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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ FABILE SCHLICKMANN ESTUDO QUÍMICO E AVALIAÇÃO DO POTENCIAL GASTROPROTETOR, ANTINOCICEPTIVO E ANTIPROLIFERATIVO DE Mimusops balata (ABRICÓ-DA-PRAIA) Itajaí 2015 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM PRODUTOS NATURAIS E SUBSTÂNCIAS SINTÉTICAS BIOATIVAS FABILE SCHLICKMANN ESTUDO QUÍMICO E AVALIAÇÃO DO POTENCIAL GASTROPROTETOR, ANTINOCICEPTIVO E ANTIPROLIFERATIVO DE Mimusops balata (ABRICÓ-DA-PRAIA) Dissertação submetida à Universidade do Vale do Itajaí como parte dos requisitos para a obtenção do grau de Mestre em Ciências Farmacêuticas. Orientador: Prof. Dr. Valdir Cechinel Filho Co-Orientador: Prof. Dr. Sérgio Faloni de Andrade Itajaí, Março, 2015 FICHA CATALOGRÁFICA S39e Schlickmann, Fabile, 1989- Estudo químico e avaliação do potencial gastroprotetor, antinociceptivo e antiproliferativo de mimusops balata (abricó-da-praia) / Fabile Schlickmann, 2015. 111f. ; il., tab. ; fig. Cópia de computador (Printout(s)). Dissertação (Mestrado) Universidade do Vale do Itajaí, Mestrado em Ciências Farmacêuticas. “Orientador : Prof . Dr Valdir Cechinel Filho ” Bibliografia : p.95-111 1. Mimusops balata. 2. Fitoterapia. 3. Farmacologia. I. Título. CDU: 615.32 Josete de Almeida Burg – CRB 14.ª 293 Dedicatória Dedico este trabalho à minha mãe Alivir, que com sua força e doçura me ensinou a nunca deixar de seguir adiante e, ao meu pai Vicente (in memoriam), o qual se alegraria com este feito. AGRADECIMENTOS À Deus, por me proporcionar força e serenidade para seguir esta trajetória; À minha mãe e irmãos, pela compreensão e apoio nos momentos difíceis e à minha família, pelo carinho; Ao meu amor Ricardo, pela paciência e carinho; Às minhas amigas Fabiana, Adriana, Juarana, Ângela, Mariel, Beth que compartilharam importantes momentos comigo e às amigas distantes, mas que sempre estiveram presentes, Camila, Marja, Fernanda; Ao meu orientador Prof. Valdir Cechinel Filho, pela confiança, pelos ensinamentos e disposição para sempre fazermos um bom trabalho, além da amizade construída ao longo destes dois anos; Ao Prof. Theodoro Marcel Wagner, ao Funcionário Pedro Pablo Perez Netto (RMN), Marcel Petreanu, Prof. Oscar Iza e ao Herbário Barbosa Rodrigues, pela contribuição; À equipe da gastroproteção: Prof. Sérgio Faloni de Andrade, Prof. José Roberto Santin, Luísa, Thaise, Lincon e todos que contribuíram de alguma forma; Ao Prof. João Ernesto de Carvalho e ao Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) na Universidade de Campinas (UNICAMP) pelo desenvolvimento dos testes in vitro (atividade antiproliferativa); À Profa. Fátima de Campos Buzzi, Karla e equipe, pelos testes antinociceptivos; À banca avaliadora, Profa. Ângela Malheiros, Profa. Márcia Maria de Souza e Profa. Simone Andrade Gualberto pela disposição em avaliar e contribuir com o presente trabalho; À Profa. Tania Mari Belle Bresolin, pelo apoio e confiança e à equipe da coordenação do PPGCF/Univali – Juliano e Helenize, sempre solícitos e atenciosos. À CAPES e CNPq pela oportunidade e apoio financeiro. À todos que estiveram presentes durante esta trajetória e que contribuíram de alguma forma. MUITO OBRIGADA!!! EPÍGRAFE “A percepção do desconhecido é a mais fascinante das experiências. O homem que não tem os olhos abertos para o mistério passará pela vida sem ver nada.” Albert Einstein ESTUDO QUÍMICO E AVALIAÇÃO DO POTENCIAL GASTROPROTETOR, ANTINOCICEPTIVO E ANTIPROLIFERATIVO DE Mimusops balata (ABRICÓ-DA-PRAIA) FABILE SCHLICKMANN Março, 2015 Orientador: Prof. Dr. Valdir Cechinel Filho. Co-Orientador: Prof. Dr. Sérgio Faloni de Andrade. Área de concentração: Produtos Naturais e Substâncias Sintéticas Bioativas Número de páginas: 111. O abricó-da-Praia (Mimusops balata), família Sapotaceae, é uma árvore perene nativa da América tropical, ocorre geralmente no litoral por se adaptar bem aos solos arenosos e salinos. A presente pesquisa teve como objetivo proceder a análise biológica (gastroprotetora, antinociceptiva e antiproliferativa) de extratos, frações e substâncias puras a partir de diferentes partes de Mimusops balata. A análise fitoquímica foi realizada por meio de maceração das partes da planta com metanol, por sete dias. Os extratos foram evaporados, com exceção do extrato da semente, o qual foi particionado gerando as frações clorofórmio e acetato de etila. Para elucidação estrutural utilizou-se técnicas convencionais espectrométricas (RMN, MS) e cromatográficas (CLAE, CG/FID). Quanto à parte farmacológica, foram utilizados modelos experimentais em ratos e camundongos. Para avaliação de dor aguda utilizou-se modelo por contorções abdominais induzidas pelo ácido acético. A atividade gastroprotetora foi avaliada pelos modelos de úlcera induzida por etanol/HCl, determinação da secreção gástrica e AINES. A avaliação da atividade antiproliferativa foi realizada, in vitro, em células neoplásicas humanas: U251 (glioma), MCF-7 (mama) e NCI-H460 (pulmão). Foram identificados e isolados os compostos taxifolina, nas sementes (fração acetato de etila) e mistura de α e β- amirina, nas folhas. Nos testes de dor aguda, todos os extratos exibiram efeito antinociceptivo, sendo o extrato da semente mais eficaz, possivelmente devido a presença da taxifolina. Nos diferentes modelos de úlcera utilizados, a dose de 300mg/kg teve resultado estatisticamente significativo. Em relação à atividade antiproliferativa, os extratos não tiveram efeitos estatisticamente significativos. A taxifolina é o mais abundante composto presente nas sementes e não foi identificado nas demais partes da planta em estudo, podendo as sementes se constituirem de fonte para a obtenção deste importante flavonóide. Os resultados obtidos permitem concluir que a planta em estudo, particularmente as sementes, possuem relevantes ações biológicas, especialmente em modelos de gastroproteção.Sugere-se a continuidade dos estudos tanto fitoquímicos como farmacológicos na busca de novos agentes medicinais considerando o potencial terapêutico evidenciado e a ausência de publicações científicas sobre a planta em estudo. Palavras-chave: Mimusops balata. Triterpenos. Taxifolina. Gastroproteção. Antinocicepção. Antiproliferativo. CHEMICAL STUDY AND EVALUATION OF GASTROPROTECTIVE, ANTINOCICEPTIVE AND ANTIPROLIFERATIVE POTENTIAL OF Mimusops balata (ABRICÓ-DA-PRAIA) FABILE SCHLICKMANN March 2015 Supervisor: Prof. Dr. Valdir Cechinel Filho. Co-Supervisor: Prof. Dr. Sérgio Faloni de Andrade. Area of concentration: Natural Products and Bioactive Synthetic Substances Number of pages: 111. Abricó-da-Praia (Mimusops balata), Sapotaceae family, is a perennial tree that is native to tropical America, where it occurs mainly on the coast, adapting well to sandy and saline soils. The aim of this study was to carry out a biological analysis of the gastroprotective, antinociceptive and antiproliferative properties of extracts, fractions, and pure substances from different parts of Mimusops balata. The phytochemical analysis was carried out by maceration of the parts of the plant with methanol, for seven days. The extracts were evaporated, except for the seed extract, which was partitioned, generating chloroform and ethyl acetate fractions. For structural elucidation, conventional spectrometric (NMR, MS) and chromatographic (HPLC, GC/FID) techniques were used. In the pharmacological phase, experimental models were used on rats and mice. For the evaluation of acute pain, the model of acetic acid-induced abdominal contractions was used. The gastroprotective activity was evaluated by the models of ethanol/HCl-induced ulcer, determination of gastric secretion, and NSAIDs. The evaluation of in vitro antiproliferative activity was performed in vitro, in human cancer cells: U251 (glioma), MCF-7 (breast), and NCI- H460 (lung). The compounds taxifolin, in the seeds (ethyl acetate fraction), and a mixture of α and β-amyrin, in the leaves, were identified and isolated. In the acute pain tests, all the extracts exhibited antinociceptive effect, the seed extract being the most effective, possibly due the presence of taxifolin. In the different ulcer models used at a dose of 300mg/kg, the result was statistically significant. In relation to the antiproliferative activity, the extracts had no statistically significant effects. Taxifolin is the most abundant compound present in the seeds, and was not identified in other parts of the studied plant, suggesting that the seeds are a source of this important flavonoid. These results suggest the need for further phytochemical and pharmacological studies in the search for new medicinal agents. Keywords: Mimusops balata. Triterpenes. Taxifolin. Gastroprotection. Antinociception. Antiproliferative. LISTA DE FIGURAS Figura 1 Foto de uma árvore de Mimusops balata (abricó-da-praia)................ 44 Figura 2 Organograma da análise fitoquímica das folhas de Mimusops balata (abricó-da-praia)....................................................................... 