Buscar

Os Profetas e a Promessa do Capitalismo Clássico

Prévia do material em texto

Os Profetas e a Promessa do Capitalismo Clássico 
 
Por unanimidade considerado o mais influente economista deste século, Jhon Maynard Keynes, fez observação de que: “...as ideias dos economistas e dos filósofos políticos, tanto quando estão certos como quando estão errados, são muito mais poderosas do que normalmente se imagina. Na verdade, o mundo é governado quase que exclusivamente por elas. Homens práticos, que se julgam imunes a quaisquer influências intelectuais, geralmente são escravos de algum economista já falecido.” Escrito em 1935. Pensando então na oratória de alguns escritores que estavam na moda como Adolf Hitler, cujas obras aqueles oradores extraíram suas doutrinas racistas, aduziu keynes: “Loucos pelo poder, que ouvem vozes no ar, estão destilando seu delírio de algum escrevinhador acadêmico de uns poucos anos atrás.” Então surgiu a sua afirmação solene: “... o poder de interesses escusos é muito exagerado quando comparado à gradativa usurpação das ideias.” 
 
A ORIGEM 
 
Na segunda metade do século XVIII, a economia da Inglaterra e, em menor escala, do resto da Europa Ocidental e em seguida da Nova Inglaterra foi transformada por uma sucessão de invenções mecânicas. Com a revolução têxtil surgiu o instinto generalizado de mudança técnica e uma vasta confiança e orgulho pelos resultados conseguidos. Foi algo assim como a explosão de confiança tecnologia e em suas maravilhas que se seguiu à Segunda Guerra Mundial. Com a Revolução Industrial aconteceu uma outra no pensamento econômico. Essas idéias tinham uma premonição do mundo do porvir, mas foram também - e isso é muito importante - profundamente influenciadas pelo mundo que sempre existira. Esse era, acima de tudo, o mundo da agricultura. E nem poderia ter sido de outra forma. Até então, a vida econômica, representada por uma minoria de privilegiados, significa suprir a si e aos familiares com três coisas apenas - comida, roupa e alojamento. E tudo isso provinha da terra. 
 
PAISAGEM 
 
Os economistas repetidas vezes tem procurado apresentar o sistema econômico aos leigos como sendo uma máquina. Matérias-primas são introduzidas na máquina; os operários fazem a funcionar; o capitalista é o dono; o estado, os proprietários das terras, os capitalistas e os operários partilham o seu produto, geralmente de uma forma flagrantemente desigual. Pode-se ter uma noção mais real imaginando o mundo econômico como sendo uma paisagem. A renda e o poder duas coisas que sempre andaram de mãos dadas, eram indicadas pelo tamanho e magnificência das residências; as casas dos lavradores eram muitas e péssimas. A abundância da mão-de-obra e a relativa a falta de terras favoreciam latifundiário. E assim também lhe eram favoráveis à tradição, a posição social, as leis e a educação. A casa do dono das terras espelhava o seu status privilegiado A renda quase sempre fui ao longo do mesmo eixo que o poder, só quem sentido contrário. 
 
O FUNDADOR 
O maior dos escoceses foi o primeiro economista, Adam Smith. Se a economia teve um fundador, esse em dúvida alguma foi Smith. O pai do homem cujo nome ficaria para sempre ligado à liberdade de comércio era um funcionário da alfândega. Smith estudou na boa escola local e depois vai para Balliol. Suas impressões de Oxford foram desfavoráveis; mais tarde, ele sustentou que os professores públicos de Oxford, como eram chamados os que percebiam salário, não trabalhavam. Afinal, eles recebiam da mesma forma; então porque se incomodar ? Os professores do ensino superior tornaram-se uma metáfora de seu sistema econômico. Os homens - e as mulheres - produzem mais quando recebem a recompensa tanto de sua dilligência ou inteligência como as penalidades da indolência. Igualmente importante era que as pessoas fossem livres para procurar o trabalho ou exercer a profissão que lhes recompenssasem em por seus esforços. O quê dessa forma servisse ao indivíduo, propiciando-lhe o maior ganho, também servia a sociedade, dando a esta o máximo. E 1751, ele tornou-se catedrático da Universidade de Glasgow primeiramente na cadeira de Lógica, posteriormente na de Filosofia Moral.Em 1763, o interesse pessoal sobrepujou seus princípios morais e tomou conta de Smith. Foi-lhe oferecido o cargo de tutor do jovem duque de Buccleuch - pertencente a uma família que na época (como ainda agora) possuía grandes extensões de terra de discutível legitimidade em seus limites. O cargo representava um bom e seguro salário e a garantia de uma boa pensão no final. Smith renunciou a cátedra e levou o seu tutelado ao continente europeu na Grande Viagem. 
 
