Buscar

343101513-Introducao-Ao-Pensamento-Sociologico

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 211 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 211 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 211 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

1
COLEÇÃO LEITURAS SOCIOLOGIA
Responsáveis:
Anna Maria de Castro Nancy Aléssio Magalhães
INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO
Os capítulos I, II e V foram elaborados pela professora Anna Maria de Castro e oscapítulos III e IV pelo professor 
Edmundo Fernandes Dias.
ANNA MARIA DE CASTRO E EDMUNDO FERNANDES DIAS
INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO SOCIOLÓGICO
CONTEXTO HISTÓRICO DO APARECIMENTO DA SOCIOLOGIA
A revolução industrial e a nova ordem social
A Revolução Industrial, realmente, é o marco de uma nova era na história da humanidade, pois 
deu início a uma etapa de acumulação crescente de população, bens e serviços, em caráter permanente 
e sistemático sem precedente. É inseparável do desenvolvimento por ser, fundamentalmente, uma 
revolução produtiva: uma Revolução na capacidade de produção e de acumulação do homem.
Não se trata, apenas, do crescimento da atividade fabril. A Revolução Industrial é fenômeno muito 
mais amplo, constitui uma autêntica revolução social que se manifesta por transformações profundas da 
estrutura institucional, cultural, política e social. (...) (S.1970,3)
A excepcional expansão experimentada pelas economias industriais, a partir da segunda metade do 
século XIX, tem seus antecedentes mais próximos no período de gestação e triunfo da Revolução 
Industrial que pode ser fixado, arbitrariamente, nos cem anos que vão dos meados do século XVIII até 
igual período do século XIX.
(...) Um dos elementos essenciais na gestação das condições que possibilitaram a Revolução 
Industrial foi a acumulação de recursos financeiros proporcionada pela intensificação do comércio 
internacional e pela política mercantilista inglesa de épocas anteriores. O enriquecimento e o 
fortalecimento dos grandes comerciantes e das empresas mercantis significou o advento de novo talento 
empresarial e de importantes recursos de capital na atividade manufatureira e na agricultura. (...) (S. 
1970,7-8)
(...) o capitalista comercial, originado na fase mercantilista anterior, foi levado a introduzir 
modificações substanciais na atividade manufatureira, ainda de natureza artesanal, doméstica e 
marcadamente rural: o capitalista-comerciante reorganiza o trabalho individual ou familiar que 
prevalecia nas oficinas (os Work-shops), onde reúne grupo importante de artesãos a quem fornece 
matéria-prima, energia mecânica, local de trabalho e organização de vendas. (S. 1970, 9).
Do ponto de vista da estrutura produtora, a Revolução Industrial acelerou a profunda 
transformação da atividade agrícola, principalmente pela introdução de novas técnicas que 
intensificaram o uso i do solo e incorporaram novos recursos naturais ao cultivo. Como 
conseqüência, a produtividade inglesa aumentou substancialmente entre meados do século XVII e 
fins do século XVIII.
A Revolução Industrial traduz-se, também, cm profunda transformação da estrutura da 
sociedade. Por exemplo, na reordenação da sociedade rural, com a destruição sistemática da 
servidão e da organização rural, centralizada na vila e na aldeia camponesa, e a conseqüente 
emigração da população rural para os centros urbanos. A transmutação da atividade artesanal em 
manufatureira e. por último, em atividade fabril, deu margem, também, a profundas reformas que 
conduziram à criação do proletário urbano e do empresário capitalista: o primeiro, assalariado, e 
sem acesso à propriedade pessoal dos meios de produção; o segundo, com a função precípua de 
organizar a atividade produtiva na empresa,
A Revolução Industrial implicou, por isso mesmo, o fortalecimento e a ampliação de uma nova 
classe social que vinha sendo configurada em períodos anteriores sobre a base da atividade comer-
cial e financeira; classe esta que passou a exercer considerável influência na criação das condições 
institucionais e jurídicas indispensáveis ao seu próprio fortalecimento e expansão. (S.1970.11)
A Revolução Francesa é o fenômeno histórico que reflete com mais perfeição as aspirações e 
exigências da nova classe burguesa em consolidação. De fato, a Revolução Francesa e a Revolução 
Industrial, que ocorre paralelamente na Inglaterra, constituem as duas faces de um mesmo processo 
- a consolidação do regime capitalista moderno. (S. 1970,12)
Os Mecanismos da Revolução Industrial
Na verdade, os progressos da revolução industrial foram realizados através de uma série de 
desequilíbrios, fonte de perturbações na economia, mas ao mesmo tempo promotores de invenções 
fecundas. (A.1970, 24)
A revolução técnica que se situa geralmente entre 1750 e 1850, que leva à instauração do 
capitalismo liberal, não é senão um momento de uma longa evolução que leva paralelamente ao 
controle da natureza, à tomada do poder pela burguesia e ao "laisser-faire", "lais-er-passer". Esta 
mutação aparece primeiro na Grã-Bretanha, depois ia França, antes de se generalizar no fim do 
período na Europa ocidental e nos Estados Unidos. (A. 1970, 13).
A partir de meados do século XVIII, as técnicas de produção oram profundamente modificadas; 
em menos de dois séculos os homens vão adquirir um controle da natureza sem comparação com o 
jue até então possuíam. Essa Revolução Industrial começa sob a égide da liberdade. Mas, essa 
liberdade tem um significado particular. antes de qualquer outra coisa, trata-se de permitir aos 
empresários industriais que desenvolvam e criem novas formas de produção e de enriquecer. Luta-
se contra os regulamentas, os costumes, as tradições 3 as rotinas, a fim de submeter a organização 
da sociedade aos imperativos de uma classe social - a burguesia; progressivamente, no seu próprio 
seio, um grupo predomina: os empresários industriais. Mais que a liberdade, o capitalismo liberal 
estabelece o reino do capital, dos seus possuidores e dos imperativos de acumulação deste capital. 
(A. 1970,11)
As Crises sociais e Econômicas do Capitalismo Liberal
O nascimento do capitalismo é marcado por graves crises econômicas e sociais. Elas atingem, 
inicialmente, a Inglaterra, país que conheceu o primeiro capitalismo industrial, generalizando-se 
pela Europa.
As primeiras crises sociais do capitalismo colocam o mundo agrícola inglês às voltas com o 
cercamento dos campos, em seguida aparece a luta, antecipadamente perdida, entre os artesãos e a 
indústria; rapidamente, porém, a luta social opõe os operários aos capitalistas.
(...) A maioria dos operários são camponeses e artesãos arruinados; expulsos das terras e das 
aldeias, vivem em ignóbeis condições de alojamento e de promiscuidade. O artesão perde a sua 
antiga qualificação (....) Estamos em presença de uma verdadeira castração de talento. Todos eles 
são desenraizados, considerados pela burguesia como seres úteis mas perigosos. Na França, o 
operário passa a ter uma carteira de trabalho que o submete ao controle da Polícia. Na Inglaterra, o 
operário que deixa seu patrão é passível de ser preso. As condições de trabalho são duras. A jornada 
é de pelo menos 12 horas e não há férias nem feriados. O trabalho das mulheres e das crianças é a 
regra. Praticamente as crianças começam a trabalhar desde a idade de seis anos. É preciso esperar 
pelos meados do século XIX para ver aparecer na França e na Inglaterra uma regulamentação 
quanto ao trabalho da mulher e das crianças. (A. 1970, 46-47).
(...) no século XIX o ritmo da alteração econômica, no referente à estrutura da indústria e das 
relações sociais, o volume de produção e a extensão e variedade do comércio mostrou-se inteira-
mente anormal, a julgar pelos padrões dos séculos anteriores; tão anormal a ponto de transformar 
radicalmente as idéias do homem sobre a sociedade, de uma concepção mais ou menos estática de 
um mundo onde. de uma geração para a outra, os homens estavam fadadosa permanecer na posição 
de vida que lhes fora dada ao nascimento, e onde o rompimento com a tradição era contrário à 
3
natureza, para uma concepção de progresso como lei da vida e da melhoria constante como estado 
normal de qualquer sociedade sadia. (. . .) (D. 1971,313-314)
As novas formas de pensar
(...) é resultado parcial da revolução total do espírito europeu que, tendo se iniciado no 
Renascimento, transformou, por inúmeras ações e reações, nossa maneira de ver o mundo e a vida. 
Na Idade Média, a terra e a obra que a atividade humana cnou sobre ela gozavam de grande 
estabilidade. A Autoridade divina, extra e supraterrena, era um firme ponto de referência. A 
cultura e a natureza se justificavam e se explicavam sobre uma base transcendente. Porém, a razão 
calculadora de Copérnico, Kepler, Galileu. Gassendi e outros fez virar a terra, os espaços se 
ampliaram ao infinito e a humanidade se transformou cm um mero episódio da História do Mundo. 
Este descobrimento deu um impulso decisivo à evolução espiritual que, por caminhos complexos, 
trabalha até o presente na obra de substituir a visão transcendente do mundo pela visão imanente 
(H. 1930, 17-18) O sistema medieval de concepção do mundo foi atingido mais profundamente, 
inicialmente, no terreno religioso. Essa ruptura devia assim abalar as pretensões teóricas e práticas 
de dominação do supranaturalismo da Igreja. No pensamento medieval, que tinha sua pedra angular 
na tradição divina, não era possível um conflito entre a Revelação e a Razão, posto que a filosofia 
não pretendia ser mais que uma serva e apologista da Teologia. Porém, no momento em que a 
Razão se rebelou contra sua condição servil e proclamou sua autonomia, tinha que se desencadear a 
luta contra a Teologia, socialmente dominante. A insuficiência da Razão proclamada pela Igreja foi 
negada pela consciência dessa mesma Razão, fortalecida pelos dados que lhe forneciam a 
experiência e os conhecimentos científico-naturais. Já a partir do século XVI, são muitas as pessoas 
cultas que, renunciando a toda sanção sobrenatural, ordenam seu pensamento e sua vida pela 
autonomia da razão (. . .) Partindo dessa autonomia e confiando apenas nela, chegou-se a uma 
explicação do mundo a partir de um princípio matemático e mecânico. Essa explicação seguia em 
harmonia com uma supranaturalidade da Razão mesma, admitindo um deísmo em que Deus 
continuava sendo cnador, ainda que não governador da máquina do mundo que construiu, pois este 
obedecia, em seu funcionamento, a leis próprias. (. ..) (H. 1930, 18-19)
O Racionalismo
Até o século XVIII o pensamento social caracterizava-se muito mais pela preocupação de 
formular regras de ação do que pelo estudo, frio e objetivo, da realidade social, que gera e 
determina todas as regras. A luta contra o drama e pelo livre-exame, expressões de profunda 
revolução intelectual, vai encontrar, porém, na obra de Descartes e de Bacon, seu modelo mais 
autêntico e a duração de sua influência permaneceu séculos.
