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63 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS Unidade II 3 FORMAS DE PURIFICAÇÃO DO AR E DA ÁGUA Medidas de prevenção e correção da poluição do ar devem ser tomadas com o objetivo de atingir o desenvolvimento sustentável. A busca de soluções para o problema deve começar com a sua prevenção. Prevenir significa evitar a formação de poluentes com a utilização de processos industriais e de combustíveis menos poluentes, além de medidas de minimização de consumo de produtos poluidores e de energia, enquanto controlar se refere a medidas de tratamento da emissão de poluentes. Sabemos que a poluição pode ser interpretada como perda de matéria‑prima ou energia. Uma caldeira que emite fumaça preta está trabalhando com pouca eficiência, desperdiçando combustível e emitindo mais poluentes no ar, facilmente notados nas chaminés, além de monóxido de carbono, hidrocarbonetos, entre outros. A população precisa atuar mais intensamente. Por exemplo, diminuindo a utilização de veículos particulares e dando preferência ao transporte coletivo, que deve ser menos poluente, mais disponível e confortável para que a população possa ficar satisfeita ao utilizá‑lo. A diminuição da produção de lixo pela população e o uso de eletrodoméstico e lâmpada mais eficientes, em termos de consumo de energia, são medidas de muita importância. Medidas tecnológicas são importantes, mas não têm sido eficazes na resolução do problema, como é o caso dos automóveis, sendo necessária a atuação consciente e ambientalmente correta da sociedade. A evolução da ciência e da tecnologia constitui a própria evolução da humanidade desde a Pré‑História, propiciando sua adaptação ao meio e a busca da sobrevivência, da satisfação, do conforto e do bem‑estar. No início, a humanidade buscou alimentos e abrigo para as intempéries, depois o combate às pragas, até o conhecimento de outras regiões do planeta e do universo. Para a prevenção e controle da poluição do ar, utilizam‑se medidas que envolvem desde o planejamento do assentamento de núcleos urbanos e industriais e do sistema viário até a ação direta sobre a fonte de emissão. A prevenção está relacionada com a tríade reduzir, reutilizar e reciclar. Podemos levar em consideração que o processo de poluição do ar ocorre em duas fases: a fase de geração, emissão, transporte, difusão e transformação e a fase de recepção. Podemos citar como exemplo um incinerador de resíduos, que na queima de lixo ocorre a formação de poluentes emitidos pela chaminé. Quando chegam à atmosfera, esses poluentes são transportados, difundidos, transformados e, por fim, atingem o receptor, que pode ser pessoas, vegetais, animais ou materiais que sofrem os efeitos desses poluentes. 64 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Existem muitas formas de produzir que não poluem. Os poluentes podem ser eliminados pela substituição de combustíveis, matérias‑primas, reagentes, alteração de equipamentos e processos. Podemos citar como exemplo a eliminação da emissão de compostos de chumbo por veículos à gasolina, quando o chumbo tetraetila, um aditivo antidetonate, deixou de ser adicionado é o gás natural, que elimina a formação e a emissão de compostos de enxofre ao ar. Na realidade, a diminuição da quantidade de poluentes gerados é mais fácil de ser alcançada do que sua eliminação. Isso pode ser feito com a adoção das seguintes medidas: operação de equipamentos dentro de sua capacidade nominal; operação e manutenção adequada de equipamentos produtivos, caldeiras, fornos e veículos; armazenamento adequado de materiais pulverulentos, evitando a ação dos ventos; utilização de processos, equipamentos e operações, matérias‑primas, reagentes e combustíveis de menor potencial poluidor. A educação ambiental da população e dos empresários tem um papel importante para que a ação de controle funcione. De nada adianta existirem leis se a população não estiver envolvida no processo e se os meios empresariais não estiverem motivados para realizar a ação. Se mesmo após todos os esforços utilizados ainda não conseguirmos a redução necessária na emissão ou na concentração no ambiente, devemos utilizar os equipamentos para o tratamento das emissões. Sempre em conjunto com o equipamento de controle de poluição industrial, existe um sistema de exaustão cuja função é captar, concentrar e conduzir os poluentes para serem filtrados, com posterior lançamento residual no ar. Os equipamentos de controle da poluição do ar são divididos em função do tipo de poluente: equipamentos de controle de material particulado e equipamentos de controle de gases. No caso dos veículos, um dispositivo de tratamento de emissões é o combustor catalítico, que reduz a emissão de CO2, NOx e hidrocarbonetos. O material particulado pode ser removido do fluxo gasoso poluído por sistemas secos e sistemas úmidos. Os três equipamentos mais eficientes para o controle do material particulado são o filtro manga, o precipitador eletrostático e o lavador Venturi, mas com eficiências de retenção de poluentes que variam de acordo com o projeto e com as condições de operação e manutenção. A seguir vamos estudar os equipamentos de controle da poluição do ar mais utilizados. Os gases e vapores podem ser removidos do fluxo poluído por meio de absorvedores e adsorvedores, particularmente com a utilização de carvão ativado, ou por incineração térmica ou catalítica e também por condensadores, biorreatores e processos especiais. Para cada fonte de poluição deve ser estudada a melhor solução, tanto do ponto de vista do custo como do ponto de vista ambiental. A tecnologia de controle de poluição do ar disponível permite que a poluição seja reduzida, muitas vezes em mais de 99%. Por outro lado, o planejamento urbano permite uma melhor distribuição espacial das fontes poluidoras do ar, aumentando a distância entre fonte e receptor; reduzindo a concentração de atividades poluidoras próximas a núcleos residenciais; proibindo a implantação de fontes de alto 65 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS potencial poluidor em regiões críticas; localizando as fontes a jusante dos ventos predominantes na região em relação a assentamentos residenciais; controlando a circulação de veículos em áreas congestionadas, bem como atuando com vistas à melhoria do sistema viário. Nesse caso, é preciso tomar cuidado, pois a melhoria do sistema viário pode agir no sentido contrário, incentivando mais ainda o uso do transporte individual, como o automóvel. Lembrete A maioria dos poluentes do ar fica na atmosfera por apenas alguns dias, com exceção do dióxido de carbono, CO2, que perdura por muito tempo na atmosfera. No que se refere à diluição, deve‑se enfatizar que a utilização de chaminés altas visa à redução da concentração do poluente no nível do solo, sem diminuição da quantidade emitida. Trata‑se de uma medida, cuja eficácia depende da distribuição espacial das fontes e das condições meteorológicas e topográficas da região. Esta é uma técnica recomendável como medida adicional para melhoria das condições de dispersão de poluentes residuais na atmosfera, mas somente após a tomada de outras medidas para diminuir a geração de poluentes e a sua emissão. 3.1 Dispositivos para remoção de material particulado em suspensão Câmara gravitacional é um dos dispositivos mais simples e consiste em uma câmara de expansão, na qual ocorre redução da velocidade do gás até um ponto em que as partículas em suspensão são capturadas pela força da gravidade. Com a redução da velocidade do gás, a influência da forçaviscosa do gás sobre as partículas diminui e elas começam a cair pela ação da gravidade. Quanto maior a partícula, maior a taxa de sedimentação. Em uma determinada corrente gasosa, as partículas maiores sedimentam mais rapidamente que as partículas menores. Existem várias configurações para as câmeras gravitacionais; os tipos mais usados são: a câmara de expansão simples, câmaras de multipratos e câmara inercial (CALIJURI; CUNHA, 2013). 66 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Na figura a seguir podemos observar os tipos de câmaras mais comuns: Gás “sujo” Pó (a) Gás “limpo” Gás “sujo” (b) Gás “limpo” Bandejas Gás “sujo” Pó (c) Gás “limpo” Placa defletora (a) de expansão simples, (b) com bandejas, (c) inercial Figura 2 – Câmara gravitacional Geralmente, as câmaras são utilizadas para retirada da fração mais grossa da massa de partículas em suspensão, antes de dispositivos de controle de particulados mais eficientes, contribuindo para o funcionamento e para a diminuição da frequência de limpeza dos outros equipamentos. Raramente é utilizada como dispositivo final de limpeza do gás. Ciclones podem ser chamados de separadores centrífugos e são muito usados para o controle de particulados quando partículas relativamente grandes precisam ser coletadas. São mais eficientes que as câmaras gravitacionais, mas também podem ser usados como pré‑coletores de dispositivos mais eficientes ou usados para proteção de outro equipamento. Possuem custos baixos de manutenção e instalação, pois não possuem partes móveis. Seu princípio de separação é a atuação da força centrífuga sobre as partículas. A corrente gasosa, ao entrar no ciclone, é forçada a girar no interior do equipamento. As partículas maiores que não acompanham o movimento do gás colidem com as paredes do ciclone, são direcionadas para baixo pela ação da gravidade e coletadas na parte inferior do equipamento. As partículas menores giram com o gás e ganham velocidade angular com a rotação em torno do eixo do ciclone e de sua massa. Pela ação da força centrífuga, essas partículas são direcionadas para as paredes do equipamento e seguem o mesmo caminho das 67 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS partículas maiores. O gás limpo sai pela parte superior do equipamento. A força centrífuga é proporcional à massa da partícula. A figura a seguir mostra o caminho da partícula dentro do ciclone: Saída gás “limpo” Entrada gás “sujo” Entrada do gás Saída do pó Tubo “vórtex” Corpo Cone Figura 3 – Trajetória do gás e das partículas no interior do ciclone Precipitador eletrostático: imagine uma corrente gasosa escoando no interior do espaço entre duas grandes placas planas verticais. As partículas em suspensão na corrente gasosa estão carregadas eletricamente; entre as placas, existe alta tensão, cerca de 40 a 50 kV. As partículas, ao entrarem nesse espaço, serão desviadas em direção à placa com sinal contrário ao da carga das partículas. Ali serão coletadas e removidas da corrente gasosa. A velocidade adquirida pela partícula, ao se deslocar em direção à placa, é conhecida como velocidade de migração e tem a direção das linhas de força do campo elétrico. Essa velocidade é similar à velocidade de sedimentação de uma partícula sob influência de um campo gravitacional. A figura a seguir mostra o modo de coleta das partículas na placa do equipamento e, na figura 5, podemos observar um esquema simplificado de um precipitador de placas planas paralelas. 68 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Eletrodo Gás “sujo” Gás “limpo” Placa coletora Figura 4 – Movimento e coleta das partículas em precipitador eletrostático Existem diversos mecanismos pelos quais partículas líquidas ou sólidas podem adquirir cargas elétricas. Os mais usados são: eletrificação por contato ao atrito, por corrente corona, por indução e por ionização. Para precipitadores eletrostáticos, o carregamento por corrente corona é mais comum. Fonte de alimentação Eletrodo Corona Placas Coletoras Fonte de alimentação Gás “limpo” Gás “sujo” Figura 5 – Precipitador eletrostático de placas planas paralelas Filtro de manga: essa filtração consiste em passar uma corrente gasosa através de um meio filtrante que retenha o material particulado em suspensão. O material pode ser líquido ou sólido, e esse processo é mais usado para correntes líquidas. Com o avanço da filtração vai se formar uma camada do material removido do gás, conhecida como torta de filtração. Essa camada auxilia no processo de filtração, aumentando a eficiência de coleta. Com a formação da torta, o conjunto tecido + torta forma o meio filtrante definitivo do processo de filtração, como podemos observar na figura a seguir. O crescimento da espessura da torta pode causar a queda de pressão no filtro, forçando a 69 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS limpeza periódica da torta. A eficiência da coleta de filtros sujos é maior do que a de filtros limpos. Em aplicações industriais, o material poroso é normalmente um tecido, confeccionado em formato tubular, similar a uma manga de camisa. Muitas mangas de camisa são colocadas em fileiras lado a lado e acondicionadas dentro de um grande caixa. Essa configuração é conhecida como filtro de mangas, como podemos observar na figura 7. Gás “sujo” Gás “limpo” Filtro“Torta” Figura 6 – Filtração com formação de torta Mecanismo de limpeza Saída do gás “limpo” Entrada do gás “sujo” Funil coletor Placa perfurada Filtros (mangas) Gás “limpo” Placa defletora Gás + Pó Figura 7 – Filtro de mangas Periodicamente, as mangas filtrantes velhas devem ser substituídas por mangas novas, causando uma parada no processo de filtração. Esse tipo de dispositivo é altamente eficiente, mesmo para partículas pequenas, e é capaz de tratar grandes volumes de gás. Contudo, apresenta queda de pressão 70 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II considerável e grande área de filtração, tendo como resultado o emprego de um número maior de mangas filtrantes. As variáveis importantes para caracterização do filtro são: tipo de meio filtrante, temperatura de operação, capacidade de filtração, filtração intermitente e contínua, tipo de mecanismo de limpeza e coleta do material particulado na superfície interna ou externa da manga. A operação eficiente de um filtro está relacionada a uma limpeza adequada do meio filtrante. Uma limpeza deficiente causa o aumento da queda de pressão do filtro, diminuição da capacidade de filtragem e dano ao tecido, reduzindo sua vida útil. Existem três mecanismos básicos de limpeza utilizados: vibração mecânica, fluxo reverso e jato pulsante. A escolha adequada do meio filtrante também é importante para o bom funcionamento dos filtros. Resistências mecânicas e químicas, temperatura de operação e peso são características fundamentais dos tecidos filtrantes. O lavador Venturi é utilizado na limpeza de correntes de ar devido a sua capacidade de remoção de poluentes em suspensão. A lavagem consiste em colocar em contato íntimo a corrente gasosa e um líquido atomizado, usualmente água. O termo “lavadores” é normalmente usado para a remoção de material particulado, já para os gases utilizamos os processos de absorção, os absorvedores. Os tipos mais conhecidosde lavadores são a torre de lavagem e o lavador Venturi. Nesses equipamentos, um líquido de lavagem é atomizado para a formação de uma grande quantidade de pequenas gotas que capturam o material particulado suspenso no gás, e o mecanismo de coleta dominante é a impactação. Quanto maior a quantidade de gotas e menor o seu diâmetro, maior é a eficiência da coleta e mais eficiente é o dispositivo. Podemos observar nas figuras 8 e 9 o esquema de um lavador Venturi. Injeção do líquido Gás “sujo” Gás “limpo” Seção convergente Garganta Difusor Figura 8 – Lavador Venturi Os lavadores Venturi são utilizados com mais frequência para o controle de particulados, pois são mais eficientes para a retirada de partículas pequenas. Nesse equipamento, temos a necessidade de introdução de uma corrente gasosa, que é a corrente que queremos tratar, e uma corrente líquida, que é a corrente de tratamento. Dessa forma, o consumo de energia no lavador é considerável, pois a queda de pressão no equipamento é significativa, um parâmetro importante no seu dimensionamento. 