OS HOMENS DA RAZÃO 
 
Os mais notáveis homens visitados por Smith moravam fora de Genebra, quase que exatamente na fronteira entre França e Suíça. O ocupante do chatêau era François-Marie Arouet, conhecido por Voltarie. Um aspecto agradável dessa visita deve ter sido a questão da língua. Smith estava tendo uma experiência desastrosa com seu francês. Mas Voltaire falava um excelente em inglês. Tanto para Smith como para Voltaire, a razão exigia que se chegasse a uma conclusão não recorrendo a religião, a regulamentos, a preconceitos ou paixões; mas, sim, que se aplicasse a mente total e amplamente a toda a informação importante que estivesse ao alcance. Assim, tornavam-se decisões. Sob este aspecto, Adam Smith também era, acima de tudo, um homem de razão. Ele tinha simplesmente um apetite ilimitado de informação. Corrigir informações, de digeria-as e deixava que elas orientassem seus pensamentos. Isso o levou a novos caminhos, tornando-o um pioneiro. 
 
O SISTEMA AGRÍCOLA 
 
A França era, para Smith, uma imensa fonte de informações em ensino. Os fisiocratas afirmavam que toda a riqueza provinha da agricultura. Somente aí, como dádiva da natureza, o esforço produtivo podia oferecer um excedente sobre o custo. O comércio e a indústria não propiciavam esse lucro. Eles eram necessários, porém estéreis. O excedente, ou saldo, produzido na agricultura - seu “produit net” - mantinha todos os demais produtores. A agricultura era, pois, a indústria básica ou melhor a única indústria de base.Isso corrobora a assertiva de Keynes, de que nenhuma ideia econômica jamais morre. Smith ficou conhecendo os fisiocratas em Paris e Versalhes. quem mais ou impressionou e eu que tinha maior originalidade era François Quesnay, o médico pessoal, 
nada mais nada menos, de Luís XV. Quesnay era amigo de Madame Pompadour, e ela era seu anjo protetor na corte. Os campos da França seriam mais tarde glorificados pela vila-modelo de Maria Antonieta, Le Hameau, que ainda agora pode ser visitada. A economia rural francesa foi exaltada com idêntica imaginação por Quesnay, em seu famoso Tableau Économique. O Tableau foi uma tentativa de mostrar, em termos quantitativos, o relacionamento das principais peças do sistema econômico nacional - mostrar quanto os fazendeiros e lavradores, os latifundiários e donos de terra, os comerciantes recebiam uns dos outros em mercadoria e qual qual a renda que davam, uns aos outros, por estas transações. Em 1973, Wassily Leontief, Ocasião professor de Harvard, recebeu o Prêmio Nobelpor sua análise interindustrial, mais conhecida por sistema de insumos e produção. Essa análise interindustrial mostra, num grande quadro, o que cada ramo industrial ( em realidade, cada categoria industrial) compra e vende a cada um dos outros. Um outro dos fisiocratas visitado por Smith foi Anne Robert Jacques Turgot. Juntamente com seus colegas, Turgot Achava que os gastos públicos e, com eles, ônus do imposto sobre o empresariado - ou então, como os fisiocratas o interpretavam, sobre a agricultura e o “ produit net ” - deveriam ser mantidos no mínimo. Isso devia ser feito limitando-se o poder e atuação do Estado. Em 1974, Turgot tornou-se Tesoureiro da França, sendo sua função a de coibir toda e qualquer extravagância da corte francesa e, assim, reduzir ou encargo sobre o “ produit net ”.Mas ele fracassou. Uma regra inexorável agiu contra ele. Pessoas que gozam de privilégios preferem sempre arriscar-se a total destruição, em vez de submeter-se a qualquer redução de suas vantagens materiais. A miopia intelectual, também conhecida por estupidez, sem dúvida alguma é uma forte razão. Mas acontece que os privilegiados acham que seus privilégios, não importando quão ostensivos possam parecer aos outros, constituem direitos solenes, fundamentais, que eles cabem própria de Deus. 
 
