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6868686868 O MODULADOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPOR˙ˆO E MEDIDA DA ARQUITETURA Ennio Possebon R. Cult. : R. IMAE, Sªo Paulo, a.5, n. 11, p. 68-76, jan./jun. 2004 O MODULOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPORÇÃO E MEDIDA NA ARQUITETURA ESUMORRRRR BSTRACTAAAAA Le Corbusier Ø um dos raros arquitetos, nªo só do sØculo XX, mas de toda a História da Ar- quitetura, que propôs uma teo- ria de proporçıes e forneceu descriçıes de como foram apli- cadas em seus projetos. Na sua obra transparece, alØm do olhar atento para a criaçªo de uma arquitetura consoante com as transformaçıes sociais, trazidas pelas tecnologias despontantes no sØculo XX, um pensamento lógico, racional e disciplinador que encontra sua plena expressªo, em termos de proporçıes, no seu sistema de- nominado Modulor. Palavras-chave: arquitetura, comodulaçªo. LE CORBISIERS MODULATOR: FORM, PROPORTION AND MEASURE IN ARCHITECTURE Le Corbusier is one of the few architects, not only in the 20th century, but in the whole history of Architecture, to propose a theory of proportions and to make descriptions on how they were applied to his projects. His work shows, besides the attentive look to the creation of an architecture consonant with soci- al changes brought by the 20th centurys emerging technologies, a logical, rational, and disci- plinary thinking that finds its full expression, in terms of proportions, in his system named Modulor. Keywords: architecture, comodulation. * Ennio Possebon Ø graduado e mestre pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Trabalha com arquitetura, design grÆfico e artes visuais. Leciona desenho arquitetônico no curso de Arquitetura e Urbanismo do UniFIAM-FAAM e desenho de observaçªo e geometria no curso de Educaçªo Artística dessa Instituiçªo. Ennio Possebon* 6969696969 O MODULADOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPOR˙ˆO E MEDIDA DA ARQUITETURA Ennio Possebon R. Cult. : R. IMAE, Sªo Paulo, a.5, n. 11, p. 68-76, jan./jun. 2004 e Corbusier Ø um dos ra- ros arquitetos, nªo só do sØculo XX, mas de toda a História da Arquitetu- ra, que propôs uma teoria de propor- çıes e forneceu descriçıes de como foram aplicadas em seus projetos. Mais ainda, pretendeu e propôs que sua teoria fosse utili- zada por outros. Seus desenhos e projetos sªo, por esta razªo, um fØrtil terreno para o estudo da Geometria na sua conexªo com a Arquitetura. O MÓDULO DE OURO Segundo John Summerson, [...] nos primeiros anos da Se- gunda Guerra Mundi- al Le Corbusier criou o sistema que se cha- mou Modulor. Modulor Ø uma pala- vra composta a partir de module, ou seja, unidade de me- dida, e section d·or ou secçªo de ouro: a divisªo de uma reta de tal modo que o segmento menor estÆ para o maior assim como o segmen- to maior estÆ para o todo. O Modulor Ø um sistema de propor- cionamento do espaço arquitetônico baseado neste critØrio geomØtrico, e oferece toda uma gama de dimen- sıes. As dimensıes medianas estªo relacionadas com o corpo humano; as dimensıes extremas aplicam-se, por um lado, aos detalhes diminu- tos dos instrumentos de precisªo e, por outro lado, à escala dos grandes projetos de planejamento.2 Na obra de Le Corbusier, transparece, alØm do olhar atento para a criaçªo de uma arquitetura consoante com as transformaçıes sociais, trazidas pelas tecnologias despontantes no sØculo XX, um pensamento lógico, racional e disciplinador, ao buscar um traçado orientador do projeto, baseado na proporçªo Æurea. E, aí, ele nªo Ø menos clÆssico que Palladio ou Alberti, ao retomar um tipo de con- trole de projeto tªo essencialmente pertencente a Renascença. A PORTA DOS MILAGRES DE LE CORBUSIER A matemÆtica Ø o magistral edifí- cio imaginado pelo homem para com- preender o Univer- so. Nela encontra- se o absoluto e o in- finito, o apreensível e o nªo-apreensível, e estÆ rodeada de altos muros diante dos quais pode-se passar e de novo passar sem proveito nenhum. Neles às vezes abre-se uma porta, entra-se e aí se estÆ no lugar onde se encontram os deuses e as cha- ves dos grandes sis- temas. Estas portas sªo as portas dos milagres, e, franqueada uma delas, jÆ nªo Ø o homem quem atua, porØm o Universo que se manifesta e diante dele desenrolam-se os pro- digiosos tecidos das combinaçıes sem limites. Estais no país dos nœ- meros. Deixai-vos permanecer nele, maravilhados diante de tanta luz in- tensamente espalhada. 