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48 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II Unidade II 5 TENDÊNCIAS ATUAIS EM RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS Antes de discutirmos a fundo as tendências sobre a recuperação de áreas degradadas, é importante ressaltar que a educação do ser humano tem implicações relevantes sobre a forma como vê e a importância que ele dá ao meio ambiente. Contudo, educação não implica redução da responsabilidade na degradação dos ecossistemas. Em relação ao meio ambiente, todas as pessoas têm de pensar que a ação do outro influencia sua vida e a da comunidade. Por esse motivo, ações comunitárias voltadas para a saúde são extremamente importantes para que os objetivos de promoção da saúde sejam alcançados. Se lembrarmos o que discutimos anteriormente, a destruição do meio ambiente, desde muito tempo, é ocasionada principalmente pelos seres humanos. Dentre os exemplos de destruição podemos destacar o desmatamento, queimadas e a contaminação dos recursos naturais pelos inúmeros tipos de dejetos líquidos ou sólidos lançados nos rios, enfraquecendo o lençol freático. Em meio a esse cenário, o descarte inadequado dos materiais pela sociedade aumenta ainda mais os riscos de afetar o meio ambiente e todos os seres vivos. Assim, a reciclagem passa a ser uma alternativa para mitigar os riscos dos impactos ambientais provocados por quem ainda tem o hábito de lançar no meio ambiente as sobras dos materiais, que, por vezes, podem ser reutilizadas ou transformadas em um novo produto. Nota‑se, no entanto, que as relações entre o homem e a natureza sempre foram marcadas por interações e rupturas em diversos momentos no contexto histórico. Porém, as preocupações com as questões ambientais tornaram‑se relevantes somente a partir dos anos 1950, com a identificação da contaminação atmosférica pela diminuição de organismos nos grandes lagos, além dos efeitos dos pesticidas, que repercutiram em discussões e encontros globais objetivando a contribuição para a mudança de conduta diante da utilização dos recursos naturais. A educação popular é capaz de modificar qualquer processo, principalmente no que diz respeito à energia e ao meio ambiente. Para isso, existe um respaldo pela Carta de Ottawa (1986). Esse documento considera que as causas ou os fatores de risco mais relevantes estão relacionados com comportamentos humanos pessoais e coletivos, estilos de vida ou tipos de trabalho e, com certeza, com o meio ambiente. Dessa forma, capacitar pessoas para que aprendam a lidar com as situações rotineiras, que podem ser causadas por diversos aspectos extrínsecos do ser humano, além da ausência de saúde, colabora para a superação desses desafios na educação. O processo de educação se enquadra perfeitamente quando pensamos no cuidado que devemos ter com o meio ambiente, por exemplo. Quando uma criança aprende a conservar o meio ambiente, 49 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS compreendendo o quanto este pode contribuir para nossa saúde, quando bem‑cuidado, ela colabora para a manutenção e a prevenção para as gerações futuras. A comunicação precisa ser clara, pois comunicar‑se vai além da transmissão de conhecimento, ou seja, existe uma troca de experiências que deve ser recíproca e horizontal. O modelo mais indicado de comunicação é aquele capaz de agir sempre no coletivo, denominado comunicação participativa. Esse modelo segue a ordem de comunicação baseada no diálogo (comunicação dialógica), quando a comunicação entre emissor e receptor é estabelecida de forma horizontal e ambos são, ao mesmo tempo, emissores e receptores. Quando pensamos em meio ambiente e sustentabilidade, a comunicação com sucesso é a principal ferramenta, pois tanto a educação quanto a informação acontecem de forma correta, favorecendo ações adequadas. Isso porque é extremamente importante que a população entenda o sistema e o apoie. Outro aspecto importante é que a comunicação e a informação não sejam somente instrutivas (quando a população é instruída para o que deve realmente ser feito), mas também motivadoras (por meio de campanhas e acompanhamento de perto das autoridades públicas). Assim, sustentabilidade significa a habilidade de sustentar uma ou mais condições mostradas por alguém. Assim, torna‑se pertinente que o uso dos recursos naturais (para atingir as necessidades do momento) não comprometa as necessidades das gerações futuras. Assim, para que um empreendimento humano seja sustentável, ele precisa ser ecologicamente correto, economicamente viável, socialmente justo e culturalmente diverso. Diversas ações podem ser consideradas como sustentáveis: exploração dos recursos naturais de florestas e matas de forma controlada, garantindo o replantio, preservação das áreas verdes, incentivo da produção e do consumo de produtos orgânicos e exploração dos recursos minerais de forma controlada, racionalizada e planejada. Além disso, é possível criar fontes de energia limpas e renováveis (energia eólica, geotérmica e hidráulica), reciclagem de resíduos sólidos, gestão sustentável nas empresas, consumo consciente de água e medidas que não permitam a poluição dos recursos hídricos e contribuam para a despoluição daqueles que já foram contaminados. Em relação ao aspecto educacional, a alfabetização ecológica é a forma de educação voltada para a sustentabilidade que nos faz compreender que a educação é o pilar para uma nova relação entre o ser humano e o meio ambiente. A alfabetização ecológica implica também o conhecimento de qualquer crise relacionada ao meio ambiente, pois quando o indivíduo é ecologicamente alfabetizado se torna capaz de diagnosticar qualquer tipo de irregularidade. Atualmente, cresce a preocupação com a relação das ações humanas com o meio ambiente, e, assim, tem sido importante minimizar o risco de desastres naturais consequência de uma relação humana errônea com o meio ambiente. Existe um termo muito interessante, gestão racional, que tenta reintegrar o homem e a natureza de forma que eles possam viver harmoniosamente. Isso quer dizer que, para que exista uma estabilidade, as espécies que compõem o ecossistema devem viver em conjunto, e não isoladas. 50 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II No entanto, quando pensamos em diminuição da poluição do solo, a população tem de participar e contribuir separando adequadamente os resíduos sólidos recicláveis e reutilizáveis, o que diminui a degradação do meio ambiente. Já as empresas devem utilizar o conceito de responsabilidade compartilhada por meio da logística reversa, em que o produto, ao atingir o final da sua vida útil, é devolvido ao fabricante ou importador para que possa ser reciclado, reutilizado ou passar por algum tratamento especializado. Esse sistema tem de ser estimulado pelo governo com medidas legais e incentivos fiscais. Nem todos os produtos podem ter o conceito de logística reversa, mas agrotóxicos (seus resíduos e suas embalagens), pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes (seus resíduos e suas embalagens), lâmpadas fluorescentes, aparelhos eletrônicos e embalagens de produtos que são considerados (após o uso) como perigosos são resíduos considerados passíveis de logística reversa. A recuperação deve ter como objetivos principais a integridade física, química e biológica (estrutura), além de recuperar a capacidade produtiva (função) de alimentos, matérias‑primas ou mesmo prestação de serviços ambientais. De acordo com o grau do esforço para a reversão do estado que envolve a natureza e a severidade da degradação, alguns casos podem ser considerados, como: • restauração: retornoda área degradada às condições que havia antes ou a um estado intermediário estável, no qual a recuperação é natural; • reabilitação: retorno da área que foi degradada para um estado intermediário do original, havendo a necessidade de uma intervenção antrópica (uso do ser humano); • redefinição ou redestinação: recuperação da área objetivando o uso e a destinação diferente da preexistente; faz‑se necessária a intervenção antrópica. Diversos povos antigos já utilizavam a prática de recuperação de ecossistemas. Essa prática não tinha uma concepção muito abrangente, sendo utilizada, há pouco tempo, por pequena parte das pessoas para fins restritos, como a plantação de mudas em um local específico. Contudo, recentemente, a recuperação de áreas degradadas passou a ser uma prática a ser estudada e se tornou uma área de conhecimento, denominada Restauração Ecológica ou Ambiental. O que seria exatamente o termo restauração ambiental? Como dissemos anteriormente, significa voltar ao estado original do ecossistema. Contudo, isso se torna cada vez mais complexo de acordo com a extensão da área de degradação. Assim, o termo mais viável nesses casos é recuperação ambiental. Em relação ao reflorestamento, sabe‑se que essa atitude é muito antiga na história da humanidade, mas o processo de restauração passou a ser levado a sério com a introdução de disciplinas como a Ecologia da Restauração, a partir do ano de 1980. Atualmente, existe uma preocupação social com a degradação das florestas, e, nesse ponto, há um favorecimento à utilização de produtos gerados sem degradação. 