71 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS Entrada gás “sujo” Injeção de líquido Bomba de reciclo Saída gás “limpo” Lavador Venturi Figura 9 – Lavador Venturi seguido de um separador 3.2 Dispositivos para a remoção de poluentes gasosos Condensador: os condensadores utilizam água ou ar para resfriar e condensar uma corrente de ar e seus componentes. São dispositivos que não atingem temperaturas muito baixas, por isso não possuem muita eficiência na remoção da maioria dos gases, apenas em casos em que o vapor se condense em altas temperaturas. São equipamentos usados como pré‑tratamento de equipamentos mais eficientes. As condições de condensação de um determinado gás dependem das suas propriedades químicas e físicas. A condensação pode acontecer quando a pressão parcial do poluente na corrente gasosa é igual a sua pressão de vapor como substância pura, na temperatura adequada. Podemos condensar um gás de três maneiras: em uma dada pressão, a temperatura do sistema é reduzida até a pressão parcial do gás se igualar a sua pressão de vapor; em uma dada temperatura, a pressão do sistema é elevada até a pressão parcial do gás se igualar a sua pressão de vapor; e utilizando uma combinação de compressão e resfriamento do sistema até a pressão parcial do gás se igualar a sua pressão de vapor. Os condensadores operam com remoção de calor da corrente gasosa. Os tipos mais comuns são: condensadores de contato, nos quais o fluido refrigerante é colocado em contato direto com corrente gasosa; e misturado com o gás e com os condensadores de superfície, nos quais o fluido refrigerante está confinado em um compartimento distinto da corrente gasosa. Geralmente, os condensadores de superfície são mais usados e possuem muitas configurações. As mais comuns são: casco e tubos, duplo tubo, tubo espiral e placas planas. 72 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II A figura a seguir mostra um esquema simplificado de um condensador do tipo duplo tubo, no qual a corrente gasosa escoa no interior do espaço anular entre os dois tubos. O tubo externo é chamado de camisa. A condensação ocorre entre os tubos. Corrente gasosa “suja” Corrente gasosa “limpa” Líquido resfriador Tubo externo ou “camisa” Tubo interno Condensado Líquido resfriador TGe TLe TLs TGs Figura 10 – Esquema de um condensador de duplo tubo Absorvedor: a absorção envolve a remoção de poluentes gasosos de uma corrente de processo pela dissolução em um líquido. A condição necessária para a aplicação da absorção para o controle da poluição do ar é a solubilidade dos poluentes no líquido. Em um processo de absorção, coloca‑se em contato íntimo a corrente gasosa e o líquido, tal como se faz nos lavadores. Quanto maior a superfície de contato entre os gases e o líquido, mais eficiente é a absorção, pois sendo este processo de transferência de massa, a elevada área interfacial líquido‑gás colabora com um fenômeno. O processo de transferência de massa ocorre até que o equilíbrio seja atingido. No dimensionamento de absorvedores, existe a necessidade de proporcionar: grande área interfacial líquido‑gás; boa mistura entre fases; tempo de residência elevado no equipamento; e alta solubilidade do contaminante absorvente. Geralmente, a utilização de vazões elevadas de solventes isentos do contaminante que se deseja absorver é o mais adequado, pois dessa forma temos a máxima força motriz para transferência de massa entre as fases. Para o dimensionamento de absorvedores, precisamos escolher bem o solvente, que deve possuir as seguintes características: alta solubilidade no gás, baixa viscosidade e toxicidade, baixa volatilidade, alta estabilidade química e baixo ponto de congelamento, além de baixo custo. Normalmente, a água atende aos requisitos. Existem várias configurações de equipamentos, e as mais comuns são as colunas de recheio ou empacotadas e as colunas de aspersão. As colunas também podem ser chamadas de leitos ou torres, e as colunas recheadas são mais usadas. Podemos observar um esquema das colunas absorvedoras na figura a seguir. 73 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS Saída do gás Entrada do líquido Entrada do líquido Entrada do gás Entrada do gás Saída do líquido (a) (b) Saída do líquido Distribuidor de líquido Suporte do recheio Recheio Saída do gás Spray (a) coluna recheada; (b) coluna de aspersão Figura 11 – Colunas absorverdoras Nas colunas recheadas, a escolha do recheio é fundamental, pois ele é o coração do desempenho do equipamento e sua seleção deve observar as seguintes características: alta resistência química; alta porosidade; alta relação área superficial/volume do recheio; baixa relação peso/volume; alta resistência mecânica; e custo baixo. Adsorvedores são amplamente usados nas indústrias farmacêuticas, alimentícias e petroquímicas para purificação de correntes gasosas até a recuperação de hidrocarbonetos aromáticos. Os adsorvedores mais novos são as zeólitas sintéticas. A adsorção é um fenômeno espontâneo em que as moléculas de um fluido tendem a interagir e a se concentrar na superfície de um sólido e podem ocorrer também sobre as superfícies líquidas, geralmente em um processo exotérmico. Os sólidos têm a habilidade de adsorver em sua superfície componentes específicos de uma mistura. Como consequência, esses componentes podem ser separados. A quantidade de moléculas que um adsorvente é capaz de reter é conhecida como capacidade de adsorção e é expressa pela razão entre a massa de adsorvato e a massa de adsorvente. As moléculas adsorvidas podem se acomodar sobre a superfície do adsorvente em uma camada ou várias, como podemos observar na figura a seguir. 74 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Moléculas do gás Adsorvente Monocamada Multicamada Figura 12 – Moléculas de um gás adsorvidas sobre um adsorvente Um adsorvente adequado deve possuir seletividade, capacidade de adsorção e estabilidade química elevada, com área superficial elevada, ser muito poroso e com poros de diâmetro pequeno. Os principais adsorventes microporosos são a sílica gel, o carvão ativado, a alumina ativada e as zeólitas. A estrutura porosa do adsorvente é composta de diferentes tamanhos de poros, como podemos observar na figura a seguir. Como a adsorção é um fenômeno superficial,é fundamental que o adsorvente possua grande área superficial disponível. O processo de adsorção ocorre por meio de sistemas cíclicos; neles, o adsorvente é submetido a uma etapa de adsorção, durante a qual as substâncias de interesse são adsorvidas. Em seguida, ocorre uma etapa de regeneração, na qual os componentes adsorvidos são removidos, regenerando o adsorvente e permitindo que seja utilizado novamente. Os métodos de regeneração podem ser: regeneração pela redução da pressão interna da coluna com temperatura constante; por aquecimento do leito; e por deslocamento químico, que é a exposição de uma espécie química competitiva ao material adsorvido, se deslocando e dando lugar a essa espécie com temperatura e pressão constantes. Moléculas do solvente Moléculas do gás Adsorvente Poros Figura 13 – Detalhe da estrutura porosa de um adsorvente Incinerador: um processo ideal é aquele em que a combustão é completa, e os produtos da reação são apenas água e dióxido de carbono. Se outros produtos são gerados, como monóxido de carbono ou óxidos de 75 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS nitrogênio, a combustão é denominada incompleta. A combustão incompleta de muitos compostos orgânicos resulta na formação de aldeídos ou ácido orgânicos, gerando problemas adicionais. Para alcançar a combustão completa, precisamos colocar em um contato íntimo os poluentes, o combustível e o ar, proporcionando as seguintes condições: temperatura elevada para ignição da mistura poluente/combustível, mistura turbulenta dos reagentes e tempo de residência suficiente para a reação acontecer. Os incineradores operam em temperaturas entre 600 e 650 ºC, que oxidam a maioria dos compostos orgânicos, mas as temperaturas podem variar de 1.800 a 2.200 ºC para poluentes mais perigosos. O gás natural ou o propano podem ser utilizados como combustíveis para manutenção das temperaturas adequadas. Podemos observar na figura a seguir o desenho de um incinerador que possui um sistema para recuperação do calor gerado na câmara de combustão. Para a combustão completa de um composto ocorrer, é necessária a quantidade suficiente de oxigênio para converter todo carbono em CO2. O suprimento de oxigênio na combustão vem do ar. Se assumirmos que o ar é uma mistura de 79% de nitrogênio e 21% de oxigênio, um grande volume de ar é necessário para suprir as necessidades de combustão. Gás “sujo” Ar Combustível Câmara de combustão Recuperação de calor Queimador Calor Gás “limpo” Figura 14 – Incinerador Separador de membrana: processos de separação por membranas se caracterizam pela passagem da mistura gasosa através de uma membrana permeável, ocorrendo separação seletiva dos componentes. São utilizados também no tratamento de efluentes líquidos, como na purificação de água na indústria de bebidas. É um processo muito parecido com a filtração de material particulado. No entanto, a maioria desses processos utiliza o escoamento tangencial, uma particularidade que os distingue da filtração convencional, na qual ocorre a separação em escoamento frontal. Podemos observar o escoamento tangencial na figura a seguir. Gás “sujo” Membrana Escoamento tangencial Permeado ou filtrado Gás “limpo” Figura 15 – Separador de membranas com escoamento tangencial 76 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II A eficiência da membrana é medida por dois parâmetros: a seletividade e o fluxo. Na limpeza de gases, as membranas são usadas para o tratamento de correntes gasosas que contêm compostos orgânicos voláteis com concentração acima de 1.000 ppm e vazões moderadas. Biofiltro: embora sua aplicação original tenha sido a remoção de odores em estações de tratamento de esgotos, nos dias atuais, os biofiltros são usados para o controle de emissões gasosas contaminadas por mercaptanas, aldeídos, fenóis, ácidos orgânicos e outros hidrocarbonetos. Ainda podemos citar outros contaminantes que podem ser eliminados pelo biofiltro, como: ácido sulfídrico, dióxido de enxofre, amônia e fosfina. A biofitração é o processo no qual o ar contaminado é passado por um meio poroso que contém uma população de microrganismos. Os contaminantes são absorvidos do ar para fase água/biofilme e seguem para serem convertidos pelos microrganismos em CO2, água, biomassa e produtos inorgânicos. O desempenho do biofiltro depende da capacidade de degradação dos contaminantes. Compostos mais complexos podem resistir à ação microbiana e a oxidação pode não ser completa, com geração de subprodutos mais tóxicos que os compostos originais. Um biofiltro também deve fornecer um ambiente adequado para o crescimento dos microrganismos. O teor de umidade do meio deve ser mantido em valores ideias para suportar o crescimento microbiano sem obstruir os poros da membrana. Frequentemente, água e nutriente devem ser adicionados ao biofiltro para manutenção da população microbiana. Geralmente, estão presentes na membrana fungos e bactérias. A operação do biofiltro ocorre em um leito fixo, composto de um material inerte, como argila expandida, espuma de poliuretano ou qualquer outro recheio inerte que propicie o crescimento dos microrganismos em sua superfície e a formação de uma fina camada aderida, que chamamos de biofilme. A figura a seguir mostra o esquema de um biofiltro que opera em sistema fechado, com a entrada de gás sujo pelo todo do dispositivo e a saída de gás limpo pelo seu fundo. Ainda nesta figura podemos notar um detalhe do meio filtrante, destacando o material inerte e o biofilme formado na superfície. Gás “sujo” Água e nutrientes Detalhe do leito Gás “limpo” Suporte Biofilme Água Leito Figura 16 – Biofiltro em sistema fechado 77 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS 3.3 Purificação da água Quando pensamos em purificação da água, a primeira coisa que nos vem à cabeça é deixá‑la potável. Para isso é necessário eliminar as quantidades de várias substâncias e atender à Portaria nº 2.914 do Ministério da Saúde (BRASIL, 2011c). Em seguida, pensamos em tratar a água com a menor produção de lodo possível, pois o tratamento desse material é realizado por poucas empresas. Com o objetivo de resolver o problema da qualidade da água, muitos métodos de tratamento foram desenvolvidos e aperfeiçoados. O tratamento da água bruta depende de sua qualidade, isto é, de suas características, que, por sua vez, dependem do manancial de onde a água foi retirada. A Resolução nº 430 do Conama de 2011 estabelece o tipo de tratamento que deve ser empregado, conforme podemos observar no quadro a seguir. Quadro 4 – Definição dos processos de tratamento, segundo a Resolução do Conama nº 357/2005 e de acordo com a classificação do manancial Classificação do manancial Tratamento Processos Classe especial ‑ Desinfecção. Classe 1 Simplificado Clarificação por filtração, desinfecção e correção de pH, quando preciso. Classe 2 ou 3 Convencional Clarificação usando coagulação e floculação, desinfecção e correção de pH, quando preciso. Classe 3 Avançado Técnicas de remoção/inativação de constituintes refratários aos processos convencionais de tratamento, os quais podem conferir à água cor, odor, sabor, atividade tóxica ou patogênica. Fonte: Telles e Góis (2013, p. 268). Saiba mais Para saber um pouco mais sobre os recursos hídricos no Brasil, leia o relatório da Agencia Nacional das Águas (ANA): BRASIL. Agência Nacional das Águas – ANA. Conjuntura dos recursos hídricos no Brasil 2013. Brasília, 2013. Disponível em: <http://arquivos.ana.gov.br/institucional/spr/conjuntura/ANA_Conjuntura_Recursos_ Hidricos_Brasil/ANA_Conjuntura_Recursos_Hidricos_Brasil_2013_ Final.pdf>. Acesso em: 2 maio 2016. Dependendo do manancial escolhido para o abastecimento público, aplicaremos o tipo mais adequado de tratamento, após a classificação segundo a legislação. É imprescindível analisar as características físico‑químicas e microbiológicas antes de decidir o tipo de tratamento a ser usado. As impurezas mais comuns presentes na água são: materiais flutuantes, materiais em suspensão, como algas, protozoários ou mesmo bactérias, materiais dissolvidos e materiais coloidais, como sílica, material orgânico, entre outros. 