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1 ALVENARIA ESTRUTURAL 2 ALVENARIA ESTRUTURAL PROJETO DE EDIFÍCIOS DE ALVENARIA ESTRUTURAL Fonte: CORRÊA, Márcio R.S; RAMALHO, Marcio A.. Projeto de edifícios de alvenaria estrutural. PINI. 1.1 CONCEITO ESTRUTURAL BÁSICO O principal conceito estrutural ligado à utilização da alvenaria estrutural é a transmissão de ações através de tensões de compressão. Esse é o conceito crucial a ser levado em conta quando se discute a alvenaria como processo construtivo para elaboração de estruturas. Especialmente no presente é evidente que se pode admitir a existência de tensões de tração em determinadas peças. Entretanto, essas tensões devem preferencialmente se restringir a pontos específicos da estrutura, além de não apresentarem valores muito elevados. Em caso contrário, se as trações ocorrerem de forma generalizada ou seus valores forem muito elevados, a estrutura pode ser até mesmo tecnicamente viável, mas dificilmente será economicamente adequada. Assim, pode-se perceber por que o sistema construtivo se desenvolveu inicialmente através do empilhamento puro e simples de unidades, tijolos ou blocos, de forma a cumprir a destinação projetada. Nessa fase inicial, vãos até podiam ser criados, mas sempre por peças auxiliares, como, por exemplo, vigas de madeira ou pedra. É importante mencionar que os vãos criados através desse sistema apresentavam uma deficiência séria: a necessidade de serem executados com dimensões relativamente pequenas. Além disso, existia o problema óbvio da durabilidade, no caso de se utilizar para essas vigas um material de vida útil relativamente pequena quando comparado ao que era utilizado nas alvenarias propriamente ditas. Esse era o caso, por exemplo, de vigas de madeira utilizadas sobre alvenarias cerâmicas de pedra. É principalmente por causa disso que muitas construções da antiguidade não podem ser apreciadas em sua plenitude. Exemplos eloquentes são as construções de Pompéia ou as ruínas de Babilônia. Nessas relíquias, e em muitas outras de mesma idade, as paredes são originais, mas os pavimentos e telhados, quando existem, são partes reconstruídas, pois os originais desapareceram com o correr dos séculos. Com o desenvolvimento do sistema construtivo, percebeu-se que uma alternativa interessante e viável para a execução dos vãos seriam os arcos. Nesse caso, os vãos poderiam ser obtidos através do conveniente arranjo das unidades, de forma a se garantir o preceito básico da não-existência de tensões de tração de valores significativos. A figura 1.1 (A) apresenta, de forma esquemática, um vão produzido dentro dessa concepção. Dessa forma puderam ser executadas pontes e muitas outras obras de grande beleza e durabilidade, obtendo-se um salto de qualidade significativo para o sistema construtivo. Talvez os mais marcantes exemplos de estruturas que utilizaram, de forma generalizada, esse procedimento para a obtenção de amplos espaços internos tenham sido as catedrais góticas do final da Idade Média e começo do Renascimento. Com os tetos em abóbadas suportadas por arcos de alvenaria, essas construções aliavam a beleza das formas à durabilidade dos materiais. Essas estruturas, quando necessário, foram construídas até mesmo com arcos que se apoiavam em outros arcos de contraventamento, evitando-se as tensões de tração de valores elevados e permitindo-se a criação 3 ALVENARIA ESTRUTURAL de vãos e pés-direito relativamente grandes. É o esquema que se apresenta na figura 1.1 (B), e que pode ser visto claramente, por exemplo, na parte posterior da igreja de Notre Dame, em Paris. 1.2 Situação Atual No Brasil Atualmente, no Brasil, o sistema construtivo em alvenaria tem experimentado um grande impulso. Devido à estabilização da economia, a concorrência tem feito com que um número crescente de empresas passe a se preocupar mais com os custos, acelerando as pesquisas e a utilização de novos materiais. Dentro do sistema Alvenaria Estrutural, a alvenaria não-armada de blocos vazados de concreto parece ser um dos mais promissores, tanto pela economia proporcionada como pelo número de fornecedores já existentes. Sua utilização é mais indicada em edificações residenciais de padrão baixo ou médio com até 12 pavimentos. Nesses casos utilizam-se paredes com espessura de 14 cm e a resistência de bloco normalmente necessária é de 1 MPa vezes o número de pavimentos acima do nível considerado. Entretanto, a alvenaria de blocos cerâmicos também ganha força com o aparecimento de fornecedores confiáveis para resistências superiores a 10 MPa. Apesar de, no momento, ser mais utilizada em edificações de poucos pavimentos, pode-se considerar que dentro de algum tempo os blocos cerâmicos passarão a disputar com os blocos de concreto a utilização em edifícios de até 10 pavimentos. 1.3 COMPONENTES DA ALVENARIA ESTRUTURAL Neste item serão apresentadas algumas características dos principais componentes da alvenaria estrutural. Inicialmente é importante se ressaltar dois conceitos básicos que são aqui necessários: componente e elemento. Neste texto, esses conceitos são mencionados com o significado que possuem na NBR 10837 - Cálculo de Alvenaria Estrutural de Blocos Vazados de Concreto. Essa norma de cálculo, entretanto, os apresenta de forma diversa da NBR 8798 - Execução e Controle de Obras de Alvenaria Estrutural de Blocos Vazados de Concreto. Assim, torna-se necessário um esclarecimento cabal sobre os significados aqui adotados. Entende-se por um componente da alvenaria uma entidade básica, ou seja, algo que compõe os elementos que, por sua vez, comporão a estrutura. Os componentes principais da alvenaria estrutural são: blocos, ou unidades; argamassa; graute e armadura. Já os elementos são uma parte suficientemente elaborada da estrutura, sendo formados por pelo menos dois dos componentes anteriormente citados. Como exemplo de elementos podem ser citados: paredes, pilares, cintas, vergas, etc. 4 ALVENARIA ESTRUTURAL 1.3.1 Unidade Como componentes básicos da alvenaria estrutural, as unidades são as principais responsáveis pela definição das características resistentes da estrutura. Quanto ao material componente, as unidades mais utilizadas no Brasil para edificações de alvenaria estrutural são, em ordem decrescente de utilização: unidades de concreto, unidades cerâmicas e unidades sílico-calcáreas. Quanto à forma as unidades podem ser maciças ou vazadas, sendo denominadas tijolos ou blocos, respectivamente. São consideradas maciças aquelas que possuem um índice de vazios de no máximo 25% da área total. Se os vazios excederem esse limite, a unidade é classificada como vazada. Desse detalhe advêm dois conceitos de grande importância estrutural. A tensão que se refere à área total da unidade, desconsiderando-se os vazios, é chamada tensão em relação à área bruta. Já a tensão calculada descontando-se a área de vazios é chamada de tensão em relação à área líquida. No Brasil, é muito mais comum a referência à área bruta e assim, exceto quando for feita uma observação explícita sobre esse ponto, todas as tensões aqui mencionadas serão referidas à área bruta. Usualmente, os blocos apresentam uma área de vazios em torno de 50%. Dessa forma a conversão da tensão na área bruta para a tensão na área líquida se faz multiplicando-se o primeiro valor por dois. Já quanto à aplicação, as unidades podem ser classificadas de vedação e estruturais. Neste texto apenas estarão sendo tratadas as unidades estruturais. Assim, é importante observar o que está mencionado nas normas brasileiras quanto às resistências mínimas que devem apresentar essas unidades. A NBR 6136 - Blocos Vazados de Concreto Simples para Alvenaria Estrutural6especifica que a resistência característicado bloco à compressão, medida em relação à área bruta, deve obedecer aos seguintes limites: fbk ≥ 6 MPa: blocos em paredes externas sem revestimento; fbk ≥ 4,5 MPa: blocos em paredes internas ou externas com revestimento. Portanto, na prática, só podem ser utilizados blocos de concreto com resistência característica de no mínimo 4,5 MPa. Já a NBR 7171 - Bloco Cerâmico para Alvenaria menciona que para os blocos portantes cerâmicos a resistência mínima deve ser de 4 MPa. 1.3.2 Argamassa A argamassa de assentamento possui as funções básicas de solidarizar as unidades, transmitir e uniformizar as tensões entre as unidades de alvenaria, absorver pequenas deformações e prevenir a entrada de água e de vento nas edificações. Usualmente composta de areia, cimento, cal e água, a argamassa deve reunir boas características de trabalhabilidade, resistência, plasticidade e durabilidade para o desempenho de suas funções. Para o projetista é necessário o conhecimento da resistência média à compressão da argamassa, uma vez que a NBR 10837 especifica diferentes valores de tensão admissível à tração e ao cisalhamento para a alvenaria em função desse parâmetro. No entanto, a resistência à compressão da argamassa não é tão significativa para a resistência à compressão das paredes, conforme ficará claro em item subseqüente. Mais 5 ALVENARIA ESTRUTURAL importante que essa característica de resistência é a plasticidade, que realmente permite que as tensões sejam transferidas de modo uniforme de uma unidade à outra. 1.3.3 Graute O graute é um concreto com agregados de pequena dimensão e relativamente fluido, eventualmente necessário para o preenchimento dos vazios dos blocos. Sua função é propiciar o aumento da área da seção transversal das unidades ou promover a solidarização dos blocos com eventuais armaduras posicionadas nos seus vazios. Dessa forma pode-se aumentar a capacidade portante da alvenaria à compressão ou permitir que as armaduras colocadas combatam tensões de tração que a alvenaria por si só não teria condições de resistir. É interessante ressaltar que a NBR 8798 estabelece quantidades-limite de cimento, cal e agregados para dosagens não-experimentais, o que pode ser consultado como referência sempre que necessário. Considera-se que o conjunto bloco, graute e eventualmente armadura trabalhe monoliticamente, de maneira análoga ao que ocorre com o concreto armado. Para tanto, o graute deve envolver completamente as armaduras e aderir tanto a ela quanto ao bloco, de modo a formar um conjunto único. Segundo a NBR 10837, o graute deve ter sua resistência característica maior ou igual a duas vezes a resistência característica do bloco. Essa recomendação é fácil de ser entendida quando se recorda que a resistência característica do bloco é referida à área bruta e que o índice de vazios para os blocos é usualmente de 50%. Na verdade, seria mais claro se a norma mencionasse que a resistência do graute deve ser no mínimo a mesma do bloco em relação à área líquida. 1.3.4 Armaduras As barras de aço utilizadas nas construções em alvenaria são as mesmas utilizadas nas estruturas de concreto armado, mas, neste caso, serão sempre envolvidas por graute, para garantir o trabalho conjunto com o restante dos componentes da alvenaria. Uma exceção é feita para as armaduras colocadas nas juntas das argamassas de assentamento. Nesse caso, é importante ressaltar que o diâmetro deve ser de no mínimo 3,8 mm, não ultrapassando a metade da espessura da junta. 1.4 ASPECTOS TÉCNICOS E ECONÔMICOS Sempre que se fala de um novo sistema construtivo, é imprescindível que se discutam os aspectos técnicos e econômicos envolvidos. Isso significa considerar, para cada um desses itens, as principais vantagens e desvantagens desse sistema. Para tanto, optou-se não apenas por fazer um breve apanhado das principais características da alvenaria estrutural, isoladamente falando, mas, também desenvolver uma série de comparações com o processo convencional de produção de edifícios de concreto armado. Dessa forma pretende-se situar a alvenaria estrutural em relação às estruturas convencionais de concreto armado, um sistema construtivo bastante disseminado e muito conhecido, facilitando-se assim o entendimento de algumas características mais marcantes do sistema em análise. Inicialmente, deve-se ressaltar que a utilização da alvenaria estrutural, para os edifícios residenciais, parte de uma concepção bastante interessante que é a de transformar a alvenaria, originalmente com função exclusiva 6 ALVENARIA ESTRUTURAL de vedação, na própria estrutura. Dessa forma, pode-se evitar a necessidade da existência dos pilares e vigas que dão suporte a uma estrutura convencional. Assim, a alvenaria passa a ter a dupla função de servir de vedação e suporte para a edificação, o que é, em princípio, muito bom para a economia. Entretanto, a alvenaria, nesse caso, precisa ter sua resistência perfeitamente controlada, de forma a se garantir a segurança da edificação. Essa necessidade demanda a utilização de materiais mais caros e também uma execução mais cuidadosa, o que evidentemente aumenta o seu custo de produção em relação à alvenaria de vedação. 1.4.1 Principais parâmetros a serem considerados para a adoção do sistema Nos casos usuais, o acréscimo de custo para a produção da alvenaria estrutural compensa com folga a economia que se obtém com a retirada dos pilares e vigas. Entretanto, é necessário que se atente para alguns detalhes importantes para que a situação não se inverta, passando a ser a alvenaria um processo mais oneroso para a produção da estrutura. Esses detalhes dizem respeito a determinadas características da edificação que se pretende construir, pois não é correto se considerar que um sistema construtivo seja considerado adequado a qualquer edifício. Para maior clareza, apresentam-se a seguir as três características mais importantes que devem ser levadas em conta para se decidir pelo sistema construtivo mais adequado. a) Altura da edificação No caso da altura, considerando-se os parâmetros atuais no Brasil, pode-se afirmar que a alvenaria estrutural é adequada a edifícios de no máximo 15 ou 16 pavimentos. Para estruturas com um número de pavimentos acima desse limite, a resistência à compressão dos blocos encontrados no m e r c a d o não permite que a obra seja executada em um esquema de grauteamento generalizado, o que prejudica muito a economia. Além disso, mesmo que a resistência dos blocos pudesse ser adequada quanto ã compressão, as ações horizontais começariam a produzir tensões de tração significativas, o que exigiria a utilização de armaduras e graute. E se o número de pontos sob essas condições for muito grande, a economia da obra estará irremediavelmente comprometida. b) Arranjo arquitetônico É claro que as afirmações feitas no item anterior referem-se a edifícios usuais. Para arranjos arquitetônicos que fujam desses padrões usuais, a situação pode ser um pouco melhor, ou bem pior. Nesse caso é importante se considerar a densidade de paredes estruturais por m2 de pavimento. Um valor indicativo razoável é que haja de 0,5 a 0,7 m de paredes estruturais por m2 de pavimento. Dentro desses limites, a densidade de paredes pode ser considerada usual e as condições para seu dimensionamento também refletirão essa condição. c) Tipo de uso Pelo que se menciona no item anterior, é importante ressaltar que para edifícios comerciais ou residenciais de alto padrão, onde seja necessária a utilização de vãos grandes, esse sistema construtivo normalmente não é 7 ALVENARIA ESTRUTURAL adequado. A alvenaria estrutural é muito mais adequada a edifícios residenciais de padrão médio ou baixo,onde os ambientes, e também os vãos, são relativamente pequenos. Em especial para edifícios comerciais, é desaconselhável o uso indiscriminado da alvenaria estrutural. Nesse tipo de edificação é muito usual a necessidade de um rearranjo das paredes internas de forma a acomodar empresas de diversos portes. A adoção de alvenarias estruturais para esses casos seria inconveniente, pois essa flexibilidade deixa de existir. Pode-se inclusive considerar que sua adoção seja perigosa, pois com o tempo é provável que proprietários realizem modificações sem estarem conscientes dos riscos que correm. 1.4.2 principais pontos positivos do sistema Continuando a discussão sobre os mais importantes aspectos técnicos e econômicos da alvenaria estrutural, a seguir são apresentadas as características que podem representar as principais vantagens da alvenaria estrutural em relação às estruturas convencionais de concreto armado, em ordem decrescente de importância. a) Economia de fôrmas Quando existem, as fôrmas se limitam às necessárias para a concretagem das lajes. São, portanto, fôrmas lisas, baratas e de grande reaproveitamento. b) Redução significativa nos revestimentos Por se utilizar blocos de qualidade controlada e pelo controle maior na execução, a redução dos revestimentos é muito significativa. Usualmente o revestimento interno é feito com uma camada de gesso aplicada diretamente sobre a superfície dos blocos. No caso dos azulejos, eles também podem ser colados diretamente sobre os blocos. c) Redução nos desperdícios de material e mão-de-obra O fato de as paredes não admitirem intervenções posteriores significativas, como rasgos ou aberturas para a colocação de instalações hidráulicas e elétricas, é uma importante causa da eliminação de desperdícios. Assim, o que poderia ser encarado como uma desvantagem, na verdade implica a virtual eliminação da possibilidade de improvisações, que encarecem significativamente o preço de uma construção. d) Redução do número de especialidades Deixam de ser necessários profissionais como armadores e carpinteiros. e) Flexibilidade no ritmo de execução da obra Se as lajes forem pré-moldadas, o ritmo da obra estará desvinculado do tempo de cura que deve ser respeitado no caso das peças de concreto armado. Dos itens apresentados, pode-se perceber que, em termos gerais, a principal vantagem da utilização da alvenaria estrutural reside numa maior racionalidade do sistema executivo, reduzindo-se o consumo de materiais e desperdícios que usualmente se verificam em obras de concreto armado convencional. 8 ALVENARIA ESTRUTURAL 1.4.3 Principais pontos negativos do sistema Apesar de as vantagens apresentadas serem de grande relevância, não se pode esquecer de algumas desvantagens da alvenaria estrutural em relação às estruturas convencionais em concreto armado. Elas se encontram listadas a seguir, também em ordem decrescente de importância. a) Dificuldade de se adaptar arquitetura para um novo uso Fazendo as paredes parte da estrutura, obviamente não existe a possibilidade de adaptações significativas no arranjo arquitetônico. Em algumas situações isso se torna um problema bastante sério. Estudos realizados demonstram que ao longo de sua vida útil uma edificação tende a sofrer mudanças para se adaptar a novas necessidades de seus usuários. No caso da alvenaria isso não só é inconveniente como tecnicamente impossível na grande maioria dos casos. b) Interferência entre projetos de arquitetura/estruturas/instalações A interferência entre os projetos é muito grande quando se trata de uma obra em alvenaria estrutural. A manutenção do módulo afeta de forma direta o projeto arquitetônico e a impossibilidade de se furar paredes, sem um controle cuidadoso desses furos, condiciona de forma marcante os projetos de instalações elétricas e hidráulicas. c) Necessidade de uma mão-de-obra bem qualificada A alvenaria estrutural exige uma mão-de-obra qualificada e apta a fazer uso de instrumentos adequados para sua execução. Isso significa um treinamento prévio da equipe contratada para sua execução. Caso contrário, os riscos de falhas que comprometam a segurança da edificação crescem sensivelmente. Quanto às desvantagens, deve-se ressaltar a impossibilidade de se efetuar modificações na disposição arquitetônica original. Essa limitação é um importante inibidor de vendas e até mesmo um fator que pode comprometer a segurança de uma edificação durante a sua vida útil PRINCIPAIS ASPECTOS QUANTO À MODULAÇÃO 2.1 CONCEITOS BÁSICOS A unidade é o componente básico da alvenaria. Uma unidade será sempre definida por Três dimensões principais: comprimento, largura e altura (fig. 2.1). O comprimento e, pode-se dizer, também a largura definem o módulo horizontal, ou módulo em planta. Já a altura define o Módulo vertical, a ser adotado nas elevações. Dentro dessa perspectiva, percebe-se que é muito importante que o comprimento e a largura sejam ou iguais ou múltiplos, de maneira que efetivamente se possa ter um único módulo Em planta. Se isso realmente ocorrer, a amarração das paredes será enormemente simplificada, Havendo um ganho significativo em termos da racionalização do sistema construtivo. Entretanto, Se essa condição não for atendida, será necessário se utilizar unidades especiais para a correta 9 ALVENARIA ESTRUTURAL Amarração das paredes, o que pode trazer algumas conseqüências desagradáveis para o arranjo Estrutural. Essas conseqüências serão apresentadas, com alguns detalhes, nos itens subsequentes. Assim, pode-se dizer que modular um arranjo arquitetônico, ou pelo menos modular as paredes portantes desse arranjo, significa acertar suas dimensões em planta e também o pé-direito da edificação, em função das dimensões das unidades, de modo a não se necessitar, ou pelo menos se reduzir drasticamente, cortes ou ajustes necessários à execução das paredes. No presente texto a unidade usualmente referida será o bloco, por ser a mais freqüentemente utilizada nas edificações em alvenaria estrutural. 2 .2 Importância da Modulação A modulação é um procedimento absolutamente fundamental para que uma edificação em alvenaria estrutural possa resultar econômica e racional. Se as dimensões de uma edificação não forem moduladas, como os blocos não devem ser cortados, os enchimentos resultantes certamente levarão a um custo maior e uma racionalidade menor para a obra em questão. Esse custo mais elevado se verifica não só em relação à mão-de-obra para execução dos enchimentos propriamente ditos, mas também pelo seu efeito negativo no próprio dimensionamento da estrutura como um todo. O fato de as paredes estarem trabalhando isoladas, consequência praticamente inevitável dos enchimentos, faz com que a distribuição das ações entre as diversas paredes de um edifício seja feita de forma a penalizar em demasia alguns elementos e conseqüentemente a economia do conjunto. Dessa forma, pode-se concluir que uma obra de alvenaria estrutural, que se pretenda racionalizada, deve apresentar todas as suas dimensões moduladas. Ajustes até podem ser realizados, mas em pouquíssimos pontos e apenas sob condições muito particulares. 