O racionalismo daqueles pensadores preconizava que a atitude científica diante dos fenômenos 
— embora não insistissem sobre a noção fundamental de que a realidade é exterior à consciência — 
deve ser despida da influência dos idola e das praenotiones, com o que lançaram as bases do que 
havia de ser o método científico, bases que podem ser resumidas nestes postulados fundamentais:
1. deve-se afastar, no estudo da realidade objetiva , toda e qualquer idéia preconcebida, toda 
noção apriorística sobre os fatos que se estudam;
* Segundo Bacon, idola são os erros mais gerais e inveterados, contra os quais devemos nos 
precaver, a fim de realizar a obra de instauração da ciência, (nota do organizador).
2-o espírito deve ser conduzido à pesquisa pela dúvida, dúvida metódica e construtiva, que analisa e 
investiga, único meio de retirar a verdade dos fatos e não deformar os fatos para ajustá-los a uma verdade 
revelada.
Apesar da função demolidora e construtiva que exerceu na história do pensamento humano e do 
método científico, esse racionalismo não ultrapassou, nem podia ultrapassar, os limites de sua 
determinação histórica, e acabou por cometer muitos dos erros que pretendia combater, resvalando 
para a metafísica (, ..) (CP. 1965,36)
O Positivismo
A crise do antigo regime e a Revolução Industrial tomaram possível o aparecimento dessa nova 
forma da inteligência que é o positivismo, cujo desenvolvimento estará vinculado ao processo 
histórico desse mesmo sistema de contradições sociais que produzem sua gênese. O 
desaparecimento do estado monárquico implica a dissolução da "ordem estamental": à pressuposta 
harmonia do "corpo social unificado" organicamente como "corpo político" se sucede a luta 
declarada de classes, chave do desenvolvimento econômico capitalista e determinante da de-
mocracia como nova forma política.
(...) Com a destruição revolucionária de sua própria alienação estatal, a sociedade se toma 
autoconsciente de seu protagonismo histórico, de sua autêntica realidade: como tal sistema 
autônomo de determinação sua realidade específica entra no primeiro plano da consciência 
secularizada de seus membros: assim a sociedade se constitui como objetividade possível para o 
conhecimento científico. "Em nosso tempo começou-se a observar uma série de fenômenos a que 
antes não se podia destinar um lugar, quer na vida corrente, quer na ciência . . . Importantes 
acontecimentos demonstraram . .. nos novos tempos que aqueles fenômenos se apoiam numa força 
que penetra a existência inteira dos povos e, inclusive, a de cada indivíduo em particular, que se 
acham numa conexão íntima e necessária, e que o conhecimento humano, ao ocupar-se deles, 
chegou a uma dessas descobertas que nos permitem reconhecer, por assim dizer, por trás do mundo 
conhecido até agora e da ordem deste mundo, outro organismo, ainda mais grandioso, de forças e 
elementos. . . Trata-se da sociedade, seu conceito, seus elementos e movimentos." (M. 1970, 31-32)
Diante da velha definição ontológica da sociedade - sem sentido nesse mundo efervescente - 
impõe-se um "conhecimento positivo" que torne possível sua reorganização. A ciência adquire um 
sentido messiânico na hora de remediar a situação social: o padrão atual não é a decisão política, 
ética ou teologicamente fundamentada, mas a aplicação técnica das leis científicas que regem a 
sociedade humana. Deve-se, por conseguinte, construir "positivamente" a ciência social: como ciên-
cia da vida coletiva será um dos ramos fundamentais da ciência da vida em geral ou fisiologia, "uma 
fisiologia social, constituída pelos fatos materiais que derivam da observação direta da sociedade, e 
uma higiene, que contenha os preceitos aplicáveis a tais fatos, são, portanto, as únicas bases 
positivas sobre as quais se pode estabelecer o sistema de organização reclamado pelo estado atual 
da civilização" (Saint-Simon, op. cit., 58), A "positividade prática" da ciência social supõe sua 
"positividade metodológica": do mesmo modo que a praxis médica supõe o conhecimento das leis 
que regem a fisiologia humana, uma praxis política capaz de remediar a patológica situação social 
só é possível a partir da investigação das leis científicas que regem a sociedade humana. Para 
alcançá-las é preciso adotar o mesmo método das ciências naturais: a "fisiologia social" deverá 
"basear todos os seus raciocínios sobre fatos observados e discutidos" (Saint-Simon, loc. cit., 67) 
(...) (M. 1970, 33).
SOCIOLOGIA
O Aparecimento da Sociologia
(...) as transformações econômicas e sociais que assinalam a primeira metade do século XIX e o 
desenvolvimento do métodocientífico noutros setores do conhecimento humano, paralelos à 
sociologia, criaram, a esse tempo, as condições práticas e teóricas, históricas e filosóficas, para a 
organização da sociologia como disciplina, e só nesse quadro, ligando a evolução intelectual às 
condições sociais da liquidação do "ancien regime" e da inauguração da era industrial, é possível 
entender o momento histórico em que a sociologia começou a destacar-se como setor especializado 
de conhecimento, sistematizando-se como ciência.
Interpretada por um prisma idealista, a evolução material, naquela época, parecia aos 
contemporâneos um produto do desenvolvimento intelectual do homem, cujo pensamento 
iluminava os passos da civilização, quando, em verdade, o progresso crescente dos modos de pensar 
sobre fenômenos cada vez mais complexos - e disso a sociologia é uma prova - era produto direto 
5
das novas maneiras de viver e produzir. Nessa época, como se vê, é que a sociologia surgiu; surgiu, 
portanto com a sociedade industrial, ou melhor, com os seus esboços. Surgiu quando do seu ventre 
nasceu o proletariado, e essa circunstância, quase sempre esquecida, é de importância decisiva para 
a compreensão de sua história, de seu método e de seus problemas de hoje. (CP. 1965,37)
A herança intelectual da Sociologia
A Sociologia não se limita ao estudo das condições de existência social dos seres humanos. 
Todavia, essa constitui a porção mais fascinante ou importante de seu objeto e aquela que alimentou 
a própria preocupação de aplicar o ponto de vista científico à observação e à explicação dos 
fenômenos sociais. Ora, ao se falar do homem, como objeto de indagações específicas do 
pensamento, é impossível fixar, com exatidão, onde tais indagações se iniciam e quais são os seus 
limites. Pode-se, no máximo, dizer que essas indagações começam a adquirir consistência científica 
no mundo moderno, graças à extensão dos princípios e do método da ciência à investigação das 
condições de existência social dos seres humanos. Sob outros aspectos, já se disse que o homem 
sempre foi o principal objeto da curiosidade humana. Atrás do Mito da Religião ou da Filosofia 
sempre se acha um agente humano, que se preocupa, fundamental e primariamente, com questões 
relativas à origem, à vida e ao destino de seus semelhantes.
Por isso, seria vão e improfícuo separar a Sociologia das condições histórico-sociais de 
existência, nas quais ela se tornou intelectualmente possível e necessária. A Sociologia não se 
afirma primeiro como explicação científica e, somente depois, como forma cultural de concepção 
do mundo. Foi o inverso o que se deu na realidade. Ela nasce e se desenvolve como um dos 
florescimentos intelectuais mais complicados das situações de existência nas modernas sociedades 
industriais e de classes. E seu progresso, lento mas contínuo, no sentido do saber científico-positivo, 
também se faz sob a pressão das exigências dessas situações de existência, que impuseram tanto ao 
pensamento prático, quanto ao pensamento teórico, tarefas demasiado complexas para as formas 
pré-científicas de conhecimento.
Daí a posição peculiar da Sociologia na formação intelectual do mundo moderno. Os pioneiros 
e fundadores dessa disciplina se caracterizam menos pelo exercício de atividades intelectuais 
socialmente diferenciadas, que pela participação mais ou menos ativa das grandes correntes de 
opinião dominantes na época, seja no terreno da reflexão ou da propagação de idéias, seja no 
terreno da ação. As ambições intelectuais de autores como Saint-Simon, Comte, Proudhon e Le 
Play, ou de Howard, Malthus e Owen, ou de Von Stein, Marx e Riehl iam além do conhecimento 
positivo da realidade social. Conservadores, reformistas ou revolucionários, aspiravam fazer do 
conhecimento sociológico um instrumento da ação. E o que pretendiam modificar não era a 
natureza humana em geral, mas a própria sociedade em que viviam.
Existe, portanto, fundamento razoável para a interpretação segundo a qual a Sociologia 
constitui um produto cultural das fermentações intelectuais provocadas pelas revoluções industriais 
e político-sociais, que abalaram o mundo ocidental moderno (...).