78 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Fazemos um tratamento prévio para retirada de sólidos maiores através de um sistema de gradeamento, na maioria das vezes construído com barras metálicas de mesma espessura e com espaçamentos iguais entre si. Lembrete Os principais organismos que podem estar presentes na água são bactérias (grupo salmonella) e vírus (poliomelite, hepatite A e protozoários). 3.3.1 Tratamento convencional Para tornarmos a água potável, aplicamos o tipo de tratamento que está baseado na retirada da turbidez e da coloração. Esse processo acaba por eliminar outras substâncias, como manganês, ferro e matéria orgânica, utilizando apenas alguns produtos químicos específicos. O sistema de tratamento completo é constituído por alguns processos unitários, por exemplo, coagulação e floculação, sedimentação, filtração, desinfecção e fluoretação, que estudaremos a seguir. Observação Colóides são misturas heterogêneas de pelo menos duas fases diferentes, com a matéria de uma das fases na forma finamente dividida, entre 1 e 1000 nm. As partículas coloidais são análogas ao soluto, e o meio dispergente é análogo ao solvente. A dimensão das partículas é responsável pela maioria das características físico‑químicas dos colóides. Coagulação e floculação: o objetivo dessa etapa é transformar as impurezas em suspensão ou na forma coloidal presentes na água em partículas maiores, os flocos, que serão removidos nas etapas seguintes com maior facilidade. Qualquer falha pode prejudicar não apenas a qualidade da água como o seu custo. Geralmente, a coagulação e floculação ocorrem em decantadores, mas se a qualidade da água for boa, a água floculada pode passar diretamente para o sistema de filtração, pulando a sedimentação. Para que o processo seja eficiente, utilizamos os coagulantes compostos por elementos que formam hidróxidos gelatinosos. Os mais utilizados são o sulfato de alumínio (Al2(SO4)3) e o cloreto férrico (FeCl3). Nesse processo também usamos alcalinizantes, como óxido de cálcio (CaO), hidróxido de cálcio (Ca(OH)2) e carbonato de sódio (Na2CO3). Os alcalinizantes reagem com os coagulantes, produzindo flocos; como a superfície de contato desses flocos é grande, ela permite a adsorção de partículas não sedimentáveis. Ocorre a formação de íons trivalentes positivos, que atraem e neutralizam as cargas elétricas dos coloides e partículas não sedimentáveis, que são negativas. A principal propriedade do coagulante é reagir com a base, formando o hidróxido gelatinoso, que vai envolver e absorver a impureza, removendo a turbidez da água. Outra propriedade importante é a formação de íons trivalentes com cargas positivas, que vão atrair e neutralizar os coloides. 79 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS As partículas coloidais na água, geralmente, apresentam cargas negativas e, quando dissolvidas na água, repelem umas às outras. Isso faz com que a suspensão seja estável e permite que as partículas se aproximem umas das outras e se aglomerem. Os íons positivos adicionados à água são atraídos pelas cargas negativas das partículas coloidais, comprimindo a carga negativa e gerando uma desestabilização das cargas. Isso torna possível a colisão entre as partículas e, consequentemente, a formação de partículas maiores (VESILIND; MORGAN, 2013). A neutralização da carga é promovida pela reação dos íons alumínio com as cargas das partículas coloidais, como podemos observar na figura a seguir. Força (de repulsão) negativa Figura 17 – Efeito de cátions multivalentes na força de repulsão das partículas coloidais, promovendo a neutralização da carga Vários fatores podem influenciar a coagulação, como o tipo de coagulante (sais de ferro ou alumínio); quantidade do coagulante, que está relacionada à turbidez e à coloração da água a ser tratada, assim como seu teor de microrganismos; a quantidade de coloides protegidos, quantidade de emulsionantes e substâncias coloidais dissolvidas; características químicas da água (alcalinidade, teor de ferro e material orgânico); o pH, pois cada floculante possui uma faixa de pH adequada para reagir de forma mais eficiente; se o tempo de mistura for rápido, ocorrerá a dispersão do coagulante, e se for lenta, haverá a formação de flocos; em temperaturas mais altas, a água flocula melhor, em baixas temperaturas, devemos esperar maior consumo de coagulante; a velocidade de agitação influencia o tamanho da partícula e a sua formação. Em uma Estação de Tratamento de Água (ETA) ocorrem misturas rápidas para a dispersão do coagulante, seguida da mistura lenta para a formação dos coágulos que são transformados em flocos. As câmaras de misturas podem ser mecanizadas, nas quais as misturas são agitadas por agitadores mecânicos, aproveitando a energia hidráulica do fluxo. Para determinar o melhor coagulante e obter uma estimativa de quantidade necessária, realizamos testes de jarro: são preparados seis recipientes com amostras de água a ser tratada, e cada recipiente recebe um produto químico, ou uma quantidade diferente do mesmo produto químico; após a mistura dos reagentes, observamos as características do sólido precipitado e escolhemos o produto e a quantidade 80 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II mínima a ser usada para a retirada adequada dos sólidos. O efeito da malha de coagulação tem o objetivo de destruir a estabilidade das partículas coloidais para que sofram aglutinação, formando partículas maiores. No entanto, se a quantidade de coagulante for muito alta, pode ter o efeito contrário e causar a reestabilização das partículas (VESILIND; MORGAN, 2013). O processo de floculação é um processo físico que ocasiona a formação de partículas maiores. O objetivo da floculação é gerar velocidades diferentes dentro da água para que as partículas sofram colisões. Isso se consegue facilmente fazendo uso de misturadores com pás, que lentamente movimentam a água quimicamente tratada. Esse processo pode ser conhecido como estágio 2, como vemos na figura a seguir: Motores Do tanque de mistura rápida Para o decantador Figura 18 – Floculador utilizado no tratamento de água Após o processo de formação de partículas maiores, a próxima etapa é a sua remoção do meio. Sedimentação: é o processo em que ocorre a deposição do material em suspensão através da ação da força gravitacional. No tratamento de água, a sedimentação pode seguir a coagulação, ou dependendo da qualidade da água, pode ser o primeiro tratamento realizado. A forma e o tamanho das partículas são variáveis e podem interferir no processo de sedimentação. Sobre as partículas podem agir: forças horizontais, devido ao movimento da água no decantador, e forças verticais, devido à gravidade. Assim, enquanto as partículas avançam horizontalmente no decantador, ocorre também um movimento descendente devido à força da gravidade. Quandocolocamos água com material em suspensão em um tanque, verificamos que as partículas, devido à ação da força gravitacional, têm a tendência de ir para o fundo, cada uma com uma velocidade, caracterizando o processo de sedimentação. Como não é possível encher e esvaziar o tanque para o tratamento de água, reduzimos a velocidade com que a água passa por esse tanque, permitindo a deposição de partículas em um determinado tempo. Os sedimentadores podem ser tanques de seção retangular, quadrada ou circular, com fundo dotado de pelo menos um ponto de descarga de lodo, e com dispositivos especiais de entrada e saída. O processo de sedimentação ocorre num tanque chamado de decantador, e sua eficiência depende de características como área, dispositivos de entrada e saída, profundidade, tempo de detenção, entre outras. 81 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS Os decantadores são construídos com o objetivo de minimizar a turbulência dentro do tanque. Sendo assim, os principais elementos de um decantador são suas configurações de entrada e saída. A mais usada é a que utiliza um distribuidor de fluxo que entra e sai do decantador, como podemos observar na figura a seguir (VESILIND; MORGAN, 2013). Vertedor Defletor Efluente para o filtroVálvula para descarga de lodo Lodo Afluente proveniente do floculador A Figura 19 – Decantador utilizado em estações de tratamento de água Nas estações de tratamento, o lodo é formado por hidróxidos de alumínio, carbonato de cálcio e argilas, não é biodegradável e precisa ser retirado do tanque periodicamente. O excesso de lodo no decantador pode causar fermentação, além da produção de gases que vão conferir odores e gosto à água. Em alguns casos, o lodo pode se desprender em forma de placas que ficam boiando na superfície da água, causando má impressão (TELLES; GÓIS, 2013). Geralmente, a remoção do lodo se faz após períodos de algumas semanas através da válvula de descarga de lodo, localizada no fundo do tanque. Ele é descartado em um esgoto ou tanque de contenção ou secagem (VESILIND; MORGAN, 2013). Todo lodo formado durante o processo é armazenado no sistema de sedimentação e precisa ser eliminado, o que ocorre durante a lavagem. Existem poucas ETAs que descartam o lodo adequadamente, mas isso não acontece com frequência, e o lançamento desse material diretamente em um corpo de água gera grandes problemas de poluição. Dentro dos decantadores, a densidade dos sólidos supera a do líquido. A movimentação da partícula sólida em um fluido, sob o efeito da força da gravidade, é impulsionada ao fundo do tanque por alguns fatores, como tamanho, forma e densidade da partícula, além da densidade, da viscosidade e da habilidade de escoamento do fluido (VESILIND; MORGAN, 2013). O ideal é que as partículas sedimentem o mais rápido possível. Para isso, elas devem ter formas compactas, com alta densidade, e o fluido deve ter baixa densidade e baixa viscosidade. Na prática, não é muito viável controlar as últimas três variáveis, mas a coagulação e a floculação geralmente vão resultar compactação das partículas, alterando sua forma e densidade. Na tabela a seguir, podemos observar que, embora a velocidade de sedimentação em um fluido possa depender do formato e da densidade da partícula, pequenas alterações nas partículas floculadas 82 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II no tratamento da água afetam brutalmente a eficiência da remoção da sedimentação. Por isso a coagulação e a floculação são tão importantes na preparação da partícula para o decantador. Tabela 2 – Taxas de sedimentação Diâmetro da partícula (mm) Partículas típicas Velocidade de sedimentação (m/s) 1,0 Areia 2 x 10‑1 0,1 Areia fina 1 x 10‑2 0,01 Silte 1 x 10‑4 0,001 Argila 1 x 10‑6 Fonte: Vesilind e Morgan (2013, p. 206). Filtração: filtrar é passar a água por um meio poroso no qual ficam retidas as impurezas. Os sistemas de filtração de uma ETA podem ser a etapa mais importante, pois é nela que verificamos o polimento da água. Como meio poroso, podemos usar vários materiais; o mais comum é a areia, sustentada por camadas de seixos dispostos sobre um sistema de drenos. No decorrer da filtração, retiramos as partículas em suspensão, que podem ser microrganismos, partículas coloidais e substâncias químicas. Isso ocorre devido aos seguintes fenômenos: ação mecânica de coagem; floculação de partículas que estavam em formação pelo aumento de contato entre elas; sedimentação das partículas sobre os grãos de areia; e formação de película gelatinosa na superfície de areia devido aos microrganismos em desenvolvimento. Observamos que, com a passagem das águas através do solo, muitos elementos contaminantes podem ser removidos. Dessa forma, engenheiros ambientais aprenderam a aplicar esse processo natural aos sistemas de tratamento de água e desenvolveram o que conhecemos atualmente como filtro rápido de areia. A operação desse filtro envolve duas etapas: filtração e lavagem. A água proveniente da saída do decantador entra no filtro e atravessa camadas de areia e cascalho, seguindo por um fundo falso e saindo para um reservatório de água tratada que armazena a água final. Durante a filtração, as válvulas A e C ficam abertas, como podemos ver na figura a seguir. Também podemos utilizar antracito como uma camada do filtro. O antracito funciona como um carvão e é usado para remover matéria orgânica dissolvida. Os sólidos em suspensão que passam pela floculação e escapam das etapas de sedimentação ficam retidos nas partículas de areia. O filtro rápido pode ser obstruído quando grande quantidade de material sólido fica retida nas camadas filtrantes, resultando em perda de carga. Nessa situação, é necessária a limpeza do filtro, que é executada hidraulicamente através de um processo chamado de retrolavagem. O operador fecha a vazão de entrada e saída do filtro (fechando as válvulas A e C); em seguida, abre as válvulas D e B, que permitem que a água de lavagem entre por baixo da camada do filtro. Esse jato de água força a expansão das camadas de areia e cascalho e movimenta as partículas de areia. Os sólidos retidos são liberados e saem com a água de lavagem. Esse processo dura aproximadamente 15 minutos e, em seguida, o fluxo de água de lavagem é interrompido e a filtração é reiniciada. Esses 83 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS procedimentos gastam energia e quantidade significativa de água, por isso devem ser realizados com frequência mínima para diminuição de custos da estação de tratamento. Observação Sabemos que a escassez de água potável que vemos atualmente é resultado da poluição dos recursos hídricos causados pela atividade humana e pela falta de responsabilidade perante a utilização dos recursos naturais. Armazenamento de água de lavagem Nível da água durante a filtração Nível da água durante a lavagem Reservatório de água tratada Distribuição para a cidade Areia Cascalho Dreno de lavagem Subdreno Do decantador A B C D Figura 20 – Filtro rápido utilizado em estações de tratamento de água Desinfecção: consiste em um processo realizado para eliminar os microrganismos patogênicos, no entanto, as substâncias utilizadas são as mesmas usadas na oxidação das impurezas da água. Assim, podemos dizer que quando aplicamos um desinfetante, oxidamos vários compostos orgânicos e inorgânicos. Os compostos usados para esse processo podem ser peróxido de hidrogênio, cloro e seus derivados, como hipoclorito de sódio(NaClO), hipoclorito de cálcio (Ca(ClO)2), ozônio (O3) e raios ultravioleta. O cloro é um gás de coloração esverdeada, não explosivo, mais denso que o ar, que ataca apenas metais quando úmido e está disponível comercialmente. Dos compostos de cloro, os mais usados são os hipocloritos de sódio e cálcio. O cloro é um poderoso agente oxidante, tendo a capacidade de penetrar nas células e de se combinar com compostos celulares vitais, provocando a morte dos organismos patogênicos. O cloro se combina com a água e com suas impurezas presentes, formando inúmeros compostos. Ao ser adicionado à água, o cloro sofre uma reação de hidrólise. Cl2 + H2O HClO + HCl 84 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II O HClO, que possui maior poder oxidante, sofre dissociação de acordo com o pH da água em: HClO H+ + OCl‑ A concentração de ácido hipocloroso, ou íon hipoclorito, depende do pH: quanto menor o pH, maior a presença de HClO, e quanto maior o pH, maior a concentração de ClO‑. Como o HClO possui um maior poder bactericida, a