48 Figura 3 Organograma da análise fitoquímica do caule de Mimusops balata (abricó-da-praia).................................................................................. 49 Figura 4 Organograma da análise fitoquímica da polpa do fruto de Mimusops balata (abricó-da-praia)....................................................................... 50 Figura 5 Organograma da análise fitoquímica das cascas do fruto de Mimusops balata (abricó-da-praia)..................................................... 51 Figura 6 Organograma da análise fitoquímica das sementes do fruto de Mimusops balata (abricó-da-praia)..................................................... 52 Figura 7 Espectro de Ressonância Magnética Nuclear de Hidrogênio (RMN- 1H) da Taxifolina isolada das sementes de Mimusops balata em metanol deuterado (CD3OD).............................................................. 61 Figura 8 Espectro de Ressonância Magnética Nuclear de Carbono-13 (RMN-13C) da Taxifolina isolada das sementes de Mimusops balata em metanol deuterado (CD3OD)......................................................... 62 Figura 9 Espectro expandido de Ressonância Magnética Nuclear de Carbono-13 (RMN- 13 C) da Taxifolina isolada das sementes de Mimusops balata em metanol deuterado (CD3OD)............................. 63 Figura 10 Cromatograma de CLAE. Sobreposição das amostras: (a) extrato metanólico da semente de Mimusops balata e (b) Taxifolina no comprimento de onda 288 nm............................................................ 64 Figura 11 Estrutura química da taxifolina (3',4'-di-hidroxifenil)-5,7-di-hidroxi- flavanon-3-ol) ou dihidroquercetina, isolada das sementes de Mimusops balata................................................................................. 65 Figura 12 Estruturas químicas de α-amirina e β-amirina.................................... 68 Figura 13 Espectro de Ressonância Magnética Nuclear de Hidrogênio (RMN- 1H) da mistura de a-amirina e ß-amirina isolada do resíduo das folhas de Mimusops balata em metanol deuterado (CD3OD)............ 69 Figura 14 Espectro de Ressonância Magnética Nuclear de Carbono-13 (RMN-13C) da mistura de a-amirina e ß-amirina isolada do resíduo das folhas de Mimusops balata em metanol deuterado (CD3OD)..... 70 Figura 15 Cromatograma obtido por CG (FID) para a amostra 23..................... 71 Figura 16 Efeitos da administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e diferentes doses (30, 100 e 300mg/kg) do extrato metanólico da casca do fruto de Mimusops balata em camundongos submetidos ao modelo de úlcera induzida por etanol/HCl..................................... 75 Figura 17 Efeitos da administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e diferentes doses (30, 100 e 300mg/kg) do extrato metanólico da polpa do fruto de Mimusops balata em camundongos submetidos ao modelo de úlcera induzida por etanol/HCl..................................... 75 Figura 18 Efeitos da administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e diferentes doses (30, 100 e 300mg/kg) do extrato metanólico das sementes de Mimusops balata em camundongos submetidos ao modelo de úlcera induzida por etanol/HCl.......................................... 76 Figura 19 Fotos dos estômagos de camundongos submetidos aos efeitos da administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e diferentes doses (30, 100 e 300mg/kg) do extrato metanólico das sementes de Mimusops balata, no modelo de úlcera induzida por etanol/HCl... 76 Figura 20 Efeitos da administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e taxifolina (T) isolada do extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (1,14mg/kg) em camundongos submetidos ao modelo de úlcera induzida por etanol/HCl.......................................... 77 Figura 21 Fotos dos estômagos de camundongos submetidos aos efeitos da administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e taxifolina (T) isolada do extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (1,14mg/kg), no modelo de úlcera induzida por etanol/HCl................ 77 Figura 22 Quantificação de muco (µg de Alcian Blue/g de tecido) após administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) ediferentes doses do extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (30, 100 e 300mg/kg) em estômagos de camundongos submetidos ao modelo de úlcera induzida por etanol............................................ 79 Figura 23 Quantificação dos níveis de GSH (µg/g de tecido) após administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e diferentes doses do extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (30, 100 e 300mg/kg) em estômagos de camundongos submetidos ao modelo de úlcera induzida por etanol............................................ 80 Figura 24 Quantificação dos níveis de MPO (D.O./mg proteína/ 3 minutos) após administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e do extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (300mg/kg) em estômagos de camundongos submetidos ao modelo de úlcera induzida por etanol.............................................................................. 81 Figura 25 Quantificação dos níveis de LOOH (mmol/mg de tecido) após administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (300mg/kg) em estômagos de camundongos submetidos ao modelo de úlcera induzida por etanol.............................................................................. 82 Figura 26 Quantificação de volume (ml) de suco gástrico após administração oral de omeprazol (30mg/kg) e extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (300mg/kg) em estômagos de ratos submetidos ao modelo de determinação de secreção gástrica............................. 84 Figura 27 Quantificação de pH após administração oral de omeprazol (30mg/kg) e extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (300mg/kg) em estômagos de ratos submetidos ao modelo de determinação de secreção gástrica.................................................... 85 Figura 28 Quantificação de acidez (mEq [H+]) após administração oral de omeprazol (30mg/kg) e extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (300mg/kg) em estômagos de ratos submetidos ao modelo de determinação de secreção gástrica............................ 86 Figura 29 Efeitos da administração oral de omeprazol (30mg/kg) extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (300mg/kg) na atividade péptica (µM de tirosina/4 horas) em estômagos de ratos submetidos ao modelo de determinação de secreção gástrica............................................................................................. 87 Figura 30 Quantificação de muco (µg de Alcian Blue/g de tecido) após administração oral de omeprazol (30mg/kg) e extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (300mg/kg) em estômagos de ratos submetidos ao modelo de determinação de secreção gástrica................................................................................................ 87 Figura 31 Efeitos da administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e do extrato metanólico das sementes de Mimusops balata (300mg/kg) em ratos submetidos ao modelo de úlcera induzida por AINES (indometacina 80mg/kg)..................................................................... 89 Figura 32 Fotos dos estômagos de camundongos submetidos aos efeitos da administração oral de carbenoxolona (200mg/kg) e diferentes doses (30, 100 e 300mg/kg) do extrato metanólico das sementes de Mimusops balata, no modelo de úlcera induzida por etanol/HCl... 90 LISTA DE TABELAS Tabela 1 Princípios ativos, efeitos fisiológicos e principais fontes de alimentos funcionais.............................................................................................. 33 Tabela 2 Rendimento dos materiais vegetais de Mimusops balata no preparo de extratos metanólicos....................................................................... 59 Tabela 3 Resultados das Cromatografias de Camada Delgada dos extratos das partes de Mimusops balata conforme reveladores utilizados........ 59 Tabela 4 Comparação da estrutura química da taxifolina conforme literatura................................................................................................ 64 Tabela 5 Porcentagem de inibição de contorções abdominais em camundongos após a administração de extratos metanólicos brutos de Mimusops balata e Paracetamol por via intraperitoneal na dose de 10mg/kg........................................................................................... 72 Tabela 6 Porcentagem de inibição de contorções abdominais em camundongos após a administração de extratos metanólicos brutos de Mimusops balata e Paracetamol por via oral na dose de 50mg/kg................................................................................................ 73 Tabela 7 Atividade antiproliferativa do controle positivo doxorrubicina e dos extratos metanólicos brutos da casca, caule e folhas de Mimusops balata contra linhagens tumorais humanas.......................................... 