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Brasília-DF. OrganizaçãO dO SiStema ÚnicO de SaÚde Elaboração Juliana Borges Pereira Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APRESENTAÇÃO .................................................................................................................................. 5 ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA ..................................................................... 6 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 8 UNIDADE I SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) ............................................................................................................ 9 CAPÍTULO 1 CONCEITO DE SUS .................................................................................................................. 9 CAPÍTULO 2 FUNCIONAMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) .......................................................... 25 CAPÍTULO 3 DEFINIÇÃO DE CONSELHO DE SAÚDE .................................................................................... 28 UNIDADE II PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS ................................................................................................................ 34 CAPÍTULO 1 UNIVERSALIZAÇÃO, EQUIDADE E INTEGRALIDADE .................................................................... 34 UNIDADE III PRINCÍPIOS ORGANIZATIVOS .............................................................................................................. 43 CAPÍTULO 1 REGIONALIZAÇÃO E HIERARQUIZAÇÃO ................................................................................. 43 CAPÍTULO 2 DESCENTRALIZAÇÃO E COMANDO ÚNICO ............................................................................ 46 CAPÍTULO 3 PARTICIPAÇÃO POPULAR ...................................................................................................... 53 CAPÍTULO 4 PARTICIPAÇÃO DA UNIÃO, ESTADOS E MUNICÍPIOS E RESPONSABILIDADES ............................... 58 UNIDADE IV PRINCIPAIS LEIS .................................................................................................................................. 66 CAPÍTULO 1 LEIS E PACTOS .................................................................................................................... 66 UNIDADE V ATENÇÃO BÁSICA .............................................................................................................................. 84 CAPÍTULO 1 POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO BÁSICA – PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA (PSF) E O PROGRAMA AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE (PACS) ........................................................ 84 PARA (NÃO) FINALIZAR ...................................................................................................................... 98 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 103 5 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 6 Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Praticando Sugestão de atividades, no decorrer das leituras, com o objetivo didático de fortalecer o processo de aprendizagem do aluno. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. 7 Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Exercício de fixação Atividades que buscam reforçar a assimilação e fixação dos períodos que o autor/ conteudista achar mais relevante em relação a aprendizagem de seu módulo (não há registro de menção). Avaliação Final Questionário com 10 questões objetivas, baseadas nos objetivos do curso, que visam verificar a aprendizagem do curso (há registro de menção). É a única atividade do curso que vale nota, ou seja, é a atividade que o aluno fará para saber se pode ou não receber a certificação. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 8 Introdução Prezado aluno Iniciaremos a disciplina 3 “Organização do Sistema Único de Saúde” direcionando nossas discussões para o Sistema Único de Saúde (SUS). O conhecimento na área de saúde coletiva está ganhando força e sendo cada vez mais exigido no mercado de trabalho. Em busca rápida na literatura científica, podemos encontrar mais de 64 mil artigos relacionados ao SUS, sendo, portanto, um assunto muito importante e de grande relevância para vários profissionais como médicos, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, educadores físicos, assistentes sociais, farmacêuticos, dentistas, terapeutas ocupacionais, biólogos, biomédicos, fonoaudiólogos e outros interessados. Dessa forma, convidamos a participar dessa disciplina do curso de pós-graduação, com o objetivo de aprimorar sua conduta profissional no conhecimento da organização do Sistema Único de Saúde. Objetivos » O objetivo dessa disciplina consiste em proporcionar aos alunos a capacidade de compreensão da organização do Sistema Único de Saúde (SUS) perpassando a história, os conceitos gerais, o funcionamento, os princípios organizativos e doutrinários, as principais leis e pactos, alémda política de atenção básica. » Dessa forma, buscamos aperfeiçoar o profissional tornando-o crítico, fundamentado e com condutas profissionais atualizadas ao real cenário da saúde coletiva do Brasil. 