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DeRiVaNtEs DeLiRaNtEs DeRiVaNtEs DeLiRaNtEs Antologia Título Original: Derivantes Delirantes Organização: Matheus Peleteiro Capa: Maria Mariô Edição: Matheus Peleteiro Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser apropriada ou reproduzida em sistema de banco de dados ou processo similar, em qualquer forma ou meio, seja eletrônico, gravação etc., sem a permissão dos detentores do copyright. APRESENTAÇÃO Certo dia contei a uma amiga que eu escrevia poesias. Sempre gostei de escrever, afinal, é escrevendo que me encontro. Ela me pediu para que compartilhasse com ela algum dos meus escritos, e assim o fiz. Ela gostou bastante e disse que eu precisava conhecer uma amiga dela, pois assim poderíamos escrever juntas. Foi como eu conheci a Ana Flavia. Eu e Ana comentamos uma com a outra sobre a nossa sede de escrever e discutimos a possibilidade de criar uma página para compartilhar nossos escritos. Certo dia, estava lavando a louça (não há momento exato para que aconteça, rs), e tive um insight sobre um potencial nome para a nossa futura pagina. Foi quando pensei em “Derivantes Delirantes”, pois era exatamente o que éramos (somos). Derivantes das experiências que tivemos, derivantes das nossas amizades, dos nossos ancestrais, dos nossos ídolos. Delirantes porque somos devaneios, cheios de maluquices que são transformadas em normalidades - ou que superam as normalidades - quando lemos e nos vemos em nossos autores preferidos. Ana concordou com o nome, a comunidade cresceu, adicionamos mais membros ao nosso grupo, e agregamos mais delirantes sonhadores, derivantes de tudo e de muitos. Foi assim que a nossa página evoluiu. Adicionar mais amigos com pontos de vista parecidos foi o principal “booster” para que a Derivantes Delirantes pudesse ter um maior alcance. Além da Ana e Eu, faz parte hoje desse talentosíssimo grupo: Aryana Frances, Diego Sanches, Eric Moreira, Iago Souza, Matheus Peleteiro, Pedro Poker, Pedro Venturini, Rennan Sama, Roge Weslen, Saulo Matos e Vitor Oliva (que serão devidamente apresentados no final do livro). Nesta antologia, convidamos também os poetas Aleff Ribeiro, João Farias e Joe Arthuso. A Derivante e Delirantes é constituída por um pouco de cada um de nós, que escreve para aliviar a alma. Por cada um de nós que escreve para deixar um legado, para não enlouquecer, ou para, talvez, ser lembrado num futuro qualquer. Escrever é a arte da alma, e ficamos imensamente felizes em dividir um pedacinho de nós com cada um de vocês. Agora, tornando palpável e lançando o nosso primeiro livro impresso, esperamos, sinceramente, que apreciem os nossos escritos e, mais que tudo, que nossos escritos os inspirem a escrever, para que, assim como nós, possam deixar uma nova faísca, por mais ínfima que seja, acesa na literatura brasileira. Estefani Camile Bem vindo ao caos eu sei que você me vê em todo o canto, no quarto nas ruas nos olhos daquela ruiva de bem com a vida na política no trânsito nos cabelos daquela manhã de segunda mal dormida e eu te vejo e além disso me vejo em você que não é apenas mais um zumbi de relógio mas está perdido sabendo exatamente onde está e eu amo isso. sei que você me vê e me acha sublime à minha maneira, pois entendes a necessidade deste pandemônio como ninguém, essa desordem quase etérea que clama por ti e dança para ti diariamente. todos esses sons horrendos misturados em uma única onda de balbúrdia, aromas doces e aromas assassinos, cenas belas e ridículas se fundindo em um único arco ordinário, não finja que não gostas da cidade e dos seus dejetos messiânicos! bem vindo ao caos companheiro. não resista, essa é a minha humilde existência, jogue tudo pelo chão ou em qualquer outro lugar, sente-se ai mesmo sob os cacos da cidade e vamos assistir tudo da camarote, pois eu preciso de você, você precisa de mim e eles precisam de nós. Saulo Matos Cotidiano poético Boletos, riso amarelo, pensamento qualquer e, no calor intenso, a fila não anda. Pago boletos para ter o mínimo, rio amarelo por excesso de café, minha falta de fé já aceitou mais um dia infernal e os poemas seguem nesse vão de pensamento qualquer. Aryana Frances Mais um poema Um poema para levar no bolso direito da calça junto à bala de menta e dinheiro da passagem do ônibus Um poema roto pra ser lido para os infinitos mendigos postos à sarjeta Um poema escrito em folha de caderno com letra feia e caneta vermelha Um poema que faça a professora de português me olhar com asco e as palavras talhadas no papel como escrituras na carne (feitas à faca) Um poema que faça teus olhos castanhos brilharem e o céu se abrir Um poema que te diga que vá e tente que nada é certo (exceto os erros) o resto é incerto como as rimas nulas que aqui deixo. Um poema que funcione como um soco na cara ou uma chuva no verão Um poema desses, que eu sempre escrevo, e logo deixo de canto, mofando à imensidão. Um poema desses, de amor, falando do teu púbis e dos teus sinais e sardas na face e da marca de infância nas tuas coxas. Um poema feio. Um poema que faça teu peito sangrar e tua alma rugir o eco indefinido de todos os amantes (desde que o mundo é mundo). Roge Weslen eu queria escrever sobre coisas bonitas, mas o demônio que se debate dentro de mim emite gemidos mais doídos que os meus. eu queria escrever sobre coisas bonitas, mas búfalos trespassam sobre minha têmpora me provocando vertigens incuráveis. eu queria escrever sobre coisas bonitas, mas um tinhoso anônimo rasga meu peito, amiúde, fazendo-me inalar cigarros e exalar álcool vagabundo pela manhã. eu queria escrever sobre coisas bonitas, mas estou prestes a matar alguém. e, desta vez, meu alvo é certo. eu queria escrever sobre coisas bonitas, mas lembro de ocorrências do passado, e fico estático num canto, e choro quieto. eu queria escrever sobre coisas bonitas, mas tenho muito ódio correndo em mim, causando-me tremores intermináveis e uma vontade incessante de derramar sangue - aquele sangue. eu queria escrever sobre coisas bonitas, mas minha quimera de bom homem nada mais é que devaneio, onde meu inibidor de conduta continua por um fio. eu queria escrever sobre coisas bonitas, mas continuo instável demais, insano demais, propenso a cada vez mais violência. eu queria escrever sobre coisas bonitas, mas a beleza excessiva dos livros românticos roubou-me a capacidade de me comover por eles, e eu fico dentre o pó e o limo, aguardando pelo sussurro do diabo me dizendo que é chegada a minha hora de agir. Vitor Oliva O céu rugindo acompanha a ginga do reflexo das nuvens na água. O morro tão distante forma a complexidade artística de um quadro gigante. Eu escrevo poemas percorrendo os metros quadrados num quintal abaixo dos galhos e das frutas. A chuva regando o mundo é a renovação do terreno baldio da minha alma. Minha solidão é pura meditação e amizade para com a natureza das coisas. Meu coração finalmente floresce. Rennan Sama Próprias fronteiras com a mochila nas costas leva nos ombros o peso da casa. sente nas asas um futuro que aposta na brisa dos sonhos. há lobos na rodovia, mas há também o brilho da lua e das estrelas, que caem da escuridão além do horizonte da cidade logo a frente; onde as ruas, monstros de energia, consomem e carregam os vagabundos pelos becos e bares, aos tropeços. mesmo um viajante solitário na estrada com seus manuscritos e os poucos trocados no bolso, sabe que sua felicidade consiste na esperança de umamanhecer mais claro; pois o ideal é ultrapassar as próprias fronteiras. Ana Flavi Sarti Semideuses A criação foi feita. Para alguns, um sopro uma dádiva, a graça! Para outros uma explosão, uma estrela, um cometa, BUM! Junto disso veio o Eu, o ego, o semideus. O poder a essa raça foi dado O semideus foi pro Universo um achado. Havia o próprio semideus pensado! Junto do poder, um perigo exagerado, de novo era o ego, coitado! O ego fez o semideus sentir-se culpado seja culpa simplista ou culpa do Eu comparado. Semideus se perguntava Por que eu, meu Deus? Sou um pobre, quebrado! Do Éden me havia expulsado. Por que tu fizestes da minha vida um estrago? O semideus, já sentindo-se desgraçado não sabia onde havia errado Julgava-se, questionava-se, mas não olhava pro lado. Dizia ter na vida pecado, mas não sabia que o errado, era o que havia acertado. Que o mundo vivia o sistema inflamado, cansado de tanto sofrimento infundado de tanta dúvida, não se sentindo encaixado O semideus decidiu fazer jus ao seu legado O arbítrio dado era o espelho do mundo arruinado. O fim havia chegado, o semideus colheu tudo que havia plantado sem rumo, em um adeus o semideus se despediu dessa loucura que ele mesmo criou uma decisão, um suspiro, um segundo, um tiro. Em um instante, esse mundo, para o semideus, desmoronou. Tinha ele pensado que o sofrimento havia acabado mas o disparo por ele dado abriu uma porta, mais um difícil recomeço uma outra vida, de um outro lado. Estefani Camile Eu Deixei De acreditar Nas Minhas crenças religiosas por falta de Esperança Ou Excesso De Ignorância Não Sei Dizer Ao certo Hoje Caminho Incerto Ateu de Deus Joe Arthuso Fatalidades te amei o tempo de uma canção de Serge Gainsbourg vivi rápido demais por tempo demais as drogas aumentaram o déficit de qualquer coisa dentro de mim um câncer