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ESTUDOS LINGUÍSTICOS E VARIAÇÃO Denise Gassenferth E d u ca çã o E S T U D O S L IN G U ÍS T IC O S E V A R IA Ç Ã O D en is e G as se nf er th Curitiba 2015 Denise Gassenferth Estudos Linguísticos e Variacao~ Ficha Catalográfica elaborada pela Fael. Bibliotecária – Cassiana Souza CRB9/1501 G251e Gassenferth, Denise Estudos linguísticos e variação / Denise Gassenferth. – Curitiba: Fael, 2015. 124 p.: il. ISBN 978-85-60531-15-8 1. Linguística 2. Variação linguística I. Título CDD 410 Direitos desta edição reservados à Fael. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da Fael. FAEL Direção Acadêmica Francisco Carlos Sardo Coordenação Editorial Raquel Andrade Lorenz Revisão Luzia Almeida Projeto Gráfico Sandro Niemicz Capa Vitor Bernardo Backes Lopes Imagem da capa Shutterstock.com/Franck Boston Arte-Final Evelyn Caroline dos Santos Betim Apresentação (...) Se a linguagem se contentasse em refletir a realidade, por que cada língua engendraria palavras que não deveriam ser pronunciadas? (...) HUSTON, Nancy. A Espécie Fabuladora- um breve estudo da humanidade. O Falar, escrever, ler... usar uma língua para expressar sen- timentos, compartilhar experiências, trocar conhecimentos, emitir juízo, inserir-se em uma comunidade, enfim, usar uma língua para partilhar de uma identidade cultural. – 4 – Estudos Linguísticos e Variação Todos os dias fazemos isso, mas nem nos damos conta de todos os ele- mentos e implicações que entram em questão, na hora de nos comunicarmos. Mas, alguns estudiosos, conhecidos por linguistas, se deram conta disso e fizeram da linguagem humana, escrita e falada, seu objeto de estudo. O estudioso, considerado o “pai” da Linguística, foi o suíço Ferdinand de Saussure (1857-1913). Saussure é conhecido no mundo todo por suas pes- quisas sobre a linguagem humana. Ele analisou diversas línguas, comparou-as entre si. Analisou também o modo como elas se transformam com o passar do tempo, as interferências dos falantes e das situações sociais. Seu livro Curso de linguística geral (CLG), publicado postumamente, em 1916, é resultado de uma compilação dos três cursos que ministrou durante cinco anos, feita por Charles Bally (1865-1947) e Albert Sechehaye (1870- 1946), a partir das anotações dos seus alunos, principalmente Albert Riedlin- ger (1883-1978). Apesar de seus estudos e da publicação de sua obra fazerem de Saussure, o “pai” da Linguística, o próprio Saussure atribuiu a fundação da Linguística à primeira obra do alemão Franz Bopp (1791-1867), Gramática comparada das línguas indo-europeias: O sistema de conjugação do sânscrito comparado aos das línguas grega, latina, persa e germânica (1816). Todavia, é Ferdinand Saussure que traz a ideia da linguagem humana como produto de uma coletividade e que se modifica como se modificam os seres humanos. Em sua obra, Saussure parte das definições de signo, significante e sig- nificado. Ele define que a linguagem é um sistema de signos linguísticos, um sistema de convenções. Porém, o signo é arbitrário, é a união de uma forma significante (imagem acústica) e uma forma significada (conceito, a parte inteligível do signo). Não há relação lógica entre uma determinada palavra e o que ela representa. Para Saussure, “Língua e escrita são dois sistemas distintos de signos; a única razão de ser do segundo é representar o primeiro. ” (CLG, 2005, p. 34). Dessa forma, Saussure fundamenta a Linguística como um estudo imprescindível da formação e evolução da linguagem humana, é preciso – 5 – Apresentação partir, então de suas conclusões para depois conhecer outros linguistas que também contribuíram para que essa disciplina seja tão importante nos nos- sos dias. Contudo, nosso livro de Estudos Linguísticos e Variação não tratará apenas de Saussure. No primeiro capítulo, faremos uma introdução aos assuntos a serem estudados nesse livro, com apresentação do que é a Ciência Linguística, com exposição de um breve histórico e qual seu objeto de estudo. Já no segundo capítulo, veremos os processos que são envolvidos na Comunicação: linguagem, língua e fala. No terceiro capítulo, trataremos da Teoria do Signo Linguístico e estu- daremos também algumas das dicotomias apresentadas por Saussure, como Sincronia e Diacronia, e Paradigma versus Sintagma. No quarto capítulo, veremos o Discurso e estudaremos um preâmbulo da Análise do Discurso. Em seguida, no quinto capítulo, focaremos em algumas das Divisões da Linguística, como Fonética e Fonologia, Morfologia e Sintaxe, Semântica e Pragmática. A Sociolinguística e a Variação Linguística serão vistas nos capítulos seis e sete, pois os tipos de variação, além do conceito de “norma” e “erro linguís- tico” merecem um estudo um pouco mais detalhado. Durante o percorrer de seus estudos acadêmicos, vários dos temas apre- sentados nesse livro serão observados com mais afinco. O estudo da Linguística e da Variação Linguística busca instrumenta- lizá-los para uma maior compreensão da complexidade do estudo da língua. Cabe ainda outra constatação ou reflexão: sem nos darmos conta, somos todos, pelo menos, bilíngues. E por que podemos fazer tal afirmação? Temos uma língua própria, a que usamos para nos comunicar com nossos familiares, em nosso ambiente de trabalho, em nossos momentos de socializa- ção. E, em nosso percurso escolar, chegamos ao nível superior com uma segunda língua: a que a escola nos apresentou - a norma padrão, ou norma culta. – 6 – Estudos Linguísticos e Variação Como educadores, ou futuros educadores, precisaremos ter bem clara essa realidade: somos bilíngues! E como tal, devemos, obrigatoriamente, res- peitar os falares de compõem a língua brasileira. A Linguística nos proporciona o entendimento do que é a linguagem, como conhecê-la, como decifrá-la, pois, sem conhecer a linguagem, podemos conhecer o ser humano? Para finalizar a apresentação desse livro, cito as palavras de Eni Puccinelli Orlandi: O homem procura dominar o mundo em que vive. Uma forma de ele ter esse domínio é o conhecimento. Esse é um dos motivos pelos quais ele procura explicar tudo o que existe. A linguagem é uma dessas coisas. Ao procurar explicar a lin- guagem, o homem está procurando explicar algo que lhe é próprio e que é parte necessária de seu mundo e da sua con- vivência com os outros seres humanos. Por que falamos? Para que falamos? Como falamos? Por que as línguas são diferentes? O que são as palavras? O que elas produzem? Essas questões tocam diretamente o homem, e ele tem procurado dar-lhes uma resposta. De posse desse saber sobre a linguagem, o homem tenta domesticar seus poderes e trazê-los para si. Será que conse- gue?” (...) (ORLANDI, Eni Pucinelli. O que é Linguística. São Paulo: Brasiliense, 2009, 2° ed.) Bom estudo! Sumário 1 Estudos Linguísticos e Variações | 9 2 Comunicação | 27 3 O Signo | 41 4 O Discurso | 57 5 Divisões da Linguística | 71 6 Sociolinguística | 91 7 A Norma Linguística | 105 Referências | 119 1 Estudos Linguísticos e Variações Na língua só existem diferenças. Ferdinand Saussure A liberdade consiste na possibilidade de optar. Ferdinand Saussure Iniciaremos este capítulo apresentando vários conceitos em relação à linguística, qual é seu objeto de estudo e um breve histó- rico da ciência linguística. Buscamos, com isso, apresentar-lhes conceitos e princípios que regem os Estudos Linguísticos. – 10 – Estudos Linguísticos e Variação Apesar de neste capítulo e, principalmente, nos primeiros capítulos, não nos atermos, ainda, às questões relacionadas à variação linguística, ini- ciaremos nossos estudos com um texto bastante interessante do Professor Antonio Escandiel de Souza, intitulado A Diversidade Linguística no Contexto Escolar: A Diversidade Linguística no Contexto Escolar A língua de um povo constitui-se como um dos seus bens mais preciosos. É na língua que se apresentam refletidas asrepresentações e construções de uma sociedade. É pela língua que se dão as relações de poder e dominação, os consensos, as discórdias, as transmissões culturais. Assim como é pela língua que o sujeito constrói seu lugar na socie- dade, também é através dela que é excluído. Considerando que nossas cidades são formadas pela união de diversas raças e povos, é impossível ignorar que a diversidade étnica caracteriza nosso país. A língua, em suas diversas formas e variantes, é uma entidade viva, dinâmica e é o código utilizado pelo ser humano para se comunicar com seus semelhantes, trocar informações, difun- dir ideias e conceitos. O uso da escrita desenvolveu a comunicação entre os homens permi- tindo-lhes remontar as barreiras do tempo na recepção de mensagens, além de ajudar muito no desenvolvimento intelectual do ser humano. Ademais, seu domínio passou a figurar, socialmente, como prestígio social e instrumento de ascensão profissional. Devido a constantes inovações, a escola está deixando de ser apenas o local onde se acumulam conhecimentos, que tem no professor o depositário da sabedoria e no estudo, um fim em si mesmo. A escola passou a ser um ambiente voltado à reflexão e o educador pas- sou a atuar como mediador da aprendizagem, sabendo respeitar e interagir Figura 1: balões diálogo Sh ut te rs to ck .c om / P us hk in – 11 – Estudos Linguísticos e Variações com as diferenças étnicas, culturais, sociais e econômicas do educando. A sociedade está cada vez mais exigente, então não basta seguir rigidamente as normas linguísticas, sem deixar espaço para o desenvolvimento do educando como ser crítico, capaz de expressar suas ideias e lutar pelos seus ideais. A língua se relaciona com a sociedade porque é a expressão das necessida- des humanas de se congregar socialmente, de construir e desenvolver o mundo. “A língua não é somente a expressão da alma, ou do íntimo, ou do que quer que seja, do indivíduo; é acima de tudo, a maneira pela qual a sociedade se expressa como