2.3 Blocos usualmente utilizados Muitos blocos diferentes podem ser utilizados em uma edificação em alvenaria estrutural. Dependendo do tipo de bloco a ser utilizado, maciço ou vazado, cerâmico ou de concreto, existem dimensões usualmente encontradas. A NBR 6136, que trata de blocos vazados de concreto para alvenaria estrutural, especifica duas larguras padronizadas: largura nominal de 15 cm, denominados blocos M-15, e largura nominal de 20 cm, denominados blocos M-20. Entretanto, segundo a norma, os comprimentos padronizadosserão sempre de 20 10 ALVENARIA ESTRUTURAL e 40 cm e as alturas de 10 e 20 cm. A padronização adotada, em especial quanto ao comprimento, é adequada à largura de 20 cm, mas revela-se inadequada à largura de 15 cm. Os motivos dessa inadequação serão mostrados com detalhes nos itens seguintes. No Brasil são mais facilmente encontrados blocos de modulação longitudinal de 15 cm e 20 cm. ou seja, comprimentos múltiplos de 15 e 20 cm. Em algumas regiões, especialmente no Norte e Nordeste, é comum o módulo 12 cm, que começa a ser utilizado também no restante de nosso país para edificações de até dois pavimentos. Usualmente, a largura é igual ao módulo longitudinal, mas para o caso de blocos de módulo longitudinal 20 cm, pode-se encontrar larguras de 15 ou 20 cm, de acordo com a padronização apresentada pela NBR 6136. Já em termos de altura, não é comum encontrar-se valores diferentes de 20 cm, exceto para blocos compensadores. Na modulação longitudinal de 15 cm, normalmente são encontrados os blocos com 15 e 30 cm de comprimento, ambos com 15 cm de largura. Com freqüência encontra-se, também, o bloco de 45 cm de comprimento, conforme se apresenta na figura 2.2. Quando se trata do módulo de 20 cm, cujos blocos usuais têm comprimentos nominais de 20 cm, 40 cm, são encontradas larguras de 15 e 20 cm. Para a largura de 15 cm, é também freqüentemente encontrado um bloco especial de 35 cm, um módulo de 15 somado a um módulo de 20, cuja utilização será discutida com detalhes em item posterior. Uma família típica de blocos de modulação longitudinal de 20 cm é apresentada na figura 2.3. Na verdade, poder-se-ia generalizar as afirmativas anteriores mencionando que a figura 2.2 mostra blocos para os quais a largura é igual ao módulo, qualquer que seja esse valor. Já a figura 2.3 mostra uma família de blocos em que a largura é menor que o módulo, também quaisquer que sejam esses valores. Por exemplo, largura 12 cm e módulo 20 cm, em vez da largura de 15 cm que é mencionada. 2.4 Escolha da modulação a ser utilizada À primeira vista pode parecer que o único parâmetro a ser considerado na escolha do módulo horizontal a ser adotado para uma edificação seja seu arranjo arquitetônico. Isso porque se adotado o módulo de 15 cm, por 11 ALVENARIA ESTRUTURAL exemplo, as dimensões internas dos ambientes em planta devem ser múltiplas de 15. Assim, pode-se ter 60 cm, 1,20 m, 2,10 m, etc. No caso da utilização do módulo 20, as dimensões devem ser múltiplas de 20 cm. por exemplo. 60 cm. 1.60 m. 2.80 m. etc. Dessa forma o módulo a ser adotado seria aquele que ocasionasse menores alterações em uma arquitetura previamente concebida ou que propiciasse a concepção de um partido arquitetônico interessante. Realmente, a arquitetura é um ponto muito importante na definição do módulo a ser adotado. Entretanto, o principal parâmetro a ser considerado para a definição da distância modular horizontal de uma edificação em alvenaria é a largura do bloco a ser adotado. Isso porque o ideal é que o módulo longitudinal dos blocos a serem utilizados seja igual à largura a ser adotada. Dessa forma pode-se prescindir da utilização de blocos especiais e evitar uma série de problemas muito comuns,em especial na ligação de duas paredes, tanto em canto quanto em bordas. Assim sendo, o projetista, antes de sugerir o módulo a ser adotado, deve avaliar o edifício e verificar se a largura conveniente será 15 cm ou 20 cm, ou eventualmente um outro valor. Somente após esse procedimento é que deve ser discutida a modulação a ser adotada. Todavia, nem sempre é possível definir o módulo apenas seguindo esse procedimento recomendado. Pode ocorrer de não se conseguir um fornecedor para a modulação mais adequada. O fornecedor dos blocos necessita estar a uma distância relativamente pequena da obra, de forma que se viabilize economicamente o empreendimento. Distâncias muito grandes, normalmente acima de 200 km, tornam o frete proibitivo, na prática a sua utilização. Além disso, o ideal é que existam pelo menos dois fornecedores potencialmente viáveis para uma determinada edificação, a menos que os blocos estejam sendo produzidos no próprio canteiro de obras. A dependência de apenas um fornecedor externo pode representar um perigo significativo quanto a eventuais interrupções no fornecimento ou aumentos abusivos de preços. Já quanto à modulação vertical, a situação é normalmente bem mais simples. Trata-se apenas de ajustar a distância de piso a teto para que seja um múltiplo do módulo vertical a ser adotado, normalmente 20 cm. Esse procedimento usualmente não traz problemas significativos para a compatibilização com o projeto arquitetônico. Além disso, o módulo horizontal adotado e a largura dos blocos também não influem na escolha do módulo vertical. Por fim, alguns outros recursos que podem ser adotados, como a utilização de blocos compensadores ou jota adequados, podem fazer com que a distância a ser modulada seja de piso a piso, dando uma flexibilidade ainda maior ao pé-direito da edificação. Detalhes mais específicos serão analisados em item subseqüente. 2.5 Modulação Horizontal - Principais detalhes O primeiro conceito a ser aqui abordado é o das dimensões reais. Quando se adota um determinado módulo, aqui chamado de M, esse módulo refere-se ao comprimento real do bloco mais a espessura de uma junta, aqui chamada de J. Portanto, conforme se apresenta na figura 2.4, o comprimento real de um bloco inteiro será 2M - J e o comprimento real de um meio bloco será M - J. Considerando-se as juntas mais comuns, que são de 1 cm, 12 ALVENARIA ESTRUTURAL tem-se que os comprimentos reais dos principais blocos serão seus comprimentos nominais (15, 20, 30, 35, 45 cm, etc.) diminuídos de 1 cm (14, 19, 29, 34, 44 cm, etc.). Entretanto, não são tão raros blocos preparados para juntas de 0,5 cm, principalmente nas famílias de módulo 15 cm. Nesse caso os comprimentos reais seriam de 14,5 cm, 29,5 cm e 44,5 cm. Então, as dimensões reais de uma edificação entre faces dos blocos, ou seja, sem se considerar os revestimentos, serão sempre determinadas pelo número de módulos e juntas que se fizerem presentes no intervalo. Dependendo do caso pode-se ter (n∞M), (n∞M - J) ou (n∞M + J). A figura 2.5 ilustra alguns casos típicos. Outro ponto interessante apresentado na figura 2.5 é o fato de os blocos que vão colocados em cantos e bordas vizinhos estarem "paralelos" ou "perpendiculares", sendo essas definições tomadas em relação a eixos segundo o comprimento das peças. Quando a dimensão entre blocos de canto ou borda vizinhos é um número par vezes o módulo, os blocos se apresentarão paralelos (Fig 2.5A). Em caso contrário, se a dimensão for um número ímpar vezes o módulo, os blocos estarão perpendiculares (Fig 2.5B). Somente com esses conceitos simples apresentados já é possível definir uma das fiadas, por exemplo, a primeira. As demais fiadas devem levar em conta a preocupação de se evitar ao máximo as juntas a prumo. Portanto, as fiadas subseqüentes são definidas de modo a se produzira melhor concatenação possível entre os blocos. Isso significa defasar as juntas de uma distância M, obtendo-se a situação mostrada na figura 2.6. Ressalta-se que os blocos de canto estão hachurados apenas para se destacar o seu posicionamento. Com os conceitos apresentados, a modulação horizontal estará praticamente resolvida na maior extensão das paredes. Apenas podem ocorrer alguns problemas adicionais em cantos e bordas, especialmente quando o módulo adotado não for o mesmo valor da largura. Para deixar bem claros esses detalhes a serem utilizados é que se apresentam no próximo item soluções recomendadas para esses casos.13 ALVENARIA ESTRUTURAL 2.6 Soluções recomendadas para cantos e bordas Neste item, procurar-se-á destacar os blocos vazados de concreto, os mais utilizados no Brasil, e que por serem vazados exigem maiores cuidados na disposição a ser adotada em cantos e bordas. Entretanto, as disposições aqui adotadas podem ser adaptadas com facilidade para outros tipos de blocos, inclusive cerâmicos e não-vazados. 2.6.1 Módulo e largura iguais Neste item serão apresentados detalhes para canto e bordas quando o módulo adotado é igual à largura do bloco. Esse valor pode ser de 12,15 ou mesmo 20 cm. Os detalhes serão os mesmos para qualquer caso. Entretanto, é importante mencionar que na grande maioria das edificações residenciais a largura de bloco ideal a ser adotada é de 15 cm. Nesse caso, o módulo ideal também será o de 15 cm. Quando for possível adotá-lo, os detalhes de cantos e bordas são muito simples, em especial quando se puder utilizar o bloco de três módulos nas bordas. Para maior clareza, apresentam-se nas figuras 2.7 a 2.9 os esquemas de fiadas para esses encontros. É interessante salientar que para os cantos, sempre, e para as bordas, quando se dispõe de um bloco especial de três módulos, são necessárias apenas duas fiadas para esclarecer completamente o detalhe. Já para as bordas executadas sem a utilização do bloco de três módulos, serão necessárias quatro fiadas para que o detalhe seja completo. Nesse caso, após três fiadas com juntas a prumo é que ocorrerá uma fiada com junta defasada. 14 ALVENARIA ESTRUTURAL 2.6.2 largura menor que o módulo Se o projetista não puder utilizar o módulo e a largura do bloco iguais, será necessário se prever a utilização de blocos especiais para a solução de cantos e bordas. Somente para exemplificar apresenta-se o esquema de fiadas em um canto sem a utilização desses blocos especiais. Pode-se observar que a solução é completamente inadequada, tanto em relação à continuação das fiadas quanto ao mau posicionamento dos septos. Assim, para esses casos, é imprescindível a utilização do bloco especial no qual um dos furos é especialmente adaptado para a dimensão da largura do bloco, enquanto o outro é um furo com as dimensões normais. Por exemplo, para blocos que estejam de acordo com a especificação M-15 da NBR 6136, módulo de 20 cm com largura 15 cm, o bloco especial teria 35 cm de comprimento. Somente com a utilização desse tipo de bloco é que se pode realizar corretamente a concatenação de blocos entre as diversas fiadas, conforme se mostra na figura 2.11. 15 ALVENARIA ESTRUTURAL Também a modulação de uma borda pode ser resolvida com o mencionado bloco especial, de acordo com o esquema apresentado na figura 2.12. Outra possibilidade é a utilização de um bloco especial de três furos, raramente encontrado no mercado. Esse bloco teria de apresentar os furos das extremidades com as dimensões normais e o furo do meio com a dimensão adaptada à largura das unidades. Assim, além de não ser comum a sua produção, esse bloco normalmente apresentaria dificuldades de instalação, pois seria pesado. Por exemplo, no caso dos blocos seguindo a especificação M-15 da NBR 6136, ele teria 55 cm de comprimento. Entretanto, o esquema de fiadas da borda pode ser simplificado com a sua utilização como se observa na figura 2.13. 2.7 Modulação vertical - principais detalhes Conforme já se mencionou, a modulação vertical raramente provoca mudanças significativas no arranjo arquitetônico. Existem basicamente duas formas de se realizar essa modulação. A primeira, apresentada na figura 2.14, é aquela em que a distância modular é aplicada de piso a teto. Assim, paredes de extremidades terminarão com um bloco J que tem uma das suas laterais com uma altura maior que a convencional, de modo a acomodar a altura da laje. Já as paredes internas terão sua última fiada composta por blocos canaleta comuns. Em casos em que não se pretenda ou não se possa utilizar blocos J, mesmo nas paredes externas poderão ser utilizados apenas blocos canaleta convencionais, realizando-se a concretagem da laje com uma fôrma auxiliar convenientemente posicionada (Fig. 2.15). 16 ALVENARIA ESTRUTURAL A segunda possibilidade de modulação vertical que pode ser utilizada é a aplicação da distância modular de piso a piso. Nesse caso, apresentado na figura 2.16, a última fiada das paredes externas será formada por blocos J com uma das suas laterais com altura menor que a convencional, de forma a também propiciar a acomodação da espessura da laje. Já as paredes internas apresentarão, em sua última fiada, blocos compensadores, para permitir o ajuste da distância de piso a teto que não estará modulada. Este procedimento pode ser interessante quando o fabricante de blocos não puder fornecer blocos J e não se desejar fazer a concretagem utilizando-se fôrmas auxiliares. Ocorre que os blocos canaleta comuns poderão ser cortados no canteiro, por meio de uma ferramenta adequada, permitindo que os blocos J e os compensadores possam ser obtidos com relativa facilidade. 17 ALVENARIA ESTRUTURAL 2.8 CONCLUSÃO No presente capítulo foram apresentadas as características geométricas da utilização da alvenaria, tendo sido discutidos os aspectos relativos às suas modulações horizontal e vertical. Foi mostrada a importância da modulação para a obtenção de economia e racionalidade na edificação em alvenaria. Foram apresentadas também as dimensões usuais das unidades encontradas no mercado brasileiro, apontando-se para uma relativa vantagem daquelas em que o módulo longitudinal é igual à largura nominal da unidade. São feitas algumas recomendações para amarração de paredes em cantos e bordas, sempre com o objetivo de evitar- se a presença de junta a prumo, com benefícios na interação de paredes e na redução de potenciais fissuras. Por fim são discutidas as opções para a modulação vertical, com destaque para a escolha de pés-direitos a serem praticados, e a eventual necessidade de adoção de um maior número de componentes na família de unidades escolhida. ANÁLISE ESTRUTURAL PARA CARGAS VERTICAIS 3.1 PRINCIPAIS SISTEMAS ESTRUTURAIS A concepção da estrutura consiste em se determinar, a partir de uma planta básica, quais as paredes que serão consideradas estruturais ou não-estruturais, no presente caso, em relação às cargas verticais. Alguns fatores podem condicionar esta escolha: utilização da edificação, simetria da estrutura, etc. Esse conjunto de elementos portantes é denominado sistema estrutural. Apenas com objetivos didáticos, os sistemas estruturais podem ser classificados em alguns tipos notáveis. Segundo Hendry (1981), que criou uma classificação que se pode considerar clássica, os sistemas estruturais podem ser nomeados de acordo com a disposição das paredes estruturais nos tipos apresentados nos itens que se seguem. 3 .1.1 Paredes transversais Utilizável em edifícios de planta retangular e alongada. As paredes externas, na direção do maior comprimento, são não estruturais, de forma a permitir a colocação de grandes caixilhos. As lajes são armadas em uma direção, de forma a apoiarem-se sobre as paredes estruturais. Algumas aplicações principais podem ser mencionadas: hotéis, hospitais, escolas, etc. 3.1.2 Paredes celulares Sistema adequado a edificações de plantas mais gerais. Todas as paredes são estruturais. As lajes podem ser armadas em duas direções, pois há a possibilidade de apoiarem-se em todo seu contorno. Suas aplicações principais são em edifícios residenciais em geral. Por conferir uma maior rigidez ao conjunto, o sistema de paredes celulares é bastante interessante de ser utilizado,sempre que possível. 18 ALVENARIA ESTRUTURAL 3.1.3 Sistema complexo Trata-se da utilização simultânea dos tipos anteriores, normalmente em regiões diferentes da planta da edificação. Interessante para edificações onde se necessita de alguns painéis externos não estruturais, sendo, entretanto, possível manter-se uma região interna mais rígida, com todas as paredes com função estrutural. 3.2 CARREGAMENTO VERTICAL As cargas a serem consideradas em uma edificação dependem do tipo e da utilização desse edifício. Por exemplo, em um edifício industrial pode ser necessária a consideração de cargas provenientes de pontes rolantes. Neste trabalho, entretanto, as atenções principais estão voltadas para edificações residenciais. E para os edifícios residenciais em alvenaria estrutural as principais cargas a serem consideradas nas paredes são: a) ações das lajes; b) peso próprio das paredes. Os valores mínimos a serem adotados para os carregamentos podem ser obtidos consultando-se a NBR 6120 - Cargas para o Cálculo de Estruturas de Edificações. 3.2.1 Cargas provenientes das lajes As principais cargas atuantes nas lajes de edifícios residenciais podem ser divididas em dois grandes grupos: cargas permanentes e cargas variáveis. As principais cargas permanentes normalmente atuantes são: 19 ALVENARIA ESTRUTURAL a) peso próprio; b) contrapiso; c) revestimento ou piso; d) paredes não-estruturais. Já as cargas variáveis são cobertas pela sobrecarga de utilização, que para os edifícios residenciais variam de 1,5 a 2,0 kN/m2. As lajes descarregam todas essas cargas sobre as paredes estruturais que lhe servem de apoio. Para o cálculo dessas ações, dois casos podem ser destacados: a) lajes armadas em uma direção; b) lajes armadas em duas direções. Para os casos de lajes pré-moldadas ou armadas em uma direção, deve-se considerar simplesmente a região de influência de cada apoio, ou seja. os lados perpendiculares à direção da armadura. Nesse caso pode-se imaginar a existência de uma linha, paralela aos apoios, que delimita as regiões de influência. Considerando- se um vão L, essa linha pode ser tomada nas seguintes posições: a) 0,5 L entre dois apoios do mesmo tipo; b) 0,38 L do lado simplesmente apoiado e 0,62 L do lado engastado; c) 1,0 L do lado engastado quando a outra borda for livre. Já no caso de ações de lajes maciças, armadas em duas direções, pode-se utilizar o procedimento das linhas de ruptura, recomendado pela NBR 6118 - Projeto e Execução de Obras de Concreto Armado. 3.2.2 Peso próprio das paredes Para considerar o peso próprio das paredes, basta utilizar a expressão: p = Ɣ e h Em que, p: peso da alvenaria (por unidade de comprimento) Ɣ : peso específico da alvenaria e: espessura da parede (bloco + revestimento) h: altura da parede (não esquecer eventuais aberturas) Quanto ao valor de Ɣ, o parâmetro mais importante da expressão, devem ser consideradas as condições específicas da alvenaria utilizada. Para os principais tipos presentes em edifícios residenciais, pode-se montara tabela 3.1. 20 ALVENARIA ESTRUTURAL Tabela 3.1 - Principais pesos específicos para alvenaria. Tipo de alvenaria Peso específico kN/m3 Blocos vazados de concreto 14 Blocos vazados de concreto preenchidos com graute 24 Blocos cerâmicos 12 3.3 INTERAÇÃO DE PAREDES Numa parede de alvenaria, quando se coloca um carregamento localizado sobre apenas uma parte de seu comprimento, tende a haver um espalhamento dessa carga ao longo de sua altura. A NBR 10837 - Cálculo de Estruturas de Alvenaria de Blocos Vazados de Concret3 prescreve que esse espalhamento deve-se dar segundo um ângulo de 45°. Se esse espalhamento pode ser observado em paredes planas, é de se supor que também possa ocorrer em cantos e bordas, especialmente quando a amarração é realizada intercalando-se blocos numa e noutra direção, ou seja. sem a existência de juntas a prumo. Isso se dá porque um canto assim executado guarda muita semelhança com a própria parede plana, devendo ser, portanto, o seu comportamento também semelhante (Fig. 3.4). É claro que somente haverá espalhamento da carga através de um canto se nesse ponto puderem se desenvolver forças de interação (Fig. 3.5). Se essas forças não estiverem presentes por um motivo qualquer, como a existência de uma junta a prumo no local, evidentemente o espalhamento também não se verificará. E não ocorrendo o espalhamento não ocorrerá a uniformização das cargas que atuam sobre essas paredes. Outro ponto em que se pode discutir a existência ou não de forças de interação são as aberturas. Usualmente, considera-se que a existência de uma abertura também represente um limite entre paredes, ou seja, a abertura caracteriza a interrupção do elemento. Assim sendo uma parede com aberturas normalmente é considerada como uma seqüência de paredes independentes. Entretanto, também nesse caso, costuma haver forças de interação entre esses diferentes elementos e, portanto, haverá espalhamento e uniformização de cargas (Fig. 3.6). Não se pode esquecer que em casos usuais de janelas ainda se tem aproximadamente 2/3 do pé-direito preenchido com material, sendo que essa altura se reduz a aproximadamente 1/3 no caso de portas. Dessa forma, é importante deixar bem claro que o procedimento de distribuição de cargas verticais somente pode ser definido após uma clara avaliação desses níveis de interação entre paredes, de modo a não se violar condições reais de trabalho da estrutura. Se for possível a ocorrência de forças de interação relativamente grandes, isso significará um espalhamento do carregamento e, portanto, uma uniformização das cargas entre essas paredes. Em caso contrário, o espalhamento e a uniformização do carregamento podem se dar em níveis muito baixos. 21 ALVENARIA ESTRUTURAL 3.4 IMPORTÂNCIA DA UNIFORMIZAÇÃO DAS CARGAS Normalmente, as cargas verticais que atuam sobre as paredes, num determinado nível da edificação, apresentam valores que podem ser muito diferentes. Por exemplo, as paredes internas tendem a receber carregamentos bem maiores que as paredes externas. Mesmo assim, não é recomendável que. para um determinado pavimento, sejam utilizadas resistências diferentes para os blocos. Seria muito perigoso uma troca de resistências, fazendo com que uma parede que necessitasse de um bloco mais resistente acabasse sendo construída com um menos resistente e vice-versa. Isso porque os blocos normalmente não possuem nenhuma indicação explícita dessa resistência, podendo ser facilmente confundidos. 22 ALVENARIA ESTRUTURAL Desse modo, a parede mais carregada acaba definindo a resistência dos blocos a serem utilizados em todas as paredes do pavimento. É claro que podem ser previstos pontos grauteados, o que aumenta a resistência da parede mantendo-se a resistência do bloco. Entretanto, o grauteamento não é uma solução para ser utilizada de modo extensivo, devido ao custo e às dificuldades de execução. Portanto, pode-se concluir que quanto maior a uniformização das cargas verticais ao longo da altura da edificação, maiores os benefícios para a economia, pois haverá uma tendência a uma redução das resistências dos blocos a serem especificados. Por outro lado, se a suposta uniformização não ocorrer na prática, pode-se ter uma redução significativa da segurança da edificação. Logo, o projetista deve ter em mente esses parâmetros para considerar a distribuição dos carregamentos verticais, de modo a não onerar em excesso o custo da obra e não comprometer a segurança da estrutura. É bastante claro que, em maior ou menor grau, sempre ocorrerá umauniformização dos carregamentos ao longo da altura da edificação. Entretanto, quantificar essa uniformização é o ponto relevante da questão. 