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CAPÍTULO 2 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: Estabelecer os requisitos e/ou critérios para existência de relação empregatícia. Compreender a natureza jurídica do contrato de trabalho a partir das teorias explicativas desenvolvidas, suas implicações e aplicações. Interpretar os critérios de caracterização da relação empregatícia. Analisar aplicações jurisprudenciais dos componentes da relação empregatícia e suas consequências em casos concretos. Caracterizar condições jurídicas da existência de vínculo empregatício. 42 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO 43 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 CONTEXTUALIZAÇÃO Caro acadêmico, estamos entrando no Capítulo 2 do Livro de Estudos da disciplina O Direito do Trabalho e as relações de trabalho. No primeiro capítulo, analisamos o percurso de formatação das estruturas normativas das relações de trabalho no Brasil, o que implica no surgimento do próprio Direito do Trabalho Pátrio. No ponto ápice da legalização das relações de trabalho está a CLT, porém esta não é a única norma sobre o assunto. Há inúmeras outras leis, decretos etc., que balizam juridicamente as relações entre trabalhadores e seus empregadores. É bom lembrar, por exemplo, que a Constituição Federal é a fonte primeira de normas disciplinadoras das relações de trabalho, estabelecendo, no tocante aos direitos sociais e do trabalho – direitos fundamentais de segunda geração – direitos e garantias básicos de todos os trabalhadores. Isso tem impacto sobre o que estudaremos neste capítulo, visto que ao analisarmos o contrato – ou a relação jurídica – que se estabelece entre empregadores e empregados temos que ter em conta que há um conjunto normativo consideravelmente abrangente que atua dirigindo as vontades das partes, por exemplo, as partes não podem estabelecer qualquer jornada de trabalho, devendo respeitar as regras legais e constitucionais a respeito. Para chegar a este ponto, é importante recordar algo do que analisamos anteriormente para que possamos estabelecer, ao menos didaticamente, uma passagem de um conteúdo para outro. Quando analisamos a evolução das relações de trabalho no Brasil, percebemos que um ponto culminante para compreender a atualidade foi exatamente a passagem do trabalho escravo para o trabalho livre. A existência de trabalho livre, é algo que na linguagem econômica chamamos de mercado de trabalho, permitem pensar na questão da seguinte forma: os homens são livres para fazerem o que quiserem e também para venderem sua força de trabalho nas condições que conseguirem alcançar. Esta visão, essencialmente liberal (visto que afi rma a liberdade de cada um para agir conforme sua disposição), poderia levar a uma curiosa consequência; se todos aqueles que dispõem de força de trabalho se recusassem a vendê-la, ou simplesmente preferissem organizar “seu próprio negócio”, não haveria quem trabalhasse nas fábricas, no comércio etc. 44 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO Vender força de trabalho é a forma pela qual a maior parte das pessoas, em qualquer lugar do mundo, consegue recursos para satisfazer necessidades básicas como: alimentação, vestuário, moradia etc. É dessa constatação que surgem princípios como o da hipossufi ciência do trabalhador, tido como elo mais fraco da relação laboral. Afi nal, não se trata apenas de escolha, mas de necessidade. No entanto, há pessoas que pela natureza de sua atividade ou pelo modo como determinados serviços são organizados e reconhecidos na sociedade, ou por sua própria escolha, prestam serviços a outras pessoas (físicas ou jurídicas), mas preservam essa liberdade. Um advogado, por exemplo, presta serviço a uma empresa, mas pode fazê-lo de forma autônoma e sem subordinação a ordens de seu contratante. Há outras situações em que as pessoas realizam atividades que correspondem a uma necessidade esporádica de quem contrata. Uma faxineira contratada eventualmente para uma limpeza de escritório; um eletricista contratado para executar uma ligação de energia para uma máquina na fábrica, são exemplos desse tipo de situação. Esta questão, a diferença entre trabalho subordinado e trabalho não subordinado é a essência, da temática deste capítulo. Veremos que, apesar de antiga, é uma questão que permanece controvertida. A temática da subordinação traz como uma questão de fundo o contrato de trabalho e sua natureza. Analisaremos centralmente as condições ou os requisitos de formação do vínculo de emprego, partindo da distinção preliminar entre relações de trabalho e relações de emprego. O capítulo está dividido em cinco seções. A primeira é reservada à Distinção entre relações de trabalho e relações de emprego; na segunda o tema será o Contrato de Trabalho e sua natureza jurídica; na sequência analisaremos os critérios (ou requisitos) de caracterização da relação empregatícia; a partir disso poderemos então analisar a validade jurídica da relação de emprego: elementos jurídico-formais do contrato empregatício; concluindo com as características, classifi cação e condições dos contratos de trabalho. Neste capítulo, assim como no seguinte, trabalharemos com casos práticos, geralmente julgados de tribunais, que sirvam de exemplo para os estudos. Vamos lá! 45 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 DISTINÇÃO ENTRE RELAÇÕES DE TRABALHO E RELAÇÕES DE EMPREGO Neste capítulo nossa preocupação será compreender a distinção entre relações de trabalho e relações de emprego, tendo como pano de fundo a diferença essencial entre trabalho subordinado e trabalho não subordinado. Para isso, começaremos analisando a situação das famílias Martini e Dallegrave e sua experiência de colheita de uva. A notícia mostra uma situação de trabalho envolvendo a solidariedade entre vizinhos e amigos e serve como ponto de partida da nossa análise para compreender o trabalho subordinado como elemento chave da relação de emprego. Leia a notícia a seguir: TEMPO DE COLHEITA Familiares e vizinhos mantêm tradição antiga de se ajudarem uns aos outros durante a época da colheita da uva PARCERIA Martini (E) e Dallegrave (D) se ajudam há 12 anos O perfume que exala dos parreirais da Serra Gaúcha indica a quem transita pela região que o tempo de colheita já começou. E a cada ano, durante o verão, se renova uma tradição de longa data em diversas propriedades, a da ajuda mútua entre famílias de produtores para a retirada dos cachos de uva. Mesmo com os problemas enfrentados no campo, como a falta de sucessores na atividade rural, essa prática se mantém fi rme há décadas. No interior de Caxias do Sul, as famílias Dallegrave e Martini são parceiras há 12 anos na colheita da uva. A cada safra, o trato se renova. Em um primeiro momento, Noeri Martini, sua esposa e o fi lho vão até a propriedade do vizinho Hamilto Dallegrave, em Caravaggio da Terceira Légua, para coletar a fruta. Posteriormente, Hamilto, sua esposa e o fi lho se dirigem até a propriedade dos Martini, em São Pedro da Terceira Légua, e fazem o mesmo processo. 46 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO – É difícil encontrar mão de obra. E também, dessa maneira, a gente mantém as famílias unidas. Quando um precisa do outro, a gente se ajuda – justifi ca Hamilto. Para as duas famílias, o calendário acaba sendo um aliado. Em seus sete hectares de parreiras, os Dallegrave têm variedades que estão entre as primeiras a serem colhidas na safra, como Violeta e Isabel. Por dia, são tiradas 8 toneladas de uva. Sem o auxílio dos amigos, o volume cairia pela metade. Já os Martiniprivilegiam as uvas mais tardias, como Bordô e Niágara, em uma área de seis hectares. Assim, eles conseguem se organizar com facilidade para trabalharem juntos. A maior agilidade na colheita e a economia fi nanceira, decorrente da não contratação de funcionários, são alguns dos frutos resultantes da união. No entanto, um benefício acaba se sobressaindo sobre os demais: o fortalecimento da amizade. – Trabalhando juntos, os dias passam mais rápido. Vamos contando piadas, falando besteira, conversando em meio aos parreirais. Às vezes também falamos assuntos sérios – revela Noeri Martini. Fonte: Disponível em: <http://pioneiro.clicrbs.com.br/especiais-pio/ maisserra/23/central.html>. Acesso em: 19 abr. 2018. a) Situação 1 Essa notícia, que para alguns pode até mesmo evocar lembranças familiares ou de infância, serve de ponto de partida para um questionamento: como podemos descrever a relação de trabalho estabelecida entre as famílias Martini e Dallegrave? Trata-se de uma relação de trabalho? Efetivamente há trabalho envolvido, em sentido amplo podemos falar de uma relação de trabalho, talvez muito mais em sentido sociológico, como abordamos no primeiro capítulo. Se procurarmos um enquadramento jurídico para a história contada anteriormente não o encontraremos em lugar algum. Trata-se de uma relação de solidariedade entre pessoas que têm auxílio mútuo, não só um apoio de mão de obra, mas o estabelecimento de relações de amizade e convívio, e não há normatização jurídica para a amizade. A reiteração da prática corresponde a uma tradição, em termos civis não há qualquer laço de obrigação envolvendo as duas famílias, ou seja, há trabalho envolvido, mas não há criação de nenhum 47 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 tipo de liame jurídico entre as partes envolvidas. Podemos