51 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS Dessa forma, produtores que não se preocupam com a degradação e que produzem sem pensar em sustentabilidade acabam se tornando menos competitivos no mercado, além de toda a preocupação legal pela qual eles têm de responder. Essa forma nova de lidar com a sustentabilidade, como alternativa para diminuir a degradação do meio ambiente, é conhecida como manejo sustentável. O manejo sustentável sistêmico é um modelo que permite a criação de bens e serviços para a sociedade, sem prejudicar o meio ambiente. Para as zonas ripárias das microbacias, devem‑se preservar as matas ciliares para que o manejo seja sustentável e de preservação ambiental. A partir do momento em que se preserva ou se recupera a mata ciliar, a criação de corredores ecológicos é favorecida, interagindo com os fragmentos florestais ainda existentes, pois, quando esses fragmentos estão isolados, dificultam a reprodução e a sobrevivência de plantas e animais da microbiota local. Quando um dano à mata ciliar é restrito, a retirada do fator degradante ou a reinserção de uma espécie pode favorecer a composição original do ecossistema daquela área. No entanto, isso é raro, tendo em vista que, na maioria das vezes, a degradação é enorme e, mesmo que se tente recuperar a área, o ecossistema não é o mesmo. É importante conhecer todos os processos envolvidos na dinâmica de formação natural, que conduz os programas de recuperação, a fim de reconstruir a interação do homem com o meio ambiente e permitir a perpetuação natural da área e das espécies que lá habitam, como apresentado na figura a seguir. A mata ciliar deve ser reconstruída gradualmente, e toda a fauna e flora deve ser recolocada no local. Comunidade vegetal Biologia floral e reprodutiva Dispersão de sementes Reprodução vegetativa Banco de sementes Solo nu ou serrapilheira Plântulas Banco de plântulas Juvenis Herbivoria, predação etc Figura 6 – Processos envolvidos na organização de comunidades vegetais, importantes para projetos de restauração 52 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II Observação O manejo sustentável sistêmico é um modelo que permite a criação de bens e serviços para a sociedade sem prejudicar o meio ambiente. Nas zonas ripárias das microbacias, devem‑se preservar as matas ciliares para que o manejo seja sustentável e de preservação ambiental. 5.1 Geotecnologias A erosão dos solos é considerada um dos maiores riscos naturais por causa dos grandes danos econômicos, ambientais e sociais que provoca e, quando ocorre sob a forma de erosão em canais, como ravinas e voçorocas, leva à destruição ou à inoperância de diversas atividades antrópicas, como estradas, dutos, edificações, barragens etc. Movimentos de massa são processos desencadeantes nas encostas, decorrentes da atuação integrada de diversos fatores condicionantes e caracterizados pelo movimento gravitacional de material, descendente e para fora da encosta. Conhecer a dinâmica dos processos erosivos e dos fatores condicionantes dos movimentos de massa é de extrema relevância para planejamento e gestão ambiental eficazes, uma vez que a compreensão da gênese e da abrangência desses fenômenos se faz essencial para mitigar as perdas materiais e humanas que eles geram. São cada vez mais comuns estudos que lançam mão de geotecnologias para predizer áreas vulneráveis ao desencadeamento de processos erosivos e de movimentos de massa e para mapear temporalmente as áreas. Técnicas ligadas ao geoprocessamento emergem com sucesso no que diz respeito a ferramentas para avaliação de perda dos solos por erosão e de suscetibilidade à ocorrência de deslizamentos de terra. Nesse contexto, o mapeamento de áreas afetadas por deflagração de movimentos de massa e processos erosivos é uma das principais atividades na avaliação de danos ocorridos e população afetada, e o uso do sistema de informação geográfica (SIG) e de imagens de sensores remotos fornece informações de síntese para avaliação de riscos, tomada de decisões e compreensão das causas e consequências desses eventos. O sensoriamento remoto permite uma rápida e confiável obtenção de dados em diferentes faixas espectrais e escalas, enquanto o SIG possibilita a ligação dessas informações com outros tipos de produtos, tornando essas duas tecnologias complementares. A evolução e a popularização do SIG propiciam custos mais baixos e contínuas melhorias com o intuito de responder a demandas de diversos ramos, tais como o estudo de processos erosivos e de movimentos de massa. 53 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS Ferramentas provenientes de geotecnologias podem contribuir para a elaboração de mapas de riscos de escorregamentos, auxiliando na criação e manutenção de sistemas de alerta, o que é de extrema relevância para a redução das constantes perdas de vidas humanas decorrentes dos frequentes movimentos de massa desencadeados após eventos chuvosos de grande intensidade. Com o desenvolvimento de técnicas de sensoriamento remoto que facilitam o exercício de integração dos dados, a compartimentação geomorfológica passou a ser mais coerente com a realidade do terreno. Além de permitir a articulação de distintos dados temáticos, facilitando a compreensão dos fatores que contribuem para o desencadeamento dos processos erosivos e dos movimentos de massa, a disponibilidade de fotografias aéreas e imagens de satélites possibilita o monitoramento temporal de evolução das feições em questão. A vasta disponibilidade de sensores remotos e o grande acervo de fotografias aéreas existente proporcionam um leque maior de opções para o usuário do SIG, mas também requer cautela para garantir que o sensor ou as fotografias aéreas selecionadas sejam as mais adequadas para o estudo pretendido. As fotografias aéreas permitem alcançar uma escala maior de detalhes por apresentarem maior resolução espacial (tamanho do pixel);a ausência de resolução espectral e radiométrica dificulta análises mais apuradas, tais como determinação do tipo de solo ou presença de matéria orgânica. Em razão das possibilidades de resolução espectral, as imagens de satélite permitem o uso de ferramentas mais sofisticadas com um eficiente processamento digital de imagens (PDI), desde georreferenciamento e manipulação de contraste até as mais complexas análises, como transformações espectrais e uso do modelo de mistura. O PDI fornece ferramentas para facilitar a identificação e a extração das informações contidas nas imagens para posterior interpretação. Pode ser feito por meio de inúmeros softwares comercializados. Uma das principais funções do PDI é a classificação digital das imagens. Com a classificação digital de imagens é possível identificar, de forma automática ou semiautomática, feições erosivas e/ou cicatrizes de movimentos de massa de uma grande extensão de terra, em um intervalo de tempo bastante inferior ao que seria gasto na identificação manual, fato que representa uma grande vantagem para a recuperação de áreas degradadas, considerando a urgência em minimizar danos provocados por deslizamentos e/ou erosão acelerada. O crescente aumento da resolução espacial dos sensores fez com que novos procedimentos de classificação surgissem, utilizando informação espacial ou contextual para enfrentar desafios alavancados por esse avanço, como os problemas inerentes à classificação. A emergência de novas técnicas tem sido necessária, uma vez que classificadores pixel a pixel não vêm obtendo resultados satisfatórios para imagens de alta resolução. Um novo procedimento utilizado recentemente em estudos ambientais é a classificação orientada a objeto, que pretende tornar o processo de classificação automatizado mais complexo, gerando produtos 54 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II com cada vez menos erros e reduzindo substancialmente o tempo de edição da imagem para a confecção do produto temático, diferentemente do método tradicional de classificação, no qual o pixel é utilizado como unidade primitiva para a análise. Apesar das variadas ferramentas de manipulação do dado espacial desenvolvidas, a utilização delas é fortemente vinculada ao tipo de estudo a ser realizado, à escala de trabalho e ao sensor ou à fotografia aérea a ser utilizada. A escolha do sensor remoto adequado para estudos de movimentos de massa e processos erosivos tem extrema relevância para o resultado deles. Além das resoluções que variam enormemente de sensor para sensor, a resolução temporal – espaço de tempo que o sensor leva para obtenção de cada cena – não deve ser desprezada no momento da escolha, principalmente em estudos que tenham como objetivo o monitoramento de feições erosivas e/ou cicatrizes de deslizamentos. Sensores aptos a captar os comprimentos de onda na faixa do infravermelho, que se encontram fora do espectro visível, são uma relevante vantagem para os estudos ambientais, pois constituem um conjunto de técnicas e permitem uma melhor identificação de feições naturais, tais como copas arbóreas, solos expostos, cordões arenosos, entre outras. É na faixa do infravermelho que se pode extrair o índice de vegetação como medida radiométrica adimensional, que indica a abundância e a atividade da vegetação verde, incluindo índice de área foliar, porcentagem de cobertura verde, teor de clorofila, biomassa verde e radiação fotossinteticamente ativa absorvida. Esse índice se constitui num importante indicador da conservação de uma determinada área, em que um pequeno valor pode representar indicativo de degradação dos solos. Sensores óticos podem registrar as características de refletância espectral da superfície dos solos, tais como textura, salinidade e presença de matéria orgânica, principalmente se não estiverem recobertos por dosséis densos. A diferenciação da textura é possível ao se trabalhar em solos secos e de baixo teor de matéria orgânica, com sensores de alta resolução espectral e radiométrica. Solos secos possuem resposta espectral relativamente simples; à medida que o solo é umedecido, a água dos horizontes superficiais começa a absorver seletivamente significativas quantidades de energia incidente nas bandas de absorção da água, resultando em uma resposta espectral muito mais complexa. Solos argilosos possuem comportamento igual em relação à curva espectral; as bandas de absorção pela água parecem ser muito mais ativas por causa da fina textura desses solos, que podem controlar a retenção de mais umidade na porção superior do horizonte, permitindo que essa umidade absorva uma parte do fluxo radiante incidente e, assim, sejam criados significativos “vales” nas bandas de absorção e nas adjacências dessas bandas. Lembrete Programas de preservação devem sempre impedir interferências do homem no meio ambiente, bem como promover a conservação voltada à sustentabilidade, a fim de diminuir os impactos sobre o meio ambiente. 