3.5 INFLUÊNCIA DO PROCESSO CONSTRUTIVO Quando se fala de distribuição de cargas verticais entre as diversas paredes de um pavimento, deve-se levar em consideração que o processo executivo é uma variável de grande importância. Pode-se citar algumas das providências construtivas que mais contribuem para a existência de forças de interação elevadas e portanto uma maior uniformização das cargas verticais, em caso de cantos e bordas: a) amarração das paredes em cantos e bordas sem juntas a prumo; b) existência de cintas sob a laje do pavimento e à meia altura; c) pavimento em laje maciça. A primeira característica apresentada é a mais importante. Quando se utiliza qualquer procedimento de amarração que não seja a colocação dos blocos de forma a se evitar a formação de juntas a prumo, o desenvolvimento de forças de interação, o espalhamento das cargas e logicamente a uniformização desse carregamento, torna-se um procedimento duvidoso. Resultados de pesquisas recentes realizadas no Laboratório de Estruturas do SET-EESCUSP, ainda a serem publicados, indicam que grapas, corretamente colocadas em cantos e bordas com o auxílio de furos grauteados, podem atuar de forma bastante eficiente. Os resultados são realmente muito animadores, podendo-se admitir um comportamento muito próximo daquele que se obteria com a amarração entre as paredes sem juntas a prumo. Entretanto, tendo sido esses resultados obtidos para paredes construídas em escala 1:3, é necessário que se confirmem esses valores através de ensaios em escala real para que possam ser utilizados com segurança. Já alguns outros esquemas de armaduras que muitas vezes são colocadas nos cantos e bordas, como telas ou barras de pequeno diâmetro envolvidos pela argamassa de juntas horizontais, realmente não tem a condição de garantir com segurança a transmissão de forças significativas nos encontros de paredes. Também podem contribuir para uma uniformização das cargas em cantos e bordas as outras providências mencionadas, se bem que num nível de menor importância. Cintas sob a laje e à meia altura e pavimentos 23 ALVENARIA ESTRUTURAL em laje maciça trabalham a favor da uniformização pois tendem a aumentar as forças de interação. Entretanto, é difícil quantificar essa influência benéfica, especialmente se for considerada a grande variabilidade dessas providências. Cintas podem ser executadas com diversas alturas e armadas com barras de diversos diâmetros. Lajes também podem apresentar espessuras diferentes e diversos esquemas de armação. Quanto às aberturas, os detalhes construtivos que mais colaboram no sentido do aumento das forças de interação e portanto da uniformização são: a) existência de vergas; b) existência de contra-vergas. Evidentemente, essas vergas e contra-vergas devem ser previstas com uma penetração apropriada nas paredes a que se ligam. Quanto maiores forem essas penetrações melhores condições de desenvolvimento de forças de interação serão criadas. 3.6 PROCEDIMENTOS DE DISTRIBUIÇÃO Para auxiliar a definição da distribuição de cargas verticais, pode-se apresentar alguns dos procedimentos mais indicados. Cada um tem suas vantagens, desvantagens e aplicações apropriadas, o que se tentará destacar nos itens específicos. 3.6.1 Paredes Isoladas Neste procedimento trata-se de considerar cada parede como um elemento independente, não interagindo com os demais elementos da estrutura. É um procedimento simples e rápido. Para encontrar a carga numa parede, num determinado nível, basta somar todas as cargas atuantes nessa parede nos pavimentos que estão acima do nível considerado. Além de simples é também muito seguro para as paredes, pois na ausência da uniformização das cargas as resistências prescritas para os blocos resultarão sempre mais elevadas que se a uniformização fosse considerada. O ponto negativo é obviamente a economia, que sai penalizada, pois blocos mais resistentes são também blocos mais caros. Além disso, considerar as paredes completamente isoladas não é verossímil, para a maioria das edificações, pelas razões anteriormente citadas. Isso pode causar uma estimativa errada das ações sobre estruturas complementares, como pavimentos de pilotis e fundações em concreto armado. A recomendação que se pode fazer é que este procedimento de se considerar as paredes isoladas seja utilizado para edificações de altura relativamente pequena, onde os seus efeitos negativos são menos perceptíveis. 3.6.2 Grupos isolados de paredes Um grupo é um conjunto de paredes que são supostas totalmente solidárias. Geralmente, os limites dos grupos são as aberturas, portas e janelas, conforme se mostra como exemplo na figura 3.7. Neste 24 ALVENARIA ESTRUTURAL procedimento consideram-se as cargas totalmente uniformizadas em cada grupo de paredes considerado. Isso significa que as forças de interação em canto e bordas são consideradas suficientes para garantir um espalhamento e uma uniformização total em uma pequena altura. Por outro lado, desconsideram-se as forças de interação nas aberturas, limites dos grupos. Dessa forma, cada grupo definido trabalhará isolado dos demais. É um procedimento bem aceito na literatura internacional. Sutherland (1968) propõe que se divida a laje em triângulos e trapézios e que essas áreas de contribuição sejam levadas a grupos de paredes que estariam trabalhando solidárias. Esse é, em suma, o procedimento aqui recomendado. Os triângulos e trapézios mencionados nada mais são do que as regiões formadas por linhas de ruptura das lajes de concreto. E as evidências de uniformização do carregamento vertical dentro dos grupos foram levantadas por Stockbridge4 apuei Hendry (1981) que mediu deformações em paredes na base de um edifício de cinco pavimentos enquanto este era construído. Essas medidas evidenciaram que as cargas acabavam se uniformizando à medida que os pavimentos eram acrescentados à edificação. Também é um procedimento simples de ser implementado, se bem que implique um trabalho um pouco maior do que para o procedimento de paredes isoladas. Basta que todas as cargas a serem aplicadas em qualquer parede de um determinado grupo sejam somadas e posteriormente distribuídas pelo comprimento total dessas paredes do grupo. Encontrada a carga para o grupo correspondente a um pavimento, basta multiplicar pelo número de pavimentos que se encontram acima do nível que se pretende verificar. Usualmente, também é um procedimento seguro, em especial quando as aberturas são consideradas como o limite entre os grupos. Entretanto, como essa definição pode basear-se cm outros parâmetros, o procedimento pode apresentar distorções, dependendo de quais paredes serão consideradas como pertencentes a tal ou qual grupo. Considera-se ainda que produza reações adequadas para eventuais estruturas de apoio, o que é um detalhe bastante importante a ser considerado. Quanto à economia, sempre se admitindo uma escolha tecnicamente correta dos grupos a serem considerados, é um procedimento bastante racional e que normalmente resulta em especificações adequadas de blocos. A redução das resistências necessárias para os blocos costuma ser bastante significativa em relação ao procedimento das paredes isoladas. 25 ALVENARIA ESTRUTURAL Pelas suas qualidades, pode-se considerá-lo um procedimento adequado a edificações de qualquer altura. Entretanto, é fundamental que se avalie corretamente a possibilidade de realmente ocorrerem as mencionadas forças de interação em cantos e bordas, condição fundamental para sua correta aplicação. 3 .6.3Grupos de paredes com interação Este procedimento é uma extensão do anterior, com uma sofisticação adicional de modo que os próprios grupos de paredes interagem entre si. Portanto, a diferença entre este procedimento e o anterior, que apenas considerava a interação em canto e bordas, é a existência de forças de interação também sobre as aberturas. Claro que essa interação não pode se limitar a uma uniformização total do carregamento, pois isso equivaleria a encontrar a carga vertical total de um pavimento e dividi-la pelo comprimento total das paredes, obtendo uma carga média igual para todos os elementos. Na verdade é conveniente que seja definida uma taxa de interação, que representa quanto da diferença de cargas entre grupos que interagem deve ser uniformizada em cada nível. Além disso, é também importante que se possa especificar quais grupos de paredes estão interagindo, de modo que o projetista tenha total controle sobre o processo. É bem mais trabalhoso que os dois procedimentos anteriormente mencionados. Assim, de forma a reduzir a possibilidade da ocorrência de erros, recomenda-se que seja automatizado através de computadores, até mesmo com a utilização de um programa de planilha eletrônica. Uma sugestão interessante para se considerar essa interação através de um algoritmo seguro e relativamente fácil de ser implementado é apresentada em Corrêa & Ramalho (1994a) ou Corrêa & Ramalho (1998b). Resumidamente trata-se de fazer a distribuição através das seguintes equações: Em que. n = número de grupos que estão interagindo q, = carga do grupo i qm = carga média dos grupos que estão interagindo, calculada pela carga total dividida pelo comprimento total d = diferença de carga do grupo em relação à média t = taxa de interação Quanto à segurança do procedimento aqui exposto, é difícil adotar uma posição simplista. Como devem ser definidos os grupos, quais grupos interagem entre si e ainda a taxa de interação adotada, é um procedimento que exige bastante experiência do projetista e resultados experimentais para a sua utilização. Quando bem utilizado é seguro, produzindo inclusive ações adequadas para eventuais estruturas de suporte. A economia é seu grande atrativo. As especificações de resistências de blocos resultantes de sua utilização tendem a ser as menores entre os procedimentos discutidos até aqui. Especialmente quando se tem paredes de pequenas dimensões e isoladas por aberturas, as diferenças costumam ser muito significativas, mesmo em relação ao procedimento de grupos isolados. 26 ALVENARIA ESTRUTURAL De forma semelhante ao procedimento que considera os grupos isolados, é adequado a edificações de qualquer altura. Entretanto, aqui também é fundamental que se avalie corretamente a possibilidade de realmente ocorrerem as forças de interação, tanto em cantos e bordas como nas regiões de aberturas. Serão essas, sem dúvida, as condições fundamentais para sua utilização. 3.6.4 Modelagem tridimensional em elementos finitos Trata-se de modelar a estrutura discretizada com elementos de membrana ou chapa, colocando-se os carregamentos ao nível de cada pavimento. Dessa forma a uniformização dar-se-á através da compatibilização dos deslocamentos ao nível de cada nó. É um procedimento muito interessante que, entretanto, apresenta alguns inconvenientes: dificuldades na montagem dos dados e na interpretação dos resultados, além da definição de elementos que possam representar o material alvenaria. No momento, pode-se afirmar que ainda não é viável para projetos usuais. São ainda necessárias pesquisas adicionais, inclusive com o desenvolvimento de elementos especiais para a simulação da alvenaria, para que realmente possa ser utilizada com eficiência e segurança. 3.7 EXEMPLOS DE DISTRIBUIÇÃO DE CARGAS VERTICAIS Para deixar clara a utilização dos três primeiros procedimentos discutidos, apresenta-se neste item dois exemplos de aplicação. Através deles pretende-se demonstrar as principais características de cada procedimento, verificando-se assim as suas peculiaridades quanto à dificuldade do implementação e obtenção de resultados. 3.7.1 EXEMPLO 1 Trata-se de parte de uma edificação, representada pelos três grupos apresentados na figura 3.7. Será admitido que esses três grupos representem o conjunto de paredes do pavimento, o que é bastante razoável para as comparações efetuadas. O objetivo maior é demonstrar os cálculos necessários para a obtenção dos resultados, além da discussão sobre esses valores obtidos. Dados adicionais sobre comprimentos das paredes e cargas atuantes são organizados na tabela 3.2. Ressalta-se que os valores dos carregamentos são representativos de uma situação típica de projeto e, para a comparação pretendida, são adotados oito pavimentos de altura e espessura das paredes igual a 0,14 m. Utilizando-se o procedimento das paredes isoladas, para o primeiro pavimento, obtêm-se os valores de carga e tensão especificados na tabela 3.3. Pelos resultados obtidos, pode-se concluir que a variação das tensões 27 ALVENARIA ESTRUTURAL nas diversas paredes que compõem o citado exemplo é bastante grande. A parede P6, a mais solicitada, apresenta uma tensão 3,2 vezes maior que a parede P3, a menos solicitada. Já quanto à resistência necessária de bloco, a última coluna da referida tabela 3.3 apresenta o valor aproximado calculado considerando-se a utilização de blocos vazados de concreto. Pelos valores obtidos verifica-se que mesmo que se adotasse o grauteamento da parede P6, procedimento altamente recomendável para esse caso, ainda se obteria uma variação bastante significativa da resistência considerando-se apenas as outras paredes. Isso, obviamente, acabaria por penalizar a economia da obra. Agora, considerando-se grupos isolados de paredes (sem interação), obtêm-se, para o mesmo primeiro pavimento, os resultados apresentados na tabela 3.4. Da análise dos resultados obtidos, pode-se perceber que a situação das paredes em que a distribuição das cargas dependia de forças de interação em canto e bordas, que neste caso são consideradas, fez com que a tensão se aproximasse de 1 MPa para os dois grupos. Portanto, tensões que no caso anterior variavam de 1,30 a 0,74 MPa foram praticamente igualadas. Apenas a parede P6, que se encontra isolada no grupo G3, já que as forças de interação através das aberturas não estão sendo consideradas, ainda apresenta a mesma tensão elevada que apresentava no procedimento anterior. Quanto à resistência a ser especificada para os blocos que comporão as paredes, ao se considerar apenas os grupos 1 e 2, os valores que variavam de 4,5 a 8 MPa passam a 6 MPa. Já a pequena parede isolada P6, que compõe o grupo G3, deve ser considerada grauteada e armada. Isso faz com que o bloco de 6 MPa possa ser utilizado em todo o pavimento, o que representa uma economia significativa. Finalmente, pode-se demonstrar a utilização do procedimento de grupos de paredes com interação. Nesse caso, adotando-se uma taxa de uniformização da diferença de carga de 50%, obtêm-se os resultados que se encontram organizados na tabela 3.5. 28 ALVENARIA ESTRUTURAL Observando-se os resultados da tabela 3.5, verifica-se que para o primeiro pavimento ocorreu um aumento muito discreto das tensões nos grupos 1 e 2 para uma diminuição bastante acentuada da tensão no grupo 3. Essa é realmente a situação típica a ser encontrada. Como a parede isolada tinha pequena dimensão, e por causa disso apresentava problemas com tensões muito elevadas, a carga transmitida aos demais grupos não é significativa para acrescer as suas tensões, sendo no entanto suficiente para reduzir de forma significativa a própria tensão.Quanto à resistência a ser especificada para os blocos, sempre considerando-os vazados de concreto, verifica-se que o valor para o pavimento como um todo não se modifica, mantendo-se em 6 MPa. Entretanto, a parede P6 poderá ser simplesmente grauteada, não se necessitando da utilização de armaduras para resistir à nova tensão obtida. Percebe-se que, obviamente, os cálculos necessários à obtenção dos resultados organizados na tabela 3.5 são muito mais trabalhosos que para os dois procedimentos anteriores. Entretanto, utilizando-se o recurso de uma planilha eletrônica eles podem ser executados de forma confortável e acima de tudo confiável. Portanto, essa maior complexidade não é tão importante na opção por um ou outro procedimento. O aspecto da segurança é, sem dúvida, muito mais significativo. 29 ALVENARIA ESTRUTURAL 3.7.2 EXEMPLO 2 O segundo exemplo a ser discutido é um edifício de alvenaria estrutural de nove pavimentos, com pé-direito de 2,72 m de piso a teto, cuja planta esquemática apresenta-se na figura 3.8. As paredes portantes externas e as que dividem os apartamentos têm espessura de 19 cm, sendo as restantes de 14 cm de espessura. Para se limitar esta discussão aos elementos mais importantes, tomar-se-á a região inferior esquerda da edificação, que aparece em detalhe na figura 3.9. Essa região foi dividida em paredes e analisada com quatro suposições de níveis de interação entre os elementos componentes: a) paredes isoladas; b) grupos de paredes sem interação; c) grupos de paredes com taxa de uniformização de cargas igual a 50%; d) grupos de paredes com taxa de uniformização de cargas igual a 100%. Convém ressaltar que a interação adotada no item d corresponde a uma uniformização completa das cargas verticais entre todos os grupos, obtendo-se um único valor de carga média para todas as paredes. Os grupos foram definidos procurando-se reunir paredes de mesma espessura, conforme se apresenta na tabela 3.6. Isso foi feito porque a interface entre paredes de espessuras diferentes precisaria ser realizada através de utilização de armaduras, pela inexistência de blocos especiais adequados à chamada amarração direta. Conforme já se mencionou, esse é um procedimento sobre o qual há algumas dúvidas quanto à sua eficiência para a distribuição das ações verticais. Assim sendo, seria perigoso considerar que as forças de interação nessas interfaces pudessem se desenvolver de forma completa, a menos que se tratasse de paredes muito pequenas, que dificilmente trabalhariam de forma independente. 30 ALVENARIA ESTRUTURAL Quanto aos resultados obtidos para as quatro simulações mencionadas, eles serão apresentados por parede, independentemente delas estarem ou não agrupadas e desses grupos estarem interagindo ou não. Dessa forma poder-se-á comparar com maior facilidade os diversos resultados obtidos. A tabela 3.7 apresenta um resumo desses resultados, com as diversas simulações, sempre para o primeiro pavimento da edificação, que é o mais solicitado. Com os resultados da tabela 3.7, podem-se observar algumas diferenças muito significativas na carga vertical atuante em algumas paredes quando se considera o procedimento de paredes isoladas e grupos de paredes. Normalmente são paredes de pequeno comprimento que se encontram adjacentes a uma abertura. Podem- se citar, por exemplo, as paredes P4, P5, P6 e P15. Nesse caso, pode-se afirmar que é fundamental a consideração de um grupo entre essas paredes e as adjacentes, supondo que as forças de interação sejam suficientes para a uniformização das cargas. Se isso não for feito, será praticamente impossível especificar blocos com resistência razoável. Já para as simulações que envolvem grupos de paredes, as diferenças são menos expressivas, e as maiores cargas ocorrem nas paredes que estão isoladas das demais pela existência de aberturas. O caso mais significativo é a parede P3. A redução do carregamento entre o procedimento de grupos sem interação e com interação de 50% é da ordem de 37%. Caso semelhante ocorre com uma parede de grande importância, a P20, que apresenta uma redução de 21% na carga vertical atuante. 31 ALVENARIA ESTRUTURAL Somente como comparação pode-se estimar a resistência à compressão necessária para o bloco em cada caso simulado, sempre para o primeiro pavimento e considerando-se blocos vazados de concreto. Para tanto, serão utilizadas as tensões obtidas para cada parede, realizando-se o dimensionamento e tomando-se o maior valor obtido. Os resultados podem ser encontrados na tabela 3.8. Observe-se que não foi considerada a possibilidade de grauteamento das paredes. Através dos resultados da tabela 3.8, pode-se perceber que o processo utilizado para a distribuição das cargas verticais influencia, de forma muito significativa, a resistência necessária para os blocos a serem utilizados e, por conseqüência, o custo da obra. Entretanto, não se deve deixar de se considerar o aspecto mais importante a ser analisado: a segurança a ser obtida com o procedimento de análise, o que mostra ser fundamental o desenvolvimento de pesquisa que gere informação sobre a interação de paredes. 3.8 VERIFICAÇÃO DE DANO ACIDENTAL 32 ALVENARIA ESTRUTURAL Ações acidentais são aquelas que estão fora do conjunto normalmente considerado para o projeto de um edifício, como ações devidas a explosões e impactos. Essas verificações ganharam importância após um acidente ocorrido em 1968 na Inglaterra. Um edifício de 23 pavimentos, o Ronan Point, sofreu um colapso progressivo após a explosão de um botijão de gás no 181 pavimento. Pela retirada de um de seus painéis portantes, no caso um painel pré-moldado, as lajes que estavam acima do nível acidentado entraram em colapso, levando à ruína todo um canto da edificação. Existem, basicamente, duas maneiras de se prevenir o colapso progressivo: a) evitar a possibilidade de ocorrência do dano acidental; b) admitir a possibilidade de ocorrência do acidente e evitar o colapso progressivo. Evidentemente a primeira opção nem sempre é viável de ser implementada. Claro que em alguns casos podem ser tomadas providências que minimizem a probabilidade de ocorrência do acidente. Por exemplo a construção de obstáculos que evitem o eventual impacto de veículos em paredes do pavimento térreo. Entretanto, a eliminação completa dessas possibilidades seria no mínimo antieconômica. Quanto à segunda opção, trata-se de evitar que o acidente, e a falha local dele advinda, possam se transformarem uma ruína de parte significativa da estrutura pela progressão de colapsos. Nesses casos os projetistas devem estar atentos à identificação dos pontos em que seria mais provável a ocorrência de um acidente e prover a estrutura de alternativas para a transmissão das cargas. Na prática, isso significa retirar uma parede ou um trecho de uma parede e verificar se o acréscimo dos esforços sobre a laje e demais paredes pode ser suportado pela estrutura. É importante ressaltar dois pontos sobre essa questão: os elementos devem ser retirados um de cada vez e os coeficientes de segurança podem ser reduzidos ou mesmo eliminados. Em casos usuais, um pequeno reforço nas armaduras das lajes e a mudança dos detalhes de armadura normalmente empregados são suficientes para evitar o colapso progressivo após um dano acidental. Ocorre que usualmente as armaduras são interrompidas sobre os apoios, no caso as paredes estruturais. Na eventualidade de uma dessas paredes ser destruída, as lajes que concorrem para ela perdem as condições mínimas de continuarem suportando o seu carregamento, provocando, então, a progressão de um colapso que poderia ser apenas localizado. Portanto, é recomendávelque para um edifício de alvenaria, as armaduras do pavimento sejam calculadas para resistir à eventualidade desses acidentes e detalhadas com transpasses sobre todas as paredes. A norma brasileira é omissa quanto a essa questão. Entretanto a BS 5628 - Code of Practice for Structural Use of Masonry - Unreinforced Masonry, Part 16, apresenta uma série de prescrições sobre o assunto em seu item 37. Algumas recomendações são gerais, para edifícios de até quatro pavimentos, e outras são mais específicas, para edificações de cinco ou mais pavimentos. Finalmente é importante salientar que o uso de muito bom senso é imprescindível numa questão que trata de ocorrências tão eventuais. 