falar de um certo compromisso moral a ligar as famílias. Afi nal, se meu vizinho me ajudou, eu considero justo ajudá-lo, mas não passa disso. b) Situação 2 Tente imaginar uma segunda situação: suponha que uma das famílias (ou ambas) decidam ampliar e modernizar seus parreirais, adotando um novo modelo de plantio das parreiras. Para esse modelo tomam conhecimento de um empreiteiro especializado nesse tipo de serviço, de uma cidade vizinha. A empreitada envolve a colocação de postes, esticamento de arames e todas as demais obras de suporte necessárias e todo material, que envolve um nível médio de tecnologia, é fornecido pelo próprio empreiteiro. Nesse caso, estamos diante de uma relação de trabalho? Qual o liame jurídico que vai se dar entre os contratantes e o empreiteiro? Inicialmente, é importante constatar que há uma relação de trabalho, visto que há trabalho envolvido. Nesse caso há também uma relação contratual. O empreiteiro, que pode ser uma pessoa jurídica ou uma pessoa física – como no caso – vai realizar os trabalhos contratados. Em síntese temos uma relação de trabalho, juridicamente conformada, mas subordinada a normas que não pertencem ao campo do Direito do Trabalho. Vamos entender melhor isso, a partir de uma pequena leitura sobre o contrato de trabalho: Na sociedade moderna distinguem-se, nitidamente, dois grandes ramos de atividade ligada à prestação de trabalho: trabalho subordinado e trabalho autônomo. A expressão “contrato de trabalho” designa um gênero muito amplo, que compreende todo contrato pelo qual uma pessoa se obriga a uma prestação de trabalho em favor de outra (...). A distinção entre trabalho autônomo e trabalho subordinado prendem-se as duas categorias de locação de serviços, vindas do direito romano: “locatio operis” e “locatio operarum”. Na primeira é o resultado do trabalho que importa; na segunda, a própria força de trabalho. Enquanto na “locatio operis” o risco do resultado permanece a cargo de quem se obriga a realizar certa obra (empreiteiro), na “locatio operarum” recai sobre aquele que adquire o direito de dispor do trabalho alheio (empregador). O contrato de 48 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO trabalho, porém, como iremos ver, é um contrato com individualidade especial, distinta de todos os demais contratos de direito privado, não se ajustando, assim, aos moldes do direito romano. Daí não apresentarem tais categorias, para o direito do trabalho, a mesma importância que lhes emprestava a doutrina clássica no direito civil. Dentro do sistema geral de produção industrial – escreve Gallard Folch – “não existe diferença maior entre o que presta um serviço ou executa uma obra, sempre que o façam para um empregador e sob a dependência deste”. Em lugar daquela classifi cação de diferentes espécies de “locação de serviço”, o que se deve ter em conta é a distinção fundamental entre trabalho autônomo e trabalho subordinado. Justifi ca-se, por isso, a afi rmação de Renato Corrado de que “o contrato de trabalho é antes um modo de ser de qualquer contrato que importe numa obrigação de fazer, quando a prestação deva realizar-se em um estado de subordinação, do que, principalmente, um contrato de conteúdo específi co” Fonte: Süssekind, Maranhão e Vianna (1991, p. 222-223, grifo nosso). Esta citação, que você pode complementar com outras leituras sobre o assunto, permite estabelecer uma distinção essencial nas relações de trabalho. Como bem recordam os autores da citação, a industrialização produziu um nível profundo de homogeneização de relações de trabalho e mesmo a empreitada, contrato tipicamente civil, foi reduzido substancialmente, embora não tenha desaparecido e permaneça presente nos contratos de trabalho autônomo (SÜSSEKIND; MARANHÃO; VIANNA, 1991). No exemplo que demos, estaríamos então diante de um contrato de empreitada, previsto nos artigos 610 a 626 do Código Civil. Embora a atividade envolva uma prestação de serviço ela poderia, excepcionalmente, ser enquadrada sob normas de direito civil e corresponder a obrigações de natureza civil, mas apenas para a relação entre o empreiteiro contratado para a obra específi ca de modernização dos parreirais e o contratante. Sendo o empreiteiro uma pessoa jurídica e valendo-se de empregados, naturalmente que a relação entre os empregados e o empreiteiro terá a natureza de uma relação de trabalho ou, mais especifi camente, uma relação de emprego. 49 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 c) Situação 3 Voltemos à questão da colheita da uva e agora tente imaginar como as famílias Martini e Dallegrave poderiam resolver o problema de colher a uva em suas propriedades. Além da hipótese de fazer o trabalho sozinhos, com a ajuda solidária uns dos outros, eles também poderiam dispor de outras possibilidades? Sim. Uma das hipóteses é que eles tivessem, por necessidades próprias do trabalho rural (e não apenas da uva), um ou mais empregados permanentes, que realizariam as atividades cotidianas entre as quais estaria também o cuidado com as videiras e a colheita da uva. Noutra hipótese, supondo que o trabalho de colheita durasse algumas semanas, eles também poderiam contratar um trabalhador safrista, considerando que a atividade de colheita não é permanente e o período de trabalho tem sua duração condicionada pelas variações estacionais da atividade agrária, e uma última hipótese seria a contratação de trabalhadores por pequeno prazo, por alguns dias, por exemplo, visto que se trata de atividade temporária de curta duração. Todas estas hipóteses estão reguladas pela lei 5.889/73 que estatui normas reguladoras do trabalho rural. Embora a regulamentação do trabalho rural se dê pela lei 5.889/73 é importante lembrar que a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho se consolidou no sentido da aplicação de dispositivos da CLT ao trabalhador rural, como no acórdão a seguir: Horas In itinere. Trabalhadorrural. Aplicabilidade do Artigo 58, § 2º, da CLT. Equiparação de Direitos Consagrada no ARTIGO 7º, CAPUT, da Constituição Federal. A Constituição Federal de 1988 passou a garantir, em seu artigo 7º, igualdade de direitos aos trabalhadores urbanos e rurais, revelando-se discriminatório e inconstitucional o entendimento de que somente o empregado urbano teria direito à garantia das horas in itinere. O citado dispositivo constitucional contempla expressamente os direitos dos trabalhadores ali enumerados, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, o que leva à conclusão de que o rol não é taxativo. Dessarte, se as horas in itinere prestadas 50 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO pelo reclamante, neste caso, ultrapassavam sua jornada de trabalho, como se extrai claramente do quadro fático delineado pelo acórdão regional, sua natureza de horas extras é inegável, consoante o teor do item V da Súmula nº 90 desta Corte, devendo ser remuneradas com o adicional de serviço extraordinário de, no mínimo, 50% assegurado pelo inciso XVI do artigo 7º da Constituição Federal a todos os trabalhadores, urbanos e rurais. Assim, o direito às horas in itinere é vantagem também extensiva ao trabalhador rural. Precedentes desta Corte. Recurso de revista não conhecido. Fonte: Pimenta (2013, s. p.). O artigo 58 § 2º. da CLT previa o pagamento das horas in itinere, conforme as previsões legais a seguir. As modifi cações introduzidas pela Reforma Trabalhista (lei 13.467/2017) nas relações de trabalho serão analisadas detidamente no último capítulo deste livro. § 2° O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução. No entanto, com a lei 13.467 de 2017, alterou este dispositivo para a seguinte redação: § 2º O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador. Quando pensamos nos exemplos anteriores é possível verifi car uma linha divisória fundamental para o enquadramento jurídico da situação envolvendo as relações de trabalho para a colheita da uva das famílias Martini e Dallegrave. 51 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 Paul Colin descreve deste modo a subordinação: Por subordinação entende-se um estado de dependência real criado por um direito, o direito de o empregador comandar, dar ordens, donde nasce a obrigação correspondente para o empregado de se submeter a essas ordens. Eis a razão pela qual chamou-se a esta subordinação de jurídica, para opô-la, principalmente, à subordinação econômica e à subordinação técnica que comporta também uma direção a dar aos trabalhos do empregado, mas direção que emanaria apenas de um especialista. Trata-se aqui, ao contrário, do direito completamente geral de superintender a atividade de outrem, de interrompê-la à vontade, de lhes fi xar limites, sem que para isso seja necessário controlar continuamente o valor técnico dos trabalhos efetuados. Direção e fi scalização, tais são então os dois polos da subordinação jurídica (COLIN apud MORAES FILHO, 2000, p. 242-243). Excluídos os laços de amizade e solidariedade que a rigor, não geram qualquer vínculo de natureza jurídica, as situações 2 e 3 nos permitem materializar duas situações emblemáticas do modo como podem se estabelecer relações de trabalho: em um trabalho autônomo, noutro trabalho subordinado. Esta é uma distinção fundamental que nos permite compreender a diferença entre relação de trabalho e relação de emprego. Relação de trabalho é o gênero, que compreende o trabalho autônomo, eventual, avulso etc. Relação de emprego trata do trabalho subordinado do empregado em relação ao empregador. (...) Contrato de trabalho é gênero, e compreende o contrato de emprego. Contrato de trabalho poderia compreender qualquer trabalho, como o do autônomo, do eventual, do avulso, do empresário etc. Contrato de emprego diz respeito à relação entre empregado e empregador e não a outro tipo de trabalhador. Daí por que se falar em contrato de emprego, que fornece a noção exata do tipo de contrato que estaria sendo estudado, porque o contrato de trabalho seria o gênero e contrato de emprego, a espécie (MARTINS, 2016, p. 160). Note que o autor introduz a questão do contrato de trabalho, mas procura especifi car uma diferença entre contrato de trabalho e contrato de emprego. A distinção essencial entre uma e outra está na subordinação, característica essencial da relação de emprego. 