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1 Intensivo MPSP DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Sumário 1. Lições preliminares. .................................................................................................. 2 2. Direitos fundamentais............................................................................................. 10 3. Prevenção especial.................................................................................................. 78 4. Política de Atendimento ......................................................................................... 87 5. Medidas de proteção .............................................................................................. 99 6. Prática de ato infracional: Direitos e Garantias .................................................... 105 7. Medidas socioeducativas ...................................................................................... 108 8. Conselho tutelar .................................................................................................... 122 9. Justiça da Infância e da Juventude........................................................................ 125 10. Procedimentos .................................................................................................... 131 11. Recursos .............................................................................................................. 149 12. Ministério Público, Advocacia e Tutela de Direitos ............................................ 152 13. Crimes e infrações administrativas ..................................................................... 159 14. Disposições finais e transitórias .......................................................................... 173 15. SINASE ................................................................................................................. 173 2 ECA Aula 01. Lições preliminares. Direitos fundamentais. Direito à convivência familiar. Família substituta. 1. Lições preliminares. Para fins didáticos, convém dividir a análise dos direitos das crianças e dos adolescentes em quatro fases: 1ª) Fase da Absoluta Indiferença Nessa fase, não existiam normas jurídicas destinadas a tratar dos direitos e deveres de crianças e adolescentes, os quais não eram tutelados pelo Estado, tampouco pela sociedade. No geral, cabia ao pai reger de forma absoluta a vida dos filhos. Na idade antiga, p. ex., o pai em uma família romana possuía poder absoluto sobre seus descentes, e decidia, inclusive, sobre a vida e a morte deles. Em algumas cidades gregas, mantinham-se vivos apenas os filhos fortes e saudáveis, sendo que em Esparta o genitor transferia o poder de criar os filhos ao Estado, que os transformavam em guerreiros. Na idade média houve evolução no tratamento das crianças e adolescentes, graças ao influxo da religião sobre o Estado e, por conseguinte, nas normas por ele emanadas. Assim, notou-se um abrandamento na severidade outrora vista no tratamento dos filhos. Ademais, em alguma medida, a Igreja passou a proteger os infantes ao estabelecer penas corporais e espirituais aos pais que maltratavam os filhos. De toda sorte, ainda não havia normas jurídicas propriamente ditas destinadas à proteção das crianças e dos adolescentes. A história mais recente traz um caso emblemático que se passou nos EUA, em 1896, envolvendo uma criança chamada Marie Anne, que sofria maus-tratos por seus pais. Uma sociedade Protetora de Animais resolveu intervir buscando decisão judicial em favor da 3 criança, argumentando que se até os animais possuíam proteção, com maior razão deveriam ter as crianças. O fato teve grande repercussão e virou o símbolo de uma nova fase que se iniciava, porque à época ainda não havia normas protetivas às crianças, e não era comum que violações a elas chegassem à justiça. Veja como isso já foi cobrado em prova: VUNESP, Juiz, TJMS, 2015: Na fase da absoluta indiferença, não havia leis voltadas aos direitos e deveres de crianças e adolescentes. (Correto) 2ª) Fase da Mera Imputação Criminal ou do Direito Penal Indiferenciado ou do Direito Penal do Menor Nessa fase preocupa-se primordialmente com a repressão de infratores. Abrange o período de vigência das Ordenações Filipinas (que previa a imputabilidade penal a partir dos 7 anos de idade), do Código Penal do Império de 1830 (que introduziu o exame da capacidade de discernimento para a aplicação da pena a pessoas entre 7 e 14 anos), do Código Penal de 1890, do 1º Código de Menores do Brasil de 1926 e do Código Mello Mattos de 1927, o qual consolidou a categoria “menor” e lançou as bases da Doutrina da Situação Irregular. 3ª) Fase Tutelar (fase da Doutrina da Situação Irregular) O debate no campo internacional e nacional levou ao desenvolvimento de uma doutrina do Direito do Menor. Nesse período existiam normas sobre crianças e adolescentes, mas elas não os tratavam como sujeitos de direitos, e sim como objeto do direito, além disso tinham uma incidência restritiva. A base dessa doutrina tinha relação direta com o binômio carência-delinquência, pois era justamente nessas situações que incidiam as normas relativas aos infantes. O sistema entrava em ação diante de crianças e adolescentes que estivessem em “situação irregular”1, o que geralmente envolvia um desses dois contextos (carência ou delinquência). Cabe destacar quatro importantes características dessa fase: 1 O artigo 2º do Código de Menores de 1979 definia o que era “situação irregular” de forma vaga e imprecisa. 4 a) abrangência relativa e discriminatória das normas de proteção às crianças e adolescentes: A rigor, o sistema entrava em ação preponderantemente diante de crianças e adolescentes pertencentes a famílias carentes, pois eram consideradas em situação irregular ou envolvidas com condutas desviantes. As leis não se aplicavam a todos de forma indistinta. b) possibilidade de afastar crianças e adolescentes do convívio com a família natural por dificuldade financeira dessa: A família, independentemente da sua condição socioeconômica, tinha o dever de prover as necessidades dos jovens à luz de um ideal estabelecido pelo Estado. Se não o fizesse de acordo com os padrões esperados, o menor era considerado em situação irregular e era possível retirá-lo do convício de sua família. O foco não era preservar a convivência familiar. Atualmente o ECA expressamente proíbe tal comportamento (art. 23). Vigorava a cultura da internação tanto para os menores carentes quanto para os “delinquentes”. A segregação era vista como uma das principais soluções. Veja como isso já foi cobrado em provas: CESPE, DPE-PE, 2018: A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar; nesse caso, a família deverá ser incluída em serviços e programas oficiais de proteção, apoio e promoção. MPMG, 2014: A falta ou a carência de recursos materiais pode ensejar a suspensão do poder familiar e o abrigamento de criança ou adolescente segundo o princípio da proteção integral. (FALSO. Art. 23 ECA) TJPR, 2014: Em se considerando que aos pais incumbe o dever de sustento dos filhos e que a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou suspensão do poder familiar, remanesce ao magistrado da Infância e Juventude apenas a possibilidade de submeter os pais a um procedimento administrativo, por infração ao disposto ao art. 249, do ECA (Art. 249. Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao pátrio poder familiarou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.) (FALSO. Arts. 22 e 23 ECA: a falta de recursos 5 materiais não é motivo, por si só, para a perda ou suspensão do poder familiar. Deve-se manter na família de origem, incluindo-a obrigatoriamente em programas de proteção, apoio e promoção). c) amplos poderes do juiz “de menores”: A partir do Código Mello Mattos, ficou estabelecido que caberia ao juiz definir o destino dos menores, sendo que para tanto a ele foi dado uma função judicial e normativa muito forte. O aspecto referente ao poder normativo é o que mais se cobra em provas, merecendo destaque o dispositivo Código de Menores de 1979 que admitia ao juiz editar atos normativos de caráter geral.2 Nesse contexto, era possível se deparar com portarias do juízo que impunham o “toque de recolher”, vendando de forma geral e abstratas a permanência de crianças e adolescentes nas ruas desacompanhadas de responsáveis após determinado horário. Atualmente ainda se tem notícias sobre portarias com esse conteúdo, porém, de acordo com o STJ, elas violam o art. 149, § 2º, do ECA, o qual veda que os atos normativos expedidos pelo juiz da infância contenham caráter geral. Vejam como isso já foi cobrado em provas: CESPE, TJDFT 2015: É vedado a juízes da infância e da juventude disciplinar, por meio de portaria ou ato normativo similar, horário máximo de permanência de crianças e de adolescentes desacompanhados dos pais ou responsáveis nas ruas da cidade. (CORRETO. STJ, HC 207.720 e REsp 1.046.350/RJ: “A portaria em questão ultrapassou os limites dos poderes normativos previstos no art. 149 do ECA. Ela contém normas de caráter geral e abstrato, a vigorar por prazo indeterminado, a respeito de condutas a serem observadas por pais, pelos menores, acompanhados ou não, e por terceiros, sob cominação de penalidades nela estabelecidas.” CESPE, TJPR, 2016: A competência regulamentar do juiz da infância e da juventude implica o poder-dever de disciplinar, por meio de ato normativo de caráter geral, horário máximo de 2 Art. 8º A autoridade judiciária, além das medidas especiais previstas nesta Lei, poderá, através de portaria ou provimento, determinar outras de ordem geral, que, ao seu prudente arbítrio, se demonstrarem necessárias à assistência, proteção e vigilância ao menor, respondendo por abuso ou desvio de poder. 