9 UNIDADE ISISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) CAPÍTULO 1 CONCEITO DE SUS Saúde: “É um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não meramente a ausência de doenças ou defeitos”. (Organização Mundial da Saúde) Essa definição é considerada utópica, poética e impossível de ser alcançada, porém, possui o mérito de reconhecer, no seu sentido mais amplo, que a saúde não depende somente de profissionais e unidades de saúde. É um problema de natureza social decorrente do nível de vida dos indivíduos, é um equilíbrio orgânico resultante de um ajustamento do organismo no sentido da manutenção de um balanço positivo contra forças biológicas, fisicoquímicas, mentais e sociais que tendem a romper este equilíbrio. Segundo o Ministério da Saúde: A saúde é resultante de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse de terra e acesso aos serviços de saúde. É assim o resultado das formas de organização social e da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida. Como surgiu o SUS? Realmente sabemos o que significa SUS? Qual são os reais objetivos do SUS? O SUS é um sistema composto por muitas partes que, por mais diferentes que pareçam, possuem uma finalidade em comum: cuidar e promover a saúde de toda a população, melhorando a qualidade de vida dos todos os brasileiros. O SUS existe há pouco tempo e surgiu como resposta à insatisfação e descontentamento existente em relação aos direitos de cidadania, acesso, serviços e forma de organização do sistema de saúde. Nos anos 1970 e 1980, vários médicos, enfermeiros, donas de casa, trabalhadores de sindicatos, religiosos e 10 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) funcionários dos postos e secretarias de saúde levaram adiante um movimento, chamado “movimento sanitário” cujo objetivo foi criar um novo sistema público para solucionar os inúmeros problemas encontrados no atendimento à saúde da população. O movimento orientava-se pela ideia de que todos têm direito à saúde e que o governo, com a sociedade, tem o dever de fazer o que for preciso para alcançar este objetivo. Na tentativa de alcançar o conceito de saúde foi criado o Sistema Único de Saúde, o SUS. Então, vamos compreender um pouco mais sobre SUS. História do SUS Para compreender melhor a história do SUS, fundamentaremos nossa linha de raciocínio no excelente artigo científico intitulado: “O Instituto de Medicina Social e a luta pela reforma sanitária: contribuição à história do SUS”, do professor Hésio Cordeiro, publicado na PHYSIS: Rev. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 14(2): 343-362, 2004. Disponível em: <<http://www.scielo.br/pdf/%0D/physis/v14n2/v14n2a09. pdf>>. Acesso em: 4/7/2012. Nesse artigo, o autor estuda o processo da reforma sanitária brasileira e suas relações com a produção de conhecimentos que influenciaram a aprovação do Sistema Único de Saúde, na Constituinte de 1988, e sua implementação na década de 90. O Movimento Sanitário incorporou conhecimentos desenvolvidos por pesquisadores de Saúde Coletiva e orientou práticas técnicas que serviram de base para a organização do SUS. O processo em curso na década de 1990 resultou em novos conceitos relativos a Estado e mercado, no campo da saúde. Foram configuradas novas questões que deverão influenciar a agenda de pesquisa em Saúde Coletiva, dando conta dos temas da equidade, da qualidade em saúde e da democratização do sistema brasileiro de saúde. Para iniciar a história da implementação do SUS, o autor começa descrevendo os movimentos de resistência e todos os colaborados desse movimento. Desde suas origens, no início da década de 1970, foi explicitado que o campo denominado “Medicina Social” diferenciava o que, na época, se denominava Higiene (denominação da antiga unidade 11 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I universitária) ou Saúde Pública, com a notável tradição dos sanitaristas, desde a Fundação Serviço Especial de Saúde Pública, em meados dos anos 1940. A busca de alternativas que contemplassem uma articulação entre as Ciências Sociais, a