3 Estais no país dos nœmeros. Deixai-vos permanecer nele, maravilhados diante de tanta luz intensamente espalhada. (Le Corbusier) L 2 SUMMERSON, John. in A linguagem clÆssica da Arquitetura, p.116. 3 LE CORBUSIER, in Modulor1, p. 69. (Trad. nossa.) 7070707070 O MODULADOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPOR˙ˆO E MEDIDA DA ARQUITETURA Ennio Possebon R. Cult. : R. IMAE, Sªo Paulo, a.5, n. 11, p. 68-76, jan./jun. 2004 ORIGENS E INTEN˙ÕES DO MODULOR O Modulor1 tinha como subtítu- lo Ensaio sobre uma medida harmô- nica à escala humana e aplicÆvel uni- versalmente à Arquitetura e à Mecâ- nica. Sem dœvida, uma grandilo- qüente e pretensiosa aspiraçªo ... Acompanhar o fio condutor do seu pensamento ao longo do texto, tªo rico em idØias mas nem sempre claro e organizado, às vezes atØ per- turbado por excesso de dados, rela- tos burocrÆticos, citaçıes enfado- nhas e atØ mesmo com algumas im- precisıes geomØtricas, de certa ma- neira desvenda parte do que foram seu grande esforço, seus ideais, seus sonhos, suas conquistas e seu lega- do: o que nªo Ø pouca coisa. Acom- panhemos alguns fatos narrados nos livros Modulor 1 e 2. Pertencente a uma família de mœsicos, embora sem sŒ-lo, Le Corbusier sabia muito bem que a mœsica, assim como a arquitetura, se desenvolvem no espaço e no tempo e dependem da medida. Em algumas consideraçıes sobre a mœsica ele ob- servou como, historicamente, o continuum sonoro foi fragmentado, dividido, mas tornado passível de ser compreendido por meio de propor- çıes estabelecidas entre suas subdi- visıes. Com isso teve sua transmis- sªo possível, atravØs do tempo e do espaço, por meio da escrita musical, que finalmente veio a ser codificada no Ocidente por J. S. Bach, em sua gama temperada. Este utensílio aper- feiçoado trouxe imenso impulso à composiçªo e pôde exprimir o pen- samento musical de Mozart, Beethoven, Debussy, Stravinsky, Satie, Ravel ... atØ os dias atuais. E na busca de uma analogia, Le Corbusier se coloca a questªo: um utensílio correlato, que tratasse de medidas visuais, geomØtricas, nªo seria desejÆvel tambØm no âmbito da construçªo, nªo facilitaria tam- bØm sua escrita e traria um enor- me benefício à composiçªo arquite- tônica? Entende que sim, e assim conclui o seu raciocínio: Numa sociedade moderna me- canizada, cujas ferramentas se aper- feiçoam a cada dia para proporcio- nar recursos de bem-estar, a apari- çªo de uma gama de medidas visu- ais Ø admissível, posto que o primei- ro efeito deste utensílio serÆ unir, enlaçar, harmonizar o trabalho dos homens, precisamente desunido neste momento atØ mesmo des- troçado pelo presença de dois sistemas dificilmente conciliÆveis: o sistema dos anglo-saxıes e o siste- ma mØtrico decimal. 4 Ele compreende tambØm que os partenons, os templos indianos e as catedrais de todos os tempos sempre foram constituídos segundo um código e se fundamentaram num sistema coerente que afirmava uma unidade essencial. E perguntando-se sobre de que instrumentos dispu- nham, encontra sempre a resposta nas medidas baseadas em propor- çıes humanas: codo, dedo, polega- da, pØ, braço, palmo etc. . Com esses instrumentos sutis participando da matemÆtica que rege o corpo humano, era possível sustentar, tambØm na construçªo, a mesma harmonia. E como eles es- tavam circunscritos a cada cultura específica, sem ter de cruzar distân- cias pelos mares, eram aptose sufi- cientes para cumprir seus desígnios, jÆ que tambØm nªo havia por que reclamar dessas medidas dentro de seus âmbitos operacionais. Com a Revoluçªo Francesa, diz Le Corbusier, o pensamento laico entendeu que podia conquistar o mundo. E alØm de colocar em jogo razıes profundamente huma- nistas, apresentou ainda muitas pro- messas: ciŒncia e cÆlculo empreen- deram caminhos sem limites. No rastro dessa revoluçªo tambØm fo- ram destronados pØs e polegadas, juntamente com seus complicados cÆlculos, e entªo substituídos por uma medida despersonalizada e abs- trata, o metro (a dØcima milionØsi- ma parte do quadrante do meridiano terrestre),5 adotado imediatamente por sociedades mais Ævidas de no- vidades, porØm ainda em grande parte rejeitado em favor dos tradi- cionais pØs e polegadas. Uma ten- sªo se estabeleceu entre a nova me- dida de cÆlculo mais simples e a tra- dicional, mais complexa, porØm mais adequada à escala humana. Le Corbusier entende que exis- te uma carŒncia de medida ou sis- tema proporcionalizador que satis- faça, sendo vÆlidos para qualquer parte do mundo estes quesitos: racionalidade, simplicidade na orde- naçªo do cÆlculo e adequaçªo à es- 4 LE CORBUSIER, in Modulor 1, p. 17. (Trad. nossa.) 