6 permanência de crianças e de adolescentes desacompanhados dos pais ou responsáveis nas ruas das cidades da comarca. (ERRADO. STJ e art. 149, § 2º, ECA) Art. 149, § 2º: As medidas adotadas na conformidade deste artigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as determinações de caráter geral. d) direitos menos amplos que os dos adultos: Crianças e adolescentes tinham menos direitos que os adultos. Argumentava-se que as medidas eram tomadas para protegê-los, e não para punir, e assim não se observavam garantias fundamentais dos jovens. Nessa esteira, em certos casos, não se seguia um processo legal para aplicar medidas aos jovens autores de “conduta desviante”, nem para aferir se estavam em “situação irregular”. Não eram vistos, em verdade, como sujeitos de direito, e sim como objeto desse. 4ª) Fase da Doutrina da Proteção Integral A doutrina da Proteção Integral da criança e do adolescente foi adotada pela CF/88 e pelo ECA. Nessa esteira, o art. 1º do Estatuto diz expressamente que a lei trata da proteção integral da criança e do adolescente, já o art. 227, caput, da Carta Magna conta com a seguinte redação, a partir da qual se infere a adoção da referida doutrina: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá- los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. A CF/88 mudou de paradigma, pois as crianças os adolescentes passaram a ser tratados como sujeitos de direito, e não objetos de tutela, bem como a contar com um amplo conjunto de mecanismos jurídicos voltados à sua proteção. 7 As características da Doutrina da Proteção Integral são bastante exploradas em provas de concursos públicos, e cinco delas merecem destaque: a) Generalidade de proteção do Estatuto e demais normas protetivas: Diferente do que se verificava à época da doutrina da situação irregular, agora todas as pessoas com menos de 18 anos3 sujeitam-se de forma isonômica às normas sobre direitos e deveres das crianças e adolescentes. Vedou-se toda sorte de tratamento discriminatório, outrora bastante comum, especialmente em razão de condições econômicas dos jovens e seus familiares. O Estatuto da Primeira Infância (Lei 13.257/2016) reforçou essa ideia ao alterar o art. 3º do ECA, incluindo no parágrafo único dizendo que os direitos previstos no estatuto devem ser aplicados a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem. Buscou-se, assim, evitar discriminações. b) Prioridade Absoluta: Diz o art. 4º, parágrafo único, do ECA que a garantia de prioridade compreende a i) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, ii) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública, iii) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas, iv) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. E o art. 227 da CF, visto alhures, complementa ao dizer que a esse grupo de pessoas também se deve assegura com prioridade absoluta o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Cumpre mencionar que o Estatuto do Idoso, em seu art. 3º, também assegura absoluta prioridade nas situações acima mencionadas a pessoas de idade igual ou superior a 60 anos, 3 Conforme será visto a seguir, aplica-se o ECA em alguns casos a adultos entre 18 e 21 anos. 8 o que leva alguns a refletir sobre qual prioridade deveria preponderar, a das crianças e adolescentes, ou a dos idosos. A solução deve ser dada à luz do caso concreto. Contudo, no plano abstrato e teórico, há um argumento que pode ser utilizado em favor da prioridade dos infantes: a prioridade desse grupo de pessoas tem sede constitucional, e, portanto, hierarquicamente superior à dos idosos que é apenas legal. c) Condição peculiar de pessoa em desenvolvimento: São assegurados todos os direitos que possuem os adultos e mais outros decorrentes da condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Aqui também há nítido contraste com a doutrina da situação irregular, quando crianças e adolescnetes tinham menos direitos que os adultos. Em razão disso, recebem tratamento especial, com procedimentos diferenciados e até mesmo uso de taxonomia própria. Crianças e adolescentes, p. ex., não cometem crimes, e sim atos infracionais. Não se sujeito à pena,mas sim à medida socioeducativa e/ou medida de proteção. Não responde à ação penal, e sim a ação socioeducativa. d) Busca do melhor interesse da criança e do adolescente: Impõe-se que, na análise do caso concreto, o aplicador do direito busque a solução mais vantajosa para a criança ou adolescente, e não, p. ex., a seus pais, guardiães, tutores ou adotantes. Esse princípio se faz muito presente no estudo da colocação em família substituta. Veja como já foi cobrado em prova de concurso: CONSULPLAN, TJMG, 2018: Em caso de conflito entre direitos e interesses do adotando e de outras pessoas, inclusive seus pais biológicos, devem prevalecer os direitos e os interesses do adotando. (CERTO. É uma decorrência da busca do melhor interesse da criança, e da previsão expressa do art. 39, § 3º, do ECA). CESPE, TJAM, 2016: O princípio da proteção integral e a aplicação de medidas de proteção à criança e ao adolescente, previstas no ECA, justificam a imperatividade na obediência à ordem cronológica do registro de pessoas interessadas na adoção. (ERRADO. Em razão do princípio 9 do maior interesse da criança e do adolescente, existe situações em que se admite a não observância da ordem cronológica do registro de pessoas interessadas na adoção. Três exceções são previstas no art. 50, § 13, do ECA, e outas são fruto da jurisprudência do STJ, conforme veremos no momento oportuno). e) Abandono da expressão “menor”: A expressão “menor” tornou-se pejorativa, porquanto remete ao Código de Menores, e consequentemente à doutrina da situação irregular, a qual se preocupava primordialmente com a carência-delinquência, e dava tratamento discriminatório aos jovens nessa situação. ➢ Art. 2º do ECA: Define criança e adolescente da seguinte maneira: • Criança ➔ pessoa até 12 anos de idade incompletos (de 0 a 11). • Adolescente ➔ pessoa entre 12 e 18 anos de idade (de 12 a 17). O jovem é de 15 a 29 anos. ➢ Parágrafo único do art. 2º: Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente o ECA às pessoas entre 18 e 21 anos de idade. Isso ocorre tanto na seara do ato infracional quanto na seara civil. Exemplo de aplicação do ECA para os maiores de 18 anos no âmbito cível: Adoção: tramitava processo de adoção na Vara da Infância e da Juventude (VIJ) de adolescente de 17 anos de idade. No meio do processo, ele completou 18 anos, mas já estava sob guarda ou tutela dos adotantes. Nessa situação, o pedido de adoção correrá na vara da infância e da juventude. Exemplo de aplicação do ECA para os maiores de 18 anos no âmbito infracional: Medida socioeducativa: podem ser aplicadas até o jovem completar 21 anos. Ou seja, é possível que um adulto de 18 comece a cumprir uma medida de internação decorrente de ato infracional que praticou quando adolescente. A medida poderá perdurar até os 21 anos. 10 Veja como isso já foi cobrado em provas: CONSULPLAN, TJMG, 2018: Criança, para os efeitos do ECA, é a pessoa que possuiu até 12 (doze) anos de idade completos. Em situações excepcionais, expressas em lei, o Estatuto poderá ser aplicado às pessoas entre 18 (dezoito) anos e 21 (vinte e um) anos de idade. (ERRADO. Art. 2º do ECA: criança é até 12 anos incompletos). IV. Interpretação do ECA Diz o art. 6º do ECA que, na sua interpretação levar-se-ão em conta: a) os fins sociais a que ela se dirige; b) as exigências do bem comum; c) os direitos e deveres individuais e coletivos; e d) a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento. V. Competência legislativa Competência concorrente: a União trata de normas gerais e os Estados e o DF tratam de normas específicas. 