se fosse a sua boca”. (SIGNORINI, 2002. p. 76-77). É importante ter um discurso condizente com a realidade social, mas a consideração da modalidade linguística que o educando traz de casa, é essen- cial, já que a democracia e a liberdade de expressão devem acontecer desde o espaço escolar e, porque, por meio dessa linguagem, é possível estabelecer a comunicação. Com respeito pela linguagem do aluno, é possível levá-lo a aprimorar-se da variedade linguística valorizada socialmente, o que possibilitará a ele a adequação de uso da linguagem às diversas situações sociais em que precise se manifestar. Ao contrário do ensino tradicional, que silencia, e contribui, desse modo, para a manutenção da ordem social vigente, com as mudanças no ensino poderão ser conseguidas mudanças sociais ao se garantir que a possi- bilidade de expressão deixe de ser sonegada à grande parcela da população. Não é preciso substituir a modalidade do aluno, mas é possível for- necer-lhe outra adicional, a de maior prestígio, para que, com isso, ao mesmo tempo em que ele possa conseguir sua ascensão social, também continue participando de seu grupo de origem, não sofrendo, assim, um processo de despersonalização. Faz-se necessário o ensino da forma para enriquecer e contribuir com o desenvolvimento cognitivo do educando, bem como ampliar o seu léxico, porém não se deve impor bruscamente o padrão sob pena de continuar promovendo, na sociedade, o complexo de incompetência linguística, que gera alienação. Seria necessário ao professor falante da forma culta se familiarizar com a nova realidade escolar, conduzindo o aluno a alternar fala familiar com a norma culta, em função das situações de interação verbal (...) – 12 – Estudos Linguísticos e Variação Com a leitura desse texto, iniciamos um caminho bastante interessante: não estudaremos somente o que a é linguística, o que é a linguagem. Buscare- mos, também, um percurso que nos permita refletir sobre ela e sobre seu uso. Nessa perspectiva, é importante não sermos apenas meros repetidores dos conhecimentos adquiridos, mas usuários sabedores de uma língua que tem várias funções nos contextos sociais constituídos. Refletir nos diferencia. Somos educadores. E como tal, devemos também ter consciência do nosso papel na análise da nossa língua, a língua brasileira. 1.1 O que é Linguística Costuma-se estabelecer que a Linguística é a ciência que estuda os fenômenos relacionados à linguagem verbal humana, buscando entender quais são as características e princípios que regem as estruturas das línguas do mundo. Cabe aos linguistas, portanto, a responsabilidade do estudo e formula- ção de explicações a respeito das estruturas e dos mecanismos da linguagem em geral. Assim, para que nossos estudos apresentem o embasamento necessário, faz-se mandatório apresentar algumas das definições, conceitos ou estudos de especialistas na área em relação O que é linguística. Iniciaremos com Rodrigues (2008), asseverando que, para se estabelecer como ciência, a linguística necessitava definir seu objeto e obter um método que atendesse ao estudo desse objeto. De acordo com Fiorin (2009), a linguística definiu-se, com bastante sucesso, entre as ciências humanas, como “o estudo científico que visa descre- ver ou explicar a linguagem verbal humana”. Para compreender a concepção da Linguística, Juchem (2008) afirma que se deve recorrer a uma visão geral de sua história. De acordo com essa autora, citando Saussure, a língua, como tal, preci- puamente era limitada à Gramática, onde servia, unicamente, aos paradigmas de certo e errado. – 13 – Estudos Linguísticos e Variações No início do século XVIII, a Linguística começa a ter seu campo de estudo redimensionado pela Gramática Comparada, que apresenta, então, a possibilidade de as línguas serem comparadas entre si, assevera Saussure. A língua passa a ser pensada e estudada como tal somente meio século depois. Com os estudos entre as línguas românicas e germânicas, nasce a escola de neogramáticos, que passa a entender a língua como processo resul- tante da coletividade, não mais individual. É nessa visão pioneira que Saussure se apoiará para conceber a língua em sua dimensão social. Considerando como matéria “todas as manifestações da linguagem humana”, Saussure instaura três tarefas básicas para a Linguística: a) “fazer a descrição e a história de todas as línguas que puder abranger; b) procurar as forças que estão em jogo, de modo permanente e universal; c) delimitar e definir-se a si própria” (ibid., p. 13). Com isso, Saussure reivindica para a Linguística um lugar dentro da ciência, ou seja, enfatizando, a partir de seus estudos, buscou-se a considera- ção da Linguística como ciência. Saussure também admite que a Linguística possui estreitas relações com outras ciências, mas, ao intuir que “tudo é psicológico na língua”, ou seja, social, está delimitando seu ponto de vista a respeito da língua e, para Saus- sure, “o ponto de vista cria o objeto” (ibid., p.15). Tem-se a partir daí o objeto da Linguística: a língua – essência de sua existência. Mas, Saussure admite que uma língua não existe sem os falantes, ele ainda apresenta a linguagem como um “fenômeno – o exercício de uma faculdade que existe no homem e a língua é o conjunto de formas concordan- tes que esse fenômeno assume numa coletividade de indivíduos e numa época determinada” (SAUSSURE, 2004, p. 115) “F . J ul lie n G en èv e” Figura 2: Ferdinand de Sassure – 14 – Estudos Linguísticos e Variação Contudo, enfatiza: “a língua não está naquilo que nos interessa no indi- víduo, naquilo que nos interessa antropologicamente nem no que nos parece indispensável para produzi-la, jogo de órgãos vocais ou convenção de espécie voluntária” (ibid., p. 247-248). Sua inquietação está em tomar a língua em si e por si, como “norma de todas as outras manifestações da linguagem” (id., 2006, p. 16-17), porque somente ela épassível de definição e classificação. Saussure afirma também, em seu livro Curso de Linguística Geral, (2005, p.13), que: A matéria da Linguística é constituída inicialmente por todas as manifestações da linguagem humana, quer se trate de povos selvagens ou de nações civilizadas, de épocas arcaicas, clássicas ou de decadências, considerando-se em cada período não só a linguagem correta e a ‘bela linguagem’, mas todas as formas de expressão. Isso não é tudo: como a linguagem escapa as mais das vezes à observação , o linguista deverá ter em conta os tex- tos escritos, pois somente eles lhe farão conhecer os idiomas passados ou distantes. Petter (apud Fiorin, 2005, p.17-18) afirma que o termo linguagem tem variadas acepções e pode se referir desde a linguagem dos animais até outras linguagens - música, dança, pintura, entre outras. Figura 3: Linguagem. Sh ut te rs to ck .c om / S as ha ti ga r – 15 – Estudos Linguísticos e Variações Contudo, convém enfatizar que “a Linguística detém-se somente na investigação científica da linguagem verbal humana. No entanto, é de se notar que todas as linguagens (verbais ou não verbal) compartilham uma caracterís- tica importante – são sistemas de signos usados para a comunicação”. A Linguística, assume Petter, estuda a principal modalidade dos sistemas sígnicos, as línguas naturais, que são a forma de comunicação mais altamente desenvolvida e de maior uso. Dascal & Borges Neto (1991) tentaram mostrar que a “linguagem humana”, mesmo que a considerassem um único objeto complexo, não per- maneceria o mesmo objeto, citando: [...]a linguagem, tal como manipulada ou enfocada pela filo- sofia, pela magia, pela atividade estética (literatura, por exem- plo) pelo jornalismo e pela linguística é invariante, autoidên- tica, independentemente do enfoque? A resposta é, certamente, não! Ou seja, a escolha de um objetivo relativamente à abordagem de um objeto deter- mina, na verdade, uma visão, um modo de construir esse objeto. Ao escolher o objetivo fazer ciência, a linguística propõe de fato um modo de construir ou conceber seu objeto, a linguagem”. Entende-se por linguagem a capacidade que os seres possuem de se expressar, de se comunicar. Há inúmeros tipos de linguagens como os sinais, os símbolos, os sons, os gestos, as cores, os signos da linguagem verbal. Todo elemento que estabelece o ato comunicativo entre indivíduos pode ser reco- nhecido como linguagem. A Linguística é, segundo todos as definições apresentadas, uma ciência que estuda todo e qualquer sistema de signos. Estuda a principal modalidade dos sistemas de signos, as línguas naturais, consideradas a forma de comuni- cação mais desenvolvida e de maior uso. Mas, o que sabemos acerca do que são as línguas naturais? Chamam-se Línguas Naturais as línguas faladas por qualquer comunidade humana para interação social. A expressão se opõe a línguas artificiais como as gera- das por computadores. BORBA (2007, p.75) – 16 – Estudos Linguísticos e Variação Petter ainda firma que: Os estudos linguísticos não se confundem com o aprendi- zado de muitas línguas: o linguista deve estar apto a falar “sobre” uma ou mais línguas, conhecer seus princípios de funcionamento, suas semelhanças e diferenças. A Linguística não se compara ao estudo tradicional da gramática; ao obser- var a língua em uso, o linguista procura descrever e explicar os fatos: os padrões sonoros, gramaticais e lexicais que estão sendo usados, sem avaliar aquele uso em termos de um outro padrão: moral, estético ou crítico. (In: FIORIN, 2005) Podemos, assim, afirmar que a linguística é o estudo científico da lin- guagem humana, pois, para ser considerado científico, deve ter por base a observação dos fatos e a abstenção de propor qualquer escolha entre tais fatos. Martinet (1978) afirma que [...] importa especialmente insistir no caráter científico e não prescritivo do estudo: como o objeto desta ciência constitui uma atividade humana, é grande a tentação de abandonar o