realização da cloração ocorre em pH ácido. Quando o cloro em solução se apresentar na forma de HClO ou ClO‑ é conhecido como cloro residual livre. A amônia ou substâncias nitrogenadas, quando presentes em água clorada, dão origem a compostos com ação bactericida, conhecidas como cloraminas. Entre elas, a mais ativa é a dicloroamina (NHCl2). Esta também é uma forma de cloro residual. A cloroaminação é uma técnica de cloração com o objetivo de formar cloro residual combinado. A reação do cloro com substâncias amoniacais forma cloraminas inorgânicas, enquanto a reação do cloro com compostos orgânicos forma cloraminas orgânicas. As cloraminas orgânicas têm poder bactericida menor que as inorgânicas, podendo não ter nenhuma ação. Por isso, é necessário remover os compostos orgânicos nitrogenados antes de realizar a cloração e formar apenas cloraminas inorgânicas. Para águas com boa qualidade, a cloraminação pode ser aplicada para a desinfecção, desde que sejam adotadas medidas que garantam a sua eficiência, como adição de cloro em pH ácido para formação de dicloaminas em concentrações elevadas. Para águas muito contaminadas, devido ao menor poder bactericida das cloraminas, devemos fazer uma cloração com residual livre antes da cloraminação. A cloraminação é recomendada para casos em que pretendemos obter um residual mais estável. A amônia pode ser adicionada depois do cloro, dando tempo para o cloro livre agir. A adição de amônia gera cloraminas menos voláteis que o cloro livre, gerando perdas menores como as verificadas pela exposição da água clorada à luz do sol. As principais vantagens da cloraminação são: prevenção do gosto, especialmente os provenientes do fenol e controle de microrganismos nos decantadores, filtros e sistemas de distribuição, já que possui maior período de persistência de residual bactericida e causa menos irritação aos olhos e nariz que o cloro utilizado em piscinas. Podemos eliminar microrganismos pela radiação ultravioleta, que ocorre quando a energia UV é absorvida pelo material genético da célula. A máxima atividade de destruição ocorre a 256 nm, que corresponde à máxima absorção dos ácidos nucleicos. Quando o material genético da célula absorve energia UV, dímeros de pirimidina são formados. Esses compostos causam distorções do DNA, impedindo a sua replicação. A sensibilidade dos organismos varia devido a sua resistência à penetração da radiação. A composição química da célula e a espessura da parede determinam a resistência relativa do microrganismo. A luz ultravioleta com comprimento de onda entre 900 e 3800 nm tem efeito bactericida, são usadas lâmpadas de mercúrio/argônio em instalações pequenas e lâmpadas de mercúrio/quartzo para instalações maiores. As lâmpadas podem ser instaladas em série, colocadas sobre os canais, em tubulações ou submersas, em pressão atmosférica ou pressurizadas. A água deve fluir sem turbulência, com cor e turbidez baixas, pois pode absorver a radiação UV, diminuindo sua eficiência. 85 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS A desinfecção realizada por meio do uso da radiação tem a vantagem de não introduzir material estranho na água, não alterando significativamente as suas características físico‑químicas. Esse sistema não produz ou retira gosto e odor, o tempo de contato é muito curto, da ordem de poucos segundos, e não gera problemas com overdose. Além disso, a radiação é menos eficiente na inativação de esporos, cistos e vírus. Para boa eficiência, devemos passar a água por um pré‑tratamento para eliminação de partículas suspensas. A radiação ultravioleta não deixa residual, obrigando a utilização de outro desinfetante. O gasto de energia e manutenções frequentes são as principais desvantagens desse método de desinfecção. A ozonização é um processo de desinfecção de água. O ozônio é um gás tóxico, com odor peculiar, produzido por descarga elétrica de alta voltagem em um meio contendo ar atmosférico ou oxigênio puro. O ozônio não reage com amônia e não forma cloramina. Baixas concentrações auxiliam a coagulação, têm boa eficiência na remoção de complexos orgânicos do manganês, do ferro e do fenol e não forma compostos com os trihalometanos. Tem ótima eficiência na inativação de vírus. Não deixa residual. O consumo de energia na sua produção e a produção no local de aplicação são as principais desvantagens. Nos últimos anos foram adicionadas à água substâncias químicas cuja finalidade é assegurar o desempenho fisiológico adequado do corpo humano. O flúor é um desses elementos; ele adicionado à água potável com o intuito de prevenir as cáries dentárias. A ação benéfica do flúor ocorre na época de formação dos dentes e possui eficiência a longo prazo. Sua ação ocorre devido ao aumento da insolubilidade da parte mineralizada do dente, que o torna mais resistente à ação bacteriana. Assim, ocorre uma concentração maior de fluoretos na cavidade oral, inibindo a ação de processos enzimáticos que dissolvem o material calcificante do dente. O flúor atua como inibidor do crescimento de lactobacillus acidophillus. Os compostos mais usados são: fluoreto de sódio, fluossilicato de sódio, ácido fluossilícico e fluoreto de cálcio. Redução da dureza da água: esse procedimento é necessário para fontes subterrâneas ou superficiais que possam ser usadas como fontes de água potável. A dureza da água é gerada pela presença de minerais como cálcio, magnésio e ferro dissolvidos no solo e nas rochas. A dureza não causa prejuízos à saúde humana, mas reduz a eficácia do sabão, resultando em acúmulo de sujeira e formação de crostas. A reação dos íons de minerais com sabões provoca o acúmulo de sujeira e reduz a quantidade de espuma. Os sabões são constituídos de moléculas de cadeias longas com duas extremidades diferentes. Uma delas tem afinidade por água e é chamada de hidrófila, enquanto a outra extremidade é chamada de hidrofóbica e tem afinidade por óleos e gorduras. Quando esta última reage com os íons de dureza, o sabão sofre uma aglomeração, formando uma película de espuma. Além de deixar resíduo de sujeira, essa crosta pode causar irritações na pele, alterando o pH e deixando o cabelo opaco. A crosta é formada quando o carbonato de cálcio precipita da água aquecida e reduz a eficiência da transferência de calor, recobrindo aquecedores, caldeiras ou qualquer outro recipiente onde a água está sendo aquecida, e pode entupir tubulações. A dureza pode provocar sabor desagradável. A dureza total (DT) é determinada pela soma dos cátions na água, os mais comuns são o cálcio (Ca2+) e o magnésio (Mg2+). Assim, a DT é a soma aproximada desses dois componentes,mas também podem estar presentes elementos como ferro (Fe2+, Fe3+), manganês (Mn2+), estrôncio (Sr2+) e alumínio (Al3+). 86 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Saiba mais Se você quiser saber como fazer a determinação quantitativa de ânions de relevância ambiental, como fosfatos, nitratos e fluoretos em águas após o tratamento, leia: BAIRD, C.; CANN, M. Química ambiental. 4. ed. Porto Alegre: Bookmann, 2011. p. 679‑682. 4 SISTEMAS DE TRATAMENTO DE RESÍDUOS O gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos (RSU) consiste no conjunto de ações normativas, financeiras, operacionais e de planejamento que uma administração municipal deve desenvolver baseando‑se em critérios ambientais, sanitários e econômicos para coletar, tratar e dispor o lixo do seu município. Chamamos de manejo o conjunto de atividades que envolve os resíduos sólidos do ponto de vista operacional, como coleta, transporte, acondicionamento, tratamento e disposição final. O gerenciamento envolve o manejo e os aspectos relacionados ao planejamento, regulamentação e fiscalização. O quadro a seguir mostra um resumo do processo de transformação usado no manejo dos resíduos domiciliares. Os principais tratamentos estão apresentados e discutidos a seguir. O aterro sanitário é considerado uma forma de disposição final e não de tratamentos, por isso não se encontra no quadro. Quando utilizamos uma forma de tratamento, não quer dizer que as demais foram excluídas. Dessa forma, o resíduo doméstico pode ser enviado para triagem. Em seguida, a parte orgânica segue para o incinerador ou compostagem, enquanto os recicláveis serão triturados e compactados para serem vendidos. Como podemos observar no quadro, os tipos de tratamento de resíduos são muito limitados, sendo papel do município escolher o melhor conjunto de operações de manejo, pois não existe um sistema clássico de gerenciamento de resíduos sólidos urbanos. Quadro 5 – Técnicas de manejo de resíduos sólidos urbanos Processo de transformação Método de transformação Principal conversão em produtos Físicos Separação de componentes Manual ou mecânica Componentes individuais encontrados nos resíduos domiciliares Redução de volume Métodos de compactação e embasamento Redução de volume do material original Redução de tamanho Métodos de diminuição (moinhos e britadores) Redução de tamanho dos componentes originais Térmicos Combustão Oxidação térmica COx, SOx, NOx, outros, cinzas, produtos de oxidação e escórias Esterilização Micro‑ondas, desativação eletrotérmica, autoclave Eliminação de organismos patogênicos Pirólise Destilação destrutiva PHAs, óleos, alcatrão, gases combustíveis 87 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS Biológicos Compostagem aeróbia Conversão biológica aeróbia Composto humificado Digestão aeróbia Conversão biológica aeróbia CH4, Cox, húmus Fonte: Philippi Jr.; Romero e Bruna (2014, p. 222). Entendemos como disposição final o processo de disposição em aterros sanitários. Assim, as outras formas de tratamento, incluindo incineração, não são denominadas de disposição final, visto que nesses processos existe uma fração que não pode ser tratada, ou existem subprodutos que não podem ser tratados de outra forma que não seja aterro. O coprocessamento em fornos de cimento, usado para resíduos industriais, pode ser considerado um processo de incineração. Os processos de coleta seletiva também podem ser considerados como disposição final, dependendo do gerenciamento. A escolha do tipo de tratamento a ser adotado precisa respeitar os seguintes aspectos: custos de operação e implantação, disponibilidade financeira dos envolvidos, capacidade de atender às exigências legais e quantidade e capacitação técnica dos recursos. O fato de uma alternativa apresentar um custo alto em termos absolutos, como um incinerador, não é razão suficiente para ser descartada, pois pode ser a mais barata e eficaz para tratar um determinado resíduo industrial ou serviço de saúde quando comparada com as outras. As tecnologias com foco na estabilização dos resíduos podem ser classificadas em processos físico‑químicos e biológicos. Entre os processos biológicos estão a compostagem, vermicompostagem e digestão anaeróbia. Já os processos físico‑químicos são: pirólise, hidrólise térmica, incineração, secagem/desidratação e queima em fornos para produção de cimento (CALIJURI; CUNHA, 2013). 4.1 Compostagem O processo de compostagem é classificado como reciclagem da parte orgânica do resíduo sólido urbano. Nos aterros, o processo de decomposição é anaeróbio devido à escassez de ar dentro das células. No processo de compostagem ocorre uma digestão aeróbia do resíduo orgânico. No entanto, não podemos considerar que o composto produzido é adubo, visto que não possui a quantidade de nutrientes exigida pelas especificações agrícolas. Assim, o composto orgânico é usado como um condicionador de solo. Esse material estabilizado é chamado de húmus. Quando falamos das vantagens desse processo, podemos citar a valorização da parte orgânica de resíduos sólidos e aumento da vida útil do aterro sanitário. Como desvantagens podemos citar que ele é mais caro que o aterro sanitário por tonelada de resíduo e que existem muitas dificuldades para comercialização do composto. As vantagens do uso de composto na agricultura: retenção de umidade do solo em períodos secos, preservação do solo contra erosão, aumento da permeabilidade, melhoria das propriedades biológicas, que favorecem o estabelecimento de besouros e minhocas provenientes do revolvimento da terra, fornecimento de nutrientes como N, P e K e fornecimento de micronutrientes como Zn, Mn, Fe e Ca. As desvantagens são restrições de uso pelo aumento do pH do 88 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II solo. Não é recomendado para o cultivo de plantas acidófilas, contaminações com resíduos e presença de metais pesados. As usinas de compostagem também realizam a triagem ou a reciclagem de materiais inorgânicos, já que é necessária a separação prévia dos materiais inorgânicos. Assim, usinas de compostagem e reciclagem realizam as seguintes etapas: pátios de recebimento e estocagem, catação manual em esteira ou separação automatizada, trituração, compostagem e peneiramento. Os materiais inorgânicos são separados por classes e vendidos. A trituração tem por objetivo a maior homogeneidade do material, o que facilita a formação das leiras. Mesmo que várias unidades contenham sistemas de trituração, eles são pouco utilizados, visto que é praticamente impossível separar todo o material inorgânico na esteira, e o material orgânico fica contaminado. Essa contaminação é parcialmente eliminada no peneiramento depois da compostagem, mas se o material for triturado antes da compostagem, a eficiência do peneiramento diminui. A matéria inorgânica que fica retida na peneira não possui qualidade para ser reciclada e é destinada ao aterro. O processo de compostagem é composto por duas etapas: etapa ativa de degradação e fase de maturação e humificação da matéria orgânica. O processo de digestão aeróbia, desenvolvido por uma população de microrganismos aeróbios e anaeróbios, como bactérias, protozoários, fungos, entre outros, causa aumento de temperatura da massa, que deve ser mantida entre 45 e 65 ºC. Essa faixa de temperatura é tida como ideal, pois acima dela os agentes de fermentação não sobrevivem e abaixo dela os ovos de insetos e larvas encontram condições para sobreviver. No fim da primeira etapa, a decomposição ainda não foi completada, e esse estágio é chamadode bioestabilização. A segunda etapa é a fase de maturação do composto. O processo termina quando o composto chega ao estágio de umidificação, em que apresenta as melhores condições como condicionador de solo. O tempo de compostagem depende da maneira como ela é realizada. A compostagem natural leva de 2 a 3 meses para a primeira etapa e mais 3 a 4 meses para a segunda etapa, enquanto a compostagem por métodos mais acelerados demanda até a bioestabilização de 25 a 35 dias e mais 30 a 60 dias para a umidificação. Temos que estar atentos aos seguintes parâmetros: • carbono é utilizado pelos microrganismos como principal fonte de energia e constituinte das estruturas celulares. Parte da perda de massa e da geração de calor, características do processo de compostagem, ocorre devido à oxidação do carbono a dióxido de carbono. • nitrogênio é o principal constituinte do protoplasma dos microrganismos participantes da compostagem. As células dos microrganismos possuem cerca de 50% de carbono e 5% de nitrogênio em relação ao peso do material seco. Assim, o crescimento dos microrganismos só ocorre na presença de nitrogênio. • temperatura máxima deve ser entre 55 e 60 ºC para evitar a morte dos organismos patogênicos úteis ao processo. Para controlar a temperatura de processo, fazemos o revolvimento periódico das leiras de compostagem. 