A explicação sociológica exige, como requisito essencial, um estado de espírito que permita 
entender a vida em sociedades como estando submetida a uma ordem, produzida pelo próprio 
concurso das condições, fatores e produtos da vida social. Por isso, tal estado de espírito não só é 
anterior ao aparecimento da Sociologia como representa uma etapa necessária à sua elaboração. No 
mundo moderno, pelo que se sabe, ele se constituiu graças à desagregação da sociedade feudal e à 
evolução do sistema capitalista de produção, com sua economia de mercado e a correspondente 
expansão das atividades urbanas. É que estes dois processos históricos-sociais se desenrolaram de 
modo a ampliar, continuamente, as esferas da existência nas quais o ajustamento dinâmico às 
situações sociais exigia o recurso crescente a atitudes secularizadas de apreciação dos móveis das 
ações humanas, do significado dos valores e da eficiência das instituições.
No plano puramente intelectual, a secularização dos modos de conceber e de explicar o mundo 
está relacionada com transformações radicais da mentalidade média. O efeito mais notável e 
característico dessas transformações consiste no alargamento do âmbito da percepção social além 
dos limites do que era sancionado pela tradição, pela Religião ou pela Metafísica.
Todo sujeito percebe o mundo exterior e as próprias tendências egotistas através de categorias 
de pensamento herdadas da sociedade em que vive. Quando a herança cultural é constituída, 
predominantemente, por categorias de pensamento modeladas pelo influxo direto e profundo das 
tradições, de noções religiosas ou de explicações metafísicas de origem sacerdotal, a percepção 
social acaba sendo condicionada de forma estática e recorrente, o que restringe as potencialidades 
críticas e inconformistas dos agentes humanos em face de suas situações de existência. Qualquer 
análise da conduta, da sociedade ou do destino humano esbarra com o caráter "absoluto", 
"intangível" e "sagrado" das normas dos valores e das instituições sociais reconhecidos 
culturalmente. Nem mesmo uma disposição objetiva ou neutra de reconhecimento das situações de 
existência se torna facilmente acessível. Nas condições de inquietação e de instabilidade, ligadas à 
desagregação da sociedade medieval e à formação do mundo moderno, as inconsistências daquelas 
categorias absolutas e estáticas do pensamento se fizeram sentir com rapidez. Contudo, como se 
estava em uma era de revolução social (e não apenas de transição de um período a outro de uma 
mesma civilização), elas não foram simplesmente impugnadas e rejeitadas: as formas de saber de 
que elas derivavam e que pareciam viciar, de diversas maneiras e sob diferentes fundamentos, o uso 
da razão, é que foram condenadas e substituídas. Seja no plano prático, seja no plano teórico, 
impunham-se tarefas que pressupunham novos padrões de apreciação axiológica, mais ou menos 
livres dos influxos da tradição ou de concepções providencialistas. Portanto, o que se poderia 
designar como consciência realista das condições de existência emerge e progride através de 
exigências de novas situações de vida, mais complexas e instáveis. Daí o enriquecimento dos 
conteúdos e o alargamento dos níveis da percepção social do sujeito, exposto a um cosmos moral 
cm que a capacidade de julgar, de decidir e de agir passa a depender, de modo crescente, do grau de 
consciência por ele alcançado sobre os móveis das ações dos outros ou os efeitosdas possíveis 
alterações da estrutura e funcionamento das instituições.
A essa transformação básica do horizonte intelectual médio, é preciso acrescentar outras duas 
conseqüências, a ela relacionadas. De um lado, as modificações que se produziram na natureza e 
nos alvos do conhecimento do senso comum; de outro, as inovações que se manifestaram no seio do 
pensamento racional sistemático. As modificações por que passou o conhecimento do senso comum 
têm sido subestimadas, em particular devido às inclinações intelectualistas dos autores que estudam 
a história do pensamento no mundo moderno. Mas, elas possuem uma significação excepcional, 
pois foi por meio delas que se projetaram na vida prática as diversas noções que fizeram da 
atividade humana, individual ou coletiva, o próprio cerne de todo progresso econômico, político ou 
cultural. Na verdade, foi o conhecimento do senso comum que se expôs e teve de enfrentar as 
exigências mais profundas e imediatas das novas situações de existência social. Por isso, ele acabou 
servindo como verdadeiro foco de formação e de cristalização das categorias de pensamento, 
historicamente adequadas àquelas situações (...)
Em suma, aos efeitos do processo de secularização da cultura na modificação da mentalidade 
média, do conhecimento do senso comum e do pensamento racional sistemático devem-se: a 
formação do ponto de vista sociológico, a noção de que a vida humana em sociedade está sujeita a 
uma ordem social, e as primeiras tentativas de explicação realista dos fenômenos de convivência 
humana (...) (F. 1960, 273-279).
Papel inicial da Sociologia
(...) Cabia, (...) ao lado da demolição da ordem social do passado, demolição que a filosofia 
enciclopedista tornara racional, racionalizar a construção de uma ordem nova, c com esta missão 
nasceu a sociologia. (CP. 1965, 37-38)
A sociologia do século XIX marca incontestavelmente o momento da reflexão dos homens sobre eles 
mesmos, aquele onde o social como tal é posto em questão, com seu caráter equívoco, ora enquanto 
relação elementar entre os indivíduos, ora enquanto entidade global. Ela também exprime uma intenção 
não radicalmente nova mas original por seu radicalismo, a de um conhecimento propriamente 
7
científico, baseado no modelo das ciências da natureza, tendo em vista o mesmo objetivo: o 
conhecimento científico deveria dar aos homens o controle de sua sociedade e de sua história assim 
como a física e a química lhes possibilitaram o controle das forças naturais. (A. 1967,16-17)
Creio ser legítimo encarar os autores do século XIX como participantes de um debate que era 
sempre o mesmo, sobre a possibilidade de por em prática os princípios anteriormente proclamados pela 
Revolução Francesa. Para sermos mais precisos, eles discutiam a viabilidade da criação de uma 
sociedade racional nas condições de progresso industrial e com os materiais humanos existentes àquele 
tempo. Para esses homens, o termo "racional" possuía um conteúdo social definido e implicava, ainda 
que imprecisamente, a espécie de sociedade que permitiria ao homem tirar o máximo de proveito das 
suas capacidades criativas (M. 1972,97-98)
SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA
A tarefa da Ciência
O objetivo da ciência é tomar inteligível o real. Sendo o real diverso, pode ser apreendido a partir 
de diferentes pontos de vista, o que explica a multiplicidade das ciências, que por sua vez precisa ser 
elucidada, já que é um aspecto do real. Este é o papel da epistemologia, que podemos definir como a 
explicação dos diversos sistemas de explicação da realidade. Trata-se de um problema que sempre 
ocupou a filosofia e que o desenvolvimento atual das ciências humanas coloca em termos novos: a 
discordância entre a unidade da ciência como conceito e a variedade das pesquisas que dá origem a 
ciências particulares, até mesmo divergentes. Em resumo, o problema consiste em conciliar a unidade da 
ciência com a pluralidade das ciências. (F. 1973-75)
O método como um produto histórico
Um dos químicos contemporâneos que desenvolveu os métodos científicos mais minuciosos e mais 
sistemáticos, Urbain, não hesitou em negar a perenidade dos melhores métodos. Para ele, não há método de 
pesquisa que não acabe por perder sua fecundidade inicial. Chega sempre uma hora em que não se tem 
mais interesse em procurar o novo sobre os traços do antigo, em que o espírito científico não pode 
progredir senão criando novos métodos. Os próprios conceitos científicos podem perder sua 
universalidade. Como diz Jean Perrin, "Todo conceito acaba por perder sua utilidade, sua própria 
significação, quando nos afastamos pouco a pouco das condições experimentais em que ele foi 
formulado". Os conceitos e os métodos, tudo é função do domínio da experiência; todo o pensamento 
científico deve mudar ante uma experiência nova; um discurso sobre o método cientifico será sempre 
um discurso de circunstâncias, não descreverá uma constituição definitiva do espírito científico. (B. 
1968, 121)
As Ciências Humanas enquanto Ciências
As ciências históricas e humanas não são pois, de uma parte, como as ciências físico-químicas, 
o estudo de um conjunto de fatos exteriores aos homens, o estudo de um mundo sobre o qual recai 
sua ação. São ao contrário a análise dessa própria ação, de sua estrutura, das aspirações que a 
animam e das alterações que sofre (...) (G. 1970, 27)
Na realidade, sabemos hoje que a diferença entre as condições de trabalho dos "físicos, 
químicos e fisiológicos" e a dos sociólogos e dos historiadores não é de grau mas de natureza; no 
ponto de partida da investigação física ou química há um acordo real e implícito entre todas as 
classes que constituem a sociedade atual a respeito do valor da natureza e do fim da pesquisa. O 
conhecimento mais adequado e mais eficaz da realidade física e química é um ideal que hoje não 
choca nem os interesses nem os valores de qualquer classe social. Neste caso, a falta de objetividade 
no trabalho de um cientista só pode ser causada por defeitos pessoais (espírito de sistema, falta de 
penetração, caráter apaixonado, vaidade, e no limite, falta de probidade intelectual) (...)
