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contato com pacientes suicidas

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1
VIVÊNCIAS SUBJETIVAS DE PSICÓLOGOS EM SEU DIA-A-DIA DE
TRABALHO: O CONTATO COM PACIENTES SUICIDAS
Eneida Silveira Santiago
Luciane Soarez Lopez Ribeiro1
INTRODUÇÃO
A morte traz consigo muitos atributos e associações: dor, ruptura, interrupção
desconhecimento, tristeza. Além de todos estes atributos e associações, traz para o
homem a única certeza existencial, a certeza de sua própria finitude.
Existem diferentes tipos de morte, a morte clínica, a morte encefálica, morte por
acidentes, e tantos outros tipos de morte, porém há uma morte em especial que nos
chama a atenção, a morte por suicídio.
A morte por suicídio é uma morte diferente da morte eminente, daquela que entendemos
como “parte natural” do desenvolvimento humano. O suicídio é uma morte
diferenciada, pois, é uma morte que cresce por dentro, não é uma morte que vem de
fora, que chega sem ser convidada, como na mão do assassino ou pela doença terminal,
é um gesto do indivíduo contra si próprio. (CASSORLA, 1998).
O número de tentativas de suicídio vem crescendo gradativamente, o que aponta uma
necessidade de profissionais preparados para atender esta demanda. Neste sentido,
pesquisas e debates acerca deste tema se faz necessário em tempos atuais, pois, os
profissionais de psicologia estão cada vez mais em contato com esta realidade.
Historicamente é possível visualizar como a sociedade tratou este fenômeno e como isso
se alterou no decorrer dos tempos, o suicídio enquanto questão política foi tratado de
diferentes maneiras pelo estado.
Na antiguidade, entre gregos e romanos, o suicídio era fato
punível, pois tomava o caráter de violação de um dever para
com outrem ou para com o estado. Sobre o cadáver do suicida
recaíam ou a pena de infâmia ou a prática de mutilação ou de
outros tratamentos impiedosos. (NOGUEIRA, 1995, p.119).
2
Na idade média a vida era compreendida como sendo um dom de Deus e somente ele
poderia tirá-la, o suicida, portanto, era privado dos sacramentos e de uma sepultura
eclesiástica. (NOGUEIRA, 1995).
Estes tipos de pensamentos favoreceram para a constituição preconceituosa que o
suicida tem que enfrentar quando este não chega a falecer, pois estes pensamentos
certamente foram transmitidos de geração em geração.
Há vários tipos de posicionamentos em relação a este ato, existem sociedades que
abominam e rejeitam (como a nossa sociedade ocidental), e sociedades que incentivam
por fins ideológicos ou religiosos, como o caso das sociedades orientais (quase sempre
de forma camuflada) onde o suicídio é uma alternativa de solução para determinadas
circunstâncias da vida, como por exemplo, quando os guerreiros samurais optavam por
se matar diante da derrota de uma guerra, ou hoje em dia, quando o jovem japonês não
consegue alcançar o sucesso escolar esperado. (CASSORLA, 1998).
Só podemos considerar o ato como suicídio se houver por parte do suicida a intenção
consciente de por fim a própria vida. Há a necessidade da intenção deliberada de si
matar, isto é comportamento doloso. (NOGUEIRA, 1995).
Segundo Kovács, (1992) o tratamento de um caso como este exige profunda
compreensão das motivações básicas que leva o indivíduo a este ato. Para autora, este
profissional deve estar devidamente preparado, pois o ato suicida pode despertar no
terapeuta seus próprios desejos de morte, sua impotência.
O profissional de psicologia não está restrito a campos como: empresas, escolas, ou a
carreira acadêmica, mas estará sujeito a trabalhar também nos campos da saúde, como
nos hospitais, nas clínicas entre outros. Nestes campos, em determinado momento, este
profissional poderá entrar em contato com a morte, muitas vezes atenderá casos como
os de tentativa de suicídio. Segundo Kovács (1992), toda doença é uma ameaça à vida,
conseqüentemente um aceno á morte. Sendo assim, se faz necessário que este
profissional esteja devidamente qualificado para este tipo de atendimento, tanto técnica
como afetivamente, uma vez que, caso isso não ocorra este profissional estará
infringindo o código de ética do psicólogo.
