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COMO É DAR AULA NO ENSINO SUPERIOR E A CORRUPÇÃO NA

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COMO É DAR AULA NO ENSINO 
SUPERIOR E A CORRUPÇÃO 
NA UNIVERSIDADE 
AUTOR RODRIGO BOTELHO RIBE IRO 
24 junho 15 
Pensei em escrever um texto crítico e formal a respeito da educação e da sociedade. Mas 
dizer que a educação é a salvação já ficou meio fora de moda. Portanto, acho melhor 
apenas contar pra vocês como é dar aula. Lembrando que este texto não é uma crítica à 
profissão. É apenas uma exposição das frustrações diárias e um apelo a uma mudança 
urgente de postura, não só dos alunos, mas da sociedade como um todo. Aqui mostro 
como a postura corrupta está enraizada nos alunos e já virou parte da comunidade 
acadêmica. 
Antes, uma pausa para minha relação com a profissão. Particularmente, gosto muito de 
ensinar. Gosto de matemática e gosto de entender matemática. Passar adiante minhas 
paixões é algo que faço por amor. Nunca houve problema sério o bastante para não 
desaparecer diante do quadro, dos alunos e sobre o tablado. Dar aula e pensar a respeito 
de matemática apagam, momentaneamente, claro, todos os meus problemas. 
“FAZ PROVA FÁCIL ! ” 
Minha felicidade se esvai diante das avaliações, dos comentários, da falta de 
compromisso dos alunos. Ouve-se mais “alivia aí, fessô!” do que “bom dia”, “boa tarde” 
ou “boa noite.” Há liberdade para chorar, mas não há liberdade para a educação e cortesia. 
“VALE PONTO, FESSÔ?” 
Em sua maioria, aluno não faz nada sem receber algo em troca. E a moeda de troca é 
chamada de ponto. A única motivação é o ponto. Sugestão de livros? Só valendo ponto. 
Lista de exercícios? Só valendo ponto. Fazer pelo conhecimento é ser taxado de idiota. 
TRABALHOS E L ISTAS 
Tudo copiado. A cópia é quase sempre nítida. Conjecturo que numa turma de k alunos, 
apenas realmente fazem os trabalhos, enquanto todo o restante apenas copia dos 
colegas. 
Pai Rodrigo adivinhando o futuro: Esse aluno que só copia vai taxar de vagabundo 
moradores de rua. Vai dizer: “emprego tem demais, basta querer!” 
AULAS DE EXERCÍCIOS 
Durante aulas de exercícios, ninguém faz nada. O pedido geral é um resumão bem estilo 
pré-vestibular. Melhor ainda se você dar dicas do que cairá na prova (e pensar que nem 
assim os resultado são bons.) Gente pra gritar “faz um resumão aí, fessô!” Nunca falta. 
Você dá aula por meses antes de avaliação e aí lhe aparece vários que não prestaram 
atenção em nada, mas no dia da aula de exercícios eles aparecem lá só pra gritar a frase 
anterior ou pra escolher um exercício aleatório que sequer tentaram. Qual a razão de dar 
aula se no fim é dado um resumo mágico que abre todas as provas e desvenda todos os 
segredos? 
LISTA DE PRESENÇA 
Como aluno, confesso, nunca gostei de ir às aulas. Sempre preferi estudar sozinho. Assim 
poderia estudar durante a madruga, horário que sempre fui mais produtivo. Nunca tive 
problemas com chamadas. A aprovação era minha absolvição. Por conta disso, a única 
postura que adotei como professor foi a de passar uma lista de chamada e reprovar por 
infrequência apenas aqueles que não obtiveram 60 pontos. Ou seja, não precisou ir à 
universidade para ser aprovado? Parabéns, campeão. 
A regra da UFMG é reprovar aluno infrequente. Tenha ele a pontuação necessária para 
sua aprovação ou não. Portanto, estou isentando o aluno de um dever: frequentar a 
universidade. Qual o resultado? Alunos assinam as listas pelos colegas. O sujeito 
foi livrado de um dever, mas ele não quer dar nada como contra-partida. Ele ainda quer o 
direito de, caso reprovado na pontuação, fazer o exame especial. 
Nem vou comentar que assinar um documento em nome de outra pessoa é crime. Tem 
até nome: falsidade ideológica. 
Logo, se o professor deseja ser rigoroso com a lista de presença, ele deve chamar nome a 
nome, como lá nos tempos da escolinha infantil Girafinha Feliz. 
Pai Rodrigo adivinhando o futuro: Esse mesmo aluno que pede pro colega assinar a 
chamada, acha um absurdo o médico que só bate ponto e vai embora. Vai reclamar 
também do deputado que estava batendo dedo lá pro outro. Vai postar lá na timeline “É 
um absurdo!” 
 
PROVAS E COLAS 
Esta é a pior parte e a maior prova de que ninguém se preocupa com educação. Durante 
os meses de aula, o aluno não fez nada. Porém, chegada a prova, não foi possível estudar 
todo o conteúdo ou simplesmente não estudou mesmo. Qual o recurso utilizado? Cola. A 
pessoa não cumpriu com suas obrigações como aluno, nada fez até o momento da prova, 
porém ele ainda quer obter bom resultado. Apesar de totalmente irresponsável, o aluno 
ainda acha plausível apelar para a cola. Ainda quer uma boa nota. Isso é o absurdo dos 
absurdos. A incoerência da incoerência. 
Existem ainda casos mais absurdos. Aqueles que os alunos pagam outros para fazer a 
avaliação em seus lugares (preciso lembrar que aqui também se comete crime?). 
Chegamos ao ponto ridículo de precisar olhar documento dos próprios alunos por conta 
dessa atitude patética. Isso é literalmente comprar o próprio diploma. É ridículo querer o 
diploma mas não querer fazer nada. 
Pai Rodrigo adivinhando o futuro: O aluno colador, que hoje é engenheiro porque 
pagou gente mais esperta que ele pra se formar, vai gritar “Abaixo a corrupção!” aqui na 
porta de casa. Ele também vai compartilhar um monte de reportagem sobre escândalos de 
corrupção e vai dizer que esse país não tem jeito. 
O ALUNO, O PATRÃO E O FUTURO 
Enquanto considerou coisa de otário estudar quatro horas por dia, o aluno corrupto vai 
gastar 12h do seu dia, muito possivelmente, fazendo dinheiro pra outra pessoa. Ele não 
vai chegar pro chefe “alivia aí, chefe!”, “quebra essa aí, patrão!” porque ele sabe o 
destino de empregado molengão: rua. E ele vai dar duro, porque, ao contrário da educação 
superior, valoriza o emprego que tem. Sua timeline estará repleta de links contra a 
corrupção na política, contra desvio de verbas, enquanto continua perpetuando que colar 
não tem problema, assinar lista é “de boa” e pagar para fazerem suas avaliações é coisa 
de esperto. E assim continuaremos sendo essa sociedade que ainda não entendeu o valor 
moral e intelectual da universidade, pelos séculos dos séculos…

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