me aguarda na próxima carteira de cigarro morrerei antes dos 60 nunca serei um grande escritor a poesia é inútil os poetas são inúteis mas inutilidades importam cerveja quente é uma porcaria nunca confiar em quem não toma vodka pura beijar prostituas que fazem ponto na segunda Alameda xingar Deus e foder os anjos apertar a mão do diabo e traí-lo em seguida escrever um romance e depois jogá-lo fora amar uma mulher casada odiar quase todos beber cerveja gelada todo dia no bar do Mané roubar um banco transar entre beijos e socos gozo e suor umidade aí, então, num dia ensolarado deixar-se ser atropelado por um carro. Roge Weslen Poema ardente Minhas emoções nunca se apossaram de mim e ainda que a serenidade beije a minha boca e transe comigo toda madrugada, o mundo insiste em pertencer aos que tem a sorte de nascer com os olhos fechados. É triste notar a literatura reduzida a opiniões políticas; a música reduzida ao underground; e a arte sangrando, como sempre sangrou, enquanto aqueles que costumavam beber seu sangue em taças postas na mesa durante a ceia, cospem imbecilidades nas redes sociais apontando para tudo que se opõe ao usual. O soco na face que costumava ser proferido aos leitores agora não passa de um afago sutil àqueles que se acostumaram a chamar deputados de celebridades ou ídolos. Assisto o poeta triste vendendo livros na delegacia, o funcionário desolado, sendo despedido mais uma vez, e as mulheres metendo seus dedos nas faces daqueles que já temem trata-las como objetos. A cidade é quente, e a poesia arde enquanto as feridas dos poetas cicatrizam em versos soluçantes. Matheus Peleteiro Ironias Eu era uma criança e tinha o mundo em minhas mãos, oodia fazer o que quisesse com ele. Hoje sou um adulto e o mundo me tem nas mãos, me resta saber o que ele fará comigo. Matheus Peleteiro Meus instintos se aguçam quando sinto de longe o aroma da alma. Sua aparência não me basta. Me apresente algo único, sua natureza única. Não me chateie com superficialidades. Me mostre aquilo em você que a tua família despreza e seus amigos sentem repulsa. Me mostre um pedacinho daquilo que você mesma considera loucura. Algo palpita aqui dentro quando percebo originalidade. Um pouco daquilo que falta no mundo. Um pouco daquilo que tentam destruir no mundo. Os grandes querem a igualdade. Não de vida! Jamais! Eles pregam a igualdade das cabeças. Não no formato dos crânios, mas nas formas de pensar e agir! Me salve um dom, um bom dilema, um lema, uma ideia. Me apresente um projeto de revolução, um crime, um assalto ao banco central! Me tranquilize com sonhos de vencer o mundo! Me surpreenda com boas expectativas, só não falhe em desanimar... Mostre-me a origem dos teus desejos. O núcleo do teu possível ímpeto. Não me faça sonhar sem antes ter peito para oferecer às balas do fracasso. A vida foi dada para explodir. Se fosse para sentar e observar o tempo se estendendo como uma grande chance se esvaindo, as florestas, os animais, os mares, nada seria tão bonito... Nada valeria a pena. Rennan Sama Dos amores que se foram as traças comendo todos os restos das paixões e amores despedaçados pelo tempo nos dias assassinados pela imensidão das lembranças refratárias que me intimam à escrever esse poema. Roge Weslen Satânica I eu conheci o diabo tinha olhos castanhos um cabelo comprido e batom vermelho me aparecia assim em qualquer horário em qualquer dia depois de sumir um mês ou mais e eu deixo ela entrar deitar na minha cama beber da minha cachaça e se escorrer em mim espalhar suor pela cama só pra sumir de novo e voltar daqui um mês ou mais pra que eu deixe ela entrar outra vez querendo que ela fique mas nunca fica só fica o cheiro só fica a falta meu erro foi achar que ela era minha enquanto ela é dela só dela e de mais ninguém Iago Souza Para K. Vou conviver com isso pra sempre com o nó na garganta e o arrependimento pela falta de coragem de não ter dito alguma coisa nem que fosse a coisa errada talvez a coisa certa a ser dita fosse qualquer coisa mas não consegui. o nó na garganta o gargalo descendo rasgando o gosto de sangue na boca e a amargura na língua agora mandarei flores para seu apartamento em Maceió deixarei bilhetes com o porteiro pra entregar-te picharei as paredes de São José da Tapera com poemas intitulados com seu nome seu nome está gravado nas paredes do meu coração e arde quando penso em você eu tenho uma fotografia sua guardada, ela fica numa gaveta do criado-mudo, você está sorrindo na foto eu vou continuar fumando e bebendo e cheirando, mas não se preocupe, a literatura vai me acolher cheguei em casa triste naquela sexta e ela me abraçou e disse "calma, senta na frente do PC e vê se não chora." já vou no meu décimo cigarro e você sabe sobre o conhaque, né? ainda estarei esperando até às 2 horas da manhã pela sua mensagem, enquanto escrevo poemas com seu nome e juro ser o último no final de cada um. João Farias Eu escrevo para alçar meu voo para realçar o segredo e saciar os desejos a vista pro horizonte a paisagem entre os montes empirismo louco entre o sufoco ativismo pacifismo escrevo senão morro de relance nesse novo lance avisto meu próprio e abalado semblante no espelho meus olhos refletem a chama do isqueiro e nesse olhar de revoltado com o mundo inteiro escuridão e luz jazem no fundo dessa pupila e minha imaginação num ritmo filosófico resume a sensação numa luz de pisca-pisca alma lírica desmistifica a vida mente possuída LSD cannabis imagine a metafísica a esfera imaginativa a arte ofensiva a briga com a realidade da vida enquanto a chuva cai lá fora o desalento aqui dentro piora aceito pagar por estar vivo todo esse preçome deito e escrevo. Rennan Sama invento desculpas para minha preguiça nas manhãs frias, tão convincentes. guardo a tarde no bolso do casaco e arrasto as horas em insignificâncias importantes pra mim. alego que o ócio é algo essencial. faz parte de toda a encenação. reconheci muito cedo que pro nada eu tenho talento. Ana Flavia Sarti Poema Batido escrevo sobre aquilo que verte em minha pele do olhar de um eu criança nas tardes de meu tempo escrevo sobre ritalina, morfina e outras paranoias em estado escatológico sobre as visões do fim sou dor, sou drama, tesão, amor, fúria, colo e lágrima ator de minha própria peça uma autobiografia púrpura eu falho, eu cego, eu rio e me caio de joelhos ferrado arrebento o peito todo com o maldito do cigarro escrevo a fuligem nos pulmões e a benção dos dias quentes eu chupo o sangue do lábio e a laranja do entardecer escrevo sobre a memória e ela escreve sobre mim e nu me entrego no escuro ao corpo que me aquece sou testemunha dos dias e das noites que me atingem escrevo sobre a capela olvidada, as paredes descascadas e a santa o som do motor do caminhão e o cheiro da gasolina pela manhã a lembrança que ruge felina e anoitece em meu coração sou revolução e hino socialista, a marca que branda na pele e me contenho: incompleto, contraditório e todo fluído me desfaço em ossos cinzas como se flutuasse no breu a febre roxa me bate à porta e me arranha em delírio a cabeça escrevo rios de água braba e choro por páginas inteiras me faço paisagem quieta de caminhos silênciosos e então sou tão saudade que quase desapareço só hesito quieto o beijo e me confesso em sorriso envelheço anos em meses e lembro do que preocupa ranjo feito porta empenada e esmiúço os sonhos no dente o motor continua a rodar roncando nas costelas então me entrego fantasia como se fosse conto eterno escrevo a maquiagem-bem-vermelha e a tormenta que causam os lábios escrevo neuroses de uma página e me falta o ar em angústia bato a parede na cabeça e abalo com força toda coluna beijo, beijo e beijo de novo tudo num bem-querer-danado e caminho tropeçante entre as plataformas do trem escrevo lembrança de criança, minha inocência que incendeia me faço refúgio como um cão e durmo a chuva gelada minha garganta entope de sonhos e vomito pedregulhos do lar retratos-velhos-de-infância cobrem por inteiro meus brônquios então cresço semente entorpecida de amores virulentos & botânicos escrevo fêmures-de-adultos e um metro e oitenta centímetros escrevo pelos pubianos, unhas, barba e cabelos negros e maciços escrevo com um único tiro um poema (a)batido pelo tempo que me envelhece em estalos e me queima dor e paixão na alma. Pedro Venturini Eu e meus devaneios sobre Kerouac, parte 1 tens toda razão, iluminados são os vagabundos, querido Jack. mentes em constante ascensão, embriagadas por Buk, Ginsberg, Buda, cervejas, Drummond, Cristo... as estrelas prenunciam um dia de sol. o amanhecer sempre chega, claro, alto. a hora vai chegar, cedo, inesperada. é tudo tão lindo e tão orgânico quando se aceita a real condição da fragilidade humana e quando se aceita a natureza, a cruel & linda natureza do pecado do desejo da tristeza da mortalidade. não há tempo para arrependimentos eternos. por isso, os vagabundos são os mais puros de coração, querido Jack. afinal de contas, no fundo quem não é? bem, espero que eu tenha razão. Ana Flavia Sarti nem sei mais o intragável é tudo o que tenho nem verso ou haicai nem Mahler nem Mozart Bukowski morreu faz mais de 20 anos Fante também Céline também o indizível exige novos interlocutores a posteridade é uma mentira todo homem é uma farsa ninguém nunca