Trabalhar com o sofrimento ou a perda de significado da existência pelo paciente, pode
despertar no profissional as mesmas vivências, ferindo seu narcisismo e sua
 
1
 Bacharel em Psicologia – FAI- Faculdades Adamantinenses Integradas - E-mail:
3
onipotência, colocando – o diante do incompleto. (TORRES & GUEDES, 1987 apud
KOVÁCS, 1992).
Cassorla (1998) ressalta a importância que o profissional tem como receptor e
decodificador da mensagem implícita no ato suicida, o preconceito ou a indiferença
serve apenas como faixa aos olhos para que este profissional menospreze a importância
do ato. Segundo o autor, até mesmo o profissional de saúde mental despreparado,
muitas vezes acaba caindo no julgamento moral e termina por dar conselhos ao
indivíduo. Isto muitas vezes acontece diante da ansiedade contratransferencial.
O desprezo neste momento pode ser letal, indo de rumo contrário ao da tarefa do
psicólogo que é o de se preocupar com o bem-estar do ser humano ao longo de seu
desenvolvimento, estando ele no estado em que estiver, pois, este analisa os processos
intrapessoais e as relações interpessoais para que possa compreender e problematizar o
comportamento humano em seus diversos estados, tendo como objetivo identificar e
intervir nos fatores determinantes das ações dos indivíduos considerando sua história
biológica, pessoal, familiar e social.
Freud percebeu que o contato com o paciente despertava no terapeuta alguns
sentimentos que ele denominou contratransferência, que poderia se manifestar tanto
conscientemente quanto inconscientemente no terapeuta. Este aspecto se tornou
importante quanto à compreensão do conteúdo inconsciente que estava sendo analisado.
(MATTIOLI, 2004).
Não podemos esquecer que o analista, é um ser humano como todos os outros, com seus
próprios problemas, qualidades e defeitos, conflitos e características de personalidade.
 O analista não deixa de ser uma pessoa, um ser humano
vulnerável, sensível, vaidoso, ambicioso, invejoso, que ama e
odeia, que ainda que capacitado para sua prática terapêutica,
também sente, segundo as circunstâncias, carinho, afeto,
rejeição, tédio, frente ao que seu "paciente" fala, relata,
apresenta, projeta nele/nela (transferência), e se irrita, fica
entediado, sente empatia e segundo o material da temática
tratada, se angustia e sofre. (SANTOS, 2007, p 02)
 
luciane_lopez@yahoo.com.br
4
Segundo Morgado (2002, p.94) “a estrutura libidinal do analista também é ambivalente,
fixada em etapas psicossexuais infantis, podendo reviver nas relações atuais os mesmos
conflitos que o analisando: atualização de protótipos, compulsão á repetição e
resistência”.
Quando o terapeuta se depara frente a uma tentativa de suicídio, frente a um indivíduo
que lhe chega extremamente frágil e como aponta Cassorla (1998), um indivíduo que
encontrou a única forma de pedir ajuda sob este ato, trazendo ainda sob si resquícios da
morte, o terapeuta se identifica porque entre outras coisas, este não escapará da morte,
talvez não desta forma como o paciente suicida, mas dentre uma das tantas faces dela.
(LABAKI, 2006).
Segundo Volich, (1999) “tratar o outro é poder entrar em contato com o próprio
sofrimento, e com as experiências que ele evoca em nosso foro mais íntimo” “É efetuar
o trabalho permanente de reparação de nossas próprias feridas, reencontradas nas dores
daqueles de quem cuidamos” (VOLICH, 1999 apud LABAKI, 2006 p. 53).
 Labaki, (2006 p. 53) aponta que “a ameaça de morte precipita no psicoterapeuta formas
íntimas de amálgama com o paciente ou, opostamente modos abismais de escutá-los”.Cassorla (1998) fez um levantamento e concluiu que no atendimento a pacientes
suicidas a equipe de saúde e principalmente o médico, se sente perdido no atendimento
a estes casos, isto aconteceria segundo o autor pela captação inconsciente do sofrimento
intenso do paciente, por identificação e necessidade de negá-lo; por ser aterrorizante; ou
pela sensação de impotência e desesperança por identificação de aspectos do paciente
e/ou por mobilização de conflitos próprios do profissional. Segundo o autor quando o
paciente chega a efetivar o ato a equipe de saúde sofre com o impacto violento deste.
“Aparecerão com grande intensidade, sentimentos de culpa, remorsos, impotência,
desespero, complicados por defesas do tipo: negações, projeções, racionalizações”.