A RIQUEZA DAS NAÇÕES 
 
Muito antes de Turgot ser demitido, Smith já havia aprendido as lições de sua viagem em sua volta a Escócia. Iria trabalhar em seu grande livro, e seus amigos começaram a duvidar que jamais conseguiria terminá-lo. Com o tempo, em 1776, para ser exato, ele chegou a publicá-lo; a consagração foi imediata, e a primeira edição de Uma Investigação da Natureza e das Causas da Riqueza das Nações, esgotou-se em seis meses, fato esse que seria ainda mais interessante se soubéssemos qual a tiragem da edição. A riqueza das Nações resulta do diligente empenho de cada um de seus cidadãos em seus próprios interesses - ou seja, quando cada qual colhe sua recompensa ou sofre os reveses disso resultantes. Ao defender seus próprios interesses, o indivíduo serve ao interesse público. Em sua expressão máxima, Smith é guiado por uma mão invisível. Melhor essa mão invisível do que a mão visível, inepta e rapinante do Estado. 
 
ALFINETES E A DIVISÃO DA MÃO-DE-OBRA 
 
Juntamente com a dedicação aos próprios interesses, a riqueza de uma nação também era favorecida pela divisão da mão-de-obra. A isso - ou seja, a maior eficiência da especialização - Smith atribuía a máxima importância. Eis como Smith descreveu a divisão 
da mão-de-obra em seu exemplo de maior destaque; em seu empenho por colher informações, ele deve ter deparado com a fabricação de alfinetes e anotou o processo com sua costumeira meticulosidade: Um homem puxa o arame, o outro endireita, um terceiro o corta, um quarto o afia, um quinto o esmerilha na outra extremidade para colocação da cabeça; para se fabricar a cabeça, são necessárias duas ou três operações distintas; a colocação da cabeça é muito interessante, e o polimento final dos alfinetes também; até a sua colocação no papel constitui, em si mesmo, uma atividade.... Dez homens subdividindo o trabalho dessa forma, calculou Smith, podiam fabricar 48.000 alfinetes por dia, a razão de 4.800 cada um. |Se um só homem realizasse todas as operações, talvez fabricasse um unico alfinete, ou possivelmente uns vinte. Mas ainda a maioria das pessoas pensa que a linha de montagem, com seu consequente aumento de produtividade, foi inventada no início deste século por Henry Ford. Quanto maior fosse o mercado, maior poderia ser o tempo de produção - quer se tratasse de alfinetes ou outra coisa qualquer - e maior seria a oportunidade de subdividir o trabalho. Daí surgiu ação de Smith contra as tarifas alfandegárias e outras restrições ao comércio, e a favor da maior liberdade possível, nacional e internacional, no intercâmbio de mercadorias, isto é, criação do mais amplo mercado possível. 
 
CONSPIRAÇÕES E MULTINACIONAIS 
 
O velho inimigo das liberdades era o Estado - o governo intervencionista, mercantilista, que impunha as suas tarifas, concedia monopólios, onerava todos com seus impostos e, acima de tudo, procurava melhorar aquilo que, por conta própria, era o melhor. Mas o Estado não constituía a única ameaça, como quase todos que citam Smith nos dias de hoje imaginam que fosse. Os homens de negócio, ou empresários, eram uma grande ameaça à sua própria liberdade de ação; seu infalível instinto era o de impor restrições sobre sobre si mesmos, e dessa circunstância surgiu outra das mais argutas observações de Adam Smith: “ Pessoas do mesmo ramo raramente se reúnem, até mesmo para se divertir, mas quando o fazem a conversa termina numa conspiração contra o público, ou então não concluiu para aumentar os preços ”. 
 