mais nascerá póstumo. Roge Weslen Essas capitais... Tenho um amigo em São Paulo que fuma maconha de madrugada enquanto escuta Nick Cave e que já assistiu a todos os filmes que eu queria assistir Tenho um amigo em São Paulo que chega bêbado nas aulas da Universidade de Psicologia e que queria mesmo era ser cineasta Tenho um amigo em São Paulo Que já teve um roteiro recusado pela Amazon e escreve loucos contos eróticos que se fossem lidos no século passado seriam condenados e queimados Tenho um amigo em São Paulo que tem a alma voyeur e sente que apenas observa outras existências Tenho um amigo em São Paulo que é fã de Serge Gainsboug e fuma um cigarro atrás do outro enquanto me fala de um cantor de música country dos anos 60 Tenho um amigo em São Paulo que ainda não desistiu do que quer e que sabe que mesmo sendo tudo tão difícil ainda há tempo Tenho um amigo em São Paulo que não se importa se um dia seremos grandes e apenas bebe outro gole de conhaque e me diz que seria foda viver nos 20 com Fitz, Hemingway, Zelda e os caralhos Tenho um amigo em São Paulo que busca sua iluminação em porres intermináveis e toma rivotril quando está atrás de um pico Tenho um amigo em São Paulo que lê meus textos e diz que um dia seremos ricos e idolatrados e que a eternidade não vale nada pra gente Tenho um amigo em São Paulo que se concentra no próximo gole e fuma camels enquanto escreve textos que provavelmente nunca serão lidos. Roge Weslen Alguma consciência Sinto coisas vejo coisas às vezes as compreendo bem… às vezes raramente. Algo entra e não bate na porta acho que esteve comigo durante o dia. Isso pesa, dói, me guia desde a aurora dum sorriso infame. Foi aquele frouxo riso consciente na nua alma melancólica da firme máscara sorridente que esconde uma vida toda amarga. Aryana Frances Eu sou um fodido. Penso demais, Erro demais, Vivo demais, Sinto demais, Bebo demais, Preciso de mais. Me escondo por detrás de Frases prontas E do emprego ordinário E do sol e do meu volante E da forma como finjo me Importar. Me sinto egoisticamente Livre Às três da manhã Com insônia, Contando as estrelas do meu Teto, Enquanto algumas estrelas Lá de fora Deixam de brilhar. Escancaro essa ferida aberta Para que possam ver o sangue escorrendo E sentir o cheiro da nudez, Do interior, Da profundidade, Porque é isso mesmo, Ela dói pra caralho E a não ser que você já tenha Rasgado seu peito, Perfurado seu coração E mergulhado nele de cabeça enquanto ainda pulsante, Não entenderá. Aleff Ribeiro No final das contas, Na última respirada No último olhar No apagar das luzes Depois do orgasmo Quando acaba o efeito Quando o despertador toca (Nem sempre) Após o Adeus Estamos sós. Solidão é desejar um sorriso para admirar Um ombro para dividir o fardo Uma mão para manter quente a nossa E não encontrar. É estar no meio de gente e não, de fato, Estar. É entender que risos e abraços e Bebidas e cigarros e Transas E amores Não duram, Que ao final estamos apenas na nossa Companhia, Vendo as letras miúdas deslizarem Na tela do filme das nossas vidas. Aleff Ribeiro Há tamanha solidão nesse mundo Há tamanha solidão nesse mundo que eu me sinto acompanhado pelo choro daqueles que um dia já sorriram. Mães de santo espalham promessas nos postes da cidade e clínicas psiquiátricas ficam lotadas por pessoas sãs que carecem de atenção. Há tamanha solidão no mundo que eu me sinto abraçado mesmo quando estou sozinho e sinto o calor daqueles que ardem queimando no meu peito. Músicos tocamsolos eternos sem ninguém para ouvi-los pintores reproduzem um mundo num quadro 20x50 e uma sonhadora protesta na rua pelo direito à felicidade sem ninguém para escutar. Matheus Peleteiro Ausência Eu vivia, certas vezes com torpor, assistindo algo sem emoção, sem fulgor. Mas era qualquer coisa que passasse sem a tevê naquela estação. Eu vivia esperando pelo amor só pra dizer que amo sem a pretensão de ter alguém ao meu lado pra sentir de perto mais de uma solidão. Aryana Frances Lar, habitação Noite no esgoto, Há rostos, restos e trapos. É assim, só a vida de ratos? Aryana Frances A vida é uma bagunça às vezes Tudo parece virar de cabeça pra baixo Menos você Te deixando com vertigem E sem saber o que diabos está acontecendo. A vida é uma bagunça às vezes Lança golpes certeiros Sem dó, mas sem rancor também Te deixando caído no chão, engasgando com O próprio sangue, e Perguntando o que diabos há de errado consigo. A vida é uma bagunça às vezes Te faz sorrir enquanto te fode por trás Ao som de "you can't always get what you want" E você percebe que os certos e errados São carros indo e vindo sobre o mesmo chão. A vida é uma bagunça às vezes E te faz realmente pensar que Não sabe como viver, e Que está destinado a estar nesse mundo Fodido, Cambaleando entre cenas que Às vezes Te fazem perceber todo o ponto Dessa falta absurda de Sentido. Aleff Ribeiro Me desculpe pelos catatônicos Me desculpe pelos esquizofrênicos com a individualidade reprimida por eletrochoque seguido de morte e pelos alcoólatras negros torturados pela loucura dos normais. Me desculpe pelos catatônicos lobotomizados deprimidos e pelas possibilidades de Ser aniquiladas entre quatro paredes de uma cela psiquiátrica. Me desculpe pelas mulheres prostituídas e estupradas com fezes envolta do bebê que jamais chegou a ver e pelas crianças sem linguagem sem família sem infância fadadas aos ratos e à podridão. Me desculpe pela timidez e tristeza pelas mães que enviaram seus filhos rumo ao homicídio institucional. Me desculpe por beber esgoto e urina por arrancar meus dentes e orelhas. Me desculpe pelos mortos de frio e de doença pelos corpos vivos cheio de moscas. Me desculpe pela revolta de não fazer parte da sua ditadura social. Me desculpe pelas flores apodrecidas de Barbacena e tantos outros. C. Sanches Vi suas mensagens. Olhei todos os recados Eram tantos E tantos homens em sua vida Você era louca E estava acabando comigo Destruindo-me aos poucos Consumindo-me com seu jogo sujo Eu estava caindo direitinho Como um peixe pega a isca no anzol Mas sua coragem me deixava com tesão. A falta de medo e o fato de saber que estava ficando submisso a você: me deixava ainda mais de pau duro. Parecia que era o meu combustível E quanto mais eu ouvia você falando de seus homens E quanto mais você falava perversidades com eles Eu ficava com mais tesão. E meu pau latejava como se estivesse implorando por sexo. Você era sexo puro Dos pés até a cabeça Você exalava sexo Sexo, sexo, sexo, SEXO! Eu pensei seriamente em pular aquela janela, fugir enquanto você dormia Ir embora e não olhar mais em seu rosto, Mas só conseguia ter ódio de todos aqueles homens E ficava a amaldiçoá-los em minhas orações E pensava se todos teriam te comido melhor que eu Mas eu parecia ter sido o melhor Você nunca teria gozado daquele jeito. Não com outro. Eu era durão e aguentaria mais essa. Eu sabia que iria sofrer, mas não importava. Valeria a pena, valeria e muito. Você merecia o meu desprezo, mas eu queria te dar amor. Acabei o poema sorrindo e voltei para o lado direito da cama e fiquei te olhando dormir com minha camisa e sem calcinha. João Farias Foi você Para Amanda Quaresma Os melhores poemas que eu já escrevi foi você quem fez. As melhores viagens que fiz foram para dentro de ti. Matheus Peleteiro Não qualquer uma, jamais, Porém, você, Sempre você. Até a reta final de tudo. Pois tudo que já vivi meu bem, com você foi mais intenso. Pois de todas as drogas que eu já usei tua essência delicada foi a que mais causou danos. E de todas as loucuras que já cometi, te amar foi de fato a mais arriscada. E no fim te fiz acreditar que te amar foi um tropeço lá no começo. Triste e inevitável é a ilusão do desentendimento. Enquanto desapareço através de um grande "basta!" teus traços faciais e teus relâmpagos de Jéssica se dispersam... Desvanecendo igual cinzas. Inevitavelmente seguimos numa outra viagem sem rédeas. Rennan Sama Se existe um infinito entre o Zero e o Um, Há outro muito maior entre os anos de uma vida. Somos, então, eternos mortais. O rastro de perfume deixado pelo passante. O silêncio entre uma e outra batida do coração. A ironia da efemeridade, que torna a perfeição Compreensível. Somos circenses pulando de eternidade em Eternidade compelidos pela morte a dar o próximo Salto. Somos a flor apanhada pelo romântico e apreciada pela amada. A metáfora estapafúrdia e impossível, que provoca um riso fora de tempo. Somos o nexo da loucura, e a Exatidão do subjetivo. Somos a forma encontrada pelo universo de ser Sua própria plateia, dando Olhos a si mesmo para que pudesse ser Contemplado; E boca, para ser gritado, rido, beijado. Entre um sono e outro, nas palavras cunhadas na madrugada, Jogadas ao silêncio junto ao Sax e ao piano de fundo; Entre o corpo cansado e a mente Ansiando liberdade, As antíteses e paradoxos dançam monotonamente, rindo pelas beiradas das Camas dos que dormem, como dois amantes que se beneficiam da ignorância alheia. Aleff Ribeiro Ela tomava doce toda semana pra me acompanhar & ia ao bar de segunda a segunda e me via esgueirar entortando o corpo a cada copo & saia pela cidade na madrugada fria em busca de uma dose cavalar de suicídio sofrimento salvação sussurros dentro da cabeça (mas eu louco de pó a alcançava antes de chegar a