52 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO Se você acessar a bibliografi a verá que o próprio Sergio Pinto Martins acaba por utilizar a expressão contrato de trabalho para caracterizar a relação de trabalho subordinado. A explicação é simples: mesmo artigo 442 da CLT utiliza a expressão contrato de trabalho com este sentido. O que se tentou esclarecer aqui é que a caracterização de uma relação de emprego envolve subordinação, ao passo que relação de trabalho pode envolver uma gama maior de possibilidades, como a do trabalho autônomo, por exemplo. Então, uma relação de trabalho pode se dar sem necessariamente envolver uma relação de emprego? A resposta é sim. O exemplo do carpinteiro/empreiteiro mencionado é uma boa demonstração disso, mas poderíamos usar outros exemplos: se uma empresa contrata um eletricista/especialista para instalar um equipamento de ar condicionado, naturalmente contrata uma prestação de serviço, mas não estabelece uma relação de subordinação. O que se contrata é o resultado. Quando falamos de relação de emprego (ou contrato de emprego, ou mesmo contrato de trabalho conforme a explicação anterior referente ao texto da própria CLT) estamos falando de “um pacto de atividade, pois não se contrata um resultado” (MARTINS, 2016, p. 161); o que se contrata é a própria prestação de serviços, o exercício da força de trabalho. Embora esta distinção seja na aparência, algo simples, não é bem assim. Para ler mais sobre a questão da subordinação e relação e emprego você pode acessar o artigo seguinte: <http://www.trt3.jus.br/ escola/download/revista/rev_86/paulo_mercon.pdf>. Na seção seguinte analisaremos com mais detalhes a questão do contrato de trabalho (como contrato de emprego, ou seja, de trabalho subordinado), mas por ora, podemos tomar, com razoável convicção o seguinte: relação de trabalho (ou contrato de trabalho) pode ser compreendida como gênero, que não se confunde com relação de emprego (ou contrato de emprego) que pode ser considerada como uma modalidade de contrato de trabalho (NASCIMENTO, 2011). A distinção 53 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 entre uma e outra não reside necessariamente na denominação que se dê a ela, mas no elemento essencial de distinção entre trabalho autônomo e trabalho subordinado. A subordinação então serve de característica distintiva entre o que chamamos de relação de trabalho e o que chamamos de relação de emprego. A questão da subordinação, por seu turno, torna-se um tanto mais complexa com as transformações nas relações de trabalho (em sentido sociológico e em sentido econômico, ou seja, como relações de produção – ou para a produção). Novas tecnologias e técnicas de trabalho, novas formas e espaços para a realização do trabalho, podem impactar sobre a visibilidade desse elemento subjetivo importante (a subordinação).Até mesmo modifi cações normativas ou o uso de formas contratuais diversas podem produzir também visões aparentes diversas, ocultando um vínculo de subordinação existente, por exemplo. Podemos resumir de forma simples, que enquanto a expressão relação de trabalho tem sentido amplo, descrevendo formas variadas de prestação de serviço e, principalmente, englobando trabalho autônomo, a expressão relação de emprego se refere ao trabalho subordinado que gera um vínculo especial entre empregador e empregado. Relação de trabalho (ou contrato de trabalho) pode ser compreendida como gênero, que não se confunde com relação de emprego (ou contrato de emprego) que pode ser considerada como uma modalidade de contrato de trabalho (NASCIMENTO, 2011). A expressão relação de emprego se refere ao trabalho subordinado que gera um vínculo especial entre empregador e empregado. Atividade de Estudos: 1) Agora, ao modo como fi zemos com os exemplos envolvendo as famílias Martini e Dallegrave, imagine outras situações do seu dia a dia que lhe causam dúvidas envolvendo relações de trabalho. Procure localizar jurisprudências sobre essas situações que você pensou, e também posições doutrinárias sobre cada uma delas. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ 54 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO CONTRATO DE TRABALHO E SUA NATUREZA JURÍDICA Analisaremos agora o contrato de trabalho no sentido que lhe dá a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT em seu artigo 442, Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego, ou seja, tomaremos o contrato de trabalho em seu sentido estrito de vínculo, entre empregador e empregado, marcado pela subordinação. Contrato de trabalho “strictu sensu” é o negócio jurídico pelo qual uma pessoa física (empregado) se obriga, mediante o pagamento de uma contraprestação (salário), a prestar trabalho não eventual em proveito de outra pessoa, física ou jurídica (empregador), a quem fi ca juridicamente subordinada (SÜSSEKIND; MARANHÃO; VIANNA, 1991, p. 231). Sobre este contrato estabeleceram ao longo do tempo, visões doutrinárias distintas sobre sua natureza jurídica ou sobre as obrigações a que se submete, sobretudo o empregado. Um dos pontos chave da temática está na chamada autonomia da vontade e como ela se manifesta na formação da relação de emprego. Estariam as partes, livres para formular os termos de seu contrato? Já sabemos que não. Se por um lado, pode-se dizer que a regulação normativa das relações de trabalho (por alguns tida como excessiva) serve como limitador da autonomia contratual, por outro também, pode-se afi rmar que a posição do indivíduo, que nada tem além de sua força de trabalho, representa um limitador na manifestação autônoma de vontade. Fato é que o estabelecimento de um contrato de trabalho se encontra conformado a um conjunto de normas legais que restringem ou limitam a liberdade dos contratantes, ao ponto de que alguns autores chegam a negar a existência de um contrato na relação de emprego. É sempre bom lembrar que a acusação de que as normas estariam a limitar a manifestação de vontade das partes não se presta apenas ao direito do trabalho e à disciplina do contrato de trabalho. Afora grandes agentes econômicos – que negociam condições em níveis mais complexo de articulação de seus interesses econômicos – contratos do direito comum (civil, empresarial, consumidor) também vão conter restrições iguais à liberdade de contratar, por exemplo, contrato de seguro; contrato de locação; contrato de crédito etc. De um lado estas limitações virão da própria posição econômica subordinada de algum dos contratantes ou de outra dos dispositivos legais, que visam proteger algum dos contratantes que se encontrem em posição mais frágil na relação contratual. 55 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 A questão que divide então as análises teóricas é se haveria ou não relação contratual de trabalho e o que isto signifi ca. A teoria contratualista considera a relação entre um empregado e um empregador como um contrato. A teoria anticontratualista, por sua vez, considera que não há relação contratual entre empregado e empregador. Vejamos cada uma delas. a) Teoria Anticontratualista A teoria anticontratualista considera que a relação estabelecida entre empregado e empregador não tem natureza contratual. Divide-se em duas subteorias: teoria da instituição e teoria da relação de trabalho. • Teoria da instituição O ponto de partida desta teoria explicativa é aquele segundo o qual a empresa é uma instituição. Esta é uma explicação que em parte remete ao direito empresarial e à teoria do italiano Alberto Asquini, para quem a empresa é um fenômeno poliédrico. O conceito de empresa é o conceito de um fenômeno poliédrico, o qual tem, sob o aspecto jurídico, não um, mas diversos perfi s em relação aos diversos fenômenos que o integram. No Brasil, Fábio Konder Comparato, nos estudos do direito empresarial, adota uma semelhante perspectiva, de observar a empresa como instituição. “Se quiser indicar uma instituição social que, pela sua infl uência, dinamismo e poder de transformação, sirva de elemento explicativo e defi nidor da civilização contemporânea, a escolha é indubitável: essa instituição é a empresa” (COMPARATO, 1995, p. 3, grifo nosso). Tal visão toma como referência a grande empresa capitalista, a sociedade anônima, regida por um estatuto, em que este prevê as condições de trabalho sob o poder diretivo e disciplinar do empregador. Compreendida a empresa como fenômeno subjetivo (que se distingue da empresa x estabelecimento e também se distingue do empresário – pessoa jurídica), ou seja, como organização da atividade econômica, a relação do empregado com esta seria uma natureza institucional e não contratual. 