OS DESPEJOS 
 
Adam Smith morreu em 1790, tendo vivido bem seus últimos anos, pois era o Comissário da Alfândega em Edimburgo. Quando Smith morreu, as mudanças que ele havia profetizado já estavam se tornando visíveis na Inglaterra e na Escócia. Tanto no campo como nas cidades. A Revolução Industrial não foi uma coisa súbita, violenta, mas sim o tipo da revolução que se pode realmente ver e sentir. Gente de todas as partes era atraída dos campos, dos vilarejos, para as cidades e para empregos nas usinas e fábricas. Na Escócia, essas pessoas eram até expulsas inopinadamente do campo, em consequência da crescente demanda da principal matéria-prima da indústria, que era a lã. O mais espetacular exemplo desse processo de expulsão deu-se em Sutherland. De 1811 a 1820, segundo estimativas genéricas, cerca de 15.000 habitantes da região (chamados Highlanders) foram expulsos dessa propriedade, para dar lugar a criação de 
ovelhas. Em Strathnaver (como em outros lugares), em maio de 1814, a operação de limpeza assumiu aspectos definitivos de solução final. Embora fossem cruéis, os Despejos exemplificaram de maneira brilhante um problema do desenvolvimento econômico que permanece sem solução até os nossos dias. É possível haver uma desproporção tão grande entre gente e terra - muita gente, pouca terra utilizável - que o progresso seja inteiramente impossível. Não há mais terras para ninguém. A técnica das Highlands para reduzir a população não é mais recomendável. O controle da natalidade serve perfeitamente para belos discursos, mas só pouco a pouco, se tanto, produz resultados práticos.
Cidade Têxtil Modelo
	Por volta de 1815 ou 1820, havia fábricas, especialmente de tecelagens, nas quais os moradores despejados de suas terras podiam arranjar empregos. Mas os homes de Highlands não se adaptavam com facilidade ao ritmo das máquinas. Eles gostavam de emigrar e de preferência para o Canadá. New Lanark foi o cenário de maior e mais famosa experiência de crianças na indústria. Essa experiência se deu por volta dos últimos anos do século XVIII através de David Dale, destacado capitalista e filantropo escocês cujo rosto estampa as notas do Banco da Escócia. Ele teve a ideia de ir aos orfanatos de Glasgow e Edimburgo a fim de dali retirar os jovens desamparados e os dar escola e trabalho nas fábricas, livrando as cidades das despesasde sua manutenção. New Lanark transformou-se na maior tecelagem de toda a Escócia. Cada um dos órfãos recebiam uma hora e meia de rigorosa educação escolar todos os dias, durante a noite, depois de 13 horas de um bom e honrado trabalho nas fábricas.
	Em 1799, o genro de Dale, Robert Owen, assumiu a direção. Owen era um filósofo, um socialista utópico, um cético religioso e um espiritualista. Sobre sua administração, foi criada a Instituição para Formação de Caráter, que promovia palestras para adultos, festas, recitais de canto e outras recreações para os órfãos. Com o passar tempo, a diária de trabalho das crianças fora reduzida para dez horas e meia, sendo que menores de 12 anos não poderiam ser empregados.
Indiana: Um Complemento
	New Lanark não satisfez inteiramente a visão utópica de Owen. Ele procurou um lugar em que pudesse começar tudo de novo, uma comunidade sem fins lucrativos, nenhuma contaminação capitalista. Um lugar na onde o ideal seria de prestar serviços aos outros e não as ideias de Smith. Surgiu uma contemplação: New Harmony, em Indiana, um paraíso cooperativo às margens do rio Wabash.
	Assim se fez uma história de reunião de desajustados, misantropos, aproveitadores e picaretas. Eles não se dedicavam em servir os demais, mas sim, quase que exclusivamente, a discutir uns com os outros. A harmonia acabou, e New Harmony fracassou redondamente. A livre iniciativa, a busca do interesse próprio, foi dessa forma salva em Indiana.
Ricardo e Malthus
	Se New Harmony não estava de acordo com os preceitos de Smith, a Grã-Bretanha estava. Dois de seus amigos íntimos, David Ricardo e Thomas Malthus, defenderam suas ideias 25 anos que se seguiram depois de sua morte. Malthus, durante a maior parte da vida, lecionou em Haileybury – a escola de quadros, onde funcionários da Companhia das índias Orientais eram treinados. No século passado, a Companhia das índias Orientais foi a fonte de renda dos maiores economistas ingleses. Malthus deu-nos o princípio da população. Afirmava esse princípio que, dada a “paixão entre os sexos”, a população cresceria sempre em uma proporção geométrica – isto é, 2, 4, 8, 16... Enquanto isso, a alimentação cresceria apenas aritmeticamente – ou seja, 2, 3, 4... Daí veio o resultado inevitável de que a população viveria de fome, guerras e catástrofes naturais.
O Ponto de Vista Ricardiano
	Da mesma forma que seu amigo, David Ricardo previa um contínuo aumento da população, e a população de Malthus tornou-se o operariado de Ricardo. Entre os operários haveria tamanha concorrência na procura de emprego ou trabalho, de um lado, e de comida, do outro lado, que tudo ficaria reduzido a um simples processo de subsistência. Era o destino da humanidade. 