domínio da observação imparcial para recomendar determi- nado comportamento, de deixar de notar o que realmente se diz para passar a recomendar o que deve dizer-se. 1.2 Pequeno histórico da Linguística A partir do momento em que o homem se viu como tal, passou a se interessar pela linguagem. Povos primitivos, que não tinham a escrita para resguardar sua cultura, criaram por meio de pinturas nas paredes de cavernas, uma linguagem. Nossos ancestrais paleolíticos, que viveram entre 30000 e 8000 a.C. dei- xaram registrados para a eternidade a necessidade que tinham de representar, por meio de figuras, o que pensavam, o que viam e o que sentiam. Sua capaci- dade de descrever os bichos com os quais entravam em contato com tamanha precisão de detalhes atesta a vontade de comunicar algo. É uma espécie de recado que nos deixaram, no tempo ainda em que não tinham a menor noção de que estavam criando meios de transmitir mensagens. – 17 – Estudos Linguísticos e Variações Figura 4: Pintura Rupestre. Imagem de pinturas rupestres do Complexo de Cavernas de Lascaux – França (uma das mais conhecidas do mundo e Patrimônio Mundial da UNESCO). Tempos depois, ainda que os povos primitivos não constituíssem uma linguagem escrita, ainda assim contavam, por meio de gestos, sons e simu- lações, suas ideias e pensamentos. Essa vocação comunicativa é inconteste e faz parte da natureza humana. E a invenção de uma língua primitiva, que se registrou no barro, na pedra, na parede não se deu de maneira intencional, mas foi obra de uma construção processual em que eram usados símbolos e associações. Com a frequência e disseminação dos símbolos e associações germinou aquilo que podemos entender como invenção da linguagem escrita, muitos registros foram objeto de estudo de arqueólogos e antropólogos no sentido de se descobrir como os seres humanos criaram os códigos que compõem suas línguas. Estudiosos passaram, então, a analisar a língua com o intuito de conhe- cer essa capacidade inata e exclusivamente humana de interação linguística Sh ut te rs to ck .c om / A si t J ai n – 18 – Estudos Linguísticos e Variação com o meio. As línguas, então, tornaram-se, não uma forma de desvenda- mento da história dos seres humanos, mas começaram a ser analisadas em si mesmas. E assim, o estudo científico das línguas e da linguagem veio após o século XVIII. Conforme Gonçalves e Santos, costuma-se dividir a ciência, que hoje chamamos linguística, em duas grandes fases ou períodos: a linguística até o século XIX – a pré-saussuriana – e a linguística a partir do século XIX – a saussuriana. Na verdade, é bom que se saliente que só no século XIX a lin- guística começou a adquirir status de ciência. Antes dessa época já havia estudos que se preocuparam com a origem e a estruturação da língua. Mas não havia ainda pesquisas com embasamento científico suficiente, e esses estudos se concentravam no caráter meramente descritivo da língua. E, conforme ainda esses autores, no período considerado como pré- saussuriano, destacam-se três fases: a filológica, a filosófica e a histórico- comparativista. Pode-se afirmar que a fase filosófica dos estudos linguísticos principiou com os gregos. Gonçalves e Santos afirmam que “a ideia grega sobre a lingua- gem foi, de início, eminentemente prática. Para os gregos, o importante na análise da língua era observar de plano a práxis, a ação, o “fazer”. Os gregos também foram os precursores dos estudos em torno da ori- gem da língua materna. Por meio de suas reflexões filosóficas a respeito da língua, embrenharam-se na área da Morfologia, da Etimologia, da Retórica, da Semântica, da Fonologia, da Filologia e da Sintaxe. Com os gregos, os estudos da linguagem começaram como uma espécie de descrição da língua, porém limitada à coletânea de regras (gramática), às quais “ensinavam” a arte de ler e de escrever. Começou-se por fazer o que se chamava de “Gramática”. Esse estudo , inauguradopelos gregos, e continuado princi- palmente pelos franceses, é baseado na lógica e está despro- vido de qualquer visão científica e desinteressada da própria – 19 – Estudos Linguísticos e Variações língua; visa unicamente a formular regras para distinguir as formas corretas das incorretas. (CLG, p.7) Figura 5: AEscola de Atenas. 1509. Fresco, width at the base 770 cm. Stanza della Segnatura, Palazzi Pontifici, Vatican Contudo, pelos princípios filosóficos da época, esses estudos estavam desprovidos de uma visão científica e objetiva da língua em si mesma, embora buscassem descrevê-la por meio de uma normatização. Os estudos realizados pelos gregos influenciaram os estudos vindouros e suas hipóteses acerca da língua perduraram por vários séculos. A chamada fase filosófica dos estudos da linguagem humana se estendeu até a Idade Média. – 20 – Estudos Linguísticos e Variação Figura 6: Biblioteca de Alexandria A Biblioteca de Alexandria passou a ser efetivamente uma biblioteca aberta ao público em 283 a.C.. Com manuscritos de valor inestimável, foi queimada. Ficava em Alexandria, cidade helênica fundada no Egito por Alexandre, o Grande. O imperador seguinte a ele, Sotero Ptolomeu II, quis construir um museu de estilo grego que atraísse estudiosos do mundo todo. Daí surgiu a PtolemaicMouseionAcademy,nome oficial da Antiga Biblioteca de Alexandria. (...) Depois de tantas invasões e falta de recursos pra manter a biblioteca, ela não abrigava mais uma grande coleção e nem era referência para acadêmicos. O acervo restante foi literalmente queimado - os pergaminhos foram usados como combustível nos fornos que mantinham quentes os banhos termais da cidade, de acordo com Canfora. Demorou seis meses para que todo o material fosse queimado e só os livros de Aristóteles foram poupados. Disponível em:<http://revistagalileu.globo.com.>Acesso em 21 maio 2015. – 21 – Estudos Linguísticos e Variações A declarada segunda fase dos estudos pré-saussurianos, a que tem por base a Filologia, surgiu em Alexandria, em torno do século II a.C.. Os estudos alexandrinos de então, propagavam uma descrição mais filo- lógica e menos filosófica da língua. À época, os filólogos procuraram focar seus estudos na morfologia, na sintaxe, na fonética e, por consequência, na elucida- ção dos textos em geral. Esses estudos filológicos acabaram influenciando toda a Idade Média. A fase filológica da descrição da língua teve no filólogo alemão Friedrich August Wolf (1759-1824) seu principal divulgador. Mas, o que é Filologia? A palavra filologia em sentido lato emprega-se muito frequente- mente para designar dois domínios que, todavia, importa distinguir: a filologia em sentido restrito e a linguística; duas disciplinas rela- cionadas com a linguagem humana, mas cujos pontos de vista são diferentes. [...] o papel da filologia é determinar o conteúdo de um documento que utiliza uma língua humana. (MALMBERG, 1971). A Filologia, que tem como princípio “a determinação do conteúdo de um documento que utiliza a língua humana”, a partir de meados do século XVIII aumentou de forma considerável seu campo e sua abrangência, graças a escola alemã de WOLF, pregando a importância do conhecimento dos cos- tumes, das instituições e da história literária dos povos. [...] A língua não é o único objeto da Filologia, que quer, antes de tudo, fixar, interpretar, comentar os textos; [...] se aborda questões linguísticas, fá-lo sobretudo para comparar textos de diferentes épocas, determinar a língua peculiar de cada autor, decifrar e explicar inscrições redigidas numa lín- gua arcaica ou obscura. (CLG, p.7) Todo o arcabouço teórico de então contribuiu para o surgimento e a consolidação da linguística histórico-comparativista. Por volta do final do século XVIII, início do século XIX, os estudos his- tórico-comparativistas têm início, na busca da identificação das relações entre o latim, o grego e as línguas germânicas, entre outras, a partir da descoberta do sânscrito. – 22 – Estudos Linguísticos e Variação O período histórico-comparativista estabelece para a linguística sua ter- ceira fase, chamada de fase histórica, notadamente marcada pela preocupação dos teóricos em saberem como as línguas evoluem, e não tão somente como funcionam, conforme tinha sido o enfoque até então. A fase histórico-comparativista teve devida importância, pois colaborou para o lançamento das bases científicas para a linguística do século XX, inclu- sive para os ensinamentos de Saussure e de Bloomfield. 