissional desde o inicio definir tais conceitos. A questão ética relaciona-se com a formulação do problema. Acontece quando o bem comum, o bem que promove a vida da comunidade, da nação ou até do planeta Terra, entra em choque com interesses de algumas pessoas, organizações ou nações. A questão ética se dá sempre entre dois bens que não podem ser satisfeitos ao mesmo tempo, por exemplo: um país em desenvolvimento decide desenvolver sua indústria; tal ato oferecerá mais empregos a uma população pobre, mas, de outro lado, poluirá mais ainda o ar, que é um bem comum de toda a humanidade. O dilema ético lida com a solução do problema. Acontece quando a questão se estabelece e eu tenho que decidir entre um bem e outro bem, ou decidir qual é o mal menor, e sempre envolve a escolha de ações conflitantes entre si. A solução nem sempre é transparente. Assim, no exemplo acima referido, o dilema consiste em atender à demanda de emprego, e, portanto, de vida melhor para essa população ou impedir que as indústrias se estabeleçam para evitar a produção de gás carbônico, que polui a terra. Como vivemos numa sociedade que dirige nossa ação para a prática do “jeitinho” de buscar vantagens e não o cumprimento do dever, quase sempre o contador, que pode obter vantagens para as pessoas, se verá dentro de dilemas éticos. Muitos sucumbem à tentação de usufruir lucros, superiores ao salários, imediatos; porém, a médio e longo prazo, este fato apenas contribui para denegrir não somente o profissional que o praticou, mas a comunidade contábil como um todo. Tais atitudes reforçam o desprezo da sociedade para com a profissão. Ao recusar-se a praticar atos incompatíveis com a legislação, o contabilista prova que sua conduta é coerente não só com a ética, mas também com a profissão que escolheu executar. Para fazer com que a ética realmente seja aplicada na contabilidade, A questão ética relaciona-se com a formulação do problema. O dilema ético lida com a solução do problema. 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 70 Unidade II um dos caminhos escolhidos pelo mundo dos negócios foi o de exigir que se ensinasse ética profissional no decorrer do curso de ciências contábeis. Um dos objetivos é sensibilizar os futuros profissionais para a reflexão sobre a importância dos valores éticos na própria estrutura da sociedade capitalista. Formar profissionais que compreendam a importância de seu papel na sociedade e das consequências que as condutas não éticas provocam na classe contábil é o objetivo principal dos cursos de ciência contábil. A discussão ética para a profissão contábil requer um conjunto de regras de comportamento do contabilista no exercício de suas atividades profissionais. Qualquer profissional deve conhecer a sua profissão e não seria diferente para o contabilista,que deve conhecer os aspectos técnicos, as prerrogativas e as regras de conduta moral da profissão. Na visão do Institute of Certified Management Accountants e o Institute of Management Accountants, os padrões de conduta ética a serem seguidos pelos profissionais de contabilidade estão relacionados com as responsabilidades de desenvolverem suas atividades de acordo com o grau de competência, confidencialidade, integridade e objetividade: competência (realizar suas obrigações profissionais em consonância com as leis, regulamentações e padrões técnicos); confidencialidade (Informar aos subordinados com os devidos cuidados a respeito da confidencialidade da informação obtida na execução dos trabalhos e monitorar suas atividades a fim de assegurar o sigilo da informação. Privar-se de utilizar informações confidenciais para obter vantagens ilicitamente, sejam elas de interesse pessoal ou de terceiros.); integridade (Evitar conflitos de interesses e aconselhar as devidas partes quanto a qualquer possível conflito. Privar-se de corromper os verdadeiros objetivos da organização e da ética.) e objetividade (comunicar a informação de forma clara e objetiva). 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 35 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 71 Ética Geral e Profissional Nem sempre o profissional que está atendendo o seu cliente, aplicando todos os conhecimentos e os meios disponíveis para resolver os problemas apresentados por ele, estará agindo de maneira ética. Ser ético é apontar as propostas e soluções compatíveis com os princípios morais e éticos. Observa- se que, dentre todas as profissões, a do contabilista talvez seja aquela que mais exija do profissional um agir ético, isso porque é a atividade contábil aquela que, por seus relatórios, registros, demonstrativos e principalmente pela assinatura da responsabilidade técnica pelo serviço prestado, mais expõe o profissional à crítica de responsabilidade social. 