56 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO Essa concepção é encontrada na CLT no art. 2º – que menciona a empresa como empregador (quando na verdade o empregador é a pessoa física ou jurídica); e também nos artigos 10 e 448 que consideram que a alteração na estrutura jurídica da empresa ou em sua propriedade, preservam-se os direitos dos seus empregados e preservam-se também os contratos de trabalho existentes (MARTINS, 2016). • Teoria da relação de trabalho Segundo esta teoria, defendida por autores alemães, não existe uma vontade na constituição da relação de trabalho. O trabalhador se submeteria a um estatuto, formado por um conjunto de: dispositivos legais, regulamentos da empresa, contrato de trabalho e negociação coletiva. Tal estatuto defi niria as condições de trabalho. “O empregador apenas dirige a prestação do serviço. Não há qualquer discussão sobre as condições de trabalho” (MARTINS, 2016, p. 167). A diferença entre uma e outra das teorias anticontratualistas é que a primeira (teoria da instituição) não despreza totalmente a manifestação de vontade de empregados e empregadores, ao passo que na teoria da relação de trabalho não há qualquer consideração sobre o elemento de vontade. b) Teoria Contratualista Segundo esta teoria a relação estabelecida entre empregador e empregado é um contrato. Para essa teoria existe uma manifestação, de vontade das partes que o formam. Embora possa falar em restrições, a autonomia da vontade, pela lei, por regulamentos e outros dispositivos,ainda assim, permanece o efeito jurídico da manifestação de vontade. Vamos usar dois pequenos extratos de textos que permitem verifi car fundamentos dessa teoria. Você poderá buscar outros subsídios teóricos para sua compreensão: O empregador apenas dirige a prestação do serviço. Não há qualquer discussão sobre as condições de trabalho Para essa teoria existe uma manifestação, de vontade das partes que o formam. Texto 1: Impressionados com essa diminuição relativa da disciplina contratual da relação de trabalho, negam muitos autores a existência do contrato, e advogam a substituição do conceito de contrato de trabalho pelo de relação de trabalho. Na mesma linha de ideias, 57 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 sustentam outros que essa relação resulta da simples inserção ou da ocupação de fato do trabalhador na empresa. O empregado não mais “contrata” com o empregador: torna-se membro de uma instituição. É a “institucionalização” da relação de trabalho imposta pelo fi gurino da moda. Parece-nos – “data vênia” – que vai em tudo isto, a par do gosto pela novidade, uma grande confusão a respeito do que se deve entender, juridicamente, por contrato. Contrato – é a lição da escola – é um acordo de duas ou mais vontades tendo em vista produzir efeitos jurídicos. Ora, se o empregado é admitido para trabalhar na empresa, essa admissão pressupõe, como é lógico, um acordo de vontade: um contrato, pois dir-se-á que a manifestação de vontade do empregado se resume em um ato de adesão a condições prefi xadas pelo empregador ou pela lei, mas como fi ga De Page, “nenhum texto ou princípio de direito exige, para a validade de um acordo de vontades, que o conteúdo do contrato seja estabelecido pelas duas partes ou tenha sido objeto de negociações e discussões preliminares”. [...] O contrato pressupõe a liberdade de contratar ou não; a igualdade dos contratantes no plano jurídico; e o respeito à palavra empenhada, à fé contratual: dignifi ca a pessoa humana do trabalhador. A noção do contrato traduz a ideia de uma união para produzir e do trabalho livremente aceito. A relação institucional, como ressalta Ripert, implica, ao revés “a obediência imposta no interesse da empresa, de que não participa o empregado: mais fortemente que a noção clássica do contrato, acentua a subordinação de homens pertencentes a uma classe social e a manutenção da servidão sob a forma do salariado” (SÜSSEKIND; MARANHÃO; VIANNA 1991, p. 225-226). Texto 2: A teoria predominante entende que o contrato de trabalho tem natureza contratual. Trata-se de um contrato, pois depende única e exclusivamente da vontade das partes para sua formação. Há, portanto, um ajuste de vontades entre as partes. Os efeitos do contrato não derivam apenas da prestação de serviços, mas daquilo que foi ajustado entre as partes. A execução é decorrente do que foi ajustado. O mero ajuste de vontades produz, portanto, efeitos jurídicos. A efi cácia jurídica ocorre desde o ajuste das partes, adquirindo efi cácia com a execução do trabalho. A liberdade em assentir, em ajustar o contrato de trabalho, é fundamental. O trabalho do empregado é livre, assim como é livre a vontade da pessoa passar a trabalhar para a empresa. Como bem esclarece 58 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO Amauri Mascaro Nascimento (2011, p. 149 apud MARTINS, 2016, p. 169-170), “ninguém será empregado de outrem senão por sua própria vontade. Ninguém terá outrem como seu empregado senão também quando for da sua vontade. Assim, mesmo se uma pessoa começar a trabalhar para outra sem que expressamente nada tenha sido combinado entre ambas, isso só será possível pela vontade ou pelo interesse das duas”. A existência do contrato de trabalho pode também ocorrer com a prestação de serviços se que o empregador a ela se oponha, caracterizando o ajuste tácito. Note que os textos reproduzidos anteriormente, aos quais você aluno poderá acrescentar outras leituras, enfatizam o aspecto do acordo de vontades no estabelecimento da relação de emprego. Naturalmente não se está falando do contrato de trabalho num sentido formal, ou seja, como um documento escrito a registrar as manifestações de vontade dos contratantes. Ao contrário, a intepretação das normas do direito do trabalho se não rejeita ao menos relativiza o formalismo, como se vê no princípio da primazia da realidade. Recorde-se que o artigo 442 da CLT descreve o contrato de trabalho como “o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego”. De acordo com Sérgio Pinto Martins (2016, p. 137), explicando o princípio da primazia da realidade, “no Direito do Trabalho os fatos são muito mais importantes que os documentos. [...] São privilegiados, portanto, os fatos, a realidade sobre a forma ou a estrutura empregada”. c) Outras Teorias Além das teorias apresentadas a doutrina aponta outras teorias do contrato de trabalho, chamadas de teorias mistas: (1) a teoria da concepção tripartida do contrato de trabalho; e (2) a teoria do contrato de trabalho como fato. Qual seria a teoria adotada pela CLT? 59 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 Atividade de Estudos: 1) Agora, o desafi o é você procurar conhecer as teorias mistas do contrato de trabalho apresentadas anteriormente, e também entender qual a teoria adotada pela CLT. Procure artigos científi cos e doutrinas que tratam do assunto e elabore uma fi cha- resumo das visões encontradas sobre o tema, especialmente, sobre qual a teoria adotada na CLT. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ CRITÉRIOS (OU REQUISITOS) DE CARACTERIZAÇÃO DA RELAÇÃO EMPREGATÍCIA Conforme abordagens anteriores, estamos discutindo a relação de trabalho em sua natureza jurídica (ou em sentido jurídico) específi ca de contrato de trabalho que envolve subordinação, e, portanto, uma relação entre empregador e empregado. O contrato de trabalho aqui discutido é aquele estabelecido entre dois contratantes, um na qualidade e empregador, outro na qualidade de empregado. Como já visto, os dispositivos da CLT admitem que o contrato de trabalho se forme a partir até mesmo de um acordo tácito, ou seja, sem a necessidade de uma manifestação expressa de vontades por parte dos contratantes. Assim, é da verifi cação de determinados requisitos que se extrai, vida de regra, a existência ou não do vínculo jurídico específi co entre empregador e empregado. Nesta seção, analisaremos pontualmente cada uma dessas condições ou requisitos que, unidos, confi guram uma relação de emprego (ou contrato de trabalho strictu sensu como podem alguns também denominar). 60 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO Utilizaremos, para cada um dos requisitos/critérios um ou dois exemplos, com julgados de tribunais do trabalho, para exercitar a compreensão da matéria. De pronto, para introduzir o assunto, listamos os requisitos do contrato de trabalho: continuidade, subordinação, onerosidade, pessoalidade e alteridade. a) Continuidade (ou não eventualidade) O primeiro critério que permite aferir a existência ou não de um contrato de trabalho (vínculo entre empregador e empregado) é a continuidade da relação de trabalho. Isso implica que aquele que presta serviços eventualmente não é empregado. O exemplo da empreitada, dado lá no início, e mais especialmente do autônomo que atende a uma necessidadenão permanente do empregador, podem demonstrar situações de não continuidade. A continuidade indica que há um trato sucessivo na relação entre as partes e que tem natureza de permanência. O contrário da continuidade é a eventualidade. Neste sentido, podemos considerar que o requisito da continuidade se demonstra em oposição à eventualidade, ou seja, quando se considera que o trabalho é não eventual. Em sentido contrário, a contratação em caráter eventual pode ser descaracterizada se demonstrado que a relação de trabalho se deu de modo contínuo. A seguir, trazemos um exemplo para que você possa estudar: A continuidade indica que há um trato sucessivo na relação entre as partes e que tem natureza de permanência. PROCESSO Nº TST-RR-127300-08.2005.5.17.0151. ACÓRDÃO. (1ª Turma) GMLBC/cj/gs [...] VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO EVENTUALIDADE 1. A Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 2º, ao eleger a não eventualidade como elemento fático-jurídico caracterizador da relação de emprego, rejeitou a teoria da descontinuidade na caracterização do referido pressuposto da relação empregatícia. 