2. Direitos fundamentais Crianças e adolescentes têm todos os direitos fundamentais assegurados à pessoa adulta. O rol de direitos fundamentais previstos no ECA é ainda mais amplo. Isso decorre da Doutrina da Proteção Integral e do princípio da condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. São direitos fundamentais encontrados no ECA: • Direito à vida e à saúde 11 • Direito à liberdade, ao respeito e à dignidade • Direito à convivência familiar e comunitária • Direito à educação, à cultura, ao esporte e ao lazer • Direito à profissionalização e à proteção ao trabalho I. Direito à vida e à saúde O capítulo que trata destes direitos é muito importante para provas de concursos, especialmente após as diversas alterações promovidas pela Lei 13.257/2016 (Estatuto da Primeira Infância). Diz o legislador que a criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência (art. 7º). Aqui, direito à vida não se confunde com o direito de sobreviver. Implica, em verdade, o reconhecimento do direito à vida digna. E para assegurar a vida digna, há necessariamente de se reconhecer o direito à saúde. Assim, não basta garantir o direito à vida, é necessário garantir o direito à vida com saúde. Visando atingir esse fim, o legislador criou direitos às mulheres em geral, às gestantes e às mães de crianças. Em alguma medida, disciplinou-se direitos sexuais e reprodutivos das mulheres4, com o objetivo de fazer com que as crianças nasçam e se desenvolvam com saúde. A esse respeito, merecem destaque os seguintes direitos: • As mulheres em geral passaram a ter direito ao acesso a programas e políticas de saúde específicos da mulher e de planejamento reprodutivo; • Às gestantes deve ser assegurado a nutrição adequada; 4 Direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, envolvendo aborto, foi tema abordado na 2ª fase do 29º concurso para Promotor de Justiça do MPDFT. 12 • Os locais onde o parto for realizado assegurarão às mulheres e aos seus filhos recém-nascidos alta hospitalar responsável5 e contrarreferência na atenção primária, bem como o acesso a grupos de apoio à amamentação; • As gestantes têm direito de escolher o estabelecimento em que o parto será realizado e de serem a ele vinculado nos três últimos meses de gestação (trata-se de medida que visa dar atenção humanizada à gravidez e ao parto, viabilizando que a mulher se familiarize com a equipe médica que o irá realizar, bem como o local em que ele se dará); • Às gestantes e às mães de recém-nascidos é assegurada a assistência psicológica até no pós-natal como forma de prevenir ou minorar as consequências do estado puerperal, inclusive às mulheres privadas de liberdade; ademais, elas têm o direito de serem acompanhadas em todas as etapas por uma pessoa de sua preferência; • Como forma de incentivar o parto normal no Brasil, ele foi elevado a um verdadeiro direito ao parto, devendo a cesariana ser realizada por motivos médicos. • Criou-se, por fim, o dever de buscar-se ativamente a gestante que não iniciar ou que abandonar as consultas de pré-natal, bem como da puérpera que não comparecer às consultas pós-parto. Como isso já foi cobrado em provas: Promotor de Justiça, MPMG, 2017: Assinale a alternativa INCORRETA: São direitos das gestantes e parturientes, garantidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente: a) Atendimento pré-natal no estabelecimento em que será realizado o parto, garantido o direito de opção da mulher. (ERRADO. Art. 8º, § 1º e 2º, ECA) 5 O conceito de alta hospital responsável consta do art. 16 da PORTARIA Nº 3.390/2013 do Ministério da Saúde, o qual tem o seguinte teor: A alta hospitalar responsável: é a transferência do cuidado, realizadapor meio de: I - orientação dos pacientes e familiares quanto à continuidade do tratamento, reforçando a autonomia do sujeito, proporcionando o autocuidado; II - articulação da continuidade do cuidado com os demais pontos de atenção da Rede de Atenção à Saúde, em particular a Atenção Básica; e III- implantação de mecanismos de desospitalização, visando alternativas às práticas hospitalares, como as de cuidados domiciliares pactuados na RAS. 13 b) Um acompanhante, de sua preferência, durante o período do pré-natal, do trabalho de parto e do pós-parto imediato. c) Alta hospitalar responsável e contrarreferência na atenção primária, bem como o acesso a outros serviços e a grupos de apoio e amamentação. d) Acompanhamento saudável durante toda a gestação, parto natural cuidadoso, aplicação de cesariana e outras intervenções cirúrgicas por motivos médicos. FCC, Defensor Público, DPE/BA, 2016: Em março de 2016, o texto do Estatuto da Criança e do Adolescente sofreu modificações destinadas a incorporar ou reforçar regras voltadas à proteção da primeira infância, entre as quais podemos citar: [...] b) Direito da parturiente, junto ao Sistema Único de Saúde, de contar com um acompanhante de sua preferência no pré-natal, e o pós-parto e dois acompanhantes durante o trabalho de parto. (ERRADO. ART. 8º, § 6º, ECA) Além de direitos às mulheres, o legislador também criou diversos deveres ao poder público, às instituições e empregadores privados, bem como aos hospitais, igualmente visando assegurar o direito de crianças e adolescentes terem uma vida com saúde. Assim, o ECA passou a exigir de forma expressa, p. ex., que o poder público, as instituições e os empregadores propiciem condições adequadas ao aleitamento materno, inclusive aos filhos de mães submetidas a medida privativa de liberdade (art. 9º).6 Nessa linha, vale lembrar que o constituinte originário também teve essa preocupação com os recém-nascidos cujas mães sejam presidiárias, pois, no art. 5º, inc. L, da CF, estabeleceu que devem ser asseguradas condições para que elas possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação. Frise-se, ainda, que a Lei do SINASE (Lei 12.594), no § 2º do art. 63, trouxe previsão semelhante para proteger os filhos das adolescentes submetidas à execução de medida 6 Esse tema foi cobrado na prova discursiva da DPE/SP (2012). 14 socioeducativa de privação de liberdade, pois diz ser necessário assegurar condições para que ela permaneça com o seu filho durante o período de amamentação. De toda sorte, em ambos os casos, é mais um direito do recém-nascido do que da gestante, porquanto se visa primordialmente a saúde daquele. Quanto aos hospitais e estabelecimentos de atenção à saúde de gestantes, sejam públicos ou particulares, merecem destaque as seguintes obrigações: Art. 10 do ECA: • Manter registro das atividades desenvolvidas, através de prontuários individuais, pelo prazo de dezoito anos. Esse prazo, por ser longo, é muito cobrado em prova. Geralmente o examinador apresenta um tempo inferior. Veja um exemplo de como isso já foi cobrado: CESPE, Juiz, TJDFT, 2016: O ECA relaciona obrigações que devem ser cumpridas pelos hospitais e demais estabelecimentos públicos e particulares de atenção à saúde de gestantes, dentre elas a de manter registro das atividades desenvolvidas, até de prontuários individuais, pelo prazo de cinco anos, sob pena de cometimento de infração administrativa, punida com multa, além de outras sanções administrativas. • Identificar o recém-nascido mediante o registro de sua impressão plantar e digital e da impressão digital da mãe, sem prejuízo de outras formas normatizadas pela autoridade administrativa competente. • Proceder a exames visando ao diagnóstico e terapêutica de anormalidades no metabolismo do recém-nascido, bem como prestar orientação aos pais. Neste ponto, vale mencionar que a Lei nº 13.438 de 2017 incluiu o § 5º no art. 14 do ECA para dizer que “é obrigatória a aplicação a todas as crianças, nos seus primeiros dezoito meses de vida, de protocolo ou outro instrumento construído com a finalidade de facilitar a detecção, em consulta pediátrica de acompanhamento da criança, de risco para o seu desenvolvimento psíquico”. Por ser uma alteração recente, é bem provável que o examinador passe a explorar isso. 15 • Fornecer declaração de nascimento onde constem necessariamente as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato. • Manter alojamento conjunto, possibilitando ao neonato a permanência junto à mãe. • Acompanhar a prática do processo de amamentação, prestando orientações quanto à técnica adequada, enquanto a mãe permanecer na unidade hospitalar, utilizando o corpo técnico já existente. Essa última obrigação foi incluída pela Lei nº 13.436 de 2017. Por ser recente, certamente irá ser cobrada em provas de concursos. Art. 12: • Os estabelecimentos de atendimento à saúde, inclusive as unidades neonatais, de terapia intensiva e de cuidados