90 LISTA DE ABREVIATURAS AINES – Anti-Inflamatórios Não Esteroidais ATP – Adenosina Trifosfato Cbn – Carbenoxolona CCD – Cromatografia de Camada Delgada CG/FID – Cromatografia Gasosa com Detector por Ionização de Chama CG/MS - Cromatografia Gasosa/Espectrometria de Massa CLAE – Cromatografia Líquida de Alta Eficiência COX – Ciclo-Oxigenase COX-1 – Ciclo-Oxigenase 1 COX-2 – Ciclo-oxigenase 2 DI50 – Dose Inibitória de 50% DMSO – Dimetilsulfóxido EITF – Espectroscopia no Infravermelho com Transformada de Fourier EROs – Espécies Reativas de Oxigênio GR – Glutationa Redutase GSH – Glutationa reduzida i.p. – Intraperitonealmente LDL – Low Density Lipoprotein (lipoproteína de baixa densidade) LOOH – Hidroperóxidos Lipídicos MPO – Mieloperoxidase MS – Mass Spectrometry (espectometria de massa) NADPH – Fosfato de Dinucleótido de Nicotinamida e Adenina Naive – Animais sem tratamento farmacológico Ome – Omeprazol OMS – Organização Mundial da Saúde Ran – Ranitidina RMN – Ressonância Magnética Nuclear RMN-1H – Ressonância Magnética Nuclear de Hidrogênio RMN- 13 C – Ressonância Magnética Nuclear de carbono 13 RPMI – Roswell Park Memorial Institute SFB – Soro Fetal Bovino SRB – Corante Protéico Sulforrodamina B T1,14 - Dose 1,14mg de taxifolina TGI – Total Growth Inhibition (inibição total de crescimento) TR – Tempo de Retenção Vei – Veículo v.o. – Via Oral SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 23 2 OBJETIVOS ......................................................................................................... 25 2.1 Objetivo Geral: ................................................................................................. 25 2.2 Objetivos Específicos: ..................................................................................... 25 3 REVISÃO DA LITERATURA ................................................................................ 27 3.1 Plantas e seus metabólitos .............................................................................27 3.1.1 Principais classes de metabólitos secundários ......................................... 28 3.2 Alimentos funcionais ....................................................................................... 31 3.3 Análise fitoquímica e atividade biológica: aspectos gerais .......................... 34 3.4 Dor ..................................................................................................................... 36 3.5 Úlcera ................................................................................................................ 37 3.6 Carcinogênese ................................................................................................. 40 3.7 Da planta em estudo: Mimusops balata (abricó-da-praia)............................. 41 3.7.1 Família e Gênero ........................................................................................... 41 3.7.2 Mimusops balata (abricó-da-praia) .............................................................. 43 4 MATERIAL E MÉTODOS ..................................................................................... 45 4.1 Análise Fitoquímica ......................................................................................... 45 4.1.1 Materiais e reagentes .................................................................................... 45 4.1.2 Equipamentos ............................................................................................... 45 4.1.3 Obtenção de extratos .................................................................................... 46 4.1.4 Elucidação estrutural .................................................................................... 47 4.1.5 Cromatografia Líquida de Alta Eficiência .................................................... 47 4.1.6 Cromatografia Gasosa – FID ........................................................................ 48 4.2 Análise Farmacológica .................................................................................... 53 4.2.1 Avaliação da atividade antinociceptiva em modelo de dor aguda ............ 53 4.2.2 Avaliação da atividade gastroprotetora ....................................................... 54 4.2.3 Avaliação da atividade antiproliferativa in vitro. ......................................... 57 4.2.4 Análise estatística ......................................................................................... 58 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................ 59 5.1 Análise fitoquímica .......................................................................................... 59 5.1.1 Identificação de compostos isolados .......................................................... 59 5.2 Atividade Farmacológica ................................................................................. 72 5.2.1 Atividade antinociceptiva ............................................................................. 72 5.2.2 Atividade gastroprotetora............................................................................. 74 5.2.3 Atividade antiproliferativa in vitro ................................................................ 90 6 CONCLUSÕES ..................................................................................................... 93 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 95 23 1 INTRODUÇÃO O registro da utilização de plantas como agentes terapêuticos são tão remotos quanto a era Paleolítica (FABRICANT; FARNSWORTH, 2001; RAMALINGUM; MAHOMOODALLY, 2014). Com o crescimento de doenças crônicas e complicações patológicas associadas, a saúde tornou-se alvo de investigação científica para encontrar novos alimentos e estratégias para abordar tal problema. Nos últimos anos ocorreram desafios significativos nos conceitos tradicionais de nutrição e farmacologia (RAMADAN; AL-GHAMDI, 2012; RAMALINGUM; MAHOMOODALLY, 2014). Os conhecimentos sobre o papel dos componentes fisiologicamente ativos dos alimentos, de fontes vegetais e animais tem mudado o entendimento do papel da dieta sobre a saúde (ADA, 2004). Em vista disto, há interesse mundial para melhorar a qualidade da nutrição e reduzir os gastos com saúde por meio da prevenção de doenças crônicas, da melhoria da qualidade e da expectativa de vida ativa (BADARÓ et al., 2008; STRINGHETA; OLIVEIRA; GOMES, 2007). Assim, foi esse interesse que levou a concepção do termo "alimentos funcionais", expressado também em uma variedade de termos como "pharmafoods", "medifoods", "vitafoods", ou "medicinalfoods" (KRUPA, 2008; RAMALINGUM; MAHOMOODALLY, 2014). Os alimentos funcionais possuem potencial para promover a saúde por meio de mecanismos não previstos na nutrição convencional, o que significa uma abordagem prática para alcançar o estado de saúde desejado, promovendo o bem estar e, possivelmente, a redução do risco de desenvolver enfermidades (COSTA et al., 2013; ROBERFROID, 2007; SIRÓ et al., 2008). A planta sintetiza susbtâncias químicas (metabólitos secundários) para elaboração de um sistema de proteção contra agressores presentes no ambiente, e, por conseguinte, algumas de suas funções podem ser de fungicida, de inseticida e/ou antibacteriana. Desta forma, a análise fitoquímica é realizada para conhecer os constituintes e eficácia terapêutica (VIZZOTTO; KROLOW; TEIXEIRA, 2010). É sabido que a utilização de plantas com fins medicinais para tratamento, cura e prevenção de doenças é uma das mais antigas formas de terapia medicinal 24 da humanidade (FERREIRA; DANTAS; CATÃO, 2014; LÓPEZ, 2006; VEIGA- JÚNIOR; PINTO, 2005). No que tange a efeitos gastroprotetores, diversas substâncias de origem vegetal, entre elas flavonóides, taninos e terpenóides, têm apresentado atividade gastroprotetora bastante significativa demonstrando o grande potencial dos vegetais como fontes alternativas para o tratamento desta patologia (BORRELLI; IZZO, 2000; DONATINI et al., 2009; KLEIN-JÚNIOR et al., 2012a; MARQUES et al., 2006; RODRIGUEZ; HIRUMA-LIMA; SOUZA BRITO, 2004). Além disso, alguns estudos realizados com fitoconstituintes sugerem efeitos positivos no tratamento de dor e inflamação, sendo reportados por diversos autores (BRIOSCHI et al., 2009; GARCIA, 2011; MESQUITA et al., 2011). Como cita Brioschi et al. (2009, p.277) “a nutrição funcional, oferece ações úteis para auxiliar no tratamento coadjuvante da dor musculoesquelética e inflamatória, possibilitando abordagem multidimensional e maior eficácia terapêutica do que a medida medicamentosa isoladamente”. Ainda, a busca por conhecimentos acerca de plantas com potencial antiproliferativo para células carcinogênicas cresce progressivamente, sendo esta uma área promissora no que tange a saúde pública. De acordo com o INCA (2014), ocorreram 14,1 milhões de casos novos de câncer e um total de 8,2 milhões de mortes por câncer, em todo o mundo, em 2012. Esta condição continuará crescendo nos países em desenvolvimento e aumentará ainda mais em países desenvolvidos se medidas preventivas não forem vastamente aplicadas. Buscou-se, na presente pequisa, analisar a planta em estudo com o intuito de proceder o isolamento e identificação de substâncias com potencial gastroprotetor, antinociceptivo e antiproliferativo de Mimusops balata (abricó-da-Praia). 