55 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS 6 RECUPERAÇÃO DE SOLOS Para recuperar um solo é necessário conhecê‑lo: como se originou, sua composição, suas características. Diante de um solo degradado, para recuperá‑lo de maneira que ainda consiga ser rico em nutrientes, que consiga manter uma produtividade primária e que seja capaz de abrigar organismos diferentes, é necessário retirar amostras e analisá‑las para que as medidas tomadas sejam minimamente satisfatórias. Uma vez em processo de recuperação, o solo necessita de monitoramento contínuo para avaliação do grau de resposta ao longo do tempo e a possibilidade de novas interferências. Portanto, começaremos como esses conceitos básicos, para depois avançarmos em técnicas adequadas para cada caso. 6.1 Propriedades do solo A matéria orgânica presente nos solos, turfas e sedimentos, consiste em uma mistura de produtos, em vários estágios de decomposição, resultante da degradação química e biológica de resíduos vegetais/ animais e da atividade de síntese de micro‑organismos. Essa matéria é chamada de húmus, substâncias húmicas e substâncias não húmicas. A base da diferenciação é que as substâncias não húmicas são de natureza definida, como aminoácidos, carboidratos, proteínas e ácidos orgânicos, ao passo que as substâncias húmicas são de estrutura química complexa, compondo um grupo de compostos heterogêneos. As substâncias húmicas são importantes do ponto de vista ambiental, pois representam a principal forma de matéria orgânica distribuída no planeta Terra. São encontradas não apenas em solos, mas também em águas naturais, turfas, pântanos e sedimentos aquáticos e marinhos. As propriedades físico‑químicas de solos e sedimentos são, em grande medida, controladas pelas substâncias húmicas. Dependendo das condições do meio, possuem características oxirredutoras, influenciando na redução de espécies metálicas. Participam do ciclo do mercúrio reduzindo espécies presentes em solos e sistemas aquáticos à espécie (volátil), consequentemente transferida para o compartimento atmosfera. Na litosfera e na hidrosfera, atuam no mecanismo de sorção de gases orgânicos e inorgânicos presentes na atmosfera. Como agentes complexantes, as substâncias húmicas também influem no transporte, no acúmulo, na toxicidade, na biodisponibilidade de espécies metálicas e de nutrientes para plantas e/ou organismos da micro e macrofauna. Interagem com compostos orgânicos antrópicos pesticidas e herbicidas (xenobióticos) por efeitos de absorção, solubilização, hidrólise, bem como de processos microbiológicos e fotossensibilizantes. O efeito solubilizante sobre compostos orgânicos influi na dispersão, na mobilidadee no transporte desses produtos xenobióticos nos ambientes aquáticos e terrestres. Quando presentes em altas concentrações, durante o processo de tratamento de água, podem reagir com o cloro, produzindo compostos orgânicos que possuem características cancerígenas. Em sistemas aquáticos, a matéria orgânica pode ser dividida em particulada e dissolvida, e a definição entre material orgânico dissolvido e particulado é operacional. A definição operacional está baseada em cromatográficos de extração. As substâncias húmicas detêm cerca de 50% de carbono em massa, e sua concentração pode ser estimada como o dobro do valor de carbono determinado no extrato húmico, podendo ser de origem alóctone (levadas por lixiviação e/ou erosão dos solos e transportadas aos lagos, rios e oceanos pelas águas das chuvas, por pequenos cursos de água e pelas águas subterrâneas) ou 56 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II autóctone (derivadas dos constituintes celulares e da degradação de organismos aquáticos nativos). Ainda que haja alguma similaridade entre substâncias húmicas presentes no solo e na água, a diversidade no ambiente de formação e nos compostos de origem faz que elas apresentem diferenças peculiares. A natureza da água (rios, lagos ou mar) e a estação do ano também são fatores determinantes nos processos de formação e de humificação. Os solos possuem três fases – sólida, líquida e gasosa – , cujas proporções relativas variam de solo para solo e, em um mesmo solo, com as condições climáticas, a presença de plantas e o manejo. Em geral, na composição de um solo que apresenta ótimas condições para o crescimento de plantas, verificam‑se 50% de sólidos (45% de origem mineral e 5% de orgânica), 25% de líquidos e 25% de gases. Os quatro componentes (mineral, orgânico, líquido e gás) estão intimamente misturados, permitindo a ocorrência de reações e constituindo um ambiente adequado para a vida vegetal. A fração mineral da fase sólida é resultante da desagregação física das rochas. Portanto, possui dimensões bem menores, mas com composição química idêntica à da rocha‑mãe da qual se originou. A fração orgânica é constituída pela porção do solo formada de substâncias provenientes de plantas e animais mortos, bem como por produtos intermediários de gradação biológica feita por bactérias e fungos. O material orgânico de fácil decomposição é transformado em gás carbônico, água e sais minerais. Nos solos férteis, com densa vegetação, existe uma complexa fauna constituída de pequenos mamíferos, como ratos e outros roedores, além de minúsculos protozoários, minhocas, insetos e vermes, que desempenham função muito importante na trituração, aeração, decomposição e mistura da matéria orgânica no solo. A água no solo contém numerosos materiais orgânicos e inorgânicos que foram dissolvidos da fase sólida. A água constitui uma parte maior do fator de intensidade no fornecimento de nutrientes para as plantas. É o meio para a maioria dos processos químicos e biológicos que ocorrem no solo e o principal meio para o transporte de materiais no solo. Sempre que chove, ou quando se pratica a irrigação, as águas infiltram‑se, preenchendo os espaços existentes entre as partículas de solo. A quantidade de água absorvida depende da permeabilidade do solo, pois, quando esta é pequena, a maior parte da água escorre pela superfície em direção aos vales e rios, carregando consigo grandes quantidades de sedimentos e elementos nutritivos. A água da chuva, ao se formar na atmosfera, já constitui uma solução de vários elementos e compostos químicos absorvidos do ar. Quando há precipitação, além das diversas espécies trazidas da atmosfera ao atravessar as camadas de solo, a água da chuva passa a transportar também outras substâncias até chegar às raízes. Ademais, a capacidade da água de dissolver diferentes substâncias no solo é ainda bastante ampliada pela presença do gás carbônico resultante da respiração das raízes e dos micro‑organismos. Todos esses elementos químicos existem em quantidades limitadas no solo. Nos ambientes naturais, eles são continuamente reciclados, isto é, à medida que absorvidos pelas raízes, são novamente depositados 57 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS na superfície do solo por meio da queda contínua de folhas, frutos, ramos e outras partes vegetais. Ou, ainda, participam de um ciclo biogeoquímico maior, transferindo‑se para outros compartimentos, como a hidrosfera e/ou a atmosfera. A fase gasosa do solo apresenta, qualitativamente, os mesmos componentes principais presentes no ar atmosférico. Entretanto, do ponto de vista quantitativo, pode haver grandes diferenças. Ou seja, devido à respiração das raízes e dos micro‑organismos, à decomposição da matéria orgânica e a reações ocorridas no solo, há consumo de O2 e liberação de CO2 com constantes alterações nos fluxos entre os compartimentos; consequentemente, a composição do ar do solo não é fixa. O ar circulante no interior do solo é a fonte de oxigênio para a respiração das células das raízes, bem como dos micro‑organismos e pequenos animais produtores de húmus. Há certas características do solo que podem ser vistas a olho nu ou facilmente percebidas pelo tato; elas são frequentemente utilizadas para a descrição de sua aparência no ambiente natural. Dentre as principais dessas características estão cor, textura ou granulometria, estrutura, consistência e espessura dos horizontes. Do ponto de vista ecológico, o grau de acidez, a composição e a capacidade de troca de íons é essencial para a ciclagem de nutrientes. Os solos escuros, tendendo para o marrom, quase sempre podem ser associados à presença de matéria orgânica em decomposição em teor elevado; a cor vermelha é indicativa da presença de óxidos de ferro