3.9 CONCLUSÃO 33 ALVENARIA ESTRUTURAL Neste capítulo foi inicialmente apresentada uma breve classificação dos principais sistemas estruturais para edificações em alvenaria. Foram destacadas as cargas verticais que usualmente devem ser consideradas no seu projeto estrutural. Na seqüência, foram discutidos aspectos relativos à interação de paredes interconectadas submetidas a carregamentos verticais, destacando-se a importância da uniformização de cargas entre paredes submetidas a carregamentos desiguais, bem como a importância do processo construtivo na garantia de transmissão de forças entre paredes através de sua interface comum. Foram apresentados alguns procedimentos para a distribuição de cargas verticais: paredes isoladas, grupos isolados de paredes, grupos de paredes com interação e modelagem tridimensional em elementos finitos. O segundo deles é o indicado pelos autores por aliar fatores como economia, segurança e viabilidade prática em uma medida adequada. São incluídos exemplos de distribuição de cargas verticais com aplicação dos três primeiros procedimentos, discutindo-se as suas características principais e implicações nos resultados produzidos. Finalmente são apresentados conceitos básicos relativos à verificação do dano acidental e a importância de se evitar o chamado colapso progressivo. ANÁLISE ESTRUTURAL PARA AÇÕES HORIZONTAIS 4.1 Conceitos básicos Algumas considerações são fundamentais para se entender os procedimentos de distribuição das ações horizontais. Inicialmente, vale a pena discutir uma classificação das estruturas de contraventamento apresentada no CEB-FIP Model Code 1990'. Lá se encontram definidas estruturas contraventadas e estruturas de contraventamento. Isso significa que em um sistema estrutural global existiria um subsistema de contraventamento e um subsistema contraventado. Obviamente, essa é uma classificação que tem por objetivo sistematizar o conhecimento sobre o tema e não descrever o funcionamento real da estrutura da edificação em análise. Na verdade, é impossível separarem-se elementos que contraventam e elementos que são contraventados. O projetista deve ter em mente que se algum elemento for retirado do sistema de contraventamento, por qualquer razão específica, será impossível informar isso à estrutura, a menos que sejam tomadas providências efetivas para seu desligamento. De fato, quando se considera que uma determinada peça não faz parte da estrutura de contraventamento, isso significa que esse elemento deve ter uma participação de pequena importância. Portanto, a sua eliminação não deve provocar alterações significativas nem nos seus esforços nem nos esforços dos elementos vizinhos. Outro ponto interessante é que se supõe que as ações horizontais sejam distribuídas aos painéis de contraventamento pelas lajes dos pavimentos. Para tanto, as lajes são usualmente consideradas como diafragmas rígidos em seu próprio plano, embora sem rigidez transversal. Nesse caso, deve-se tomar muito cuidado para que essa suposição seja respeitada quando da definição do processo construtivo da edificação. Lajes pré-moldadas devem ser utilizadas com restrições, em especial para edifícios acima de cinco ou seis pavimentos, quando as ações horizontais tornam-se mais significativas. Mas, mesmo abaixo desse limite, seria interessante se utilizar lajes pré-moldadas com capa de concreto moldado in loco, onde armaduras podem ser adicionadas em duas direções ortogonais. Somente deste modo se pode admitir que haverá um razoável travamento dos painéis que fazem parte da estrutura de contraventamento. Em todo caso, lajes 34 ALVENARIA ESTRUTURAL moldadas in loco são mais adequadas quando existe a necessidade de se considerar a existência de um diafragma. Por fim, deve-se mencionar outro detalhe importante. Trata-se da simetria da estrutura de contraventamento. Sempre que possível, assimetrias significativas devem ser evitadas. Quando a ação se dá segundo um eixo de simetria da estrutura, as lajes apresentam apenas translações nessa direção. Entretanto, em caso de ações que atuem segundo direções em que essa simetria não se faça presente, além da mencionada translação ocorrem rotações nos pavimentos. Esses 1 Comitê Euro-lnternacional Du Béton (1991).movimentos de corpo rígido são exemplificados esquematicamente pela figura 4.1. O fato é que assimetrias acentuadas, além de tornarem a distribuição das ações muito mais complicada ao nível do projeto, são inconvenientes para o próprio funcionamento da estrutura, gerando maiores tensões nas lajes em si, em seu comportamento de membrana. 4.2 Ações Horizontais a serem consideradas No Brasil, as ações horizontais que devem ser consideradas são a ação dos ventos e o desaprumo. Eventualmente podem ocorrer empuxos desequilibrados do solo. Em caso de áreas sujeitas a abalos sísmicos, a sua consideração também é indispensável. 4.2.1 AÇÃO DOS VENTOS Considera-se que o vento atua sobre as paredes que são normais à sua direção. Estas passam a ação às lajes dos pavimentos, consideradas como diafragmas rígidos, que as distribuem aos painéis de contraventamento, de acordo com a rigidez de cada um. Esse esquema é mostrado pela figura 4.2. 35 ALVENARIA ESTRUTURAL Para consideração da ação do vento, deve-se utilizar a NBR 6123 - Forças Devidas ao Vento em Edificações 2. Dessa forma, obtêm-se forças, ao nível de cada pavimento, que posteriormente serão distribuídas pelos painéis de contraventamento segundo os procedimentos mostrados em itens subseqüentes. 4.2.2 DESAPRUMO Sugere-se que o desaprumo seja considerado tomando-se por base a norma alemã DIN 1053 - Alvenaria: Cálculo e Execução3. Sua prescrição para esse caso é bastante razoável, sendo o ângulo para o desaprumo do eixo da estrutura tomado em função da altura da edificação, conforme o que se apresenta na equação 4.1. Como mencionado, este procedimento é racional pois o ângulo de desaprumo decresce em relação à altura da edificação. Isso é o que se espera no caso de uma edificação, pois a probabilidade de erros de prumo dos pavimentos sempre para o mesmo lado é relativamente pequena. Apenas como exemplo, tomando-se a expressão 4.1 pode-se calcular o ângulo de desaprumo para algumas alturas mais significativas, o que é apresentado na tabela 4.1. É importante mencionar um aspecto prático para a consideração do desaprumo. Através do ângulo <p, pode- se determinar uma ação horizontal equivalente, a ser aplicada ao nível de cada pavimento, através da expressão 4.2. Essas forças, que aparecem esquematizadas na figura 4.3, podem ser simplesmente somadas à ação dos ventos, permitindo que a consideração desse efeito seja feita de forma simples e segura. 36 ALVENARIA ESTRUTURAL 4.2.3 SISMOS A ação de sismos pode também ser considerada através da ação de forças horizontais equivalentes. Para a definição dessas forças deve-se consultar normas específicas, que sejam válidas para o local onde será construída a edificação.4.3 Consideração de abas em painéis de contraventamento Para a correta consideração da rigidez dos painéis de contraventamento é recomendável que se leve em conta a contribuição das abas ou flanges, que são trechos de paredes transversais ligados ao painel. Esses trechos podem ser considerados como solidários aos painéis, alterando de forma significativa a sua rigidez, especialmente o momento de inércia relativo à flexão. A figura 4.4 mostra, para duas situações típicas, como o painel seria ampliado pela consideração das abas. Todos os procedimentos para distribuir as ações horizontais mostrados a seguir podem ser executados com ou sem a consideração das abas. Entretanto, apesar de um pouco mais trabalhosa, essa consideração é bastante interessante. Duas vantagens podem ser destacadas. A primeira diz respeito a uma maior acuidade na determinação da rigidez de cada painel que participa da estrutura de contraventamento. Como os quinhões de carga são distribuídos em função dessas rigidezes, a ausência das abas pode influir negativamente na distribuição das ações, fazendo com que alguns painéis tenham sua rigidez subestimada ou superestimada, causando uma distribuição incorreta dessas ações. Além disso, as abas em geral dobram as inércias dos painéis e, portanto, praticamente dividem por dois as tensões a serem obtidas da análise. Dessa forma, evita-se que apareçam tensões elevadas, inclusive trações, que podem inviabilizar uma estrutura. Essa vantagem é especialmente importante quando se trata da distribuição com a consideração de paredes isoladas, conforme se verá nos resultados apresentados para os exemplos de edifícios que são discutidos no final deste capítulo. As recomendações normalizadas para a consideração dos comprimentos efetivos das abas serão apresentadas posteriormente, junto a outros aspectos relativos às características geométricas dos elementos. Entretanto, é muito importante que se esteja atento à possibilidade de se desenvolverem forças de interação entre a parede e as abas que eventualmente sejam consideradas. Se essas forças não puderem se desenvolver, pela existência de uma junta a prumo, por exemplo, a consideração da aba ou das abas será injustificável. Nesse aspecto o ACI530 - Building Code Requirements for Masonry Structures4 é bastante explícito, citando situações em que essa consideração pode ser feita. Uma delas é quando não existem juntas a prumo na 37 ALVENARIA ESTRUTURAL ligação das abas com a parede. A outra, na eventualidade da existência de juntas a prumo, é quando são tomadas providências adicionais para garantir a existência de forças de interação: utilização de conectores metálicos ou cintas convenientemente armadas e pouco espaçadas para ligar as fiadas. 4.4 Distribuição de ações para contraventamentos simétricos No caso de contraventamentos simétricos em relação à direção em que atua o vento que se deseja analisar, haverá apenas translação dos pavimentos. Nesse caso todas as paredes, em um determinado nível, apresentarão deslocamentos iguais. Isso facilita significativamente a distribuição das ações pelos diversos painéis de contraventamento, conforme ficará claro pelos procedimentos descritos a seguir. 4.4.1 PAREDES ISOLADAS Nesse caso, supõe-se que a existência de uma abertura separe as paredes adjacentes a essa abertura, transformando-as em elementos isolados, verdadeiras vigas engastadas na extremidade inferior e livres na outra. Entre elas existirá apenas a necessidade de que os deslocamentos horizontais sejam os mesmos ao nível de cada pavimento, devido à existência das lajes de concreto e consideradas como diafragmas rígidos. Considerar paredes de forma isolada é um procedimento de distribuição de ações horizontais que pode ser muito simples e eficiente. Sobretudo em casos de ações que atuem segundo eixos de simetria da estrutura, basta que seja feita a compatibilização dos deslocamentos dos diversos painéis para que se possa encontrar o quinhão de carga correspondente a cada um. Inicialmente deve-se lembrar que cada painel assume um quinhão de carga proporcional à sua rigidez, ou, para painéis de rigidez constante ao longo da altura, simplesmente proporcional ao seu momento de inércia. Dessa forma, pode-se definir a soma de todas as inércias, o que é apresentado na equação 4.3. Depois, a rigidez relativa de cada painel será simplesmente: A ação em cada painel pode ser obtida simplesmente multiplicando-se a ação total em um determinado pavimento, Ftot, pelo valor Rl ou seja: Encontradas as ações ao nível de cada pavimento, resta determinar os diagramas de esforços solicitantes, em especial o momento fletor. Então, as tensões devidas a essa ação podem ser encontradas utilizando-se a expressão tradicional da resistência dos materiais: 38 ALVENARIA ESTRUTURAL 4 . 4 . 2 PAREDES COM ABERTURAS Outro procedimento que pode ser utilizado consiste em considerar as alvenarias com aberturas como pórticos, sendo as paredes entendidas como pilares e os lintéis, trechos entre as aberturas, como vigas, conforme se apresenta na figura 4.5. Os painéis assim definidos absorverão esforços também proporcionais às suas rigidezes, de forma semelhante ao que foi descrito anteriormente para o procedimento com paredes isoladas. Aliás, quando se fala na consideração de paredes com suas respectivas aberturas, não se deve esquecer que algumas paredes não possuirão aberturas, comportando-se como simples paredes isoladas. Esse procedimento evidentemente envolve a utilização de recursos computacionais, mesmo que a estrutura de contraventamento seja simétrica. Para o caso de ação segundo um eixo de simetria da estrutura de contraventamento, poderá ser utilizado um programa para pórticos planos, sem quaisquer recursos especiais. Basta que metade dos diversos painéis da estrutura, pórticos ou paredes isoladas, sejam modelados em um esquema chamado de associação plana de painéis (Fig. 4.6) Dois detalhes são importantes para esse caso de associação. O primeiro diz respeito à barra que realiza a ligação entre os painéis ao nível de cada pavimento, simulando a laje de concreto. Evidentemente essa barra deve ser suficientemente rígida para que os deslocamentos de todos os nós de um mesmo nível sejam iguais. Entretanto, essa rigidez não pode ser muito grande, sob pena de impor um mau condicionamento numérico à matriz de rigidez global da estrutura, inviabilizando a obtenção de resultados coerentes. Recomenda-se que os comprimentos dessas barras sejam pequenos, entre 0,5 m e 1 m, e que sua seção transversal seja a de uma faixa de 2 a 3 m da laje de concreto presente na estrutura. Por exemplo, supondo-se que a laje tenha 0,09 m de espessura, as características da seção transversal dessa barra, em especial a área, seriam determinadas considerando-se as dimensões 0,09 x 2,00 m. Além do comprimento e da área da seção, as outras características são pouco importantes, devido ao fato de se supor a barra articulada em seus extremos. Dessa forma o momento de inércia não influi nos resultados a serem obtidos. Apenas se o programa não possuir o recurso de articulação em extremidade de barra deve-se reduzir esse valor de inércia 39 ALVENARIA ESTRUTURAL para que a rigidez à flexão seja desprezível, em conformidade com a hipótese de comportamento de diafragma para a laje. O segundo ponto a ser destacado é a aplicação do carregamento, normalmente metade da ação total do pavimento, apenas no primeiro painel modelado. A distribuição dessa ação se fará automaticamente pela compatibilidade dos deslocamentos, garantindo esforços coerentes em cada elemento da estrutura. Este procedimento costuma produzir resultados de tensões nasparedes significativamente menores que as paredes consideradas isoladamente. Entretanto, deve-se tomar as devidas precauções para que todos os esforços advindos da análise sejam corretamente considerados. Em especial, deve-se verificar a flexão e o cisalhamento dos lintéis, garantindo o funcionamento da estrutura segundo o modelo idealizado. Observe-se que no caso das paredes com aberturas, os "pilares" estão submetidos à flexão composta com força normal. 4.5 Distribuição de ações para contraventamento assimétricos Neste caso, quando se aplica a ação horizontal, o pavimento não apenas translada, mas também apresenta uma rotação. Assim sendo, os deslocamentos dos painéis, mesmo para um mesmo pavimento, não serão os mesmos. Dessa forma existe a necessidade de maiores recursos computacionais para a obtenção de resultados consistentes com o fenômeno. Entretanto, os procedimentos de distribuição basicamente continuam os mesmos e serão tratados a seguir. 4.5.1 PAREDES ISOLADAS Caso o eixo segundo o qual atua a ação não seja de simetria, o procedimento torna-se impraticável de ser executado sem um programa computacional. Nesse caso, conforme já mencionado, a distribuição precisa levar em conta a rotação dos pavimentos, inviabilizando o procedimento simples anteriormente descrito para contraventamentos simétricos. Uma alternativa interessante é utilizar um programa que possua elementos barra tridimensional e um recurso conhecido como nó mestre. Nesse caso, as paredes devem ser discretizadas com um elemento para cada pavimento da estrutura e todos os nós correspondentes a um pavimento devem ser ligados a um nó mestre. O aspecto de um modelo deste tipo é o que se apresenta na fig 4.7. O nó mestre é um recurso computacional através do qual as translações no plano do pavimento dos nós a ele ligados são transferidas em conjunto com a rotação normal a esse plano, como se existisse um segmento totalmente rígido entre o nó considerado e o nó mestre (Fig. 4.8). Assim, acaba-se definindo um plano rígido ao nível do pavimento, simulando-se a existência da laje de concreto. Todos os nós do pavimento perdem os 40 ALVENARIA ESTRUTURAL referidos graus de liberdade de translação, e também a rotação em tomo do eixo normal ao plano, ficando as rigidezes concentradas no nó eleito como mestre do pavimento. Como também os carregamentos são colocados apenas no nó mestre, após a solução do sistema global de equações do edifício, as translações e a rotação obtidas para o nó mestre são utilizadas para o cálculo dos deslocamentos e rotações de cada nó do pavimento. Dessa forma garante-se total compatibilidade das translações e rotação do plano. 4.5.2 PAREDES COM ABERTURAS Para as paredes com aberturas, a situação é semelhante ao caso apresentado no item anterior. Os recursos computacionais necessários serão os mesmos, com a diferença de que existirão barras horizontais para simular os lintéis (Fig. 4.9). Também aqui todos os nós de um pavimento devem estar ligados a um mesmo nó mestre e a ação total do pavimento estará aplicada nesse referido nó mestre, de forma que o plano do pavimento execute movimentos de corpo rígido. Continua sendo imprescindível a verificação dos lintéis quanto ao esforço cortante e momento fletor. 4.6 Considerações de trechos rígidos para os Lintéis Um detalhe importante, quando se menciona a modelagem de pórticos, é a consideração da dimensão finita dos nós ou os chamados trechos rígidos (Fig. 4.10). Ocorre que a colocação de barras nos eixos dos elementos faz com que o comprimento flexível dessas barras seja na verdade maior que o seu comprimento real, e isso tem como resultado painéis mais flexíveis. De fato, pelo menos para os elementos que representam os lintéis, a consideração dos trechos rígidos pode alterar bastante a rigidez de um painel. 41 ALVENARIA ESTRUTURAL Da mesma forma que para o caso das abas, a não-consideração desses comprimentos corretos pode provocar algumas perturbações importantes na distribuição das ações horizontais. Alguns painéis sofrem um acréscimo significativo de sua rigidez e outros permanecem sem alterações sensíveis. Dessa forma, os quinhões de carga são também bastante modificados, sendo que a distribuição pode se afastar da realidade. Para corrigir essas distorções, considerando-se os trechos rígidos, existem basicamente dois procedimentos. O primeiro, muito mais eficiente, exige que o programa computacional utilizado incorpore trechos rígidos como recurso de modelagem. Isso significa que quando se define uma barra pode-se indicar, junto às duas extremidades, o comprimento dos trechos sem deformação.Dessa forma, ao montar a matriz de rigidez do elemento, o programa considera apenas o trecho Figura 4.10 - Nós de dimensões finitas ou trechos rígidos de barras.efetivamente flexível, transferindo as rigidezes através de um procedimento padrão de translação de graus de liberdade. Evidentemente os resultados a serem obtidos também serão correspondentes às extremidades flexíveis, onde a consideração dos esforços realmente tem significado. O segundo procedimento, muito menos eficiente, só deve ser utilizado quando o programa não dispuser do recurso anteriormente citado. Trata-se de colocar nós adicionais e dividir os elementos em dois ou três trechos, conforme existam trechos rígidos junto às extremidades inicial e final. Obviamente, os modelos crescem em dimensão e complexidade, existindo ainda um problema a ser resolvido: que características geométricas adotar para esses trechos que não devem apresentar deformação. Se os valores forem muito elevados, a matriz global da estrutura tende a ser mal condicionada, obtendo-se do processamento valores incoerentes. Entretanto, se as características forem relativamente pequenas, o trecho pode apresentar deformações significativas, não sendo a modelagem representativa. Como indicação geral pode-se sugerir que as características geométricas adotadas sejam correspondentes a uma seção com a largura igual à espessura da parede e altura igual ao pé- direito da edificação. Dessa forma, as deformações serão desprezíveis e a matriz não deve apresentar problemas de condicionamento numérico, sendo obtidos resultados confiáveis. Entretanto, esse procedimento alternativo somente deve ser utilizado quando não se dispuser do recurso descrito para a alternativa anterior. Para finalizar, é importante citar que o CEB-FIP Model Code 1990 menciona uma forma simples e eficiente de se considerar os comprimentos flexíveis e por conseqüência os trechos rígidos das extremidades. Apesar de serem originalmente prescritos para peças de concreto armado, eles podem ser considerados adequados para os elementos de alvenaria estrutural. E esses valores estão mencionados em capítulo posterior, no qual se encontram agrupadas as características geométricas para elementos de alvenaria. 42 ALVENARIA ESTRUTURAL 4.7 Exemplos de modelos de edifícios sob ações horizontais Neste item serão analisados dois edifícios residenciais com sete e dez pavimentos, em alvenaria estrutural de blocos vazados de concreto. Em todos os exemplos, as paredes têm espessura de 14,5 cm. Serão consideradas as ações do vento segundo as direções dos eixos X e Y, indicados nas plantas do pavimento tipo. As paredes, bem como seus respectivos lintéis, são identificados por PX, LX, PY ou LY, conforme sejam paralelos à direção do eixo X ou Y, seguidos por seus números. Para o processamento utilizou-se o sistema em elementos finitos descrito em Ramalho (1990). Para a consideração do pavimento como diafragma rígido, o programa dispõe do recurso do nó mestre. Além disso, existe a possibilidade de se considerar trechos rígidos pela translaçãode rigidezes, sem a necessidade de utilizar barras e nós adicionais. Nos exemplos apresentados optou-se por localizar o nó mestre no centro geométrico dos pavimentos, para facilitar a aplicação das ações. Levando-se em conta a pequena assimetria das estruturas analisadas, o que faz com que as rotações sejam praticamente nulas, somente serão analisados resultados dos painéis paralelos ã direção do vento considerada, apesar dos modelos construídos serem tridimensionais. São comparados os deslocamentos, esforços e tensões normais nas paredes, modelando-se os edifícios de seis maneiras distintas. A descrição dos modelos é feita na tabela 4.2. As ações do vento foram determinadas conforme a NBR 6123. Os comprimentos efetivos das abas foram adotados como sendo de seis vezes a espessura das paredes e os comprimentos dos trechos rígidos foram obtidos com base nas recomendações do CEB-FIP Model Code 1990. Já os lintéis mais solicitados foram dimensionados à flexão e ao cisalhamento de acordo com a NBR 10837 - Cálculo de Alvenaria Estrutural de Blocos Vazados de Concreto. 4.7.1 EXEMPLO 1 Neste item, é analisado o efeito do vento em um edifício de sete pavimentos, com pés direitos de 2,74 m. A planta do pavimento tipo é apresentada na figura 4.11. As dimensões externas do edifício, em planta, são de 18,60 m e 22,20 m, nas direções normais aos eixos X e Y, respectivamente. O módulo de elasticidade adotado foi de 4.480 MPa. As forças devidas ao vento foram determinadas para uma velocidade básica de 45 m/s. O fator topográfico S, e o fator estatístico S3 são iguais a 1.0. A categoria do terreno é IV e a classe da edificação é B. Os coeficientes de arrasto são 0,99 e 1,03, considerando-se o vento nas direções X e V, respectivamente. 