(CASSORLA, 1998, p. 162).
Portanto, no atendimento a pacientes suicidas a relação contratransferencial é de suma
importância quando devidamente detectada e devidamente utilizada, pois, como já
enfatizado o profissional de psicologia como todo e qualquer ser humano não escapa as
projeções de seus pacientes, este deverá tomar cuidado para que seus conflitos próprios,
não se misturem com as projeções de seus pacientes de forma muito intensa, a ponto de
tornar esta atividade tão rica em pleno desprazer e fonte de sofrimento.
5
OBJETIVOS
Compreender como o psicólogo vivencia afetivamente e utiliza as práticas terapêuticas
num caso de finitude tão próxima como é o caso de pacientes que tentaram suicídio.
Objetivos específicos
Verificar como o psicólogo compreende o fenômeno do suicídio, e como ele vivencia,
ou vivenciou a experiência de atendimento deste caso.
Problematizar as razões cognitivas e psíquicas presentes na decisão do psicólogo de
empreender uma relação terapêutica com pacientes que tentaram o suicídio.
Verificar as técnicas terapêuticas adotadas pelo psicólogo no atendimento de pacientes
que cometeram tentativa de suicídio, uma vez que este paciente já vem com uma alta
carga emocional e uma experiência de proximidade da morte.
Verificar se existe por parte do psicólogo uma cobrança maior consigo mesmo por estar
em contato com a possibilidade da morte do outro, podendo vir a se sentir responsável
pela sobrevivência do paciente. Caso seja afirmativo, como este psicólogo vivencia o
“sentir-se responsável pelo outro”.Compreender como é vivenciado pelo psicólogo, o
trabalho com o sofrimento e a perda do significado de existência do paciente suicida,
uma vez que isto pode despertar no psicólogo as mesmas vivências.
Compreender as possíveis dificuldades encontradas pelo profissional nesse encontro.
METODOLOGIA
Participaram desta pesquisa 4 (quatro) sujeitos. Todos profissionais formados em
psicologia com atuação clínica mínima de 3 anos, que atendem ou já atenderam
pacientes que tentaram suicídio. Os sujeitos possuíam idades entre 36 a 48 anos, sendo
1 (um) homem e 3 ( três) mulheres, todos moradores do interior do Estado de São
Paulo. O tempo de atuação clínica destes sujeitos variaram de 08 há 19 anos.
6
Instrumentos
Utilizamos como instrumento de pesquisa a entrevista semi-dirigida, com perguntas
relacionadas à prática terapêutica que foi utilizada, ou que atualmente estava sendo
utilizada com pacientes que passaram por tentativa de suicídio, bem como, perguntas
relacionadas ao como é ou como foi para este profissional lidar diretamente com a
possibilidade ou até mesmo a morte real do outro.
Procedimentos
O procedimento adotado foi à realização das entrevistas semi-dirigidas, utilizadas como
fonte de coleta de dados, sendo estruturadas e analisadas de acordo com enfoque
psicanalítico.
A entrevista foi realizada de forma individual com psicólogos que atendem ou já
atenderam pacientes que tentaram suicídio. Cada entrevista foi realizada de acordo com
a disponibilidade deste profissional, no horário estipulado por ele, assim como o local
(desde que fatores quanto à privacidade do encontro fossem atendidas). Foram
explicados aos sujeitos alguns dados da pesquisa, tais como: objetivo e o sigilo total de
sua identidade. Foram coletadas as assinaturas no termo de consentimento, e entregue
aos sujeitos a carta de informação constando todos os dados da pesquisa a ser realizada.
RESULTADOS:
Ato de desespero, fracasso individual e social, punição aos seus, fuga da realidade
vivente, desistência dos sonhos, da vida, busca de alívio, essas entre outras, são as
concepções que os profissionais de psicologia entrevistados fazem da pessoa que
comete o suicídio. Segundo Cassorla (1998), a morte em nossa sociedade possui caráter
depreciativo, não é encarada como um dado natural do desenvolvimento humano, pois
esforçamo-nos para bani-la de nossas experiências de vida. Se a morte “natural” já é
encarada desta forma, pior ainda é a morte por suicídio. Carregada de preconceitos e
fantasias a cerca da causa, a morte por suicídio pode ser encarada como fracasso
individual ou social como disse uma das entrevistadas:“Pra mim, o suicídio é um sinal
7
de fracasso”. Pesquisador: Por que fracasso? Entrevistada: “Porque significa que a
pessoa falhou, e a sociedade também”.