e de solos bem‑drenados; as tonalidades acinzentadas, mais comumente encontradas junto às baixadas, são índicio de solos frequentemente encharcados. A textura ou granulometria descreve a proporção de partículas de dimensões distintas componentes do solo. Um exame mais atento de um solo mostra que ele é constituído de partículas de tamanhos diversos, frequentemente agrupadas em forma de torrões ou grumos. Tecnicamente, podemos quantificar a granulometria passando o solo por um conjunto padronizado de peneiras com malhas de diferentes dimensões e determinando o peso das parcelas retidas em cada uma delas. A textura ou granulometria é a base de classificação mais conhecida dos solos, na qual identificamos areia, argila etc., e explica, também, algumas das principais propriedades físicas e químicas dos solos, como a drenabilidade. Um solo se apresentará com maior drenabilidade, permeabilidade e aeração se as dimensões das partículas que o formam forem maiores. Já os solos com partículas menores favorecem a resistência à erosão, bem como a retenção de água e de nutrientes. A argila é considerada a parcela ativa da fração mineral por sediar os fenômenos de troca de íons determinantes da fertilidade do solo existentes com nutrientes em quantidades adequadas para uma boa nutrição vegetal e uma boa capacidade de ceder os nutrientes à planta. As frações minerais mais grossas presentes no solo são também essenciais para assegurar a drenabilidade, a permeabilidade e a aeração indispensáveis para o equilíbrio da água, do ar exigido para a realização da fotossíntese e da respiração dos organismos existentes no solo. As partículas de menores dimensões presentes na fração argilosa do solo, bem como a matéria orgânica e alguns óxidos, podem apresentar cargas elétricas. Essas cargas elétricas desempenham 58 Re vi sã o: C ar la - D ia gr amaç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II importante papel nas trocas químicas entre as partículas sólidas e a solução aquosa que as envolve, repelindo ou absorvendo íons e radicais, configurando o que se denomina capacidade de troca iônica do solo. Se houver excesso de cargas negativas, o solo será trocador de cátions, propriedade que pode ser medida como capacidade de troca catiônica (CTC). Se o excesso for de cargas positivas, será medida a sua capacidade de troca aniônica (CTA). Os solos com CTC mais elevada retêm nutrientes essenciais às plantas, como cálcio, potássio, magnésio etc.; não retêm, entretanto, ânions como os nitratos e cloretos, que podem passar livremente para as águas do lençol subterrâneo, podendo até ocasionar contaminação. Solos de zonas de alta pluviosidade tendem a apresentar valores mais baixos de pH em consequência do processo de lixiviação das bases dos horizontes superiores pela infiltração e percolação das águas. As condições climáticas predominantes em nosso país fazem com que quase a totalidade dos solos apresente pH inferior a sete. Há ainda outras causas de acidez progressiva, como o cultivo intensivo com retirada, sem reposição, de nutrientes essenciais, a erosão que remove as camadas superficiais que contêm maiores teores de bases e a adubação com compostos de amônio, sulfato e nitrato. A acidez do solo atua sobre a produção primária de várias formas. Sobre os solos com pH inferior a 5,5 favorece a solubilidade do alumínio, do manganês e do ferro, em detrimento do fósforo, que se precipita, ficando reduzida a disponibilidade desse nutriente essencial para as plantas. Além disso, a acidez reduz a atividade de bactérias decompositoras de matéria orgânica, diminuindo a quantidade de nitrogênio, fósforo e enxofre contidos no solo. A deficiência desses nutrientes essenciais prejudica o desenvolvimento das plantas e pode aumentar sua sensibilidade à toxidez do alumínio e do manganês. Por fim, o pH baixo pode afetar a atividade microbiana de decomposição e produção de húmus ao reduzir sua ação na estruturação dos solos. Os valores de pH mais elevados, acima de 6,5, reduzem a disponibilidade de vários nutrientes, como zinco, cobre, ferro e manganês, entre tantos outros, podendo provocar uma deficiência nas plantas. De um modo geral, a faixa de pH em que ocorre maior disponibilidade de nutrientes situa‑se entre 6,0 e 6,5. Quando levamos em consideração o tamanho das partículas que compõem o solo, temos a classificação granulométrica ou textural, identificando a pedra, o cascalho, a areia e o silte ou limo, cujas partículas vão diminuindo conforme os exemplos citados. Raramente um solo é constituído de uma só das frações acima definidas, mas sim de uma combinação com diferentes proporções. Definida a granulometria de um solo, ele pode ser classificado em: • argiloso, quando possuir mais que 35% de argila; • arenoso, quando possuir mais que 65% de areia e menos que 15% de argila; • siltoso ou limoso, quando possuir mais que 60% de silte e menos que 20% de argila; • barrento, quando não estiver enquadrado em nenhum dos anteriores, tendo, portanto, uma composição mais equilibrada. 59 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS A palavra solo tem, pelo menos, dois significados usuais: o de chão, ou de superfície da terra, e o de elemento de fixação das plantas. Neste último, a conotação é definida como rocha finamente particulada, misturada com resíduos da decomposição vegetal e animal, constituindo a porção da superfície da terra em que as plantas se desenvolvem. Sua origem está ligada à desagregação de rochas e à decomposição de restos vegetais e animais. A sua porção mineral pode ser resultante da ação vulcânica ou da desintegração de rochas sólidas por ações físicas, químicas e mesmo biológicas reunidas sob a denominação de intemperismo. Assim, as grandes variações de temperatura ocorridas entre o dia e a noite ou o congelamento de água constituem ações físicas fatores de corrosão das rochas ou intemperismo químico; a penetração de raízes nas fendas ou a produção de substâncias corrosivas por liquens contribuem para os fenômenos de desagregação. A interação de todos esses fenômenos e outros, como o efeito abrasivo da água ou do vento carregando partículas sólidas de maior dureza, leva a um desgaste natural e progressivo das rochas primárias da litosfera. As rochas desagregadas recebem a denominação de regolitos, e da sua mistura com os produtos de decomposição orgânica originam‑se os solos férteis. Os fragmentos podem, ainda, deslocar‑se de uma região para outra por ação de chuvas ou ventos originando uma camada que recobre a maior parte da superfície da terra. Essa camada é geralmente mais espessa nas regiões mais baixas, onde se acumulam os produtos da decomposição ou a ação do intemperismo se faz sentir com maior intensidade, como é o caso das regiões de clima quente e úmido. Do ponto de vista do desenvolvimento de vegetais, o solo tem importância fundamental como elemento de fixação das raízes e como fornecedor de elementos químicos e água indispensáveis à sua nutrição e ao seu crescimento. A capacidade do solo de desempenhar essas funções depende muito de sua estrutura física, capacidade de fornecimento de água, circulação de ar e propriedades químicas e físico‑químicas. As partículas que compõem o solo são de vários tamanhos, e sua distribuição relativa é responsável por algumas de suas propriedades, como circulação de ar e de água. Assim, por exemplo, os solos arenosos, que são os constituídos predominantemente de partículas de tamanho relativamente grande, apresentam boa circulação de ar, mas baixa capacidade de retenção de água, enquanto os solos argilosos, formados de partículas muito mais finas, retêm grande quantidade de água, mas não permitem boa circulação de ar. A água, nos solos arenosos, tem a tendência de caminhar rapidamente para regiões profundas, longe do alcance das raízes, ocorrendo exatamente o contrário em solos argilosos. No entanto, o acúmulo da água nos solos argilosos pode prejudicar a respiração das raízes. As partículas do solo podem, entretanto, formar agregados ou grumos, principalmente quando cimentadas entre si pela presença de matérias coloidais orgânicas e alguns elementos minerais, como o ferro e o cálcio, ou também elementos biológicos, como bactérias, fungos ou raízes. Esses agregados são importantes por aumentarem a circulação de ar no interior do solo ao mesmo tempo que, pela ação dos coloides presentes, retêm água, sais minerais e dificultam a erosão. O solo, além disso, constitui ambiente para abundante vida vegetal e animal. Bactérias, fungos, algas, protozoários, vermes, larvas de insetos etc. constituem um ecossistema de grande importância para a 60 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II vida de plantas superiores. Alguns desses seres vivem no solo apenas uma parte da sua vida, como é o caso das larvas de cigarras, moscas e outros insetos. Muitos dos microrganismos presentes são benéficos ao solo e às plantas, como é o caso de bactérias, fungos e outros seres saprófitos, que provocam a decomposição de restos vegetais e animais. Essa atividade é de fundamental importância para a recirculação de elementos valiosos na composição dos solos. Os solos exercem um papel fundamental na sobrevivência de diferentes sociedades em nosso planeta. Tanto para os camponeses quanto para quem mora na cidade, os solos representam uma fonte de vida. Um solo pobre ou escasso pode trazer a miséria, enquanto sua abundância e fertilidade podem ser transformadas em riqueza. Camada superficial da crosta terrestre,o solo compõe‑se principalmente de