5 Na atualidade, definido como a distância correspondente a 1.553.164, 03 longitudes de onda da banda vermelha do cÆdmio no espectro a ar seco, a 15” de temperatura e a 760 mm de Hg de pressªo. 7171717171 O MODULADOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPOR˙ˆO E MEDIDA DA ARQUITETURA Ennio Possebon R. Cult. : R. IMAE, Sªo Paulo, a.5, n. 11, p. 68-76, jan./jun. 2004 cala humana tanto para a Arqui- tetura quanto para a Mecânica. Des- de o início do sØculo XX ele vinha observando em obras de arquitetu- ra aquilo que chamou de o ângulo reto dirigindo a composiçªo. Tam- bØm encontraram ressonância nele as palavras de Choisy com sua His- tória da Arquitetura (1902), especi- almente quando trata de traçados re- guladores ao explicar a organizaçªo de composiçıes arquitetônicas. Na revista L· Esprit Nouveau, junto com outros, Le Corbusier pro- duz artigos teóricos, base doutrinÆ- ria para sua atividade projetual pos- terior. A grande indœstria deve ocupar-se com a edificaçªo e esta- belecer em sØrie os elementos da casa. Deve ser criado o estado de espírito da sØrie: de construir casas em sØrie, de habitar casas em sØrie, de conceber casas em sØrie.6 E aqui a normatizaçªo se torna ques- tªo fundamental. Depois que publica o artigo Os traçados reguladores na L· Esprit Nouveau, em 1921, Le Corbusier conhece os livros de Matila Ghyka, sobre a proporçªo Æu- rea, que lhe confirmam e demons- tram matematicamente assuntos que jÆ o ocupavam. E tambØm em suas pinturas, experimenta a plasticidade sobreposta a uma rigorosa geometria. Posteriormente, por volta dos anos 1940, as idØias desenvolvidas por Wittkower a respeito do Renascimento, da proporçªo e dos traçados reguladores de projetos tambØm encontrarªo ressonância em Le Corbusier. Embora tenha expres- sado algumas críticas à arquitetura renascentista, por ver nas suas cons- truçıes, quando rigorosamente ori- entadas pela geometria, e por vezes segundo complexas estruturas, a pressuposiçªo de um observador ideal que teria de se colocar no cen- tro da obra e perceber como um todo, simultaneamente, todos os de- talhes. Contra essa interpretaçªo ele argumenta, entªo, que o observador concreto sempre estÆ de pØ, tem o foco de visªo a mais ou menos 1,60 m de altura e estÆ em movimento pelo espaço, apreendendo, a cada vez, e no decorrer do tempo, as suas vÆrias perspectivas. Tem percepçıes diferenciadas a cada momento e, enfim, uma estatura que deve ser sempre considerada. Nos anos de ocupaçªo da Fran- ça durante a Segunda Guerra Mun- dial, instituiu-se o AFNOR, um órgªo cuja funçªo era auxiliar a reconstru- çªo do país. Industriais, engenheiros e arquitetos foram convocados a participar do empreendimento. Le Corbusier foi um deles. O AFNOR propıe normatizar os objetos da construçªo e seu mØtodo Ø simplista: simples aritmØtica aplicada aos usos e utensílios dos arquitetos, engenheiros e industriais. Parece-me arbitrÆrio e pobre. As Ærvores, por exemplo, com seu tronco, seus ramos, suas folhas e nervuras, me afirmam que as leis de crescimento e combina- çªo podem e devem ser mais ricas e sutis. Um laço geomØtrico tem de in- tervir nestas coisas e sonho instalar nas obras que mais tarde cobrirªo o país, um enredado de proporçıes tra- çado sobre o muro ou apoiado nele, feito com ferros laminados e soldados, que serÆ a regra da obra, o modelo que inicia a sØrie ilimitada das combi- naçıes e das proporçıes. O pedreiro, o carpinteiro e o serralheiro irªo aí escolher as medidas para seus traba- lhos, os quais, diversos e diferencia- dos, serªo testemunhos da harmonia. Tal Ø o meu sonho. 7 6 In Casas em sØrie, L· Esprit Nouveau, 1921, citado em LE CORBUSIER, Modulor 1, p. 31. (Trad. nossa.) 