1.3 Objeto de estudo da linguística Apresentamos na introdução desse capítulo que linguística é o estudo da linguagem humana. Podemos, então, conforme Botelho (2008, p. 53), afirmar que a Linguística é: [...] uma ciência que procura observar e descrever os fenôme- nos linguísticos ou de uma dada língua ou de línguas afins ou nas línguas em geral, na busca de princípios fundamentais, que regem a organização e o funcionamento da linguagem humana, como elemento de comunicação entre os membros de uma dada comunidade linguística e de exteriorização psí- quica desses mesmos membros. Já vimos que, com Saussure, a Linguística ganha um objeto específico: a língua. O estudioso a conceituou como um “sistema de signos”, ou seja, um conjunto de unidades que estão organizadas formando um todo. Segundo Orlandi ( 1995), Saussure define esse “signo” como a associa- ção entre significante (imagem acústica) e significado (conceito). Ele afirma que é fundamental observar que a imagem acústica não se confunde com o som, pois ela é, como o conceito, psíquica e não física. Ela é a imagem que fazemos do som em nosso cérebro. Oliveira (2013) explica que, para Saussure, a capacidade da linguagem não pode ser o objeto de estudo de uma única ciência como a linguística, na medida em que ela tem características de naturezas diversas: física, fisiológica, antropológica, entre outras. Enfatiza que o objeto da linguística deve ser a lín- gua, que é um produto social da faculdade da linguagem, e que é uma unidade. – 23 – Estudos Linguísticos e Variações Saussure apresenta ainda a distinção entre fala e língua: para ele, a fala é a realização concreta da língua pelo sujeito falante, sendo cir- cunstancial e variável; já a língua é um sistema abstrato, um fato social, geral, virtual. Consoante Petter (apud Fiorin, 2005, p.14), a língua é para Saussure “um sistema de signos” – um conjunto de unidades que se relacionam orga- nizadamente dentro de um todo. É “a parte social da linguagem”, exterior ao indivíduo; não pode ser modificada pelo falante e obedece às leis do contrato social estabelecido pelos membros da comunidade. Ela também afirma que o conjunto linguagem-língua contém ainda um outro elemento, conforme Saussure, a fala. Já vimos que a fala é um ato individual, resultado das combinações feitas pelo sujeito falante ao utilizar o código da língua e se expressa pelos mecanis- mos psicofísicos (atos de fonação) necessários à produção dessas combinações. A distinção linguagem/língua/fala, segundo Fiorin (2005), situa o objeto da Linguística para Saussure. Dela decorre a divisão do estudo da linguagem em duas partes: uma que investiga a língua e outra que analisa a fala. Afirma ainda que as duas partes são inseparáveis, visto que são interdependentes: a língua é condição para se produzir a fala, mas não há língua sem o exercício da fala. Há necessidade, portanto, de duas Linguísticas: a Linguística da lín- gua e a Linguística da fala. Para o linguista americano William Labov, o objeto da linguística é a gramática da comunidade de fala, o sistema de comunicação usado nas interações sociais. Esse objeto é essencialmente heterogêneo em duas dire- ções: ele comporta um grande número de variantes, estilos, dialetos e lín- guas usadas pelos falantes e não pode ser arbitrariamente retirado do nicho social em que é usado. Saussure focalizou em seu trabalho a Linguística da língua, “produto social depositadono cérebro de cada um”, sistema supraindividual que a sociedade impõe ao falante. Destacamos, portanto, nesse capítulo, que, para Saussure, a língua é um objeto fundamentalmente social. De acordo com Borges Neto (2004), Chomski escolhe a competência como objeto da linguística, excluindo do domínio da disciplina, consequentemente, todos os fatos do desempenho. – 24 – Estudos Linguísticos e Variação Aqui Chomski age do mesmo modo de Saussure, e a distinção compe- tência/desempenho tem o mesmo papel homogeneizante que a distinção saus- suriana lange/parole. Para Chomski, a língua é um objeto mental, um sistema de princípios radicados na mente humana. Mas, sobre isso, estudaremos mais adiante. Compete-nos destacar, agora, o que nos dizem em relação ao objeto da Linguística, Borges e Dascal (apud Borges, 2004): [...] assim, para toda definição do objeto linguística apresentada, outras definições possíveis seriam excluídas. Por exemplo, para quem assume que o objeto da linguística é a competência linguística do falante/ouvinte ideal, todos os fatos linguísticos ligados à variação ou ao discurso ficam, de certa forma, fora do domínio da linguística. E vice-versa. Se alguém assumir que o objeto da linguística são os textos reais produzidos pelos falantes, a própria noção de competência linguística pode perder todo o significado. A alternativa seria o apelo a “definições” suficientemente vagas para conter todas as possibilidades, tais como “o objeto da linguística é a linguagem humana”, ou algo semelhante, que na realidade não definem nada, ou definem tão pouco que perdem completamente o interesse. Não é difícil perceber por que isso acontece. A linguagem é um objeto de tal complexidade que todas as possibilidades de abordagem serão sempre parciais. A lin- guagem está presente e se liga a tudo o que o homem faz. Pode-se dizer, por exemplo, que a linguagem é o suporte do pensamento; que a linguagem é instrumento de comuni- cação e ação sobre os outros; que a linguagem é matéria de arte; que a linguagem é usada como índice de posição social, entre outros. [...]. Para finalizarmos esse capítulo, acreditamos ser importante apresentar um trecho de um artigo intitulado A importância da Linguística na produção e interpretação de textos, de Lídia Carmem Santana Queiroz. Nele, estão presentes alguns pontos de vista relativos à gramática formal, que normalmente é estudada e cobrada nas salas de aula na disciplina de Lín- gua Portuguesa, e algumas considerações acerca do estudo da linguística. Que esse excerto sirva para continuarmos nossas reflexões: – 25 – Estudos Linguísticos e Variações A IMPORTÂNCIA DA LINGUÍSTICA NA PRODUÇÃO E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS (...) Gramática Normativa Esta área das muitas outras pertencentes aos estudos de Linguagens e Códigos está relacionada às normas de concordância, às regras e preocupa-se com o entrelace das pala- vras na pronúncia e escrita corretas, visando à estética, em não encontrar erros de ortografia, de regência, de pontuação, etc. De acordo com Possenti (2000) “[...] a noção de gramá- tica é controvertida: nem todos os que se dedicam ao estudo desse aspecto das línguas a definem da mesma maneira.” Gramática nada mais é, num sentido mais simples, um con- junto de regras que de acordo com os estudiosos da área, devem ser seguidas e dominadas pelos falantes da língua. Estas regras são encontradas na Gramática Normativa que tem por intuito contri- buir para o desenvolvimento do estudo de processos lexicais. Esta área atenta para que seja ensinada e aprendida a norma-padrão da escrita, ou seja, os indivíduos em contato com a gramática normativa aprenderão escrever de acordo com as regras impostas pela mesma, o chamado português “correto”, a norma culta. (...) A complexidade da língua culta faz com que os próprios estudiosos contradigam-se, causando assim, incertezas aos novos aprendizes da língua. (...) Parafraseando Perini (2002), a gramática deveria ser consistente e livre de contra- dições para ganhar mais credibilidade diante de seus usuários, fazendo assim, com que seja mais fácil e agradável estudá-la. Para os gramáticos, a língua é tida como um sis- tema, ou um conjunto de sistemas em que a preocupação em defini-la não é uma cons- tante, uma vez que, muitas gramáticas não fazem sequer menção a uma conceituação de língua, sendo que, os gramáticos a conceituam para distingui-la da linguagem, fazendo destes conceitos o foco de seus estudos teóricos. “Com a instrumentalização da Gramática Normativa em mecanismo ideológico de poder e de controle de uma camada social sobre as demais, formou-se essa “falsa consciência” coletiva de que os usuários de uma língua necessitam da Gramática Nor- mativa como se ela fosse uma espécie de fonte mística da qual emana a língua “pura”. Foi assim que a língua subordinou-se à gramática.” (BAGNO, 2000:87). Segundo Bagno (2000) “A gramática deve conter uma boa quantidade de ativi- dades de pesquisa, que possibilitem ao aluno a produção de seu próprio conhecimento linguístico, como uma arma eficaz contra a produção irrefletida e acrítica da gramá- tica normativa”. Sh ut te rs to ck .c om / C ie np ie s D es ig n – 26 – Estudos Linguísticos e Variação (...) A importância do estudo da gramática normativa está, então, inserida em um conjunto de regras que vai nos fornecer o que é certo e errado na hora de elaborar textos e em toda a forma escrita. Além disso, é comum vermos que muitos gramáticos buscam embasar a língua falada de acordo com o estabelecido pela norma padrão. Uma sinopse sobre Linguística Distinguindo-se totalmente da Gramática, a Linguística está totalmente ligada à fala dos indivíduos e se preocupa em entender as diferenças entre os dialetos que variam de região para região em nosso país devido à miscigenação cultural e social encontradas no mesmo. Para os linguistas, não há necessidade de o indivíduo saber todas as regras gra- maticais para se comunicar no ato da fala. A linguagem é inata a qualquer ser humano e é o meio de comunicação entre falantes de um mesmo país ou grupo. Porém, as escolas tradicionais se preocupam em ensinar para os alunos, todas as regras gramati- cais, esquecendo de aprimorar a fala, sendo ela, o que o corpo docente domina melhor. “Eis um óbvio que frequentemente esquecem os que transformam o estudo da língua em estudo de Gramática. Uma crítica indireta à escola tradicional onde é tão raro que se estude a língua como meio de comunicação.” (LUFT, 1995:16). A possibilidade humana de se comunicar, de interagir no nível de ideias, só é possível com a aquisição de uma língua. Mesmo havendo dúvidas quanto à maneira de usá-la, o importante - acima de tudo - é conseguir transmitir a mensagem de forma que os interlocutores a compreendam. As diferentes abordagens quanto ao uso da língua implica inúmeras incógnitas, pois, pensar a língua significa também, pensar no processo de fala e de escrita, ou seja, pensar a língua em seu uso. “Segundo a Linguística, não existe uma forma melhor (mais certa) ou pior (mais errada) de empregar uma língua. A norma culta é apenas uma entre as muitas formas de usar a língua. A escolha da norma culta como “modelo” é arbitrária e convencional; baseia-se em critérios ideológicos (sociais, culturais, políticos e econômicos).” (AMARAL [et al.], 2005:141). Esta teoria apresenta ainda uma tendência maior à universalização e aspira à construção de uma teoria geral da estrutura da linguagem que abarque todos os seus aspectos. O desenvolvimento, ao longo dos séculos, de várias hipóteses sobre a forma- ção, evolução e funcionamento da linguagem criou a base para as pesquisas linguísticas atuais. Antes do século XIX, quando a linguística ainda não havia adquirido caráter científico, os estudos nessa área eram dominados por considerações empíricas sobre a própria condição da linguagem, que proliferaram em vários glossários e gramáticas cujo