intermediários, deverão proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente. (Obrigação criada pelo Estatuto de Primeira Infância) Veja como isso já foi cobrado em prova: Promotor de Justiça, MPPR, 2016: Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, os estabelecimentos de atendimento à saúde, inclusive as unidades neonatais, de terapia intensiva e de cuidados intermediários, deverão proporcionar condições para a permanência em tempo integral DOS GENITORES ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente. (FALSO. Só um dos pais). Por fim, os últimos pontos a serem destacados quanto ao capítulo do direito à vida e à saúde diz respeito a procedimentos a serem adotados (1º) em caso de suspeitas de maus tratos de crianças e adolescentes e (2º) em caso de interesse da gestante ou mãe em entregar filho para a adoção: 16 . (1º) suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante ou de maus-tratos contra criança ou adolescente: o Conselho Tutelar deve ser comunicado obrigatoriamente;7 . (2º) mães e gestantes que quiserem entregar seus filhos à adoção: devem ser conduzidas à Justiça da Infância e Juventude, sem constrangimento (conforme veremos adiante, a Lei 13.509 de 22/11/2017 incluiu no ECA o art. 19-A que detalhou esse procedimento, até então previsto de forma genérica no § 1º do art. 13 do ECA, com a redação dada pelo Estatuto da Primeira Infância). Embora sejam assuntos bem diferentes, o legislador tratou deles em um só dispositivo (art. 13 e §§ do ECA), e em provas de concursos públicos é comum que o examinador busque confundir os procedimentos. A propósito, veja como isso já foi cobrado em prova: MPPR, Promotor de Justiça, 2016: Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, as gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção serão obrigatoriamente encaminhadas, sem constrangimento, ao Conselho Tutelar mais próximo do lugar em que se encontrem. (FALSO. Nesse caso se encaminhar à Vara da Infância e da Juventude). - Preocupação com a entrega da criança à adoção O ECA se orienta pela preservação da criança em sua família natural. A colocação em família substituta é absolutamente excepcional, sendo a adoção a última opção. Conforme visto, o art. 8º, § 5º, diz que incumbe ao poder público prestar assistência psicológica: 7 A obrigação se dirige aos mais diversos agentespúblicos e privados, porém é muito comum que essa obrigação surja para professores e médicos. As entidades públicas e privadas devem contar com pessoas capacitadas a reconhecer e comunicar ao Conselho Tutelar suspeitas ou casos de maus-tratos praticados contra crianças e adolescentes (art. 70-B ECA). E são igualmente responsáveis pela comunicação as pessoas encarregadas, por razão de cargo, função ou ocupação, do cuidado, assistência ou guarda de crianças e adolescentes (§ único do 70-B). 17 • A gestantes e mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção. E o art. 13, § 1o, estabelece que: As gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção serão obrigatoriamente encaminhadas, sem constrangimento, à Justiça da Infância e da Juventude. Já a Lei nº 13.509 de 2017 disciplinou os termos desse encaminhamento, o qual é importante memorizar para a prova. Ressalte-se que os §§ 6º e 10 foram vetados. Porém, em fevereiro de 2018, os vetos foram derrubados. Em razão disso, os códigos e vade mecum do início de 2018 estão desatualizados. Confira o que diz o dispositivo: Art. 19-A. A gestante ou mãe que manifeste interesse em entregar seu filho para adoção, antes ou logo após o nascimento, será encaminhada à Justiça da Infância e da Juventude. (Incluído pela Lei nº 13.509, de 2017). Lembre-se que esse encaminhamento deve ser feito “sem constrangimento”, segundo o art. 13 do ECA. § 1º A gestante ou mãe será ouvida pela equipe interprofissional da Justiça da Infância e da Juventude, que apresentará relatório à autoridade judiciária, considerando inclusive os eventuais efeitos do estado gestacional e puerperal. O relatório da equipe interprofissional subsidiará não só futura decisão do juiz quanto à adoção, como também quanto à necessidade de encaminhar a mãe ou gestante a atendimento especializado de saúde ou assistência social. § 2º De posse do relatório, a autoridade judiciária poderá determinar o encaminhamento da gestante ou mãe, mediante sua expressa concordância, à rede pública de saúde e assistência social para atendimento especializado. § 3º A busca à família extensa, conforme definida nos termos do parágrafo único do art. 25 desta Lei, respeitará o prazo máximo de 90 (noventa) dias, prorrogável por igual período. Aqui se ressaltou que a adoção deve ser tida como última providência. Primeiro deve-se buscar a manutenção dos vínculos com a família natural, entregando-a ao pai ou buscando a 18 família extensa ou ampliada (aquela formada por parentes próximos com os quais a criança tem vínculos de afinidade e afetividade). De toda sorte, com o fito de dar agilidade ao processo de adoção, estabeleceu-se limite temporal a essa busca, que antes durava tempo indefinido. § 4º Na hipótese de não haver a indicação do genitor e de não existir outro representante da família extensa apto a receber a guarda, a autoridade judiciária competente deverá decretar a extinção do poder familiar e determinar a colocação da criança sob a guarda provisória de quem estiver habilitado a adotá-la ou de entidade que desenvolva programa de acolhimento familiar ou institucional. § 5º Após o nascimento da criança, a vontade da mãe ou de ambos os genitores, se houver pai registral ou pai indicado, deve ser manifestada na audiência a que se refere o § 1º do art. 166 desta Lei, garantido o sigilo sobre a entrega. § 6º Na hipótese de não comparecerem à audiência nem o genitor nem representante da família extensa para confirmar a intenção de exercer o poder familiar ou a guarda, a autoridade judiciária suspenderá o poder familiar da mãe, e a criança será colocada sob a guarda provisória de quem esteja habilitado a adotá-la. (Promulgação de partes vetadas) Inicialmente esse artigo tinha sido vetado. Porém, em fevereiro de 2018 o Congresso Nacional derrubou o veto. § 7º Os detentores da guarda possuem o prazo de 15 (quinze) dias para propor a ação de adoção, contado do dia seguinte à data do término do estágio de convivência. Aqui, mais uma vez, fica nítido o propósito de imprimir celeridade ao procedimento de adoção. § 8º Na hipótese de desistência pelos genitores - manifestada em audiência ou perante a equipe interprofissional - da entrega da criança após o nascimento, a criança será mantida com os genitores, e será determinado pela Justiça da Infância e da Juventude o acompanhamento familiar pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias. § 9º É garantido à mãe o direito ao sigilo sobre o nascimento, respeitado o disposto no art. 48 desta Lei. 19 § 10. Serão cadastrados para adoção recém-nascidos e crianças acolhidas não procuradas por suas famílias no prazo de 30 (trinta) dias, contado a partir do dia do acolhimento. (Promulgação de partes vetadas) Inicialmente esse artigo tinha sido vetado. Porém, em fevereiro de 2018 o Congresso Nacional derrubou o veto. II. Direito à liberdade, ao respeito e à dignidade • Denominada trilogia da proteção integral da criança e do adolescente. Teoria de proteção integral: as normas que cuidam de crianças e adolescentes devem concebê-los como cidadãos plenos, porém sujeitos à proteção prioritária, tendo em vista que são pessoas em desenvolvimento físico, psicológico e moral. • Referem-se, basicamente aos três pilares destacados. a) Direito à liberdade Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos (rol exemplificativo): • I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais; • II - opinião e expressão; • III - crença e culto religioso; • IV - brincar, praticar esportes e divertir-se; • V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; • VI - participar da vida política, na forma da lei; • VII - buscar refúgio, auxílio e orientação. 