aglomerados minerais oriundos da decomposição de rochas e de matéria orgânica vegetal e animal. Dessa forma, serve como fonte de nutrientes às plantas, viabilizando o cultivo agrícola e a formação de pastagens. O processo de decomposição do solo pela desagregação de rochas pode levar milhares de anos. Por isso, para que ele possa ser utilizado pelos diversos povos da melhor maneira, é imprescindível conhecer sua origem e suas características. Atualmente, na maior parte do mundo, é utilizado o sistema de classificação denominado genético‑natural, que está baseado nas características e nos fatores que levaram à formação do solo. Os latossolos foram formados sob ação de lavagens alcalinas em regiões quentes e úmidas florestadas. Isso determinou a perda de parte da sílica, material original, permanecendo os óxidos de ferro e de alumínio. A argila silicatada presente é a caolinita. Os latossolos possuem coloração vermelha, amarela ou alaranjada, são muito profundos e bastante porosos, possuem elevados teores de óxidos de ferro e alumínio, pequenas diferenças entre os horizontes que apresentam transição gradual ou difusa, à exceção do superficial, orgânico, típicos de clima tropical úmido, bastante envelhecidos e intemperizados; a fertilidade natural é baixa. Podem suportar vegetações de florestas devido a uma quantidade mínima de nutrientes periodicamente recicladas, ou vegetação de cerrado, quimicamente mais pobres; o cultivo extensivo é perfeitamente viável, pois possuem propriedades físicas boas e, na maior parte, estão situados em área de relevo suave, aptas à mecanização; dependem de correção da acidez e de adição de fertilizante; são ótima fonte de matéria‑prima para aterros, estradas e barragens, além de facilitarem os trabalhos de engenharia que envolvem escavações (zonal). Solos argilosos (argilossolos‑podzólicos) são formados pelo processo de lavagens ácidas sobre material de origem arenosa, em regiões úmidas e florestadas. Solos formados com excesso de água em condições de aeração deficiente são denominados gleissolos (hidromórficos). Esses solos, de coloração acinzentada, geralmente são ácidos, pobres em cálcio e magnésio e possuem acúmulo de matéria orgânica nas camadas superficiais. 61 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS Neossolos (litossolos) são solos jovens, pouco desenvolvidos e de pequena espessura, assentados diretamente sobre as rochas consolidadas ou, às vezes, aflorando à superfície. Neossolos regolíticos (regossolos) se caracterizam por serem solos profundos, ainda que em início de formação arenosa e, portanto, com drenagem excessiva. Apresentam camada superficial mais escurecida devido à presença de matéria orgânica. As características do solo variam com a profundidade por causa da maneira pela qual ele se formou ou se depositou, em razão das diferenças de temperatura, teor de água, concentração de gases (particularmente CO2 e O2) e movimento descendente de solutos e de partículas e fluxos de material formando diferentes camadas (denominados horizontes), que podem ser identificadas a partir do exame de uma seção vertical do solo denominada perfil do solo. Os horizontes se diferenciam por espessura, cor, distribuição e arranjos das partículas sólidas e poros, distribuição de raízes e outras características resultantes das interações de fatores influenciadores na formação do solo. A caracterização mais detalhada dos horizontes permite que o agricultor identifique, classifique e planeje o manejo mais adequado para o solo. Os horizontes são designados por letras maiúsculas. Assim, A, B e C representam os principais horizontes do solo. As letras O e R são também utilizadas para identificar um horizonte orgânico em solos minerais e a rocha inalterada, respectivamente como mostrado a seguir. As principais características dos horizontes que um solo pode conter são: Horizonte 0 Horizonte A Horizonte B Horizonte C Horizonte R Figura 7 – Horizontes do solo Horizonte O – horizonte orgânico com matéria orgânica recente ou em decomposição. Em condições de má drenagem. 62 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II Horizonte A – resultante do acúmulo de material orgânico misturado com material mineral. Geralmente, apresenta coloração mais escura devido ao material orgânico humificado. Em solos em que há eluviação (transporte vertical de material solúvel) muito intensa, forma‑se uma camada de cores claras, com menor concentração de argila abaixo do horizonte A. Horizonte B – caracterizado pelo acúmulo de argila, ferro, alumínio e pouca matéria orgânica. É denominado horizonte de acúmulo ou iluvial. O conjunto dos horizontes A e B caracteriza a parte do solo que sofre a influência das plantas e dos animais. Horizonte C – camada de material não consolidado, com pouca influência de organismos, geralmente apresentando composição química, física e mineralógica similar à do material em que se desenvolve o solo. Horizonte R – rocha inalterada que poderá ser ou não a rocha‑matriz a partir da qual o solo se desenvolveu. É importante lembrar que nem sempre se encontram todos os horizontes em um solo; muitas vezes, pela influência das condições ambientais, pode‑se encontrar um ou dois horizontes somente. A pedogênese é o processo de formação dos solos; inicia‑se com modificações causadas nas rochas por intempéries atmosféricas, pela ação humana ou de outros organismos vivos, entre outros fatores. O estágio de formação do solo tem implicações bastantes diversas e marcantes, por exemplo, sobre o ciclo hidrológico e sobre o regime dos cursos de água em uma região. A variação de temperatura entre o dia e a noite, por exemplo, age sobre as rochas, fragmentando‑as. A água das chuvas, por sua vez, reage com os minerais que as compõem, originando substâncias ácidas e corrosivas. Nas regiões áridas, em que o intemperismo é menos intenso, os solos tendem a ser menos profundos. Quando ocorre uma precipitação sobre um desses solos, os poros são rapidamente preenchidos por água; com a saturação, o escoamento na superfície passa a ser o único caminho das águas precipitadas. Como o escoamento é rápido, as águas logo se acumulam em grandes volumes nos fundos dos vales, provocando as grandes enchentes. Cessada a chuva, o curso de água passa a ser alimentado apenas pela água acumulada nos poros do solo. Como o volume de poros é pequeno, e o solo pouco profundo, após algum tempo de estiagem, essa água se esgota e o rio deixa de correr, tornando‑se intermitente. A mesma precipitação, caindo sobre um solo profundo, poderá não causar enchente e ser suficiente para manter a alimentação do curso de água durante todo o período de estiagem devido ao maior volume de água acumulado nos poros desse solo. Nesse caso, o curso de água é perene. Observamos que os poros do solo são um grande reservatório de água doce, capazes de assegurar muitas vezes sua disponibilidade, mesmo durante longos períodos de estiagem. Entretanto, a ausência desse reservatório nas regiões áridas de solos rasos agrava a escassez de água nas estiagens, sucedidas por grandes enchentes e inundações. 63 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS Outra implicação importante das características dos horizontes do solo é de natureza agrícola. O manejo do solo e, em particular, a aração devem levar os horizontes em conta, sob pena de reduzir ou eliminar o potencial de produção primária. É importante destacar alguns aspectos que diferenciam os solos de regiões climáticas distintas. Os climasequatoriais e tropicais, devido à temperatura, à umidade e à pluviosidade que os caracterizam, não só favorecem o intemperismo acelerado, já que nessas regiões os solos são mais profundos e mais velhos, mas também intensificam a fotossíntese. Em comparação com as áreas de maior latitude e clima temperado, nas regiões equatoriais, a vegetação luxuriante contém boa parte da matéria orgânica; nas temperadas, grande parte da matéria orgânica está no solo. Consequentemente, é mais provável que os horizontes orgânicos (horizonte A) sejam mais espessos em climas temperados. O conceito de fertilidade do solo também está intimamente relacionado aos vários fluxos de matéria e energia no ambiente. São várias as reações químicas que ocorrem entre as substancias presentes no solo e na água, bem como as trocas de substâncias entre os seres vivos, as raízes, as partes aéreas das plantas e as partículas minerais do solo. Desses processos resulta a formação de componentes secundários responsáveis por um estado de equilíbrio, seja em nível físico‑químico (como a estabilidade do pH, ou o equilíbrio ácido/base), químico ou biológico. Outra constatação do fluxo dinâmico de energia e matéria entre os grandes reservatórios reguladores é a obtenção dos quatro principais elementos químicos componentes dos vegetais pelas plantas a partir do reservatório atmosfera. A água da chuva (H2O), indispensável a qualquer processo biológico, é também a fornecedora de hidrogênio. O carbono e o oxigênio são retirados do ar, sendo o primeiro no processo de fotossíntese e o segundo no de respiração. Além disso, o nitrogênio também é absorvido do ar por algumas bactérias lixadoras localizadas nas raízes e, posteriormente, disponibilizado para as plantas. Para o crescimento de plantas, com exceção dos quatro principais elementos em questão, todos os demais (macro e micronutrientes) devem encontrar‑se no solo. Portanto, os vegetais conseguem desenvolver‑se em cada ambiente quando encontram no solo os elementos que lhes são indispensáveis. Mesmo nos solos férteis, os elementos essenciais aos vegetais não são inesgotáveis. Por isso, após sua utilização pelas plantas, eles participam de ciclos biogeoquímicos, voltando ao solo (e/ou atmosfera e hidrosfera) para que ele se mantenha fértil e a vida vegetal tenha continuidade. Se, por algum motivo (por exemplo, queimadas, erosão, salinização etc.), os ciclos forem interrompidos, o solo se tornará progressivamente estéril ou improdutivo. 