Nas ciências humanas, ao contrário, a situação é diferente. Pois se o conhecimento adequado 
não funda logicamente a validade dos juízos de valor, é certo porém que favorece ou desfavorece 
psicologicamente essa validade na consciência dos homens. (...) (G. 1970, 32)
Ora, em tudo o que respeita aos principais problemas que se colocam para as ciências humanas, 
os interesses e os valores sociais divergem totalmente. Em lugar da unanimidade implícita ou 
explícita nos juízos de valor sobre a pesquisa e o conhecimento que está na base das ciências físico-
químicas, encontramos nas ciências humanas diferenças radicais de atitude, que se situam no início, 
antes do trabalho de pesquisa, permanecendo muitas vezes implícitas e inconscientes. (...) (G. 1970, 
32) (...) Retomemos somente: 1) a constatação de que todo pensamento histórico ou sociológico 
sofre profundas influências sociais, no mais das vezes, não explícitas para o pesquisador individual, 
influências que ele nunca poderá eliminar mas que, ao contrário, deverá tornar conscientes e 
integrá-las na investigação científica para evitar ou para reduzir ao mínimo sua ação deformante; 2) 
a necessidade, que se torna evidente nessa perspectiva, de um estudo sociológico das próprias 
ciências sociais e, em termos mais precisos, de um estudo materialista e dialético do materialismo 
dialético. ( . . . ) (G. 1970, 36)
Há sem dúvida muitas ocasiões para o pensamento do indivíduo ser influenciado pelo meio 
com o qual entra em contato imediato; essa influência pode entretanto ser múltipla: adaptação mas 
também reaçãode recusa ou de revolta, ou ainda síntese das idéias encontradas no meio com outras 
vindas do exterior etc. ( . . . ) (G. 1970,48)
Os grandes escritores representativos são aqueles que exprimem, de uma maneira mais ou 
menos coerente, uma visão do mundo que corresponde ao máximo de consciência possível duma 
classe; é o caso sobretudo dos filósofos, escritores e artistas. Para o homem de ciência a situação às 
vezes se apresenta diferente. Sua tarefa essencial é chegar ao conhecimento mais vasto e mais 
adequado da realidade. Ora, precisamente a mencionada independência relativa do indivíduo em 
relação ao grupo permite-lhe, em certos casos, corrigir os limites duma visão por conhecimentos 
adequados, contrários a esta mas perfeitamente compatíveis com outra visão real duma classe 
diferente, ou ainda ampliar os limites da consciência real da classe, numa dada época, pelas 
possibilidades gerais dessa classe no conjunto do período histórico. (...) (G. 1970,48-49)
O fato de não termos ainda, na ciência social, leis comparáveis às das ciências naturais não 
prova, por si mesmo, que tais leis nunca serão descobertas. Sem embargo, justifica que se pergunte, 
mais uma vez, se a ciência social está no caminho certo ao fazer da busca dessas leis a sua principal 
raison d'etre. As diferenças entre a ciência natural e a ciência social talvez pesem mais do que a 
relativa imaturidade da ciência social. A estrutura lógica dos gêneros de conhecimento que 
procuramos na ciência social pode não ser idêntica à das ciências naturais avançadas. (M. 1972,109)
(...) Achamos que a finalidade da Sociologia não é elaborar um sistema fechado de leis 
definidas, mas permitir, pelo estudo científico, que as tornem cônscias de algumas das razões 
sociais para os problemas sociais que experimentam e para serem capazes de dirigir sua atenção aos 
tipos de remédios a eles adequados. Ela também pode ajudá-las a se compreenderem melhor. (C. 
1972, 2S2, 256).
O PROBLEMA DA SUBJETIVIDADE
O Sociólogo enquanto pessoa
Em primeiro lugar, as proposições que (os sociólogos) fazem sobre as pessoas — como elas são 
afetadas por pertencerem a certos tipos de grupos; na verdade, mais do que isso, a de que é 
inconcebível pessoas sem grupos. Mannheim, o famoso sociólogo, assim o expõe: Pertencemos a 
um grupo não só porque nascemos nele, não apenas por confessarmos pertencer a ele e, por último, 
não porque lhe prestamos nossa lealdade e fidelidade, mas principalmente porque vemos o mundo e 
certas coisas no mundo da maneira como ele vê (Mannheim, 1960, pág. 19). Mas os sociólogos 
também são gente; por conseguinte, também são membros de grupos e, tanto quanto é válida a 
afirmação acima, também tenderão a ver o mundo da maneira que o fazem os grupos a que 
9
pertencem. Logo, deveríamos esperar aprender algo sobre o que os sociólogos, como tais, dizem, 
estudando a natureza dos diferentes tipos de grupos aos quais pertencem. (Aqui, estamos usando a 
palavra grupo num sentido muito geral e não apenas pensando em pessoas que se encontram face a 
face.) (C. 1972, 17)
O segundo problema para os sociólogos é que seu assunto está inextricavelmente ligado aos 
tipos de problemas cuja solução, de um modo ou de outro, interessa a todo ser humano; sobre os 
quais existem vastas discordâncias de âmbito continental; pelos quais muitos têm morrido — 
problemas como guerra e paz, socialismo, pobreza, desemprego, as relações entre homens e 
mulheres, etc. Sua investigação envolve os sociólogos em grandes argumentos históricos e lhes 
torna muito difícil divorciar seus próprios pontos de vista, como cidadãos, do seu trabalho como 
sociólogos. Alguns sociólogos têm tentado fugir a esse problema recusando-se resolutamente a 
estudar qualquer coisa que possa, concebivelmente, ter importância social (cf. Moore, 1963). Mas 
na verdade não há como escapar, já que mesmo a decisão quanto ao que estudar ou ao que não 
estudar é uma decisão social e pode ser julgada em termos morais: "Pelo seu trabalho, todos os 
estudiosos do homem e da sociedade assumem e subentendem decisões morais e políticas" (Mills, 
1959, pág. 76). Assim, em maior ou menor grau e de várias maneiras, o sociólogo não pode evitar o 
problema dos valores sociais em seu trabalho. (C. 1972,18-19)
As questões colocadas pelo sociólogo diante da realidade social não são necessariamente as 
mesmas que as colocadas pelo homem de ação. As questões pertinentes em sociologia são da ordem 
do conhecimento e da explicação: e somente permanecendo a sociologia fiel ao que ela é enquanto 
disciplina científica é que sua contribuição na intervenção social será válida.
Três problemas principais dominam (...) a pesquisa teórica e empírica na sociologia geral. 
Podem ser enunciadas nos seguintes termos:
—como explicar que as coletividades humanas existam e se mantenham? e correlativamente 
como o indivíduo se liga a essas coletividades?
—como se organizam ou se estruturam os quadros sociais da vida humana?
—como se produz e se explica a mudança, a evolução das sociedades humanas? (R. 1968,10)
—
A lei do comprometimento
O sociólogo, como qualquer especialista em ciências sociais, está sempre condicionado, em sua 
especulação, por um a priori de caráter existencial, tenha ou não consciência disso. Decorre o fato 
de que sua consciência se elabora invariavelmente a partir do trato com os objetos e as pessoas do 
mundo particular em que vive, Não existe um eu acósmico ou a-histórico capaz de postar-se diante 
do mundo, livre de condicionamentos. O eu e a consciência do eu brotam do "nós" que os antecede 
lógica e historicamente. A consciência ingênua não percebe a implicação recíproca do ser humano e 
do mundo. Resíduo de ingenuidade se encontra na atitude do cientista que acredita numa ciência 
imune de condicionamentos. Ao refletir sobre os supostos da atividade científica, ver-se-á que está 
implicada numa teia de relações complexas que constituem o mundo tal como aparece ao cientista 
que nele vive (...)
(...) O conhecimento, descritivamente, é uma relação entre a consciência cognoscente e o 
objeto, na qual se verifica reciprocidade de influência, fato este que não foi visto pelas antigas 
teorias gnoscológicas. No plano histórico-social essa reciprocidade de influência permite 
compreender a idéia de mundo, que torna inteligíveis as relações entre o sujeito e o objeto. O 
mundo não é uma coleção de objetos que possamos contemplar do lado de fora. Estamos 
necessariamente no mundo e por ele somos constituídos. O homem é ser-no-mundo, não, porém, 
como um par de sapatos está numa caixa, mas enquanto suas ações implicam o mundo, ou uma 
visão prévia do mundo (Welt-anschauung). (G. 1965, 113-114)
(...) A atual teoria filosófica do mundo é tributária das indagações de pensadores alemães a 
respeito do que são as visões do mundo. É comum a esses pensadores o ponto de vista de que a 
visão do mundo não é adquirida por esforço intelectual, nem pode ser exposta como se explica uma 
doutrina ou um sistema de idéias. A visão do mundo, apesar disso, é sistema porque é configuradora 
de atos e de idéias, tem organicidade. Mas não é puramente intelectual e, por isso, não se pode 
neutralizar seu efeito condicionador sobre a atividade científica. Porque nos integramos na 
totalidade do mundo "de modo não intelectual" é que nossa existência supõe um a priori histórico-
social. Não aceitamos uma visão de mundo como esposamos uma doutrina ou nos convertemos a 
uma religião. Vivemos necessariamente a visão de mundo de nossa época e de nossa nação. (G. 
1965, 115)
(...) Supor que o homem teoriza primeiro e age depois é incorrer em erro. O homem não se 
esgota no pensar, é também sentir e querer. O pensaré apenas um aspecto particular da vida, que 
consiste em converter em objeto determinado conteúdo do agir humano. A nova teoria, resultante 
do esforço de pensar, era, no agir humano, uma virtualidade. É precisamente a reflexão que torna 
explícita e exprime, de modo elaborado, a virtualidade implícita no agir humano. A pergunta 
famosa: "quem educa o educador? " só tem uma resposta — a sociedade, e não outro educador. E 
assim se desfaz a polaridade entre teoria e prática. Por que a sociedade? Porque é um fenômeno 
total. É pressuposto essencial da categoria de totalidade, a idéia de implicação. O verdadeiro 
educador sabe que só conseguirá levar a efeito a pedagogia que lhe possibilitem as condições 
sociais determinadas em que vive. Tem a consciência da implicação do homem no
mundo. (G. 1965, 116)
Há ainda um vício eurorocêntrico em tais estudos, expresso no academicismo que os afeta. 
Aqui se verifica um limite imposto ao: estudioso europeu. A sua prática social entra em conflito com 
a prática do estudioso de regiões subdesenvolvidas. 0 estudioso europeu só poderá ultrapassar esse 
limite se, por um esforço de "desideologização", adotar, em caráter sistemático, o ponto de vista 
universal da comunidade humana. Só assim transcenderá o seu contexto histórico-social particular. 