20 Note-se que é bem mais amplo do que o mero direito de ir e vir. É importante memorizar o conteúdo desse direto para não confundir com o direito ao respeito. Vê-se em provas de concurso público a tentativa de confundir os candidatos misturando o conteúdo deles. No que diz respeito ao direito de ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, vale lembrar que o juiz disciplinar a entrada e permanência de crianças e adolescentes em diversos espaços, desde que não o faça de modo geral e abstrato. Conforme visto alhures, atualmente o ECA e o STJ não admitem as portarias que criem “toque de recolher”, vendando genericamente a permanência de crianças nas ruas no período noturno desacompanhada dos responsáveis. A esse respeito, vale conferir o que diz o ECA: Art. 149. Compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante alvará: I - a entrada e permanência de criança ou adolescente, desacompanhado dos pais ou responsável, em: a) estádio, ginásio e campo desportivo; b) bailes ou promoções dançantes; c) boate ou congêneres; d) casa que explore comercialmente diversões eletrônicas; e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão. II - a participação de criança e adolescente em: a) espetáculos públicos e seus ensaios; b) certames de beleza. § 1º Para os fins do disposto neste artigo, a autoridade judiciária levará em conta, dentre outros fatores: a) os princípios desta Lei; b) as peculiaridades locais; 21 c) a existência de instalações adequadas; d) o tipo de frequência habitual ao local; e) a adequação do ambiente a eventual participação ou frequência de crianças e adolescentes; f) a natureza do espetáculo. § 2º As medidas adotadas na conformidade desteartigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as determinações de caráter geral MPSP, Promotor de Justiça, 2017: A Constituição Federal de 1988 impôs ao legislador infraconstitucional o dever de tratar a criança e o adolescente como sujeitos de direito – e não mais como mero objeto de intervenção do mundo adulto. Nessa linha, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu Título II, especificou direitos denominados fundamentais de infantes e jovens. Em tal contexto, atribuiu às crianças e aos adolescentes direitos de defesa mesmo em face dos adultos a quem o ordenamento jurídico os subordina. Dentre tais direitos, encontra- se o de defesa da integridade físico-psíquica e moral, na sua faceta de proteção aos direitos de fruir e de desenvolver a própria personalidade, de defender-se de agressões comprometedoras de sua condição de pessoa em fase de desenvolvimento, especificamente quando as iniciativas nefastas partam de pessoas a quem a lei impôs o dever de, direta e rotineiramente, protegê-los contra os ataques dos demais membros do grupo social, devendo ser-lhes prestado, para tanto, o suporte necessário. Tal contextualização correspondente ao direito de liberdade de: (B) buscar refúgio. MPRS, Promotor de Justiça, 2016: A implementação de programas para atendimento da criança e do adolescente em situação de rua vai de encontro ao direito de ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, assegurado no Artigo 16, inciso I, do Estatuto da Criança e do Adolescente. (FALSO). Além disso, esse assunto já foi cobrado nas provas de Juiz/DF, CESPE, 2015 e Juiz/PR, em 2013 e 2016. 22 b) Direito ao respeito Art. 17 - O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. • Conclusão: o direito ao respeito guarda estreita relação com os direitos da personalidade. Eventuais violações ao direito ao respeito podem levar à indenização por danos morais. Cumpre destacar que abrange a proteção à imagem. Importante julgado sobre o tema foi objeto do informativo 511 do STJ. Restou estabelecido ser vedada a veiculação de material jornalístico com imagens que envolvam criança em situações vexatórias ou constrangedoras, ainda que não se mostre o rosto da vítima, e que o MP detém legitimidade para propor ação civil pública com o intuito de impedir a veiculação de vídeo, em matéria jornalística, com cenas de tortura contra uma criança, ainda que não se mostre o seu rosto. Embora o julgado tenha se referido especificamente à legitimidade do Ministério Público, entendemos que o mesmo raciocínio pode ser utilizado para legitimar ação similar por parte da Defensoria Pública. Outro ponto correlato d extrema relevância para provas, diz respeito à vedação de divulgação de atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional. Atenção! Não confunda com a divulgação da notícia sobre o fato, o que é admissível com ressalvas. Qualquer notícia a respeito do fato não poderá identificar a criança ou adolescente, vedando-se fotografia, referência a nome, apelido, filiação, parentesco, residência e, INCLUSIVE, INICIAIS DO NOME E SOBRENOME. (Art. 143 do ECA). Isso já foi cobrado em provas de promotor de justiça do MPPR, juiz do TJPR e juiz do TJDFT de 2016. Veja como isso já foi cobrado em provas: TJDFT, Juiz, CESPE, 2016: As notícias que envolvam a prática de ato infracional poderão conter identificação da criança e do adolescente mediante mera indicação de iniciais do nome e do sobrenome, desde que não divulgadas fotografias ou imagens do rosto do menor. (FALSO. Não pode indicar nem as iniciais do nome). 23 TJPR, Juiz, CESPE, 2016: Quem exibe, sem autorização, fotografia de adolescente envolvido em ato infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga respeito ou se refira a atos que lhe sejam atribuídos, de forma a permitir sua identificação, direta ou indiretamente, pratica infração administrativa prevista no ECA. (CORRETO) Promotor de Justiça, MPPR, 2016: Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo, entre outros, os seguintes aspectos: opinião, expressão e participação na vida política, na forma da lei; (ERRADO. Misturou com liberdade: art. 16). MPSP: O direito ao respeito de que gozam as crianças e os adolescentes, afirmado em norma contida na Lei n. 8.069/90, não abrange: a) a imagem e a identidade. b) os espaços e objetos pessoais. c) a escolha de trabalho, ofício e profissão. d) a autonomia, os valores, as ideias e as crenças. e) a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral. c) Direito à dignidade Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. d) Direito à educação sem castigo físico, sem tratamento cruel ou degradante A Lei n° 13.010/2014 inseriu no art. 18-A e 18-B do ECA o direito de crianças e adolescentes serem educados e cuidados sem o uso de: • castigos físicos ou • de tratamento cruel ou degradante. 24 A Lei ficou conhecida como “Lei da Palmada” ou “Lei Menino Bernardo”, em homenagem a criança chamada Bernardo Uglione Boldrini que teria sido morta pelo pai e pela madrasta. Para fins de prova, é importante saber o que é considerado “castigo físico” para os fins desta Lei. Castigo físico é a ação de natureza disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da força física que cause na criança ou adolescente: a) sofrimento físico ou b) lesão. Portanto, a “palmada” dada em uma criança, mesmo que não cause lesão corporal, poderá ser considerada “castigo físico” se gerar sofrimento físico. Todavia, a lei não proíbe toda e qualquer palmada nas crianças e adolescentes. Somente veda aquela que gere sofrimento físico ou lesão. Se a palmada for leve e não causar sofrimento nem lesão, em tese estará fora da incidência da lei. Frise-se que o projeto original da lei proibia expressamente qualquer palmada. Porém, houve um abrandamento com o texto final. Note-se que o castigo físico com lesão corporal sempre foi punido. Pode enquadrar-se nos tipos dos arts. 129 ou 136 do Código Penal, a depender do caso concreto. E o que é considerado “tratamento cruel ou degradante” para os fins desta Lei? Tratamento cruel ou degradante é aquele que: a) humilha; b) ameaça gravemente; ou c) ridiculariza a criança ou o adolescente. Perceba, portanto, que a Lei n° 13.010/2014 proíbe, além da violência física, qualquer forma de tratamento cruel ou degradante, o que pode acontecer mesmo sem contato físico, como no caso de agressões verbais. Veja como isso já foi cobrado em provas: 25 TJGO, Juiz, FCC, 2015: cobrou o que é “tratamento cruel ou degradante”. Literalidade do art. 18-A, II, do ECA. MPRR, Promotor de Justiça, CESPE, 2017: Segundo o ECA, “A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los.” Nesse sentido, entende-se porI - castigo físico a ação de natureza disciplinar ou punitiva aplicada com o uso da força física sobre a criança ou o adolescente e que lhes cause sofrimento físico ou lesão. II - tratamento cruel ou degradante a conduta ou forma cruel de tratamento em relação à criança ou ao adolescente que lhes humilhe, ameace gravemente ou ridicularize. III - tratamento cruel ou degradante a alienação parental praticada por um dos genitores, por ser uma forma de humilhar a criança ou o adolescente. Assinale a opção correta. (O item III é falso, pois alienação parental não se enquadra como tratamento cruel, nos termos do que diz o ECA). Ainda sobre o tema, destaque-se importante julgado do STJ, veiculado no informativo 598, onde se decidiu que a conduta da agressão, verbal ou física, de um adulto contra uma criança ou adolescente, configura elemento caracterizador da espécie do dano moral in re ipsa. (É prescindível prova de dano em concreto à subjetividade do indivíduo que pleiteia a indenização) (REsp 1.642.318-MS, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 