43 ALVENARIA ESTRUTURAL 4.7.1.1 DESLOCAMENTOS HORIZONTAIS Na figura 4.12 são apresentadas as curvas de deslocamentos horizontais obtidas nos modelos M1, M2 e M3. Observando-se as referidas curvas, verifica-se que o comportamento do s Associação Brasileira de Normas Técnicas (1989).conjunto é predominantemente de parede isolada, mesmo quando são considerados os lintéis. Já na tabela 4.3, são comparados os deslocamentos no topo para todos os modelos e para o vento nas direções X e Y. 44 ALVENARIA ESTRUTURAL Analisando-se a tabela 4.3, observa-se que na direção X há uma redução maior nos deslocamentos obtidos nos modelos M2 e M3, em relação a M1, indicando um efeito mais pronunciado dos lintéis nesta direção. O mesmo é verificado nos modelos sem abas, quando se comparam M5 e M6 a M4. Ocorre que na direção X há um número maior de aberturas e, assim, as diferenças percentuais entre os deslocamentos dos modelos com lintéis em relação aos modelos sem lintéis são maiores. Quanto aos trechos rígidos, a maior diferença percentual entre M3 e M2 verifica-se na direção Y. Ocorre que nesta direção os trechos rígidos considerados foram maiores. Entretanto, comparando-se M6 e M5, observa- se que o efeito dos trechos rígidos é mais acentuado na direção X, devido à aproximação dos centros de gravidade das seções transversais das paredes e conseqüente aumento dos comprimentos dos trechos enrijecidos. Por fim, deve-se ressaltar que a colocação das abas realmente tem um efeito extremamente importante, reduzindo praticamente à metade os deslocamentos obtidos. 4.7.1.2 MOMENTOS FLETORES Na figura 4.13, são apresentados os diagramas de momentos fletores em algumas paredes nos modelos M1, M2 e M3. Os momentos fletores nos painéis compostos por apenas uma parede nos modelos M2 e M3 foram menores do que no modelo M1, indicando que suas rigidezes, nos modelos com lintéis, perderam importância em relação ao conjunto. Como exemplo, podem ser tomados os diagramas da parede PY10. Nas bases das paredes de painéis com aberturas, os momentos obtidos nos modelos M2 e M3 foram menores do que os de M1, devido à ação dos lintéis. Observa-se ainda que os diagramas de momentos de PX2 e PY8 em M2 e M3 apresentam descontinuidades mais pronunciadas do que os diagramas de PX10. Tal comportamento deve-se ao fato de o lintel da parede PX10 ser bastante flexível diante da rigidez dessa parede. 45 ALVENARIA ESTRUTURAL Os trechos rígidos provocam uma restrição maior às rotações dos nós dos painéis. Logo, os momentos obtidos no modelo M3 são menores que os momentos de M2, como se pode ver nos diagramas apresentados. Nota-se, inclusive, que as descontinuidades do diagrama de momento de PX10 tornam-se um pouco mais destacadas no modelo M3, em relação ao modelo M2, pois a rigidez do lintel cresceu. Convém ressaltar que as observações feitas nos parágrafos anteriores, relativas aos efeitos dos lintéis com e sem trechos rígidos, continuam válidas nos modelos sem as abas, M4, M5 e M6, que deixam de ser aqui apresentados. 4.7.1.3 ESFORÇOS NORMAIS Na figura 4.14 são apresentados os esforços normais nas bases das paredes, onde ocorrem os valores máximos, para as paredes com aberturas. A tendência, para os valores mais significativos, é um discreto aumento para os casos em que são considerados os trechos rígidos. Isso ocorre porque, com os trechos rígidos, os esforços cortantes nas extremidades dos lintéis tendem a ser maiores, aumentando também os esforços normais nas paredes. 46 ALVENARIA ESTRUTURAL 4.7.1.4 TENSÕES NORMAIS Na figura 4.15 são apresentados os gráficos das tensões normais nas paredes PX13, PX14, PY1 e PY2. São comparadas as máximas tensões de tração devidas ao vento, obtidas nos modelos M1, M2 e M3, com as tensões de compressão provenientes das cargas permanentes, as quais são denominadas de tensão V. Fazendo-se a combinação das tensões, conforme os gráficos das figuras acima mencionadas, resulta em valores que indicam a predominância de tensões de tração nessas paredes, em alguns desses modelos. Entretanto, estas tensões estão dentro das faixas admissíveis prescritas pela NBR 10837. Já na tabela 4.4 são apresentadas as tensões devidas ao vento nos modelos com e sem abas e as tensões devidas às cargas verticais, incluindo-se as cargas variáveis. Os resultados mostram o efeito favorável das abas, reduzindo-se as tensões praticamente à metade das que seriam obtidas sem as abas. De fato, nos modelos sem abas em algumas paredes as tensões devidas ao vento são maiores que as tensões provenientes das cargas verticais. Já nas paredes modeladas com abas, as tensões finais são unicamente de compressão. Nos modelos M2 e M3, devido à presença dos lintéis e dos trechos rígidos, verifica-se que as diferenças percentuais entre as tensões nas paredes mais e menos solicitadas são menores do que no modelo M1. 47 ALVENARIA ESTRUTURAL 4.7.1.5 VERIFICAÇÃO DOS LINTÉIS À FLEXÃO E AO CISALHAMENTO Nas tabelas 4.5. e 4.6 são apresentados os momentos fletores e os esforços cortantes máximos nos lintéis mais solicitados. Nos modelos sem abas os momentos e cortantes são em geral maiores, tendo em vista as paredes serem relativamente mais flexíveis. A maior área de aço necessária para combater a flexão foi de 0,93 cm* no lintel LX5 e 0,91 cm 2 para o lintel LY1 no modelo M2. No modelo M5, a área de aço necessária no lintel LX5 foi de 1,11 cm2. Em todos os lintéis, tanto nos modelos com abas como nos modelos sem abas, as tensões de cisalhamento atuantes são menores que as tensões admissíveis especificadas pela NBR 10837 para dimensionamento sem armaduras transversais. 4.7.2 EXEMPLO 2 Neste item será analisado um edifício de dez pavimentos, com pés-direitos de 2,72 m. A planta do pavimento tipo é apresentada na figura 4.16. Suas dimensões externas são 15,90 e 22,05 m nas direções normais a X eY, respectivamente. O módulo de elasticidade adotado foi de 6.400 MPa. 48 ALVENARIA ESTRUTURAL As forças devidas ao vento, ao nível de cada pavimento, são determinadas para uma velocidade básica de 35 m/s. O fator topográfico S, e o fator estatístico S3 são iguais a 1,0. A categoria do terreno é IV e a edificação classe B. Os coeficientes de arrasto são 1,03 e 1,11, respectivamente nas direções X e Y. 4.7.2.1 DESLOCAMENTOS HORIZONTAIS Na figura 4.17 são comparados os deslocamentos horizontais nas direções X e Y, para os modelos com abas. 49 ALVENARIA ESTRUTURAL Também neste caso o comportamento do conjunto foi predominantemente de parede isolada, em ambas as direções e nos três modelos. Na tabela 4.7 são comparados os deslocamentos no topo obtidos nas seis modelagens. Da tabela 4.7. conclui-se que os efeitos dos lintéis sem trechos rígidos foram mais pronunciados na direção X e com trechos rígidos na direção Y, tanto nos modelos com abas como nos modelos sem abas. Também neste exemplo, observa-se o efeito favorável das abas, reduzindo-se os deslocamentos de forma significativa, especialmente na direção Y. 4.7.2.2 MOMENTOS FLETORES Quanto aos momentos fletores, não há nenhuma novidade em relação ao que já foi dito para o exemplo anterior. Então, são apresentados apenas os diagramas de momentos nas paredes PX8 e PY17 (Fig. 4.18), as mais importantes em termos de absorção das ações provenientes do vento. 4 .7.2.3 ESFORÇOS NORMAIS Na figura 4.19 comparam-se os esforços normais nas bases das paredes. O que se pode perceber é que. de forma semelhante ao exemplo anterior, a utilização de trechos rígidos tende a aumentar os esforços normais para as paredes que apresentam valores significativos, em especial a PY16. 50 ALVENARIA ESTRUTURAL 4.7.2.4 TENSÕES NORMAIS Na figura 4.20 são comparadas as máximas tensões de tração devidas ao vento, determinadas nos modelos com abas, com as tensões devidas às cargas verticais permanentes atuantes nas paredes PX9, PY3, PY4 e PY8. Os gráficos apresentados mostram a predominância das tensões de tração em algumas seções dessas paredes, que em geral são inferiores às admissíveis pela NBR 10837. Entretanto, para a parede PX9, no modelo M3, seus valores são mais elevados que os admitidos pela referida norma. No modelo M1, as tensões de tração são predominantes apenas na parede PY8 e nos dois primeiros níveis. Na tabela 4.8 são apresentadas as tensões devidas às cargas verticais, incluindo-se as cargas variáveis, e as tensões devidas ao vento nos modelos com e sem abas. Considerando-se as tensões devidas às cargas variáveis, nos modelos com abas as tensões finais nas paredes são unicamente de compressão, o que não ocorre para os modelos sem abas. 51 ALVENARIA ESTRUTURAL 4.7.2.5 VERIFICAÇÃO DOS LINTÉIS À FLEXÃO E AO CISALHAMENTO Os momentos e cortantes máximos nos lintéis mais solicitados, nos modelos com abas, são apresentados na tabela 4.9. A máxima área de aço necessária foi de 1,40 cm2 no lintel LY2. Neste exemplo, as tensões de cisalhamento atuantes nos lintéis ainda poderiam ser resistidas sem armaduras transversais. 4.7.3 CONCLUSÕES GERAIS PARA OS EXEMPLOS Como se pode observar dos resultados obtidos para os exemplos desenvolvidos, algumas conclusões são bastante claras. Inicialmente é importante destacar que a consideração das abas reduz de forma significativa os valores dos deslocamentos horizontais previstos e ainda os valores das tensões devidas às ações horizontais nas paredes. Sua consideração, portanto, é altamente recomendável. Quanto às paredes com aberturas, obtém-se uma redução bastante significativa das tensões nas paredes, mas os lintéis precisam ser armados para resistir aos esforços de flexão devidos à ação dos ventos. É claro que os lintéis já possuem uma armadura construtiva para servir como vergas, mas a situação se diferencia devido à inversão do sentido do momento no caso dos ventos. Assim, torna-se necessária a colocação de armaduras inferiores e superiores. Ainda quanto às armaduras, uma constatação importante é que os lintéis não ultrapassaram os limites para tensões de cisalhamento da NBR 10837, mesmo quando foram considerados os trechos rígidos. Aliás, as diferenças verificadas pela consideração dos trechos rígidos nos lintéis são significativas, mas não alteram de forma drástica os valores obtidos. Talvez sua maior atuação seja nos deslocamentos horizontais a serem obtidos. Portanto, a recomendação que se pode fazer é que inicialmente o projetista tente considerar as paredes isoladas, não se esquecendo de acrescentar a contribuição das abas. Se com essa consideração estiverem sendo obtidos deslocamentos muito grandes ou as tensões nas paredes estiverem apresentando grandes trações, então se deve pensar no modelo de paredes com aberturas. Não se deve esquecer que a consideração das paredes com aberturas vai resultar na colocação de armaduras adicionais, algumas vezes inclusive para o cisalhamento, nos lintéis. Dessa forma, pode-se dificultar a execução da obra e penalizar a economia a ser obtida com a adoção do sistema construtivo. Assim, deve-se verificar se não é possível evitar tais situações, adotando-se um modelo mais simples e ainda seguro para a análise e o dimensionamento da estrutura. 4.8 Estabilidade global da estrutura de contraventamento 52 ALVENARIA ESTRUTURAL A verificação da estabilidade global de uma estrutura de contraventamento é recomendável para qualquer edificação e indispensável para edifícios em que, em razão do número de pavimentos ou outro motivo qualquer, haja suspeita sobre sua condição de deslocabilidade. Por exemplo, para os casos de edifícios nos quais a grande maioria das paredes estruturais esteja orientada segundo uma só direção, pode ocorrer que a deslocabilidade seja inaceitável para a outra direção, mesmo que a edificação apresente poucos pavimentos. Dessa forma, é importante estar atento aos problemas de segunda ordem, principalmente quando se utiliza o sistema estrutural chamado de "paredes transversais", mencionado anteriormente. 4.8.1 CONCEITOS BÁSICOS Imagine-se uma estrutura submetida simultaneamente a uma carga vertical e uma ação horizontal. É fácil concluir-se que haverá um acréscimo do momento fletor inicial, chamado de momento de primeira ordem, representado pelas cargas verticais atuando nos deslocamentos produzidos pelas ações horizontais, conforme se mostra na figura 4.21. Esse acréscimo, chamado momento de segunda ordem, somente não ocorreria se a estrutura pudesse ser considerada indeslocável, o que é impossível quando se considera que qualquer material tem sua flexibilidade. Esse é o caso dos edifícios em geral, e de alvenaria em particular, que se encontram submetidos a ações verticais e horizontais. Essas estruturas devem, portanto, apresentar acréscimos de esforços de segunda ordem, tanto maiores quanto maior a sua deslocabilidade. 4.8.2 CLASSIFICAÇÃO DAS ESTRUTURAS DE CONTRAVENTAMENTO Torna-se aqui importante mencionar um conceito discutido no CEB-FIP Model Code 1990 para as estruturas de contraventamento. Trata-se de uma classificação quanto à deslocabilidade da estrutura considerada, que pode ser classificada em deslocável ou indeslocável. Obviamente não existem estruturas indeslocáveis, do ponto de vista rigoroso, posto que submetidas a determinada ação todas apresentariam algum deslocamento. Mas a classificação indeslocável pode ser adotada quando os acréscimos de segunda ordem representam menos de 10% dos esforços de primeira ordem. Trata-se, na verdade, de uma simplificação, que consiste em se chamar uma estrutura pouco deslocávelde indeslocável. 53 ALVENARIA ESTRUTURAL Entretanto, essa classificação é muito importante, pois, como se verá a seguir, é tomada como base para se decidir se é ou não necessário que a análise de uma determinada estrutura seja feita em teoria de segunda ordem. 4.8.3 AVALIAÇÃO DOS ACRÉSCIMOS DE SEGUNDA ORDEM A avaliação do acréscimo de esforços devido à consideração da segunda ordem é sempre um processo iterativo. Para tanto existem processos, que podem ser chamados de rigorosos, em que são feitas alterações na matriz de rigidez e no vetor de cargas, dentro de um programa computacional de pórtico plano ou tridimensional. Podem ainda ser utilizados processos simplificados, como, por exemplo, o chamado processo P-O. No caso dos processos rigorosos, é necessário que se tenha acesso a um programa computacional que permita a consideração da segunda ordem, ou não-linearidade geométrica. Esses programas não têm ainda uma utilização disseminada, pelo menos para análises usuais. Exigem uma entrada de dados normalmente mais complexa e apresenta um tempo de processamento relativamente elevado, motivos pelos quais têm utilização mais restrita a casos especiais. Já no processo P-D a análise é feita com a utilização de um programa de pórtico convencional, ou seja, sem a consideração da não-linearidade geométrica. Os dados são mais simples e o tempo de processamento de cada etapa muito menor. Conforme mencionado, trata-se de um processo iterativo. Na primeira etapa a estrutura é analisada com a atuação simultânea das ações verticais e horizontais, obtendo-se os deslocamentos dos pontos nodais. Através desses deslocamentos são calculados acréscimos de momento fletor ao longo da altura do edifício e esses acréscimos são transformados, por equilíbrio, em forças horizontais equivalentes que são somadas às ações originais. A estrutura é novamente processada e com a obtenção dos novos deslocamentos são calculados novos acréscimos de esforços e ações horizontais. O processo continua até que os acréscimos obtidos para deslocamentos, esforços ou ações sejamsuficientemente pequenos de modo que se possa considerar que o procedimento convergiu ao seu resultado final. Assim sendo, os esforços obtidos no último processamento já estarão computando os acréscimos devidos à consideração da segunda ordem. O processo P-B apresenta resultados muito satisfatórios e seu desenvolvimento pode ser automatizado, sendo que o tempo total de processamento não deve ultrapassar o tempo de solução de um programa que efetivamente considere a não-linearidade geométrica. Como os dados de entrada e os recursos computacionais utilizados são mais simples, pode-se considerar que ele se qualifica como uma alternativa bastante interessante. 4.8.4 DESLOCABILIDADE DAS ESTRUTURAS POR PROCESSOS SIMPLIFICADOS Foi mencionado que para estruturas com acréscimos de esforços devidos à consideração da segunda ordem menores que 10% dos de primeira ordem, a estrutura pode ser considerada indeslocável. Nesse caso não haverá necessidade de a análise ser realizada em teoria de segunda ordem, podendo ser utilizado um procedimento convencional em primeira ordem, sem a necessidade de diversas iterações. É, sem dúvida, o procedimento mais confortável. 54 ALVENARIA ESTRUTURAL Entretanto, é necessário saber se os referidos acréscimos realmente se limitam aos mencionados 10% para a estrutura em análise. Nesse caso pode-se lançar mão de procedimentos simplificados que indiquem se uma estrutura pode ou não ser considerada indeslocável. O próprio CEB-FIP Model Code 1990 apresenta uma solução para o mencionado problema: o parâmetro a. Outro procedimento, que se pode considerar mais adequado, é o parâmetro Ɣz. A seguir esses parâmetros são discutidos com maiores detalhes. 4.8.4.1 PARÂMETRO α Considera-se que o acréscimo de esforços de segunda ordem será menor que 10% se o referido parâmetro for: Quando o parâmetro o. exceder os valores apresentados, o projetista deve necessariamente providenciar a análise do edifício em teoria de segunda ordem, de forma a avaliar corretamente o acréscimo nos esforços. 4.8.4.2 PARÂMETRO Ɣz O outro procedimento, ainda mais interessante, é o chamado parâmetro Ɣz. Trata-se de um estimador do acréscimo de esforços devidos à consideração da segunda ordem e por esse motivo é mais adequado que o parâmetro a anteriormente citado. Com a sua utilização consegue-se estimar o efeito de segunda ordem apenas com o resultado do cálculo da estrutura submetida às ações verticais e horizontais. É como se estimarem os valores de convergência de um processo P-D apenas com os resultados da primeira etapa. Sua expressão é a seguinte: 55 ALVENARIA ESTRUTURAL Dessa forma, calculado o parâmetro pode-se avaliar a deslocabilidade da estrutura. Analogamente ao que já foi mencionado, pode-se estabelecer, considerando-se o limite de 10%: Aqui a vantagem do Ɣz torna-se evidente. Em especial porque o parâmetro é um bom estimador do acréscimo de segunda ordem até, pelo menos, o valor 1,20. Assim sendo, pode-se, obtido um valor entre 1,10 e 1,20, utilizar o próprio parâmetro como multiplicador de esforços de primeira ordem para a obtenção dos de segunda ordem, ou seja: 4.9 CONCLUSÃO O presente capítulo apresentou conceitos relativos à análise de estruturas de edificações em alvenaria submetidas a ações horizontais. Inicialmente foram discutidas as ações usualmente consideradas, com destaque para as devidas ao vento e ao desaprumo. Foi enfatizada a importância de consideração das abas ou flanges na composição das seções transversais dos painéis de contraventamento, devido à sua significativa contribuição na rigidez e na resistência desses painéis. Foram discutidos procedimentos para a distribuição de ações horizontais para contraventamentos simétricos e assimétricos, analisando-se o processo das paredes isoladas e o de paredes com aberturas, bem como as suas implicações nas duas referidas situações. No caso das paredes com aberturas foi introduzido o conceito de nós de dimensões finitas, como elemento de enrijecimento dos painéis. Foram ainda discutidos os recursos de modelagem encontrados em alguns programas computacionais, que permitem um aumento da eficiência da análise, tanto sob o ponto de vista da representatividade da estrutura como na elaboração e no processamento dos modelos numéricos. Foram introduzidos dois exemplos de modelagem de edifícios submetidos a ações horizontais, comparando-se os resultados obtidos com os procedimentos alternativos apresentados e as suas Implicações no desenvolvimento do projeto estrutural. Por fim foi discutida a questão da estabilidade global da estrutura de contraventamento, apresentando dois procedimentos simplificados para a avaliação da relevância dos efeitos de segunda ordem. Destaca-se a superioridade do parâmetro Ɣz sobre o parâmetro a, devido à possibilidade que aquele possui de apresentar uma estimativa para os efeitos de segunda ordem. 56 ALVENARIA ESTRUTURAL PRINCIPAIS PARÂMETROS PARA O DIMENSIONAMENTO DE ELEMENTOS 5.1 Tensões admissíveis e estados limites A segurança de uma estrutura pode ser entendida como a capacidade de suportar as diversas ações previstas durante a sua vida útil, garantida sua possibilidade de funcionar conforme sua destinação. Todas as teorias que permitem introduzir o conceito de segurança baseiam-se na hipótese de que o comportamento estrutural é determinístico. Isto significa que para um mesmo corpo, sob as mesmas condições de vinculação, a repetição de uma solicitação ao longo do tempo produziria as mesmas respostas estruturais, ou seja, as mesmas deformações, tensões, esforçose deslocamentos. O método das tensões admissíveis introduz a segurança no projeto estrutural mediante o estabelecimento de um coeficiente de segurança interno Ɣi. É imposta a condição de que as maiores tensões na estrutura não ultrapassem valores admissíveis, estabelecidos de forma empírica, a partir da divisão de tensões de ruptura ou de escoamento pelo coeficiente Ɣi. A aplicação desse método pode ser resumida por: Este método tem algumas deficiências que podem ser consideradas sérias: a) impossibilidade de se interpretar o coeficiente yt como um coeficiente externo: b) preocupação exclusiva com a relação serviço-ruptura; c) adequação apenas para o comportamento linear. Também se pode conceituar a segurança de uma estrutura com a introdução da idéia de estado limite. Segura é a estrutura que, durante a sua vida útil, não atinge nenhum estado limite. Esses estados limites podem ser definidos como: a) estado limite último (ELU); b) estado limite de serviço (ELS). O estado limite último corresponde ao esgotamento da capacidade portante da estrutura e pode ser ocasionado por diversos fatores: perda de estabilidade do equilíbrio, ruptura, colapso, deterioração por fadiga ou excesso de deformação plástica que inviabilize a sua utilização como estrutura. Já o estado limite de serviço está relacionado a exigências funcionais ou de durabilidade da estrutura e pode ser causado por excesso de deslocamentos, deformações, danos ou vibrações. 57 ALVENARIA ESTRUTURAL A segurança é introduzida mediante a verificação dos estados limites de serviço e através de coeficientes de segurança externos Ɣe relativos aos estados limites últimos. O estabelecimento dos coeficientes Ɣe é feito de maneira empírica. A vantagem do método dos estados limites sobre o das tensões admissíveis é que ele permite a definição de um critério direto para resistência e para as condições de serviço da estrutura. Atualmente, um aperfeiçoamento verificado para o método dos estados limites consiste em se considerar que os parâmetros geométricos, mecânicos e de solicitação das estruturas não são determinísticos, sendo representados por variáveis aleatórias contínuas. A inclusão de conceitos probabilísticos permite considerar incertezas relativas ao carregamento, à resistência dos materiais e à representatividade do modelo de análise empregado. O dimensionamento com base nos estados limites pode ser resumido da seguinte maneira: Geralmente os valores característicos são escolhidos de modo que 95% das resistências verificadas na estrutura excedam Rk e 95% das ações aplicadas sejam menores que Fk. Assim, a probabilidade de ruína é dada por: É necessário determinar os valores dos coeficientes Ɣm e Ɣf compatíveis com o valor de "p" pré-fixado. Para que isso seja feito, além de conceitos estatísticos, são utilizados também valores empíricos baseados na experiência de construção acumulada e em ensaios de laboratório. A norma brasileira NBR 10837 - Cálculo de Alvenaria Estrutural de Blocos Vazados de Concreto1, assim como a norma americana ACI 530 - Building Code Requirements for Masonry Structures, adotam o método das tensões admissíveis para a introdução da segurança estrutural. Entretanto, a BS 5628 - Code of Practice for Use of Masonry já adota os estados limites. De fato, seria interessante se a norma brasileira adotasse o conceito dos estados limites. Além de ser mais adequado, por permitir melhor conhecimento da segurança da estrutura, esse é o conceito que serve de base para as demais normas existentes no País. até mesmo para algumas que complementam o próprio emprego da alvenaria como sistema estrutural. Por exemplo, a NBR 6136 - Blocos Vazados de Concreto Simples para Alvenaria Estrutural4 fala explicitamente em resistência característica do bloco de concreto. Além disso, é impossível a utilização da NBR 8681 - Ações e Segurança nas Estruturas* para edificações de alvenaria estrutural. 