6.2 Coleta de amostras e análise do solo Geralmente, a coleta de amostras sólidas requer um tratamento especial, pois na maioria das situações o material é pouco homogêneo. Muitas vezes, a solução pode ser coletada em vários pontos, sendo todo o material recolhido misturado e homogeneizado. Desse material, retira‑se uma nova amostra, que é posteriormente usada para análise química. Com relação ao solo, a questão da profundidade da coleta da amostra pode ser relevante. Nesse caso, dependendo do problema, a solução pode ser utilizar brocas, trados, tubos, metálicos ou não (um pedaço de cano, por exemplo) que são cravados no solo ou equipamentos específicos para cortar o solo, como cavadeiras (conhecidas como “boca de lobo”). 64 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II Outra técnica conveniente consiste em fazer um buraco ou uma trincheira até atingir a profundidade necessária e recolher diretamente o material. Para a análise, coletam‑se 15 a 20 amostras do solo, a uma profundidade de 0,20 m, distribuídas ao longo da área a ser recuperada. Essas amostras são misturadas, dando origem a uma amostra composta, que será encaminhada a um laboratório de solos, onde serão determinados os teores de macro e micronutrientes, de matéria orgânica, o pH, a capacidade de troca de cátions, a soma de bases e os percentuais de silte, de argila e de areia fina e grossa. Sazonalmente, o setor agrícola tem necessidade de coletar e analisar amostras de solo agricultável para que sejam feitas as correções adequadas, por exemplo, adição de calcário (calação). Essas correções são feitas baseadas nos resultados da análise do solo para fins de fertilidade. A coleta de amostras de solo para fins de fertilidade deve seguir o seguinte protocolo: 1. Dividir a propriedade em áreas uniformes de até 10 hectares para retirada de amostras. Cada uma dessas áreas deve ser uniforme quanto à cor, à topografia e à textura e quanto às adubações e calagens que recebeu. Áreas pequenas, diferentes da circunvizinha, não deverão ser amostradas juntas. 2. As amostras devem ser retiradas da camada superficial do solo, tendo antes o cuidado de limpar a superfície dos locais escolhidos, removendo as folhas e outros detritos. Cada uma das áreas escolhidas deverá ser percorrida em zigue‑zague, retirando‑se as amostras em pontos diferentes; elas deverão ser colocadas juntas em um recipiente limpo. Todas as amostras individuais de uma mesma área uniforme deverão ser muito bem misturadas dentro de um recipiente, retirando‑se uma amostra composta final de aproximadamente 500 gramas para ser enviada ao laboratório. 3. Não retirar amostras de locais próximos a residências, galpões, estradas, formigueiros, depósito de fertilizante etc. Não retirar amostras quando o terreno estiver encharcado. Do ponto de vista ambiental, muitas vezes é necessário conhecer a concentração de um analito no perfil do solo. Para isso, fazem‑se coletas de amostras de solo e análises para se certificar de que o local já está impactado com materiais potencialmente poluentes. Caso seja constatado um problema, é preciso saber se ele foi causado por indústria ou se já existia no local antes da sua instalação. Para conhecer rotas de aporte, mobilidade, acúmulo e destinação de espécies, nutrientes e/ou contaminantes, geralmente se utiliza a coleta de amostra no perfil do solo. Uma coleta de amostra de solo pode fornecer matéria orgânica (ácidos húmicos e fúlvicos), a distribuição de mercúrio e outros metais no solo em função da profundidade. Sedimentos são partículas com diferentes tamanhos, formas e composição química, que foram transportadas pela água, pelo ar ou pelo solo do ambiente terrestre de origem e depositadas no fundo de lagos, rios e oceanos. Essas partículas contêm quantidade variável de materiais coprecipitados dos recursos hídricos por processos químicos e biológicos. Partículas transportadas pela água ordenam‑se e depositam‑se de acordo com suas propriedades em diferentes áreas dos reservatórios. Geralmente, materiais grossos, 65 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS como areia e cascalho, sedimentam‑se nas zonas perto da orla, e partículas de granulação fina, como silte ou argila, são depositadas em águas profundas levadas pela ação da correnteza. Diferentes conceitos são empregados para a classificação de sedimentos de águas doce e marinha. Eles podem ser classificados pela sua origem geográfica, geológica, geoquímica e pelas propriedades fisico‑químicas, como cor, textura, granulometria, estrutura, conteúdo de matéria orgânica etc. Sedimentos desempenham uma importante função no processo de caracterização da poluição. Eles podem indicar a qualidade e, assim, serem usados para detectar a presença de contaminantes, podendo se solubilizar pela ação de micro‑organismos. A dinâmica de algumas espécies químicas faz com que os sedimentos atuarem como “estoque” e possíveis fontes de poluição, pois os contaminantes (espécies inorgânicas ou orgânicas) não permanentemente lixados por eles podem ser disponibilizados, causando mudanças em parâmetros, como pH, potencial redox ou ação de micro‑organismos. Também podem ser importante fonte de contaminantes,mesmo quando as fontes de contaminação atmosféricas e/ou terrestres já tiverem sido controladas ou eliminadas. Os sedimentos se depositam continuamente ao longo dos anos. Modificações no ambiente influem diretamente na composição do sedimento. Na primavera, eles agregam polens; se tiver ocorrido uma grande queimada, serão agregadas cinzas aos sedimentos. Dessa forma, as várias camadas dos sedimentos podem indicar não só como e quando ocorreu a contaminação, mas também eventos naturais ou antrópicos que ocorreram na região. Pela análise do pólen é possível conhecer que tipo de vegetação existia na região em um passado bem distante. Quando se quer conhecer o histórico de um sedimento se faz necessária a coleta de suas várias camadas. Os minérios geralmente são extraídos na forma de fragmentos grosseiros de diferentes tamanhos e composição variável. Logo, manter a condição de representatividade é relativamente difícil. Frações do material retiradas com pás ou cargas de carrinhos de mão são separadas e posteriormente reunidas (amostra composta). Quando a produção do minério é feita em larga escala, porções do material são intermitentemente removidas em uma correia transportadora, ou o material pode ser forçado através de uma calha ou série de calhas, resultando na separação contínua de certa fração do fluxo. Quando o material está armazenado em grandes depósitos, as amostras devem ser tomadas de diferentes pontos espaçados, de modo que assegure uma coleta representativa. É preciso considerar que raramente se tem uma completa distribuição ao acaso. Nesses casos, sugere‑se dividir o depósito em seções pela superfície e, de cada seção, retirar de alto a baixo um número regular de amostras. Com base nos resultados das análises do solo, verifica‑se a necessidade da calagem e da adubação mais indicada para a área. Fatores como estado de degradação do solo, posição topográfica, proximidade de cursos d’água, regime de inundações e exigências das espécies utilizadas irão determinar a correta necessidade de adubação do plantio. 66 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II O adubo pode ser misturado com a terra retirada na abertura da cova, e, posteriormente, a mistura pode ser utilizada para preencher a cova com a muda. Outra forma de adubação consiste na abertura, após o plantio, de minicovas laterais a cerca de 10 cm da muda nas quais o adubo é colocado no momento do plantio ou até duas semanas depois. Em áreas em que o solo não foi degradado ou o tipo de solo apresenta naturalmente boa fertilidade, pode‑se utilizar apenas a adubação orgânica. Recomendam‑se esterco de curral, esterco de galinha (curtidos), torta de mamona e torta de filtro, preenchendo no máximo, 20% do volume da cova. Exemplo de aplicação Convidamos você a desenvolver um projeto de recuperação de uma área degradada do seu bairro, como se fosse para entregar ao prefeito do seu município. Esse projeto deve ter no máximo cinco páginas e precisa ser embasado na literatura. Qual seria seu foco? Como você resolveria o problema? 