objetivo era explicar e conservaras formas linguísticas conhecidas. ( ...) In: http://www.webartigos.com/artigos/a-importancia-da-linguistica-na-producao-e- -interpretacao-de-textos/74778/#ixzz3boemVJb9Acesso em 21/05/2015 2 Comunicação Comunicação não é o que você fala, mas o que o outro compreende do que é dito. Claudia Belucci Em nosso primeiro capítulo, vimos que a linguagem humana é o objeto do estudo da linguística. Neste capítulo, nos ateremo-nos ao estudo do que é lingua- gem, visto que a linguística é a ciência que investiga os fenômenos relacionados à linguagem e que busca determinar os princípios e as características que regulam as estruturas das línguas. Não podemos nos abster, portanto, primeiramente, de apresen- tar o que advém ao estudo da linguagem e da língua: a comunicação. – 28 – Estudos Linguísticos e Variação 2.1 Comunicação A palavra comunicação deriva do latim communis, que remete à ideia de comunidade. A atividade de comunicação é uma constante em qualquer escala da vida animal: todos os animais se comunicam de alguma forma e em algum período de sua vida seja por necessidade de sobrevivência, seja por imperati- vos biológicos, como reprodução, alimentação, atividades que impõem um mínimo de interação. A constância e a amplitude da atividade comunicativa talvez estejam ligadas aos meios de que a espécie dispõe para tal fim. Algumas espécies pos- suem códigos nitidamente pontuais e limitados, porém, na espécie humana o ato comunicativo atinge o mais alto grau de complexidade e eficiência. A comunicação, por meio das diversas linguagens, está ligada à capa- cidade humana, formada por leis combinatórias e signos linguísticos que se tornam concretizados na mensagem. E há variadas linguagens, a lin- guagem dos gestos, do olhar, dos sons, do movimento do corpo, das cores, das linhas, das formas, dos símbolos e signos. Quando nos referimos aos signos da linguagem escrita, remetemo-nos à ideia da linguagem verbal, constituída pelos sinais gráficos, cuja interpretação requer do interlocu- tor, conhecimentos linguísticos e conhecimentos adquiridos ao longo de sua existência. Cabe-nos destacar agora os elementos que compõem a comunicação: que são: a) Emissor: aquele que emite a mensagem; b) Receptor: aquele que recebe a mensagem; c) Mensagem: conjunto das informações transmitidas; d) Código: conjunto de signos e regras de combinação desses signos; a comunicação só será efetivada se o receptor puder codificar a men- sagem transmitida pelo emissor; e) Canal de comunicação ou contato: é o meio pelo qual a mensagem é transmitida; f ) Contexto ou referente: a situação a que a mensagem se refere. – 29 – Comunicação Receptor (a quem se destina a mensagem) Emissor (o que emite a mensagem) (através de que a mensagem é passada, no caso, a voz) Mensagem (objeto da comunicação) Código (como a mensagem está orgaizada) Canal de comunicação Ao observarmos o exemplo acima, podemos organizar os elementos da comunicação da seguinte forma: 1. Emissor: uma mulher. 2. Receptor: um homem. 3. Mensagem: efetivamente o que a mulher está dizendo. 4. Código: linguagem oral no idioma que ela está utilizando. 5. Canal de comunicação ou contato: voz. 6. Contexto ou referente: pela expressão facial dos interlocutores, ves- tuário, o contexto é informal. Contudo é preciso lembrar que só há a comunicação entre os interlocutores – autor e receptor - se o recep- tor compreender a mensagem transmitida pelo autor e, invariavelmente, der continuidade à interlocução. Por exemplo, se o rapaz não for falante da mesma língua (não decodificar o código linguístico) acontece o que chamamos de ruído. A comunicação não se efetiva. – 30 – Estudos Linguísticos e Variação 2.2 Linguagem O homem procura dominar o mundo em que vive. Uma forma de ele ter esse domínio é o conhecimento. Esse é um dos motivos pelos quais ele procura explicar tudo o que existe. A linguagem é uma dessas coisas. Ao procurar explicar a linguagem, o homem está procurando explicar algo que lhe é próprio e que é parte necessária de seu mundo e da sua convivência com os outros seres humanos. (Orlandi,2009) Considerada em si mesma, a linguagem humana é apenas uma habili- dade ou competência que se revela por meio de conjuntos organizados a que se chama língua e de que as comunidades se servem para a interação social. Ao se falar determinada língua, pressupõe-se um conhecimento que cer- tamente transcende a um intento puramente linguístico. Para exemplificar, vamos contextualizar com um encontro entre duas pessoas, duas pessoas falantes de uma mesma língua. Elas, quando passam a interagir linguisticamente, promovem um intercâmbio amplo em que cada uma delas passa a elaborar uma imagem da outra, (se está bonito (a); cansado (a); triste; feliz; realizado (a); decepcionado (a), entre outras elaborações. Muito além da mensagem que trocam, há muitas outras informações. São esses processos anteriores que culminam com a comunicação que passaremos a estudar agora, pois, segundo Borba (2007) “a linguagem aparece como o mais difundido e o mais eficaz instrumento natural de comunicação à disposição do homem”. Na medida em que se desenvolveram os estudos linguísticos, muitas definições de linguagem foram sendo propostas. Muitas delas são próximas em alguns pontos e distintas em outros. A linguagem humana tem sido idealizada de maneiras bastante diversas e que, conforme Koch (2008), podem ser abreviadas em três principais:Como reprodução (“espelho”) do mundo e do pensamento; – 31 – Comunicação Sh ut te rs to ck .c om / I ng ka D . J iw Figura 7: “Espelho do mundo” VII. Como instrumento (ferramenta) de comunicação; Sh ut te rs to ck .c om /M on ke y B us in es s Im ag es Figura 8: Comunicação VIII. Como forma (“lugar”) de ação ou interação. Figura 9: Interação Sh ut te rs to ck .c om /R aw pi xe l – 32 – Estudos Linguísticos e Variação A mais antiga dessas percepções é, sem dúvida, a primeira. Segundo ela, “o homem representa para si o mundo por meio da linguagem e, assim sendo, a função da língua é representar (= refletir) seu pensamento e seu conheci- mento de mundo”. A segunda percepção considera a língua como um código por meio do qual um emissor comunica a um receptor determinadas mensagens. A princi- pal função da linguagem é, neste caso, a transmissão de informações. A terceira percepção é aquela que apresenta a linguagem como atividade, como forma de ação, individual orientada, como lugar de intercâmbio que possibilita aos membros de uma sociedade a prática dos mais diversos tipos de atos, que vão exigir dos semelhantes reações e/ou comportamentos, que tendem a consignar vínculos e compromissos anteriormente inexistentes. Continuando o raciocínio apresentado por Koch, veremos o que Petter apresenta entre a dicotomia Saussure e Chomsky. Petter (2005) apresenta que Saussure considerou a linguagem “hete- róclita e multifacetada”, pois compreende vários domínios; é ao mesmo tempo física, fisiológica e psíquica; pertence ao domínio individual e social; «não se deixa classificar em nenhuma categoria de fatos humanos, pois não se sabe como inferir sua unidade». Ainda segundo a autora, Saussure abstrai uma parte do todo linguagem, a língua - um componente unificado e suscetível de categorização. A autora assevera ainda que Saussure considera a língua uma parte indis- pensável da linguagem; “é um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos” (CLG, p.17). Na segunda metade do século XX, Noam Chomsky, linguista estaduni- dense, apresentou para o meio científico um frescor necessário para os estu- dos da língua e da linguagem. Em seu livro Syntactic Structures (1957), asse- vera: “Doravante considerarei uma linguagem como um conjunto (finito ou infinito) de sentenças, cada uma finita em comprimento e construída a partir deum conjunto finito de elementos”. Essa acepção envolve não só as línguas naturais, mas, conforme ele, todas as línguas naturais, orais ou escritas, são linguagens, no sentido de sua – 33 – Comunicação definição, pois : a) toda língua natural possui um número finito de sons (e um número finito de sinais gráficos que os representam, se for escrita); b) mesmo que as sentenças distintas da língua sejam em número infinito, cada sentença só pode ser representada como uma sequência finita desses sons (ou letras). Chomsky afirma ainda que a linguagem é uma capacidade inata e espe- cífica, ou seja, transmitida geneticamente e própria da espécie humana; dessa forma, existem propriedades universais da linguagem. Chomsky centrou seus estudos na sintaxe, na capacidade que os falantes têm de compor, recompor, compreender as frases dessa língua. Chomsky criou a Gramática ou linguística Gerativa, inicialmente formulada como uma espécie de resposta e rejeição ao modelo behaviorista de descrição dos fatos da linguagem, modelo esse que foi dominante na linguística e nas ciências de uma maneira geral durante toda a primeira metade do século XX. Para os behavioristas, dentre os quais se destacava o linguista norte-americano Leonard Bloomfield, a linguagem humana era interpretada como um condicionamento social, uma resposta que o organismo humano produzia mediante os estímulos que recebia da interação social. Essa resposta, a partir da repetição constante e mecânica, seria convertida em hábitos, que caracterizariam o comportamento linguístico de um falante. Uma das razões para estudar a linguagem (exatamente a razão gerativista) – e para mim, pessoalmente, a mais premente delas – é a possibilidade instigante de ver a linguagem como um “espe- lho do espírito”, como diz a expressão tradicional. Com isto não quero apenas dizer que os conceitos expressados e as distinções desenvolvidas no uso normal da linguagem nos revelam os modelos do pensamento e o universo do “senso comum” cons- truídos pela mente humana. Mais instigante ainda, pelo menos para mim, é a possibilidade de