7 LE CORBUSIER, in Modulor 1, p. 34. (Trad. nossa.) Nos anos de ocupaçªo da França durante a Segunda Guerra Mundial, instituiu-se o AFNOR, um órgªo cuja funçªo era auxiliar a reconstruçªo do país. 7272727272 O MODULADOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPOR˙ˆO E MEDIDA DA ARQUITETURA Ennio Possebon R. Cult. : R. IMAE, Sªo Paulo, a.5, n. 11, p. 68-76, jan./jun. 2004 TENTATIVA E ERRO NA INVEN˙ˆO DO MODULOR Em 1943, Le Corbusier propıe a seu assistente Hanning uma tare- fa: Tome um homem com o braço levantado com 2,20 m de altura, inscreva-o em dois quadrados superpostos de 1,10 m, coloque-o a cavalo sobre os dois quadrados e um terceiro quadrado resultante lhe darÆ uma soluçªo. O lugar do ân- gulo reto deve poder ajudÆ-lo a co- locar o terceiro quadrado. Com este enredado, regido por um homem instalado no seu interior, estou se- guro que chegarÆ a uma sØrie de medidas que poderªo colocar de acordo a estatura humana (o bra- ço levantado) e a MatemÆtica.8 Essa indicaçªo, um tanto enig- mÆtica quando meramente lida, en- tretanto, continha o germe do que viria a ser claramente desenvolvido no traçado final do modulor. Era ainda uma primeira intuiçªo. Mas daí surgiu o primeiro tra- çado, em 25 de setembro de 1943, que sofreria uma retificaçªo realiza- da por Elisa Maillard, trŒs meses depois, em 26 de dezembro de 1943. Ambos os traçados tŒm ain- da incoerŒncias e incorreçıes geo- mØtricas, que, embora nªo interfi- ram totalmente na praticidade e na aplicabilidade da idØia, serªo revis- tos posteriormente, e mediante vÆ- rias tentativas e aproximaçıes, pro- gredirªo atØ resultar num traçado rigoroso e preciso em todos os sen- tidos. O traçado definitivo contou com a colaboraçªo de dois jovens, o uruguaio Justino Serralta e o fran- cŒs Maisonnier, e foi relatado no Modulor 2. Esse traçado produz duas sØries de valores baseados na proporçªo Æurea, entªo chamadas sØrie vermelha e sØrie azul, esta œltima correspondendo aos valores referidos ao duplo quadrado. Essa rede de proporçıes antropometricamente combinadas, recebeu depois a denominaçªo modulor (sugerida a Le Corbusier por Robert Lancrey-Javal, doutor em Direito). O modulor, na sua pri- meira versªo, tinha como base um homem com 1,75 m (a altura mØ- dia de um francŒs), de onde resul- tavam suas medidas principais. Tec- nicamente foi definido da seguinte maneira: O modulor Ø um aparato de medida fundamentado na estatu- ra humana e na matemÆtica. Um homem com o braço levantado dÆ os pontos determinantes de ocupa- çªo do espaço: o pØ, o plexo solar, a cabeça e a ponta dos dedos com o braço levantado trŒs interva- los que definem uma sØrie de secçıes Æureas de Fibonacci; e ain- da por outra parte, a matemÆtica, que oferece a variaçªo mais imedi- ata e significativa de um valor: o simples, o dobro e as duas secçıes Æureas. 9 Em síntese,a unidade, a duplicidade e a proporçªo Æurea o modulor. Essa rØgua de proporçıes com- bina-se, assim, atravØs do ponto das duas sØries de segmentos Æureos, que ele chamou de vermelha e azul, com a estatura humana nos seus principais pontos de ocupaçªo do espaço. Num momento posterior, a altura padrªo do homem serÆ retificada para 6 pØs ou 182,88 cm. (altura mØdia de um inglŒs), valor esse que irÆ satisfazer mais, em vir- tude de os valores em polegadas corresponderem com mais proximi- dade à sØrie Fibonacci que se forma na sØrie azul: 3, 5, 8, 13, 21, 34 ... Le Corbusier quer contribuir para o jogo das normatizaçıes ne- cessÆrias a uma produçªo em sØrie, racional e eficiente, de elementos prØ-fabricados. Mas quer evitar tam- bØm o empobrecimento formal pro- duzido por normatizaçıes efetuadas pelo mínimo esforço. Quer colocar no lugar do trivial, do monótono e sem graça o harmonioso, o diverso, o elegante. E remover o obstÆculo que resulta da incompatibilidade das medidas centímetro e polegada. O modulor rege as longitudes, as superfícies e os volumes, manten- do sempre a escala humana, pres- tando-se a infinitas combinaçıes e assegurando a unidade na diversi- dade: benefício inestimÆvel, milagre dos nœmeros. 10 Quando elege a proporçªo Æurea como princípio estruturador do seu enredado de proporçıes (modulor), Le Corbusier preocupa-se em acoplar nele a estatura humana (estabelecida no padrªo mØdio de 1,82 m ou 6 pØs) e pretende com isso criar um disposi- tivo proporcionador das medidas de sua arquitetura. E neste aspecto pare- ce se colocar em perfeita sintonia com o conceito vitruviano de sime- tria, de comodulaçªo. A proporçªo Æurea Ø o módulo que engendra as 8 Idem, op. cit., p. 35. (Trad. nossa.) 