lugar-algum) & então ela chorava cheirava no banheiro olhando pra privada suja & bebia Coca-Cola mascando chiclete como uma criança que recém-virava órfã mas como se nunca tivesse tido mas como se nunca tivesse sido nada daquilo – Pedro Poker Fizera casa no meu peito — esse vazio veio com a mudança. Ana Flavia Sarti Sonho de uma Noite de Verão teu cangote cheirando à Lavanda e perfumes etílicos que evaporam no mormaço de uma noite de verão. você sentada em seu trono de framboesas derretidas, com seu longo vestido negro de decotes homicidas. a marca de batom no cigarro de palha, doses de clonazepam e conhaque relaxando os músculos da consciência. nosso cavalo Pégaso marchando pelas ruas fantasmas da madrugada, galopando pelos viadutos como se fosse constelações estrelares e invadindo nebulosas nuvens carregadas de morfina e minério. eu quero abafar com beijos de cevada a risada da caveira ébria guardiã de dolorosos crepúsculos. do alto da varanda dos seus sonhos lúcidos todo céu é blues e chove diamantes reluzentes em forma de lágrimas nos olhos da minha amada. Joe Arthuso Para aquela que me mandou embora Ela me culpava por não dar importância ao seu diploma em Literatura Estrangeira pela USP e por nunca ter ido à um daqueles saraus de universitários recitar meus poemas Ela me chamava de burro porque Borges nunca esteve entre os meus favoritos e porque eu só sabia idolatrar Fante e Miller e Céline e alguns outros que seria cansativo citar Ela jogava na minha cara que praticamente me sustentava e que eu ficava todo dia só escrevendo e escrevendo e escrevendo e que nunca saíamos e só trepávamos nosintervalos entre um conto ou um poema e que nenhum daqueles poemas eram sobre ela Sim Ela sempre me perguntava se eu escrevia meus poemas pensando nela eu não sabia como responder já que quando escrevia minha cabeça se esvaziava por completo e não, eu acho que nunca dediquei nenhum poema para ela Ela disse um dia que estava farta de mim e da minha vagabundice e indiferença e que eu devia pegar minhas coisas e ir embora assim mesmo, como naquelas comédias românticas americanas então peguei minhas coisas e fui sem me importar nunca soube o que sentia por ela de fato Esses dias nos encontramos na rua ela parecia muito feliz e sorridente disse-me que havia se casado na semana passada e que tinha acabado de descobrir que estava grávida –– doida para contar para o marido. E me abraçou e me desejou sorte e disse tchau e eu sorri e disse tchau me senti infinitamente estranho e destroçado naquele momento acho nunca vou poder contar a ela que finalmente escrevi um poema pensando em seu nome com minha tristeza ironicamente dedicado à sua felicidade. Roge Weslen Barulho do trafego -- ouvi alguém me chamar pelo nome Pedro Poker Para G. Ao atravessar a rua e quase ser atropelado; ao estremecer quando a gastrite me mastiga; nos delírios da tarde; no abandono da remota memória; ao lembrar dos lábios estranhos que me tatuaram o corpo em saliva; ao ouvir Gilberto Gil; com as legendas em francês daquele filme com Louis Garrel; quando violeta de raiva partiu com a honestidade tingida nos olhos; agora, nesse escritório vazio e cinza marrom; penso até as artérias, penso na ponta dos dedos, penso até na alma – seja lá o que isso for – penso câncer, vida, ocupação mental e retalhos desavisados do que erámos, penso notícias frias em dias sós. Eu penso seu rosto, seu carinho, suas vibrações, eu penso em Você. Pedro Venturini Admito, Sou cheirador! Pois cheiro a dor Da sua ausência E as dores do mundo Enquanto você não volta E o mundo não acaba Comigo Nem eu com ele. Saulo Matos A verdade é que eu ando triste mais triste que um alcoólatra budista deitado no sofá recitando o mantra dos teus olhos castanhos como se ainda fosse possível um nirvana que não o último gole amargo do rum barato. A verdade é que eu te prometi no silêncio do táxi escuro nunca mais falar de Chet Baker em uma poesia e que eu devia acreditar que aquele silêncio significava alguma coisa. A verdade é que agora eu tô sentado contando meus dedos porque não tenho nada mais para fazer. As pessoas tristes estão por toda a parte como eu procurando por alguma verdade que as levou para essa situação e ter acreditado mais uma vez a última vez nos teus afagos e no balançar da tua cintura me jogou novamente na solidão da noite infinita a noite está velha assim como eu. C. Sanches Toda autodestruição é uma forma de amor Se vamos todos ao encontro da morte Morreremos então por amor à Carne Pela fumaça que corrói os pulmões Pela bebida barata e cirrose hepática Pela cafeína e a dor no estômago Pela tranquilidade da dopagem antidepressiva Morreremos então pela contracultura Por novas formas de pensar Por toda individualização de sentimentos Por tudo que não sabemos sentir Pela poesia dos malditos Pela música dos loucos Pela dança dos epiléticos Morreremos então por tudo de mais intenso Por atos desesperados Por anseios inconcebíveis Por medos e angústias Por sonhos destruídos Por amor Porque todo amor é uma forma de autodestruição. C. Sanches Medo Medo das traças, Dos relógios E de perder a graça. Aryana Frances Eu e meus devaneios sobre Kerouac, parte 2 envolvido por uma névoa de loucura e álcool e café e anfetaminas movido por poemas e escritores imortais e pelo som dos alucinados bebops dos anos 40 e 50 sentia a vida queimar nos ossos na pele na alma consumido quase que completamente pela paixão por algo mais a cada amanhecer. mas vivenciar não foi o bastante. encontrou na literatura o âmago da chama a vocação a salvação para esse mundo desajustado e louco. perambulou pelas rodovias e embarcou em navios e trens imundos em busca de emoção e sentido & sensação. cada experiência contada em uma lírica instigante e espontânea e cativante. fez-se eterno beatificado numa escrita cheia de beleza e melancolia e amor. repleta de humanidade. Ana Flavia Sarti Autor desconhecido acabo de ler o mais lindo & sincero poema já escrito. autor desconhecido. uma pitada de Vinicius com García Lorca. um mártir canonizado santo. linhas ditas, como uma promessa. uma prece. um poema tão revelador que nem mesmo o escritor, agora, se reconhece. Ana Flavia Sarti estou cheia da linguagem poética e de tanta hipérbole que sinto meu coração saindo pela boca. me sinto louca e grito grito! grito por dentro até ficar rouca, sentada na mesa em silêncio, quieta no meu canto. ah, o poema! santo! santo poema! santo Sama! santo Peleteiro! santo Weslen! santo Ginsberg! musa inspiradora. santa cama! onde meus piores pensamentos nascem e nunca dormem. santo vinho! que me influencia nas mais importantes decisões e me entrega as malditas palavras, que como balas de canhões me ferem com lembranças na ressaca logo noutro dia de manhã. Ana Flavia Sarti eu quero morar em ti. e passear a boca pelo teu corpo e pernas pescoço costas virilha eu quero esquecer minhas mãos na tua cintura e tuas mãos na minha nuca e nossas mãos apertadas contra o lençol quero lamber tua alma e exclamar teu gozo envolver teu cheiro em mim eu quero o peso da tua cabeça no meu peito o som doce do teu prazer e a tua ira sem raiva cuspida em mim espalhada no meu rosto escorrida no meu corpo quero teu corpo tremido em cima do meu e os teus olhos fechados a ver algo talvez alma. tua alma nua e crua curvas suor suspiro quero ser roupagem do teu espírito insano a gritar aos quatro cantos do quarto o meu nome e que os teus suspiros sejam tão altos que só eu ouça também quero morar no teu peito riscar no muro do teu corpo que teu cheiro é meu cais eu sou cheio de querer desculpa Iago Souza Todos os discos jogados no chão Alguns vinis quebrados E o CD do Cazuza que eu comprei em liquidação em pedaços Você me dizendo que não presto Que não tenho valor nenhum "você é um canalha" E eu acho que já ouvi isso em algum lugar Enquanto você fala Vejo sua boca abrindo e fechando e dá pra ver seu gargalo Então me perco nos pensamentos E vou longe e volto novamente e percebo que você jogou todas as minhas camisas pela janela E tocou fogo no colchão da nossa cama Pois tinha o cheiro da puta que deitei enquanto você viajava Todos os meus livros jogados fora Folha por folha pela janela E as pessoas ignoravam como se não importasse que estivesse chovendo literatura (já que não era dinheiro) E eu vejo Cioran voando pela janela Bukowski caindo no esgoto Dostoiévski caindo dentro da calcinha estendida na janela do apartamento do primeiro andar Allen Ginsberg sendo usado pra limpar o cu de uma velha que caga escondida atrás do lixeiro num beco escuro Oswald sendo devorado por um mendigo que acreditou aquele papel ser um pedaço de presunto enviado por Deus Eles pareciam querer me dizer algo, mas estavam distantes demais para tal E Cazuza nunca mais tocará na minha amplificadora fodida que achei num lixão perto de onde moro Veneza não terá mais graça e minha gata não mais irá miar pedindo por carinho enquanto passa entre minhas pernas Que estão embaixo da escrivaninha onde minha máquina de escrever Olivetti fica sobre, pedindo pra ser dedilhada todas as noites E todas as noites descontomeu ódio ali até os dedos sangrarem e ela pedindo por piedade fale comigo "chega de poesia por hoje!" E eu coloco um pouco de café misturado com cocaína e continuo acordado gozando da vida E rezando