61 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 2. Registrado pela Corte de origem, no exame do conjunto fático- probatório dos autos, que a reclamante laborou para a reclamada, como garçonete, no período de 12/11/2004 a 9/11/2005, de forma não eventual, ainda que descontínua, na atividade fi m da empresa, e que restou comprovada a subordinação jurídica. Recurso de revista não conhecido. [...] 2.2 VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO EVENTUALIDADE O Tribunal Regional manteve a sentença mediante a qual se reconhecera o vínculo de emprego entre as partes e se declarara a unicidade contratual. Consignou, para tanto, os seguintes fundamentos às fl s. 763/767 (grifos acrescidos): 2.2.2 Vínculo de emprego. garçonete. nulidade dos contratos de trabalho por tempo determinado. unicidade contratual. anotação e retifi cação da ctps da reclamante Insurge-se a primeira reclamada contra a r. sentença que reconheceu o vínculo empregatício, declarou nulos os contratos de trabalho por prazo determinado e determinou a anotação e a retifi cação da CTPS da reclamante. Não lhe assiste razão. Os elementos probatórios dos autos corroboram as assertivas da autora no sentido de que manteve com a reclamada uma relação de emprego ininterrupta durante o período compreendido entre 12/11/2004 a 09/11/2005. De fato, as cópias da CTPS da autora, acostadas às fl s. 17/20, demonstram que a primeira reclamada, na tentativa de furtar-se de suas responsabilidades trabalhistas, anotou apenas parte do contrato de trabalho, nos períodos de 18/12/2004 a 09/02/2005, 24/03/2005 a 27/03/2005, 21/04/2005 a 24/04/2005, 16/07/2005 a 17/07/2007, 30/07/2005 a 31/07/2005, 09/09/2005 a 11/09/2005 e 08/10/2005 a 09/10/2005. Na sua contestação, a própria recorrente demonstra, no quadro de fl s. 103/104, que a reclamante trabalhou durante muitos meses não anotados na CTPS da obreira, não merecendo prosperar a alegação de que a reclamante trabalhava como “diarista” em certos períodos e como empregada em outros. Nesse passo, há de se ater para o fato da essencialidade dos serviços de garçonete prestados pela obreira às reclamadas e para o fato de que as atividades das rés são permanentes, o que revela a confi guração da fraude trabalhista. Ora, as reclamadas, como observado nos autos, tratam-se de empresas que possuem 62 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO um complexo de lazer composto de bares e restaurantes de renome no Estado do Espírito Santo (Multiplace Mais, Hotel Meaípe, Tribo de Gaia e Forte Enseada) e, mesmo que o funcionamento dos estabelecimentos não seja habitual, e que a abertura das casas comerciais se dê em dias predeterminados, conforme alegado pela recorrente, é certo que, apesar de não trabalhar durante todos os dias, a função desempenhada pela reclamante estava inserida na atividade fi m das reclamadas, não podendo ser considerada eventual. Não obstante houvesse preponderância da prestação de serviços no verão, a reclamante também prestou serviços em outras épocas e fi cava aguardando ser chamada para trabalhar em eventos, estando assim vinculada ao contrato tácito que as partes mantinham. Nesse sentido, o depoimento da preposta da primeira reclamada, in verbis: “a CTPS da reclamante só foi registrada em relação aos períodos de verão e alguns feriados prolongados, que então quando o labor se dava em dia fora de feriado não havia registro na CTPS” (fl s. 274). Os contratos de trabalho por prazo determinado celebrados seriam válidos somente se não houvesse a prestação de serviços habitual e se a reclamante não tivesse continuado a trabalhar na baixa temporada, o que não ocorreu, fazendo incidir a hipótese dos artigos 450 e 451, ambos da CLT. Presentes a pessoalidade, a não eventualidade na prestação dos serviços, a subordinação da reclamante às empresas reclamadas, a onerosidade do contrato e o cumprimento de horário previamente estipulado resta evidenciada a existência dos elementos essenciais da relação de emprego, sendo certo que a prestação laboral ocorreu de forma ininterrupta durante todo o período indicado na inicial. Por outro lado, não há se falar em temporariedade dos contratos de trabalho fi rmados com a autora e sequer há a possibilidade de considerá-los separadamente, não podendo ser aplicada a regra do artigo 453 da CLT, diante da prova contundente de existência de fraude nas rescisões. Dessa forma, deve ser mantida a r. sentença que reconheceu o vínculo empregatício, declarou nulos os contratos de trabalho por prazo determinado, reconheceu a unicidade contratual, e determinou a anotação e a retifi cação da CTPS da reclamante no período de 12/11/2004 a 09/11/2005. Fonte: Disponível em: <https://tst.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/133942934/ recurso-de-revista-rr-1273000820055170151>. Acesso em: 26 abr. 2018. 63 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 Depois dessa leitura, você considera que compreendeu a questão? Para reforçar vamos dividir didaticamente: • 1º. O trabalho eventual pode (e geralmente está) associado a um trabalhador autônomo, contratado para atender uma demanda que não faz parte das atividades habituais da empresa, por exemplo, o contrato de um eletricista para fazer um reparo na rede elétrica interna. Ainda que o trabalho possa durar alguns dias ou mesmo algumas semanas, a rigor trata-se de algo eventual, não contínuo. O próprio contrato será um contrato de resultado, e não de trabalho. O que se quer, é a rede elétrica consertada e funcionando, não é mesmo? • 2º. É importante não confundir trabalho eventual com trabalho temporário, ou mais precisamente, com contrato de trabalho temporário, regido pela Lei 6.019/74. No caso do trabalho temporário, a própria lei dispõe que não poderá durar mais de três meses. Ademais no contrato de trabalho temporário, o objetivo é suprir necessidades temporárias de substituição de pessoal, e há uma relação triangular envolvendo o empregado, uma empresa de trabalho temporário (ETT) e a empresa que demanda o trabalho, sendo que o empregado fi ca subordinado a esta última. • 3º. Há também outra modalidade de relação de trabalho que é a terceirização. Neste caso, o empregado é subordinado e mantém vínculo com uma empresa que é contratada para realizar atividades em uma empresa contratante. • 4º. A Reforma Trabalhista recente introduziu outras modifi cações no que toca à continuidade da relação de emprego, com a fi gura do trabalho intermitente. Analisaremos a questão no último capítulo. • 5º. Por fi m, é importante também distinguir essas situações do contrato de trabalho por tempo determinado. Neste caso, a própriaCLT admite que o contrato de trabalho seja estipulado por prazo certo, e estabelece as situações em que isso pode ocorrer. Além do mais, há outras situações legais em que se admite o contrato por tempo determinado: o contrato por safra da Lei 5.889/73; o atleta profi ssional na Lei 9.615/98; os artistas na Lei 6.533/78; entre outros. Frise-se que a análise da presença de condições que demonstrem continuidade da prestação tanto serve para a) descaracterizar a eventualidade, demonstrar a existência de um contrato de trabalho (ou vínculo empregatício), como para b) demonstrar a permanência e continuidade de um vínculo já existente e tido como temporário ou descontínuo. 64 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO b) Subordinação A subordinação indica a posição dos contratantes. O empregado presta serviço sob dependência e sob a direção daquele que o contratou. Neste ponto se encontra a diferença entre o trabalho autônomo e o trabalho subordinado. No trabalho autônomo o próprio prestador do serviço organiza seu trabalho. No trabalho subordinado, caracterizador do vínculo entre empregador e empregado, é o empregador que organiza a prestação do serviço, dirigindo o trabalho do contratado e determinando a realização de atividades. Lembremos o que diz o art. 3º da CLT: Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual. A expressão “sob dependência” tem certamente um sentido vago, podendo mesmo ser interpretada como dependência econômica, mas o sentido que lhe empresta a CLT é certamente um sentido jurídico, visto que é este elemento – subordinação que caracteriza o contrato de trabalho. Tem-se que a subordinação é decorrente da existência do contrato de trabalho e a caracterizadora deste contrato. Sem subordinação não se pode falar em contrato de trabalho, no mesmo passo que a subordinação jurídica “resulta de um contrato: nele encontra seus fundamentos e seus limites” (SÜSSEKIND, MARANHÃO; VIANNA, 1991, p. 236). Por outro lado, a subordinação decorre de uma questão elementar: não é possível separar a força de trabalho da fi gura do trabalhador e, é este o motivo da subordinação. Claro, que está não se trata de subordinação da pessoa nos sentidos