9 LE CORBUSIER, in Modulor 1, p. 52. (Trad. nossa.) 10 Idem, op. cit., p. 88. (Trad. nossa.) 7373737373 O MODULADOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPOR˙ˆO E MEDIDA DA ARQUITETURA Ennio Possebon R. Cult. : R. IMAE, Sªo Paulo, a.5, n. 11, p. 68-76, jan./jun. 2004 formas da arquitetura, nas partes e no todo, e leva em conta, todo o tempo, a escala humana. E aqui, como Zeizyng o fizera no sØculo XIX,11 re- afirma a insinuaçªo de ser ela a legismetria12 do crescimento e do de- senvolvimento dos seres orgânicos. O modulor, dito de uma outra maneira ainda, Ø a combinaçªo de duas sØries coordenadas de segmen- tos Æureos que estabelecem um sis- tema proporcional e relacionado com a estatura humana evidentemen- te, com um padrªo mØdio escolhido: uma grandeza referencial que deter- mina as dimensıes e proporçıes cri- adas dentro deste criterium defini- do pela proporçªo Æurea. Nota-se que existe, de certa maneira, uma obsessªo em eliminar a incompatibilidade entre os siste- mas mØtrico e de polegadas. Isso Ø resolvido, ou contornado, em parte, mas na verdade nªo Ø o que tem mais importância. Parece-nos mais importante a tentativa de Le Corbusier de buscar coerŒncia na disposiçªo das proporçıes de suas obras, guiando-se por determina- çıes sugeridas pelos processos construtivos da Geometria, combi- nados com todas as outras disposi- çıes e determinaçıes necessÆrias ao dimensionamento da Arquitetura. E nesse sentido ele age, antes de tudo, como um geômetra. O modulor Ø patenteado por Le Corbusier. Durante as conversaçıes no processo burocrÆtico de requeri- mento e concessªo de patentes irªo despontar as vÆrias perspectivas co- merciais e direitos possíveis pela sua utilizaçªo, aos quais Le Corbusier depois renunciarÆ. Como um produto a ser lançado no mer- cado foi, na Øpoca, pensado e com- posto das seguintes peças: uma fita com 89 polegadas contendo as duas escalas, um quadro numØrico com as medidas das duas sØries e um manual de instruçıes. John Dale editou, entªo, um boletim mundi- al contendo notícias e discussıes entre os usuÆrios do modulor. Isso foi cogitado em 1947. Houve pers- pectivas de que empresÆrios ame- ricanos se interessassem pela sua fabricaçªo e comercializaçªo, mas o produto modulor nunca chegou ao mercado. A partir da ediçªo do livro Modulor 1 (1948) hÆ uma intensa troca de correspondŒncia entre Le Corbusier e inœmeros estudiosos e usuÆrios interessados no modulor. Correçıes, retificaçıes e ampliaçıes da idØia sªo dirigidas a ele, e interagindo com essas respostas o projeto se redefine, torna-se mais preciso e se esclarece. Ele mesmo, por iniciativa própria, estarÆ sempre interessado em dialogar com mate- mÆticos, engenheiros e outros pro- fissionais, buscando e aceitando o aperfeiçoamento do projeto quando lhe Ø proposto por outros. O próprio nome modulor foi proposto por Lancrey-Javal. A princípio, Le Corbusier nªo o considerou adequa- do e o rejeitou. Toda troca de infor- maçıes, idØias, sugestıes e adver- tŒncias, e as respectivas respostas e consideraçıes, se encontram exaus- tivamente descritas no Modulor 2 (1950), juntamente com as defini- çıes finais do sistema, alØm da des- criçªo de inœmeros casos do siste- ma aplicado por ele mesmo ou por outros arquitetos. 11 ZEISING, Adolf. in Neue Lehre von den Proportionen des menschlichen Korpers, aus einem bisher unerkannt gebliebenen, die ganze Natur und Kunst durchdringenden morphologischen Grundgesetz entwicklt. (Nova teoria das proporçıes do corpo hu- mano desenvolvida de uma lei morfológica bÆsica, atØ entªo desconhecida, que impregna a inteira Natureza e a Arte.) (Trad. nossa.) 12 Legismetria . Neologismo criado por F. Muller para a traduçªo do vocÆbulo Gezetzmassigkeit, do alemªo. Durante as conversaçıes no processo burocrÆtico de requerimento e concessªo de patentes irªo despontar as vÆrias perspectivas comerciais e direitos possíveis pela sua utilizaçªo, aos quais Le Corbusier depois renunciarÆ. 