4.4.2 A importância da ética na formação profissional É pela profissão que o indivíduo se destaca e se realiza plenamente, provando suas capacidade, habilidade, sabedoria e inteligência; comprovando sua personalidade para vencer obstáculos; gerando recursos para sua manutenção e o seu progresso financeiro. Aliás, na modernidade, o sujeito passa a ser sua profissão. Quando nos apresentamos a alguém sempre nos referimos a nossa pessoa seguida da nossa profissão. Por exemplo, eu sou professora. A contabilidade é uma das profissões mais antigas do homem e evoluiu junto com a sociedade. Nunca deixou de ser útil à sociedade e ao Estado, mas foi com o advento da modernidade que se tornou imprescindível, uma vez que tudo é feito de maneira racional e tendo por base o cálculo contábil entre lucro e perdas. Tal profissão é o próprio cerne do capitalismo, e por isso até hoje continua essencial. O contador tem reserva de mercado de trabalho, pois outro profissional não pode, por lei, executar suas tarefas. Entre os diversos objetivos da profissão está o de prover informações e orientações aos gestores públicos ou privados. Seu papel principal consiste na proteção à vida da riqueza das células sociais e na capacidade de produzir informes qualificados sobre o comportamento patrimonial. O reconhecimento profissional constrói-se passo a passo, desde a escolha da profissão, que segundo Lopes Sá (1998, p. 137) Os padrões de conduta ética a serem seguidos pelos profissionais de contabilidade estão relacionados com as responsabilidades de desenvolverem suas atividades de acordo com o grau de competência, confidencialidade, integridade e objetividade. A contabilidade é uma das profissões mais antigas do homem e evoluiu junto com a sociedade. Com o advento da modernidade tornou-se imprescindível, uma vez que tudo é feito de maneira racional, tendo por base o cálculo contábil entre lucro e perdas. 5 10 15 20 25 30 35 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 72 Unidade II “implica o dever do conhecimento e o dever do conhecimento implica o dever da execução adequada”, e estende-se por toda a vida profissional. Nesse aspecto, Lopes Sá (1998, p. 120) afirma: A profissão contábil consiste em um trabalho exercido habitualmente nas células sociais, com o objetivo de prestar informações e orientações baseadas na explicação de fenômenos patrimoniais, ensejando o cumprimento de deveres sociais, legais, econômicos, como a tomada de decisões administrativas, além de servir de instrumentação histórica da vida e da riqueza. A grande missão do profissional contábil é desempenhar suas atividades com honestidade, independência e lisura, embasando-se sempre nos princípios fundamentais de contabilidade, nas normas brasileiras de contabilidade e no código de ética da profissão, o qual, segundo Lisboa (1997, p. 61), “além de servir como guia à ação moral, possibilita que a profissão de contador declare seu propósito de: a) cumprir as regras da sociedade; b) servir com lealdade e diligência; c) respeitar a si mesma”. Conclui-se que a ética profissional representa um conjunto de normas que direciona a conduta dos integrantes de determinada profissão. 4.4.3 Relação entre a ética e a conduta do contador nas empresas Ao trabalhar como empregado em uma empresa, sobretudo as de grande porte e, ainda mais, as estrangeiras, o contador, como já dissemos acima, deve buscar conhecer a legislação específica para cada situação. Se surgirem dilemas éticos de difícil solução dentro dos parâmetros comuns, ou quando a solução não esteja prevista no código de ética da classe 5 10 15 20 25 30 5 10 15 20 25 30 Re im pr es sã o - Re vi sã o: D an ie l C or re çã o: L éo 2 6/ 06 /0 9 - 73 Ética Geral e Profissional contábil, o contador deve discutir a questão com um superior imediato que, de preferência, não tenha interesses envolvidos no caso. Somente a ele deve esclarecer conceitualmente a raiz da dúvida na intenção de obter um curso de ação e, se o conflito persistir, é melhor submeter o caso a um órgão representativo da organização. Em nível mais fundamental, as violações aos códigos de ética podem ser identificadas como conflitos de interesses ou dilemas éticos do contador solucionados de maneira simplista. Qualquer falha no reconhecimento e encaminhamento apropriado de um conflito, tanto real como potencial, pode trazer sérias consequências para os agentes envolvidos e para as empresas. Os controles de coerção internos e o código de ética da empresa são mecanismos que podem solucionar os conflitos de interesses mais imediatos e fornecer garantias para os clientes quanto à qualidade dos produtos e serviços oferecidos. Contudo, no que se refere às informações privilegiadas, a cargo do contador, tais controles são inócuos e, muitas vezes, impossíveis de serem evitados. É pelo fato de as fraudes terem aumentado em número e grau que algumas empresas transnacionais têm aplicado as punições específicas dos Estados Unidos em toda as partes do globo. Isso porque as consequências das ações fraudulentas acarretaram falência de empresas gigantescas, desemprego em massa, perda de melhoria das condições socioeconômicas da coletividade. Hábitos aparentemente inocentes e comuns ao nosso “jeitinho”, como a sonegação de impostos, podem gerar pagamentos de multas gigantescas para uma megaempresa, além de danificar o bem mais caro no capitalismo: a imagem. De tão corriqueiro esses fatos produziram, além de diversos danos
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