25 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral: Isolar e identificar as principais substâncias e avaliar o potencial gastroprotetor, antinociceptivo e antiproliferativo de extratos, frações e substânciaspuras de Mimusops balata (abricó-da-Praia). 2.2 Objetivos Específicos: - Preparar extratos e frações de diferentes partes de Mimusops balata; - Avaliar o material obtido em distintos modelos experimentais de dor aguda, úlcera em camundongos e ratos e avaliar a atividade antiproliferativa in vitro; - Selecionar as frações mais ativas para isolamento dos princípios ativos por meio de métodos de cromatografia convencionais (Cromatografia de Camada Delgada, Coluna Cromatográfica, etc.); - Identificar os princípios ativos obtidos por técnicas espectroscópicas usuais; - Avaliar farmacologicamente as substâncias majoritárias obtidas para verificar o potencial gastroprotetor, antinociceptivo e antiproliferativo; - Comparar o efeito biológico dos produtos obtidos com medicamentos usados na clínica. 26 27 3 REVISÃO DA LITERATURA 3.1 Plantas e seus metabólitos Ao longo dos tempos, o conhecimento sobre as plantas acompanhou a evolução do homem. As civilizações primitivas perceberam que as plantas comestíveis, de maior ou menor toxicidade, revelavam ainda que empiricamente, o seu potencial curativo (FERRO, 2006). São esses conhecimentos arraigados em grupos restritos que possibilitam o resgate do uso de plantas medicinais na terapêutica (CADETE et al., 2011; CARVALHO; ALMANÇA, 2003). Até o século XIX, os recursos para terapias e tratamentos de doenças eram provenientes, predominantemente, de plantas e extratos vegetais, o que pode ser comparado pelas Farmacopéias da época. Um exemplo é a Farmacopéia de Portugal (1974), na qual constam 11 produtos de origem animal, 30 produtos de origem mineral e mais de 400 espécies de vegetais (SCHENKEL; GOSMANN; PETROVICK, 2010). Médicos ilustres na Antiguidade, como Hipócrates e Avicenna, já utilizavam plantas medicinais para tratamento de doenças. Em países como a China, a prática de uso de ervas como terapia é seguida há muitos séculos. No Brasil, os índios utilizavam as plantas em rituais de cura, assim como os africanos associavam-nas a rituais religiosos (FERRO, 2006). Desta forma, os recursos vegetais começaram a ser pesquisados e assim, deu-se a tendência de utilizar as substâncias ativas isoladas, denominadas “princípios ativos”, sendo este um resquício da linguagem alquimista da época (SCHENKEL; GOSMANN; PETROVICK, 2010). As substâncias oriundas das plantas são comumente chamadas de fitoquímicos e podem ser classificadas como metabólitos primários ou secundários. Os metabólitos primários estão amplamente distribuídos na natureza e são necessários para o desenvolvimento fisiológico em plantas (BALANDRIN et al., 1985; YÁÑEZ et al., 2013). O metabolismo primário envolve as etapas metabólicas de fixação de carbono e nitrogênio, catabolismo e anabolismo de metabólitos primários como carboidratos, lipídeos e proteínas. Este processo é essencial à vida 28 e manutenção dos seres vivos. Têm como função a degradação de macromoléculas e fornecimento de energia (LEITE, 2009). Por outro lado, os metabólitos secundários são derivados dos metabólitos primários, são limitados em distribuição no reino vegetal e estão restritos a um grupo taxonômico particular. Metabólitos secundários são, na maioria das vezes, substâncias provenientes de adaptações a estresses ambientais (BALANDRIN et al., 1985; YÁÑEZ et al., 2013). Os metabólitos secundários têm como funções fisiológicas: defesa contra herbívoros e microrganismos, proteção contra raios ultravioleta, atração de animais polinizadores, ação alelopática e resposta ao estresse devido ao ataque microbiano. Alguns exemplos de metabólitos secundários são os flavonóides, terpenóides, alcalóides, taninos, cumarinas, óleos essenciais entre outros (LEITE, 2009). Esses geralmente não são vitais para as plantas; são a expressão química dos indivíduos e são distintos de espécie para espécie, em qualidade e quantidade; comumente são produzidos em pequenas quantidades e são intimamente influenciados pelo ambiente (FERRO, 2006). Além dos fatores ambientais comuns, outros podem influenciar o desenvolvimento de terpenos como a idade da folha, eventos fenológicos, acúmulo de nitrogênio foliar, herbivoria, injúria física e outras formas de estresse (GUENTHER, 1997; LIMA; KAPLAN; CRUZ, 2003). 3.1.1 Principais classes de metabólitos secundários As classes de metabólitos secundários mais representativas são terpenóides e compostos fenólicos e, abaixo são indicados resumidamente algumas informações de maior interesse: - Terpenóides: esta classe representa a maior classe química de constituintes ativos de vegetais, ocorrendo mais de 30.000 substâncias elucidadas (LIMA; KAPLAN; CRUZ, 2003; RAVEN; EVERT; EICHHORN, 2001; VERPOORTE; MARASCHIN, 2001). São obtidos pelas vias do mevalonato e da desoxixilulose-fosfato, onde ocorrem a biossíntese de unidades isoprênicas. Estas por sua vez, são precursores responsáveis pela formação de diversos produtos naturais conhecidos como terpenóides. Por este motivo, são conhecidos como isoprenóides. As unidades isoprênicas bioquimicamente ativas são identificadas como os ésteres de pirofosfato 29 (ou difosfato) de isopentenila (IPP) e pirofosfato de dimetilalila (DMAPP) (LEITE, 2009). Há uma grande diversidade de terpenóides produzidos por vegetais, animais, fungos e bactérias, compondo mais de vinte mil espécies conhecidas. São compostos formados por 10, 15, 20, 30 ou 40 átomos de carbono. Nomeados, respectivamente, como mono, sesqui, di, tri e tetraterpenos. Compostos esteroidais também pertencem a esta classe, dentre eles o colesterol e os glicosídios cardiotônicos como a digitoxina e digoxina, molécula comercializada como fármaco para tratamento cardiovascular. Outros compostos, a exemplo do pigmento betacaroteno, também se incluem nessa classe (EMERY; SANTOS; BIANCHI, 2010). Em recente revisão, os monoterpenos são apontados devido a propriedades analgésica, anti-inflamatória, anestésica e antioxidante (GUIMARÃES; QUINTANS; QUINTANS-JÚNIOR, 2013). No artigo de revisão de Ntie-Kang e colaboradores (2014), são citados as atividades biológicas dos terpenóides (anti-inflamatório, antimicrobiano, antitripanossoma, antiplasmódico, antiúlcera) e o impacto da distribuição geográfica dos gêneros de plantas. Também são sugeridas ações para descoberta de fármacos a partir de produtos naturais na África Ocidental. - Compostos fenólicos: estes têm como característica a presença de um grupamento hidroxila (-OH) ligado a um anel aromático (EMERY; SANTOS; BIANCHI, 2010). Este grupo ocorre vastamente na natureza, sendo de considerável importância fisiológica e morfológica para as plantas. Como um grande grupo de substâncias químicas bioativas, têm diversas funções biológicas (IGNAT; VOLF; POPA, 2011; POPA et al., 2008). Semelhantemente aos flavonóides, os ácidos fenólicos constituem importante classe de compostos fenólicos com funções bioativas, e são usualmente encontrados em plantas e produtos alimentícios. Os ácidos fenólicos podem ser divididos em dois subgrupos sendo eles ácidos hidroxibenzóicos (como ácidos gálico, vanílico, siríngico) e hidroxicinâmicos (ácidos cafeico, ferrílico, sináptico) (BRAVO, 1998; MARTINS et al., 2011). Os polifenóis são compostos de pequeno peso molecular (200-400g/mol) que ocorrem naturalmente. Eles são produzidoscomo metabólitos secundários que têm por função proteger o vegetal do bombardeio de patógenos e radiação ultravioleta. 30 Após a ameaça ambiental, a planta hospedeira ativa uma das vias de síntese e, assim, estruturas de polifenóis são produzidas e, posteriormente, secretadas. A especificidade do polifenol produzido dependerá em grande parte do seu hospedeiro, a região de origem e os estímulos ambientais. Muitos polifenóis são sintetizados pela via do fenilpropanóide. Entre as classes de polifenóis pode-se citar: flavonóides, estilbenos, isoflavonóides e lignanas (FERRER et al., 2008; YÁÑEZ et al., 2013). Os flavonóides têm estruturas complexas. Consistem de uma unidade de 15 carbonos com dois anéis de benzeno A e B ligados por uma cadeia de carbonos. Esta cadeia é fechada na maior parte dos flavonóides, constituindo o anel heterocíclico C; no entanto, chalconas e dihidrochalconas apresentam-se como um sistema de anel aberto. Dependendo do estado de oxidação do anel C e na ligação do anel B ao anel C, os flavonóides podem ser classificados em subclasses. Podem ser submetidos à hidroxilação, metilação, glicosilação, acilação, prenilação, e sulfonação; gerando subclasses distintas como: flavononas, flavonas, isoflavonas, flavonóis, diflavonóis e antocianidinas (BALANDRIN et al., 1985; BEECHER, 2003; STAFFORD, 1990; YÁÑEZ et al., 2013). Os taninos agregam sabor adstringente às folhas de plantas lenhosas. As ligninas são polímeros que conferem rigidez, resistência e impermeabilidade à parede celular de plantas. Há ainda outras classes conhecidas: derivados de ácidos graxos, moléculas produzidas por animais e corais marinhos, importantes para o sistema circulatório, hormonal e respiratório; policetídeos, como as naftoquinonas juglona e plumbagina, que inibem o crescimento de outras plantas competidoras que estão ao redor, aflatoxinas (substâncias tóxicas produzidas pelos fungos), tetraciclinas usadas como antibióticos no tratamento de infecções bacterianas; peptídeos, têm como exemplo as penicilinas, produzidas por fungos ou bactérias e que apresentam grande poder antibiótico (EMERY; SANTOS; BIANCHI, 2010). Os polifenóis de todas as classes são encontrados em uma grande variedade de plantas e produtos como suplementos fitoterápicos e cosméticos (FERRER et al., 2008; YÁÑEZ et al., 2013). Artigos relevantes de revisão (KHAN; HUMA; DANGLES, 2014; MUSHTAQ; WANI, 2013, YÁNEZ et al., 2013) apontam principalmente o potencial antioxidante dos polifenóis, sendo este um fator de proteção à saúde humana. 