7474747474 O MODULADOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPOR˙ˆO E MEDIDA DA ARQUITETURA Ennio Possebon R. Cult. : R. IMAE, Sªo Paulo, a.5, n. 11, p. 68-76, jan./jun. 2004 Sobre o modulor, o rigoroso Ernst Neufert, a despeito de algumas críticas com relaçªo às aproximaçıes e arredondamentos de medidas esta- belecidos nas sØries vermelha e azul, comentou em seu livro A industria- lizaçªo das construçıes: [...] Ø importante que um ar- quiteto de tanta popularidade como Le Corbusier tenha dedicado sua atençªo ao problema das medidas na construçªo e que tenha coloca- do em primeiro plano necessidades arquitetônicas que haviam sido dei- xadas de lado, como pouco acerta- das, substituídas por normatizado- res mecânicos e exclusivistas. Nªo menos importante Ø o fato de que para desenvolver as constru- çıes se possa jogar com proporçıes baseadas na secçªo Æurea.13 E Wittkower comenta em So- bre a arquitetura na idade do humanismo, em tom um tanto exa- gerado e claramente apologØtico: [...] Todos sabemos que quan- do a geometria nªo-euclidiana pas- sou a ser a base da visªo moderna do universo no final do sØculo XIX e início do XX, produziu-se uma ruptu- ra bÆsica com o passado, mais pro- funda atØ que aquela entre o univer- so hierarquizado e escolÆstico da Idade MØdia e o matemÆtico e euclidiano de Leonardo, CopØrnico e Newton. Que repercussıes teve e terÆ sobre a proporçªo nas artes e a subs- tituiçªo das medidas absolutas do espaço e do tempo por uma nova re- laçªo dinâmica espaço-tempo? O modulor de Le Corbusier constitui uma resposta preliminar. À luz da História aparece com a inten- çªo fascinante de coordenar a tradi- çªo com o nosso mundo nªo- euclidiano. Em primeiro lugar por- que toma como ponto de partida o homem e seu entorno, e nªo um conjunto de universÆlias. Com isto Le Corbusier acerta o passo das nor- mas absolutas com o das relativas. PorØm, tenta uma nova conso- lidaçªo neste nível. Os velhos sis- temas de proporçıes eram o que po- deríamos chamar de sistemas de mªo œnica, por constituírem desen- volvimentos coerentes de conceitos bÆsicos,geomØtricos ou numØricos (mais aritmØticos). Outro tanto ocorre com o modulor de Le Corbusier. Seus elementos sªo ex- tremamente simples: quadrado, du- plo quadrado e as secçıes Æureas. Estes elementos se fundem num sis- tema de razıes geomØtricas e numØ- ricas: o princípio bÆsico da simetria se combina com as duas sØries di- vergentes de nœmeros irracionais derivados da secçªo Æurea. A despeito do que esta opiniªo possa suscitar, se trata, sem dœvida, da primeira síntese coerente desde a decomposiçªo dos velhos siste- mas, síntese que reflete a natureza da nossa própria civilizaçªo e Ø, ao mesmo tempo, um testemunho de nossa tradiçªo cultural. E, igual- mente como as proporçıes da geo- metria plana utilizadas na Idade MØdia e as proporçıes musicais e aritmØticas do Renascimento, o sis- tema dual de magnitudes irracio- nais de Le Corbusier segue depen- dendo dos conceitos que o pensa- mento pitagórico-platônico legou à humanidade do Ocidente.14 Num encontro com Albert Einstein, Le Corbusier relata que, após ouvir suas explicaçıes e co- mentÆrios, e depois de ter verifica- do matematicamente os esquemas do modulor, teria assim resumido seu parecer a respeito: Uma esca- la de proporçıes que torna o mau difícil e o bom fÆcil.15 Essa boa receptividade ele encontrou tambØm entre numerosos matemÆticos, enge- nheiros e arquitetos. O modulor re- almente despertou, na Øpoca, um significativo interesse no ambiente profissional e acadŒmico. Com o passar dos anos o inte- resse se esmaeceu e o próprio Le Corbusier acabou pondo de lado sua obsessªo inicial e o uso persistente e sistemÆtico do sistema. E, desafor- tunadamente, tambØm deixou de ser estudado com a profundidade que merece o que representou esse im- portante processo surgido dentro da obra de um dos mais representativos arquitetos do sØculo XX. O PRODUTO MODULOR John Summerson tambØm afir- ma: Le Corbusier defendeu inten- samente o Modulor como um siste- ma que, se amplamente adotado, poderia solucionar muitos dos pro- blemas de padronizaçªo na indœs- tria e, ainda, dar harmonia ao con- junto do meio físico. Talvez isso pu- desse ter acontecido. PorØm desde 13 NEUFERT, Ernst. in Industrializacion de las construciones, p. 35. (Trad. nossa.) 14 WITTKOWER, Rudolf. in Architectural principles in the age of humanism, p. 537-538. (Trad. nossa.) 