(G. 1965, 118)
Nos países periféricos, é a adoção sistemática de um ponto de vista universal orientado para o 
futuro que possibilita a redução sociológica. É o imperativo de acelerar, de modo historicamente 
positivo, a transformação de contextos subdesenvolvidos que impõe ao cientista de países 
periféricos a exigência de assimilar não mecanicamente o patrimônio científico estrangeiro. Esta 
exigência se torna particularmente aguda quando, naqueles países, se deflagram impulsos concretos 
de ordenação própria ou de articulação interna. Enquanto permanecem ordenados ou articulados 
para fora, refendos a um centro dominante que lhes é exterior, carecem da condição mesma que os 
habilitaria à prática da redução global de um país situado no âmbito de dominação de outro mais 
poderoso, no sentido de obter capacidade autodeterminativa. Nesses países periféricos, a sociedade 
não está fundada segundo critérios próprios, é algo a fundar (...) (R., 1965, 119)
A transformação do sociólogo em técnico
(...) o falso dilema teórico da sociologia na América Latina não se esclarece de modo completo 
senão quando deslindamos a metamorfose do sociólogo em técnico. É que se diferenciam e se reno-
vam os papéis do cientista, explicitando-se assim novos significados da própria ciência.
Não há dúvidas de que a sociologia — como a economia política, a ciência política, a história, a 
antropologia - está continuamente submetida a duas ordens de solicitações. Existe mesmo certa 
duplicidade nos alvos da atividade científica do sociólogo. Por um lado, o círculo dos especialistas 
estabelece objetivos e padrões de trabalho científico, em conformidade com o caráter cumulativo da 
ciência. Em sua história e em seus desenvolvimentos teóricos, as diferentes correntes vão 
selecionando conceitos e problemas, técnicas e concepções que implicam na constituição de um 
corpo teórico, ao qual os sociólogos precisam ater-se. É óbvio que o problema da objetividade e da 
neutralidade se colocam neste ponto ( . . . )
(...) O que alguns críticos apresentam como simples "especulação", "filosofia social" ou 
"ensaísmo", muitas vezes são interpretações pioneiras, que abrem perspectivas novas à reflexão e à 
pesquisa. (...)(I. 1971, 18-19)
A ciência não destrói a imaginação; ao contrário, ela tende; exercitar e disciplinar as suas 
funções (...)
11
"A imaginação sociológica habilita-nos a apanhar a história e i biografia, e as relações de 
ambas no interior da sociedade. Essa é i sua tarefa e promessa. Nenhum estudo social se completa 
se não estiver voltado para os problemas da biografia, da história e das suai conexões recíprocas na 
sociedade" (C. Wright Mills, The Sociological Imagination)
Todavia, há outra ordem de solicitações. (...), a sociedade como um todo, ou certos círculos de 
influência, solicitam à socióloga estudos especiais, voltados para determinados problemas 
"práticos". A realidade social se impõe ao sociólogo, filtrada pelos interesses particulares ou gerais, 
conforme a situação. Em última instância, solicita o trabalho do cientista para "validar" ou 
"invalidar" uma dada configuração social presente, pelo estudo do próprio presente ou do passa do. 
A UNESCO quando estimulou e subsidiou estudos sobre as relações raciais no Brasil, estava 
interessada em conhecer para difundi em outras nações os característicos modelares de uma 
"democrata racial". Foram também "necessidades práticas", isto é, a gravidade ei profundidade das 
tensões sociais na sociedade rural brasileira que levaram o Centro Latino Americano de Pesquisas 
em Ciências Sociais a programar e orientar a realização de estudos sobre o regime de posse e uso da 
terra.
Essas são as duas "tendências" sempre ativas no trabalho i sociólogo. Inevitavelmente, elas 
afetam tanto a seleção dos temi como o seu tratamento mais ou menos amplo. A realização apeni 
descritiva ou ao modo interpretativo, analítica ou sintetizadora, monográfica ou de interpretação 
global, depende da intensidade e da direções dessas influências. Não há dúvidas, contudo, de que a 
soa logia progrediu geralmente envolvida em solicitações imediatas ou I diretas das condições de 
existência social presentes. (...).
Esse é o contexto mais geral das transformações dos papéis d sociólogo e das possibilidades de 
utilização prática do pensamento científico nas ciências sociais. Nesse movimento, dá-se a gênese i 
técnico. A ciência guarda sempre a sua conotação de técnica de autoconsciência da realidade social. 
O caráter "instrumental" do conhecimento sociológico é algo de que a sociedade não quer nem pode 
prescindir. E essa necessidade surge tanto no plano mais amplo, de permuta e correspondência entre 
as condições de existência social com a estrutura do pensamento científico, como no plano 
particular da utilização prática, imediata, institucionalizada do conhecimento científico. Neste caso, 
estamos em face do técnico. É ele que trabalhará diretamente na formulação de programas 
governamentais e privados, bem como na execução e controle da sua execução. A relação entre o 
sujeito e o objeto, no processo do conhecimento sociológico, é um fenômeno que está na base dessa 
questão. Em última instância, o que ocorre é que há vários modos de integração entre o sujeito e o 
objeto.
Devido à complexidade e diferenciação interna crescentes dos sistemas socioeconômicos 
latino-americanos, e em decorrência das exigências cada vez mais numerosos das massas que 
irrompem continuamente nos centros urbanos e industriais em transformação acelerada; e, ainda, 
devido às mudanças sociais aceleradas que estão ocorrendo em certas zonas agrícolas e mineiras, 
multiplicam-se os "problemas sociais", com os quais se defrontam empresários e assalariados, 
administradores e políticos, cientistas sociais e educadores. A necessidade de elaborar planos 
setoriais, regionais e também nacionais, bem como a emergência e multiplicação de tensões e 
problemas sociais, no âmbito das relações entre grupos e classes, levaram as autoridades, os grupos 
empresariais, os sindicatos etc. a estimular a formação de técnicos em assuntos sociais. A 
transformação do sociólogo em técnico ocorre nesse contexto. Pouco a pouco, a sociologia 
desenvolve a sua conotação de técnica de resolução de tensões ou canalização destas em direções 
não "destrutivas".
(...) A experiência dos grandes países industrializadoscolocou em evidência a importância 
crescente do papel que as ciências sociais têm na resolução destes problemas, bem como no 
conhecimento do processo de desenvolvimento econômico e social. Já se demonstrou que não há 
inversões de capital que possam ser produtivas, a longo prazo, sem investimentos humanos 
paralelos, se possível anteriores. Como em outras esferas, o fator humano continua a ser o fator 
decisivo do desenvolvimento dos países da América Latina. Uma das tarefas prioritárias nesta parte 
do mundo, pois, é constituir rapidamente um contingente de especialistas em ciências sociais, 
qualificados e aptos para realizar pesquisas científicas, que são as únicas que podem fundamentar a 
ação sobre o conhecimento. Nesse texto estão reunidos os elementos fundamentais das reflexões 
que estamos desenvolvendo neste ensaio. Nele destacam-se temas tais como os seguintes: a 
vinculação íntima entre o pensamento cientifico e as condições de existência social, principalmente 
quando estas aparecem e se impõem como "problema"; a sociologia como uma técnica de 
autoconsciência científica da realidade social: a metamorfose do sociólogo em técnico. (I, 1971, 23-
24)
Institucionaliza-se a atividade de técnico, em âmbito continental. As tarefas do 
desenvolvimento econômico e as suas implicações sociais, mobilizaram economistas e sociólogos. 
Aqui de novo ressurge a preocupação com a objetividade neutra do trabalho científico. É j dado 
como pressuposto que, "no plano puramente técnico", a atividade científica do economista e do 
sociólogo é neutra. Estamos no plano da sociologia da "inteligentsia", de Karl Mannheim.
Esse mesmo processo está em curso nas diferentes nações latino-americanas. No Brasil, ele está 
em franco progresso. A própria regulamentação da profissão de sociólogo, em fase de debate, prevê 
a definição das atividades técnicas do sociólogo. Com o progresso da racionalização, espraiando-se 
pelo sistema social como um todo, em todas as suas esferas, a ciência se torna essencial nas 
organizações e nas ações sociais. Substituem-se os padrões legados pela tradição por aqueles 
elaborados por intermédio do método científico. Os atos humanos traduzem-se em variáveis.
É óbvio que essas transformações envolvem problemas sérios no campo do conhecimento 
científico. À medida que o sociólogo se modifica num técnico, o seu instrumental de investigação e 
reflexão tende a refinar-se. É aí que reaparece de uma maneira clara e impositiva a necessidade de 
organizar a atividade intelectual com base na manipulação de variáveis. As exigências práticas 
impõem que a pesquisa se realize em período de tempo predeterminado, atenda a recursos 
financeiros e humanos prefixados e alcance conclusões precisas e sumárias. Muitas vezes essas 
conclusões devem ser susceptíveis de com paração com resultados obtidos em estudos paralelos, 
realizados ao I mesmo tempo em outras comunidades ou nações. Tudo isso envolve a eleição de 
varáveis quantificáveis, como focos de observação e interpretação. (I. 1971,24-25)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARON, Raymond - Les étapes de Ia pensée sociologique. Paris, E
tions Gallimard, 1967 ALBERTINE, J.M - Capitalismes et socialismes à Vépreuve. Pa:
Editions Économie et Humanisme, 1970 BACHELARD, G. - O novo espirito cientifico. Tradução 
de Juver
Hahne Júnior. Rio, Edições Tempo Brasileiro, 1968. COSTA PINTO - Sociologia e 
desenvolvimento. Rio, Editora Civili2
çà"o Brasileira. 1965 COULSON, Margaret A. e RIDDEL, David S. - Introdução critica
sociologia. Tradução de Edmond Jorge. Rio, Zahar Editore
1972 DOBB, Maurice - A evolução do capitalismo - Tradução de Affon
Blacheyre. Rio, Zahax Editores, 1971. FERNANDES, Florestan - Ensaios de sociologia geral e 
aplicada. Si
Paulo, Livraria Pioneira Editora, 1960. FREUND, Julien - Les theories des sciences humaines. 