pra que seu namorado morra e eu possa casar com você numa igrejinha do interior de Alagoas. João Farias não é por nada não mas dentro de mim tem um puteiro que abre as portas toda vez que cê vai embora. Roge Weslen Vulva profunda vão que quase-chega no buraco da bunda que não pode ser confundida que não pode ser fodida (e sim amada com beijos, delícias e carícias) sulco que carrega o mundo teu suco de sabor único míngua em minha língua prazer eufórico que deixa tudo fora do eixo liquido aquoso silencioso e oco ao mudar o foco da cabeça no cabaço do pau Buceta poderosa Fada misteriosa baba de caldo fictício saliva a um passo do precipício Símbolo antigo no qual me enfio no qual me meto dentro sem questionamento Metáfora que aflora levando a mente da órbita pra fora Desejo que dá à vida asas compridas e dedos & dentes pacientes o suficiente para aguentar até o próximo presente ou até o próximo gozo quente Pedro Poker Doutor Isac me disse que sou hipocondríaco e que a minha mais nova neurose é você que eu deveria conhecer novas pessoas e que não é hipocrisia sorrir mesmo sem vontade o fato é que sinto necessidade de ouvir seus batimentos cardíacos em proximidade aos meus na mesma intensidade e velocidade e o que ele não sabe é que amar tem dessas perversidades de te transformar em um louco com atitudes irracionais selvagens e mortais Não sabe que o amor é um caroço insignificante que o tempo sem que percebamos trata de evoluir em um câncer e tudo que resta é a podridão Todo amante é um hipocondríaco em evidência Joe Arthuso A moça de meias calças Já era madrugada, e num vagão de metrô, ela entrou: sexy & embriagada. Sentou-se desejando apenas uma coisa naquela madrugada: deleite. Um rapaz notou sua situação acolhedora após o sorriso que ela lhe desferiu e, sagaz como um legítimo gentleman, notou em sua saia jeans uma abertura que exibia sua bela calcinha de renda preta. Sentou-se ao seu lado e, jeitosamente, sem lhe dirigir a palavra, afagou apenas a ponta da saia, em silêncio, enquanto todos estavam na parte de trás. Observando a expressão da moça para analisar a sua vontade, começou com as pontas dos dedos e seguiu em direção a sua boceta, que, no momento, já estava encharcada. Enquanto portas se abriam, a moça contorcia as pernas em cada estação e sorria: tensa, delirando de prazer. Sabia que aquilo não eram bons modos, mas, que podia fazer? A moça simplesmente não conseguia parar, e não queria. De repente, o metrô parou. O rapaz se levantou e partiu. Ela não pôde ver o seu rosto, porém, de que importava um rosto, se tudo que ela queria eram aqueles dedos entre as suas pernas? A moça, naquela noite, um tesão inesgotável. E, mesmo deixada ali, solitária, de pernas abertas e coração fechado, voltou todas as noites na esperança de repetir aquele ato. Sentava-se, com sua saia curta e sua meia-calça de sempre, olhava para frente e esperava que algo acontecesse. Esperava por horas, na esperança de que aparecesse novamente aquele homem que, definitivamente, sabia usar os seus dedos. Matheus Peleteiro Nossos olhos Se encontraram E nossas almas Se perderam Na eternidade Finalmente. Saulo Matos desperdicei os dias negando as vontades. achei que o tempo não passasse e que todas as idas teriam regresso. me exilei numa ilha que habito por proteção. achei que as vontades do coração eram maravilhas em excesso. levei tudo muito a sério. levei ao pé da letra tudo que foi dito. porém, sei que nada é infinito. sei que nada é eterno. no fim, acho que tenho que esquecer. tudo que você tem a me dizer não deixe pra depois, peço que me diga agora. não haverá outra aurora pra nós dois. Ana Flavia Sarti Eu alcancei a puta e lhe perguntei o seu preço. Ela respondeu '' cinquenta pelo começo. '' Lhe perguntei quanto custava a submissão, e ela disse oitenta. Eu dei noventa, Ela disse senta. Se encaixou no meu colo e se contorceu, e eu imaginei que a atitude súbita havia sigo paga com os dez de gorjeta. Eu só queria um diálogo genial com uma puta qualquer, e sobre o prazer, eu sempre me viro com a punheta. Eu lhe perguntei o preço da sua alma, paralisando seus movimentos sem vida. Ela me encarou com uma expressão: aflita! Que puta divina, pensei. E então, após alguns segundos, ela respondeu: ''A alma é um jogo complicado. Você me promete conceder o espaço onde deveria estar a sua. Só então fechamos o contrato.'' Essa puta nunca existiu. É parte da minha ficção de inventor, escritor, poeta ou seja lá como você chamar. O importante é que essa história não existiu, simplesmente porque eu nunca haveria de ter um diálogo genial com uma puta. Mas o nome dela era Dilene! Adivinha a razão! É engraçado... Foi o nome que um colega inventou nesta tarde, quando conversávamos sobre nomes que começam com ''Di''. É um mundo louco. E esse poema é mais um poema sobre uma frustração. É sobre as risadas fracas da vida, que a gente solta em meio aos suspiros fundos, mais fundos que o poço no qual nos encontramos quase sempre. quase sempre por uma razão inquebrável e irreversível. Rennan Sama Beleza é coisa que esfaqueia a gente pelas costas eu não acredito mais em beleza a traição começa sempre no belo, tal qual a traição do bom. do mal e do feio podemos esperar sempre a mesma coisa, são seres que não mudam. Tenho sentido meu corpo como, acho, nunca o senti antes. Tenho sentido cada uísque, cada carreira, cada copo e cada porção de torresmo que como. Tenho sentido meus músculos de elástico frouxo e câimbra alcoólica persistente. E tenho sentido meus órgãos, cada um a sua maneira e cada qual com suas consequências. Tenho sentido meus rins que doem tal qual uma paulada seca no saco. O fígado inchado e marcado na barriga como um tumor e o branco dos olhos amarelados de bilis. meu estômago ressequido de junk - a minha junk e não a convencional daquele livro dos anos cinquenta. e o corpo reclama como um pistão desgastado pelo uso fazendo o motor rugir de dor como uma cadela pós-coito, caralho e boceta torcidos numa tarde de verão. tenho sentido também minha cabeça doente que mostra os primeiros sinais do álcool diário. o ódio e os colapsos dos nervos ruins. hoje sou mais ansioso que ontem. delírio e tremores involuntários. tenho sentido medo me olhando descolar do espelho pequeno do banheiro. De uma maneira muito específica, pelos olhos do uísque turvo e falsificado. sinto que morro mais uma vez. Eric Moreira Dizem que um homem feliz vive com pouco Sou um homem feliz e realizado Me bastam apenas três coisas Minha mulher, batida de limão e comer Como um porco capado. Eric Moreira uma mãe de santo uma vez me disse que calada é a noite eu não não me calam as armas e as fardas os gritos que sejam nem de ódio nem de socorro não me calam os dias as horas e o tempo o pouco o oco a treva e o trevo a sorte e o azar as balas que insistem em perfurar e explodir e eclodir e repelir o peito tão baldio quanto a esquina da minha rua não me calam nem as grades e as calamidades nem o verso a maldição e a benção também não não me calam as mãos firmes que apontam o leve e o livre nem os calões as multidões não me cala nem a mordaça quem tenta calar pra falar em ordem e o toque que não seja de acolher e recolher esse verso invisível barulhento einsensível que sempre diz o indizível é de grito que se faz essas ruas e calçadas escuras cheia de histórias tristes e absurdas não me calam os calos nas mãos nem o grito de quem acerta na razão só o que me cala é a boca é o beijo é o coração Iago Souza Sonho real Suspiro, sonho tranquilo; tiros, caos a caminho; sorrio, tenho você em meu destino. Aryana Frances Quem guarda o santo de guarda adia o juízo final Dizem que algumas pessoas sentem até o cheiro do calibre que atira eu lembrei disso quando me joguei no chão no meio de um tiroteio no boteco da Zira senti o cheiro do conhaque derramado, da cerveja senti até o cheiro do mijo escorrido de algum cagão que mijou-se nas calças. Foi a primeira vez que presenciei um tiro com vontade de morte. Demorei a me levantar, fiquei debruçado no chão do bar até que a dona, Alzira da Conceição Pinheiro, veio me pegar pela mão. Achou que eu tava ferido. Mas eu só tinha medo e porre. O medo não deixava eu levantar, o porre me impedia de tentar. Quando me sentei na cadeira, pedi um trago pra tentar recobrar os sentidos Zira trouxe pra mim um copo de conhaque e afagou minha cabeça “Menino de deus, foi por um dedo que o tiro não te pega. Você tava logo na reta da bala. Deus foi quem te salvou” Mas eu queria dizer pra dona Zira Deus me salvou de muita coisa, se eu botar fé na palavra de quem crê nisso. Quase caí da janela do terceiro andar com menos de quatro anos quase me dei mal numa boca com dois maluco sem medo de morrer que questionaram a qualidade do bagulho quase levei uma facada de um corno ciumento no centro da cidade. Se deus me salvou de tudo isso, viro crente, Eu disse. Mas eu não acho. Eu tenho meus próprios santos Acredito no meu santinho de zé pelintra E maria navalha Que eu cuido com muito amor. Eles é quem me conhecem Mais que o Deus jeová evangélico Que pune e que mata Quem não crê. Nunca tive medo de inferno Sei bem o caminho que trilho e confio demais nos espírito que me guia. Tatuei uma navalha no braço Porque toda navalha é uma promessa De vida ou de morte E eu sempre fui