31 Foi em função dos metabólitos secundários que muitos organismos vivos sobreviveram com o passar dos séculos, transmitindo suas características de geração para geração, dando continuidade ao processo de evolução (EMERY; SANTOS; BIANCHI, 2010). Os produtos naturais, tanto de origem marinha como terrestre, especialmente as chamdas plantas superiores, são considerados uma excelente fonte de inspiração para o desenvolvimento de novos fármacos. Uma inspeção de aprovação de medicamentos revelou que aproximadamente 64% de todos os fármacos considerados, tiveram um produto natural envolvido em seu desenvolvimento, tanto em relação ao seu uso puro como modelos para a síntese destes fármacos (NEWMAN; CRAGG, 2012; VALLI et al., 2013). Neste contexto, cabe ressaltar a importância das plantas como fonte de substâncias com potencial terapêutico, podendo ser utilizadas também na forma de alimento funcional. 3.2 Alimentos funcionais Os alimentos funcionais surgiram na década de 80, no Japão, por meio de um programa de governo que tinha como objetivo desenvolver alimentos saudáveis para uma população que envelhecia e apresentava uma grande expectativa de vida, criando então outra concepção de alimentos (ANJO, 2004; COLLI, 1998; RAMALINGUM; MAHOMOODALLY, 2014; SIRÓ et al., 2008). Há duas resoluções brasileiras que aprovam o uso de alimentos com propriedades funcionais, são elas: Resolução ANVISA/MS 18/99 - Aprova o Regulamento Técnico que estabelece as Diretrizes Básicas para a Análise e Comprovação de Propriedades Funcionais e/ou de Saúde, alegadas em rotulagem de alimentos; Resolução ANVISA/MS 19/99 - Aprova o Regulamento Técnico de Procedimentos para Registro de Alimentos com Alegação de Propriedades Funcionais e ou de Saúde em sua Rotulagem (BRASIL, 1999a; BRASIL, 1999b). A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (BRASIL, 1999a, item 3.3) considera como alimento funcional “O alimento ou ingrediente que alegar propriedades funcionais ou de saúde pode, além de funções nutricionais básicas, quando se tratar de nutriente, produzir efeitos metabólicos e ou fisiológicos e ou benéficos à saúde devendo ser seguro para consumo sem supervisão médica”. O termo nutracêutico é usado para alimento ou parte de um alimento que propicia benefícios à saúde, os quais incluem prevenção e/ou tratamento da doença. 32 Podem ser nutrientes isolados, suplementos dietéticos, produtos herbais e alimentos processados tais como cereais, sopas e bebidas, ou até na forma de cápsulas (ANDLAUER & FÜRST, 2002; HUNGENHOLTZ, 2002; KWAK; JUKES, 2001; MORAES; COLLA, 2006; ROBERFROID, 2002). Os nutracêuticos podem ser classificados em fibras dietéticas, ácidos graxos poliinsaturados, proteínas, peptídios, aminoácidos ou cetoácidos, minerais, vitaminas antioxidantes e outros antioxidantes (ANDLAUER; FÜRST, 2002; MORAES; COLLA, 2006) A prevenção e a redução do risco de doenças são atribuídas aos alimentos funcionais, enquanto aos nutracêuticos são atribuídas a prevenção e principalmente o tratamento das doenças (KWAK; JUKES, 2001; MORAES; COLLA, 2006). Assim, os nutracêuticos incluem suplementos dietéticos e outros tipos alimentares, enquanto que os funcionais apresentam-se sob a forma de alimento comum (ANJO, 2004). O aumento de interesse por alimentos funcionais está relacionado aos custos de tratamentos de saúde, à legislação e às descobertas científicas (IKEDA; MORAES; MESQUITA, 2010; MILNER, 2000). Considera-se ainda, o aumento da consciência dos consumidores, que desejando melhorar a qualidade de suas vidas, optam por hábitos saudáveis (MORAES; COLLA, 2006). O cultivo de vegetais que seja de simplificada execução e custo reduzido, para a produção de alimentos, pode ser uma forma importante de se oferecer alimentos de qualidade e em quantidade à população. No entanto, a cadeia produtiva nem sempre avança, devido, dentre muitos fatores, à carência de informações técnico-científicas sobre estas plantas (TOFANELLI; RESENDE, 2011). Assim, a nutrição humana tem conhecimento que os alimentos são instrumentos na prevenção de doenças, como já reportado anteriormente. A seguir, tabela proposta por ANJO (2004) adaptada de FAGUNDES & COSTA (2003) exemplifica esta prática, onde estão apresentados algumas classes de metabólitos secundários, seus efeitos e fontes alimentares: 33 Tabela 1 – Princípios ativos, efeitos fisiológicos e principais fontes de alimentos funcionais. Composto ativo Efeito Fonte Terpenóides Carotenóides Atividade antioxidante e anticancerígena Frutas (melancia, mamão, melão, damasco, pêssego), verduras (cenoura, espinafre, abóbora, brócolis, tomate, inhame, nabo) Fitoesteróis Redução dos níveis de colesterol total e LDL-colesterol Óleos vegetais, sementes, nozes, algumas frutas e vegetais Glucosinolatos Detoxificação do fígado, atividade anticancerígena e antimutagênica Brócolis, couve-flor, repolho, rabanete, palmito e alcaparra Fenólicos Ácido fenólico Atividade antioxidante Frutas (uva,morango, frutas cítricas), vegetais (brócolis, repolho, cenoura, berin jela, salsa, pimenta, tomate, agrião), chá Flavonóides Atividades antioxidante, redução do risco de câncer e de doença cardiovascular Frutas cítricas, brócolis, couve, tomate, berinjela, soja, abóbora, salsa, nozes, cereja Isoflavonas Inibição do acúmulo de estrogênio, redução das enzimas carcinogênicas Leguminosas (principalmente soja), legumes Catequinas Atividade antioxidante, redução do risco de doença cardiovascular Uva, vinho tinto, morango, chá verde, chá preto, cacau Antocianinas Atividade antioxidante, proteção contra mutagênese Frutas (amora, framboesa) Ácidos graxos ϖ3 e ϖ6 Redução do risco de câncer e de doenças cardiovasculares, Peixes de água fria, óleo de canola, linhaça e nozes 34 redução da pressão arterial Oligossacarídeos Polissacarídeos Redução do risco de câncer e dos níveis de colesterol Frutas, verduras, leguminosas, cereais integrais Prebióticos Regulação do trânsito intestinal e da pressão arterial, redução do risco de câncer e dos níveis de colesterol total e triglicerídeos, redução da intolerância à lactose Raiz de chicória, cebola, alho, tomate, aspargo, alcachofra, banana, cevada, cerveja, centeio, aveia, trigo, mel Probióticos Regulação do trânsito intestinal, redução do risco de câncer e dos níveis de colesterol total e triglicerídeos, estímulo ao sistema imunológico Iogurte, leite fermentado 3.3 Análise fitoquímica e atividade biológica: aspectos gerais Diante da imensidão das florestas, ainda não se têm conhecimento completo sobre a ocorrência, distribuição e densidade das plantas. A exploração racional e sustentável dos recursos naturais concebe oportunidades de desenvolvimento em setores como economia, agricultura, horticultura, cosméticos, alimentação e fármacos (LEITE, 2009). Distintos grupos de pesquisadores estudam a atividade biológica de plantas medicinais originárias de diversas regiões do mundo, orientados pelo uso popular das espécies nativas. A exploração científica contínua e ampliada é importante, pois o pesquisador pode determinar as qualidades e usos potenciais de produtos de espécies distintas, sendo capaz de determinar a localização dos recursos, o rendimento, problemas de logística e outros fatores que influenciam a utilização das plantas (DUARTE, 2006). O progresso na química de produtos naturais sempre esteve ligado às inovações na tecnologia analítica. A caracterização de metabólitos em misturas complexas exige técnicas sofisticadas, que deverão ter boa sensibilidade e seletividade, bem como a informação estrutural sobre os componentes de interesse. Apesar de diversos métodos de extração e estudos de compostos oriundos de 35 plantas serem demonstrados constantemente na literatura, o foco necessita ser em compostos que apresentem relevante atividade biológica. Assim, é extremamente importante a necessidade de estudos fitoquímicos guiados pelos bioensaios, seja “in