dados pela “servidão” e pela “escravidão” de tempos pretéritos. O contrato de trabalho, guarda particularidades em relação aos demais contratos presentes na sociedade, no que reside a própria raiz da existência da disciplina do Direito do Trabalho. No trabalho autônomo o próprio prestador do serviço organiza seu trabalho. No trabalho subordinado, caracterizador do vínculo entre empregador e empregado, é o empregador que organiza a prestação do serviço. Sem subordinação não se pode falar em contrato de trabalho 65 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 Süssekind, Maranhão e Vianna (1991, p. 235), esclarecem um pouco mais a questão: De um lado, temos a faculdade do empregador de utilizar- se da força de trabalho do empregado – um dos fatores de produção de que dispõe – no interesse do empreendimento cujos riscos assumiu; de outro, a obrigação do empregado de se deixar dirigir pelo empregador, segundo os fi ns que este se propõe alcançar no campo da atividade econômica. Exatamente porque o trabalho é um dos fatores de produção, colocado à disposição do empregador mediante o contrato de trabalho, decorrente deste contrato, implica – como salienta D’Eufemia – uma certa indeterminação do conteúdo de cada prestação e, conseguintemente, o direito do empregador de defi nir, no curso da relação contratual e nos limites do contrato, a modalidade da atuação concreta do trabalho (faça isso, não faça aquilo; suspenda este serviço; inicie aquele). Ora, a subordinação é uma consequência desse direito (grifo nosso). Veja que ao empregador é dado este controle por ser ele o organizador dos fatores de produção, e pelo fato de ser também o trabalho um fator de produção. Nessa condição de organizador da atividade econômica, na qual o serviço prestado está implicado, é onde o empregador adquire o direito de comando sobre a atividade do empregado, reforçado pelo trato sucessivo das prestações (de força de trabalho) que o empregado se obriga a entregar diariamente ao empregador. Veremos adiante, que a subordinação também pode (e deve) encontrar resistência em determinadas situações. O poder de direção do empregador se dá em três dimensões: • Poder de organização ou de direção e comando O empregado, que não detém poder de direção da atividade, e, portanto, submete-se a terceiro, é o empresário que organiza os fatores de produção ou prestação de serviços e colhe os resultados da atividade econômica (NASCIMENTO, 2011). É importante sempre recordar que tal, poder é exercido nos limites do contrato e no contexto da fi nalidade deste. • Poder de controle Representa o poder de acompanhar e verifi car o cumprimento da prestação de trabalho determinada. Representa a possibilidade de fi scalizar e dirigir a prestação de serviços realizada por terceiro (o empregado). Basta recordar que 66 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO o art. 2º da CLT defi ne Empregador como “a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço” (grifo nosso). • Poder disciplinar Tem como fundamento o inadimplemento da obrigação contratual. Em nossa legislação trabalhista são admitidas como sanções disciplinares aplicáveis pelo empregador: a advertência, a suspensão, nos termos do artigo 474 da CLT e a despedida. Não existe penalidade de multa. A legislação e a jurisprudência não admitem pena de multa ao empregado, mas há uma situação em que ela é admitida: no caso de atleta profi ssional de futebol, de acordo com a Lei 6.354/76, e mantida a vigência por disposição na Lei 9.615/98. Lembre-se, os poderes diretivos do empregador não são aleatórios ou ilimitados. O dever de obediência do empregado vai até onde vai o contrato. Em outros termos é possível aos empregados resistir a uma ordem injusta se ela colocá-lo em risco, ou seja, se fugir da natureza do trabalho contratado, ou sendo ilícita a ordem. Você pode aprofundar estudos sobre a questão do poder de direção do empregador nos artigos a seguir. Disponível em: <http:// siabi.trt4.jus.br/biblioteca/acervo/Doutrina/artigos/santos_2008_ limites_ao_poder_disciplinar_do_empregador.pdf> e <https:// juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/1939/94403/2014_allan_ nasser_abuso_poder.pdf?sequence=1>. Agora, podemos retomar a ideia que vem nos guiando nesta parte dos estudos, a subordinação como um dos requisitos para a concretização do contato de trabalho (vínculo de emprego). Para facilitar o estudo, como no requisito anterior, apresentaremos dois trechos de julgados sobre o tema. 67 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 CASO 1. 00723-2011-092-03-00-1-RO EMENTA: RELAÇÃO DE EMPREGO. SUBORDINAÇÃO IMPLÍCITA O conceito de subordinação não se confunde com o cumprimento de horário e convivência de empregado e empregador, porque, embora exista a possibilidade material de dar ordens ou controlar diretamente o cumprimento do trabalho, a exteriorização da subordinação em atos de comando pode ocorrer de maneira irregular e variável, muitas vezes imperceptível (ou desnecessária), sofrendo um processo de diluição, até quase desaparecer, à medida em que o trabalho se tecnisa e se intelectualiza. Arelação de emprego se estabelece independentemente da vontade das partes, submetida apenas à existência concomitante dos elementos que a informam. [...] 2 – JUÍZO DE MÉRITO 2.1 – RECURSO DO RECLAMANTE DA RELAÇÃO DE EMPREGO Insurge-se o reclamante contra a improcedência do pedido de reconhecimento de vínculo empregatício com a Top Line Ltda., primeira reclamada, que forma grupo econômico com as demais. Segundo a narrativa na petição de ingresso, fora admitido pela primeira reclamada em 12/12/2008, para exercer a função de motorista de caminhão, com uso de veículo próprio e mediante formalização de um suposto contrato de prestação de serviço autônomo; a tarefa principal e rotineira era entrega de móveis, que se inseria no objeto de empresa da reclamada; trabalhava de forma subordinada, tendo de cumprir as regras fi xadas para os empregados, como procedimentos de controle de atividades através de relatórios e cumprimento de horário; recebia salário fi xo mensal; o contrato durou 23 meses, tendo sido rompido sem justa causa e por iniciativa da reclamada, em 12/11/2010. Como início de prova o autor ofereceu o anexo fotográfi co de fl s. 4050, em que ele se mostra trajado com uniforme da Top Móveis, bem como o seu caminhão caracterizado pelas cores, logomarca e telefone dessa empresa. Nas mesmas fotos o reclamante aparece usando um crachá aparentemente da Top Móveis, a se ver pelas cores. 68 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO A defesa conjunta das reclamadas, por seu turno, confi rmou a existência do grupo econômico e admitiu tenha havido a prestação de serviços, mas sob natureza diversa da pretendida pelo autor, pois não havia pessoalidade nem subordinação e tampouco alteridade, isso porque ele podia enviar um profi ssional substituto caso não pudesse executar o serviço pessoalmente, podia estabelecer o horário que mais lhe conviesse e utilizava o seu próprio caminhão, como dito na inicial, assumindo todas as despesas de manutenção do veículo. Por isso, concluiu a defesa, não concorriam os elementos formadores da relação de emprego, razão pela qual o trabalho do reclamante era de natureza autônoma. [...] O depoente Rodrigo da Silva Mora, único ouvido a requerimento do autor, declarou que este tinha horário a cumprir, de 7h a 18h de segunda a sexta-feira e no sábado de 7h a 12h, e sempre iniciava e encerrava a jornada na sede da empresa (fl . 152). As três testemunhas das reclamadas depuseram no sentido de que não havia pessoalidade e subordinação, porém em alguns pontos fi zeram ruir tal afi rmação, que era a linha-mestra de sustentação da defesa: - A testemunha Trindade Vilela de Jesus declarou que mesmo se não houvesse entregas a fazer durante todos os dias da semana o reclamante recebia a remuneração; o uniforme que aparece na foto foi efetivamente entregue ao reclamante; a reclamada forneceu um rádio Nextel ao reclamante, pelo qual este era acionado (fl s. 152153); - O depoente José Luiz Correa Damasceno também disse que o reclamante usava camisa da reclamada e um rádio Nextel por ela fornecido (fl . 154); - O depoente José Marcos Leandro afi rmou que o reclamante comparecia todos os dias e usava camisa da empresa; o reclamante já saía da empresa, para a rota de entregas, com as orientações pré- determinadas (fl .155). Percebe-se que tanto o preposto quanto as testemunhas arroladas pelas reclamadas bem se esforçaram na tentativa de demonstrar autonomia no labor desenvolvido pelo reclamante, mas, na verdade, apenas mais evidenciaram que os serviços se enquadravam, em justaposição, na atividade-fi m das reclamadas, além de revelarem a existência dos elementos fático-jurídicos e jurídico-formais da relação de emprego, senão vejamos: 69 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 [...] No mesmo sentido de que o trabalho do reclamante se enquadrava na atividade-fi m, ressalte-se que ele era sempre auxiliado por dois empregados da reclamada (depoimento do preposto). Não só o horário a cumprir, como também uso de uniforme e de aparelho de comunicação, bem como o cumprimento de rota de entrega previamente determinada, conforme declarado pelas testemunhas do autor e das rés, também revelam, sem sombra de dúvida, que ele estava subordinado às regras gerais da empresa. Causa estranheza a afi rmação do preposto e sócio da primeira reclamada, de que ele, depoente, nem sequer conhecia direito os motoristas que eventualmente substituíam o reclamante, pois a cláusula 3.12 do instrumento contratual, fi rmado a título de contratação de serviços autônomos, prevê expressamente que em caso de excepcional necessidade de ser o serviço executado por outrem, deve haver prévia aprovação da empresa (fl . 