Segundo Durkheim (1983), o suicídio é um ato individual, porém com contribuições
significativas da sociedade que as produz. O autor acredita que a sociedade tem papel
fundamental na decisão suicida do indivíduo, pois este meio social de certa maneira,
não foi favorável e acolhedor de maneira a dar subsídios para que este indivíduo
pudesse sobreviver.
Segundo Cassorla (1998), sob um olhar sociológico, as motivações que levariam o
indivíduo a buscar pelo suicídio como sua última forma de arte no mundo estaria
associada a motivações de aspectos sociais que transcenderiam a esfera da vida pessoal
e dependeriam de forças exteriores ao indivíduo presentes na dinâmica dos valores e
padrões da cultura de determinada sociedade.
Os profissionais entrevistados acreditam que este indivíduo não encontrando outra saída
tenta fugir de sua realidade, desiste da vida, dos sonhos, do sentido que a vida antes lhe
trazia, acredita que somente encontrará alívio após esta atitude, onde possivelmente
ocorreria uma cisão do ego, um “surto” do psiquismo.
A baixa estima, a disfunção mental como a depressão também seriam fatores
importantes que permeiam o ato segundo estes profissionais de psicologia.
As razões cognitivas presentes na decisão do psicólogo em empreender uma relação
terapêutica com pacientes que tentaram o suicídio, na maioria dos casos é por falta de
poder optar por atender ou não este tipo de caso. A maioria dos entrevistados atende ou
atenderam seus pacientes em hospitais ou centros públicos de saúde, nestes locais não é
permitido segundo eles, não atender um caso como este ou outro qualquer, desde que
seja identificada sua necessidade.
 Sobre as dificuldades encontradas no atendimento a estes casos, Priscila assim
respondeu: Eu fui à luta, fui estudar sobre o suicídio, e fui fazer terapia. Pesquisador:
Por que você foi buscar terapia? Entrevistada: Porque eu tinha dificuldade com estes
assuntos de morte... Então eu decidi buscar ajuda ... até pra me compreender melhor.
Alguns profissionais descobrem a tentativa ou a possibilidade de uma possível tentativa
durante o tratamento, e com o vínculo já estabelecido e uma transferência-
contratransferência já instaurada. Isso de certa forma contribui para que este profissional
acabe por continuar o tratamento.
8
O suicida é compreendido segundo estes profissionais como uma pessoa solitária,
fragilizada e depressiva. Muitas vezes não percebe que inconscientemente busca por seu
aniquilamento como, por exemplo, os alcoolistas, dependentes entre outros, que são
compreendidos como suicida em potencial.
Pôde-se perceber durante as entrevistas que os sentimentos em relação a estas pessoas
tentadoras de suicídio estão permeados por sentimentos ambivalentes, pois, segundo os
entrevistados estas seriam pessoas solitárias,fragilizadas e depressivas, porém em outro
momento são lembradas como pessoas fortes e corajosas uma vez que, para cometer o
suicídio há a necessidade de muita coragem. Márcia, em relação à compreensão que faz
do indivíduo suicida diz que: “Uma pessoa desta é muito forte... Tem que ser forte pra
fazer isso... E depois a gente fala que são pessoas fracas...”.
Através desta fala podemos perceber que não é apenas o fato da morte que chama a
atenção, mas a forma pela qual o indivíduo procura por ela. A forma agressiva que se
mostra aos outros, um ato revestido de desespero.
Sabemos que a morte um dia irá chegar, e que segundo Murphy (1959), o medo dela é
universal e atinge a todos, está associada ao medo da solidão, da separação de quem se
ama e do desconhecido; o medo dos julgamentos por atos terrenos e o medo do que
possa ocorrer aos dependentes; o medo da interrupção dos planos e fracasso em realizar
os objetivos mais importantes da pessoa (apud Kovács, 1992). Por isso este tipo de ato
causa certo espanto em nossa sociedade, pois a maioria das pessoas busca “viver” numa
sociedade que é quase impossível apenas “sobreviver”. Rebeca ao se referir sobre o
valor da vida diz: “Veja bem que espetáculo maravilhoso é a nossa vida! Como é difícil
gerar uma vida... Um espermatozóide disputa com centenas de outros espermatozóides
o óvulo... Que milagre que é a vida... Pra acabar assim... É muito triste!”.