89 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS • aeração é importante para o controle de temperatura, aceleração da atividade microbiana e diminuição da emanação de odores. A taxa de aeração torna‑se excessiva quando ultrapassa a taxa de geração de calor na massa de compostagem, causando o esfriamento. • umidade é o meio de transporte dos alimentos solúveis e dos detritos da reação. Para o metabolismo dos microrganismos, a umidade deverá estar na faixa de 40 a 60%, sendo este último valor aceitável para a fermentação em condições de aeração forçada e com o material em agitação. O primeiro valor, 40%, é apenas para leiras. Valores de umidade inferiores a 40% causam inibição na atividade dos microrganismos do processo de compostagem, enquanto o excesso de umidade, superior a 70%, pode provocar condições de anaerobiose em razão da obstrução dos vazios pela água, restringindo a difusão de oxigênio. As tecnologias de compostagem podem ser divididas em três grupos: o processo convencional, o processo das leiras estáticas aeradas e os reatores aeróbios. No processo convencional, os resíduos são dispostos em montes de forma cônica ou de forma prismática com seção triangular. Essas pilhas de resíduos devem ser periodicamente revolvidas e umedecidas, o que é conseguido com equipamentos usuais de movimento de terra ou com equipamentos projetados para tal, conhecidos como compostadores. No processo das leiras aeradas, não há revolvimento: a aeração é conseguida insuflando‑se ar pela base da leira. Isso acelera o processo, mas exige um maior controle das condições da massa de resíduos. Existem sistemas patenteados, nos quais é feita a adição de culturas microbianas para acelerar a decomposição. A compostagem também pode ser realizada em reatores, conhecidos como usinas de compostagem. Esse processo acontece em quatro etapas: na primeira, ocorre a decomposição da matéria orgânica pelas bactérias e fungos gerando calor, que faz com que a temperatura da leira suba para a faixa do processo 55 a 60 ºC dentro de 12 a 24 horas. Deixando o processo ao natural, a temperatura vai continuar subindo, podendo passar de 70 ºC. Assim, é necessário introduzir um fator externo de controle, que pode ser revolvimento da leira, adição de umidade ou aeração mecânica, que permitem manter a temperatura numa faixa adequada. A decomposição leva de 60 a 90 dias pelo método convencional ou 30 dias pelo método das leiras estáticas aeradas. A manutenção de temperaturas elevadas (fase 2) por um tempo longo garante a eliminação dos patógenos. Terminada a fase mais ativa, a temperatura da leira começa a reduzir, retornando à temperatura ambiente dentro de 3 a 5 dias (fase 3). Finalmente, ocorre a fase de maturação do composto, com a formação dos ácidos húmicos, que leva de 30 a 60 dias (fase 4). Vermicompostagem é um processo complementar à compostagem que tem por objetivo otimizar as características do composto, aumentando a disponibilização de macro e micronutrientes e produzindo material estável. Os agentes do processo são minhocas, que dependem de certas condições de sobrevivência. O composto não pode estar encharcado, pois afogaria as minhocas, mas também não pode estar ressecado. A umidade ideal está entre 60 e 80%. As leiras não podem ser muito profundas devido à necessidade de ar, devendo ter cerca de 30 cm de altura. Profundidades maiores são viáveis mediante o uso de aeração forçada. As minhocas preferem temperaturas entre 12 e 25 ºC, de modo que o composto sobre o qual elas irão agir já deve estar estabilizado. 90 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Digestão anaeróbia é um processo de tratamento biológico da fração orgânica dos resíduos sólidos urbanos que acontecem na ausência de oxigênio. Ela ganhou popularidade na Europa porque permite um aproveitamento mais eficaz do metano produzido quando comparado à exploração do biogás em aterros. O resíduo estabilizado pode ser mandado para aterros ou ser utilizado na agricultura. Os sistemas de digestão anaeróbia podem ser divididos em sistemas de fluxo contínuo e sistemas em batelada. Os de fluxo contínuo podem tratar quantidades muito maiores de resíduos, mas são de implantação de maior custo que os sistemas em batelada, que precisam de áreas muito grandes. Os reatores anaeróbios também podem ser divididos em sistemas a seco e a úmido, também conhecidos como sistemas com alta e baixa concentração de sólidos. Os sistemas com alta concentração de sólidos trabalham com os resíduos na sua umidade natural, enquanto os de baixa concentração precisam de adição de água; o meio da reação tem aparência de uma sopa. Os reatores anaeróbios podem ser divididos em sistemas de uma e duas fases. No sistema de uma fase todas as etapas da digestão anaeróbia acontecem no mesmo reator. Os mais tradicionais sistemas europeus de tratamento anaeróbio são sistemas de uma fase, a seco e de fluxo contínuo. Nos sistemas de duas fases se procura otimizar a acidogênese em um dos reatores e a metanogênese em outro. São ideais para substratos facilmente degradáveis, em que a acidogênese é muito rápida e poderia vir a inibir a metanogênese, causando a falha do reator. Os reatores anaeróbios disponíveis no mercado não atingem a estabilização completa do material orgânico. Logo, é necessário que os resíduos que saem do reator sejam estabilizados de forma aeróbia, por compostagem. Esses reatores trabalham com cargas orgânicas muito mais altas que os sistemas de compostagem. Suas vantagens residem tanto na possibilidade de aproveitamento do biogás quanto de área para instalação do sistema. 4.2 Incineração A incineração é usada como técnica de eliminação de resíduos, e é uma prática de cerca de 100 anos de idade. Os incineradores sempre foram associados a instalações que emitem forte odor e uma fumaça preta característica. Mesmo atualmente não são vistos com bons olhos e têm sido uma prática em extinção na Suécia, Bélgica, Canadá e Holanda. Mesmo assim, na Alemanha, ainda é uma técnica em expansão. Inicialmente, a incineração tinha como único objetivo a redução do volume dos resíduos para aumentar a capacidade dos aterros industriais. A incineração também elimina os resíduos tóxicos e perigosos através da sua combustão, gerando como subprodutos escórias, gases e cinzas. No incinerador ocorremreações de oxidação e de decomposição de resíduos. Os produtos orgânicos possuem ligações com átomos de carbono e hidrogênio; no incinerador acontece a oxidação desses compostos, de acordo com a reação genérica: CxHy + (x+ 0,25Y)O2 xCO2 + 0,5yH2O 91 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS A reação de combustão dos produtos orgânicos libera calor, que é transferido para os gases e para o material sólido, e pode ser aproveitado na saída do forno usando trocadores de calor. Esse é o princípio para a reciclagem energética de resíduos. Independentemente do aproveitamento do potencial térmico das reações de oxidação da matéria orgânica, acredita‑se que toda matéria orgânica sólida pode ser convertida em gases dependendo das condições de incineração, reduzindo significativamente o volume. Os compostos inorgânicos podem sofrer decomposição térmica perdendo massa, como podemos observar nas equações a seguir: 2NaOH Na2O + H2O CaCO3 CaO + CO2 Ocorre a formação de óxidos gasosos, e os metais presentes se oxidam de forma total ou parcial, formando óxidos que geram a escória que fica no reator. Alguns compostos têm alta pressão de vapor na temperatura de trabalho, sendo eliminados na forma de vapor como compostos halogenados e alguns óxidos metálicos. Esses vapores se condensam no sistema de tratamento de gases, formando, junto aos produtos de combustão incompleta, as cinzas volantes. Os incineradores são reatores com câmaras de alta temperatura e atmosfera oxidante. Para que a oxidação ou decomposição completa dos resíduos ocorra, deve‑se controlar de forma criteriosa as condições de combustão. Os fatores que devem ser controlados são: • quantidade de oxigênio disponível na câmara de combustão, que deve garantir a existência de oxigênio suficiente para a oxidação total dos resíduos. • turbulência: devemos garantir a constante mistura entre os resíduos e a atmosfera do forno. A maior turbulência favorece as reações de combustão e decomposição térmica e diminui o tempo de residência dentro da câmara aquecida, garantindo assim o melhor rendimento do forno. • temperatura de combustão: é necessário manter o sistema em uma temperatura tal que se possa garantir a total degradação dos compostos orgânicos. O tempo de residência diminui com o aumento da temperatura. Não é suficiente trabalhar com a temperatura elevada, é preciso que haja homogeneidade de temperatura no reator para se garantir o tempo de residência na faixa de temperaturas. • tempo de residência dos compostos na temperatura de combustão: os resíduos precisam permanecer na região de alta temperatura por tempo suficiente para sua total combustão e decomposição. Devido a isso, devemos observar a cinética de oxidação dos compostos. A permanência dos compostos a altas temperaturas em tempos insuficientes provoca a formação de resíduos perigosos de combustão incompleta que poluem o ar. 92 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II A figura a seguir mostra um esquema das condições para oxidação e decomposição completa dos resíduos durante a incineração. Todos os quatro fatores necessitam de controle contínuo, pois a falta deste pode acarretar a eliminação incompleta dos resíduos, gerando produtos perigosos de combustão incompleta. Para que todas essas condições sejam atingidas para os vários tipos e formas físicas dos resíduos, foram desenvolvidos incineradores de várias configurações. São quatro os tipos mais comuns de incineradores: fornos rotativos, de injeção líquida, leito fixo e leito fluidizado. Temperatura Tempo de permanência Destruição completa Elevados níveis de oxigênio Turbulência Figura 21 – Condições necessárias para a incineração completa de resíduos Existe a necessidade do controle dos subprodutos do processo, além dos próprios controles intrínsecos. Acreditamos que a parte mais crítica de um incinerador está no controle das emissões, seja de material particulado ou de gases. Assim, o sistema de controle de poluição é tão importante quanto o reator em si. Os gases saem do incinerador com altas temperaturas (800 a 1000 ºC), e é necessário um resfriamento antes do tratamento contra a poluição atmosférica. Para isso, utilizamos trocadores de calor, que além de resfriarem os gases, aproveitam o calor transformando‑o em energia ou vapor, que é usado para cobrir as despesas da incineração. O material particulado formado é controlado por equipamentos como filtros de manga, lavadores Venturi e precipitadores eletrostáticos. Devido à presença de nitrogênio, cloretos e enxofre na carga, existe sempre a possibilidade de formação de gases ácidos na saída. Assim, a forma considerada mais eficiente é o resfriamento dos gases com lavadores de água contendo cal, seguido por filtros de manga. Esse processo permite a condensação dos metais e diminui a formação de dioxinas e furanos. Incineradores do tipo fornos rotativos Esse tipo de incinerador é versátil e é o mais popular entre os incineradores de resíduos sólidos urbanos. Podemos observar o esquema de funcionamento do equipamento na figura a seguir. Ele consiste em um cilindro de aço revestido de material refratário e isolante montado sobre um sistema de rolamentos que impõe uma rotação de 0,5 até 2 rotações por minuto, com inclinação de 1 a 2º. A carga é transportada pelo rolamento ao longo do comprimento do forno. 93 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS 1 2 3 3 4 5 7 10 8 49 9 6 1.Alimentação de resíduo sólido, 2. Alimentação de tonéis, 3. Sistema de injeção de ar primário, 4. Queimador de resíduos líquidos, 5. Lanças para injeção de resíduos líquidos e pastosos, 6. Câmara de combustão, 7. Motor para rotação do forno, 8. Câmara de pós‑combustão, 9. Injeção de resíduos aquoso, 10. Descarregamento das cinzas. Figura 22 – Esquema do incinerador tipo forno rotativo com câmara de pós‑combustão e locais de alimentação do forno Nesse tipo de incinerador podemos tratar resíduos líquidos, pastosos e sólidos com poder calorífico superior a 2.300 kj/kg. O equipamento opera em temperaturas de 815 a 1605 ºC. Em conjunto com a carga é introduzido óxido de cálcio para a neutralização de eventuais vapores ácidos gerados durante a queima. Os resíduos sólidos podem ser introduzidos na zona quente, ao lado da fonte de energia. Então, a carga é submetida a uma velocidade de aquecimento elevada desde o início e segue em paralelo aos gases resultantes da combustão do queimador. Outra maneira de introdução de resíduos é na zona fria, com a carga caminhando em direção à zona quente. Nesses casos, os resíduos caminham em um fluxo contrário aos gases gerados na combustão do queimador, sofrendo um ciclo térmico de aquecimento que depende do perfil térmico do forno. Essa configuração é chamada de carregamento contracorrente. Na figura a seguir podemos observar um esquema de carregamento e transporte concorrente e contracorrente da carga sólida em um incinerador tipo forno rotativo. A configuração concorrente é indicada para resíduos que apresentam poder calorífico entrando como fonte energética no forno. O carregamento em contracorrente é indicado para resíduos que não apresentam poder calorífico e elevada umidade, pois com o aquecimento gradual o resíduo é seco, garantindo o controle de temperatura da zona quente. O carregamento contracorrente apresenta as melhores condições de turbulência, mas apresenta também uma maior dificuldade de controle de emissão de particulados. O tempo de residência do resíduo no forno é diretamenteproporcional ao comprimento do forno e à rotação. A geometria do forno impõe todas as características de processo ao equipamento. Todavia, o forno rotativo é caracterizado pela relação comprimento/diâmetro (C/D) do cilindro, e essa relação está entre 2 e 10. A relação C/D e a velocidade de rotação do forno são elementos fundamentais para determinar o tipo de resíduo que pode ser processado. Valores elevados da relação C/D resultam em 94 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II baixas velocidades de rotação. Fornos com essa característica podem ser utilizados para destruição de resíduos que exijam altos tempos de residência para combustão completa. No forno rotativo, a turbulência da carga é garantida pela rotação do forno. Com o movimento de rotação, a carga apresenta uma constante agitação pelo rolamento ao longo do percurso no forno. O volume que a carga ocupa é de cerca de 20% do volume total do forno. a) b) a) carregamento concorrente: o fluxo de gases (tracejado) apresenta o mesmo sentido do transporte de resíduos (preto contínuo); b) carregamento contracorrente: o fluxo de gases apresenta sentido oposto ao transporte dos resíduos. Figura 23 – Esquema de transporte da carga e dos gases dentro do incinerador Em muitos casos, o perfil térmico dos fornos rotativos não garante um tempo de residência eficiente para completar a oxidação dos compostos gasosos. Quando isso acontece, os incineradores são acrescidos de câmaras para pré‑combustão logo na saída de gases e sólidos, como pudemos observar na figura 23. Assim, garantimos que os componentes gasosos sejam completamente destruídos pelo aumento do tempo de residência dos compostos gasosos a temperaturas elevadas. Fornos com essa configuração permitem a incineração de quase todos os tipos de resíduos existentes. Os resíduos sólidos ou pastosos são introduzidos diretamente no forno como carga sólida. Para essa situação, são utilizados queimadores específicos para resíduos que apresentam poder calorífico. Para os resíduos que apresentem reações endotérmicas ou líquidos sem poder calorífico, são colocados queimadores de combustível auxiliar para evitar a diminuição da temperatura do forno. Portanto, é comum a eliminação de resíduos clorados como PVC e compostos utilizados em guerra química em incineradores de fornos rotativos. Incinerador de injeção líquida Esse tipo de incinerador é utilizado para combustão de resíduos líquidos, como o nome sugere. É muito aplicado para resíduos industriais e possui formato cilíndrico colocado na vertical ou horizontal. 