6.3 Recuperação de áreas de agricultura e pecuária A sucessão primária é iniciada por organismos pioneiros em local desabitado e sem a influência de organismos que o tenham habitado em época anterior; envolve modificações substanciais do ambiente, causadas direta ou indiretamente pelos organismos pioneiros. Esse processo tende a ser muito lento, uma vez que plantas e outros organismos precisam formar o solo, o que pode levar dezenas ou centenas de anos. No caso de sucessão em rochas, líquens, fungos, microrganismos e vegetais de pequeno porte (como algumas bromélias, orquídeas e ervas) iniciam o processo erodindo a rocha e formando uma tênue camada de solo, propiciando a colonização por outros organismos (vegetação herbácea rasteira). Por meio da troca de organismos, a sucessão avança para uma comunidade com maior biomassa e maior diversidade. Em muitas situações de forte degradação ambiental provocada pelo homem, como a remoção das camadas de solo pela mineração deixando apenas a rocha exposta, se nenhuma intervenção for feita, a tendência será ocorrer um processo extremamente lento de sucessão primária. Por isso, são adotadas técnicas de recuperação dessas áreas, visando transformar um processo que naturalmente levaria centenas de anos em sucessão secundária de uma ou poucas décadas. Na sucessão secundária, uma característica é o fato de já existir um solo formado, mas a capacidade de regeneração da vegetação depende do grau de perturbação ocorrido. A sucessão secundária ocorre após distúrbios naturais, como abertura de grandes clareiras no dossel das florestas devido à queda de uma ou mais árvores; destruição da vegetação pela ocorrência de incêndios naturais ou após distúrbios 67 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS antrópicos, como corte; queima de florestas; abandono de campos agrícolas e pastagens em áreas antes cobertas por florestas, entre outros. A sucessão secundária pode ser rápida ou lenta, sendo essa velocidade influenciada por um conjunto de fatores, como o tamanho da clareira – quanto maior a clareira aberta numa determinada área, mais lenta tende a ser a sucessão; pequenas clareiras tendem a ser ocupadas pelas próprias espécies já presentes na área antes da sua degradação. A composição florística remanescente, bem como a presença de banco de sementes no solo e de indivíduos remanescentes ou com capacidade de rebrota auxilia muito a sucessão secundária. Quando esses componentes são perdidos, a sucessão passa a depender quase exclusivamente de propágulos (frutos, sementes e outros) vindos de áreas próximas. Quanto mais próximo de fontes de propágulos estiver a área perturbada, mais rápido tende a ser o processo de sucessão. Por isso, há a necessidade de conservação de remanescentes de vegetação nativa, seja como fragmentos da área degradada, seja como árvores isoladas, nas proximidades da clareira para facilitar as atividades de recuperação dessas áreas. Assim, o tipo de vegetação em que a área degradada está inserida influencia fortemente na recuperação da sua cobertura vegetal. O tipo de dispersão de uma espécie de planta é determinante da sua capacidade de chegar até uma área aberta e iniciar sua colonização, desencadeando a sucessão. As principais formas são: • Anemocoria – dispersão pelo vento; as sementes são leves, podendo ser muito pequenas ou dotadas de asas ou plumas que facilitam o carregamento pela ação do vento e de deslocamentos de ar. É bastante comum em plantas colonizadoras de áreas abertas. • Zoocoria – diversos tipos de animais exercem importante papel na dispersão de sementes para áreas degradadas. As plantas investem em recursos para atrair seus dispersares, como arilos, polpa e outros, assim conseguem espalhar suas sementes a grandes distâncias. A maior dificuldade em recuperar áreas degradadas ocorre quando o solo foi degradado por meio da eliminação de suas camadas superficiais, compactação excessiva e erosão acentuada. Formigas e outros insetos, bem como pequenos roedores, podem comprometer o processo de sucessão numa área em recuperação com predação de sementes e plântulas. Esta é apontada como uma das principais barreiras a dificultar a sucessão secundária em pastagens abandonadas. Diferentes situações levam a diversos modelos para explicar o arranjo das espécies em grupos ecológicos e as diferentes rotas de substituição de comunidades de plantas ao longo do tempo. Alguns modelos têm sido mais identificados na natureza e apresentam maior aplicação na recuperação de áreas degradadas. A substituição florística ocorre em casos de distúrbios mais intensos queeliminam a vegetação dominante, e o processo sucessional caracteriza‑se pela gradual substituição de grupos de espécies ao longo do tempo, por exemplo, onde o banco de sementes do solo de espécies florestais foi eliminado. 68 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II A sucessão, nesse caso, deve passar pelos estágios de ervas, arbustos, espécies arbóreas pioneiras e, finalmente, espécies finais de sucessão. Em contrapartida, no modelo do potencial florístico inicial, as espécies que exercem dominância ao longo da sucessão já estavam presentes, apresentando crescimento lento até que condições favoráveis se estabelecesse. Em florestas atingidas pelo fogo ou recém‑cortadas, o potencial florístico pode ser expresso pela rebrota de partes vegetativas como cepas e raízes. No modelo de facilitação, espécies pioneiras colonizam uma área recém‑aberta e melhoram as condições ecológicas, facilitando a entrada de novas espécies mais exigentes que irão substituí‑las. Essa melhoria das condições ecológicas, realizada pelas pioneiras, pode ser em termos de recuperação da ciclagem de nutrientes e da fertilidade em solos degradados, do fornecimento de sombra etc. ou por meio do plantio de leguminosas fixadoras de nitrogênio. No modelo de inibição, as espécies pioneiras colonizam a área perturbada e monopolizam os recursos; a substituição de espécies ocorre apenas quando as populações dessas pioneiras entram em declínio por senescência ou por novas perturbações, o que pode levar décadas. A inibição normalmente é exercida através de barreira física à germinação de sementes e crescimento de plântulas, alelopatia, competição por nutrientes e umidade etc. 6.3.1 Modelos de restauração Nos modelos simples, poucas espécies e arranjos de espécies são utilizados. Normalmente, são efetivos apenas na proteção inicial do solo contra erosão, mas apresentam problemas em termos de sustentabilidade, necessitando, muitas vezes, de intervenções periódicas, o que acaba resultando em custo elevado em longo prazo. Os modelos complexos procuram imitar a natureza, ou seja, por meio de conhecimentos de Ecologia, busca‑se restaurar as funções ecológicas da floresta por meio da utilização de um número elevado de espécies, combinando espécies de diferentes grupos sucessionais etc. Esses modelos mais complexos podem, na implantação, ter custos mais elevados do que os modelos simples. Contudo, por resultarem em ambientes mais heterogêneos, nos quais os processos ecológicos da floresta são restabelecidos, tendem a exigir menor intervenção e ser autossustentáveis. Quando a área degradada a ser recuperada não é muito extensa ou se dispõe de pouco recurso financeiro para a sua restauração, pode‑se optar pela nucleação. A restauração por meio da nucleação baseia‑se em estudos que mostram que a vegetação remanescente, em uma área degradada, representada por pequenos fragmentos ou até mesmo por árvores isoladas, atua como núcleo de expansão da vegetação por atrair animais que participam da dispersão de sementes. Assim, a partir das ilhas de vegetação ou núcleos, a vegetação secundária vai se expandindo e acelerando o processo de sucessão na área degradada. A nucleação é, portanto, a geração de um modelo de facilitação da sucessão. Como as áreas dos núcleos são pequenas, é possível a utilização de espécies de diferentes grupos sucessionais e diferentes formas de vida, como arbóreas, arbustos, epífitas etc. 69 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS Outra forma de implantação de núcleos ou ilhas de vegetação que vem sendo testada é a utilização de galhadas, ou seja, os restos vegetais (galhos, folhas e material reprodutivo) da floresta. Parte‑se do pressuposto de que esses restos vegetais são fontes de sementes de espécies arbustivo‑arbóreas e de outras formas de vida, como as plantas epífitas, de nutrientes e de matéria orgânica. Dessa forma, após a germinação, as plântulas encontrarão condições mais adequadas para o seu estabelecimento. Além disso, a deposição de restos vegetais numa área sem vegetação ou com solo degradado facilita a ativação de cadeias alimentares que garantem o funcionamento do ecossistema em restauração. A galhada também deve ser obtida em áreas cujo licenciamento ambiental para atividades de mineração, represamento de cursos d’água e outros, permite que a vegetação seja suprimida. Galhada oriunda de podas na arborização urbana deve ser usada com cautela, porque pode conter sementes de espécies exóticas agressivas que podem regenerar‑se na área em restauração e justamente inibir o processo de sucessão que se pretende estimular por meio dos núcleos. Esse material vegetal, a galhada, é depositado em pilhas com área de no mínimo 2 x 2 m2, ou em fileiras dentro de grandes áreas degradadas, formando ilhas de restos vegetais. É importante destacar que os restos vegetais da galhada atuam também como refúgio e fonte de alimento para insetos, por exemplo, brocas de madeira e cupins, pequenos roedores, répteis etc., atraindo outros animais predadores e, assim, ativando, com o tempo, cadeias alimentares. A utilização de poleiros para atração de aves e morcegos dispersores de sementes tem sido indicada como alternativa viável para nucleação florestal em áreas degradadas. Os poleiros podem ser naturais ou artificiais. Poleiros naturais são obtidos com o plantio de espécies arbóreas de rápido crescimento e arquitetura de copa que favoreça o pouso das aves, ou da conservação de indivíduos remanescentes na área degradada. Como é comum a presença de árvores isoladas remanescentes em pastagens abandonadas, elas devem ser consideradas poleiros vivos ou naturais nos projetos de restauração florestal. A ligação desses poleiros com cordas ou cabos de aço imitando redes de transmissão de energia pode aumentar