Estamos inseridos numa sociedade que não apóia este tipo de ato (não pelo menos
diretamente) quando isso acontece é como se estivessem infligindo à lei, assim como
antigamente, porém não a lei dos homens, mais a lei da vida.
Muitas vezes, estes profissionais embasados neste tipo de representação preferem
defender-se com a técnica, ou sob a instituição que trabalha. Paulo relata a sua vivência
com este tipo de caso: “Na verdade o paciente não era meu, não atendia na minha
clínica... Era da instituição!”
9
Podemos perceber certo tipo de distanciamento em relação ao paciente, Paulo
provavelmente busca se manter distante. “O atendimento foi num hospital de base (ou
público) o paciente passava não só por mim, mas pelo psiquiatra, pelos médicos então
eu me senti seguro.”
Em outra entrevista percebe-se o quão é importante para Priscila o trabalho juntamente
com o psiquiatra: “Acho importantíssimo o trabalho em conjunto com o psiquiatra,
sendo assim eu encaminho o paciente ao psiquiatra “Eu não brinco com essas coisas
não”. Não é só com a terapia não... Tem que ter trabalho em conjunto”.
 Talvez exista ligado a esta fala e a de Paulo um sentimento de insegurança, pois ambos
sentem-se mais seguros com a ajuda de certos aparatos como: os remédios do
psiquiatra, e a segurança da instituição.
A divisão da responsabilidade com outros colegas da área, seria uma forma de alívio,
pois, caso o tratamento não obtivesse resultados e o paciente tentasse novamente e dessa
vez conseguisse, este profissional teria com quem dividir esta impotência diante do
caso. Este profissional muitas vezes chega a considerar o suicídio não tão importante
quanto uma doença. Podemos observar isto através da fala de Paulo: “Na verdade me
preocupo muito mais com os pacientes que tem doenças auto-imune do que com um
caso de tentativa de suicídio, os pacientes com doenças auto-imune podem comparar
com uma bomba relógio, a qualquer momento o pior pode acontecer”.
Como sabemos através de Cassorla (1998), alguns profissionais de saúde chegam a
tratar este sujeito com indiferença, não compreendem o que se passa com este indivíduo
e acabam por tratá-lo muito mal, às vezes até com zombarias. Diante da fala de Paulo
podemos verificar que mesmo sendo psicólogo e conhecendo em certo grau as vivências
humanas, Paulo não se distância destes profissionais de saúde, pois para ele é muito
mais preocupante um paciente com doenças auto-imune.
O acolhimento a estes indivíduos vai depender de como este profissional vê e
compreende este ato, bem como o contexto cultural em que esta inserido. De acordo
com as entrevistas conviver e efetuar uma relação com este tipo de paciente é
angustiante para estes profissionais, pois, apesar de seus conhecimentos a cerca do
homem e de suas possíveis atitudes, estão inseridos em uma sociedade que não esta
aberta a problematizar e abordar assuntos como o da morte, muito menos, morte por
10
suicídio. Porém, de acordo com os relatos, estes profissionais não deixam de tratá-los
com respeito e cordialidade, o fato de serem psicólogos colabora para a compreensão
desse ser humano, mas não suaviza totalmente a impressão do ato agressivo, e do
impacto que isto causa a sociedade atual, pois, o fator morte ainda é considerado um
tabu em nossa sociedade.
Trabalhar com este tipo de caso está longe de se tornar um costume, é considerado
como um caso difícil. Segundo os entrevistados constatar a perda da vontade de viver
do outro é muito triste, não há como se acostumar. A vida é considerada para estes o
bem mais precioso, perde-la ou querer perdê-la é um fracasso.
Para alguns profissionais como Márcia vencer através de seus pacientes a vontade de
morrer ou ver seus pacientes vencer suas dificuldades lhe traz grande orgulho. Em
relação ao trabalho desenvolvido com os tentadores: Pesquisador: Você se orgulha
disso? Entrevistada: “Com certeza, como eu te disse, eu já trabalhei em vários
lugares, e aonde eu vou eu procuro fazer o meu melhor... Eu tenho um profundo
respeito pelo ser humano, eu amo o que eu faço, me orgulho da nossa profissão, eu
jamais me arrependo da profissão que eu escolhi. Aqui eu não recebo muito, mais eu
adoro trabalhar aqui”. Obs: Neste momento Márcia se emociona e pede desculpas ao
entrevistador.