Paris, Press
Universitaires de France, 1973 GOLDMANN, Lucien - Ciências humanas e filosofia. Tradução (
Lupe Cotrim Garaude e José Arthur Giannotti. São Paulo. Difi
são Européia do Livro, 1970. HELLER, Hermann - Las ideas políticas contemporâneas. Barcelon
Editorial Labor, 1930 IANN1, Octavio - Sociologia da sociologia latino-americana. Rio, C
vilização Brasileira, 1971 MOORE JR., Barrigton - Poder político e teoria social. Tradução d
Octávio Mendes Cajado. São Paulo, Cultnx, 1972
MOYA, Carlos - Sociólogos y sociologia. Madrid, Siglo XXI de Espa fla Editores, 1970.
RAMOS, Guerreiro - A redução sociológica. Rio, Edições Tcmpc Brasileiro. 1965
ROCHER, Guy - Introciuction à Ia sociologie généralc, Vol. I Paris Editions HMH, 1968
13
SUNKEL, Osvaldo - O marco histórico do processo de desenvolvimento - subdesenvolvimento. 
Tradução de Regina Maia. Rio. Foram Editora, 1971
TRADUÇÃO DE: Anna Maria de Castro Maura Ribeiro Sardinha
REVISÃO TÉCNICA DE: Anna Maria de Castro
MOVA, Cailos - Sociólogos y sociologia. Madrid, Siglo XXI de Espa- 
fia Editores, 1970.
RAMOS, Guerreiro - A redução sociológica. Rio. Edições Tempo 
Brasileiro, 1965
ROCHER, Guy - Introduction à la sociologie générale, Vol. I Paris.
Editions HMH, 1968 
SÜNKEL, Osvaldo - O marco histórico do processo de desenvol­
vimento - subdesenvolvimento. Tradução de Regina Maia. Rio, 
Forom Editora, 1971
TRADUÇÃO DE:
Anna Maria de Castro 
Maura Ribeiro Sa~dinha
REVISÃO TÉCNICA DE: 
Anna Maria de Castro
PARTE II
DURKHEIM, WEBER, MARX, PARSONS
 Augusto Comte, Marx c Tocqueville 
formaram seu pensamento na primeira metade
 do século XIX. Tomaram como tema de tua 
 reflexão a situação das sociedades européias, 
 depois do drama da Revoluçio e do Impe no, 
 e se esforçaram cm apreender o significado da 
 crise que acabara de se realizar e a natureza da 
 sociedade que nascia. Mas essa sodedade mo­
 derna era definida segundo os três autores de 
 maneira diferente: aos olhos de A. Comte, a 
 sociedade modems era industrial: para Marx, 
 capitalista; para Tocqueville, democrática. A 
 escolha do adjetivo revelava o ângulo sob o
 qual cada um deles via a realidade de seu
 tempo.
 (Raymond Aron, 
 Les Etapes de la Pensée Sociologique. p. 
307)
DURKHEIM
É a Sociedade que devemos interrogar,são suas 
necessidades que devemos conhecer. já que é a 
essas necessidades que devemos satisfazer.
 (D. 1968.101)
D U R K H E I M
DATAS DADOS BIOGRÁFICOS OBRAS
1852
1856
1858 — Nasce Durkheim em Epi- 
nal, Loraine na fronteira 
Nordeste da França. Famí­
lia de ascendência judaica.
1864
1871
 1879 — Durkheim entra na Ecole
 Normale Supériew onde 
 segue oi cunoa dê Puatel 
 de Coulanges e de Bou- 
 troux.
FATOS HISTÓRICOS
A. Comte e Catecismo Posi­
tivista.
Congresso e Tratado de Paris.
Recuo da influência russa e 
o apogeu do prestfeio de 
Napoleáo III
Fundaçlo em Londres da I 
Internacional (AssociaçSo 
Internacional de TraMha- 
dores)
Armist fdo franc o-p nus ano
DATA
1888
1891
1893
1895
 
 
 
 
 
 
DADOS BIOGRÁFICOS OBRAS
Publica na Revue Phüoso- 
phique artigo sobre Suicide 
et NataUti (Suicídio e Nata­
lidade). Publica na Revue 
Internationale de Venseiffte- 
ment - Cours de Science 
Sociale, Leçon d’ouverture 
(Curso de Ciência Social — 
Aula Inaugural).
— Defende tese de doutorado. — De la division du travail so­
cial (DiviiSo do trabalho so­
cial) - tese de doutoramen­
to. Lc contribution de Mon­
tesquieu i Ia constituitkm 
de Ia Science sociale (Con tri- 
buiçio de Mantesquien na 
constituiçlo da ciência so­
cial)
— Les rigies de Ia mithode 
sociologique (Aa regrai do 
método sociológico)
DATAS DADOS BIOGRÁFICOS OBRAS FATOS HISTÓRICOS
 1882 - Concurso de Docência cm Formação da Tríplice Alian 
 filosofia (agreganon). No­ ça com a adesãoitaliana à 
 meado Professor em Sens aliança austro-alemã.
 e Saint-Quentin.
 1885 Solicita uma licença para - Conferência de Berlim (par­ 
 estudar ciências sociais em tilha das áreas coloniais)
 Paris e depois na Alemanha 
 com Wundt. (até 1886)
 1886 - Retoma da Alemanha.
 1887 - Nomeado professor de pe- — Publica na Revue Philosophí-
 dagogia e ciência social na que os artigos: Les etudes
 Faculdade de Letras da récentes de science sociale
 Universidade de Bordéus (Estudos recentes da ciência 
 (primeiro curso de sociolo­ social); La science positive
 gia criado nas universida­ de la morale en AUenutgne
 des francesas). (A cicncia positiva da moral 
 na Alemanha); La philoso­
 phic dam les universitês alie-
 mandes (A filosofia nas uni­
 versidades alemãs)
FATOS HISTÓRICOS
— En cíclica Re rum — Novarum 
sobre a Sociedade Industrial.
DATAS DADOS BIOGRÁFI COS OBRAS FATOS HISTÓRICOS
18% -
1897
1899
1902
1904
Funda L ’annèe Sociobgi- 
que - jornal orientador do 
pensamento e da pesquisa 
sociológicos na França.
- Nomeado professor-substi- 
tuto na cadeira de pedago­
gia na Soibonne.
1906 -
1908
- Le Suicide (0 Suicídio)
Nomeado professor-titular 
da cadeira de pedagogia da 
Faculdade de Letras de 
Paris, onde ensina parale­
lamente sociologia e peda­
gogia.
Adotado o sufrágio univer­
sal na França.
— Início do affaire Dreyfus.
— Primeira Conferência de Paz 
em Haia.
Guerra russo-japoncsa. For­
mação de Entente Conllaie 
(França-Inglaterra).
— La determination du fait 
moral (A determinação do 
fato moral)
— Comunicação à Sociedade 
Francesa de Filosofia.
C. Sorcl = Réflexiom sur la 
violence.
 
 
 
 
 
 
DATAS DADOS BIOGRÁFICOS OBRAS FATOS HISTÓRICOS
 1911 Jugement de realité et juge-
 ment de X'aleur (Julgamento 
 de realidade e julgamento de 
 valor). Comunicrcão ao Con­
 gresso de Filosofia de Bolo­
 nha.
 1912 Les formes élémentaires de II Conferência de Paz de 
 la vie religieuse (As formas Haia.
 elementares da vida religio­
 sa).
 1913 - A cadeira de que 6 titular 
 passa a se denominar Ca­
 deira de Sociologia da Sor- 
 bonne.
 1914 Explosão da crise européia. 
 DedaraçJo de guerra
 1915 Durkbeim perde seu filho L'AUemagne au dessus de
 único, morto no front de tout. La men tali té aliemut-
 Salonique. Publica dois li* de et ia guerre (A Alemanha 
 vros inspirados na circuns­ acima de tudo. A mentalida­
 tância. de alemf e a guerra), Qui a
 voulu b guerre? Les origines
 de la guerre daprês docu­
 ments diplomatiques Quem 
 quis a guerra? As origens da 
 guerra segundo documentos 
 diplomáticos).
 
 
 
 
 
AULA INAUGURAL 
DO CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
BORDEAUX, 1887)
Senhores:
Encarregado de ensinar uma ciência nascida ontem, c que possui 
apenas um pequeno número de princípios definitivamente estabeleci­
dos, seria uma temeridade de minha parte nSo estar assustado diante das 
dificuldades de minha tarefa. Aliás, esta còhfíssSo i feita sem esforço e 
sem constrangimento, Com efeito, creio que nas nossas Universidades, 
ao lado das cadeiras do alto das quais se ensina a ciência feita e as 
verdades adquiridas, existe lugar para outros cursos, onde o professor 
faz ciência na medida em que a vai ensinando, onde ele encontra, entre 
seus ouvintes, quase tanto colaboradores quanto alunos, onde ele pro­
cura com eles e às vezes se perde com eles. Eu nSô venho, pois, lhes 
revelar uma doutrina da qual uma pequena escola de "SociologB.tás" 
teria o segredo e o privilégio, nem sobretudo lhes propor remédios 
prontos para curar nossas sociedades mode nus dos males que possam 
sofrer. A ciência não caminha tio ripido, é necessário tempo, muito 
tempo, sobretudo para poder ser aplicada. Desta fomu, o inventáfio do 
que lhes trago é modesto e fácil. Acredito poder colocar com preàslo 
uma série de questfies especiais que se ligam umas às outras de forma a 
constituir o centro de outras ciências positivas. Para resolver esses pro­
blemas eu lhes proporia um método que tentaremos juntos. Dos meus 
estudos sobre estas matérias retirei algumas idéias diretrizes, algumas 
visões gerais, um pouco de experiência que, espero, servi ri para nos 
guiar em nossas próximas pesquisas.