7/2/2017). Em outras palavras, é possível concluir que, segundo o STJ, o tratamento cruel ou degradante de uma criança ou adolescente, bem como o seu castigo físico, caracteriza o dano moral in re ipsa. 26 Demais disso, alguns questionamentos devem ser respondidos. Quem deverá respeitar esse direito? • os pais • os integrantes da família ampliada (exs: padrasto, madrasta); • os responsáveis (ex: tutor); • os agentes públicos executores de medidas socioeducativas (ex: funcionários dos centros de internação); • qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá-los ou protegê-los (exs: babás, professores). O que acontece com quem utilizar de castigo físico ou tratamento cruel ou degradante como forma de educação contra a criança ou adolescente? Os infratores estarão sujeitos, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, às seguintes medidas, que serão aplicadas de acordo com a gravidade do caso: I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família; II - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico; III - encaminhamento a cursos ou programas de orientação; IV - obrigação de encaminhar a criança a tratamento especializado; V - advertência. As medidas acima previstas serão aplicadas pelo Conselho Tutelar, sem prejuízo de outras providências legais. A conduta configura crime? Frise-se que Lei n° 13.010/2014 não prevê nenhum crime. No entanto, a depender do caso concreto, o castigo físico aplicado ou o tratamento cruel ou degradante empregado poderá configurar algum crime previsto no Código Penal ou no ECA. Assim, se o castigo físico provocar lesão corporal, haverá punição com base no art. 129 do CP. Por outro lado, se ele consistir em “expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua 27 autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina”, restará caracterizado o crime previsto no art. 136 do CP. Por fim, eventualmente, a conduta que importe em tratamento cruel ou degradante, a depender do caso concreto, amoldar-se-á ao tipo do art. 232 do ECA: “submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento”. O pai ou mãe agressor poderá perder o poder familiar por conta dessa conduta? SIM. Mas a Lei n° 13.010/2014 também não prevê isso. Contudo, o Código Civil estabelece que é caso de perda do poder familiar o castigo imoderado do filho: Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho; A Lei n.° 13.010/2014 viola o Direito de Família Mínimo, importando em uma interferência indevida do Estado nas relações familiares? Entendemos que não. A CF/88 diz ser dever também da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, e ao respeito, além de colocá-los a salvo de toda forma de violência, crueldade e opressão (art. 227). Essa lei contribuiu para esse fim. O que muda, na prática, com a Lei n.° 13.010/2014? Praticamente nada. Isso porque os castigos físicos e o tratamento cruel ou degradante já eram punidos por outras normas existentes, como o Código Civil, o Código Penal e o próprio ECA. A Lei n° 13.010/2014 assumiu um caráter mais pedagógico e programático, pois o debate do assunto no Congresso Nacional veio para as ruas, e passou-se a falar mais sobre a necessidade de uma comunicação e uma educação não violenta com os jovens. III. Direito à convivência familiar 28 Art. 19. É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral. • Critério fundamental para colocação ou não em família substituta: melhor interesse da criança ou do adolescente. • A família natural tem preferência legal em relação à família substituta. Art. 19, § 3º: a manutenção ou a reintegração de criança ou adolescente à sua família terá preferência em relação a qualquer outra providência, caso em que esta criança ou adolescente será incluída em serviços e programas de proteção, apoio e promoção. A prioridade da família natural persiste nas hipóteses em que os pais estejam privados de sua liberdade. § 4º do art. 19: será garantida a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial. § 5º do art. 19: Será garantida a convivência integral da criança com a mãe adolescente que estiver em acolhimento institucional. (Incluído pela Lei nº 13.509, de 2017) § 6º: A mãe adolescente será assistida por equipe especializada multidisciplinar. (Incluído pela Lei nº 13.509, de 2017) Veja como já foi cobrado em prova: CONSULPLAN, JUIZ, TJMG, 2018: I. A convivência integral da criança com a mãe adolescente que estiver em acolhimento institucional será devidamente garantida. (CERTO. Art. 19, § 5º, do ECA). II. Será garantida a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial. (CERTO. Art. 19, § 4º, do ECA). 29 Portanto, a regra é que a criança e o adolescente sejam criados no seio de sua família natural, devendo ser colocada em família substituta apenas em última caso, tento preferência os membros da família ampliado. Mas o que é família natural, família extensa/ampliada e família substituta?8 De acordo com o art. 25 do ECA, Família NATURAL (caput) é aquela composta pelos pais (ou um deles) e os descendentes, e Família EXTENSA ou AMPLIADA (§ único) é a formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade (p. ex., tio/sobrinho, avô/neto, que tenham convívio). Veja como isso já foi cobrado em provas: TJPR, Juiz, 2014: A família extensa ou ampliada é aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos, os quais devem ser previamente consultados, quando houver necessidade de colocação do infante/adolescente em família substituta, na modalidade de guarda. (FALSO. + convivência e vínculos de afinidade e afetividade. Além disso, não há previsão expressa da obrigatoriedade de consultá-los). CESPE, TJAM, 2016: O conceito de família natural abrange o de família extensa, como aquela formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes, inclusive parentes próximos e VIZINHOS com os quais a criança ou adolescente conviva e mantenha vínculos de afinidade e afetividade. (FALSO. ART. 25, ECA) Família SUBSTITUTA, por usa vez é aquela composta por GUARDA, TUTELA e ADOÇÃO (art. 28, caput ECA). Quando se tratar de colocação em família substituta estrangeira, a única modalidade aceita é a adoção. Art. 28. A colocação em família SUBSTITUTA far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei. Veja como isso já foi cobrado em prova: 8 Há também, doutrinariamente, a família recomposta (família mosaico): formada por homens e mulheres que se unem, tendo filhos de relacionamentos anteriores. 30 TJAM, Juiz, CESPE, 2016: A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, após definida a situação jurídica da criança ou adolescente por meio de suspensão ou destituição do poder familiar, salvo quando ambos os genitores forem falecidos. (FALSO. ART. 28, ECA. Além disso, a guarda não pressupõe a perda ou suspensão do poder familiar). O § 1º daquele artigo diz que SEMPRE QUE POSSÍVEL, a criança ou o adolescente será previamente ouvido por equipe interprofissional, respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de compreensão sobre as implicações da medida, e terá sua opinião devidamente considerada. Já o § 2º assevera que em se tratando de MAIOR de 12 (doze) anos de idade, será necessário seu consentimento, colhido em audiência. É comum os examinadores mesclarem esses dados nas provas para confundir os candidatos. Portanto, memorize o quadro: CRIANÇA OU ADOLESCENTE SE POSSÍVEL, é previamente ouvido por equipe interdisciplinar, e tem sua opinião considerada, mas não é vinculante. ADOLESCENTE (maior de 12 anos) Oitiva obrigatória. E deve consentir em previamente em audiência. Como isso já foi cobrado em provas: TJSC, Juiz, FCC, 2017: Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, são regras que devem ser observadas para a concessão da guarda, tutela ou adoção, a) o consentimento do adolescente, colhido em audiência, exceto para a guarda. b) a opinião da criança que, sempre que possível, deve ser colhida por equipe interprofissional e considerada pela autoridade judiciária competente. (CORRETO) c) a prevalência das melhores condições financeiras para os cuidados com a criança ou adolescente. d) a prioridade da tutela em favor de família extensa quando ainda coexistir o poder familiar. e) a preferência dos pais ou responsável por algum dos eventuais pretendentes à guarda, tutela ou adoção. 31 MPGO, Promotor de Justiça, 2016: O consentimento do adolescente é necessário para colocação em família substituta e deverá ser realizado em audiência, o mesmo não se exigindo quando se tratar de criança. (CORRETO. Art. 28, § 2º, ECA) TJPR, Juiz, 2014: No procedimento de adoção, em se tratando de adotando, maior de doze anos de idade, é indispensável o seu consentimento pessoal, que, entretanto, poderá ser suprido pelos pais ou responsável, se o magistrado considerar que o adolescente não está apto a manifestar sua opinião. (FALSO. Art. 28, § 2º, ECA. Não há essa previsão de suprimento). TJAM, Juiz, CESPE, 2016: Os grupos de irmãos colocados sob adoção, tutela ou guarda terão de permanecer com a mesma família substituta, ressalvada a suspeita da existência de risco de abuso ou outra situação que justifique razoavelmente o rompimento definitivo dos vínculos fraternais. (FALSO. 