Acostumar seria para estes o mesmo que aceitar, e isto não é aceito nem pela sociedade
em geral muito menos por estes profissionais cujo objetivo de sua profissão é o de se
preocupar com o bem-estar do ser humano ao longo de seu desenvolvimento, estando
ele no estado em que estiver.
Márcia que já atendeu mais de 30 casos como este nos diz: “O dia que eu achar normal
atender um caso deste... o dia que eu me acostumar... eu vou parar de lutar”.
Esta fala nos mostra como disse Kovács (1992), que a morte seria o inimigo que os
vivos passam suas vidas tentando superar e derrotar para sempre. Isso ressalta o carater
negativo que cai sobre a morte, juntamente com isso com quem a “ousa cutucá-la a fim
de encontra-la”, neste sentido, podemos imaginar o quão doloroso deve ser para o
indivíduo que passou por um suicídio mal sucedido, o caráter negativo que recai sobre
este. O psicólogo deve estar atento a isto, pois o que ele menos nescessita neste
momento é de mais uma rejeição.
11
Quando perguntado a estes profissionais como eles se sentiam no atendimento a estes
casos, respostas como: sentimento de impotência, tristeza, fracasso e angústia foram as
mais citadas. Impotente responde uma das entrevistadas: “Porque muitas vezes não sei
se o tratamento vai dar certo, e se o indivíduo vai se curar ou melhorar”. Pensamentos
como: E se ele fizer de novo? E se dessa vez ele conseguir? Permeiam a psique destes
profissionais.
Segundo Cassorla, (1998) a maior dificuldade destes profissionais da saúde decorrem da
invasão destes sentimentos como a impotência, frustração e a fragilidade que se é
sentida por estes profissionais diante dos ataques violentos de ordem emocional que
recebe destes pacientes. Portanto o profissional se vê tomado por estes sentimentos, que
os deixam paralisados, o autor ressalta que este profissional se não estiver bem
preparado e não souber utilizar corretamente a favor do paciente os mecanismos
contratransferências pode ao invés de ajudar o paciente, apenas piorar a situação.
Ao perguntar a estes profissionais se eles se sentiam responsáveis pela vida de seus
pacientes alguns responderam que sim e outros que não, os que responderam que sim se
justificam como nesta frase: “Comcerteza ... Como eu disse antes, é muita
responsabilidade, é uma vida! Tem a família que espera o resultado do tratamento, e
nós mesmos esperamos que dê tudo certo.”
Os entrevistados que responderam que não se sentem responsáveis por estas vidas
apoiam-se nas técnicas, como esta entrevistada: “Responsabilidade sempre há, como
em qualquer outro caso... Porém quando o profissional de psicologia assume um caso
como este, ele está ciente que está capacitado tecnicamente. Isso é agir com ética, se eu
sei que não estou apto a seguir com o caso, eu nem devo aceitá-lo. Por isso caso venha
o paciente a concretizar o ato, não me sentiria responsabilizada, pois estava
respaldada pela técnica”.
Pode-se perceber que há sim uma responsabilidade sentida por estes, porém uns sentem
isso de forma mais intensa e outros apoiam-se nas técnicas, maneira esta de se sentir
segura caso algo venha a acontecer.
 O sentimento de tristeza aparece com destaque nas falas de alguns, questionamentos
acerca da causa, bem como a sensação de fracasso de uma sociedade que não pôde fazer
algo pra impedir é sempre citado.
12
Este sentimento de tristeza advém da constatação deste profissional de que este paciente
perdeu a vontade de viver, perdeu o brilho pela vida. E como citado por Brim (1970
apud Kovács, 1992), o atendimento a estes casos pode ativar no terapeuta o medo da sua
própria mortalidade, ou seja, lidar com a morte ou a possível morte do outro uma vez
que, não se sabe se o tratamento vai realmente dar certo, é se perceber como um ser
também transitório.