descobrir, através do estudo da linguagem, princípios abstratos que governam sua estrutura e uso, princípios que são universais por necessidade biológica e não por simples acidente histórico, e que decorrem de caracte- rísticas mentais da espécie humana. (CHOMSKY, 1980, p. 9) Mas não limitaremos nossos estudos a esses dois cientistas. Precisamos também verificar o que outros estudiosos nos dizem a respeito da linguagem. (Re)Iniciaremos com a visão dos comportamentalistas: segundo Mas- carello (2009), ao citar a visão de linguagem para os comportamentalistas, a linguagem é uma manifestação comportamental com, pelo menos, duas pro- priedades. A primeira tem relação com a criação arbitrária de conexões entre – 34 – Estudos Linguísticos e Variação a possibilidade de enviar ou receber sinais convencionais de fatos internos ou externos ao sujeito; a segunda relaciona-se com a possibilidade de combinar esses sinais com outras convenções, permitindo generalizações e aplicação de regras, do ponto de vista cultural. Antes da formalização da Psicolinguística tal qual a conhecemos hoje, os estudiosos da psicologia buscavam, conforme Castro (2007), compreender o funcionamento da linguagem como um meio para se chegar a uma melhor compreensão da mente humana, pois acreditavam que esta se organizava de forma análoga à linguagem e por meio dela. Vislumbravam-se, então, duas correntes: a mentalista, que explorava o pensamento por meio da linguagem, e a comportamentalista, que buscava entender o comportamento linguístico, reduzindo-o a uma série de mecanismos de estímulo-resposta. Já a corrente sociocognitiva observa a linguagem como algo de natureza social, que é produto das relações humanas. A linguagem como instrumento de comunicação é internalizada pelo indivíduo: e o homem por meio de suas transformações que faz, inclusive da linguagem, faz com que a natureza sirva a seus propósitos. Essa interação homem/linguagem/sociedade, constrói sig- nificações, utilizando signos, em especial, a linguagem verbal, elaborada pela sociedade ao longo da história, portanto uma construção sócio-histórica, cuja principal amplitude é ampliar seu repertório cultural. Do ponto de vista dos estudiosos da corrente sociocognitiva, o papel da linguagem é a comunicação. A linguagem é, antes de tudo, um meio de inte- ração, de inserção em uma comunidade cultural, de enunciação e compreen- são de mundo. Na linguagem estão integradas as funções da comunicação e do pensamento. Para Vygotsky (2001,p.11) “o significado da palavra é uma unidade des- sas duas funções da linguagem, comunicação e pensamento.” Para finalizarmos essa abordagem genérica da linguagem, destaco ainda o que nos apresenta Mascarello (2009) sobre linguagem e o funcionamento da mesma no cérebro humano: [...] podemos considerar que nosso cérebro se adapta ao ambiente cultural, e não absorve cegamente tudo o que lhe é apresen- tado, ou o que nossos olhos conseguem captar. O cérebro não é constituído de circuitos virgens hipotéticos, e nem se trata de uma tábula rasa onde se acumulam construções culturais: é um – 35 – Comunicação órgão estruturado que dá significado ao novo na interface com o velho. [...] E nesse processo a linguagem vai se constituindo pela entrada e saída de informações, mas, para isso acontecer, há um refinado processamento interno em que as redes neu- rais estão constantemente ativadas através das trocas sinápticas. 2.3 Língua Uma língua é fator resultante da organização de signos, segundo regras espe- cíficas e utilizadas na articulação da comunicação entre indivíduos de uma mesma comunidade cultural. A língua é um tipo de linguagem, é a linguagem verbal. Há na superfície do globo entre 4.000 e 5.000 línguas dife- rentes e cerca de 150 países. Um cálculo simples nos mos- tra que haveria teoricamente cerca de 30 línguas por país. Como a realidade não é sistemática a esse ponto (alguns países têm menos línguas, outras, muito mais), torna-se evidente que o mundo é plurilíngue em cada um de seus pontos e que as comunidades linguísticas se costeiam, se superpõem continuamente. O plurilinguismo faz com que as línguas estejam constantemente em contato. O lugar des- ses contatos pode ser o indivíduo (bilíngue, ou em situação de aquisição) ou a comunidade. (CALVET, 2002, p. 35) O estabelecimento da língua como objeto da linguística advém dos estu- dos de Saussure. Para ele, língua é um sistema de signos, um conjunto de unidades que estão organizadas formando um todo. O estudo da linguagem comporta, portanto, duas partes: uma, essencial, tem por objeto a língua, que é social em sua essência e independente do indivíduo; [...] outra secundária, tem por objeto a parte individual da linguagem, vale dizer, a fala, inclusive a fonação e é psicofísica. (CLG, p. 27) Orlandi (2009) afirma ainda que, para Saussure, o signo é a associação entre significante (imagem acústica) e significado (conceito). Ele diz que é fundamental observar que a imagem acústica não se confunde com o som, pois ela é, como o conceito, psíquica e não física. Ela é a imagem que fazemos do som em nosso cérebro. Perini (2010, p. 14), expõe: Chamamos “língua” um sistema programado em nosso cére- bro que, essencialmente, estabelece uma relação entre os esque- mas mentais que formam nossa compreensão do mundo e um – 36 – Estudos Linguísticos e Variação código que os representa de maneira perceptível aos sentidos. Os seres humanos utilizam um grande número de tais sistemas (“línguas”), que diferem em muitos aspectos e também se asse- melham em muitos outros aspectos. Tanto as diferenças quanto as semelhanças são altamente interessantes para o linguista. Voltemo-nos novamente para Saussure. Para ele, a linguagem é composta de duas partes: a Língua, essencialmente social, porque é convencionada por determinada comunidade linguística; e a Fala, queé secundária e individual, ou seja, é veículo de transmissão da Língua, usada pelos falantes por meio da fonação e da articulação vocal. A língua é, então, percebida como forma de concretização da linguagem; como sistema linguístico imperativo ao exercício da linguagem na interlocução ou como instrumento do qual a linguagem se utiliza na comunicação. Koch (2002) assevera que “à concepção de língua como representação do pensamento corresponde a de sujeito psicológico, individual, dono de sua von- tade e de suas ações (...) “o texto é visto como um produto – lógico – do pen- samento (...) do autor, nada mais cabendo ao leitor/ouvinte senão “captar” essa representação mental, juntamente com as intenções (psicológicas) do produtor, exercendo, pois, um papel essencialmente passivo”. De acordo com a Teoria da Comunicação, a língua é um sistema organi- zado de sinais (signos) usado como meio de comunicação entre os indivíduos. Assim, a língua é um código, um conjunto de signos, combinados por meio de regras, que possibilitam ao emissor transmitir uma certa mensagem ao receptor. Bakhtin (1997) apresenta que “[...]o sistema linguístico [...] é completa- mente independente de todo ato de criação individual, de toda intenção ou desígnio. [...] A língua opõe-se ao indivíduo enquanto norma indestrutível, peremptória, que o indivíduo só pode aceitar como tal.” Vimos, então, que a língua pode ser conceituada como um sistema de signos específicos aos membros de uma mesma comunidade (usuários nativos da língua portuguesa, por exemplo). Vale ressaltar que dentro dessa mesma comunidade haverá várias moda- lidades: língua familiar; língua popular, língua técnica, língua erudita, língua própria a certas classes sociais, entre outras. Bornemann (2008) apresenta o seguinte em relação em relação ao objeto da linguística e a língua: – 37 – Comunicação Alguns comentários sobre esse objeto A Linguística, depois de submetida a superficiais formulações, renasce pelo olhar de Ferdinand de Saussure, sendo chamado “Pai da Linguística” por dar a ela o lugar de ciência ao conceber a língua como objeto por si e em si mesmo. A formulação que faz da língua como um sistema de elementos relacionados entre si sintetiza sua visão estruturalista que descarta o meio pelo qual foi constituída, conside- rando, apenas, o estado de língua em si. Pode-se dizer que esse foco se ajusta a uma das tarefas básicas que Saussure propôs à Linguística: “procurar as forças que estão em jogo de modo permanente e universal” (SAUSSURE, 2006, p. 13), o que implica a língua em um ponto de vista comum e sincrônico, considerada por ela mesma e em suas relações de permanência, dada sua organização sistêmica e sua natureza homogênea. Sabendo que a língua e a fala são próprias da linguagem, Saussure trata logo de distinguir o que de fato cada uma retrata: o social e o individual, respectivamente. Vê nessa separação a necessidade de “delimitar e definir” seu objeto de estudo, como atribuiu à outra tarefa da Linguística, porque somente a primeira atende a esse objetivo, uma vez que é classificável e se constitui como instituição social. Essa redução vai de encontro à máxima saussuriana de que “o ponto de vista cria o objeto”, pois se a língua é social, então ela é compreendida a partir do todo e desta parte para a compreensão da unidade. O que importa é a descrição da rede de relações que a língua estabelece; o individual (a fala) está fora de questão. E mesmo que descreva a língua como um fenômeno de linguagem interdependente da fala, concentra-se na língua pelo que é exterior ao indivíduo e pela forma como os elementos linguísticos se organizam e se relacionam, permitindo seu funcionamento e conferindo à língua sua permanência como estado de língua. Para a Linguística da época, Saussure deu a resposta à questão da natureza de seu objeto de estudo. Para a Linguística moderna, foi o precursor estruturalista que deixou seu legado para o nascimento – ou continuidade – de muitas outras teorias.” BORNEMANN, Neila Barbosa de Oliveira. Ferdinand de Saussure e o objeto da Lin- guística. Cadernos do IL, Porto Alegre, n.