104). [...] E eis o ponto nevrálgico da questão: há no caso a presença de alteridade, eis que a energia pessoal do trabalhador é direcionada em proveito econômico para o empresário da atividade, que assume os riscos do empreendimento. Aliás, não prevalece mais o conceito que confunde a subordinação com o cumprimento de horário e convivência de empregado e empregador, porque, embora exista a possibilidade material de dar ordens ou controlar diretamente o cumprimento do trabalho, a exteriorização da subordinação em atos de comando pode ocorrer de maneira irregular e variável, muitas vezes imperceptível (ou desnecessária), sofrendo um processo de diluição, até quase desaparecer, à medida em que o trabalho se tecnisa e se intelectualiza, ou, em complemento, como in casu, transpondo a ideia para a vertente hipótese, nem sequer se faz desnecessário aquele controle direto pela própria natureza do serviço, que no caso do reclamante era externo (entrega de móveis). Chegamos então à essência da coisa: a relação de emprego se estabelece independentemente da vontade das partes, submetida apenas à existência concomitante dos elementos que a informam. Fonte: Disponível em: <https://trt-3.jusbrasil.com.br/ jurisprudencia/124293284/recurso-ordinario-trabalhista- ro-723201109203001-0000723-4520115030092>. Acesso em: 26 abr. 2018. 70 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO CASO 2. PROCESSO TRT/SP Nº 0002160- 55.2014.5.02.0089- RECURSO ORDINÁRIO DA 89a VT DE SÃO PAULO EMENTA. RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. RELAÇÃO DE EMPREGO. SUBORDINAÇÃO JURÍDICA EXISTENTE COM O EMPREITEIRO. VÍNCULO DE EMPREGO COM O DONO DA OBRA NÃO RECONHECIDO. Para fi ns de confi guração do vínculo de emprego, necessária se faz a presença concomitante de todos os requisitos previstos no artigo 3º, da CLT, quais sejam, onerosidade, habitualidade, subordinação e pessoalidade. In casu, não há mesmo como se considerar empregado do dono da obra o pedreiro que trabalhava como auxiliar do empreiteiro contratado, quando admitido e subordinado a este último. A subordinação, como característica e requisito indispensável da relação de emprego, nos moldes do artigo 3º, da CLT, advém do poder diretivo do empregador, a quem cabe orientar, fi scalizar e dirigir a prestação pessoal de serviços e, por consequência, aplicar advertências e punições. Recurso do reclamante ao qual se nega provimento. Inconformado com a r. sentença de fl s. 272/272-verso, cujo relatório adoto, e que julgou IMPROCEDENTES os pedidos formulados na presente reclamação, dela recorre ordinariamente o reclamante, pelas razões de fl s. 274/275. Insiste o demandante, em síntese, que sempre laborou para a reclamada, de forma subordinada, sendo o Sr. Jerônimo Odilon o encarregado de suas obras. Para tanto, invoca o depoimento prestado por sua única testemunha, pugnando, ao fi nal, pelo reconhecimento do vínculo de emprego diretamente com a ré, bem como pela procedência de todos os pedidos formulados na prefacial. [...] Conforme acima relatado, insiste o demandanteno reconhecimento do vínculo de emprego com a reclamada, sob o argumento de que lhe prestava serviços de maneira subordinada, à luz do depoimento prestado por sua única testemunha. Analisando todo processado, sem razão o recorrente, porém. Isso porque, observo que o julgado realizou um estudo coerente e detalhado do conjunto probatório dos autos, quando concluiu que o reclamante estava vinculado, na realidade, ao Sr. Jerônimo Odilon dos Santos, um dos empreiteiros contratados pela ré. De fato, o depoimento prestado pela única testemunha ouvida pelo 71 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 autor, que, aliás, era o próprio Sr. Jerônimo Odilon dos Santos, sinalizou no sentido de que havia um contrato de empreitada entre a referida testemunha e a reclamada, ocasião em que o reclamante foi admitido para prestar serviços de pedreiro. Nos termos de seus esclarecimentos, “[...] 3- possuía uma empresa e realizava ‘bicos’; 4- reconhece sua assinatura nos contratos juntados pela reclamada, mas diz que não assinou; retifi ca o depoimento para dizer que assinou um contrato com a reclamada apenas em 2006; 5- contratou o reclamante para trabalhar como pedreiro; 6- o reclamante prestou serviços de 2010 a 2013; 7- pagava ao reclamante diárias de R$80,00; [...] 10- cada obra que executava como empreiteiro, a reclamada realizava medições e pagava seu salário, sendo que o depoente pagava aos pedreiros [...]” (fl . 74; nosso grifo). Do mesmo modo, a única testemunha ouvida pela reclamada foi determinante para demonstrar que o reclamante trabalhava, na realidade, para o Sr. Jerônimo, o qual, por sua vez, ativava-se como empreiteiro em favor da ré: “[...] 2- o Sr. Jerônimo era empreiteiro, executando serviços de construção civil, e realizava seguidos contratos de empreitada; 3- o reclamante era empregado do Sr. Jerônimo e não da reclamada; 4- o único encarregado da reclamada é o depoente, que coordenava os empreiteiros, que por sua vez coordenava seus empregados [...]” (fl . 74-verso; nosso grifo). Neste ponto, cabe ressaltar que, para fi ns de confi guração do vínculo de emprego, necessária se faz a presença concomitante de todos os requisitos previstos no artigo 3º, da CLT, quais sejam, onerosidade, habitualidade, subordinação e pessoalidade, que, certamente, em virtude dos esclarecimentos transcritos acima, não restaram confi gurados nos autos, pelo menos em relação à reclamada. Por essa forma, conforme bem decidido na Origem, não há mesmo como se considerar empregado do dono da obra o pedreiro que trabalhava como auxiliar do empreiteiro contratado, quando admitido e subordinado a este último. A subordinação, como característica e requisito indispensável da relação de emprego, nos moldes do artigo 3º, da CLT, advém do poder diretivo do empregador, a quem cabe orientar, fi scalizar e dirigir a prestação pessoal de serviços e, consequentemente, aplicar advertências e punições. Fonte: Disponível em: <https://trt-2.jusbrasil.com.br/ jurisprudencia/311978962/recurso-ordinario-ro-21605520145020089- sp-00021605520145020089-a28>. Acesso em: 26 abr. 2018. 72 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO Veja que nos casos apresentados, o elemento subordinação é o ponto nodal para a confi guração da relação de emprego – naturalmente combinado com os demais requisitos caracterizadores da relação de emprego. É importante perceber que a caracterização (ou confi guração) da existência da subordinação não leva em conta a denominação que se dá a certa atividade profi ssional, ou mesmo a modalidade contratual (escrita ou verbal) adotada, e sim o modo como o trabalho é prestado. No primeiro caso, havia um contrato de trabalho autônomo. Demonstrada a existência dos demais requisitos caracterizadores do vínculo jurídico de emprego – onerosidade, pessoalidade, continuidade e alteridade – restava como questão crucial verifi car a existência ou não de subordinação. A despeito da existência de um contrato de trabalho autônomo, entendeu o tribunal que havia também a subordinação, fi cando, portanto, descaracterizado o trabalho autônomo. No segundo caso, em sentido contrário, o vínculo contratual de trabalho entre o demandante e a empresa demandada não fi cou demonstrado, exatamente pela ausência do elemento subordinação àquele empregador. Neste caso, a subordinação estava também presente, mas ela ocorria em face de outro empregador. É o que ocorre também nos contratos de terceirização. Adiante veremos melhor o tema da terceirização. É importante salientar, a partir dos exemplos apresentados, que a avaliação da existência ou não de subordinação deve ser feita em cada caso concreto, considerando o modo como o trabalho é prestado. Uma mesma atividade profi ssional pode ser realizada de forma autônoma ou subordinada. A análise factual permitirá verifi car – ainda que com certa dose de subjetividade – a existência da subordinação e a confi guração do contrato de trabalho/emprego. c) Pessoalidade O contrato de trabalho é intuitu personae nos diz a boa doutrina. Isto signifi ca que o contrato se dá com pessoa certa e determinada, de tal maneira que o empregado não pode pedir que alguém, em seu lugar, realize prestação de serviço contratada. Na pessoalidade também está contida a premissa de que o empregado só pode ser pessoa física, não havendo contrato de trabalho em que o trabalhador seja considerado pessoa jurídica. Não é demais recordar a disposição do artigo 3º. da CLT: Art. 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. 