15 LE CORBUSIER, in Modulor1, p. 55. (Trad. nossa.) 7575757575 O MODULADOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPOR˙ˆO E MEDIDA DA ARQUITETURA Ennio Possebon R. Cult. : R. IMAE, Sªo Paulo, a.5, n. 11, p. 68-76, jan./jun. 2004 a sua publicaçªo, em 1950, o inte- resse por esse sistema vem diminu- indo. Estou inclinado a pensar que, como em outras situaçıes seme- lhantes, a importância real do Modulor estÆ em que ele Ø parte da aparelhagem mental de seu autor e lhe permite realizar projetos tªo originais como a capela de Ronchamp um edifício de forma tªo livre que chega a ser quase uma escultura abstrata , seguro de seu completo domínio dos procedimen- tos racionais.16 Summerson parece ter alguma razªo quando afirma que a raciona- lidade conquistada por Le Corbu- sier, ao aprofundar-se na pesquisa da proporçªo Æurea e sua expressªo sistematizada, que Ø o Modulor, tem um valor relativo, isto Ø, vale como ferramental de projeto de seu autor, porØm nªo pode como tal servir a mais ninguØm. Mas tambØm essa afirmaçªo tem valor relativo. Pois ao esforço de Le Corbusier para chegar atØ este pretendido produto final, o Modu- lor, subjaz todo um processo de pensamento organizacional de projeto que tem a proporçªo Æurea como cØlula-mªe e se desdobra em harmonias derivadas dela. E o que tem valor maior, finalmente, Ø a compreensªo que hoje temos desses desdobramentos que ele pôde exe- cutar, operando com este paradig- ma, e nªo aquilo que ele bem- intencionadamente, mas talvez equi- vocadamente, tenha sonhado em oferecer à cultura do sØculo XX como produto. O resgate e o aprofundamento no estudo desse processo de busca de uma comodu- laçªo, que estªo contidos no seu tra- balho, Ø que podem ser de imenso valor. Ou seja, se o Modulor nªo pôde servir como produto final, pronto e acabado para ser usado por outros Ø, no mínimo, um imen- so manancial de pesquisa para uma profunda imersªo no significado real e mais profícuo do que pode a Geometria, quando bem compreen- dida, significar para o trabalho do arquiteto. Mas mesmo arquitetos e teorizadores que tiveram o velho mestre como a grande figura inspiradora de uma arquitetura ra- cional, liberta das formas do pas- sado, criativa e inovadora, parecem ter deixado de lado esse aspecto de sua obra. Mas a carŒncia dos tempos sempre acaba por despertar potencialidades latentes. Klaus- Peter Gast, por exemplo, Ø uma bem-vinda alteraçªo dessa situaçªo com seu livro Le Corbusier. Paris- Chandigarh, recentemente publica- do (2000). Poderíamos discutir a estØtica de suas obras, questionar atØ que ponto Le Corbusier conseguiu, por esse seu geometrizar, resultados sig- nificativos e expressivos. Mas, inde- pendente disso, sua atuaçªo como arquiteto-geômetra, que Ø inegÆvel, estÆ longe de ser entendida e divulgada tanto quanto o sªo tantos outros aspectos exemplares e conhe- cidos de sua obra. E dentro do âm- bito desta pesquisa, nossa Œnfase Ø justamente no processo geometri- zador por meio do qual eram gera- dos seus projetos. CR˝TICAS UNILATERAIS Recentemente, Frings, num ar- tigo sobre a ocorrŒncia e o papel que a proporçªo Æurea desempenhou na teoria da Arquitetura, escreve duras e unilaterais críticas ao traba- lho de Le Corbusier, embora, em exame de detalhes, tambØm possam ser justificadas em parte. E como contraponto ao que jÆ foi exposto atØ agora, cabe aqui tambØm a sua apresentaçªo: O Modulor, na proposta de Le Corbusier, combina quadrado e secçªo Æurea, mas como resultado nªo oferece nada alØm de um siste- ma modular. Da sØrie azul de nœme- ros (secçªo Æurea da altura total) e da sØrie vermelha (altura do umbi- go) resulta uma seqüŒncia de medi- das de 27 a 226 cm (e mais alØm) em degraus de 27 e 16 cm. Na fun- çªo desempenhada pelo umbigo como origem da sØrie vermelha, Le Corbusier alude à tradiçªo do homo vitruvianus e às especulaçıes relacionadas com as harmonias num cosmos antropocŒntrico, bem mostrados numa figura emblemÆ- tica no livro Modulor 2. O Modulor tem, entretanto, al- gumas deficiŒncias. Primeiro, em- bora Le Corbusier pretenda que seja usado para todas as dimensıes, verticais e horizontais, ele prioriza a dimensªo vertical. AlØm disso, Ø baseado em aproximaçıes aos nœ- meros da sØrie Fibonacci. E desde que as sØries azul e vermelha podem ser combinadas ao sistema, ele se torna tªo elÆstico que a secçªo Æu- rea acaba sendo difícil de detectar. Neufert critica, numa ediçªo mais 16 SUMMERSON, John.in A linguagem clÆssica da Arquitetura, p.117. 