vivo” ou “in vitro”. Ressalta-se importância da colaboração ampla entre químicos e farmacólogos para a análise de extratos, obtendo-se então extratos semi-puros, frações e, finalmente, os compostos puros (CECHINEL FILHO; YUNES, 1998; MARSTON; HOSTETTMANN, 2009; MALHEIROS et al., 2010). Geralmente extrai-se uma combinação de vários tipos de compostos bioativos ou substâncias químicas em diferentes polaridades da planta em estudo. A separação destas continua a ser um grande desafio para o processo de identificação e caracterização de compostos bioativos. É comum utilizar no isolamento destes compostos, diferentes técnicas de separação, tais como: Cromatografia de Camada Delgada (CCD), cromatografia em coluna, cromatografia flash, cromatografia de filtração em gel (Sephadex) e Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE), entre outros (SASIDHARAN et al., 2011). Ao escolher projetos novos e inovadores para o laboratório, o pesquisador deve levar em consideração os princípios ativos que estão presentes no extrato que está sendo testado. Além disso, é imprescindível que os extratos utilizados na atividade biológica sejam padronizados, geralmente por meio de CLAE (WAGNER, 2012). Os compostos puros são então utilizados para a determinação da estrutura e atividade biológica. Além disso, as técnicas não-cromatográficas podem ser usadas para facilitar a identificação dos compostos bioativos, tais como: imunoensaio – que utilizam anticorpos monoclonais, ensaio de rastreio fitoquímico e Espectroscopia no Infravermelho com Transformada de Fourier (EITF) (SASIDHARAN et al., 2011). É valido ressaltar a contribuição de estudos de correlação entre estrutura química e atividade biológica, por meio da química medicinal clássica (via modificação estrutural ou síntese de análogos), que admite determinar quais são os principais fatores envolvidos na atividade de moléculas de interesse (YUNES; CECHINEL FILHO, 2012). Além disso, a avaliação biológica de um extrato vegetal necessita basear-se em informações de que a planta foi utilizada de forma etnomédica para uma condição semelhante ou idêntica, exceto quando da triagem de um alto número de plantas, usualmente in vitro. Ainda, a pesquisa somente terá valor científico se os 36 extratos demonstrarem atividades biológicas extraordinárias quando comparados com um agente antimicrobiano sintético ou natural padrão. Todos os resultados de triagens e outras investigações devem ser discutidos quanto à sua possível relevância terapêutica (WAGNER, 2012). 3.4 Dor A dor é definida como “uma sensação ou experiência emocional desagradável”, associada ao dano tecidual atual ou potencial, ou descrita em tais termos. Via de regra é subjetiva, não necessita ser verbal e relaciona-se com as experiências vividas (LOESER; TREEDE, 2008). A nocicepção abrange toda a difusão e processamento da informação dolorosa. A dor é um complexo sistema que está ligado ao aspecto comportamental devido ao processamento da informação ocorrer no sistema somatossensorial e também no sistema límbico. O começo da transmissão dolorosa se dá pelos neurônios sensoriais primários de alto limiar que também atuam como receptores chamados nociceptores. Estão subdivididos em mielínicos, do tipo A, e amielínicos, do tipo C, especializados em transmitir informações mecânicas, químicas e térmicas por meio de impulsos elétricos. Seus corpos celulares estão localizados no gânglio da raiz dorsal (GILRON et al., 2006; MONTINI; NEMAN, 2012). As fibras envolvidas na percepção tátil são as mielínicas grossas A-, já as fibras mielínicas finas A- e amielínicas C, tem como função transmitir a nocicepção e os estímulos térmicos. A nocicepção normal abrange a detecção de temperaturas altas e baixas e estímulos mecânicos intensos. Os nociceptores originam-se da pele e órgãos e findam na camada superficial do corno dorsal na medula espinhal. Os axônios das células do corno dorsal conduzem impulsos nociceptivos para o tálamo e, por meio deste, ao córtex cerebral que processa a consciência dolorosa (GILRON et al., 2006; MONTINI; NEMAN, 2012). A modulação inibitória da dor irá ocorrer com a diminuição dos estímulos periféricos e centrais que sensibilizam o sistema nervoso (GOSLIN, 2012; MOSELEY, 2003). Segundo o estudo de Calixto e colaboradores (2000), apesar da terapia da dor estar em progressivo avanço, ainda há necessidade de analgésicos potentes e eficazes, sobretudo para o tratamento da dor crônica. Uma das substânciasanalgésicas mais importantes utilizados na prática clínica de hoje continua a ser o alcalóide morfina. Nesse estudo, ressaltaram a contribuição e história da Papaver 37 somniferum, as espécies de Salix, Capsicum e Cannabis sativa no desenvolvimento de analgésicos. Entre as principais classes de substâncias antinociceptivas, estão os alcalóides, terpenóides e flavonóides (CALIXTO et al., 2000). Em estudo de revisão elaborado por Gautam; Jachak (2009), estão descritos os produtos naturais anti-inflamatórios derivados de plantas e fontes marinhas relatados durante a última década. Os compostos expostos pertencem a diferentes classes químicas, tais como alcalóides, esteróides, terpenos, os polifenóis, fenilpropanóides, ácidos graxos e outros. Pan e colaboradores (2009) também estudaram as ações de compostos naturais bioativos dietéticos como frutas, vegetais, grãos, legumes, chás e vinho, demonstrando que compostos bioativos podem ser úteis no tratamento da inflamação. Na literatura, diversas plantas são citadas com potencial antinociceptivo e/ou anti-inflamatório como o trevo-roxo (OLIVEIRA et al., 2014), angico, cumaru, hortelã- graúda (LORENZI; MATOS, 2008), aroeira, barbatimão, cajueiro-roxo, canela, carqueja, camomila, catingueira, cebola branca, endro, faveleira, hortelã-miúda, juazeiro, sabugueiro (SOUSA, 2013), copaíba (MENDONÇA; ONOFRE, 2009), erva- cidreira (DANTAS, 2007) entre outras. Pesquisas experimentais em modelos de dor realizadas no NIQFAR/CCS/UNIVALI utilizando distintas espécies de plantas, exibiram efeitos promissores como: Litchi chinensis – lichia (CASTELLAIN et al., 2014), Chenopodium ambrosioides – erva de Santa Maria (GRASSI et al., 2013), Phyllathus niruri L. – quebra-pedra (MOREIRA et al., 2013), Polygala cyparissias – Gelol-da- praia (KLEIN-JÚNIOR et al., 2012b), Piper methysticum – kava-kava (KORMANN et al., 2012), Litsea guatemalensis Mez. - condimento "laurel" (SILVA et al., 2012), Aleurites moluccana – nogueira-de-iguape (QUINTÃO et al., 2014; QUINTÃO et al., 2012). 3.5 Úlcera Úlceras gástricas podem ser definidas como uma ruptura no revestimento da mucosa estomacal, com uma profundidade considerável visualizada na endoscopia ou evidência histológica de implicação da submucosa. Já, as erosões são rupturas no epitélio de superfície que não tem profundidade perceptível. O termo “úlcera péptica” é usado de forma ampla para incluir úlceras e erosões, no estômago e no 38 duodeno com as mais variadas causas. Este termo se refere à pepsina, uma enzima proteolítica em solução ácida, que desempenha um papel importante na causa de ruptura das mucosas, independente do agente agressor (Helicobacter pylori, aspirina ou AINEs) (VAKIL, 2010). Décadas de investigação incidiram sobre o papel da secreção ácida e os efeitos do estresse, tipo de personalidade e genética na patogênese da úlcera. A descoberta de receptores de histamina-2 (H2) e desenvolvimento de drogas inibidoras da bomba de prótons geraram importantes mudanças na conduta da úlcera péptica. A descoberta da H. pylori e seu tratamento levaram a mudanças relevantes na prevalência e recorrência da doença, transformando a úlcera péptica, de uma doença crônica recorrente à uma doença curável (MARSHALL; WARREN, 1984; VAKIL, 2010). Diversos fatores são responsáveis pelo aparecimento da úlcera como a infecção por H. pylori, uso de AINEs, uso de álcool, fumo e outros fatores associados. Ao longo dos anos, observou-se que o desenvolvimento de úlcera não é exclusividade dos indivíduos infectados por H. pylori. Isto levou à hipótese da existência de cofatores como genética, ambiente ou ligado às distintas características das cepas de H. pylori (STEFANO; MICELI; CORAZZA, 2010). O uso de AINEs promove o aparecimento de danos na mucosa gástrica devido à inibição da enzima ciclo-oxigenase (COX-1), reduzindo a produção de prostaglandinas, muco e bicarbonato e inibição da proliferação de células epiteliais (AKAPA et al., 2014; CHAN; LEUNG, 2002; STEFANO; MICELI; CORAZZA, 2010). O tabagismo provoca redução da produção de prostaglandinas a nível da mucosa gástrica e duodenal e inibe a secreção de bicarbonato pela mucosa duodenal, além de aumentar a secreção de ácido e promover a proliferação H. pylori. Ainda, a fumaça do cigarro impede a cura das lesões ulcerativas e a sinergia com o H. pylori aumenta o risco de recorrência (AKAPA et al., 2014; CHAN; LEUNG, 2002; STEFANO; MICELI; CORAZZA, 2010). O consumo de álcool estimula a secreção de ácido gástrico, assim como o consumo excessivo de café e alguns tipos de chás. Outras condições médicas têm