um homem de palavra. Eric Moreira Você que secou minhas palavras tristes escritas antes num papel qualquer, Você que não me viu flutuar como o som dum sax sobre a cidade de lugar à lugar sem encontrar algo que valha a pena nomear, você que lutou contra a vida, entre ela encontrou alguém para ajudar – teu olho bateu com o meu, teu sorriso falso na minha boca, você que me suportou seis vezes por semana bêbado e no sétimo a ressaca – e agora o baseado é sempre para dois, você que provou através dos olhos que até no tudo se encontra o nada e vice-versa, a poesia é meu corpo tanto quanto a cerveja no copo, tanto quanto o pouco que considero louco por não ser maior: Queria eu lembrar tudo o que vejo, queria eu saber o que estou falando – Queria eu subir ao céu e descer ao inferno e escutar a paranoia em teu ouvido calado, minha língua um verme enrolado em teu pescoço – Não prometo bom caminho na sequência de passos dos meus pés, no arrastar de sandálias – sem profecias neste poema – sem perigo esse tiro de cocaína. Eu inspiro, e expiro o espírito então. Pedro Poker eu tenho pena dos eruditos porque o amor deles é suicida, o amor dos eruditos se joga da montanha e implora pela amada, escreve sonetos e cartas de amor perfumadas e decoradas por flores de algum jardim secreto de uma montanha longínqua, eu tenho pena dos eruditos porque eles só amam se for aquele amor de serenata e novela mexicana, que declama "ne me quitte pas" no mais perfeito francês, o amor dos eruditos é quase religioso, o amor dos eruditos nunca entenderia o poema raso que fiz sobre aquele lençol rasgado que nos cobria, o amor erudito não entenderia o que te escrevi e mandei num guardanapo sujo do bar do Bené, os eruditos não entendem o amor marginal, o amor que te oferece uma música do Belchior, uma cerveja e uma tarde inteira de sorrisos soltos, eu tenho pena dos eruditos porque eles não entendem nada de amor, amor não é isso que te ensinaram na escola, o amor é tudo que eles diziam ser vazio & Insignificante Iago Souza Mestiço Em uma queda d'água meu olhar cruzou com o seu . Por trás dos seus óculos escuros, a correnteza e o rio deixaram que o papel se movesse como um mito. Por instantes permaneci arrebatada em ânimos com a certeza de que encontros incertos nos trazem a brisa soprada pelo mar da vida. Quem pode provar do seu olhar, mestiço castanho claro, rende-se ao esboço de um sorriso monalístico deixado em um parque ambiental. Hey, mestiço, você escalou meu desejo e fez alguns momentos parecerem ilusão. Onde está seu sorriso mostrando os dentes com seus olhos pouco apertados? Diga onde está seu beijo? Perguntas sem respostas como um simples: quanto custa? consumida em timidez, foda mesmo é não saber responder. Queria a eternidade na noite que passou por momentos envolvida porém, já sentia a realidade que voltou. Hey, garoto, você escalou meu desejo desorientou minha razão, meu poder de dizer sim ou não. Flutuar em seu olhar, mestiço castanho claro, em plena corda bamba fez-me perder meus pensamentos em cachoeiras, em desencontros. Estefani Camile Cabe No espaço entre sorrir e beijar cabe minha eternidade em seu suspirar. Aryana Frances As noites são frias ao sul do Equador as noites são tristes e eu estou cansado de escrever sobre a noite sobre você sobre minha tristeza sobre o jazz estou cansado de escrever sobre cerveja sobre os mendigos sobre os loucos estou cansado de ser poeta de ser o que não sou nunca vou mudar o mundo e nem vou mudar uma pessoa. As frases soltas e quem sabe belas como "noites frias ao sul do equador" são delírios e apenas delírios. Conheci pessoas esses dias o que é raro alguns bem loucos e intensos como as linhas de Henry Miller capaz de mandar Deus à merda e perceber o sadismo de todos nós outros líricos e cheios de vida suportando problemas escritos em versos simples. São tantos os olhos e tantas as tristezas que se esvaem em quartos claustrofóbicos. São tantos os sorrisos e cada um deles sem expressão opacos como nós. "olá, tudo bem?" a mulher do caixa repete centenas de vezes e vai chorar ao fim da tarde porque o dia inteiro está uma merda para ela e para mim. Eu escrevo meus poemas e vou chorar no fim do ponto. As pessoas morrem e tudo é parte de um todo como Anaxágoras como Deleuze. "Tudo" é uma expressão tão vazia quanto assinaturas nada é mais vazio e egoísta que assinaturas quem dera pudessem todos escrever ou pintar e não assinar. Eu falei que não queria mais escrever sobre a noite e tantas outras coisas então lhe entrego esse poema (assinado) sem foco. C. Sanches O inferno é aqui, baby eu lembro de você dizer "o inferno é aqui, baby nós somos nossos próprios demônios" eu nunca acreditei, tantas vezes ateu de ti. e hoje eu ouço os discos do Cash na madrugada sobre homens solitários e alcoolatras eu machuco o pé nos cacos de garrafas espalhados pelo chão. Caetano chora baixinho no bar da frente e eu não aguento mais ouvir "sozinho" enquanto eu rasgo os lençóis que já sujamos e rasgo os poemas que te fiz e rasgo minha pele com as unhas e amasso a tua foto na mão e bebo mais um pouco e fumo uns 20 cigarros que tem o gosto estranho da sua boca que me amarga a língua, sim, agora eu sei que o inferno existe, eu me enganei, o inferno é o que sobra quando o amor acaba eu me masturbei seis vezes ontem pensando no teu sorriso bêbado Iago Souza O Barulho do Vazio não sei se sobrevivo à arritmia a frequência do meu coração alterna entre sonho & furacão e eu meu desejo é impróprio e meu signo temlua em câncer certas noites daquelas bem tristes eu converso com Deus noutras ele me escuta eu juro que ele me escuta bem pacientemente e nas manhãs eu me perco claro de um jeito quase súbito de incomodo é que tudo se desenha assim meio de marcha ré e eu imploro para Deus e a sala vazia e a música quase que muda, calada e minhas manias todas tortas elas tudo dentro de um imenso vazio - o universo cabe dentro de uma boca. Pedro Venturini Tenho dentro de mim um desejo tão forte de encontrar alegria que nem a polícia poderia apagar com bala que nem a mídia poderia manipular as notícias mostrando meus sentimentos mais tristes: Tenho dentro de mim flores no esôfago que sufocam com oxigênio Tenho dentro de mim um caminhão lotado de sacos de cimento Tenho dento de mim pássaros que não cantam. Pedro Poker Tudo continua como está De onde venho as grandes avenidas são fichinhas o que há são os becos intermináveis e obscuros – locais onde a poesia de Shakeaspeare não chegou dias inenarráveis e esse sentimento tem me tomado esse sentimento pior que a tristeza! e não há música, não há livro, não há palavra que dê jeito quando estou nesse estado transe quimérico que me deixa agoniado como se a vida estivesse prestes a acabar & espero que esteja mesmo é como se mil locomotivas tivessem me atropelado e não restasse nenhuma parte de meu corpo pra chamar de Eu como naquele romance do F. Sabino a ira ainda está aqui & o problema todo fui eu que criei por que será que o ser humano tem esse instinto devastador de querer sempre o pior para si – mesmo que as vezes inconscientemente? mil locomotivas passando por cima de cada parte do meu Ser que imagem linda de se ver & acabou saindo uma rima sei nem por quê a televisão diz que um grupo de jovens vândalos depredou o patrimônio público de são Paulo há algo errado com essa notícia e quem está depredando o futuro de nossos jovens vândalos, é o que? a loucura sussurra algo ao meu ouvido finjo que não escuto – o estourar de uma bomba jovens vândalos incendeiam um ônibus na esquina. tudo continua como está no Facebook vejo postagens “Fora Temer” uma atrás da outra mas tudo continua como está & teve aquela menina que perdeu o olho nossos jovens não dão mais sua cara à tapa de graça nossos jovens uma porra! eu sou jovem também & quero gritar & bater & xingar mas nossos homens de bem odeiam com todas as forças a atitude de depredar o que acham ser seu a parte tudo isso o que faço é sentar aqui e descarregar a merda toda aí eu consigo outra chance pra mim mesmo e porra, é triste: tudo continua como está. Roge Weslen Há muita festa em casa de rico, mas poesia só mora em pau a pique Há muita gente provando dry-martinis e cheirando cocaína no vidro alisado da mesa de centro enquanto eu aceitei a aguardente de dois reais gorgolejando metanol pra me cegar. Há muita gente contente com seus telhados de vidro e poesia fodida com trocadilhos escrotos. Há muita gente recusando a vida em favor de cruzeiros que já não valem um centavo. Muita gente elogiando periquitos mortos e Cuba-Livres sobre a mesa da sala Rum caríssimo enquanto os bons morrem contando centavos. O problema desse país é que existem poetas demais nas rebeliões das cadeias E pouquíssimos doutores capazes de fazer poesia. No entanto os livros são sempre recheados de títulos. Há mais títulos que poesia nos livros dos doutores. Conheci também doutores que de doutor, só o título O resto era algazarra e porre e mesa e vidro e canudo e outro porre e vida para além do entorpecimento e do trabalho. Conheci poemas improvisados sobre sexo Anal com garrafas de rum da pior qualidade, mas do melhor preço possível. Fumei charutos cubanos trazidos em panos velhos como contrabando da ilha mais fodida da america latina Fodida de uma maneira boa e triste, como