7676767676 O MODULADOR DE LE CORBUSIER: FORMA, PROPOR˙ˆO E MEDIDA DA ARQUITETURA Ennio Possebon R. Cult. : R. IMAE, Sªo Paulo, a.5, n. 11, p. 68-76, jan./jun. 2004 17 FRINGS. Marcus, in The Golden Section in Architectural Theory, Nexus Network Journal, vol. 4, no 1, 2002, http://www.nexusjournal.com/Frings.html ReferŒncias bibliogrÆficas: GAST, Klaus-Peter. Le Corbusier: Paris Chandigarh. Basel: Birkhauser, 2000. LE CORBUSIER. El Modulor. Buenos Ayres: Poseidon, l953. LE CORBUSIER. El Modulor 2. Buenos Ayres: Poseidon, 1962. LE CORBUSIER. The Marseille·s block. London: The Harvill Press, 1953. LE CORBUSIER. L·Architecture et l·esprit mathØmatique, in Les grand courants de la pensØe mathØmatique, presentØe par F. de Lionnais. S. l.: Cahiers du Sud, 1958. LE CORBUSIER. L· UnitØ d· habitation de Marseille. Le Point, n” 38. S.l.: Souillac (Lot) Mulhouse, nov. 1950. NEUFERT, Ernst. Industrializacion de las construciones. Barcelon: Gustavo Gili, 1969.SUMMERSON, John. A linguagem clÆssica da arquitetura. Sªo Paulo: Martins Fontes, 1999. ZEISING, Adolf. Neue Lehre von den Proportionen de menschlichen Korpers, aus einem bisher unerkannt gebliebenen, die ganze Natur und Kunst durchdringenden morphologischen Grundgesetz entwicklt. Leipzig: s.e., 1854. WITTKOWER, Rudolf. Architectural principles in the age of humanism. London: Tiranti, 1952. recente do Bauordnungslehre, ambas as indefinidas prÆticas: de ar- redondar nœmeros, de tal modo que as adiçıes passam a ser incorretas e mais ainda nas imprecisıes ao transcrever medidas mØ- tricas para o sistema britâ- nico das polegadas. E fi- nalmente, o Modulor nªo estÆ de fato longe do pró- prio sistema de Neufert, o Sistema OctamØtrico (Neufert, 1941). Por esta razªo o Modulor nªo deve ser considerado um siste- ma de proporçıes, mas sim um catÆlogo de medi- das irregulares [...] Durante um longo período a secçªo Æurea nªo foi mencionada na teoria da arquitetura. Ela primeiramente aparece no sØculo XIX, atravØs de Zeising e Fechner, e entªo surge novamente com um certo fascínio na terceira e quarta dØcadas do sØ- culo XX, quando Neufert e Le Corbusier vŒm a conhecŒ-la. Neufert alimenta grandes esperan- ças para uma renovaçªo da arqui- tetura atravØs da secçªo Æurea, mas logo cai em si. Nªo obstante ele a apresenta in extenso. Depois dos primeiros experimentos onde Le Corbusier usa a secçªo Æurea para desenvolver seu catÆlogo de medi- das, o qual nªo tinha devido aos arredondamentos e combinaçıes muito mais em comum com a secçªo Æurea ou a sØrie Fibonacci. De fato, Neufert e Le Corbusier pa- recem utilizar a secçªo Æurea de modo a glamourizar sua própria criaçªo artística subjetiva com te- oria e razªo. Em todo caso, a secçªo Æurea certamente desempe- nha um papel nos escritos destes teoristas da Arquitetura. Antes do sØculo XIX, todavia, a secçªo Æurea estÆ simplesmente ausente da teoria da arquitetura escrita atØ entªo.17 O LEGADO DE LE CORBUSIER O modulor parece representar um curioso ponto de virada na His- tória da Arquitetura. Num sentido, foi um corajoso, persisten- te e pretensioso esforço para criar uma regra unificadora para toda a Ar- quitetura; e noutro, mos- trou a falŒncia e as limita- çıes de tal tentativa. Mas isso nªo invalida nem desqualifica o processo geometrizador do seu cri- ador, nem a riqueza formal e funcional de sua arquite- tura; ao contrÆrio, confere a esse legado de «Corbu» um imenso valor. O esfor- ço despendido por Le Corbusier, atØ onde ele pode ser compreendido como intençªo consciente, eviden- ciou uma busca intensa por determinantes e alvos que foram tambØm aqueles mesmos anterior- mente pertencentes à Arquitetura clÆssica, conforme descritos por Vitrœvio e expressos na Renascença por seus arquitetos e teóricos. Ou seja, a proporçªo, a simetria ou co- modulaçªo, a harmonia e a euritmia do edifício. A beleza, enfim. Mas isso nªo invalida nem desqualifica o processo geometrizador de seu criador, nem a riqueza formal e funcional de sua arquitetura.
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