73 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 Sob esta ótica, fi caria difícil imaginar uma situação em que estivesse ausente este pressuposto do contrato de trabalho – a pessoalidade, ou seja, em que situação poderia se falar em ausência de pessoalidade? Primeiro, podemos ter em mente que não sendo possível que o empregado seja uma pessoa jurídica, a contratação de prestação de serviço por pessoa jurídica, como prestação de serviços ou empreitada pode eventualmente dissimular um contrato de trabalho. Em segundo lugar, há situações em que, embora confi gurada a prestação de serviço de forma onerosa, ainda assim, pode não existir a situação de pessoalidade. Vamos, como antes, utilizar o exemplo de julgados para entender melhor a questão. CASO 1. ACÓRDÃO Nº: 20020580937 Nº de Pauta:110 PROCESSO TRT/SP Nº: 02293200290202005 RECURSO ORDINÁRIO - 70 VT de São Paulo EMENTA: CONTRATO. RELAÇÃO DE EMPREGO. MÚSICO. PESSOALIDADE. A pessoalidade está evidente no trabalho de um músico integrante de um grupo musical que se manteve em atuação ao longo de período considerável, com apresentações às sextas-feiras, sábados e domingos. A referência à substituição de um companheiro faltoso mediante convocação dos próprios integrantes da banda apenas ressalta a característica de autodefesa dos contratos de equipe mantidos em situação de irregularidade, na qual a vontade dos trabalhadores é suplantada pelo interesse do tomador dos serviços em mascarar o vínculo empregatício. Se a relação jurídica fosse legalmente tutelada, a falta ocasional seria naturalmente suprida pela substituição determinada ou autorizada pelo empregador, mas na contingência de um contrato de equipe meramente factual, incumbe aos próprios componentes do grupo resolver problemas e imprevistos de ordem administrativa que o tomador se recusa a enfrentar. A 74 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO confi guração do contrato de trabalho decorre necessariamente da realidade que se revela em sua execução e quando a força de trabalho é canalizada para a implementação da atividade econômica resultamirrelevantes os aspectos dissonantes cuja constatação se possa atribuir ao intuito de fraudar a legislação consolidada. Fonte: Disponível em: <https://trt-2.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/15811430/recurso- ordinario-ro-2293200290202005-sp-02293-2002-902-02-00-5>. Acesso em: 27 abr. 2018. CASO 2. PROCESSO 13282200216901 PR 13282-2002-16-9-0-1 EMENTA: MÚSICO AUTÔNOMO. VÍNCULO DE EMPREGO NÃO CONFIGURADO A prova oral foi mais do que convincente para demonstrar que o autor se fazia substituir por outro músico, o que afasta a pessoalidade da prestação de serviço, um dos requisitos previstos no artigo 3º da CLT para confi guração do vínculo empregatício. O contrato de trabalho é intuito personae em relação ao empregado e tal característica não estava presente na relação havida. Recurso ordinário do reclamante que se nega provimento. Fonte: Disponível em: <https://trt-9.jusbrasil.com.br/jurisprudenc ia/19052644/13282200216901-pr-13282-2002-16-9-0-1-trt-9>. Acesso em: 27 abr. 2018. Nos exemplos, os dois casos referem-se à atividade de músico. É um tipo de atividade muito comumente exercida de forma autônoma, mas o que pesou nas decisões foi a presença ou ausência do caráter de pessoalidade do contrato. No primeiro caso, a não substituição do faltoso por outro músico serviu como ponto crucial de caracterização da pessoalidade. Em suma, o fundamento do julgamento pode ser assim entendido: se na falta do músico contratado não houve substituição, isso revela que o contrato era intuitu personae, ou seja, o contratado era aquele músico, e não outro. 75 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 No segundo caso, a situação é invertida. É exatamente a substituição por outro músico que descaracteriza o vínculo pessoal, ou seja, se o contratante pode ser (e é) substituído por outra pessoa, então há pessoalidade. Ausente a pessoalidade não se pode falar em contrato de trabalho. d) Onerosidade O contrato de trabalho é oneroso. O trabalho é prestado mediante uma contraprestação fi nanceira, “mediante salário”, como menciona o art. 3º. da CLT. Este requisito reforça tratar-se de um contrato sinalagmático, posto que dele resultam “obrigações contrárias e equivalentes” e um contrato oneroso pois “à prestação de trabalho corresponde uma contraprestação de salário”. (SÜSSEKIND; MARANHÃO; VIANNA, 1991, p. 234). Duas ideias parecem ser essenciais: a) a primeira de que, não se concebendo que alguém trabalhe gratuitamente, todo contrato de trabalho implica a contrapartida remuneratória; b) a segunda, decorrente desta, é que, a contrapartida pecuniária pela prestação do serviço serve então como requisito de existência de um contrato de trabalho. Ausente esta contrapartida, ao menos em termos jurídicos não se confi gura o contrato de trabalho. O requisito da onerosidade é observado em termos jurídicos, e não em termos econômicos, ou seja, o que se considera é a existência de contrapartida e não seu valor. Há, na jurisprudência, decisões acerca do atingimento ou não do mínimo legal, considerando o salário mínimo vigente no país. Cuidado! Estamos focando aqui os aspectos jurídico-fáticos caracterizadores de uma relação de emprego. É preciso ter em mente que há muitas situações em que as condições de trabalho (visíveis ou ocultadas), inclusive no que toca à remuneração, ultrapassa os limites jurídicos e civilizatórios aceitáveis. Um exemplo disso é a persistência, no Século XXI, no Brasil, do trabalho escravo, ou, como utilizado pela doutrina especializada “trabalho em condição análoga à escravidão”. Sugiro uma leitura do texto a seguir sobre o assunto. Você também pode pesquisar outras leituras a respeito. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103- 40142000000100002&lng=en&nrm=iso&tlng=pt>. 76 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO Fica uma dica de documentário do ano de 2006 sobre condições de trabalho e remuneração no corte de cana-de-açúcar. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=LA9EInFFwRU>. Retomaremos a questão da onerosidade como requisito do contrato de trabalho, novamente com alguns exemplos jurisprudenciais: CASO 1. AÇÃO/RECURSO: RECURSO ORDINÁRIO N°. 0032500- 27.2009.5.20.0001 ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE ARACAJU EMENTA: RELAÇÃO DE EMPREGO. ADMISSÃO DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PELA RÉ. ÔNUS DA PROVA. DEMONSTRADA A AUSÊNCIA DE ONEROSIDADE. REFORMA DO DECISUM. Tendo o sindicato atraído o ônus probatório para si por admitir a prestação de serviço, desincumbiu-se ele desse seu encargo, eis que, ao menos, demonstrou a inexistência da obrigação contraprestacional de pagar salário, isto é, a onerosidade, restando afastada a natureza empregatícia dessa relação. Recurso provido para, reformando a sentença, julgar improcedentes os pleitos autorais. Fonte: Disponível em: <https://trt20.jusbrasil.com.br/ jurisprudencia/425482207/325002720095200001>. Acesso em: 27 abr. 2018. 77 RELAÇÃO DE TRABALHO X RELAÇÃO DE EMPREGO Capítulo 2 CASO 2. Recurso Ordinário, nº TRT-RO-0076200-96.2009.5.22.0001 EMENTA: INEXISTÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO E ONEROSIDADE. VÍNCULO FAMILIAR CONFIGURADO. DESCARACTERIZAÇÃO DA RELAÇÃO DE EMPREGO. A ausência de onerosidade e subordinação e a presença de trabalho fundado em vínculo familiar descaracterizam a relação de emprego. Recurso conhecido e improvido. [...] Do exposto, constata-se a existência de quadro diverso do descrito pela autora, pois ausente qualquer meio de prova nos autos em favor da alegada relação de emprego entre as partes, notadamente pela ausência de subordinação e onerosidade, traços inerentes ao contrato de trabalho previsto no art. 3º da CLT. Restou, assim, incontroversa a relação de cooperação familiar havida entre recorrente e recorrida de forma a não autorizar a procedência do pedido inicial. Aqui não houve a intenção de contratar, nem mesmo pactuação de salários. Há evidências da ampla liberdade da reclamante na condução dos negócios da empresa. Fonte: Disponível em: <https://trt22.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/16527021/ recurso-ordinario-ro-762200900122009-pi-00762-2009-001-22-00-9/ inteiro-teor-103545553>. Acesso em: 27 abr. 2018. 78 O DIREITO DO TRABALHO E AS RELAÇÕES DE TRABALHO O primeiro caso diz respeito ao trabalho de advogado. O motivo do não reconhecimento do contrato de trabalho (vínculo de emprego) residiu exatamente na ausência da onerosidade, ou seja, o reconhecimento de que não havia pagamento pelo trabalho realizado, demonstrando ser atividade autônoma. Anteriormente foi mencionado na ementa, apenas sobre o julgamento, mas você pode acessar o site e verifi car o teor completo do acórdão. No segundo caso, também a ausência de onerosidade serviu para demonstrar a inexistência de contrato de trabalho, mas neste caso, pesou também a relação familiar que ligava as partes envolvidas. Podemos recordar o exemplo dado no início deste capítulo: a relação de solidariedade entre as famílias Martine e Dallegrave. Naquele exemplo também não há contraprestação pelo trabalho, embora os motivos sejam outros: amizade e solidariedade. Por outro lado, um alerta, essas são situações excepcionais. O uso desses exemplos aqui tem um sentido didático de demonstrar a presença ou não dos requisitos ensejadores da existência de um contrato de trabalho (vínculo de emprego). Por fi m, convém registrar a existência de uma situação jurídica em que se admite a ausência de remuneração pelo trabalho, em que juridicamente, pela própria determinação legal não se estabelece vínculo de emprego: é o caso da Lei 9.608/98, que regulamenta o trabalho voluntário no Brasil. Vale um outro alerta. Por força do princípio da primazia da realidade, que você certamente
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