º 36, junho de 2008. Disponível em:<http://www.seer.ufrgs.br/cadernosdoil/>. Acesso em: 28 maio 2015. 2.4 Fala Como vimos, a língua é um sistema de símbolos pelo qual a linguagem se realiza. Mas a linguagem se encontra relacionada a outros sistemas simbólicos (sinais marítimos, Código Morse...) e torna-se, assim, objeto da semiologia ou – 38 – Estudos Linguísticos e Variação semiótica, que deve estudar “a vida dos signos no seio da vida social”. Nota-se, portanto, que o termo linguagem tem uma conotação bem mais abrangente do que língua. Podemos afirmar que a fala é um fenômeno físico e concreto que pode ser analisado seja diretamente, com ajuda dos órgãos sensoriais, seja graças a métodos e instrumentos análogos aos utilizados pelas ciências físicas. O conjunto linguagem-língua contém ainda outro elemento, a fala, con- forme Saussure. A fala é um ato individual; resulta das combinações feitas pelo sujeito falante utilizando o código da língua; expressa-se pelos mecanismos psicofísicos (atos de fonação) necessários à produção dessas combinações. A distinção linguagem/língua/fala situa o objeto da Linguística para Saussure. Dela decorre a divisão do estudo da linguagem em duas partes: uma que investiga a língua e outra que analisa a fala. As duas partes são inse- paráveis, visto que são interdependentes: a língua é condição para se produzir a fala, mas não há língua sem o exercício da fala. O interessante é que os estudos realizados por Saussure foram criticados por alguns de seus sucessores (dentre eles Jakobson, 1985), pelo fato de Saus- sure ter priorizado a língua (por ser social) e prescindido a fala (considera- da individual). Segundo Jakobson (1985), entre a língua e a fala existe uma interde- pendência mútua, não dicotômica, como acreditava Saussure. A língua existe para a constituição de instâncias da fala; os mecanismos necessários para a concretização da fala dependem da língua. Fuzer (2004) assevera que Benveniste, por sua vez, dirige seu olhar não apenas para a forma linguística, mas principalmente para a sua função. Afirma ainda, continuando o raciocínio do autor, que a realidade é definida por inter- médio da linguagem. O falante faz renascer pelo seu discurso o acontecimento e a sua experiência do acontecimento; o ouvinte apreende primeiro o discurso e, por meio desse discurso, o acontecimento reproduzido. Conforme Fuzer (2004), “ a situação da troca e do diálogo confere ao ato de discurso dupla função: para o locutor representa a realidade; para o ouvinte recria a realidade. A linguagem é, portanto, o instrumento da comu- nicação intersubjetiva. A inserção do sujeito na constituição da linguagem marca uma nova etapa no desenvolvimento do conhecimento linguístico, mas sem perder de vista os fundamentes que a antecederam”. – 39 – Comunicação Vimos, nesse capítulo, os princípios que regem a comunicação, bem como elementos fundamentais para os estudos linguísticos, a saber, a lingua- gem, a língua e a fala. Podemos ainda apresentar, esquematicamente, os traços básicos da lín- gua e da fala: LÍNGUA FALA sistemático → regularidade subjacente potencial supraindividual, coletivo assistemático → variedade concreto real individual Embora a distinção entre língua e fala sejam evidentes, não podemos concluir que esquema e uso existam separadamente. Língua supõe fala. E vice-versa. Uma não existe sem a outra. Segundo Borba (2007), “seria melhor dizer que não são duas coisas diferentes, mas dois aspectos diferentes de uma coisa. A relação entre ambas se percebe por ser a língua indispensável para que a fala produza seus efeitos, e a fala é necessária para que a língua se estabeleça”. JUCHEM,(2008) apresenta ainda o que é língua para Saussure em parte do seu artigo Saussure, Benveniste e o objeto da linguística: (...) Na instauração da linguagem,depreende-se a importância da fala, que, segundo a teoria saussuriana, é “o embrião da linguagem”, porque, afinal, é por onde esta começa. Esse processo iniciado e articulado pelo cir- cuito da fala, num movimento de associação e coordena- ção, é o responsável pela organização da língua enquanto sistema. Esse sistema – a língua – é fato social possível pelo fato individual – a fala –,ainda que não exista sem a massa de falantes. O indivíduo, “senhor” da fala, promove a língua, mas ela só é completa na massa; é “um tesouro depositado pela prática da fala em todos os indivíduos pertencentes à mesma comunidade, um sistema gramatical que existe virtualmente em cada cérebro ou, mais exatamente, nos cérebros de um conjunto de Sh ut te rs to ck .c om / H er m in Figura 10: Olá – 40 – Estudos Linguísticos e Variação Concluímos esse capítulo citando Friedrich Nietzsche : “Na minha vida ainda preciso de discípulos, e se os meus livros não serviram de anzol, falharam a sua intenção. O melhor e essencial só se pode comunicar de homem para homem”. indivíduos”(SAUSSURE, 2006, p. 21). Tomando por base essa definição, conclui-se, ainda, que a língua é, para Saussure, virtual e comum, isto é, algo que existe poten- cialmente pelosocial. Em continuidade, a língua é delimitada e distinta da fala. Enquanto a língua é“exterior ao indivíduo”, como produto somente que esse recebe, a fala é acessória, “um ato individual de vontade e inteligência”, que permite a pessoa refletir seu pen- samento. Ambas são para Saussure de natureza concreta, porque cada imagem acústi- caestá limitada a determinados conceitos. Para ele, não existe nenhuma entidade linguística que exista fora da ideia de que lhe pode ser vinculada” (id., 2004, p. 23); por isso a possibilidade da sua apreensão. Por essa compreensão, tem-se a relação saussuriana da Linguística com a Semio- logia, justificando, assim, o lugar que lhe deu à ciência, uma vez que considera a língua um “sistema de signos que exprimem ideias”, sendo ela “social por natureza”(ibid., p. 25). O que ou quem a modifica não lhe atém a atenção; cabe-lhe o interesse pelo que é comum e tangível, pelas relações (ou regras) estabelecidas pelos signos linguísticos dentro do próprio sistema sob um ponto de vista sincrônico da língua. Desse ponto de vista decorre a distinção marcante que faz entre língua e fala, atribuída pelas denominações Linguística da Língua e Linguística da Fala; e mesmo que reconheça a interdependência entre elas, assinala à língua o centro da Linguística, enquanto a fala está subordinada a ela. O corte saussuriano entre os dois fatos de linguagem explica a omissão da fala na permanência da língua, porque é relativa a uma convenção social, que existe por si mesma; por isso não depende da fala, que, ao contrário, é heterogênea e inconstante (...) JUCHEM, Aline. Saussure, Benveniste e o objeto da linguística. Cadernos do IL, Porto Alegre, n.º 36, junho de 2008. 3 O Signo O signo é uma coisa que, além da espécie ingerida pelos sentidos, faz vir ao pensa- mento, por si mesma, qualquer outra coisa.” (Santo Agostinho) “Bem longe de dizer que o objeto precede o ponto de vista, diríamos que é o ponto de vista que cria o objeto (...) seja qual for que se adote, o fenômeno linguístico apresenta per- petuamente duas faces que se correspondem e das quais uma não vale senão pela outra. (CLG, 2005, p. 15) É inegável que as contribuições deixadas por Saussure, às quais norteiam os estudos linguísticos, ainda na atualidade, são de uma qualidade inquestionável. – 42 – Estudos Linguísticos e Variação Por isso, entre as principais dicotomias abordadas em seus estudos, como: semiologia/linguística, signo:significante/significado, arbitrariedade/lineari- dade, linguagem: língua/fala, sincronia/diacronia, sintagma/paradigma, algu- mas que ainda não estudamos, temos por finalidade nortear nosso estudo partindo dos conceitos envolvendo essas dicotomias deixadas por ele, que se trata, nesse caso, de abordar a relação entre língua (lange) e fala (parole) para iniciar nossas reflexões. 3.1 A teoria do signo Vimos, no capítulo anterior que, para que a comunicação se concre- tize, precisamos de dois elementos fundamentais: a linguagem- que representa todo o sistema de sinais convencionais, sejam estes de natureza verbal ou não verbal- e a língua, que é “a parte social da linguagem”, exterior ao indivíduo, não pode ser modificada pelo falante e obedece às leis do contrato social esta- belecido pelos membros da comunidade. A língua representa um sistema de signos convencionados de uma deter- minada comunidade linguística. Falta-nos incluir ainda a fala, que é um fenômeno físico e concreto e individual. Diante dessa retomada de conceitos, podemos referendar o signo lin- guístico, elemento representativo, que se constitui de dois aspectos básicos: o significante e o significado. Observem a imagem a seguir: Figura 11: “PÁSSARO” Sh ut te rs to ck .c om / B ip su n – 43 – O Signo Ao ouvirmos a palavra pássaro, ou passarinho, imediatamente nos vem à mente a imagem de um pássaro qualquer, uma imagem que represente o que essa palavra significa em nosso inconsciente, ou seja, algo que a represente de forma gráfica, por meio dos fonemas que formam as sílabas. Conforme Silva (2003), “o conceito relacionado à imagem acústica é também uma entidade psíquica, pois não é uma coisa observada no mundo, mas sim a representação mental dessa coisa, uma ideia. Assim, o signo lin- guístico é uma entidade psíquica de duas faces: a imagem acústica, a qual Saussure chama de significante (que está no plano da expressão) e o conceito, chamado por ele de significado (que está no plano de conteúdo)”. Assim, no exemplo apresentado pela imagem de pássaros, podemos depurar que a forma gráfica + som pássaro é o significante e o conceito, é o significado. O signo linguístico pode ser definido, então, pela união de um con- ceito e uma imagem gráfica/acústica. Da união entre significante e significado temos o signo