poeta acha legal. Conheci os barbudos e pederastas, que o Piva cantou, e não gostei da maior parte deles São coxinhas aos avessos Com convicção demais no que dizem E pouquíssima visão de experiência e gozo do mundo. Conheci quarentões que travaram suas cabeças nos seus delírios punheteiros de quinze anos. Conheci de menor mais experimente que homem feito. E nada disso mudou nada. Há muita gente que não viu porra nenhuma e acredita ter encontrado a razão do céu e do mundo E das mazelas Mas a gente ainda morre no jornal. Com a tranquilidade do imbecil Eu fumo um, dois, três cigarros seguidos. E espero a próxima notícia, Nos últimos cem anos A melhor literatura que li foi o depoimento do “maior bandido da américa latina”. Eric Moreira "Você ainda vai se foder muito na vida” Me disseram certa vez, Eu só não imaginava Que seria a própria vida Que iria me foder A vida inteira! Saulo Matos Eu não fumo, Mas depois daquela transa Precisei acender um cigarro Realizando a fantasia de Ir à janela Nu E fumar lentamente Sabendo que há uma mulher Em minha cama. De costas para ela. A imaginava E deixava a fumaça sair Como que por vontade própria. Estava frio, E a brisa gelada Contrastava com o Quente do meu corpo Cansado e Satisfeito. Terminei o cigarro Voltei para a cama Abracei-a e Fingi assistir televisão. Aleff Ribeiro o mundo poderia acabar enquanto nós trepávamos com a TV ligada no programa do Silvio Santos a terceira guerra mundial poderia explodir suas bombas e mandar essa cidade pro espaço enquanto você gemia que era minha e se contorcia como uma cobra com fome o mundo poderia parar ali enquanto você põe minha camisa do Pink Floyd e vai na cozinha preparar um lanche enquanto você puxa a calcinha do rabo e pisca pra mim enquanto você reclama da programação da TV aberta e diz que eu sou um caso perdido mas que você até gosta o mundo poderia acabar enquanto eu te vejo comer um pão com queijo em cima da cama e rindo das videocassetadas do programa do Faustão e o mundo meio que acaba mesmo por um momento ele para de fazer sentido pra mim mas só depois que você junta as roupas espalhadas no chão e eu fico ouvindo o barulho dos seus passos por detrás da porta Iago Souza Amanheceu na rodoviária um homem escutando o resultado dos jogos no radinho de pilha, a mocinha lojista comendo coxinha e matando uma mosca com um sorriso, policiais chutando mendigos com seus coturnos clérigos, um casal de hippies vendendo filtros de sonhos na realidade de um pesadelo urbano, passos emergindo do ponteiro de um relógio em direção ao embarque de um suicídio cotidiano. corre, corre para onde? por todos os lados! apitos de ordens, abre o jornal, recebe mensagem, uma selfie? paga a passagem, para onde? quem sabe? um canário de metal pousa no meu ombro, eu vislumbro um oceano. Joe Arthuso A entidade mais bela toda noite se transforma em anos incandescentes de anomalias nostálgicas indecentes e as janelas dos meus sonhos se afogam em maremotos de purificada agonia e o sol brilha pros cantos de lá mas aqui na eternidade das minhas horas o nada me chama de irmão na imensidão solitária e escura do vácuo interior. o cigarro queima minha mão e sabota meu pulmão bem devagar com o carinho doentio de um serial killer que se excita em paparicar sua vítima antes do ultimo e triunfal ato, acendo mais um e aceito o meu tracejar. de todas as coisa que esgueiram por trás da cortina negra que eu não consigo ver e de todo o mal que vive lá fora, hoje eu sei que o meu maior perigo sou eu, que vejo a morte como a entidade mais bela e pura que já andou por estas bandas. levando todos pra um lugar que não é aqui (espero). fecho os olhos e não durmo, pensando em tudo que não fui, em tudo que não foidito, me vejo em uma cama que não é a minha com o teto me sufocando e secando de forma colossal, jogando todo o peso do véu noturno do universo sobre mim. estico a mão e pego a velha arma que já encarei tantas vezes e a beijo longamente, minha antiga e fria amante, sinto o gosto do metal, então minha mente se esvazia como ejaculação precoce nas preliminares, e assim eu escorrego de volta para o ultimo fio de sanidade que me resta e durmo em paz com um "celular" na boca tentando ligar para morte novamente mas ela também não me atende. Saulo Matos Deserção Acordo em meio ao fel Podre da calçada suja. Ouço um suspiro de redenção Do diabo em meu ouvido. O ar melancólico da cidade Emite um zunido que ofusca As buzinas. O conhaque se esvaiu Num gracejo indigente da noite anterior. Sem almejar a vida, me levanto. Acendo um cigarro, E sinto a fumaça queimar O que resta dos meus pobres pulmões. Vejo a face de Thompson Piscar pra mim da vidraça Da padaria. Minha garganta amarga Se retorce num pigarro. O céu desaba em cima de mim Como num prelúdio sádico de Deus. O castigo para os de mente ignóbil Se anuncia. A depressão moral de meus ancestrais Me atinge no peito, E caminho cambaleante Rumo ao banco mais próximo. Senta-se ao meu lado, com um sorriso torpe, A imagem da Virgem-Maria. Alisa meu queixo e me diz Que meu futuro é uma solidão Empoeirada em meio às prateleiras. Ela se parece com a morte. Cuspo um sangue viscoso Na ponta dos meus pés. Sinto meus olhos lacrimejando a embriaguez De uma vida perdida, Que se entorpeceu cedo demais. Tudo parece se transformar Num caos premeditado, Sem alianças e sem pudores. Ouço uivar o lobo sem bando Que habita em mim, Num pedido de socorro. Ele quer se libertar da minha tragédia. E, em meio a seus ganidos, Percebo que ainda não despertei. Vitor Oliva Me mandaram ir a merda, Virei poeta E descobri Que sou um cara Obediente pra caralho Disfarçado De rebelde Sem meta. Saulo Matos A concessão da estrela Nascemos estrelas com brilhos únicos, próprios originais como canções que vem do coração. Sabemos da grandeza da existência do que devemos buscar, sabemos da importância das estrelas irmãs das estrelas mães, das estrelas guias. Não quero perder a fé. A fé que alimenta esse brilho, a fé da ciência, que é mais fervorosa que a fé religiosa e que esses corpos celestes nem percebem. Não quero perder a fé no poder desse brilho de todas as estrelas juntas. Somos brilhos, estrelas nascentes ofuscadas naturalmente por modelos de padrões decadentes. Uma estrela, aqui nesse céu nasce livre, e se perde num buraco negro. Se muito brilhante, será aclamada e elogiada mas, antes, verá seu sucesso numa morte fadada. esse céu que habito cheio de estrelas lindas, brilhantes sofre, por padronizar a emanação de suas próprias luzes. Meu céu de estrelas pensantes, porém, insanas, que fazem concessões para serem felizes. Estefani Camile Poema de fim de tarde É estranho: Mas sinto que caminho para a derrota sem a glória ter sido iniciada. Faço o seu caminho, imagino qual o lado da calçada que escolheu, sinto o seu cheiro e sigo. Te sigo mentalmente. Vejo os lugares que me contou, sinto o quanto perdi, mas é tarde. É tudo estranho e tarde. Caminhos belos não bem regados e podados Viram o inóspito caminho do meu coração. Aryana Frances Miles Davis faz seu instrumento chorar num dançar ritmado em toda angústia e tédio e tristeza e... Olha onde eu cheguei. Tenho um cigarro e uma arma apontada pro futuro. E o dedo que encosta no gatilho não parece ser meu amigo. Brinco com o teclado e a batida de um blues meus dedos criam muito mais que palavras. Meus olhos enxergam a magia da música e da poesia e de todos os versos escritos. Eu nasci no rock 'n' roll desfrutei do rap nacional e agora atolei no jazz e acho que acaba assim. E isso é tudo. Farejei e assediei todos os limites da perdição, que ponderei como minhas únicas correntes. Esta sempre, sempre, será minha poesia, muito mais cheia de sentido na véspera do fim de tudo. Rennan Sama Escadaria abaixo Estou no inferno dos dias dos dias ausentes de glórias, do descanso dormente da vida sem histórias bonitas ou estranhas, mas minhas. Aquele riso amargo de lembranças e tristes fatos se completam de tragédias e de esquecidas promessas vazias, mas tão belas. O calor aprisionou meu coração, o horror condenou minha ilusão, e o amor não se esqueceu de nossa traição. Eu penso nos meus erros e vejo caminhos. Eu não tenho acertos, mas sigo meu destino. Os meus medos são só meus medos. Irei temê-los Os meus medos estão na crise também e irei vencê-los. Aryana Frances Meus amores são boleros cantados por um gago apaixonado, sem medo de morrer de amor há muita besteira sobre relacionamentos hoje em dia descobri que é até fácil esquecer um amor frustrado pelo ritmo excruciante do mundo moderno. fiz a dieta da morte por um mês a fio, rivotril e cocaína alternadamente três maços de Minister por dia e meio litro de conhaque à noite. chamam isso de dieta da morte, e é bem óbvio o porquê. eu não morri mas todas as lembranças dela sim. eu não me preocupo mais com o outro lado da cama vazio nem com aquele cheiro doce de perfume de manhã. Nenhuma ferida se abriu em mim outra vez, quando, por acaso, cartola saiu do envelope e caiu no toca-discos. Eu sou um homem bem feliz agora mas, até quando? Eric Moreira Cercado Mas agora, lá fora O mundo é todo uma ilha A milhas e milhas e milhas De qualquer lugar (Terra de Gigantes – Engenheiros do Hawaii) Eu era uma ilha sem arquipélago. Eu era um punhado de terra, de lembrança sem consolo. Eu