Contudo, espero que esta restriçío nio tenha como efeito desper­
tar em alguns de vocês o ceticismo do qual os estudos de sodòlpgn 
foram muitas vezes objeto. Uma ciência jovem nSo deve ser muito
47
ambiciosa, e cia tem tanto mais crédito junto aos espíritos científicos 
quanto mais ela se apresenta com modéstia. No entanto, não posso 
esquecer que existem ainda alguns pensadores, pouco numerosos, na 
verdade, que duvidam de nossa ciência e de seu futuro. Não podemos, 
evidentemente, nos abstrair disto. Mas, para convencê-los, o melhor 
inítodo não é, creio eu, dissertar de uma maneira abstrata sobre a 
questão de saber se a sociologia é ou não viável. Uma dissertação, por 
excelente que seja, nunca converteu um só incrédulo. O único meio de 
provar o movimento é andando, o único meio de demonstrar que a 
sociologia é possível é mostrando que ela existe e que ela vive. Por essa 
razão, vou dedicar esta primeira lição às diferentes etapas pelas quais 
passou a ciência social desde o começo deste século; mostrar-lhes-ei os 
progressos feitos e os que restam por fazer; o que ela se tomou e o que 
ela se toma. Depois, voc s poderão concluir, por vocês mesmos, os 
serviços que este ensino pode prestar e o público ao qual deve se dirigir.
Desde Platão e sua República, não faltaram pensadores que tives­
sem filosofado sobre a natureza das sociedades. Mas, até o começo deste 
século, a maioria desses trabalhos era dominada por uma idéia que 
impedia de maneira radical que a ciência social se constituísse. Com 
efeito, quase todos esses-teóricos da política viam na sociedade uma 
obra humana, um fruto da arte e da reflexão. Segundo eles, os homens 
passaram a viver juntos porque acharam que seria útil e bom; foi um 
artifício imaginado por eles para melhorar um pouco sua condição. 
Uma nação não seria, então, um produto natural, como um organismo 
ou uma planta que nasce, cresce e se desenvolve em virtude de uma 
necessidade interna; lembraria, isto sim, as máquinas construídas pelos 
homens, cujas partes são reunidas segundo um plano pré-concebido. Se 
as células que compõem o corpo de um animal adulto se tomaram o 
que são, é porque estava em sua própria natureza sê-lo. Se estão agrega­
das de uma determinada maneira, é que, devido ao meio-ambiente, era 
impossível para elas se agregarem de forma diferente. Ao contrário, os 
fragmentos de metal que compõem um relógio não têm nenhuma afini­
dade especial, nem por uma determinada forma nem por um determina­
do modo de combinação. Se estão reunidos assim e não de outra manei­
ra é porque este foi o desejo do artista. Não é a natureza deles, mas a 
vontade do artista que explica as mudanças sofridas; foi ele que os 
organizou da maneira mais adequada a seus desígnios. Ocorre com a 
sociedade o mesmo que com esse relógio. Não haveria ftada na natureza 
do homem que o predestinasse necessariamente â vida coletiva; ele pró­
prio a teria inventado e instituído. Que seja obra de todos, como deseja 
Rousseau, ou de um só, como pensa Hobbes, ela teria saído inteiramen-
48
 te de nosso cérebro, de nora Imaginiçlo. Ela seria em nossas mãos 
apenas um instrumento cômodo, de que seria possível abrii mio, c 
sempre que necessário, poderíamos modificar segundo nossos desejos; 
porque podemos livremente desfazer aquilo que livremente fizemos Se 
somos os autores da sociedade, podemos destruí-la ou transformá-la.
 Basta para isso que o queiramos.
 Foi essa, senhores, a concepção que reinou até os últimos tempos. 
Sem dúvida, em raros intervalos, aparece uma idéia contrária, mas ape­
nas por algumtempo e sem deixar atrás de si traços duráveis. O exem­
plo de Aristóteles, primeiro a ver na sociedade um fato da natureza, 
ficou quase sem seguidores. No século XVIII, a idéia renasce com Mon­
tesquieu e Condorcet, mas o próprio Montesquieu, apesar de ter deda* 
rado com ênfase que a sociedade, como o resto do mundo, está subme­ 
tida a leis necessárias, derivadas da natureza das coisas, deixou escapar 
as conseqüências de seu princípio, assim que o colocou. Ora, nessas 
condições, não existe lugar para uma ciência positiva da sociedade, mas 
somente para a arte política. A ciência, com efeito, estuda aquilo que é; 
a arte combina os meios tendo em vista o que deve ser. Se, portanto, as 
sociedades sío o que delas fazemos, nlo há por que nos perguntarmos o 
que elas s£o, mas em que devemos tomá-las. Como nâo podemos contar 
com sua natureza, nio é necessário conhecê-la; basta fixar o fim que 
elas devem preencher e encontrar a melhor maneira de ananjar as coisas 
para que este fim seja bem preenchido. Colocaremos, por exemplo, que 
o objetivo da sociedade é o de assegurar a cada indivíduo o livro exer­ 
cício de seus direitos, e disto deduziremos toda a sociologia.
 - Os economistas foram os primeiros a proclamar que as leis sociais 
são tão necessárias quanto as leis físicas e a fazer deste axioma a base de
uma ciência. Segundo eles, é impossível que a concorrência não nivele 
pouco a pouco os preços, que o valor das mercadorias não aumente com 
o crescimento da populaçfo, que os corpos nio caiam em vertical ou 
que os raios luminosos nio sejam refratários quando atravessam meios 
de densidade desigual. Quanto às leis civis que os príncipes fazem ou 
que as assembléias votam, elas devem apenas exprimir, sob uma forma 
sensível e ciara, estas leis naturais; nio podem nem criá-las nem mudá- 
las. Nio sé pode, por decreto, dar valor a um produto que nio o tem, 
ou seja, que ninguém necessita, e todos os esforços dos governos para 
modificar, segundo seus desejos, as sodedades, sio inúteis, quando nio 
nocivos; assim, o melhor é que eles se abstenham. Sua intervençio só 
pode ser prejudicial: a natureza nlo tem necessidade deles. EU segue 
sozinha seu curso sem que seja preciso ajudá-la ou forçá-la, mesmo que 
isso fosse possível.
49
 Aplique esses princípio a todos os fatos sociais c a sociologia estará 
 fundada. Com efeito, toda ordem especial de fenômenos naturais, sub* 
 metidos a leis regulares. pode ser objeto de um estudo metódico, ou 
 seja. de uma ciência positiva. Todos os argumentos de dúvida fracassam 
 face a esta verdade tão simples. Mas. di7em os historiadores, nós estuda­
 mos as sociedades e nelas nio encontramos nenhuma lei. A história nio 
é mais que um suceder de acidentes que. sem dúvida, se ligam uns aos 
outros segundo as leis da causalidade, mas sem jamais se repetir. Essen­ 
cialmente locais e individuais, eles passam para nunca mais retomar e 
são, por conseguinte, refratários a toda generalização isto é, a todo 
estudo científico, já que não existe ciência do particular. As instituições 
econômicas, políticas, jurídicas dependem da raça, do clima, de todas as 
circunstâncias do meio onde se desenvolvem: são quantidades heterogê­
 neas que não permitem comparação. Apresentam em cada povo sua 
 fisionomia própria, que podemos estudar e descrever com cuidado; tudo
 poderá scr dito a partir de boas monografias.
 O melhor modo de responder a essa objeção e de provar que as 
sociedades estão submetidas a leis. como todas as coisas, seria encontrar 
 essas leis. Mas, mesmo antes disso, uma indução muito legítima nos 
 permite afirmar que elas existem. Um ponto fora de dúvida, hoje em 
 dia, é que todos os seres da natureza, do mineral ao homem, dependem 
 da ciência positiva, quer dizer, tudo ocorre segundo leis necessárias. 
 Esta proposição não tem atualmente mais nada de conjectural, é uma 
verdade que a experiência demonstrou porque as leis sfo encontradas 
ou, pelo menos, descobertas pouco a pouco. Sucessivamente a física e a 
química, depois a biologia e, enfim, a psicologia se constituíram.
 Podemos mesmo dizer que, de todas as leis, a mais bem estabeleci­
da experimentalmente - pois dela não se conhece uma só exceção e foi 
verificada uma infinidade de vezes - é a que proclama que todos os 
 fenômenos naturais evoluem segundo leis. Se, então, as sociedades estão 
 na natureza, elas devem também obedecer a esta lei geral que, ao mes­ 
mo tempo, resulta da ciência e a domina. Sem dúvida, os fatos sociais 
são mais complexos que os fatos psíquicos, mas estes, por sua vez, não 
são muito mais complexos que os fatos biológicos e físlco-qufmicos, e 
no entanto já não se pode, hoje, colocar em questão a existência da vida 
consciente fora do mundo e da ciência. Quando os fenômenos são 
menos simples, seu estudo é menos fácil, trata-se de uma questão de 
caminhos e meios, não de princípios. De outro lado, porque são com­ 
plexos, tém algo de mais flexível e tomam com maior facilidade as
 impressões das menores circunstâncias que os cercam. Por esta razão
 tém um ar mais pessoa] e se distinguem mais uns dos outros. Contudo,
SO
 nffo devemos permitir que as diferenças nos façam desconhecer as ansio- 
 gias. Sem dúvida, existe uma diitinda enorme entre a consciência do 
 selvagem e a do homem culto; no entanto, uma e outra sSo consciências 
 humanas entre as quais existem semelhanças que podem ser compara- 
 das: o psicólogo, que tira correlações destas úteis informações, sabe 
 disso. O mesmo ocorre com a fauna e a flora, no meio das quais o 
 homem evolui. Por mais diferentes que possam ser uns dos outros, os 
 fenômenos produzidos pelas açOes e reações que se estabelecem entre os 
 indivíduos semelhantes, colocados em meios análogos, devem necessa­
 riamente se assemelhar de alguma forma e se prestar a úteis compara­
 ções. Para fugir a essa conseqüência, alegaremos que a liberdade humana 
 exclui toda idéia de lei e toma impossível toda previsio cientifica? A 
 objeçffo, senhores, deve nos deixar indiferentes e podemos negligenciá- 
 la, nffo por desprezo, mas por método. A questão de saber se o homem 
é livre ou nffo, tem, sem dúvida, seu interesse, mas é na metafísica que 
 tem seu lugar e as ciências positivas podem e devem se desinteressar
dela. Existem filósofos que encontraram nos organismos e até nas coisas 
inanimadas uma espécie de livre arbítrio e de contingência. Mas, nem 
por isso os físicos e os biólogos mudaram seu método: calmamente 
continuaram seu caminho sem se preocupar com essas sutis discussões. 