sido associadas ao aumento do risco de úlcera péptica, entre elas: infecção por citomegalovírus, tuberculose, doença de Crohn, cirrose, insuficiência renal, sarcoidose e doença mielo e linfoproliferativas. Outros fármacos são potencialmente ulcerosos, como esteróides, bisfosfonatos, agentes quimioterapêuticos e cloreto de 39 potássio (AKAPA et al., 2014; CHAN; LEUNG, 2002; STEFANO; MICELI; CORAZZA, 2010). Nos dias atuais, os fármacos utilizados para o tratamento de desordens gástricas produzem muitos efeitos adversos e não são tão eficientes quanto deveriam. Por esta razão, há um interesse crescente em terapias alternativas e a utilização de produtos naturais (KLEIN-JÚNIOR et al., 2012a). Klein-Júnior e colaboradores (2012a) realizaram um levantamento sobre metabólitos secundários gastroprotetores naturais que foram classificados de acordo com a sua estrutura química, incluindo fontes terrestres e marinhas. Mais de 150 compostos distintos foram apresentados, dentre eles estão: flavonóides (chalconas [sofalcona], rutina, naringenina [presente em frutas cítricas e uva], catequinas [catequina, epicatequina, epicatequina galato, epigalocatequina, epigalocatequina galato]); terpenóides (sesquiterpenos, diterpenos, monoterpenóides e triterpenóides); saponinas (araloside A, ginsenoside, theasaponina, spartitrioside); polissacarídeos (xilose, galactose, glucose, arabinose, ramnose, manose, ácido galacturônico) e alcalóides (capsaicina, morfina), entre outros compostos. Alguns extratos provenientes de plantas estudadas na UNIVALI têm mostrado efeitos gastroprotetores eficazes publicados recentemente. Niero e colaboradores (2012) verificaram que os extratos obtidos a partir de G. achachairu e o composto isolado guttiferone A demonstraram resultados positivos contra úlcera em modelos de camundongos, em especial contra lesão por etanol/HCl e úlcera induzida por indometacina, suportando o uso popular desta planta. Esse efeito pode ser atribuído, a capacidade para diminuir a secreção gástrica. Guttiferone A, o principal componente das sementes, tem também potencial para utilização como um protótipo para obter novos e promissores agentes medicinais com perfis gastroprotetores. Lemos e colaboradores (2012) verificaram o efeito gastroprotetor de couve (B. oleraceae var. acephala). O tratamento de animais com o extrato foi mais eficaz do que a cimetidina na cura de lesões gástricas e também mais ativo do que as frações. O tratamento com extrato da couve foi capaz de reverter esse processo. Efeitos gastroprotetores foram observados por Silvério e colaboradores (2008), quando utilizaram o extrato alcóolico de Eremanthus erythropappus em camundongos submetidos aos modelos de úlcera induzida por indometacina e etanol. 40 3.6 Carcinogênese O termo câncer é dado a um conjunto de mais de cem tipos diferentes de doenças que têm em comum o desenvolvimento desordenado de células anormais com potencial invasivo. Origina-se por condições multifatoriais, essas causaspodem agir em conjunto ou em sequência para iniciar ou promover a carcinogênese (HANAHAN; WEIBERG, 2011; INCA, 2014). O câncer é uma condição clínica grave que gera desafios sociais e econômicos significativos para o sistema de saúde. Apesar da melhoria das técnicas de imagem e de diagnóstico molecular, o câncer continua atingindo milhões de pessoas em todo o mundo. Em muitos países, o câncer é a segunda principal causa de morte, perdendo apenas para doenças cardíacas. A descoberta e identificação de novos fármacos antineoplásicos, com baixos efeitos colaterais sobre o sistema imunológico tornou-se alvo em diversos estudos de imunofarmacologia (AWASARE; BHUJBAL; NANDA, 2012; SUBHADRADEVI et al. 2010). Dados recentes de estimativas mundiais do projeto Globocan 2012, da Agência Internacional para Pesquisa em Câncer (International Agency for Research on Cancer), da Organização Mundial da Saúde (OMS), indicam que ocorreram 14,1 milhões de casos novos de câncer, totalizando 8,2 milhões de mortes por câncer, em 2012. Os tipos de câncer mais frequentes na população masculina foram de próstata, pulmão e cólon e reto; e entre as mulheres - mama, cólon e reto e pulmão. Em países em desenvolvimento, os cânceres de pulmão, estômago e fígado foram mais frequentes em homens; e mama, colo do útero e pulmão nas mulheres. Em 2030, a carga global será de 21,4 milhões de casos novos de câncer e 13,2 milhões de mortes por câncer, em decorrência do crescimento e do envelhecimento da população, bem como da redução na mortalidade infantil e das mortes por doenças infecciosas em países em desenvolvimento (INCA, 2014). No Brasil, a estimativa para o ano de 2014 e 2015, é a ocorrência de aproximadamente 576 mil casos novos de câncer, sendo os principais: câncer de pele do tipo não melanoma, tumores de próstata, mama feminina, cólon e reto, pulmão, estômago e colo do útero (INCA, 2014). Diante dessa situação mundial, pesquisadores têm buscado plantas com atividade antiproliferativa de carcinomas, como pode ser visto nos seguintes artigos intitulados como: eliminação de radicais livres, antiproliferativa e perfis de variações no nível de fitoquímicos em diferentes partes do brócolis (Brassica oleracea italica) 41 (CHAUDHARY et al., 2014); efeito anti-proliferativo e fitoquímica da análise do extrato de Cymbopogon citratus (HALABI; SHEIKH, 2014); atividades in vitro antioxidante e antiproliferativa, e estudo fitoquímico em diferentes extratos de flores de Nyctanthes arbortristis (KHANAPUR; AVADHANULA; SETTY, 2014); efeitos anticancerígenos de compostos bioativos berry (FOLMER et al., 2014); a capacidade antioxidante e antiproliferativa de fitoquímicos extraíveis de frutas tropicais (abacaxi, manga e mamão) (AGUIRRE et al., 2014), entre outros estudos. 3.7 Da planta em estudo: Mimusops balata (abricó-da-praia) 3.7.1 Família e Gênero Sapotaceae pertence à ordem Ericales (APG II, 2003). A família é Pantropical composta por 53 gêneros e em torno de 1100 espécies, com, aproximadamente, 400 espécies no Neotrópico, 250 na África e 350 na Ásia Tropical (MONTEIRO; ANDREATA; NEVES, 2007). Dentre os caracteres morfológicos da família, sobressai a presença de laticíferos, como espécies da América do Sul (Manilkara sp.). Embora a predominância dos laticíferos, outras estruturas e compostos ergásticos foram citados para distintos gêneros da família (MONTEIRO, 2006; MONTEIRO; ANDREATA; NEVES, 2007). Mimusops ou Manilkara é um gênero de árvores da família Sapotaceae, compreendendo 78 espécies distribuídas nos trópicos (30 no Sul e América Central, 35 na África e 13 no Sudeste Asiático) (ARMSTRONG et al., 2014; MCLOUGHLIN, 2001). A reconstrução da distribuição ancestral de classes indica que as espécies de Mimusops colonizaram a América do Sul. Esta classe da América do Sul é composta por duas subclasses, sendo elas: classe de espécies amazônicas e classe de espécies da Mata Atlântica do litoral. As subsclasses são separadas geograficamente por biomas secos do Cerrado e da Caatinga, bem como as áreas de maior relevo do escudo brasileiro. Entre as classes amazônicas estão Mimusops balata, Mimusops huberi e Mimusops paraenses (ARMSTRONG et al., 2014; GRAHAM, 2009; GREGORY-WODZICKI, 2000). 42 Na literatura, espécies de Mimusops/Manilkara se destacam com atividades biológicas já identificadas como: Mimusops elengi L., Manilkara zapota L. e Mimusops hexandra Roxb. - Mimusops elengi L.: caracteriza-se por tornar-se uma grande árvore encontrada em toda a Índia. Essa espécie tem sido usada pelas comunidades indígenas como medicamento para o tratamento de várias doenças, tais como, doenças dentárias, queimadura, desordens uterinas, úlceras, doenças cardíacas, febre e também é utilizada como diurético, adstringente e afrodisíaco (KIRTIKAR, BASU, 1988; PURNIMA et al., 2010; YOGANARASHIMAN, 1996). Também tem sido utilizado como gastroprotetor, anti-hiperlipidêmico e anti-helmíntico (GHAISAS el al., 2008; MALI; MAHAJAN; MEHTA, 2007; PAYAL et al., 2003; PURNIMA et al., 2010). Segundo resultados obtidos por Purnima e colaboradores (2010), esta espécie possui atividade anti-inflamatória, analgésica e antipirética. - Manilkara zapota L.: o sapoti (Manilkara zapota (L.) von Royen) é uma fruta tropical muito saborosa e também a frutífera mais popular da família das sapotáceas. É amplamente encontrado por todo território brasileiro. No entanto, as condições ambientais mais favoráveis para o seu cultivo estão nas regiões Norte e Nordeste (LEDERMAN et al., 2001; MENDONÇA et al., 2007). Os extratos alcoólicos e aquosos de frutos verdes (FAYEK et al., 2013) e folhas (FAYEK et al., 2012) exibiram atividades antioxidante, antihiperglicêmica e hipocolesterolêmica. O extrato etanólico das folhas apresentou atividade antiartrítica (SINGH et al., 2011). Além disso, o extrato acetato de etila da casca do caule de M. zapota demonstrou atividade antitumoral significativa contra carcinoma de Ehrlich (OSMAN et al., 2011); o extrato etanólico da casca do caule demonstrou atividade antiproliferativa para as linhagens celulares HL-60, HT-29, A 549, A 431 e MCF-7 (AWASARE; BHUJBAL; NANDA, 2012). - Mimusops hexandra Roxb.: as folhas, cascas e frutos são usados popularmente para tratamento de febre, cólica, lepra, opacidade da córnea, úlceras, helmintíase, hiperdipsia, cefaléia, icterícia, dor de dente, diarréia, como aperitivo, purificador do sangue, tônico e adstringente (KUMAR; KAUR; ARORA, 2010; MISHRA; PAREEK, 2014; PULLAIAH, 2006; WARRIER et al., 1995). A casca do caule tem sido apontada com atividade gastroprotetora em diferentes modelos experimentais de úlceras gástricas (MODI et al., 2012; SHAH; GOSWAMI; 43 SANTANI, 2004). Na pesquisa de Kumar; Kaur; Arora (2010), o extrato metanólico das folhas de Mimusops hexandra exibiu atividade antioxidante. 