sua eficiência na nucleação. A atratividade dos poleiros à avifauna pode ser aumentada, fornecendo espaços para ninhos com pequenos furos de aproximadamente 4 a 5 cm de diâmetro. O número e a disposição dos poleiros dependem da oferta de material ou recursos para confeccioná‑los, do tamanho da área a ser restaurada e da distância dessa área a fragmentos florestais. O ideal é distribuir os poleiros de forma a fazer a ligação entre os fragmentos. Uma alternativa para instalação de poleiros artificiais é a utilização de caules de árvores mortas ou recém‑derrubadas, de reflorestamentos comerciais ou de áreas cujo licenciamento ambiental para atividades antrópicas permitiu que a vegetação fosse suprimida. A presença de galhos nessas árvores favorece sua atuação como poleiros para aves. 70 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II O modelo de restauração florestal com o plantio aleatório das mudas, ou seja, sem espaçamento definido, baseia‑se no fato de que a regeneração natural das espécies arbóreas não obedece a nenhum tipo de espaçamento predeterminado. Apesar de o plantio ser aleatório, deve‑se procurar distribuir as mudas no campo de uma forma mais regular, evitando‑se deixar grandes áreas com solo exposto e áreas com adensamento de mudas, bem como não concentrando mudas de uma mesma espécie em determinados locais. Recomenda‑se, portanto, manter uma distância de 2 a 4 m entre as covas de plantio, mas, em locais com infestação de gramíneas agressivas, essa distância deve ser reduzida para promover a rápida cobertura e o sombreamento do solo. Como o modelo não obedece a nenhum espaçamento, é possível, por exemplo, criar ilhas de maior diversidade ou de concentração de frutíferas nativas para atração de fauna, ou mesmo ilhas de maior adensamentode mudas em locais com infestação de gramíneas dentro da área total que está sendo recuperada. Esse modelo apresenta a dificuldade em se combinar espécies sombreadoras (geralmente pioneiras) com sombreadas (não pioneiras). Quando uma determinada floresta sofre um distúrbio, como um desmatamento ou um incêndio, a sucessão secundária se encarrega de promover a colonização da área aberta e conduzir a vegetação por meio de uma série de estádios sucessionais, caracterizados por grupos de plantas que vão se substituindo ao longo do tempo, modificando as condições ecológicas locais até chegar a uma comunidade bem‑estruturada e ecologicamente mais estável. A sucessão secundária depende de uma série de fatores, como a presença de vegetação remanescente, o banco de sementes do solo, a rebrota de espécies arbustivo‑arbóreas, a proximidade de fontes de sementes e a intensidade e a duração do distúrbio. Assim, cada área degradada apresentará uma dinâmica sucessional específica. Torna‑se imprescindível eliminar o fator de degradação, isolar a área e não praticar nenhuma atividade de cultivo. Um aspecto importante a ser considerado ao se planejar a recuperação de uma determinada área degradada diz respeito à matriz vegetacional em que essa área está inserida. Numa matriz vegetacional caracterizada por culturas agrícolas, como extensas plantações de soja ou algodão, ou por pastagens, dependendo do tipo de degradação e do histórico de uso a que a área foi submetida, o processo de regeneração florestal tende a ser extremamente lento ou mesmo a não ocorrer. Entretanto, a regeneração podrá ser rápida e resultar numa floresta secundária com razoável diversidade de espécies quando a matriz vegetacional for predominantemente composta por remanescentes florestais. Em alguns casos, a elevada infestação de espécies herbáceas invasoras, principalmente gramíneas exóticas, como o capim‑gordura, a braquiária e trepadeiras agressivas, pode inibir a regeneração natural das espécies arbustivo‑arbóreas, mesmo que estejam presentes no banco de sementes do solo ou que cheguem à área, via dispersão de sementes. Nessas situações, é recomendada uma intervenção para controlar as populações dessas plantas herbáceas agressivas e estimular a regeneração natural das arbustivo‑arbóreas. 71 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS Entre as técnicas para estimular a regeneração florestal em áreas degradadas, pode‑se destacar a incorporação de sementes de espécies arbóreas ao banco de sementes do solo por meio da semeadura direta, técnica também conhecida como enriquecimento e adensamento do banco de sementes. Em algumas áreas, o simples revolvimento do solo com abertura de sulcos de pequena profundidade, cerca de 3 a 5 cm, é suficiente para estimular a germinação de sementes do banco e desencadear o processo de regeneração natural. Para áreas com grande infestação de gramíneas, como a braquiária ou o capim‑gordura, a abertura de clareiras com a remoção de toda a biomassa, deixando o solo exposto, seguida da semeadura de espécies arbóreas pioneiras de rápido crescimento, pode também induzir o processo de regeneração florestal. É também possível estimular o crescimento de plântulas de espécies arbóreas suprimidas em áreas invadidas por gramíneas, ou em pastagens abandonadas, limpando a região ao redor dessas plântulas. O objetivo dessas técnicas é o aproveitamento da capacidade de autorrecuperação que o ecossistema ainda pode possuir. Essas técnicas são indicadas quando a regeneração florestal já se iniciou, o que é facilmente avaliado em campo pela observação da presença de arbustos, plântulas e indivíduos jovens de espécies arbóreas. 6.4 Restauração florestal Recomenda‑se adotar os seguintes critérios básicos de espécies para restauração florestal: plantar espécies nativas com ocorrência em florestas da mesma microbacia hidrográfica ou da região; plantar o maior número possível de espécies para gerar alta diversidade; plantar mudas oriundas de sementes obtidas em várias árvores‑matrizes de diferentes remanescentes florestais para garantir diversidade genética; utilizar combinações de espécies pioneiras de rápido crescimento e copa ampla, junto com espécies não pioneiras (secundárias tardias e clímax); plantar espécies atrativas à fauna; respeitar a tolerância das espécies à umidade do solo, isto é, plantar espécies adaptadas a cada condição de umidade do solo. Em solos degradados, é preciso plantar espécies leguminosas fixadoras de nitrogênio, juntamente com outras espécies nativas. Na escolha de espécies a serem plantadas em áreas degradadas, é imprescindível levar em consideração a variação de umidade do solo desde as margens dos cursos d’água até as áreas mais altas, como encostas e topos de morro. Para as áreas permanente encharcadas, às margens de rios e riachos, recomendam‑se espécies adaptadas a esses ambientes, corno aquelas típicas de florestas de brejo e florestas inundáveis. Para áreas de transição, são indicadas espécies com capacidade de sobrevivência em condições de inundações temporárias. Em áreas livres de inundação, como as mais altas do terreno, as encostas, os topos de morro e as marginais ao curso d’água, compondo barrancos muitos altos, recomendam‑se espécies adaptadas a solos bem‑drenados, comuns nas florestas estacionais semideciduais. No planejamento da recuperação, deve‑se considerar também a relação da vegetação com a fauna, que atuará dispersando as sementes e contribuindo com a própria regeneração natural. Espécies regionais, com frutos comestíveis para a fauna, ajudarão a recuperar as funções ecológicas da floresta. 72 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 26 /0 8/ 20 15 Unidade II Espécies exóticas devem sempre ser evitadas na recuperação de áreas degradadas. São indicadas, em casos extremos de degradação do solo, algumas leguminosas fixadoras de nitrogênio, que comprovadamente não são agressivas. Em áreas degradadas próximas a remanescentes de florestas nativas e que apresentem árvores remanescentes, e quando não se tiver disponibilidade de mudas de muitas espécies, plantios mais homogêneos poderão ser realizados. Nessas situações, deverá ocorrer um enriquecimento natural da área recuperada pela entrada de sementes vindas das fontes próximas. O aumento da diversidade nesses plantios homogêneos tende a ser muito lento, podendo ser necessários posteriores plantios de enriquecimento ou semeadura direta. O primeiro passo para a produção de mudas ou para a semeadura direta é a obtenção de sementes com qualidade fisiológica e genética. O número e a distribuição das árvores que serão utilizadas como matrizes são extremamente importantes. A coleta de sementes em uma ou poucas árvores, localizadas próximas umas das outras, tende a restringir a diversidade genética, podendo, no futuro, resultar em problemas de conservação da espécie na floresta que foi plantada. Uma vez selecionadas as matrizes, procede‑se à coleta das sementes. Esse procedimento deverá ser realizado quando os frutos apresentarem sinais indicativos de maturação, como mudança de coloração, início da queda, visitação por dispersares etc. Para espécies com dispersão pelo vento (anemocoria), a coleta deve ser realizada antes da abertura dos frutos secos para se evitar grandes perdas de sementes. Após a coleta, as sementes são beneficiadas, retirando‑se toda a impureza, como asas, polpa, sementes quebradas ou brocadas etc. A técnica de beneficiamento a ser adotada é determinada conforme o tipo de fruto. Para espécies com frutos secos, apenas sua secagem à meia‑sombra pode ser suficiente para a liberação das sementes. Para frutos carnosos com sementes grandes, utilizam‑se o despolpamento
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