95 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS A eficiência elevada de combustão do resíduo ocorre por nebulização intensa. Utilizamos queimadores projetados para produzir gotículas com 1 mm de diâmetro médio, enquanto os queimadores convencionais produzem gotículas de 10 a 50 mm. Na figura a seguir podemos observar o esquema da câmara de combustão do incinerador de combustão líquida. Figura 24 – Incinerador de combustão líquida Incinerador de leito fixo Como podemos observar na figura a seguir, nesse tipo de incineração, a câmara é dividida em duas partes. Na primeira, injetamos somente de 50 a 80% da quantidade estequiométrica de ar, causando uma atmosfera redutora parcial que vai favorecer a volatilização ou pirólise do resíduo. Os produtos de pirólise, como metano, etano, entre outros hidrocarbonetos e monóxido de carbono, juntamente com outros produtos de combustão, passam para a câmara secundária, na qual injetamos o ar restante para que a combustão seja completa. Devido ao seu custo menor e por causar emissões de material particulado, este dispositivo é mais competitivo, para pequenos volumes diários, que os fornos rotativos. Câmara secundária Câmara primária Figura 25 – Incinerador de câmeras múltiplas tipo retorta 96 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Incinerador de leito fluidizado Podemos observar o esquema de um incinerador de leito fluidizado na figura a seguir. O gás, quando injetado, atravessa uma placa de orifícios e fica pulverizado. Esse jato entra em contato com os resíduos sólidos e os deixa em suspensão. Nessa suspensão aquecida ocorrem as reações. O leito fluidizado apresenta vantagens: o tempo de residência é maior, e o material se comporta como um líquido, do ponto de vista de troca de calor, sendo a homogeneidade de temperatura superior quando comparada com os demais tipos de incinerador. Figura 26 – Incinerador de leito fluidizado Esse equipamento é muito utilizado para incinerar resíduos contaminados com materiais orgânicos perigosos, como anilina, clorofórmio, tetracloreto de carbono, cresol, clorobenzeno, metilmetacrilato, naftaleno, fenóis, tolueno, entre outros. Como existe maior turbulência e maior homogeneidade de temperaturas no leito, esses incineradores podem trabalhar com temperaturas menores quando comparados aos fornos rotativos, que possuem a mesma eficiência. 4.3 Aproveitamento energético A recuperação da energia resultante dos resíduos sólidos não é um tipo de tratamento, mas uma maneira de aproveitamento dos subprodutos gerados na incineração e em processos biológicos, como biodigestores ou aterros sanitários. Na figura a seguir podemos observar o esquema de uma usina de incineração para obtenção de energia. A energia pode ser proveniente do processo da queima do biogás formado em biodigestores, aterros, incineração ou gaseificação. Outra possibilidade é a utilização de celulignina catalítica como combustível. Esse material é formado a partir da matéria orgânica dos resíduos e pode ser utilizada como combustível sólido para produção de energia elétrica, uma vez que tem o poder calorífico de 97 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS aproximadamente 4.500 kcal/kg. O processo de obtenção da celulignina catalítica foi desenvolvido no Brasil e ocorre por um processo de pré‑hidrólise de biomassa composta por celulose e lignina globalizada. Gases limpos Sistema de tratamento dos efluentes líquidos e gasosos Entrega e armazenagem dos resíduos Geração de energia Queima dos resíduos Figura 27 – Usina de incineração com obtenção de energia A gaseificação consiste em um processo de conversão térmica para obtenção. O poder calorífico do material combustível existente no resíduo é aproveitado para a geração de energia térmica. Tendo em vista a geração de energia, o resíduo utilizado no processo de incineração deve possuir materiais com maior poder calorífico, como os papeis e plásticos. Nos biodigestores e aterros, o aproveitamento ocorre pela captação de biogás formado durante a decomposição anaeróbica de matéria orgânica. Os gases provenientes desses dois processos são semelhantes. Geralmente, trata‑se de uma mistura gasosa composta por 45 a 50% de metano e 50 a 55% de CO2 com traços de H2S e NH3. Na digestão anaeróbia em biodigestores, as reações são semelhantes às que ocorrem nos aterros, mas o processo é acelerado e controlado. Mesmo sendo usada em grande escala há mais de 30 anos, os projetos para recuperação e o aproveitamento do biogás gerado em aterros experimentaram crescimento após a introdução do conceito do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e a promulgação da Lei nº 11.145, de 5 de janeiro de 2007, que estabeleceu diretrizes nacionais para o manejo de resíduos sólidos. Ligada ao MDL, encontra‑se a possibilidade de obtenção de Reduções Certificadas de Emissões (RCEs),os chamados créditos de carbono, o que acabou criando um mercado de comercialização de emissões de gases. Dessa maneira, o aproveitamento energético a partir de resíduos tornou‑se atrativo economicamente, pois além da renda resultante de RCEs, teremos também a receita obtida a partir da negociação da energia gerada ou o seu aproveitamento para uso na mesma unidade. Os Ministérios das Cidades e do Meio Ambiente, em ação conjunta, estabeleceram um projeto de mecanismo de desenvolvimento limpo aplicado à redução de emissões de gases gerados nas áreas de disposição de resíduos sólidos, com o objetivo de incentivar os municípios a usarem o MDL como ferramenta nos sistemas de gestão de resíduos sólidos. 98 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II A maioria dos aterros com recuperação de biogás está localizada nos EUA. Entre os países em desenvolvimento que possuem esses aterros, destacam‑se Índia, China, México, Coreia do Sul e Brasil. A produção de metano não é imediata nos aterros. Geralmente, essa produção acontece dois anos após o início das atividades e aumenta gradualmente durante a utilização do aterro. Muitos fatores podem modificar a geração de metano, entre eles: as características do resíduo disposto, como quantidade de material orgânico e presença de material tóxico para sobrevivência de microrganismos; e as características do aterro, como temperatura, umidade, grau de compactação, volume de resíduo e presença de oxigênio. A produção nominal de energia a partir da incineração é cerca de cinco vezes maior do que se comparada com o aproveitamento do biogás resultante de aterros, e quase dois vezes maior que a energia alcançada pela digestão anaeróbia. Apesar de a produção de energia ser três vezes maior que o método de digestão anaeróbia quando comparada com a captação e recuperação de biogás proveniente de aterros, a eficiência do segundo método é 10% maior, como podemos observar na tabela a seguir. Tabela 3 – Produção nominal de energia elétrica Método de tratamento kWh/t RSU Eficiência Incineração 587 ‑ Digestão anaeróbia 300 30 Aproveitamento biogás em aterros 102 40 Fonte: Philippi Jr., Romero e Bruna (2014, p. 248). Tanto na incineração como no processamento biológico, é necessário conhecer a composição do resíduo sólido urbano a ser usado, uma vez que as características do resíduo interferem no aproveitamento energético. Assim, uma das ressalvas em relação à obtenção de energia a partir de resíduos sólidos é a obtenção de informações quanto à sua natureza. Na figura a seguir, podemos observar um esquema das possíveis rotas energéticas a partir dos resíduos sólido urbanos. 99 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS Resíduos sólidos Coleta seletiva Lixo Seleção Gaseificação Celulignina Aquecimento Aquecimento Material combustível Queima direta Geração de vapor Distribuição do gás Geração de eletricidade Geração de eletricidade Material não combustível Aterro Fermentação Reciclável Não reciclável Formação do gás do lixo (GDL) Rendimento 90% Rendimento 30% Figura 28 – Rotas energéticas de resíduos sólidos urbanos O reaproveitamento energético pode ser direto ou indireto. No primeiro, os resíduos são usados diretamente como fonte de energia, podendo passar antes por alguns processos simples, como moagem ou fragmentação. No segundo, os resíduos são convertidos por via química ou biológica em outros materiais, que são empregados como fonte de energia. Os resíduos com poder calorífico suficiente podem ser utilizados como combustível. Para isso, devem ser separados dos demais, formando uma mistura chamada de RDF (do inglês, refuse derived fuel). Isso é muito comum na agroindústria canavieira, na qual a palha da cana‑de‑açúcar é utilizada para gerar eletricidade nas usinas. Os resíduos são triturados e secos antes da utilização, caracterizando um aproveitamento direto. O bagaço e a palha de cana‑de‑açúcar também podem ser utilizados para produzir álcool, o chamado etanol de segunda geração. É uma tecnologia que ainda está sendo desenvolvida. Esse exemplo caracteriza aproveitamento indireto. A Política Nacional de Resíduos Sólidos aceita a recuperação energética, desde que comprovada sua viabilidade técnica e ambiental e que seja implementado um programa de monitoramento de emissão de gases tóxicos aprovado pelo órgão ambiental competente. 4.4 Reciclagem A reciclagem é o reaproveitamento de resíduos em algum processo produtivo. As técnicas para o processamento de resíduos com vistas à reciclagem são normalmente específicas para cada material. Costumam envolver algum grau de fragmentação do resíduo para facilitar o seu transporte, armazenamento e processamento. Entidades empresariais promovem os chamados bancos de resíduos ou bolsas de resíduos. As empresas apresentam os resíduos que geram com detalhes de quantidade e qualidade. A reciclagem faz sentido somente do ponto de visto econômico se o custo do produto reciclado for menor que o custo do produto feito de um novo material ou se o custo da reciclagem for menor que o custo do tratamento para disposição final. Satisfeitas essas condições, a reciclagem vai acontecer se for obrigatória por lei. 100 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II 4.5 Tecnologias específicas para tratamento de RSS As tecnologias de tratamento de resíduos sólidos de saúde visam à eliminação da sua patogenicidade, permitindo sua disposição em aterros sanitários. A incineração é uma delas, mas pode ser aplicada também a outros tipos de resíduos. Vamos estudar as formas de tratamento dos RSS mais utilizadas. Valas sépticas: são equivalentes aos aterros em vala, porém se destinam exclusivamente aos RSS patogênicos. Essas valas devem ser muito bem impermeabilizadas nas laterais e no fundo. Deve haver um bom sistema de drenagem de águas superficiais. Os resíduos lançados nas valas são misturados com cal para fazer a desinfecção, mas esse tratamento não é eficaz. Não é possível fazer a compactação dos resíduos, sob pena de contaminar os equipamentos e o solo ao redor. Por fim, as valas são recobertas com argila para fazer uma cobertura impermeável. É uma técnica de disposição final. Autoclave: esteriliza o resíduo, expondo‑o a vapor de água saturado, aquecido e sob pressão durante um tempo determinado. Após autoclavado, o resíduo deve ser triturado para garantir a descaracterização. As relações tempo versus temperatura podem ser de 30 minutos a 121 ºC ou 4 minutos a 135 ºC. É preciso garantir que o vapor atinja toda a superfície do material. É a técnica para o tratamento de RSS com maior capacidade instalada no Brasil. Micro‑ondas: o princípio do tratamento é a exposição do resíduo a temperaturas elevadas durante um tempo determinado. Os resíduos são triturados, aquecidos com vapor a 130 ºC e então mantidos a temperatura de 95 a 100 ºC por 30 minutos, graças à aplicação de micro‑ondas. Como resultado, notamos a eliminação dos patógenos e redução de 20% do volume inicial. Os resíduos desse processo podem ser destinados a aterros sanitários. Essa técnica é a terceira com a maior capacidade instalada para tratamento de RSS no Brasil. Tem como vantagem a não emissão de gases tóxicos nem efluentes líquidos. Tyndalização ou esterificação fracionada: consiste em submeter os resíduos a aquecimento por vapor a 100 ºC por poucos minutos, repetindo a operação de três a quatro vezes com intervalo de 24 horas, com o intuito de fazer com que os microrganismos que se protegeram na forma de esporos no primeiroaquecimento voltem à forma vegetativa e sejam destruídos nos ciclos de aquecimento seguintes. Encapsulamento: existem sistemas disponíveis no mercado em que os resíduos sólidos de saúde, em particular os perfurocortantes, são armazenados em cilindros plásticos colocados dentro de um cilindro metálico que aquece o material a 270 ºC, por 70 minutos, sob pressão de 2kgf/cm2 a 6 kgf/cm2. O cilindro plástico derrete e se funde ao material contaminado, formando um bloco compacto e inerte que, segundo o fabricante, pode ser destinado ao aterro sanitário. 4.6 Agrotóxicos e pesticidas Os agrotóxicos e pesticidas são produtos químicos que podem controlar pragas de origem vegetal ou animal e doenças de plantas. Também são conhecidos como defensivos químicos ou agrícolas, praguicidas, veneno e remédio de planta (RIBAS; MATSUMURA, 2009). 