era o riso de outro sem o outro. Eu era o que ainda sou sem mais conter o choro. Eu era o mesmo sem entender que já não o era mais. Eu era… Sem sentir o que o mar me trazia a cada alvorecer. E eu era sempre Sem nunca pedir para ser. Aryana Frances Indefensável Era noite, voltava à minha casa A lua toda misteriosa Banhava minha noite E minha alma vazia só queria conhaque Pra esquecer o dia desgastante Mas não havia conhaque Só havia lembranças. Blasfemei à Dionísio: “Por que em meu teto Falta conhaque? Não quero apenas versos, quero apagar, também. Por que não transforma O sereno em conhaque? Perdeste as habilidades? Só apareces com vinho? Não me responderás Está enterrado numa crença De infiéis lembranças. ” Meu péssimo humor Lembrou-me de que eu estava só. Não adiantava reclamar. Mas quero me esquecer Mas quero me iludir E acreditar na felicidade Felicidade num trago Repleto de saídas inexistentes E de flashes da realidade. Hoje ninguém, sorrindo, depois de um longo beijo, cochichará em meu ouvido: “vamos dormir, amor, quem sabe virando o travesseiro, Você sonhará de algum jeito”. E então, era pra isso o conhaque Pra te ouvir mais perto, pra te ver ao meu lado, Sentir o gosto ébrio dos teus lábios e ter o teu corpo sob o meu. Mas o conhaque acabou, O sonho não chega. É… esta minha noite se parece com um golpe indefensável. Aryana Frances Após a chuva na próxima esquina — o céu curvado de estrelas. Ana Flavia Sarti Agora (Agora) Eu me sinto um vidro quebrado Uma peça descartada Um peso inútil Um violão sem cordas Um céu. Um céu poluído Não visto do segundo andar De um quarto no subúrbio. Me sinto um pneu murcho Uma flor apanhada, contando Os instantes para ter sua cor Perdida. Me sinto resto, Me sinto desperdício, Me sinto desnecessidade, Obviedade Discrição Explosão Implosão Me sintofogo (morno) Me sinto cigarro quebrado Cerveja quente Me sinto olho que ja não Enxerga através da lente Que deveria fazê-lo enxergar. Me sinto descontínuo Me sinto normal Me sinto médio E Deus, que puta dor Que me causa esse sentimento! Me sinto trêmulo, Não me sinto eu Me sinto poça d'agua Insalubre Insosso Infeliz. Me sinto mudo E não ciente disso Então falo e falo E grito e Só vejo inércia. Me sinto amplo E perdido aqui dentro. Me sinto perdido. Absolutamente Estapafurdiamente Idiotamente Livremente Perdido. Aleff Ribeiro Um cigarro no horizonte José, recostado à janela Fuma um cigarro Contempla a rua, as portas, os postes Sentindo a inutilidade De toda esta fiação Que vela as mentes Mal iluminadas Mas o que há, José, Que nem em seu toldo chove mais? O que há, que seu martírio Tornou-se nada mais Que flagelo? Mas o que há, José, Que em seu peito, Nada mais aperta? Nada mais se esgota Ninguém mais bate à porta José não sabe, como ninguém Apenas continua tragando Todas as suas dúvidas Todas as suas lamúrias Que sabe que de nada valem Para os pulmões Que a qualquer momento irão cessar. Vitor Oliva eu não exorcizei os meus demônios como a maioria faz, eu resolvi trancafiá-los em mim e esquecer onde guardei as chaves já são tantos os monstros vagando pela cidade e tropeçando em mendigos que não seria justo soltá-los na avenida principal e esquecer seus nomes os meus demônios eu criei em terreno hostil meu peito meio aberto meu corpo fechado criei vínculos e laços e até castiguei quando foi necessário meus demônios agora cochicham conselhos pra mim gritam quando o perigo se aproxima às vezes dou ouvidos às vezes os mando calar e parar de atormentar meu juízo meus demônios agora se parecem comigo e são vários um diferente do outro um tão eu quanto o outro meus demônios agora se parecem comigo ou talvez seja só eu que me pareço cada vez mais com os meus demônios Iago Souza Veneno de Vênus O céu escuro oferece a poção que embebeda os olhos sob a luz da lua cheia que protege seus brilhos. Toda sua proximidade aparente, Vênus, aquece todo ser que te olha. Vênus de Milo poderia ter braços se sentisse tua energia letal. Qualquer Deus perderia os poderes. Vênus do amor provou sua luz transformou amor em dor, Veneno de malícia viciante. Quantos anos luz longe te vejo embriaguez cósmica que aumenta. Vênus transforma alegria em melancolia, brilho que completa esplêndido Veneno de Vênus. Estefani Camile Transa cósmica Esperando você chegar, a noite é um uivo engarrafado em cachaças no alto-mar. eu dizendo palavras sem vocábulo: murmúrios de bêbados, gírias de travestis desvairados e insultos de loucos. eu queimando como as cinzas de um cigarro, meu cinzeiro: almas perdidas em dias nublados. você no meu incenso de ervas metálicas, você gemendo de quatro como um solo de uma guitarra; derrubando os quadros e gritando: PICASSO! PICASSO! PICASSO! esperando você chegar enquanto leio Ferreira Gullar vomitando no sanitário. esperando você chegar arrastando pelos terreiros com os meus orixás. a noite é ruiva e na nudez do céu enxergo os seus cabelos ruivos de Vênus. esperando você chegar tesuda e gritando: PICASSO! PICASSO! PICASSO! eu sou tua! Joe Arthuso Querida, Querida, você me diz que eu tenho estado mais calado, que tenho andado em outras frequências, e que já não sou como era antes, mas, e se eu te disser que meus desejos não são mais os mesmos, que a minha esperança hoje, não passa de um resquício da vontade de derrotar os filhos da puta que fecham os olhos perante as vidas que se vão e se eu te dissesse que notei um pássaro voando em meio a uma multidão e que a poesia nunca me procurou, mas eu encontrei ela e ela apontou uma arma na direção da minha testa e me disse "sou eu ou a morte" e se eu te contasse que de tudo o que passa só o que fica é a lembrança da calcinha das mulheres que te deixam penduradas na fechadura da porta e a dor de ter de destruir tudo o que ama para enfim viver de fato em liberdade? e se eu te dissesse que até mesmo nas nossas trivialidades sempre houve o receio e a adorável inconstância da falta de segurança do amor, você ainda me amaria e diria que quer fugir para as Maldivas comigo para então mergulharmos na vida até que um dia não acordássemos mais? Matheus Peleteiro Você ainda teria medo se eu lhe dissesse que a vida vai destruir não importa de onde venha todos que nasceram para a solidão se eu lhe dissesse que a poesia e os vícios vão te matar antes dos 50 que família não significa muita coisa e pensar em deixar algo pra esse mundo é atormentador demais se eu lhe dissesse que é necessário morrer pra poder viver novamente que é necessário sucumbir para que tudo se faça verdadeiro que a literatura é uma farsa cheia de palavras vazias de significados e somente os que compreendem isso vão lhe entender que Péricles não passa de um charlatão e Leônidas é o verdadeiro poeta se eu lhe dissesse que suas lágrimas não vão adiantar muita coisa e no fim Werther foi fraco os românticos sempre estiveram errados se eu lhe dissesse que algumas vezes nem arte ou amor podem nos salvar que nessas vezes são eles que nos desesperam se eu lhe dissesse que em um ou dois dias a angústia pode ser maior e que talvez não seja a última vez mas você não pode parar aí se eu lhe dissesse que a filosofia não vai te levar a lugar nenhum que os remédios são a melhor opção e que teu orgulho é um erro se eu lhe dissesse que a tristeza não é tão bela assim nem tão necessária mas os outros não sabem disso que seu sorriso já não é mais tão branco ou tão bonito ou tão verdadeiro que o quarto nunca foi quarto e a casa nunca foi lar as noites sempre mais longas se eu lhe dissesse que se dopar não é tão ruim assim mas escutar a música certa é sempre melhor se eu lhe dissesse que não existe música certa você ainda teria medo? C. Sanches Barulho noturno Na madrugada até o amor silencioso Torna-se gritante C. Sanches Eu quero achar o que se perdeu: transfigurar no nada esse anseio de coisa alguma captar mensagens eletrocutar espasmos produzir ninharias auxiliar deus a se esquecer do mundo (ele mesmo não dá a mínima & sequer existe) iluminar o corpo até encantar a matéria ao virar pó ao virar a esquina mostrar os dentes a cada sorriso jorrar lágrimas expelir esperma espremer o sumo do sulco da enxada no cérebro da terra Forrar o estômago de folhas verdes derrubar os galhos secos interferir no vento assoprando sentidos contrários espirrar detalhes tossir conteúdo evacuar virtudes – no mais ser menos no resto ser tudo. Pedro Poker Fazer adormecer a língua sobre a ferida alheia e ocupar-se da saliva cuspida a cada palavrão, inaugurar nova visão nos velhos mestres, ouvir o porvir que há em cada instante, explodir no ar bolhas de felicidade entre o oxigênio fantasma da cidade, ocupar-se de coisas terrenas deliciando a matéria com sua mortalidade, jorrar quente o gozo bem na cara de quem não goza, manipular a si próprio num instante de esquizofrenia calculada, abstrair do espírito qualquer coisa que não valha o instante – Pedro Poker Agora o que me resta são poemas escritos por escritores desconhecidos do nordeste do Brasil agora o que me resta são os cigarros feitos com fumo avião, pois é o que sobrou pra comprar com algumas notas amassadas do bolso de uma bermuda suja suja com o seu gozo enquanto te comia ao lado de sua casa, num terreno onde maconheiros se reúnem pra fumar maconha, na cidadezinha
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