28, § 4º. Tem de justificar “plenamente”e buscar não romper os vínculos fraternais) MPGO, Promotor de Justiça, 2016: Em se tratando de colocação em família substituta de criança ou adolescente indígena é, entre outros, obrigatório a intervenção e oitiva de representantes do órgão federal responsável pela política indigenista e de antropólogos, perante equipe interprofissional ou multidisciplinar que irá acompanhar o caso. (CORRETO. ART. 28, § 6º, III, ECA) CESPE, TJAM, 2016: Entre outras exigências legais, criança ou adolescente indígenas ou provenientes de comunidade remanescente de quilombo encaminhados para adoção, tutela ou guarda devem prioritariamente ser colocados em família substituta de sua comunidade ou junto a membros da mesma etnia. (CORRETA. ART. 28, § 6º, II, ECA) Ainda sobre as noções gerais da colocação em família substituta, tem-se que destacar a NECESSIDADE de prévia autorização judicia, nos termos do que dispõe o ECA: Art. 30. A colocação em família substituta NÃO admitirá transferência da criança ou adolescente a terceiros ou a entidades governamentais ou não governamentais, SEM autorização judicial. Veja como isso já foi cobra em prova: TJDFT, Juiz, CESPE, 2016: A colocação em família substituta admite a transferência de criança ou adolescente a terceiro, desde que o fato seja comunicado ao Juízo da Infância no prazo de vinte e quatro horas, para a regularização respectiva. (FALSO. ART. 30. Precisa de prévia autorização judicial). 32 Conforme já dito, a colocação em família substituta é situação excepcional, sendo a adoção a mais drástica medida. E mais excepcional ainda é a colocação em família substituta estrangeira, o que se faz apenas por meio de adoção, conforme diz o ECA: Art. 31. A colocação em família substituta ESTRANGEIRA constitui medida excepcional, somente admissível na modalidade de ADOÇÃO. (Guarda e tutela NUNCA serão para famílias estrangeiras, somente adoção) Veja como isso já foi cobrado em provas: MPGO, Promotor de Justiça, 2016: O ECA admite a colocação em família substituta estrangeira desde que seja adolescente e que se realize através de tutela ou adoção. (FALSO. Só pode adoção) TJPR, 2014: A adoção internacional de criança brasileira ou domiciliada no Brasil é uma das formas de colocação do infante em família substituta estrangeira, pois, em casos específicos, poderá ser deferida a guarda definitiva ou a tutela. (FALSO) MPGO, 2016: Somente em relação ao guardião e ao tutor exige-se o compromisso, mediante termo nos autos, de bem e fielmente desempenhar o encargo. (CORRETO. Art. 32, ECA) CONSULPLA, TJMG, 2018: I. A colocação da criança ou adolescente em família substituta se fará mediante a guarda, tutela ou adoção e independentemente da sua situação jurídica. (CERTO. Art. 28, caput, do ECA). II. Os grupos de irmãos deverão ser colocados sob adoção, tutela ou guarda da mesma família substituta, ressalvada a comprovada existência de risco de abuso ou outra situação que justifique plenamente a excepcionalidade de solução diversa. (CERTO. Art. 28, § 4º, do ECA) III. A colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente admissível nas modalidades de tutela e adoção. (ERRADO. Art. 31 do ECA) IV. Tratando-se de menor de 12 (doze) anos de idade, não será necessário seu consentimento expresso. (CERTO. Art. 28, § 2º, do ECA). a) Permanência fora do convívio familiar Paralelamente à ideia de família natural e família substituta, há os institutos do ACOLHIMENTO FAMILIA e do ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL. 33 Veja como isso já foi cobrado em prova: MPSP, Promotor de Justiça, 2017: É a colocação da criança ou adolescente sob a guarda de pessoaou casal cadastrado, acompanhado e orientado pelo programa de atendimento específico, mantido por entidade pública ou privada, possuindo natureza excepcional e transitória. Tal conceito corresponde ao instituto: [...] (E) do acolhimento familiar. Se a criança ou o adolescente estiver em situação de risco (art. 98), o juiz da infância e juventude poderá aplicar medidas proteção elencadas no art. 101. Dentre elas, temos o acolhimento institucional (art. 101, VII) e o acolhimento familiar (art. 101, VIII). Precisa de decisão judicial. Mas, as entidades que mantenham programa de acolhimento institucional poderão, em caráter excepcional e de urgência, acolher crianças e adolescentes sem prévia determinação da autoridade competente, fazendo comunicação do fato em até 24 (vinte e quatro) horas ao Juiz da Infância e da Juventude, sob pena de responsabilidade.9 O acolhimento familiar consiste na entrega de criança ou adolescente em situação de risco a uma família previamente cadastrada junto ao Poder Público com o objetivo de ampará- lo temporariamente até que seja reintegrado ao convívio familiar ou colocado em família substituta. Neste período, a família acolhedora recebe uma ajuda de custo (normalmente em torno de 1 salário mínimo). O acolhimento institucional, por sua vez, presta-se ao mesmo fim, mas ao em vez de entregar a criança ou o adolescente a uma família, entrega-se a uma entidade de atendimento (antigamente chamada “abrigo”) a fim de que ali ele fique protegido de situações de maus tratos, desamparo ou qualquer outra forma de violência (física ou moral) que estava sofrendo. Ambos são medidas provisórias e excepcionais, sendo preferível o acolhimento familiar. São formas de transição para reintegração familiar ou, não sendo esta possível, para colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade (art. 101, § 1º). 9 Isso já foi objeto nas provas de Defensor Público da DPE/AL, 2017, CESPE, Juiz do TJSC, 2017, FCC, e está previsto no art. 93 do ECA 34 Somente podem ser determinados pelo magistrado. A situação da criança ou do adolescente afastado do convívio familiar deve ser sempre reavaliada. Essa reavaliação deve ser feita no máximo a cada 3 meses, de acordo com a Lei 13.509/2017, a qual alterou o § 1º do art. 19 do ECA. Vale mencionar que o dispositivo tinha sido vetado (visando manter a reavaliação apenas semestral), mas o veto foi derrubado em 2018. Veja como isso já foi cobrado em prova: TJSC, Juiz, 2017, FCC: As entidades que desenvolvem programas de acolhimento institucional devem observar o prazo mínimo de permanência de seis meses para crianças e adolescentes pelos acolhidos, a fim de evitar os danos psicológicos decorrentes da ruptura abrupta dos vínculos afetivos. (ERRADO. Art. 19, §§ 1º e 2º do ECA) d) podem, em situações excepcionais ou durante o recesso judiciário, receber diretamente criança ou adolescente sem determinação de autoridade competente, hipótese em que é obrigatória a comunicação ao juiz em até três dias. (ERRADO. Art. 93 do ECA) Prazo limite a criança ou adolescente permanecer em programa de acolhimento institucional: Art. 19, § 2º: A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongará por mais de 18 (dezoito meses), salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária. Lei 13.509 de 22 de novembro de 2017. Veja como isso já foi cobrado em prova: CONSULPLAN, TJMG: É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral. A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongará por mais de 24 (vinte e quatro meses), salvo comprovada a necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária. (ERRADO. Art. 19, § 2º, do ECA fala em 18 meses). 35 Antes da Lei 13.509/2017 ATUALMENTE Prazo máximo de permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional: 2 anos, salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada. Prazo máximo de permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional: 18 meses, salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada. Vejamos ainda outras importantes alterações ao art. 19, promovidas pela Lei 13.509/2017: • Convivência integral da mãe adolescente acolhida com seu filho: mãe adolescente acolhida em instituição ou família, tem direito permanecer em tempo integral com seu filho (§ 5º); • A mãe adolescente será assistida por equipe especializada multidisciplinar (§ 6º): tem direito a apoio de uma equipe especializada (ex.: psicóloga, assistente social etc.). Em síntese, o objetivo do acolhimento familiar é propiciar a volta da criança à família natural em algum momento. E quando isso não é possível, deve viabilizar sua colocação em família substituta. Caberá ao juiz competente, fundado no relatório da equipe interprofissional ou multidisciplinar, decidir pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação em família substituta. Ainda dentro do contexto de ACOLHIMENTO FAMILIA e INSTITUCIONAL, deve ser estudado o PROGRAMA DE APADRINHAMENTO. 