101 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS Os pesticidas são aplicados nos ambientes hídricos, industriais e urbanos e em florestas nativas ou plantadas, podendo ser usados em larga escala em pastagens para pecuária e agricultura. Podem ser classificados como: fungicidas, para o controle de fungos; inseticidas, para o controle de insetos; herbicidas, para o controle de plantas invasoras; fumigantes, para o controle de bactérias do solo; desfolhantes, para o controle de folhas indesejadas; raticidas, para o controle de roedores; acaricidas, para o controle de ácaros; e nematicidas, para o controle de nematoides. De acordo com a legislação vigente, cabe ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento avaliar a eficácia agronômica, ao Ministério da Saúde realizar a classificação toxicológica e ao Ministério do Meio Ambiente classificar e avaliar o grau de periculosidade ambiental. A avaliação e a classificação da periculosidade ambiental são baseadas nas propriedades físico‑químicas em estudos toxicológicos e ecotoxicológicos. Assim, o pesticida pode ser classificado quanto a sua periculosidade em classes, como podemos observar na tabela a seguir. Tabela 4 – Classificação dos agrotóxicos de acordo com o efeito na saúde humana Classe toxicológica Toxicidade DL 50 Faixa colorida I Extremamente tóxico < 5 mg/kg Vermelha II Altamente tóxico Entre 5 e 50 mg/kg Amarela III Mediamente tóxico Entre 50 e 500 mg/kg Azul IV Pouco tóxico Entre 500 e 5000 mg/kg Verde ‑ Muito pouco tóxico Acima de 5000 mg/kg ‑ Fonte: Ribas e Matsumura (2009, p. 150). A classificação dos pesticidas ocorre em função dos efeitos provocados à saúde devido à exposição humana a esses compostos, podendo gerar diferentes classes toxicológicas, como: Classe I – produtos muito perigosos; Classe II – produtos perigosos ao meio ambiente; Classe III – produtos pouco perigosos; Classe IV – produtos pouco perigosos ao meio ambiente. Essa classificação foi estabelecida através dos testes realizados em laboratório, que têm o objetivo de determinar a dose letal (DL) do pesticida em 50% dos animais, numa certa concentração. Com a Revolução Verde, nos anos 1950, ocorreram mudanças profundas na produção agrícola. Novas tecnologias de produção surgiram empregando produtos químicos em excesso. Os compostos disponibilizados aos agricultores aumentaram a produtividade mediante o controle de pragas, doenças e proteção contra insetos. No Brasil, o processo de automação da agricultura teve início entre os anos 1960‑1970 com o uso de agentes químicos e implemento de maquinário no processo produtivo. A criação do Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) vinculou a concessão de empréstimos à condição de se utilizar pesticidas, o que era considerado como modernização do processo produtivo na época. No entanto, nada foi explicado aos trabalhadores sobre o uso e as consequências do abuso dessas novas tecnologias, expondo as comunidades rurais a grandes riscos. 102 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II O destino dos pesticidas no ambiente é determinado pelas propriedades físico‑químicas do agrotóxico, assim como sua quantidade e frequência de utilização, condições meteorológicas e características abióticas e bióticas do ambiente. Essas condições dependem do produto químico e de fatores relacionados à sua aplicação. Assim, não podemos prever um modelo de comportamento, nem sua interação com o ambiente. Entretanto, existem processos conhecidos e descritos para alguns produtos, como transformação, retenção e transporte, que podem prever como o agrotóxico vai se comportar na interação com as partículas de solo e com os outros componentes de acordo com sua solubilidade em água, velocidade de evaporação e bioacumulação. Propriedades dos pesticidas Modo de entrada Eficácia Avaliação risco/benefício Efeitos no meio ambiente Fatores climáticos Fatores microbiológicos e da planta Propriedades do solo e da água Entrada Processos Saída Impactos Transformação abiótica/biótica Transporte para a atmosfera água subterrânea água superficial RetençãoAmbiente: solo Destino Figura 29 – Modelo conceitual de fatores que governam o destino dos agrotóxicos no solo e como esse destino afeta a sua eficiência No quadro a seguir, podemos observar a relação entre os processos de degradação e transferência que controlam a dinâmica e o destino dos agrotóxicos no ambiente. Quadro 6 – Dinâmica e destino de pesticidas no ambiente Processo Consequência Fatores Transferência (processo que realoca a molécula sem alterar a estrutura) Deriva física Movimento pela ação do vento Velocidade do vento, tamanho das gotas Volatilização Perda por evaporação do solo, da planta ou do ecossistema aquático Pressão de vapor, velocidade do vento, temperatura Adsorção Remoção pela interação com plantas, solo e sedimento Conteúdo mineral e matéria orgânica, tipo de mineral, umidade Absorção Absorção pelas raízes ou ingestão animal Transporte pela membrana celular, tempo de contato, suscetibilidade Lixiviação Translocação lateral e vertical através do solo Conteúdo de água, macroporos, textura do solo, quantidade do mineral e conteúdo de matéria orgânica Erosão Movimento pela ação da água ou vento Chuva, velocidade do vento, tamanho das partículas do mineral e da matéria orgânica com moléculas adsorvidas 103 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS Degradação (processo que altera a estrutura química) Fotoquímica Quebra da molécula devido a absorção de luz solar Estrutura química, intensidade e duração da luz solar, exposição Microbiana Degradação microbiana Fatores ambientais (pH, umidade, temperatura), condições de nutriente, conteúdo de matéria orgânica Química Alteração por processos químicos como hidrólise e reações de oxirredução Alto ou baixo pH e fatores ambientais Metabolismo Transformação química após absorção pelas plantas e animais Capacidade de ser absorvido, ser metabolizado e interagir com organismos Fonte: Ribas e Matsumura (2009, p. 152). A persistência dos agrotóxicos no solo depende da eficiência dos processos físicos de transformação. Alguns fungicidas inorgânicos que contêm cobre podem persistir no ambiente por mais de 20 anos. Porém, vários fungicidas orgânicos possuem tempo de meia‑vida curtos, apesar de seus produtos de decomposição persistirem no solo por tempo muito longo. Podemos citar como exemplo o tiofanato metílico, que é transformado em carbendazim no solo, podendo persistir por vários meses, enquanto os hidrocarbonetos aromáticos, como o pentacloronitrobenzeno, persistem por alguns anos. Os pesticidas são produzidos apartir de substâncias químicas diferentes. Eles foram desenvolvidos para exterminar, matar, impedir ou combater o desenvolvimento de certos organismos que podem ser considerados prejudiciais às culturas implantadas no processo agrícola do mundo. Esses produtos atuam sobre os processos vitais que têm ação na constituição física e na saúde do ser humano. Os pesticidas podem ter dois tipos de efeitos sobre a saúde humana: • efeitos agudos: aqueles gerados pela exposição às concentrações elevadas de um ou mais agentes tóxicos capazes de causar dano no período de um dia; • efeitos crônicos: aqueles gerados pela exposição contínua a concentrações baixas de um ou mais produtos. No quadro a seguir podemos observar um resumo dos principais efeitos crônicos e agudos causados pela exposição a pesticidas disponíveis de acordo com a praga que controlam e com o grupo químico a que pertencem. 104 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Quadro 7 – Efeitos da exposição a pesticidas Classificação Grupo químico Intoxicação aguda Intoxicação crônica Inseticidas Organofosforados e carbamatos Fraqueza, cólica abdominal, vômito, espasmos musculares, convulsão Efeitos neurológicos retardados, alterações cromossômicas, dermatites de contato Oranoclorados Náusea, vômito, contrações musculares involuntárias Arritmias cardíacas, lesões renais, neuropatias periféricas Piretroides sintéticos Irritação das conjuntivas, espirros, excitação, convulsão Alergias, asma brônquica, irritação das mucosas, hipersensibilidade Fungicidas Ditiocarbamatos Tonteira, vômito, tremores musculares, dor de cabeça Alergias respiratórias, dermatites, doença de Parkinson, cânceres Fentalamidas ‑ Teratogênese Dinitrofenóis e pentaclorofenol Dificuldade respiratória, hipertermia, convulsão Cânceres, cloroacnes Herbicidas Fenoxiacéticos Perda de apetite, enjoo, vômito, fasciculação muscular Indução da produção de enzimas hepáticas, cânceres, teratogênese Dipiridilos Sangramento nasal, fraqueza, desmaio, conjuntivites Lesões hepáticas, dermatites de contato, fibrose pulmonar Fonte: Ribas e Matsumura (2009, p. 153). A humanidade é a mais afetada, pois a contaminação do solo e da água, assim como o impacto direto na biodiversidade, interferem diretamente na qualidade de vida. Alguns resíduos que se tornam teratogênicos podem ser encontrados nos alimentos e na água potável. Os agrotóxicos podem causar doenças e levar a óbito. A segunda causa de intoxicação no Brasil são os pesticidas, seguidos dos medicamentos. Contudo, a principal causa dos intoxicados que foram a óbito é o contato com pesticidas. Os aplicadores e produtores estão expostos diretamente à contaminação por agrotóxicos. Muitos aplicadores de agrotóxicos apresentam os sintomas esperados para o grupo de risco, mas poucos realizam exames periódicos de saúde. É muito comum a exposição acidental a esses produtos químicos e acreditamos que o número de casos é bem maior que o relatado, visto que muitos acidentes não são notificados. Observação Agrotóxicos são produtos químicos. Quando contaminam a água e o solo, são considerados resíduos de Classe I, perigosos e que podem causar danos à saúde. 105 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS O aumento da quantidade de pesticidas aplicados tem trazido uma série de transtornos e modificações para o ambiente, tanto pela contaminação das comunidades quanto pelo seu acúmulo no ecossistema, isto é, água, solo, ar e biota. Uma desvantagem é que os pesticidas podem contaminar espécies que não interferem no processo de produção. Na tabela a seguir, podemos observar o grau de toxidade e persistência, variando de 1 a 5, nos principais grupos de animais sujeitos a contaminação por pesticidas, com exceção dos humanos. Tabela 5 – Persistência e toxicidade de alguns pesticidas Agrotóxicos Toxicidade Persistência no ambienteMamíferos Peixes Aves Insetos Pemetriana 2 4 2 5 2 DDT 3 4 2 2 5 Lindano 3 3 2 4 4 Etil‑paration 5 2 5 5 2 Malation 2 2 1 4 1 Carbaril 2 1 1 4 1 Metoprene 1 1 1 2 2 Bacillus thuringensis 1 1 1 1 1 Fonte: Ribas e Matsumura (2009, p. 154). O principal integrador dos processos biogeoquímicos é a água. As regiões superficiais ou subterrâneas são os principais destinos dos agrotóxicos empregados na agricultura. Em 1979, foram observados os primeiros traços de pesticidas na água nos Estados Unidos, e a contaminação dos corpos d’água com agrotóxico é uma grande preocupação. Em países como Alemanha, Grã‑Bretanha, Grécia, Espanha, Bulgária, Estados Unidos e Brasil foram encontrados resíduos de agrotóxicos em baixas concentrações em águas subterrâneas. Especialmente no Brasil, os resíduos de pesticidas contaminam os recursos hídricos de forma moderada, mas existem exceções, com áreas altamente poluídas. A preocupação com a contaminação do solo se refere à interferência desses produtos químicos em processos biológicos responsáveis pela oferta de nutrientes. Podemos levar em consideração as alterações sofridas na decomposição do material orgânico através da inativação e morte de microrganismos e invertebrados que vivem no solo. O ciclo dos nutrientes pode ser prejudicado quando o ativo persistente no solo interfere no crescimento de bactérias fixadoras de nitrogênio que disponibilizam minerais às plantas. Um parâmetro usado para observar a atividade do solo é a respiração. Assim, podemos observar a atividade de microrganismos e, ainda, utilizar a respiração como ferramenta para verificar os efeitos dos pesticidas sobre as diferentes populações. 106 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II Saiba mais Leia sobre o ciclo biogeoquímico do nitrogênio em: BOTKIN, D. B.; KELLER; E. A. Ciência ambiental: Terra, um planeta vivo. 7. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2011. p. 95. A população ainda não foi conscientizada sobre a necessidade de diminuição do uso desses produtos como forma de garantia de sustentabilidade na agricultura. A fiscalização de todo o ciclo de vida dos agrotóxicos, partindo das matérias‑primas até o descarte, poderia diminuir os impactos ambientais se conduzida de forma correta, reduzindo também a contaminação do homem. Devemos levar em consideração para um futuro com menos impactos ambientais a utilização de formas de produção mais limpas, como alimentos orgânicos, manejo integrado e uso de agentes de controle biológico para redução de danos no campo. É muito importante educar o produtor rural, mostrando a gravidade do uso sem controle de pesticidas, a existência de outras maneiras de controle mais limpas e eficientes, bem como diferentes maneiras de agregar valor ao produto. O registro dos agrotóxicos é realizado pelo Ministério da Agricultura e pelo Ministério da Saúde e do Meio Ambiente e faz parte do processo de controle sobre essas substâncias, com o objetivo de exportação e importação, produção, armazenamento, transporte, comercialização e utilização (PERES; MOREIRA; DUBOIS, 2003). Essa etapa é obrigatória em muitos países, buscando aumentar os benefícios para o usuário e diminuir os riscos para a saúde ambiental e humana. Assim, os órgãos do governo envolvidos no processo de registro têm a tarefa de avaliar as características agronômicas, ecotoxocológicas e toxicológicas de cada produto, e também determinar as restrições e recomendações de uso necessárias para uma maior segurança na utilização dos pesticidas. A sociedade espera que a aprovação do registro do pesticida signifique o reconhecimento e a garantia de queo produto, quando usado seguindo as recomendações do fabricante, esteja dentro dos limites aceitos como seguros para o ambiente e para a saúde da humanidade. A avaliação dos efeitos colaterais, agudos ou crônicos, à saúde ou ao ambiente deve ser muito importante para a concessão ou não do registro. Mesmo que os resultados da eficiência agronômica sejam facilmente comprovados pelo usuário, os danos ao ambiente e à saúde não são. No Brasil, a legislação prevê a proibição de registro de pesticidas quando: • não houver métodos para desativação dos componentes no país; • não existir antídoto ou tratamento eficaz no Brasil; 107 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS • revelarem características teratogênicas, carcinogênicas e mutagênicas; • forem produtos que provoquem distúrbios hormonais e danos ao aparelho reprodutor; • revelarem‑se mais perigosos para o homem do que os testes de laboratório com animais; • as características causarem danos ao meio ambiente. A avaliação do conteúdo da forma de apresentação e dizeres do rótulo e da bula é um aspecto importante do registro, pois serve para comunicar sua aplicabilidade ao usuário, além das advertências e recomendações sobre os problemas mais graves e importantes que foram identificados durante o desenvolvimento do produto. No rótulo e na bula devem estar presentes todas as advertências pertinentes quanto aos efeitos sobre o ambiente ou à saúde humana. Podemos considerar o seguinte exemplo: quando o resultado do teste de toxicidade aguda para abelhas demonstra que o produto é de Classe I, isto é, altamente perigoso, o seu rótulo deve trazer advertência como a que segue: “Este produto é altamente tóxico, podendo afetar outros insetos benéficos. Não aplique o produto no período