58 ALVENARIA ESTRUTURAL 5.2 Resistência à compressão da alvenaria A resistência à compressão é, obviamente, o parâmetro de resistência mais importante para a alvenaria estrutural. Dessa forma, não é de se estranhar que muitos trabalhos tenham sido desenvolvidos para quantificá-la. Aqui, procurar-se-á apresentar um panorama geral sobre esse aspecto de grande importância. 5 .2.1 INFLUÊNCIA DOS COMPONENTES NA RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO A seguir, se faz um breve resumo sobre a influência de cada componente sobre a resistência à compressão da alvenaria. O principal objetivo é dar noções qualitativas, ou até mesmo quantitativas, sobre a maneira como cada um desses componentes atua no sentido de aumentar ou reduzir a referida resistência. 5 .2.1.1 BLOCOS Dentre os fatores que exercem influência na resistência à compressão dos painéis de parede, a resistência dos blocos tem caráter predominante. De forma geral, quanto mais resistente o bloco, mais resistente será a alvenaria. Existe um conceito muito importante quando se trata da influência da resistência dos blocos na resistência à compressão das paredes. É a "eficiência", ou seja, a relação entre a resistência da parede e a resistência do bloco que a compõe. A relação 5.4 exprime matematicamente esse conceito. A eficiência costuma variar bastante, dependendo da sua forma, material e até mesmo da resistência dos blocos. Normalmente, quanto mais resistente for o bloco menor será a eficiência e vice-versa. Também se pode considerar que usualmente os blocos cerâmicos apresentem uma eficiência menor que a dos blocos de concreto. Além disso, características dos outros componentes podem influir na eficiência parede-bloco. Considerando-se os casos mais comuns no Brasil: paredes executadas com blocos vazados de concreto ou cerâmicos (resistência entre 4,5 e 20 MPa), não-grauteadas e com argamassas usuais, pode-se estimar que a eficiência apresente os valores que constam da tabela 5.1. 59 ALVENARIA ESTRUTURAL 5.2.1.2 ARGAMASSA É interessante se destacar pelo menos dois fatores quando se trata da influência da argamassa na resistência à compressão das paredes: a espessura da junta horizontal e a resistência à compressão da argamassa. Quanto ao primeiro aspecto, está bem estabelecido que a espessura da junta precisa se situar dentro de limites muito estreitos. Ela não pode ser muito pequena, pois isso poderia permitir que, por falhas na execução, pontos das superfícies dos blocos acabassem se tocando. Obviamente, essa situação provocaria uma concentração de tensões que prejudicaria a resistência da parede. Entretanto, desde um trabalho pioneiro de Francis (1971) foi comprovado que a resistência da parede decresce com o aumento da espessura da junta horizontal. Isso se explica porque com o aumento da espessura diminui o confinamento da argamassa. E é exatamente esse confinamento que torna a argamassa pouco suscetível à ruptura, mesmo que a sua resistência à compressão, medida em corpos-de-prova cilíndricos, seja relativamente baixa. Assim, segundo Sahlin6 apud Camacho (1995), a cada aumento de 0,3 cm na espessura da argamassa há uma redução de 15% na resistência da parede. Numa concordância implícita com esses fatos apresentados, a NBR 10837 especifica que a espessura da junta horizontal entre blocos deve ser igual a 1 cm, a menos que se justifique tecnicamente a adoção de um outro valor. Quanto à resistência à compressão da argamassa, conforme já se afirmou em item anterior, esse parâmetro não influi de forma tão significativa na resistência à compressão da parede. Apenas se a resistência da argamassa for menor que 30% ou 40% da resistência do bloco é que essa influência pode ser considerada importante. Por exemplo, segundo osresultados obtidos por Gomes (1983), para paredes construídas com blocos de 7,5 MPa, variando a resistência da argamassa em torno de 135%, verificou-se que o acréscimo de resistência para as paredes foi de apenas 11,5%. A própria BS 5628 corrobora esse fato quando indica que, por exemplo, para blocos de 7,0 MPa, ao se aumentar a resistência da argamassa de 6,5 MPa para 16,6 MPa, a resistência à compressão da parede cresce apenas 6%. Na verdade, argamassas exageradamente resistentes podem apresentar até mesmo um efeito contrário ao desejado, reduzindo a resistência final da parede. Dessa forma parece interessante a recomendação de Gomes (1983), que concluiu que a argamassa de assentamento deve ter como resistência um valor entre 70% e 100% da própria resistência do bloco. Pode-se até mesmo afirmar que para argamassas com resistências em torno de 50% da resistência dos blocos dificilmente haverá uma queda significativa na resistência da parede. 5.2.1.3 GRAUTE A influência do graute na resistência das paredes deve ser computada levando-se em conta duas situações distintas. Quando o grauteamento ocorre em blocos vazados de concreto, esse preenchimento, realizado com um material muito semelhante ao material do próprio bloco, pode ser avaliado de forma relativamente simples. A utilização do graute leva a um simples aumento da área líquida da unidade, podendo o acréscimo de capacidade portante da parede ser quantificado sem grandes complicações. Trata-se, na verdade, de se promover um aumento na resistência da unidade, proporcional à área grauteada, obtendo-se por conseqüência um aumento da resistência da parede, sempre se considerando a já mencionada eficiência bloco-parede. 60 ALVENARIA ESTRUTURAL Por exemplo, tomando-se um bloco de concreto de resistência na área bruta igual a 6 MPa, com 50% de vazios, e realizando-se o preenchimento de seus furos com um graute de resistência igual à do material que compõe o bloco, ou seja 12 MPa, obtém-se na verdade um bloco com resistência à compressão na área bruta 12 MPa. Dessa forma, tomando-se 0,5 como o valor de eficiência bloco parede-parede, pode-se estimar que a resistência da parede seja da ordem de 6 MPa, sempre em relação à área bruta. Caso o grauteamento não fosse utilizado, a resistência estimada para a parede seria da ordem de 3 a 3,5 MPa, dependendo do valor da eficiência bloco-parede que fosse tomado. Já para os blocos cerâmicos, essa avaliação torna-se mais complexa. Por se tratarem de materiais diferentes, ainda que de mesma resistência, fica mais difícil prever com clareza a resistência final do conjunto bloco- graute. O comportamento do conjunto dos dois materiais poderia ser influenciado negativamente, por exemplo, pelas diferentes características elásticas de cada um. Entretanto, Garcia (2000), que realizou ensaios em dez paredes grauteadas, concluiu que a situação não deve ser muito diferente daquela que se observa para os blocos de concreto. Foram utilizados blocos cerâmicos com resistência aproximada de 10 MPa e definidos dois esquemas de grauteamento, com cinco paredes rompidas para cada caso. Os resultados obtidos mostram que considerar o graute como uma redução da área de vazios dos blocos, conforme o que se sugeriu para os blocos de concreto, não parece muito distante da realidade. Mas, como os exemplares ensaiados são poucos e seriam necessários estudos complementares para corroborar esses resultados iniciais, é importante que essa consideração seja feita com cuidado, de modo a se evitar uma redução significativa do nível de segurança. 5.2.1.4 ARMADURAS De fato, o aço nas estruturas de alvenaria acaba tendo sua capacidade pouco aproveitada na resistência à compressão, pois a tensão usualmente fica limitada a valores bem abaixo da tensão de escoamento do material. A imposição de limites relativamente baixos para as tensões no aço é explicada pela necessidade de se evitar uma fissuração excessiva, bem como garantir a aderência entre as barras de aço e o graute que as envolve. Entretanto, essa limitação leva a uma contribuição menor do que aquela que se poderia esperar, especialmente porque a resistência à compressão dos outros componentes da alvenaria é relativamente elevada. Assim sendo, usualmente não é interessante do ponto de vista da relação custo-benefício se utilizar esse recurso para aumentar a resistência à compressão. Na verdade a alvenaria armada parece mais adequada quando se necessita conferir ductilidade à estrutura, aumentar o limite normalizado para a esbeltez de paredes ou quando se necessita de acréscimo muito localizado de resistência. 5.2.2 AVALIAÇÃO DA RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO DAS PAREDES Alguns procedimentos podem ser utilizados para uma avaliação da resistência à compressão das paredes de alvenaria. A seguir são apresentados três deles, sendo que são discutidas as principais vantagens e desvantagens de cada um. 5.2.2.1 ESTIMATIVA ATRAVÉS DA RESISTÊNCIA DE PRISMAS 61 ALVENARIA ESTRUTURAL Prismas são elementos obtidos pela superposição de um certo número de blocos, normalmente dois ou três, unidos por junta de argamassa e destinados ao ensaio de compressão axial, conforme se apresenta na figura 5.1. A estimativa da resistência de paredes através do ensaio de prismas é o procedimento adotado pela NBR 10837, sendo também permitido pelo ACI 530. É extremamente interessante e representa um avanço significativo do ponto de vista de se obter um método de dimensionamento válido para praticamente qualquer condição de unidade, argamassa ou mesmo graute. Obviamente, é importante que os prismas sejam executados nas mesmas condições verificadas na construção.Devem ser mantidos materiais e mão-de-obra, para que se possa ter resultados representativos do que realmente ocorre durante a execução. Um outro ponto positivo desse procedimento é que os ensaios podem ser realizados com facilidade por qualquer laboratório minimamente equipado e que realize controles usuais para estruturas de concreto armado. Até mesmo através de uma prensa manual, instalada no próprio canteiro de obras, pode-se controlar a resistência ã compressão de prismas, obtendo-se um procedimento de verificação simples, barato e eficiente. A NBR 10837, em seu item 5.3.1, é enfática na especificação do prisma como resistência básica da alvenaria estrutural de blocos vazados de concreto, e podem-se reproduzir as suas palavras textuais "As tensões admissíveis para a alvenaria não-armada e para a alvenaria armada devem ser baseadas na resistência dos prismas (fp) aos 28 dias ou na idade na qual a estrutura está submetida ao carregamento total. Nas plantas submetidas à aprovação ou usadas na obra, deve constar claramente a resistência (fp) na idade em que todas as partes das estruturas foram projetadas". E é importante ressaltar que, apesar da NBR 10837 ser uma norma voltada especificamente aos blocos vazados de concreto, não há nenhuma incoerência conceituai em estender esse procedimento a unidades de outros tipos ou material. Aqui também se pode utilizar um conceito que já foi apresentado no item 5.2.1.1. Trata-se da "eficiência", neste caso que se analisa uma relação entre a resistência do prisma e do bloco que o compõe. Essa relação pode ser escrita matematicamente como na equação 5.5. 62 ALVENARIA ESTRUTURAL Normalmente esses valores da eficiência prisma-bloco, para a prática corrente no Brasil, variam de 0,5 a 0,9 para os blocos de concreto e de 0,3 a 0,6 no caso dos blocos cerâmicos. Da mesma forma que no item 5.4.1.1, a eficiência tende a ser menor quando se aumenta a resistência do bloco e vice-versa. Também semelhante é o comportamento em relação ao material que compõe os blocos de concretotendem a apresentar uma eficiência significativamente maior que os cerâmicos. Existe ainda uma terceira relação entre resistências que é de grande importância e que não deixa de ser também uma eficiência: a relação entre a resistência da parede e do prisma. É uma relação muito importante porque, mesmo sendo o dimensionamento e o controle feitos com base na resistência do prisma, o que interessa em última instância é a resistência da parede. E a resistência do prisma é sempre maior que a da parede, porque com o aumento do número de juntas que se verifica na parede, inclusive com a adição de juntas verticais que não existem no prisma, a resistência do painel tende a cair. Tomando-se um amplo conjunto de ensaios já realizados no Brasil, verifica-se que essa relação de resistência parede-prisma situa-se por volta de 0,7 tanto para blocos de concreto como para blocos cerâmicos. Esse número é corroborado implicitamente até mesmo pela NBR 10837, quando são observadas as expressões para dimensionamento com base na resistência de prisma ou de parede. Por fim, resta mencionar que a norma brasileira que regulamenta o método de ensaio dos prismas é a NBR 8215 - Prismas de Blocos Vazados de Concreto Simples para Alvenaria Estrutural - Preparo e Ensaio à Compressão. 5 .2.2.2 ESTIMATIVA ATRAVÉS DOS COMPONENTES A estimativa da resistência à compressão das paredes através dos componentes é um procedimento muito bom, mas que apresenta um inconveniente sério para um país de dimensões continentais e com grandes diferenças regionais. Seria preciso uma boa padronização desses componentes para que o número de ensaios necessários a essa estimativa fosse razoável. Em caso contrário, a caracterização do material demandaria um número de ensaios que acabaria praticamente inviabilizando o próprio procedimento. A estimativa da resistência através dos componentes é o principal método utilizado pela BS 5628, que apresenta tabelas para a resistência característica à compressão das paredes em função do tipo de argamassa e da resistência das unidades. Por exemplo, se forem tomados os blocos vazados com relação entre a altura e a menor dimensão na horizontal entre 2,0 e 4,0, os valores da resistência característica serão os da tabela 5.2. É interessante ressaltar que a BS 5628 não se refere a prismas. Quando se tratar de uma alvenaria especial, a resistência à compressão deve ser obtida de ensaios de paredes com pelo menos 1,20 m de comprimento por 2,40 m de altura. Também o ACI 530 se utiliza deste procedimento como uma das alternativas para o cálculo da resistência à compressão. Podem-se apresentar, por exemplo, os valores especificados para unidades de concreto pelo ACI 530.1 Specifications for Masonry Structures, organizados na tabela 5.3. A diferença em relação à BS 5628 é que o ACI 530 menciona a resistência de prisma como a alternativa para a estimativa da resistência à compressão da alvenaria, num procedimento semelhante ao admitido pela NBR 10837. 63 ALVENARIA ESTRUTURAL 5.2.2.3 MODELOS TEÓRICOS DE RUPTURA Vários pesquisadores elaboraram formulações matemáticas para a determinação teórica de um modelo de ruptura de paredes em alvenaria. A seguir, serão comentadas as contribuições dadas por alguns deles, que trabalharam com prismas moldados com tijolos e com blocos vazados preenchidos com graute. Segundo Gallegos (1989), os primeiros estudos que se tem conhecimento foram realizados por Paul Haller em 1959, baseados em uma análise elástica do sistema bloco-argamassa. Entretanto, chegou-se a resultados absurdos, em que as resistências dos prismas resultavam maiores que as resistências dos blocos. Posteriormente, Hilsdorf apud Muller (1984) e Francis et al. (1971) elaboraram modelos matemáticos também considerando o comportamento elástico dos componentes tijolo e argamassa. Francis et al. desenvolveram um modelo teórico para a ruptura de prismas de alvenaria submetidos a esforços de compressão axial. Supuseram a ocorrência de tensões de tração nos tijolos provocada pela excessiva deformação da argamassa, conforme a figura 5.2. Isso é explicado pela existência de diferentes módulos de elasticidade dos materiais usados para a execução dos prismas. Francis et al se basearam na deformação unitária dos materiais para fundamentar o seu modelo, enquanto que Hilsdorf baseou-se nos esforços resistidos pelos materiais. Entretanto, adotaram as mesmas hipóteses para as formulações das suas teorias: a) as unidades estruturais eram constituídas por tijolos sólidos; b) relação de Coulomb entre o valor da resistência à tração biaxial e à resistência à compressão uniaxial, definindo a envoltória de ruptura do tijolo submetido ao carregamento triaxial; c) esforços de tração laterais uniformes na altura da unidade; d) esforços de tração laterais iguais nas direções x e z ; 64 ALVENARIA ESTRUTURAL e) aderência perfeita entre a argamassa e o tijolo. No comportamento do prisma, ao ser submetido a um estado de compressão axial, é suposto que a argamassa, por ter módulo de elasticidade menor, tende a deformar-se mais do que o bloco, submetendo-o a tensões de tração. Quando essas tensões ultrapassam a resistência à tração dos blocos, ocorre a fissuração da peça e sua conseqüente ruptura. No modelo de Francis et al, os pesquisadores deduziram um equacionamento puramente teórico envolvendo, além das resistências individuais dos componentes, as características reológicas e mecânicas referentes a cada um. O modelo foi estudado para prismas e foram admitidos os equilíbrios de forças de tração lateral nas unidades e de compressão lateral nas argamassas, ou seja, a compatibilidade das deformações laterais nas unidades e na junta de argamassa. Outros autores, entretanto, verificaram a existência de grandes variações entre os valores teóricos obtidos com essa formulação e os experimentais. Essas variações, segundo Hendry (1981), ocorreram devido a aproximações feitas para a obtenção de determinados parâmetros. Ele também critica a utilização desse modelo para a obtenção da tensão de ruptura de paredes com blocos amarrados, uma vez que toda a sua formulação foi feita para prismas. Segundo Aly (1991), outros pesquisadores continuaram o estudo sobre os modelos de ruptura já apresentados e os aperfeiçoaram. No decorrer das pesquisas, alguns autores como Hamid e Drysdale (1979) começaram a estender os estudos para prismas de blocos vazados de concreto preenchidos com graute. Para isso, novas considerações tiveram que ser formuladas. Através de ensaios laboratoriais, Hamid e Drysdale (1979) verificaram que a ruína de prismas de blocos de concreto grauteados, submetidos à compressão axial, inicia-se com o aparecimento de fissuras verticais nos blocos. Essas fissuras se estendem com o aumento do carregamento, provocando, muitas vezes, o descolamento das suas faces e o rompimento do graute. O aparecimento de fissuras nos blocos ocorre principalmente devido à maior deformação lateral do graute e da argamassa em relação à do bloco, à medida que se aumenta o carregamento, provocando, assim, a sua ruptura prematura. Assim, os autores se basearam nas seguintes hipóteses para o desenvolvimento das suas teorias sobre o comportamento dos blocos grauteados submetidos a esforços de compressão: a) aderência perfeita nas interfaces bloco-argamassa-graute; 65 ALVENARIA ESTRUTURAL b) distribuição proporcional de esforços verticais entre o bloco, a argamassa e o graute, em função do módulo de elasticidade de cada material; c) distribuição uniforme das tensões laterais para cada um dos materiais ao longo da altura; d) teoria de ruptura de Mohr (envoltória de Coulomb) adotada para expressar a ruptura do blocode concreto submetido a um estado biaxial de tensão; e) o graute é suposto como tendo as mesmas características de um concreto convencional sob um estado de compressão triaxial. Dois modelos de ruína foram propostos, dependendo do componente que primeiro atinge a sua tensão de ruptura sem confinamento: o graute ou o conjunto bloco-argamassa. Quando o graute atinge primeiro a sua capacidade de resistência a esforços de compressão não confinada, grande expansão lateral ocorre devido a deformações inelásticas provocadas pela sua microfissuração. As faces do bloco tendem a impedir essa deformação e a confiná-lo, resultando em um estado de tensões de tração. Essas tensões associadas às tensões de tração provocadas pela deformação da argamassa provocam a ruptura prematura das faces dos blocos, conforme figura 5.3. Quando as faces dos blocos atingem a sua tensão máxima à compressão antes do graute atingir a sua tensão de compressão não confinada, o graute se encontra submetido a deformações elásticas. Portanto, as faces dos blocos irão apenas restringir as deformações da argamassa e a tensão de ruptura apresenta outro valor. Nesse caso, a resistência da parede será controlada tanto pela ruptura das faces dos blocos quanto pela resistência do graute. Para graute muito resistente ou com grandes seções transversais, é possível que mesmo após a ruptura dos blocos o conjunto permaneça resistindo a cargas mais elevadas. De fato, nenhum dos métodos teóricos apresentados tem condições de prever com razoável segurança a resistência de paredes à compressão. Isso pôde ser comprovado por Garcia (2000). Assim, o objetivo de mencioná-los aqui é muito mais discutir as suas hipóteses e os seus mecanismos de ruptura, esses sim bastante interessantes, do que aproveitar as expressões que foram deduzidas. Aliás, essas expressões nem são aqui apresentadas principalmente pelas razões expostas acima, podendo ser encontradas com detalhes em Garcia (2000). 66 ALVENARIA ESTRUTURAL 5.3 Características geométricas para elementos de alvenaria Para que se possa discutir as características geométricas de elementos de alvenaria, é importante se apresentarem os conceitos de parede e pilar. Segundo a NBR 10837, a parede é um elemento laminar vertical, apoiado de modo contínuo em toda sua base, com comprimento maior que cinco vezes a sua espessura. Já o pilar, ainda segundo a NBR 10837, é um elemento estrutural semelhante à parede, mas no qual o comprimento é menor que cinco vezes a sua espessura. Em caso de seções compostas por retângulos (L, T ou Z), a limitação é para cada ramo. A figura 5.4 ajuda a entender a diferença citada. A diferenciação desses elementos resistentes em paredes e pilares é importante não apenas para as características geométricas a serem citadas, mas também para o dimensionamento. Os valores das máximas cargas de compressão que podem ser admitidas para esses elementos variam de acordo com essa classificação mencionada. Obviamente, isso ocorre porque a parede tem uma característica laminar mais acentuada, podendo resistir a esforços maiores que o pilar, que apresenta uma característica mais marcante de elemento linear. 