36 • PROGRAMA DE APADRINHAMENTO: Foi disciplinado no art. 19-B do ECA, fruto de inclusão pela Lei 13.509/17. Referido programa tem por objetivo incentivar a formação de vínculos afetivos entre crianças e adolescentes acolhidos e voluntários não relacionadas ao acolhimento institucional ou familiar, que são os padrinhos. Eles devem viabilizar a convivência familiar e comunitária desses jovens e contribuir com sua formação social, moral, físico, cognitivo, educacional e financeiro. Para tanto, espera-se que o padrinho exerça uma função semelhante à de um parente ou amigo próximo da família, podendo inserir o acolhido em seu meio sociofamiliar por meio da participação em festas familiares (Ano Novo, Natal, etc..), convívio em datas comemorativas (aniversário, dia das crianças, etc.) e realização de atividades recreativas (cinema, parques, etc.). Também pode ajudar no campo educacional e financeiro por meio do custeio de cursos, materiais, consultas e tratamentos médicos, por exemplo. Veja a redação do art. 19-B, caput e § 1º, inseridos pela Lei nº 13.509/2017 ao ECA: Art. 19-B. A criança e o adolescente em programa de acolhimento institucional ou familiar poderão participar de programa de apadrinhamento. § 1º O apadrinhamento consiste em estabelecer e proporcionar à criança e ao adolescente vínculos externos à instituição para fins de convivência familiar e comunitária e colaboração com o seu desenvolvimento nos aspectos social, moral, físico, cognitivo, educacional e financeiro. (...) PERFIL DA CRIANÇA OU ADOLESCENTE A SER APADRINHADO: Segundo a lei, deve-se priorizar o apadrinhamento daqueles “com remota possibilidade de reinserção familiar ou colocação em família adotiva” (§ 4º). Segundo estudo do CNJ, “o apadrinhamento afetivo é um programa voltado para crianças e adolescentes que vivem em situação de acolhimento ou em famílias acolhedoras, com o objetivo de promover vínculos afetivos seguros e duradouros entre eles e pessoas da comunidade que se dispõem a ser padrinhos e madrinhas. As crianças aptas a serem 37 apadrinhadastêm, quase sempre, mais de dez anos de idade, possuem irmãos e, por vezes, são deficientes ou portadores de doenças crônicas – condições que resultam, quase sempre, em chances remotas de adoção.” (http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/79680- apadrinhamento-afetivo-proporciona-convivencia-familiar-para-criancas-do-df) GUARDA DA CRIANÇA/ADOLESCENTE: O padrinho NÃO deterá a guarda da criança ou do adolescente, tampouco será seu tutor ou o adotará. A guarda permanece com a unidade de acolhimento institucional ou com a família acolhedora. QUEM PODE SER PADRINHO: a) Pessoas físicas maiores de 18 (dezoito) anos não inscritas nos cadastros de adoção, desde que cumpram os requisitos exigidos pelo programa de apadrinhamento de que fazem parte. (§ 2º: veto derrubado em fevereiro de 2018). b) Pessoas jurídicas também podem apadrinhar criança ou adolescente a fim de colaborar para o seu desenvolvimento (art. 19-B, § 3º). Poder Familiar A família terá sobre a criança poder familiar, exercido pelo pai e a mãe. Poder familiar: conjunto de direitos e deveres que tem por finalidade, no que toca ao interesse da criança e do adolescente, a proteção da sua segurança, moralidade, educação, permitindo o desenvolvimento da criança ou adolescente. Logo, o poder familiar deve ser exercido em favor dos filhos. • Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. • Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito 38 de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência. • Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais. • Código Civil, art. 1634. Rol extenso dos deveres dos pais no exercício do poder familiar. Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: • dirigir-lhes a criação e a educação; • exercer a guarda unilateral ou compartilhada; • conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para: a) casarem; b) viajarem ao exterior; c) para mudarem sua residência permanente para outro Município; • nomear-lhes tutor por testamento, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; • representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; • reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; • exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. • Parágrafo único do art. 22 do ECA reforça a paridade no exercício do poder familiar: A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais e deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas crenças e culturas, assegurados os direitos da criança. 39 • Os pais que descumprem a obrigação que tem com seus filhos poderão sofrer sanções de natureza civil ou penal. → Sanções de natureza civil • Afastamento liminar do pai do convívio com o filho, quando for o agressor. • Acolhimento institucional ou familiar da criança ou do adolescente, caso não se resolva a situação com a retirada do agressor de casa e mantendo a criança, promovendo-se a reavaliação no prazo máximo de 6 meses. • Responsabilização civil por danos morais. Dano moral por abandono afetivo. STJ: para restar configurada a responsabilidade civil por abandono afetivo, deve-se comprovar uma conduta omissiva ou comissiva do pai ou da mãe, em relação ao dever jurídico de convivência com o filho. Ninguém é obrigado a amar, mas é obrigado a educar. O dever de educação passa pelo direito de convivência. STJ: é necessário comprovar o prejuízo, dano, não sendo suficiente apenas demonstrar o abandono. O dano seria o trauma psicológico experimentado pelo filho abandonado. Dano à sua personalidade ➔ indenização por dano moral por abandono afetivo. → Sanções de natureza penal O descumprimento do poder familiar poderá caracterizar diversos crimes. Exemplos: abandono de incapaz, abandono de recém-nascido, omissão de socorro, maus-tratos, submeter criança à exploração sexual etc. b) Carência de recursos materiais Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar. § 1o Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em serviços e programas oficiais de proteção, apoio e promoção. 40 Veja como isso já foi cobrado em provas: Defensor Público, DPE-PE, CESPE, 2018: A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar; nesse caso, a família deverá ser incluída em serviços e programas oficiais de proteção, apoio e promoção. (CORRETO, art. 23 do ECA). Promotor de Justiça, MPMG, 2014: A falta ou a carência de recursos materiais pode ensejar a suspensão do poder familiar e o abrigamento de criança ou adolescente segundo o princípio da proteção integral. (ERRADO. Art. 23 do ECA) Juiz, TJPR, 2014: Em se considerando que aos pais incumbe o dever de sustento dos filhos e que a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou suspensão do poder familiar, remanesce ao magistrado da Infância e Juventude apenas a possibilidade de submeter os pais a um procedimento administrativo, por infração ao disposto ao art. 249, do ECA (Art. 249. Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao pátrio poder familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.) (ERRADO. Arts. 22 e 23 ECA: a falta de recursos materiais não é motivo, por si só, para a perda ou suspensão do poder familiar. Deve-se manter na família de origem, incluindo-a obrigatoriamente em programas de proteção, apoio e promoção). c) Condenação criminal • § 2º do art. 23: A Lei 13.715, de 24/09/2018, ampliou as hipóteses de perda do poder familiar. Dispôs sobre hipóteses de perda do poder familiar pelo autor de determinados crimes contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar ou contra filho, filha ou outro descendente. Assim, alterou o art. 92 do Código Penal para incluir como efeito da condenação “a incapacidade para o exercício do poder familiar, da tutela ou da curatela nos crimes dolosos sujeitos à pena de reclusão cometidos contra outrem igualmente titular do mesmo poder 41 familiar, contra filho, filha ou outro descendente ou contra tutelado ou curatelado” (as partes em negrito foram acrescidas pela lei). Para manter a coerência com a nova redação do CP, alterou o § 2º do art. 23 do ECA, que passa a contar com a seguinte redação: “A condenação criminal do pai ou da mãe não implicará a destituição do poder familiar, exceto na hipótese de condenação por crime doloso sujeito à pena de reclusão contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar ou
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