	No mundo Ricardiano, os trabalhadores receberiam o mínimo necessário à subsistência, nada mais que isso. Era a chamada lei de ferro e fogo do salário. Cada produto agrícola ou fabril exigia um certo montante da subnutrida mão-de-obra preconizada por Ricardo. A quantidade de mão-de-obra empregada estabelecia o valor relativo das coisas. Isso nos leva a teoria do trabalho exposta por Marx meio século mais adiante.
	No mundo de Ricardo, a figura principal continuava a ser os donos das terras. A mesma pressão exercida pelas pessoas sobre a terra, que reduzia os salários, tinha o efeito de aumentar os aluguéis. O Estado tinha cada vez menos importância e poder. Era a continuidade da lição de Smith de que assim deveria ser.
	Havia uma divergência de opinião de grande importância futura entre os dois amigos quanto ao que aconteceria ao belo acúmulo de renda dos senhorios. Ricardo afirmava que essa renda ou seria gasta ou poupada para investir em melhoria nas terras, construções de edifícios, na expansão industrial, e nesse caso também seria gasta. Ele acatou a sugestão feita por Jean Baptiste Say, de que a produção sempre provia a renda para aquisição do que era produzido. Tudo o que era poupado também era gasto, só que de maneira diferente, de modo que jamais haveria falta de poder aquisitivo.
	Malthus tinha suas dúvidas. Talvez a renda não poderia ser gasta; talvez haveria falta de poder aquisitivo e poderia fazer a economia entrar em colapso, por causa dos abalos que iria sofrer, haveria crises econômicas resultantes da falta de poder aquisitivo, como parte da ordem natural das coisas.
	Tudo isso foi muito imaginoso, mas não foi aceito. Todos aqueles que afirmassem que poderia haver falta de poder aquisitivo não entendiam nada de economia; na verdade, eram considerados loucos. Então, com o aparecimento de John Maynard Keynes, a tese de Malthus de uma escassez ou falta de poder aquisitivo tornou-se uma doutrina plenamente aceita.
Inglaterra e Irlanda
	Uma das formas de se medir ou avaliar uma ideia, embora os economistas nem sempre tenham pensado nisso, é saber se ela funciona ou não. Para a Grã-Bretanha, a tese de Smith foi mais do que uma compensação pela perda das colônias americanas. A produção e o comércio, agora muito menos prejudicados do que os de outras nações, expandiram-se maravilhosamente. Isso propiciava à nação britânica toda a riqueza que Adam Smith lhe havia prometido.
	Nas guerras com Napoleão, Pitt usou essa riqueza como compassivo sucedâneo do potencial humano britânico. A Grã-Bretanha fornecia os subsídios que garantiam e até incentivavam o valor desses homens. Depois de Waterloo, o comércio e a indústria ressurgiram ainda mais fortes. Ricardo, por sua vez, também se consagrou. À medida que a prosperidade aumentava naquele ano, os salários diminuíam, conforme o sistema ricardiano havia prenunciado. 
	As ideias de Malthus e Ricardo forma postas na Irlanda durante a primeira metade do século passado. Ninguém duvidava da tenência da população irlandesa, ela crescia geometricamente. Em sessenta anos, entre 1780 e 1840, ela duplicou e depois quase dobrou novamente. Por volta de 1840, havia 8 milhões de almas em toda a ilha.
	Enquanto a população irlandesa crescia, crescia também a concorrência de terras e aumentava a renda extraída pelos latifúndios ausentes. Cereais eram cultivados para pagar o aluguel e as batatas eram cultivadas para alimentar gente. Mesmo passando fome, tinha que se pagar o aluguel. O despejo por falta de pagamento significava que mais nada haveria para continuar a viver.
	Na Irlanda de 1845-1847, a phytophthora infestans, favorecida pelo clima quente e úmido, primeiro devastou a safra de batata e depois eliminou-a por completo, levando o país a uma verdadeira calamidade. 
Coma tantas calamidades que ocorreram, nota-se uma outra tendência nisso tudo. Ou seja, para as consequências de ações honrada, se forem desagradáveis, que recebam a aprovação divina. A mão invisível de Smith torna-se a própria mão de Deus, que não teria simpatizado muito com os irlandeses.
A Fuga
	Mas houve uma porta de saída para escapar da Grande Fome, a mesma dos Despejos dos Highlanders: e essa porta foi o navio de emigrantes para a América, que desceria p rio Saint Lawrence, a partir de Quebec, chegando a Grosse Isle, uma faixa de terra baixa, dadas pelo tempo. Nos anos de fome, era ali que os navios com passageiros acometidos de tifo vindos da Irlanda tinham de ancorar para desembarcar os mortos e moribundos. Mas tifo não foi a única fatalidade, o monumento. Hoje a ilha se chama Cholera Bay.
	Quer a terra fosse boa ou não, a verdade é que alguns imigrantes logo estavam produzindo mais alimentos num único ano do que seus pais jamais teriam visto em toda a sua vida. Assim, trabalhadores irlandeses, talvez os mais famosos refugiados da Grande Fome, começaram a construir as grandes ferrovias que iriam carrear toda essa abundância de alimentos para o mundo.

Continue navegando