de maior visitação das abelhas” (PERES; MOREIRA; DUBOIS, 2003, p. 29). Os produtos podem ser comercializados somente por meio de receituário agronômico prescrito por profissionais habilitados, segundo a legislação brasileira. A verificação dos teores de impurezas tóxicas e da composição qualitativa e quantitativa dos produtos é outra atividade importante do controle de pesticidas desenvolvida pelo Ibama. A verificação dos teores de impurezas tóxicas é realizada por meio da avaliação das análises de impurezas, das informações sobre produção prestadas pelas empresas que solicitam o registro e de ações de fiscalização. Os efeitos agudos são os mais visíveis e aparecem durante o contato da pessoa com o produto. Para os pesticidas, podemos observar convulsões, náuseas, espasmos musculares, vômitos, desmaios e dificuldades respiratórias. No caso de exposição crônica, podem surgir após semanas, meses, anos ou em outras gerações, depois do período de uso, tornando a identificação mais difícil. Geralmente são confundidos com outros distúrbios ou não atrelados ao produto que causou o sintoma. Os inseticidas classificados como organofosfatos e os carbamatos agem no organismo inibindo a enzima colinesterase, que é responsável pela degradação da acetilcolina, um neurotransmissor que atua na transmissão de impulsos nervosos tanto no sistema nervoso central como no periférico. Quando inibida, a enzima não age mais sobre a acetilcolina, gerando um distúrbio chamado de crise colinérgica, que gera os principais sintomas observados nos indivíduos intoxicados por inseticidas. Muitos problemas do sistema nervoso são associados à intoxicação por pesticidas organofosforados, ressaltando aqueles ligados à neurotoxicidade desses compostos, observados através dos retardados efeitos neurológicos. Os inseticidas organoclorados possuem como uma de suas principais características a capacidade de acúmulo dentro das células lipídicas no organismo de animais e humanos, o que pode causar vários efeitos negativos à saúde. Não podemos deixar de ressaltar que os organoclorados são muito persistentes no ambiente e no organismo, podendo durar até 30 anos. Os inseticidas organoclorados podem se açular também ao longo da cadeia alimentar, aderindo à gordura de peixes, aves, bovinos, 108 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II entre outros, no leite materno, e em plantas, frutas e água que tenham sido expostas a pesticidas, causando sérios problemas ecológicos e à saúde pública. O acúmulo de pesticidas organoclorados na cadeia alimentar gera um fenômeno conhecido como biomagnificação, que ocorre com o aumento das concentrações de certa substância de acordo com a elevação do nível que um ser vivo ocupa na cadeia alimentar (nível trófico). Por exemplo, observou‑se que a concentração de DDD, um metabólito do DDT, se elevava à medida que aumentava o nível trófico dos organismos estudados. Logo, a concentração de plâncton na água passava de 0,02 ppm para 5,3 ppm. Os inseticidas organoclorados têm utilização restrita e até podem ser proibidos, como no caso do DDT, devido aos seus efeitos tóxicos. Pesticidas de muitos tipos podem ser relacionados com efeitos reprodutivos em animais ou reduzem a fertilidade em humanos. O Mancozeb e o amitrol inibem a função da tireoide e os herbicidas triazínicos podem estar associados ao surgimento de cânceres hormônio‑dependentes. A elevada incidência de câncer nos trabalhadores rurais na década de 1980 levantou o interesse para estudos mais detalhados sobre a relação entre os agrotóxicos, o organismo humano e o aparecimento de tumores, entre outras doenças de base celular. Herbicidas, fungicidas e inseticidas foram submetidos a muitos experimentos em animais usando a técnica dose‑resposta e foram comparados com estudos das populações expostas aos efeitos desses produtos. Foram observadas evidências de que os herbicidas fenóxiacéticos poderiam causar câncer em humanos devido à presença de impurezas, como as dioxinas, na sua composição. Isso foi confirmado com a alta incidência de câncer entre os veteranos da Guerra do Vietnã. Os soldados foram expostos ao conhecido agente laranja, utilizado como desfolhante para abrir clareiras nas selvas fechadas durante a guerra. Outra classe que também pode ser considerada como potencial agente carcinogênico são os ditiocarbamatos, principalmente no surgimento de tumores no aparelho respiratório. Nematicidas dibromocloropropano podem causar infertilidade em homens expostos a esses compostos, assim como a herbicidas fenoxiacéticos. Lembrete A poluição pode ser química, biológica e térmica. Geralmente, a poluição química e biológica afeta muito a saúde humana, enquanto a poluição térmica pode exterminar todo um ecossistema aquático em poucos minutos. Existem muitos estudos sobre a criação de animais domésticos e de comunidades afetados pela ingestão de alimentos e plantas contaminadas por pesticidas, além de impacto em ecossistemas próximos às áreas de plantações e pastos, onde os produtos são usados. Assim, além do impacto sobre certa população de plantas e animais, a dispersão de pesticidas no ambiente pode gerar um desequilíbrio ecológico na interação natural das espécies. A deterioração das águas subterrâneas e superficiais contaminadas por pesticidas são um impacto ambiental muito importante, que está associado à produção industrial: 109 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS Para um sistema agrícola ser sustentável, efeitos ambientais adversos da produção agrícola devem ser minimizados, enquanto a competitividade e o lucro devem ser mantidos ou evidenciados. A degradação da qualidade de águas subterrâneas e superficiais tem sido identificada como a principal preocupação no que diz respeito ao impacto da agricultura noambiente. Esta degradação pode ocorrer como resultado do lançamento de produtos químicos agrícolas, ou organismos biológicos, nas águas superficiais e suas movimentações em direção às águas subterrâneas (ZEBARTH, 1999 apud PERES; MOREIRA; DUBOIS, 2003, p. 38). Se uma área que usa quantidades excessivas de pesticidas de vários tipos estiver localizada próxima a um manancial de abastecimento público, a qualidade da água consumida ali está em risco de contaminação, mesmo estando bem distante da região agrícola. Assim, não apenas a população que mora próxima à plantação estaria exposta aos agrotóxicos, mas também a população mais distante que é abastecida pela água contaminada. Devemos considerar que a contaminação de algumas coleções d’água diz respeito à modificação da biota com a seleção das espécies mais resistentes e à contaminação de moluscos, peixes e crustáceos. O acúmulo desses produtos em animais que habitam as águas contaminadas pode ameaçar a saúde humana pela biomagnificação. A contaminação de moluscos, crustáceos e peixes pode ser ampliada a todos os consumidores desses alimentos. Os pesticidas podem trazer uma série de problemas para as superfícies onde se depositam, como solos desnudos e coberturas vegetais. Certas superfícies podem ser marcadas, fragilizadas ou absorverem elementos minerais contaminados por esses produtos. Um problema muito sério quanto ao uso de agrotóxicos é o reuso, o descarte ou o destino inadequado das embalagens vazias que também provocam a contaminação ambiental e podem promover efeitos adversos à saúde de animais silvestres, domésticos e da humanidade. Os usuários de agrotóxicos são obrigados a devolver as embalagens aos estabelecimentos comerciais e as empresas produtoras são responsáveis pela destinação adequada às embalagens vazias, como previsto na Lei nº 9.974 (BRASIL, 2000b). Porém, a maior parte das embalagens não está sendo devolvida. Os efeitos dos agrotóxicos podem ser sentidos no ambiente de várias maneiras. Os mais marcantes estão relacionados à saúde, sendo responsáveis por cerca de 20.000 mortes não intencionais por ano. Intoxicações também podem provocar abortos, câncer, má formação de fetos, dermatites, entre outras doenças. Esse tipo de contaminação também afeta a biodiversidade. Efeitos sobre a estrutura e fertilidade do solo não foram comprovados, mas existem efeitos indiretos que podem ser relacionados à utilização de agrotóxicos. O movimento dos agrotóxicos para as águas subterrâneas e superficiais podem contaminar a água potável. Alimentos também podem ser contaminados com resíduos de agrotóxicos, tornando a humanidade o alvo mais sensível. Para que a utilização dessas substâncias seja feita de forma mais consciente, o Brasil vem trabalhando com ações que englobam o desenvolvimento do Programa Nacional 110 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II de Racionalização do Uso de Agrotóxicos, no qual são estabelecidos protocolos de ação para minimizar os impactos ambientais. Outras ações como o manejo integrado e a regulamentação e comercialização de produtos biológicos também são consideradas soluções para o problema. Resumo Medidas de prevenção e correção da poluição do ar devem ser tomadas com o objetivo de atingir o desenvolvimento sustentável. A busca de soluções para o problema deve começar com a prevenção. Para a prevenção e controle da poluição do ar, utilizam‑se medidas que envolvem desde o planejamento do assentamento de núcleos urbanos e industriais e do sistema viário até a ação direta sobre a fonte de emissão. A prevenção está relacionada com a tríade reduzir, reutilizar e reciclar. Podemos levar em consideração que o processo de poluição do ar ocorre em duas fases: a fase de geração, emissão, transporte, difusão e transformação e a fase de recepção. Para cada fonte de poluição deve ser estudada a melhor solução, tanto do ponto de vista do custo como do ponto de vista ambiental. A tecnologia de controle de poluição do ar disponível permite que a poluição seja reduzida, muitas vezes, em mais de 99%. Quando pensamos em purificação da água, a primeira coisa que nos vem à cabeça é como deixá‑la potável; para isso é necessário eliminar as quantidades de várias substâncias, atendendo à Portaria nº 2.914 (BRASIL, 2011c). Em seguida, pensamos em tratar a água com a menor produção de lodo possível, pois o tratamento desse material é realizado por poucas empresas. Com o objetivo de resolver o problema da qualidade da água, muitos métodos de tratamento foram desenvolvidos e aperfeiçoados. O tratamento da água bruta depende de sua qualidade, isto é, de suas características, que por sua vez dependem do manancial de onde a água for retirada. As impurezas mais comuns são: materiais flutuantes, materiais em suspensão, como as algas, protozoários, bactérias, matérias dissolvidas e materiais coloidais, como sílica, material orgânico, entre outros. Para tornar a água potável, aplicamos o tratamento que está baseado na retirada da turbidez e da coloração. Esse processo elimina outras substâncias, como manganês, ferro e matéria orgânica, utilizando apenas alguns produtos químicos específicos. O sistema de tratamento completo é constituído por alguns processos unitários, como coagulação, floculação, sedimentação, filtração, desinfecção e fluoretação. 111 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 MEIO AMBIENTE E GESTÃO DE RESÍDUOS O gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos (RSU) consiste no conjunto de ações normativas, financeiras, operacionais e de planejamento que uma administração municipal deve desenvolver, baseando‑se em critérios ambientais, sanitários e econômicos para coletar, tratar e dispor o lixo do seu município. A escolha do tipo de tratamento a ser adotado precisa respeitar os seguintes aspectos: custos de operação e implantação, disponibilidade financeira dos envolvidos, capacidade de atender às exigências legais, quantidade e capacitação técnica dos recursos. O fato de uma alternativa apresentar um custo alto em termos absolutos, como um incinerador, não é razão suficiente para ser descartada, pois pode ser a mais barata e eficaz para tratar um determinado resíduo industrial ou serviço de saúde quando comparada com as outras. As tecnologias com foco na estabilização dos resíduos podem ser classificadas em processos físico‑químicos e biológicos. Entre os processos biológicos estão a compostagem, vermicompostagem e digestão anaeróbia. Os processos físico‑químicos são: pirólise, hidrólise térmica, incineração, secagem/desidratação e queima em fornos para produção de cimento. Os agrotóxicos e pesticidas são produtos químicos que podem controlar pragas de origem vegetal ou animal e doenças de plantas. Também são conhecidos como defensivos químicos ou agrícolas, praguicidas, veneno e remédio de planta. Os pesticidas são aplicados nos ambientes hídricos, industriais e urbanos e em florestas nativas ou plantadas, podendo ser usados em larga escala em pastagens para pecuária e na agricultura. Podem ser classificados como: fungicidas, para o controle de fungos; inseticidas, para o controle de insetos; herbicidas, para o controle de plantas invasoras; fumigantes, para o controle de bactérias do solo; desfolhantes, para o controle de folhas indesejadas; raticidas, para o controle de roedores; acaricidas, para o controle de ácaros; e nematicidas, para o controle de nematoides. Exercícios Questão 1. (Vunesp 2012, adaptada) Em uma sociedade de consumo como a nossa, é cada vez maior a produção de materiais que são descartados diariamente, trazendo uma série de problemas que interferem diretamente na qualidade de vida. O Decreto Estadual nº38.356/98, que regulamenta a Lei Estadual de Resíduos Sólidos nº 9.921/93 (In: Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, 2003), estabelece um modelo de gestão que combina várias técnicas para o manejo dos diferentes componentes do fluxo de resíduos, e baseia‑se em alguns princípios que visam à diminuição do desperdício, do volume de resíduos, proporcionam economia de recursos naturais e de energia, assim como reduzem a poluição do solo, da água e do ar. 112 Re vi sã o: C ar la - D ia gr am aç ão : M ár ci o - 25 /0 5/ 20 16 Unidade II É possível sintetizar esses princípios na seguinte ordem: A) Não geração ou redução/minimização; reutilização/reaproveitamento; reciclagem; tratamento adequado e correta disposição final. B) Não geração ou redução/minimização; compostagem; reciclagem; reutilização/reaproveitamento. C) Geração ou aumento/maximização; reutilização/reaproveitamento; reciclagem; correta disposição final. D) Não geração ou redução/minimização; reutilização/reaproveitamento; incineração; correta disposição final. E) Geração; reciclagem; compostagem; tratamento adequado e correta disposição final. Resposta correta: alternativa A. Análise da questão Conforme o Art. 1º: “a gestão dos resíduos sólidos é responsabilidade de toda a sociedade e deverá ter como meta prioritária a sua não geração, devendo o sistema de gerenciamento destes resíduos buscar sua minimização, reutilização, reciclagem, tratamento ou destinação adequada (BRASIL, 1993). Questão 2. (Cesgranrio, 2011) O processo de tratamento de água que se caracteriza pelo uso de areia e de outros materiais de granulometria fina, como a diatomita, é denominado: A) Desinfecção. B) Filtração. C) Aeração. D) Coagulação. E) Remoção da dureza. Resolução desta questão na plataforma.