Em relação à prática terapêutica, pode-se perceber através das entrevistas que o trabalho
em conjunto com o psiquiatra é utilizado em todos ou quase todos os casos, na maioria
dos atendimentos o paciente já vem medicado e o encaminhamento é feito pelo médico
psiquiatra. Geralmente este paciente é atendido de uma a três vezes por semana, isso
dependerá de como ele se encontra psiquicamente, para uma de nossas entrevistadas
existe a necessidade para a efetivação do tratamento de um trabalho feito sob o seguinte
tripé: “O tratamento acontece com o seguinte tripé: O paciente, a medicação e a
família, os três fatores são importantes e devem ser trabalhados em conjunto”.
Isso demonstra a importância que o meio social tem na vida deste indivíduo e que além
do tratamento deste, deve haver um trabalho em conjunto com o meio social que este
está inserido, como a família.
Na maioria das entrevistas realizadas, foi constatado que o profissional de psicologia
não chega a dar alta a estes pacientes, pois estes acabam abandonando o tratamento, um
dado muito significativo, pois o que será que ocorre para que estes pacientes acabem
desistindo do tratamento? São alguns questionamentos para possíveis discussões.
Em nenhuma das entrevistas foi constatado que após o início do tratamento o paciente
tenha tentado novamente e desta vez chegado a óbito.
Estes profissionais de maneira geral não teriam mais nenhum tipo de contato após o
rompimento do tratamento, alguns chegam a ter notícias por vias diversas como à
família, ou quando acabam se encontrando ocasionalmente.
Através dos dados levantados eis que nos surgem alguns questionamentos, o
atendimento a pacientes suicidas requer um novo tipo de profissional ou abre portas
para uma nova prática?
Para esta pergunta ainda não há respostas, porém podemos visualizar através desta
pesquisa que este profissional no atendimento a este tipo de paciente se vê diante de
uma situação onde somente sua técnica já não é suficiente para lidar com este tipo de
13
caso, pois no contato com o indivíduo suicida, este profissional de psicologia se depara
com aspectos pessoais que se não forem devidamente interpretados e trabalhados a
favor do caso, possivelmente favorecerá para uma prática não eficaz.
CONCLUSÃO
Os dados nos permitiram perceber que no atendimento a pacientes suicidas o
profissional de psicologia passa por uma série de alterações emocionais, como
sentimentos de impotência e até mesmo angústia ao lidar com assuntos referentes à
morte. A pesquisa nos trouxe dados relevantes quanto ao impacto que à escolha dos
meios utilizados pelo tentador causa á estes profissionais, uma vez que, ambos
caminham rumo contrário, enquanto um busca contribuir para vidas mais satisfatórias o
outro busca por eliminá-la, ou seja, sua própria morte. Isso muitas vezes leva estes
profissionais a buscar auxílio de outros profissionais da área para melhor orienta-lo ou
para seu próprio atendimento. Pensamentos acerca do êxito do tratamento são
freqüentes, muitas vezes se questionam se darão “conta” do caso, alguns dos
profissionais entrevistados visualizam este tipo de caso como um desafio á sua prática
como psicólogo, pois, muitas vezes buscam aprimoramento para poder dar “conta”.
Para tal, existe a necessidade de construção de políticas públicas de atenção ao suicídio,
uma vez que este número de tentadores e suicidas vem crescendo gradativamente, o que
aponta a uma necessidade de medidas preventivas. Da mesma forma existe a
necessidade de profissionais mais bem preparados tanto técnica como afetivamente para
lidar com essa realidade tão corriqueira em tempos atuais. Podemos nos questionar se
os cursos de formação destes profissionais têm estado atentos a estes tipos de
atendimento, pois como já citado anteriormente estamos inseridos em uma sociedade
onde cada vez mais assuntos referentes à morte estão sendo abolidos e deixados de lado,
o que vemos é uma sociedade que prioriza o ocultamento das manifestações de morte
bem como suas ramificações como o suicídio. Pesquisas e debates a cerca de temas
como a morte, a morte por suicídio e o preconceito que este indivíduo (tentador)
enfrenta em relação á sociedade em que vive (devido à falta de conhecimento desta
sociedade em relação aos fatores que levam este indivíduo a este ato, bem como, o
aspecto negativo da morte) entre outros se faz necessários.
14
Deixar que sentimentos negativos em relação a este ato contribua para uma prática não
eficaz ou que aspectos pessoais deste profissional interfira no atendimento a estes casos
só colabora para o impedimento do avanço de uma ciência e de uma bela profissão
como é a psicologia.
BIBLIOGRAFIA
ALVARENGA, D. P. de. Anencefalia e aborto. Disponível em:
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