5.3.1 ESPESSURA EFETIVA PARA PILARES E PAREDES PORTANTES Nos casos usuais, a espessura efetiva de uma parede de alvenaria é sua espessura real, portanto, descontando-se revestimentos que possam estar presentes. Entretanto, algumas normas, dentre elas a BS 5628 e a NBR 10837, permitem que se considere uma espessura efetiva equivalente quando se tem a presença de enrijecedores. A expressão genérica para o caso seria a equação 5.6. Quanto aos valores de Ô, a tabela 5.4 e a figura 5.5 devem esclarecer adequadamente a questão. 67 ALVENARIA ESTRUTURAL Esses enrijecedores são muito utilizados especialmente em edifícios industriais, nos quais é necessário se aumentar a espessura das paredes tanto para se satisfazer os limites de esbeltez, que serão vistos em item subseqüente, quanto para reduzir os problemas com a instabilidade do elemento no dimensionamento. Ocorre que para esses edifícios a altura das paredes precisa ser relativamente grande, de forma a satisfazer características de uso dessas edificações. É importante mencionar que parede e enrijecedores devem ser executados simultaneamente e deve haver amarração entre os blocos na ligação entre eles. Em todo caso, algumas normas também apresentam valores absolutos mínimos para a largura efetiva de paredes portantes e pilares. A NBR 10837 menciona 14 cm para as paredes armadas, subentendo-se que esse limite valha também para as alvenarias não-armadas. O ACI 530, no seu item de dimensionamento empírico, especifica 20 cm, exceto para edificações de apenas um andar, para as quais o mínimo é 15 cm. Recomenda-se que esses limites mínimos de espessura absoluta sejam utilizados com bom senso. Existem casos em que eles se revelam muito conservadores. 5 . 3 . 2 ALTURA EFETIVA A altura efetiva de paredes e pilares de alvenaria, aqui denominada hef, é um dos parâmetros importantes para o cálculo da esbeltez de um elemento. A NBR 10837, o ACI 530 e a DIN 1053 - Alvenaria: Cálculo e Execução10 apresentam prescrições muito simples que podem ser resumidas nos itens seguintes: a) quando existe travamento na base e no topo, a altura efetiva deve ser a própria altura real da parede (hef = h); b) quando a extremidade superior estiver livre, a altura efetiva será duas vezes a altura real do elemento (hef = 2 h). O ACI 530 acrescenta que nos casos em que se puder calcular os pontos de inflexão da elástica da posição deformada, a altura efetiva deve ser a distância entre esses pontos. A BS 5628 é menos conservadora nas suas recomendações. Suas prescrições podem ser resumidas no seguinte: a) quando existe travamento "reforçado" na base e no topo, a altura efetiva deve ser 75% da altura real da parede (hef = 0,75 h); 68 ALVENARIA ESTRUTURAL b) quando existe travamento "simples" na base e no topo, a altura efetiva será a própria altura real do elemento (hef = h). A BS 5628 considera travamento "reforçado" uma laje de concreto moldado in loco, ou outro esquema equivalente, que esteja presente em pelo menos um dos lados da parede. O travamento "simples" será considerado basicamente para pavimentos de madeira, o que não é usual para o Brasil. Entretanto, essa recomendação pode ser interessante quando se estiver considerando telhados de madeira. Nesse caso. desde que corretamente fixados à alvenaria, eles podem ser considerados como um travamento, se bem que um travamento "simples". O trabalho de Haseltine & Moore (1981) traz interessantes considerações sobre esse tópico, inclusive com detalhes sobre os travamentos "simples" e "reforçados". 5.3.3 ESBELTEZ A esbeltez é definida usualmente pela divisão da altura efetiva pela espessura efetiva, ou seja, λ = hef / tef. A NBR 10837 apresenta, para esse parâmetro, os valores limites que estão organizados na tabela 5.5. Já de acordo com a BS 5628, o coeficiente de esbeltez X não deve ultrapassar 27, exceto nos casos de paredes com espessuras inferiores a 90 mm e em edifícios com mais de dois andares, para os quais não deve ultrapassar 20. É interessante se ressaltar que a BS 5628 permite a execução de paredes bem mais esbeltas que a NBR 10837. Além do limite de λ ser maior, existe a possibilidade de se considerar como altura efetiva 75% da altura real, o que representa uma diferença total de 80%. Por exemplo, se considerarmos um bloco de 14 cm de largura, a máxima altura de uma parede usual para um edifício residencial seria 2,80 m, de acordo com a NBR 10837. Já de acordo com a BS 5628, esse valor da altura máxima seriade aproximadamente 5,00 m. É claro que se trata apenas de um limite construtivo. Obviamente que em casos em que a esbeltez é elevada a redução da resistência da parede será bem significativa. 5.3.4 COMPRIMENTO EFETIVO DE ABAS EM PAINÉIS DE CONTRAVENTAMENTO Conforme já foi mencionado, abas são trechos de paredes transversais ligados a um determinado painel de contraventamento. As recomendações da NBR 10837 e do ACI 530 para a consideração do comprimento efetivo das abas são muito semelhantes. Na verdade, a norma brasileira é um pouco mais restritiva e suas recomendações um pouco mais complexas, pois dependem da altura da alvenaria sobre um determinado ponto considerado. Essas prescrições são as apresentadas nas equações 5.7 e na figura 5.6. 69 ALVENARIA ESTRUTURAL Já o ACI530 é mais prático sobre esse aspecto, especificando apenas que o comprimento efetivo das abas deve ser de seis vezes a espessura da parede para cada lado onde houver aba a ser considerada. Recomenda-se que essa seja a prescrição adotada, pois as recomendações da NBR10837 tornam a consideração mais complexa, sem acrescentar qualquer benefício significativo. 5.3.5 TRECHOS RÍGIDOS PARA LINTÉIS Quando da distribuição de ações horizontais pelos painéis de contraventamento, mencionou-se a possibilidade de se considerar a dimensão finita dos encontros entre as paredes e os lintéis, na discretização de paredes com aberturas. Essa consideração pode ser feita através do estabelecimento de trechos rígidos para os lintéis. Na ausência de uma especificação especialmente voltada para a alvenaria, pode-se adotar a recomendação do CEB-FIP Model Code 199011, para estruturas de concreto armado, que se encontram apresentadas na figura 5.7. 5.4 PARÂMETROS DE RESISTÊNCIA PARA ALVENARIA Os parâmetros de resistência, quando se considera o ACI 530 e a NBR 10837, são tensões admissíveis. De fato, essas normas ainda são conceitualmente muito semelhantes, sendo que na verdade a NBR 10837 é uma adaptação do antigo ACI 531 - Building Code Requirements for Concrete Masonry Structures. A diferença conceituai mais significativa entre elas é o fato do ACI 530 considerar as tensões, tanto as atuantes quanto as resistentes, em relação à área líquida, enquanto a NBR 10837 as considera em relação à área bruta. Entretanto, optou-se por apresentar aqui apenas os parâmetros definidos pela NBR 10837. 70 ALVENARIA ESTRUTURAL Entende-se que uma comparação mais interessante será obtida com a consideração da BS 5628. A norma inglesa, por ser baseada no método dos estados limites, tem realmente diferenças conceituais muito mais acentuadas em relação à NBR 10837. Assim, alguns parâmetros de resistência da BS 5628 é que serão resumidos em item subseqüente. 5.4.1 PARÂMETROS DA N B R 1 0 8 3 7 A tabela 5.6 faz um resumo das prescrições da NBR 10837 para as tensões admissíveis da alvenaria não- armada. De forma semelhante, a tabela 5.7 apresenta as prescrições para a alvenaria armada. Uma consideração importante pode ser feita em relação à tabela 5.6. Percebe-se que existe a possibilidade de se adotar a resistência de paredes, medida em ensaio normalizado pela NBR 8949 - Paredes de Alvenaria Estrutural - Ensaio à Compressão Simples13, para se obter a tensão admissível à compressão para a alvenaria não-armada. E os valores colocados confirmam o valor da eficiência parede-prisma como sendo 0,7. Além disso, através da comparação de valores prescritos nas tabelas 5.6 e 5.7, pode-se verificar que a contribuição da armadura para a resistência à compressão é pequena, apenas 12% a mais no valor da tensão admissível. Outro detalhe interessante a ser esclarecido são as linhas que dão a tensão de cisalhamento admissível para o que na tabela 5.7 está sendo chamado de "pilar parede". Na verdade trata-se de paredes de contraventamento, painéis que recebem ações horizontais. Nesse caso, quando o momento M é relativamente grande em relação à cortante V, o limite para a tensão de cisalhamento diminui. E o parâmetro escolhido para quantificar essa relação entre o momento e a cortante é o que aparece lá discriminado, ou seja, o momento fletor dividido pelo esforço cortante vezes a altura útil da seção transversal. Por fim, com relação às tensões de contato, a figura 5.8 deve esclarecer a situação. São valores de tensões admissíveis para serem usados em casos de aplicação de cargas em áreas relativamente pequenas, ocupando de 1/3 da espessura a toda espessura da parede. Nesse caso, devido aos efeitos de confinamento, a tensão admissível acaba sendo mais elevada do que nos casos de cargas distribuídas por todo o comprimento da parede. 71 ALVENARIA ESTRUTURAL Para encerrar os parâmetros de resistência da NBR 10837, a tabela 5.8 apresenta os valores de tensões admissíveis para as armaduras. Pela observação dos valores lá apresentados se percebe por que a contribuição do aço na compressão é tão pequena. Ocorre que os valores das tensões admissíveis são realmente muito baixos, pelo menos quando comparados aos que são utilizados no concreto armado, por exemplo. 5.4.2 PARÂMETROS DA BS 5628 Conforme já foi mencionado, a BS 5628 baseia-se no método dos estados limites. Portanto. seus valores de resistência de cálculo são derivados de valores característicos. 72 ALVENARIA ESTRUTURAL Essas resistências características podem ser obtidas na própria norma através de valores tabelados, como os que foram apresentados na tabela 5.2, ou através de gráficos, como o que se encontra na figura 5.9, para a resistência à compressão da alvenaria não-armada. Então, os valores característicos precisam ser multiplicados e divididos por coeficientes adequados para se obter os valores de cálculo, ou valores de projeto. No caso da resistência à compressão de paredes, para se obter os valores de cálculo, deve-se utilizar a expressão 5.8. 73 ALVENARIA ESTRUTURAL Por fim, Ɣm, que é o coeficiente se segurança parcial para o material, pode ser obtido na tabela 5.10, em função do controle existente na manufatura dos blocos e na construção. A tensão de compressão para paredes é um exemplo de determinação de uma tensão de cálculo pela BS 5628. Claro que existem alguns outros valores a serem considerados, como, por exemplo, tensão de cisalhamento, tração normal à fiada, tração na direção da fiada, compressão na flexão, etc. Entretanto, para não se tornar muito extenso, o objetivo deste capítulo é apenas apresentar um exemplo interessante. E a escolha recaiu sobre a resistência à compressão da alvenaria não-armada devido à sua importância no dimensionamento da maioria dos elementos de uma edificação. Obviamente, a determinação da resistência de projeto à compressão de paredes pela BS 5628 é mais complexa do que a simples utilização de valores admissíveis. Ainda mais se considerarmos que os carregamentos também devem ser multiplicados por coeficientes de segurança parciais específicos para o cálculo da tensão atuante. Entretanto, essa maior complexidade é que realmente permite se obter economias mais significativas, quando isso é possível, ou então penalizações adequadas para situações de risco. A complexidade, nesse caso, é justificável exatamente por tratar de forma diferente situações que são realmente diferentes. 74 ALVENARIA ESTRUTURAL 5.5 Parâmetros elásticos pra a alvenaria A relação entre a tensão e deformação da alvenaria é importante parâmetro de projeto no cálculo dos elementos que utilizam este material, tendo influência significativa na configuração deformada da estrutura. Além disso, é utilizada diretamente na definição da razão modular entre a alvenariae o aço, parâmetro básico para o equacionamento da flexão. Apesar de sua importância, este tema ainda gera dúvidas e grande controvérsia entre diversos autores, que acabam por apresentar diferentes valores e relações para a determinação do módulo de deformação. Usualmente este módulo é calculado por expressões do tipo Ealv = ξfp, em que ç é baseado em resultados obtidos em grandes conjuntos de testes. Pedreschi (1998) cita ensaios realizados com prismas feitos com diferentes blocos, nos quais também foram variáveis o tipo de argamassa, o padrão de assentamento e a direção do carregamento (paralelo ou perpendicular à junta de assentamento). Para blocos de concreto, esse autor obteve do conjunto de ensaios a expressão Ealv = 1000 fp. Sugere, no entanto, adotar como módulo de elasticidade, para todos os tipos de blocos, o valor Ealv = 900 fp, uma vez que os parâmetros obtidos são aproximados e difíceis de serem medidos. Andrade (1998) apresenta ensaios realizados por diversos autores, como Gallegos (1989), Drysdale (1994)14 apud Andrade (1998) e Gomes (1983). Estes propuseram limites de variação de ξ, sugerindo as relações 400 fp < Ealv>, < 1290fp, e concluíram que algumas normas estrangeiras superestimam os valores de Ealv e Galv, adotando ξ = 1000. Como valor de referência, é proposto o valor ξ = 750 para alvenaria de blocos de concreto e ξ= 500 a 600 para alvenaria de tijolos cerâmicos. Amrhein (1998) utiliza ξ = 750 para o cálculo do módulo de elasticidade, tanto na resolução de exemplos como também na confecção de ábacos e tabelas, e o texto da ABCI (1990) sugere o uso de Ealv = 1000 fp. Além de todos esses números, a NBR 10837 apresenta valores ainda mais discrepantes, pois prescreve 400 fp para o módulo de deformação longitudinal e 200 fp para o módulo de deformação transversal para blocos de concreto. Conforme se pode verificar, as sugestões para os valores do módulo de deformação da alvenaria são bastante diversas. A opinião do autor deste texto é que sejam adotados os valores constantes na tabela 5.11. 75 ALVENARIA ESTRUTURAL DIMENSIONAMENTO DE ELEMENTOS 6.1 INTRODUÇÃO Neste capítulo são apresentados os principais procedimentos para o dimensionamento de elementos de alvenaria. Para não se estender demais esses tópicos, serão normalmente considerados apenas os procedimentos prescritos pela NBR 10837 - Cálculo de Alvenaria Estrutural de Blocos Vazados de Concreto1. Em muitos casos, nos quais isso for interessante, serão mencionadas e discutidas as recomendações do ACI 530 - Building Code Requirements for Masonry Structures e pela BS 5628 - Code of Practice for Use of Masonry, sempre no sentido de estabelecer comparações e apresentar sugestões sobre possíveis aprimoramentos a serem oportunamente agregados à NBR 10837. Neste texto, optou-se por apresentar os dimensionamentos pelo ponto de vista das solicitações, e não dos elementos em si. Esta opção pareceu mais conveniente, pois elementos do mesmo tipo podem estar submetidos a solicitações variadas, dependendo dos casos específicos que se considere. Por exemplo, uma parede pode estar submetida desde a uma compressão simples até a uma flexão composta oblíqua. De fato, deve-se considerar que na realidade quase todos os elementos presentes numa estrutura acabam sendo submetidos a um estado combinado de solicitações. Paredes submetidas à compressão simples na realidade não existem, pois as excentricidades inevitáveis nas aplicações dos carregamentos têm como conseqüência uma solicitação mais complexa do que a que se imagina inicialmente. O que se admite é que sendo uma dessas solicitações muito pequena em relação às demais, ela possa ser desconsiderada e, por simplicidade, um determinado elemento possa ser dimensionado com segurança através de um procedimento mais simples. Mesmo assim, no início de cada item se apresentam algumas indicações sobre quais elementos são com mais freqüência submetidos àquela solicitação considerada. O objetivo é realizar a ligação entre a solicitação analisada e a situação de projeto na qual ela é provavelmente mais importante. 6.2 COMPRESSÃO SIMPLES A compressão é a solicitação mais comum e a mais simples de ser considerada. No capítulo anterior foram discutidas todas as prescrições necessárias ao dimensionamento de elementos sob compressão simples. Até mesmo o procedimento da BS 5628, uma norma que se baseia nos estados limites, foi discutido com detalhes suficientes para a sua correta aplicação. Portanto, restaria a este item apenas a apresentação de exemplos de dimensionamento. Entretanto optou-se pela realização de uma comparação entre os dimensionamentos efetuados com a NBR 10837, o ACI 530 e a BS 5628, de forma a se verificar as principais vantagens e desvantagens, tanto em relação à economia obtida quanto à complexidade desses procedimentos. Os elementos comumente considerados como submetidos à compressão simples são as paredes e os pilares, sejam eles armados ou não. Dessa forma, fica evidente a importância desse tipo de 76 ALVENARIA ESTRUTURAL dimensionamento, já que paredes e pilares são os elementos mais importantes em qualquer estrutura de edifício de alvenaria. Aliás, para edifícios de altura relativamente reduzida, até seis pavimentos em casos usuais, esse é o único dimensionamento necessário na prática. Nem mesmo as vergas sobre aberturas de janelas e portas com vãos convencionais precisariam de fato ser verificadas. Normalmente, qualquer armadura construtiva adotada é suficiente para se garantir a resistência necessária. 6.2.1 TENSÃO ATUANTE A tensão atuante em elementos comprimidos será sempre a carga dividida pela área da seção transversal desse elemento. A NBR 10837 e a BS 5628 trabalham com a área bruta da seção dos elementos, portanto desconsiderando a existência de vazios. Já o ACI 530 considera a área líquida, e dessa forma a área da seção transversal deve ser calculada descontando-se a área de vazios. A tensão atuante não sofre nenhuma correção quando o dimensionamento se dá segundo a NBR 10837 e o ACI 530. Essas normas, sendo baseadas no método das tensões admissíveis, não prevêem coeficientes de segurança parciais a serem aplicados aos carregamentos. Toda a segurança está embutida no próprio valor da tensão admissível. Já com a BS 5628 ocorre uma situação diferente. Nesse caso, existem coeficientes parciais de segurança a serem aplicados aos carregamentos, transformando-os de valores característicos em valores de cálculo. Um resumo dos valores de y, apresentados por essa norma podem ser vistos na tabela 6.1 6.2.2 COMPARAÇÃO DE DIMENSIONAMENTOS Não é muito fácil produzir uma comparação consistente de dimensionamentos obtidos pela NBR 10837 e o ACI 530 com o resultante da BS 5628. Entretanto, neste item procurar-se-á obter a máxima tensão de compressão à qual pode estar submetida uma parede não-armada de alvenaria estrutural com as seguintes condições: a) espessura 14 cm; b) alturas 240, 260 e 280 cm; c) resistência média de prisma de 8 MPa; d) resistência característica de parede de 4,7 MPa; e) contraventamento por laje de concreto armado na base e no topo; f) tensão atuante para 80% de cargas permanentes e 20% de cargas variáveis; g) excentricidade das cargas menor ou igual a 5% da espessura. 77 ALVENARIA ESTRUTURAL Essas condições especificadas são típicas para as situações normalmente encontradas em edificações residenciais no Brasil. Através delas obter-se-á um panorama interessante sobre os resultados a serem alcançados pelo dimensionamento segundo as três normas mencionadas. Existe um ponto relativamente polêmico a ser destacado. Trata-se da resistência característica da parede,o parâmetro básico para o dimensionamento segundo a BS 5628, a ser obtida com base na resistência média de prisma. Pode-se adotar, com razoável segurança, que a relação entre a resistência de parede e a resistência de prisma seja 0,7. Isso faria com que 8 MPa para a resistência média de prisma representasse uma resistência média de parede de 5,6 MPa. Além disso, a própria BS 5628 menciona que se pode obter a resistência característica de uma parede dividindo-se a resistência média obtida para dois exemplares ensaiados por 1,2. Portanto, se a resistência média de parede for 5,6 MPa, a sua resistência característica pode ser suposta como sendo da ordem de 4,7 MPa, o valor adotado para as simulações apresentadas. Um último detalhe a ser esclarecido é sobre o coeficiente parcial de segurança a ser adotado para o carregamento, y|( também no caso da BS 5628. Considerando-se a relação entre cargas permanentes e variáveis admitida para o carregamento, pode-se estimá-lo em 1,45, tomando-se em consideração os valores apresentados na tabela 6.1. Um resultado parcial interessante é o valor do coeficiente de redução da tensão relativo à esbeltez. A tabela 6.2 apresenta um resumo desses valores para as três alturas de parede adotadas e para as três normas analisadas. Através dela pode-se observar que, apesar das peculiaridades de cada código até mesmo em relação à altura efetiva que deve ser considerada, os valores não são muito díspares, pelo menos quando se toma a NDR 10G37 e a D3 GG28. O ACI 530 é que prescreve alguns valores um pouco mais conservadores. Finalmente, a tabela 6.3 resume os resultados obtidos para a referida tensão máxima que pode ser aplicada na parede segundo as condições anteriormente especificadas. Uma observação dos resultados obtidos permite perceber que a BS 5628 fornece resultados bem mais conservadores que o ACI 530 ou mesmo a NBR 10837. Mesmo considerando-se o controle especial tanto para a manufatura das unidades como para a execução da obra, as diferenças chegam a 20% em relação à NBR 10837 e a 30% em relação ao ACI 530.A extensa utilização da NBR 10837, e também do ACI 530, não traz evidências de que a segurança esteja sendo minimizada por esses dois códigos. Então, parece ser o caso de se imaginar que a BS 5628 poderia reduzir um pouco seus coeficientes. Especialmente o coeficiente Ɣm parece um pouco exagerado, quando se considera que está aplicado sobre uma resistência característica de parede. Se sua faixa de variação fosse alterada para algo entre 1,8 e 2,3, provavelmente os resultados obtidos continuariam a ser seguros e poderiam ser considerados mais satisfatórios. Quanto à utilização em si, os procedimentos baseados nas tensões admissíveis são realmente mais simples de ser aplicados. Entretanto, até mesmo considerando-se as normas existentes para os demais materiais utilizados em estruturas, a tendência aos estados limites parece ser irreversível. Ademais, a maior complexidade da BS 5628 não compromete a sua correta utilização, especialmente quando se dispõe de recursos computacionais fartos e relativamente baratos para viabilizá-la. 78 ALVENARIA ESTRUTURAL 6.3 FLEXÃO SIMPLES Vigas e vergas são elementos estruturais lineares destinados a suportar e transmitir ações verticais mediante um comportamento predominante de flexão. Normalmente utiliza-se o termo verga quando o elemento estrutural está colocado sobre vãos de aberturas de portas e janelas. E esses são os elementos mais comuns que estão submetidos à flexão simples numa edificação de alvenaria estrutural. Entretanto, muros de arrimo e paredes de reservatório, que também são elementos encontrados com muita freqüência nessas edificações, podem ser considerados como submetidos à flexão simples, bastando que as tensões de compressão sejam relativamente pequenas em relação às de flexão. Portanto, a flexão simples pode ser considerada uma solicitação bastante importante e comum em edificações de alvenaria. Provavelmente a mais comum, logo após os casos de compressão. Por fim, menciona-se que a notação adotada para os equacionamentos aqui apresentados, sempre que possível, baseia-se na notação utilizada pela NBR 10837. Pretende-se, dessa forma, facilitar a sua utilização, tornando mais direta a identificação das variáveis presentes. 