3.7.2 Mimusops balata (abricó-da-praia) O abricó-da-Praia, família Sapotaceae, é uma árvore perene (Figura 1), nativa da América tropical (Guiana e, particularmente, Trinidad). Ela tem como sinônimos: Manilkara bidentata, Achras balata, Mimusops balata, Mimusops bidentata, Mimusops globosa, Mimusops surinamensis, Sapota mulleri. Manilkara é um nome local do sul indiano (costa do Malabar) relatado em 1683 por um botânico holandês, H.A. van Rheede (1637-1691) (ELAND, 2013). Esta planta é conhecida popularmente como Ausubo (Dominicana, Porto Rico), Balata vermelho (Francês Guianese), Balato (Esperanto), Bala, Chicozapote (Mexicana), maçaranduba (Brasileiro) (ELAND, 2013). A árvore ocorre geralmente no litoral por se adaptar bem aos solos arenosos e salinos.Ela mede de quatro a dez metros de altura, dependendo do ambiente em que se situa e possui tronco pardo escuro e copa piramidal (CARNEIRO et al., 2011; SIMÃO, 1998). As folhas são simples, dispostas em espiral, coriáceas, ovaladas e de cor verde brilhante com nervura central amarelada. Elas medem cerca de sete a treze centímetros de comprimento por três a cinco centímetros de largura. Suas flores são isoladas ou aos pares, axilares e pedunculadas, de cor branca e rosa (CARNEIRO et al., 2011; CRUZ, 1982). Os frutos são redondos com casca resistente e dura, coloração amarela, contendo polpa esbranquiçada, envolvendo uma ou duas sementes marrons. O consumo do fruto, com polpa de sabor adocicado, se limita ao estádio maduro, pois antes disso produz um látex branco e pegajoso (CARNEIRO et al., 2011; CORRÊA, 1984). A madeira é explorada comercialmente, a árvore possui um látex não elástico, que contribui para um revestimento de alta qualidade para bolas de golfe e é empregado na fabricação de solas e cintos. No passado, a madeira vermelha escura, dura e pesada tinha uma vasta gama de utilizações como construção de obras, barcos e piso, têxtil e equipamentos de fábrica (ELAND, 2013). Os produtos de Mimusops balata podem ser exsudato laticíferos como borrachas, gomas e resinas hidrossolúveis, óleos essenciais, ceras, frutos 44 comestíveis, marfim vegetal, fontes de fibras (celulose e lignina) e alcalóides (para fins medicinais e inseticidas) (WILLIAMS, 1961). Rhourri-Frih e colaboradores (2013) realizaram pesquisa sobre o abricó-da- praia. Três triterpenos (3β-O-acetil-α-amirina, 3β-O-trans cinamoil α-amirina e 3β-O- trans cinamoil lupeol) foram isolados inicialmente a partir da resina de Mimusops balata. De acordo com os resultados, a Mimusops balata diminuiu a produção de citocinas inflamatórias IL-1β e IL-8. Esta atividade demonstra o potencial de Mimusops balata como agente anti-inflamatório e anti-idade na indústria farmacêutica e cosmética. De modo geral, na literatura, são escassas as publicações de Mimusops balata demonstrando atividades terapêuticas. Figura 1 – Foto de uma árvore de Mimusops balata (abricó-da-praia). Fonte: <http://www.alternativarural.com.br/ABRICO-DE-PRAIA/prod-951168/> Assim, a pesquisa da presença de metabólitos secundários em vegetais é um campo promissor na busca de combinações funcionais, preventivas ou curativas em patologias presentes na população (LEMOS et al., 2012). Sendo a dor, úlcera e câncer patologias recorrentes, buscou-se a realização de testes experimentais preliminares explorando o potencial farmacológico da planta em estudo. 45 4 MATERIAL E MÉTODOS 4.1 Análise Fitoquímica 4.1.1 Materiais e reagentes O perfil cromatográfico por CCD dos extratos, frações e substâncias puras obtidas foi delineado por meio da utilização de placas de sílica gel 60 GF254 de 20µm de espessura preparadas sobre as folhas de alumínio da Merck. Distintos sistemas de eluentes foram usados de acordo com a polaridade das amostras. Posteriormente à eluição, as cromatoplacas foram visualizadas sob luz ultravioleta antes da revelação destrutiva da amostra com os reveladores específicos. Como reveladores (CCD) foram utilizados o Anisaldeído sulfúrico (identificação de terpenos e esteróides), Cloreto férrico (compostos fenólicos), Dragendorff (alcalóides) e Hidróxido de Potássio (cumarinas) (UGAZ, 1994). As cromatoplacas foram vaporizadas com o revelador selecionado e, no caso do Anisaldeído sulfúrico, foram aquecidas à temperatura aproximada de 105ºC. Nos procedimentos de cromatografia em coluna, foi utilizada como fase estacionária, sílica gel 60 (Merck) de granulometria 70-230 mesh (ɸ = 0,063 - 0,20mm). O diâmetro e altura das colunas foram determinados de acordo com a quantidade do material a ser cromatografado. A eluição foi realizada com solventes orgânicos em ordem crescente de polaridade. Os solventes usados foram hexano (Hex), acetato de etila (AcOEt) e metanol (CH3OH) provenientes dos Laboratórios Dinâmica, Quimex ou Vetec. As frações obtidas foram reunidas de acordo com as semelhanças de fator de retenção (Rf) verificadas nas CCDs. Para análise de RMN de 1H e RMN de 13C foram utilizados solventes deuterados (acetona, clorofórmio e metanol), provenientes da Cambridge Isotope Laboratories Inc. Além disso, foram utilizados (para extração/partição) outros reagentes como acetona, clorofórmio, éter, metanol (CH3OH), diclorometano (DCM) e sulfato de sódio, advindos comercialmente dos Laboratórios Dinâmica, Quimex e Vetec. 4.1.2 Equipamentos Para visualização da fluorescência das substâncias rastreadas por CCD, foi utilizada radiação ultravioleta Minerallight (ג= 254 e 366nm) em câmara de UV-DIST. 46 Os espectros de RMN de 1H e RMN de 13C foram realizados em espectrômetro BRUCKER AC-300F (300 MHz); tendo como referência interna o tetrametilsilano (TMS) ou o próprio solvente. Os deslocamentos químicos foram registrados em valores adimensionais δ (ppm). Os extratos foram concentrados em rotavapor TECNAL TE-2II com controle de temperatura, e pesados em balança analítica SHIMADZU LIBROR-AEG-220 e SHIMADZU LIBROR-EB-33OD. 4.1.3 Obtenção de extratos A coleta das partes da planta foi realizada em dois momentos: folhas e caule ocorreram dia 13/06/2013 e casca do fruto, polpa e semente no dia 20/08/2013, na Praia Brava - Itajaí, Santa Catarina. O material botânico foi identificado pelo Prof. Oscar Iza (UNIVALI) e o voucher foi depositado no Herbário Barbosa Rodrigues (Itajaí) sob o n. VCFilho 157. A análise fitoquímica da planta escolhida, abricó-da-Praia ocorreu em etapas. Primeiramente, o material vegetal fresco (polpa, casca do fruto e semente com pesos de 280,76g, 276,79g e 240,00g, respectivamente) e seco (folhas e caule com 530,00g e 150,50g, respectivamente) foi previamente picado e triturado (semente), para a realização da extração com metanol. A maceração ocorreu por sete dias consecutivos. Em seguida, as soluções foram filtradas e o solvente evaporado, com exceção do extrato das sementes, o qual foi evaporado a 10% de seu volume inicial para, posteriormente, realizar-se a partição de líquido-líquido. Os extratos foram analisados por meio de CCD com os eluentes hexano:acetona (8:2) e clorofórmio:metanol (8:2), variando as concentrações. De acordo com as CCDs, foram realizadas colunas cromatográficas para isolamento de compostos das partes da planta escolhida. O extrato metanólico das sementes foi submetido a partição de líquido-líquido. A concentração desse extrato foi determinada por meio de amostras em duplicata, em vidros de relógios, tendo o rendimento de 9,7% - 23,50g em 100mL de extrato metanólico bruto. Para a partição líquido-líquido, foram utilizados 100mL do extrato metanólico bruto das sementes e água, 100mL do solvente clorofórmio e posteriormente 150mL acetato de etila. 47 A fração clorofórmio foi submetida à coluna cromatográfica aberta com hexano:acetato de etila para separação de compostos. Posteriormente, com a fração acetato de etila, foram realizadas CCDs e também uma nova coluna cromatográfica aberta com os eluentes clorofórmio:metanol. Foi também analisado o resíduo vegetal, que preciptou ao deixar o extrato das folhas do abricó-da-praia em repouso. Este resíduo foi submetido à coluna cromatográfica aberta, hexano:acetato de etila, para separação dos compostos. 4.1.4 Elucidação estrutural A substância proveniente da coluna foi submetida a elucidação da sua estrutura. Para elucidar e caracterizar quimicamente o composto purificado das
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