Da mesma forma a psicologia e a sociologia não devem esperar, para 
se constituir, que essa questffo do livre arbítrio do homem, pendente 
du­ rante séculos, tenha enfim encontrado uma soluçlo que, aliás, 
todos reconhecem, nffo parece estar próxima. Tanto a metafísica 
quanto a ciência têm interesse em permanecer independentes uma da 
outra. Po­ demos concluir dizendo: é necessário escolher entre estes 
dois termos, ou reconhecer que os fenômenos sociais sio passíveis de 
serem investi­ gados cientificamente, ou admitir, sem razão, e 
contrariamente a todas as induções da ciéncia, que existem dois mundos 
no mundo: num reina a lei da causalidade, no outro reinam o arbítrio e a 
contingência.
Tal é, senhores, o grande serviço que os economistas prestaram 
aos estudos sociais. Eles foram os primeiros a notar tudo que existe de 
vivo e espontâneo na sociedade. Eles compreenderam que a vida coleti­
va nffo poderia ser bruscamente instituída por um hábil artifício; que 
da nffo resultava de um impulso exterior e mecânico, mas que é no 
próprio seio da sociedade que ela se elaborava lentamente. Foi assim 
que eles puderam formular uma teoria da liberdade tendo como base 
algo mais sólido que uma hipótese metafísica. É evidente que se a vida 
coletiva é espontânea, nffo devemos interferir nesta espontaneidade.To­
do entrave seria absurdo.
5
1
Contudo, nio devemos exagerar o mérito dos economistas. Dizen­
do que as leis econômicas são naturais, cies tomaram esta palavra num 
sentido que diminuía seu alcance. Com efeito, segundo eles, só existe dc 
real na sociedade o indivíduo; é dele que tudo emana e é para ele que 
tudo retoma. Uma naçáo não passa dc uni sci nominal, uma palavra que 
designa um agregado mecânico de indivíduos justapostos. Mas, ela nada 
tem de específico que a possa distinguir do resto das coisas; suas pro­
priedades sJo as dos elementos que a compõem, aumentadas e amplia­
das. 0 indivíduo é, pois, a única realidade tangível que o observador 
pode alcançar, e o único problema que pode ser colocado pela ciência é 
o de procurar como o indivíduo deve se conduzir nas principais circuns­
tâncias da vida econômica, tendo em vista sua natureza. As leis econô­
micas e, de modo mais geral, as leis sociais, nio seriam fatos muito 
gerais que o cientista induz da observação das sociedades, mas conse­
qüências lógicas que deduz da definição do indivíduo. O economis­
ta não diz: as coisas ocorrem assim porque foi estabelecido pela expe­
riência; mas: elas devem ocorrer assim porque seria absurdo que fosse de 
outra maneira. A palavra natural deveria ser substituída pela palavra 
racional; o que não é a mesma coisa. Se ainda esse conceito de indiví­
duo que, supostamente, deveria conter em si toda ciência, fosse adequa­
do à sociedade!... Mas, para simplificar as coisas, os economistas, 
artificialmente, as empobreceram. Nio só fizeram abstração de todas as 
circunstâncias de tempo, de lugar, de país, para imaginar o tipo abstrato 
do homem em geral, como também negligenciaram, neste tipo ideal, 
tudo o que não se relacionava com a vida estritamente individual; assim, 
de abstração em abstração, só lhes restou o triste retrato do egoísta em 
si.
A economia política perdeu, assim, todos os benefícios de seu 
princípio. Permaneceu uma ciência abstrata e dedutiva, ocupada nio em 
observar a realidade, mas em construir um ideal mais ou menos desejá­
vel; pois esse homeinem geral, esse egoísta sistemático de que ela nos 
fala é um mero ser de razão. O homem real, que conhecemos e que 
somos, apresenta outro tipo de complexidade: pertence a um tempo e a 
um país, tem uma família, uma cidade, uma pátria, um credo religioso e 
político, sendo que todos esses fatores e muitos outros ainda se mistu­
ram, se combinam de mil maneiras, cruzam e entrecruzam sua influên­
cia, sem que seja possível dizer-se, num rápido olhar, onde um começa e 
o outro termina. Somente depois de longas e laboriosas análises, hoje 
apenas começadas, será possível um dia estabelecer aproximadamente a 
parte que cabe a cada um. Os economistas ainda não tinham, portanto, 
uma idéia bastante justa das sociedades que pudesse verdadeiramente
52
servir de base â cicncia social. Pois esta, tomando como ponto de parti- 
da uma construção abstrata do espírito, podia muito bem chegar a 
demonstrar logicamente possibilidades metafísicas, iras nio a estabele­ 
cer leis. Faltava-lhe ainda uma natureza s observar.
II
 Se os economistas se detiveram assim, a meio-camínbo, é porque 
cs lavam mal preparados pan esse tipo de estudos. Juristas, homens de 
negócios ou homens de Estado, em sua maior parte, desconheciam a 
biologia e a psicologia. Ora, para poder integrar a dénda social no 
sistema geral das ciências naturais, é preciso, pelo menos, ter praticado 
uma delas; nio basta possuir uma inteligênda geral e experiência. Para 
descobrir as leis da consciência coletiva é preciso conhecer as da cons­ 
ciência individual. Foi por estar ao corrente de todas as déndas positi­ 
vas, de seu método e de seus resultados, que Augusto Comte se encon­
trou em condições de fundar, dessa vez em bases definitivas, a sodologu.
 Augusto Comte retoma a proposiçSo dos economistas: como des. 
declara que as leis sociais são naturais, mas dá à palavra sua plena 
acepção científica. Fixa para a dénda social uma realidade concreta a 
conhecer - as sociedades.Para ele a sociedade é tão real quanto um 
organismo vivo. Não há dúvida de que não pode existir fora dos indiví­ 
duos que lhe servem de substrato; no entanto, ela é outra coisa. jjj, 
 todo não é idêntico a soma de suas partes, embora sem elas não seja
nada. Assim também, reunindo-se sob uma forma definida e por laços 
duráveis, os homens formam um novo ser que tem sua natureza e suas 
leis próprias. É o ser social. Os fenômenos que aí se passam têm segu­ 
ramente suas raízes últimas na consciência do indivíduo. No entanto, 
a vida coletiva nio é uma simples imagem aumentada da vida 
individual. Apresenta caracteres ad generis que só as induções da 
psicologia nio 
bastariam para poder prever. Assim, os costumes, as prescrições do 
direito e da moral seriam impossíveis se o homem nio fosse capaz de 
contrair hábitos: estes, no entanto, sio diferentes dos hábitos indi­ 
viduais. É por isso que Comte destina ao ser sodal um lugar determina­
do na série dos seres. Coloca-o bem no alto da hierarquia por causa de 
sua complexidade maior e porque a ordem sodal implica e compreende 
em si mesma os outros reinos da natureza. Uma vez que esse ser nio é 
 redutível a nenhum outro, nio se pode deduzi-lo e é predso observá-lo 
para conhecê-lo. A sodologia, dessa vez, se achava de pose de um 
objeto que só pertence a ela e de um método positivo para estudá-lo.
53
Ao mesmo tempo. Augusto Comte assinalava nas sociedades uma 
car ac te» istica que as distinguia e que, contudo, os econonistas haviam 
negligenciado. Refiro-me a “esse consenso universal que caracteriza 
quaisquer fenômenos dos corpos vivos e que a vida social manifesta 
necessariamente no mais alto grau". (Coun de phüosophie positive, IV, 
234). Para os economistas, os fenômenos morais, jurídicos, econômicos, 
políticos correm paralelamente uns aos outros, sem se tocar, por assim 
dizer; do mesmo modo, as ciências correspondentes podem se desenvol­
ver sem se conhecer. Sabe-se, com efeito, com que cuidado a economia 
política sempre defendeu sua independência. Para Comte, ao contrário, 
os fatos sociais são tão estreitamente solidários que não podem ser 
estudados separadamente. Em conseqüência dessa aproximação, cada 
uma das ciências sociais perde em autonomia, mas ganha em vigor. Os 
fatos que ela estudava, por terem sido destacados de seu meio natural 
pela análise, pareciam nffo se prender à coisa alguma e flutuar no vazio.
Tinham algo de abstrato e de morto. Agora que foram aproximados 
segundo suas afinidades naturais, mostram o que são, faces diferentes de 
uma mesma realidade viva, a sociedade. Ao invés de lidarmos com fenô­
menos organizados, por assim dizer, em séries lineares, exteriores umas 
às outras e só se encontrando por acaso, encontramo-nos diante de um 
enorme sistema de ações e reações, nesse equilíbrio sempre móvel que 
caracteriza a vida. Ao mesmo tempo, porque sentia mais a complexida­
de das coisas sociais, Augusto Comte estava garantido contra as soluções 
absolutas tão a gosto dos economistas e políticos ideólogos do século
XVIII. Quando já não vemos na sociedade senão o indivíduo e quando
reduzimos essa noção à condição de idéia dara, é verdade, mas seca e
vazia, da qual retiramos tudo que ela tem de vivo e complicado, é 
natural que dela não possamos deduzir coisa alguma de muito complexo 
e que cheguemos a teorias simplistas e radicais. Se, pelo contrário, cada 
fenômeno estudado é relativo a uma infinidade de outros, se cada ponto 
de vista é solidário a vários outros, então já não é possível apresentar as 
questões de modo categórico. Um certo gênero de ecletismo, cujo méto­
do não pretendo desenvolver, se toma indispensável. Há tantas coisas 
diferentes na vida! É preciso saber dar a cada uma delas o lugar que lhe 
convém. Eis como Augusto Comte, embora admitindo com os econo­

Continue navegando