linguístico. Desta feita, qualquer palavra, em qualquer língua, que possua um sentido, é um signo linguístico. Signo Imágem acústica Conceito Significante Significado PÁSSARO Saussure determina signo como a união do sentido e da imagem acús- tica. O que ele chama de “sentido” é a mesma coisa que conceito ou ideia, isto é, a reprodução mental de um objeto ou da realidade social em que nos situamos, reprodução essa condicionada pela formação sociocultural que nos cerca, desde nosso nascimento. – 44 – Estudos Linguísticos e Variação Segundo Carvalho (2004), simplificando, para Saussure, conceito é sinô- nimo de significado (plano das ideias), algo como o lado espiritual da palavra, sua contraparte inteligível, em oposição ao significante (plano da expressão), que é sua parte sensível. Por outro lado, assevera ainda Carvalho, a imagem acústica “não é o som material, coisa puramente física, mas a impressão psíquica desse som” (CLG, p. 80). Melhor dizendo, a imagem acústica é o significante. Com isso, temos que o signo linguístico é “uma entidade psíquica de duas faces” (p. 80), semelhante a uma moeda. O mais importante dos sistemas de signos, para Saussure, é a língua. Considerada por ele como um dos mais complexos e mais utilizados siste- mas de representações sígnicas; para ele, a língua é apenas uma parte do uni- verso semiológico. Saiba mais Semiologia: s.f. Ciência que se dedica ao estudo dos signos, dos modos que representam algo diferente de si mesmo, e de qualquer sistema de comunicação presentes numa sociedade. Podemos afirmar, então, que o signo é o resultado de um conjunto de relações mentais. Existe em cada signo uma acepção, ou várias acepções, ideias, de acordo com o contexto, com a leitura ou com o leitor e seu estado emocional. Silva assevera ainda que: o signo, para Saussure, “é um elemento binomial, a sua natureza é dicotômica. O significado e o significante traduzemas pontas da bifurcação do signo, agem dialeticamente, embora sua relação de reciprocidade seja considerada pelo próprio Saussure como arbitrária. Não é possível admitir a existência do significante sem o significado e vice-versa, assim como não é possível estabelecer ou definir um elemento de relação objetiva entre o conceito e sua imagem acústica. Saussure observa ainda que o signo linguístico “une não uma coisa e uma palavra, mas um conceito e uma imagem acústica”(CLG, p.80) – 45 – O Signo Decian e Méa (2005) asseveram que, sob o ponto de vista de Saussure, pode-se verificar “ que o signo é uma entidade psíquica de duas faces: o con- ceito e a imagem acústica. A primeira refere-se à imagem mental, ao referente que temos para designar o signo e a segunda refere-se à sequência fônica que utilizamos para designar o signo. O conceito e a imagem acústica são também chamados de significado e significante, respectivamente”. O signo linguístico apresenta ainda, segundo Saussure, uma caracterís- tica, a arbitrariedade: A palavra arbitrário requer também uma observação. Não deve dar a ideia de que o significado dependa da livre esco- lha do que fala (ver-se-á, mais adiante, que não está ao alcance do indivíduo trocar coisa alguma num signo, uma vez esteja ele estabelecido num grupo linguístico); quere- mos dizer que o significante é imotivado, isto é, arbitrário em relação ao seu significado, com o qual não tem nenhum laço natural na realidade (CLG, 2005, p. 83) Portanto, não existe um motivo para que um significante esteja asso- ciado a um significado. Elucida-se, então, a ocorrência de que cada língua usa significantes diferentes para um mesmo significado. Outra característica do signo linguístico é a linearidade. Ou seja, os componentes que integram um determinado signo se apresentam um após o outro, tanto na fala como na escrita. O princípio da arbitrariedade, nos termos saussurianos, não pode deno- tar que o sistema estaria à mercê da livre escolha do falante. Ao contrário, a demarcação e firmação de um signo linguístico perpassam por forte pressão de uso por determinado grupo linguístico. Por um lado, o princípio de orde- nação do sistema seria imutável, implicando uma impossibilidade estrutural de se fazer qualquer operação com a língua. Por outro, no curso do tempo, os signos linguísticos podem sofrer alteração em termos da relação entre con- ceito e imagem acústica, sem necessariamente pôr em xeque o alcance e a eficácia do princípio de ordenação. Observaremos agora a visão de Benveniste em relação ao estudo do signo linguístico, visto que ele foi um dos primeiros linguistas a propor uma teoria que trata, especificamente, da enunciação. – 46 – Estudos Linguísticos e Variação Para ele, caracteriza-se o signo da seguinte forma: Dizer que a língua é feita de signos é dizer antes de tudo que o signo é a unidade semiótica. Essa proposição, sublinhamo-lo, não está em Saussure, talvez porque ele a consideraria como uma evidente decorrência, e nós a formulamos aqui no início do exame que estamos fazendo; ela contém uma dupla relação que é necessário explicitar: a noção de signo enquanto unidade e a noção de signo como dependente da ordem semiótica. (CLG, 1989, p.224) Para ele, então, o signo é uma unidade dotada de sentido, posto que considera a significação como elemento precedente ao signo. Para se estabe- lecer, o signo precisa representar uma unidade, mas não uma unidade qual- quer e, sim, uma unidade dotada de significado. Decian e Méa asseveram que Benveniste destaca a ideia de língua “como um fenômeno dinâmico e de uso contínuo, por meio do qual podem ser formulados e proferidos vários discursos”. Esse estudioso também apresenta concepções diferentes das de Saussure em relação à arbitrariedade do signo linguístico. Para ele, ainda segundo Decian e Méa (2005), a questão da arbitrariedade tem suscitado discussões vãs, ou seja, não relevantes, pois, (...) a questão da arbitra- riedade está relacionada à diferenciação entre sentido e referência. A referência está diretamente ligada à situação de uso, independentemente do sentido, e relacionada ao momento em que o signo é utilizado. Esse fato faz com que possa ser conhecido o sentido original das palavras e, mesmo assim, não o reconhecer numa junção de palavras, formando as frases. Ao se referir a sentido, Benveniste se refere a algo particular, como se dá a transmissão de uma ideia e em que contexto ela se realiza. Em relação à noção de signo, ele afirma que o signo só pode existir enquanto a língua estiver em uso. Mas, como se daria essa referência em se tratando de línguas mortas, por exemplo? – 47 – O Signo Línguas mortas são aquelas que não possuem mais falan- tes nativos ou que simplesmente não são mais utilizadas na vida cotidiana. Ainda assim, todas essas línguas possuem gramáticas e vocabulários conhecidos, fato que possibi- lita seu estudo e utilização entre grupos de especialistas. Cabe aqui uma interferência: para Saussure, sendo a língua distinta da fala, aquela pode ser estudada separadamente desta. A prova é que não falamos mais as línguas mortas, mas podemos assimilar-lhes o organismo linguístico. Para finalizar essa dicotomia entre Saussure e Benveniste em relação ao signo linguístico, passemos a apresentar um apanhado das ideias de cada um deles, contrapondo-as. Benveniste apresenta que a primeira condição imperiosa para a consti- tuição do signo é a significação. E especifica que os signos somente possuem sentido em relações de oposições, ou seja, um signo somente possuirá sentido quando está em relação com outro signo. Ou seja, um signo, para ser con- siderado como tal, necessariamente deve estar em situação de uso. Assim, se não estiver em uso por um falante qualquer, não estará sofrendo oposições e, sem essas relações, o signo não pode ser concebido como dotado de sentido. Continua ainda asseverando que a noção de signo semiótico não tem como incumbência e objetivo a comunicação, mas somente a significação. A sig- nificação para o autor está distanciada da situação de uso e ligada apenas ao próprio signo, por isso, podemos dizer que o signo semiótico não tem caráter dinâmico, mas sim, estático. Já para Saussure, a língua é concebida como um sistema de signos que nos permite comunicar algo a alguém e receber informações de outros indi- víduos. Dessa forma, é via língua e seus signos constituintes que se mantém a comunicação. Cada uma das noções de signos linguísticos se aproxima muito uma da outra, pois, para Benveniste, a palavra é a menor unidade da língua, enquanto Saussure afirma que a menor unidade linguística é o signo. No artigo As teorias do Signo e suas significações linguísticas, Antonio Car- los da Silva apresenta algumas considerações bastante interessantes. Desse – 48 – Estudos Linguísticos e Variação artigo apresentamos um trecho que julgamos de grande valia para o aprendi- zado sobre o signo linguístico: O signo não pode ser considerado um elemento de natureza vazia, ou seja, um signo frívolo, sem significação. Os signos, quando analisados fora de um contexto, são apenas signos que nada ou quase nada significam, tendo em vista que sua máxima rea- lização dá-se pela relação que mantêm com outros signos dentro de um dado contexto. Uma palavra pode ser considerada o contexto de um signo menor que ela, mas que, por sua natureza significativa e pela organização e relação que estabelece com outros signos menores, pode significar tanto quanto, ou muito mais que uma palavra quando empregada como elemento menor de um contexto maior que a sua natureza. Veja o que diz Hjelmslev: As palavras não são os signos últimos, irredutíveis, da lingua- gem, tal como podia deixá-lo supor o imenso interesse que a linguística tradicional dedica à palavra. As palavras deixam-se analisar em partes que são igualmente portadoras de signifi- cações: radicais sufixos de derivação e desinências flexionais. (HJELMSLEV, 1975,
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