6.3.1 DIFERENÇAS CONCEITUAIS ENTRE A NBR 10837 E A BS 5628 No Brasil, a diferença básica entre a análise de elementos de alvenaria estrutural e de concreto armado está no modelo de cálculo adotado para cada material. A NBR 6118 - Projeto e execução de obras de concreto armado4, que utiliza o método dos estados limites, admite, por exemplo, a possibilidade da plastificação da armadura ou deformações no concreto iguais às convencionais de ruptura, na situação última de cálculo. Já a NBR 10837, que adota o método das tensões admissíveis, busca garantir distância apropriada entre as tensões atuantes e as que provocam o escoamento ou ruptura dos materiais. Nesse método, as tensões resistentes devem ser calculadas admitindo comportamento elástico e linear do material. Assim, no caso de elementos fletidos, enquanto o concreto normalmente é suposto trabalhando no Estádio III, a NBR 10837, que fixa as hipóteses de cálculo em alvenaria, especifica que os mesmos devem ser calculados no Estádio II. Já a BS 5628, que também trabalha com estados limites, acaba admitindo para a alvenaria um comportamento muito semelhante ao do concreto armado. 79 ALVENARIA ESTRUTURAL Dessa forma, conforme já se explicou no início deste capítulo, aqui serão apresentadas as hipóteses básicas da NBR 10837, e o equacionamento desenvolvido tomará por base as suas considerações. Se o enfoque fosse o da BS 5628, todo o equacionamento seria o mesmo já tradicionalmente apresentado para a flexão simples de elementos de concreto armado. Até mesmo tabelas e ábacos desenvolvidos para o concreto poderiam ser utilizados, bastando tomar a resistência à compressão adequada. No caso, a BS 5628 menciona que a resistência à compressão da alvenaria na flexão deve ser a metade da prescrita para compressão simples. 6.3.2 HIPÓTESES BÁSICAS DA NBR 10837 O item 5.2.2 da NBR 10837 é que fixa as hipóteses de cálculo dos elementos fletidos. Para maior clareza, apresentam-se as suas prescrições, que são as seguintes: "...Os componentes fletidos são calculados no Estádio II. Nestes cálculos, as hipóteses básicas são as seguintes: a) a seção que é plana antes de se fletir permanece plana após a flexão; b) o módulo de deformação da alvenaria e da armadura permanece constante; c) as armaduras são completamente envolvidas pelo graute pelos elementos constituintes da alvenaria, de modo que ambos trabalhem como material homogêneo dentro dos limites das tensões admissíveis". É interessante ressaltar que no Estádio II supõe-se que a alvenaria não suporte tensões de tração, que deve ser totalmente resistida pelas armaduras. Além disso, o comportamento dos materiais é admitido como sendo linear, ou seja, supõe-se aplicável a lei de Hooke, até os limites admissíveis das tensões. 6.3.3 EQUACIONAMENTO BÁSICO O equacionamento necessário para a análise de seções submetidas à flexão reta simples, pelo método das tensões admissíveis, pode ser realizado a partir das hipóteses básicas deste método, apresentadas anteriormente. Busca-se conhecer a situação deformada da seção, que pode ser caracterizada pela posição da linha neutra e pela inclinação do plano da seção após a aplicação da solicitação. A figura 6.1 apresenta alguns dos principais parâmetros necessários ao equacionamento mencionado. As distâncias x e z. respectivamente profundidade da linha neutra e braço entre as resultantes no aço e na alvenaria, serãoreferenciadas por parâmetros adimensionais kx e kz, relacionados à altura útil: 80 ALVENARIA ESTRUTURAL Além disso, serão utilizadas duas grandezas auxiliares: a razão de tensões m e a razão modular n. Elas são definidas como: em que fs e falv são as tensões atuantes no aço e na alvenaria. Es e Ealv os módulos de deformação do aço e da alvenaria, respectivamente. O primeiro passo para o equacionamento propriamente dito pode ser a aplicação da lei de Hooke para as tensões atuantes no aço e na alvenaria: Já a compatibilidade de deformações, de acordo com a hipótese de a seção permanecer plana após a deformação, exige que: Utilizando-se a condição de equilíbrio da flexão simples, ou seja, força normal igual a zero, pode-se escrever: Define-se a taxa geométrica de armadura através da relação: Portanto, levando-se em conta as equações 6.3, 6.7 e 6.8, pode-se escrever: Já pela divisão, membro a membro, das equações 6.5, chega-se a: 81 ALVENARIA ESTRUTURAL Assim, substituindo-se em 6.10 as relações 6.4, 6.6 e 6.9 obtém-se a equação de segundo grau: Resolvendo-se a equação e tomando apenas a raiz que interessa, chega-se à posição da linha neutra, dada por: A área de armadura e a máxima tensão atuante, na alvenaria e nas armaduras, podem ser obtidas pela equivalência do momento fletor atuante e o produzido pelas resultantes de tração e compressão na seção. Considerando-se a resultante de tração na armadura, pode-se escrever: De maneira semelhante, pode-se calcular a máxima tensão na alvenaria, a partir do momento atuante: É também interessante se expressar kx e a taxa geométrica de armadura p em função dos parâmetros m e n, o que pode ser realizado tomando-se as equações 6.4 e 6.6 e substituindo-se em 6.10. Assim se obtém: 82 ALVENARIA ESTRUTURAL 6.3.4 DIMENSIONAMENTO BALANCEADO A situação de dimensionamento balanceado, que corresponde ao melhor aproveitamento dos materiais, é obtida quando a tensão atuante na alvenaria é igual à tensão admissível à compressão na flexão e a tensão atuante no aço é igual à tensão admissível à tração: Nesse caso, a posição da linha neutra e a taxa de armadura podem ser facilmente obtidas com as relações 6.19 e 6.20: A altura útil correspondente a este dimensionamento é obtida através da reorganização da equação 6.16, com a utilização da tensão admissível à compressão na flexão para a alvenaria: 6.3.5 DIMENSIONAMENTO SUBARMADO No dimensionamento subarmado, que ocorre quando a altura útil disponível é maior ou igual à necessária ao dimensionamento balanceado, d • db, não são conhecidas, de início, as tensões desenvolvidas na alvenaria, sendo que apenas o aço estará submetido à tensão admissível, ou seja: Então, deve ser utilizado um processo iterativo para a determinação da posição da linha neutra e da área de aço necessária ao elemento. Esse procedimento pode ser realizado com o auxílio da planilha de cálculo apresentada na tabela 6.4. O processo iterativo pode ser iniciado com o valor de kzb prosseguindo até a convergência deste parâmetro, ou seja, quando a diferença entre a última e a primeira coluna estiver dentro de uma margem considerada satisfatória. 83 ALVENARIA ESTRUTURAL Observe-se que ao final deve-se verificar a tensão atuante na alvenaria, com o emprego da equação 6.17, de forma a se garantir que seu valor seja menor que o limite admissível. 6.3.6 DIMENSIONAMENTO SUPERARMADO Caso a altura útil seja menor que a do dimensionamento balanceado, ou seja, d < db, uma das opções que se pode adotar é o dimensionamento superarmado, no qual a tensão admissível da alvenaria é atingida antes que a do aço. Portanto, tem-se: Assim, após a determinação de kx 5, e o correspondente kz através da equação 6.2, o objetivo é o cálculo da área de aço necessária. Isso pode ser feito através da equação 6.26, obtida quando se isola o valor de m da equação 6.19 e se substitui na expressão 6.9. É claro que, determinada a taxa geométrica de armadura, o valor de As pode ser encontrado pela equação 6.8. Um último detalhe diz respeito à verificação da tensão no aço. Isso pode ser feito pela equação 6.14, ou seja: 6.3.7 DIMENSIONAMENTO COM ARMADURA DUPLA O dimensionamento da seção retangular com armadura dupla é realizado determinando-se inicialmente a parcela do momento fletor que é absorvida pela seção considerando-se armadura simples e dimensionamento balanceado, M0, e a correspondente parcela complementar, DM. Esta segunda parcela deve ser absorvida por um binário de forças resultantes de armaduras adicionais, uma tracionada e outra comprimida. 84 ALVENARIA ESTRUTURAL O momento M0 pode ser obtido da equação 6.16 quando se utiliza f igual ao limite admissível, ou seja: A correspondente armadura tracionada pode ser obtida da equação 6.15, adotando-se os valores de M0 e da tensão admissível do aço: A parcela complementar do momento AM = M - M0, pode ser igualada ao momento produzido pelo binário de forças das armaduras adicionais, As2 na região tracionada e As ' na região comprimida. Sabe-se, de antemão, que a tensão na armadura tracionada correspondente ao valor para o dimensionamento balanceado, ou seja, é o valor admissível. A tensão na armadura comprimida pode ser obtida através da compatibilidade de deformações, com o auxílio da figura 6.2. A área de armadura tracionada para o dimensionamento com armadura dupla é igual à soma das parcelas As1 e As2. 85 ALVENARIA ESTRUTURAL 6.4 CISALHAMENTO O cisalhamento ocorre normalmente em conjunto com a solicitação por momento fletor. Vergas, vigas ou paredes que participam do sistema de contraventamento são os elementos nos quais o cisalhamento deve ser usualmente verificado. Essa solicitação também ocorre em paredes de arrimo ou de reservatórios, mas, devido ao fato de esses elementos trabalharem segundo a direção de menor inércia, é muito pouco provável que nesses casos ocorram tensões cisalhantes que ultrapassem os limites admissíveis. 6.4.1 TENSÕES ATUANTES A NBR 10837 é bastante confusa quando se trata de definir a tensão de cisalhamento atuante. Por exemplo, para elementos de alvenaria não-armada. utiliza expressões como "esforço cortante horizontal" sem que essa direção "horizontal" esteja direta ou indiretamente definida. Ainda apresenta expressões conflitantes, confundindo comprimento da seção com altura útil para o caso das alvenarias armadas. Além disso, se refere à variável utilizada para o cálculo da tensão atuante, τalv, como "tensão de cisalhamento de referência, para elementos de alvenaria não-armada, e como "tensão convencional de cisalhamento", para elementos de alvenaria armada. Enfim, não contribui em nada para elucidar a correta aplicação de seus preceitos. Para se colocar o cálculo da tensão de cisalhamento atuante em peças de alvenaria em termos claros, o que se pode recomendar é que para elementos não-armados se utilize a expressão: Como referência interessante, menciona-se que a BS 5628 adota sempre a tensão atuante como sendo a força cortante dividida pela área da seção transversal, mesmo no caso de alvenarias armadas. É uma posição defensável e pode ser adotada mesmo por quem pretende utilizar os valores limites recomendados pela NBR 10837. Nesse caso a expressão 6.36 poderia ser considerada tanto para alvenaria armada como para alvenaria não-armada. Já o ACI 530 recomenda que a tensão atuante seja calculada da forma apresentada pela expressão 6.36. ou seja, força cortante divida pela área, apenas quando parte da seção transversal estiver submetida a tensões normaisde tração. Caso a seção apresente apenas tensões de compressão, a tensão de cisalhamento atuante deve ser calculada pela expressão tradicional da resistência dos materiais, força cortante vezes momento estático, divididos pela espessura e pelo momento de inércia à flexão. 86 ALVENARIA ESTRUTURAL Como última recomendação importante, deve-se observar que no caso de seção transversal em forma de T, I ou L, as abas não devem ser consideradas no cálculo da tensão de cisalhamento. Todo o cisalhamento deve ser absorvido pela alma da seção transversal do elemento. 6.4.2 DIMENSIONAMENTO COM OU SEM ARMADURAS Apesar de muito confusa na definição da tensão atuante, a verificação e o dimensionamento são fáceis e rápidos de ser realizados pela NBR 10837. Isso pode ser verificado pelo exame da tabela resumo apresentada no capítulo anterior. Para o caso de elementos não-armados. por exemplo paredes do sistema de contraventamento que não tenham armaduras verticais, os limites são absolutos: 0,15 MPa e 0,25 MPa, respectivamente para o caso de argamassas entre 5 e 12 MPa ou 12 e 17 MPa. Portanto, basta comparar o τalv, obtido com esses limites. No caso de elementos de alvenaria armada, deve-se fazer uma distinção entre peças fletidas sem armadura para resistir às tensões de cisalhamento e aquelas que possuem armaduras para resistir a toda tensão de cisalhamento atuante. Dentro de cada um desses grupos ainda é importante se destacar o caso de vigas ou vergas e o caso de pilares paredes. Mais especificamente ainda, para pilares parede, ainda há duas condições: a situação em que o momento fletor é preponderante e a situação em que a força cortante é preponderante. Entretanto, localizado o valor a ser utilizado para o elemento e a circunstância específica que se analisa, não existe nenhuma outra dificuldade a ser considerada pois todos os valores são simplesmente definidos em função da raiz quadrada da resistência de prisma. Basta, como no caso das alvenarias não- armadas, comparar o valor de τalv com o limite adequado. 6.4.3 CÁLCULO DA ÁREA E DISPOSIÇÃO DAS ARMADURAS PARA O CISALHAMENTO Se for necessário prever a utilização de armadura específica para o combate às tensões de cisalhamento, ela pode ser determinada mediante a aplicação da analogia de treliça, como se ilustra de forma genérica na figura 6.3. As bielas de compressão são admitidas com inclinação β, enquanto as armaduras estão inclinadas de α, sempre em relação ao eixo longitudinal da peça. A força resultante na armadura média, V/senα, deve ser absorvida pelo conjunto de barras dispostas no comprimento z(cotα + cotβ). Assim sendo, pode-se escrever: 87 ALVENARIA ESTRUTURAL Essas duas últimas expressões também estão presentes na NBR 10837. Na verdade é quase impossível, para os casos usuais, se prescrever armaduras com inclinações diferentes de 90°. Portanto, a expressão 6.41 é que realmente tem importância prática para o problema. Para a correta utilização da expressão 6.41, deve-se lembrar que o espaçamento "s" precisa ser considerado em relação à dimensão dos blocos, pois é totalmente inadequado se prever furos para a colocação das armaduras. Assim, o correto é se adotarem espaçamentos de 20 e 40 cm para blocos de comprimento múltiplo de 20 cm, ou espaçamentos de 15 e 30 cm, quando da utilização de blocos de comprimento múltiplo de 15 cm. Além disso, a tensão admissível do aço deve se limitar aos valores apresentados na tabela correspondente do capítulo anterior. Essa observação é importante, pois a NBR 10837 limita essa tensão a valores relativamente baixos, 165 MPa para os casos usuais. Finalmente, ainda com respeito à disposição das armaduras, deve-se lembrar que a NBR 10837 especifica que cada linha de fissura potencial precisa ser atravessada por pelo menos uma barra da armadura transversal. Com base nessa prescrição, a figura 6.4 apresenta os espaçamentos máximos a serem observados tanto para o caso dos estribos quanto para as barras dobradas a 45°. O limite de 30 cm é adotado por analogia às prescrições para as peças de concreto armado. 88 ALVENARIA ESTRUTURAL 6.5 FLEXÃO COMPOSTA A flexão composta, em que ocorre interação entre carregamento axial e momentos fletores, é também uma solicitação muito comum em elementos de alvenaria estrutural, particularmente quando se analisam estruturas portantes de edifícios. Nestes, além de suportar as cargas gravitacionais, as paredes que fazem parte do sistema de contraventamento lateral resistem às ações horizontais provenientes do vento e do desaprumo. Este tipo de solicitação também ocorre em elementos sujeitos a cargas verticais atuando conjuntamente com ações laterais provenientes do empuxo do solo ou da água, e ainda quando o carregamento vertical é excêntrico em relação ao eixo do elemento. 6.5.1 SOLICITAÇÕES COMBINADAS SEGUNDO A N B R 10837 A primeira verificação a ser feita quando se analisa uma seção submetida à flexão composta é a respeito de eventuais tensões de tração que possam ocorrer. Essa verificação é feita através da seguinte expressão: Se a relação 6.42 for atendida, isso significa que a seção transversal estará submetida a tensões menores que aquelas que podem ser resistidas pela alvenaria não-armada. Nesse caso, não será realmente necessário se lançar mão de armaduras para resistir a essas tensões, bastando para tanto verificar as tensões de compressão conforme as expressões 6.43 ou 6.44 apresentadas a seguir. Em caso contrário, quando a tensão admissível de tração é ultrapassada, deve-se providenciar armaduras para absorvê-la. Então, será necessário considerar o equacionamento apresentado no item subseqüente para se conseguir a solução do problema. É interessante observar-se que na relação 6.42 a NBR 10837 está implicitamente admitindo que 75% das cargas verticais são permanentes. Tal consideração é, em muitos casos, conservadora. Para edifícios residenciais essa parcela varia de 80% a 85%. Pode-se considerar que é razoável verificar em cada caso qual a parcela de carga permanente e utilizá-la na verificação da tração. Exista ou não tensão de tração acima do limite admissível, as tensões de compressão advindas dos carregamentos combinados devem satisfazer a uma das expressões de interação apresentadas a seguir. Quando para o cálculo das tensões atuantes estiverem sendo consideradas apenas as cargas permanentes e ações variáveis, a verificação será feita através da relação: 89 ALVENARIA ESTRUTURAL Caso a ação dos ventos também esteja sendo considerada na combinação, a NBR 10837 prescreve que o limite das tensões pode ser acrescido de 33%. Isso significa verificar a combinação através da relação: 6.5.2 EQUACIONAMENTO BÁSICO Quando as tensões de tração ultrapassarem o valor admissível, de acordo com a verificação feita na expressão 6.42, a NBR 10837 prescreve que se deve prever a utilização de armaduras para resistir a essas tensões. É exatamente esse equacionamento que se apresenta neste item. Entretanto, é interessante ressaltar que a solução aqui apresentada é interessante quando as tensões devidas ao esforço normal são significativas em relação às que provêm da atuação do momento fletor. Se a flexão for muito preponderante, o ideal é calcular a armadura através do procedimento apresentado anteriormente para flexão simples, ou seja, ignorando-se a atuação conjunta dos esforços para o cálculo da armadura. Apenas a verificação da tensão de compressão seria realizada considerando-se a combinação dos esforços através das expressões 6.43 ou 6.44. A exemplo do verificado para o caso da flexão simples, o equacionamento da flexão composta no método das tensões admissíveis também é realizadoa partir das hipóteses básicas deste método, como a seção que permanece plana após a flexão, a validade da lei de Hooke e o equilíbrio entre os esforços solicitantes e a resultante das tensões na alvenaria e no aço. Também aqui, o equacionamento será desenvolvido considerando-se, sempre que possível, a notação utilizada pela NBR 10837. A figura 6.5 apresenta um elemento submetido à flexão composta no qual as tensões de tração superam as de compressão geradas pela força normal solicitante. A tensão falv, que aparece na figura 6.5, é a tensão total na alvenaria, ou seja, a soma da tensão devida à compressão e à flexão: 90 ALVENARIA ESTRUTURAL O valor devido à compressão pode ser obtido simplesmente pela divisão da força normal atuante pela área da seção transversal: Já a tensão devida à flexão pode ser estimada através das expressões 6.43 ou 6.44, dependendo da combinação incluir ou não a ação do vento. Essa é a situação ideal para se obter o dimensionamento mais econômico nos casos usuais de flexão composta em edifícios, em que a tensão de compressão é normalmente significativa. Isso ocorre porque quanto maior a tensão na alvenaria menor a profundidade da linha neutra e isso tende a melhorar o aproveitamento da armadura. Dessa forma, quando a ação dos ventos não estiver sendo considerada, tem-se: 91 ALVENARIA ESTRUTURAL É óbvio que o valor de x deve ser um número real, positivo e menor que a altura útil da seção. Se isso não ocorrer, o dimensionamento deve ser interrompido. Entretanto, se essas condições forem atendidas, resta estabelecer o valor da tensão de tração no aço. Isso pode ser feito através da utilização de outras hipóteses admitidas para o problema. A manutenção da seção plana permite escrever a seguinte equação de compatibilidade de deformações: A tensão no aço deve resultar menor que a tensão admissível fs,t, Caso isso não ocorra, pode-se tentar reduzir a tensão falv e reiniciar o processo a partir da equação 6.51. Normalmente essa providência produz bons resultados. Com a redução da tensão de compressão na alvenaria para valores abaixo do máximo permitido, consegue-se reduzir também a tensão no aço, obtendo-se, como conseqüência, uma área de armadura maior que aquela que seria calculada inicialmente. Ao contrário, também pode ocorrer o caso em que o valor de fs calculado seja muito menor que o valor admissível. Então, a solução será antieconômica, por causa do aproveitamento deficiente da armadura. Essa situação ocorre normalmente quando o valor de x aproxima-se da altura útil d. Nesse caso, a solução seria a utilização de uma alvenaria mais resistente. Aumentando-se a tensão falv aumenta-se também a tensão na armadura, reduzindo-se a área de aço calculada. De qualquer modo, uma vez definida a tensão no aço, pode-se determinar a área da armadura de tração que é dada por: 92 ALVENARIA ESTRUTURAL 6.5.3 PROCEDIMENTO SIMPLIFICADO O equacionamento básico mostrado no item anterior pode ser considerado um pouco complicado para o dimensionamento automático à flexão composta. Sendo assim, pode-se sugerir a utilização de um procedimento simplificado para esses casos. O processo assume que a seção é homogênea, mas que a tração é suportada pelas armaduras. Sua utilização é bastante simples, mas implica considerar que o aço estará submetido a deformações que produzam uma tensão igual à admissível. Isso normalmente não é correto, considerando-se as hipóteses de que as seções planas permanecem planas e que a deformação é proporcional à distância até a linha neutra. Entretanto, Amrhein (1998), que sugere um processo semelhante, tenta justificar que se possa assumir a tensão no aço com seu valor admissível pelos seguintes motivos: a) as seções planas podem não permanecer planas após a flexão; b) a seção é fissurada e as fissuras localizadas que se abrem provocam uma distribuição de tensões diferente da usualmente considerada. Mesmo considerando-se o fato de que essas justificativas não são completamente defensáveis, o procedimento pode ser considerado interessante exatamente pela sua simplicidade. Além disso, os resultados quase sempre são seguros, mesmo para casos-limite. Ele pode ser organizado nos seguintes passos: a) determinação das tensões atuantes de tração, ft, e compressão, falv bem como a posição da linha neutra, figura 6.6, através das expressões clássicas da resistência dos materiais.