Epidemiologia com ênfase na determinação social das doenças e as políticas de saúde tinha o mérito de buscar a superação entre as orientações funcionalistas das ciências do comportamento, as visões tecnocráticas de determinadas correntes do planejamento e da administração de saúde ou a determinação das doenças, como o resultado multivariável e anistórico de fatores biopsicossociais. Com a definição da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), do apoio da Fundação Kellogg e da Organização Panamericana de Saúde (OPS), mobilizaram-se as inteligências audazes de José Pelúcio Ferreira, Fabio Celso de Macedo Soares, Mario Chaves, Juan César Garcia, José Roberto Ferreira, Nelson Luis de Araújo Moraes e Carlos Gentile de Melo, além de um punhado de jovens professores-alunos, alguns retornando de jornadas na América Latina ou na Europa, outros se associando para desenvolver uma aliança entre as novas teorias da saúde e a praxis reformista do sistema de saúde. Um conjunto de temas foi confluindo para linhas de pesquisa nem sempre com finalidades teleológicas bem explícitas, pois os objetos foram demarcados pelos processos contraditórios do saber e do poder. Temas como instituições de saúde, ordem médica e norma familiar, processos normativos, práticas do saber popular e nova configuração das empresas médicas foram pavimentando os outros campos teóricos a serem desbravados. Novos interlocutores apontavam para os estudos socioeconômicos em saúde e para os estudos epidemiológicos e populacionais no âmbito da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com Sergio Arouca e outros tantos pesquisadores, não sem um certo grau de disfarçada competição. Anos 1970 Os anos 1970, mais especificamente 1974, colocaram em questão a organização do Sistema Nacional da Previdência e Assistência Social (SINPAS) no Governo Geisel, que iniciou um processo de expansão da cobertura previdenciária. INAMPS, INPS, IAPAS, LBA, FUNABEM, DATAPREV são siglas das políticas sociais desse período. É de 24 de outubro de 1974 o protocolo firmado entre o Ministério da Educação (MEC) e o Ministério da Previdência e Assistência (MPAS), que gerou o Convênio MEC-MPAS, estabelecendo novas bases para a relação entre hospitais universitários e a Previdência Social (OLIVEIRA; TEIXEIRA, 1985). A Lei no 6.229, de 17 de julho de 1975 criou o Sistema Nacional de Saúde, inspirada numa visão sistêmica, ordenando e consolidando as mesmas funções, duplicações e superposições, que já mobilizavam o pensamento crítico das políticas de saúde. A VI Conferência Nacional de Saúde buscou legitimar a concepção sistêmica na saúde, evitando reconhecer e estabelecer prioridades. O conflito fez-se presente durante a própria Conferência, na qual documento alternativo produzido com a colaboração de professores do Instituto de Medicina Social foi recolhido pelo Ministério da Saúde - que impediu sua divulgação - , pois só deveria existir um único documento, isto é, o do próprio Ministério. 12 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) Da confluência entre a Academia e a praxis, entre as críticas ao complexo médico-empresarial e o exercício de propostas de descentralização e municipalização, brotavam rabiscos de alternativas que, muitas vezes, se traduziam em novos cursos, seminários, documentos, reuniões no Sindicato dos Médicos ou no Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES). Um momento estratégicopara a organização da Reforma Sanitária foi o 1o Simpósio de Política Nacional de Saúde, com debate e aprovação do documento A Questão Democrática na Área da Saúde, apresentado pela diretoria nacional do CEBES, com base em trabalho elaborado por pesquisadores do Instituto de Medicina Social da UERJ (Hésio Cordeiro, José Luis Fiori e Reinaldo Guimarães), acrescido das principais reivindicações do setor, transformando-se em documento-base para as conclusões finais do encontro (CEBES, 1980). O documento, aprovado no 1o Simpósio de Política Nacional de Saúde, em outubro de 1979, estabelece alguns princípios que seriam adotados pela Reforma Sanitária: 1. o direito à saúde como direito universal e inalienável; 2. o caráter intersetorial dos determinantes da saúde; 3. o papel do Estado no sentido de regular “para obstaculizar os efeitos mais nocivos das leis do mercado na área da saúde” (CEBES, 1980); 4. descentralização, regionalização e hierarquização; 5. participação popular e controle democrático. Entre as medidas iniciais, destaca-se “criar o Sistema Único de Saúde”. Década de 1980: sobre a busca de alternativas para a democratização da saúde A década de 1980 seria demarcada pela crise fiscal do sistema previdenciário, pois a extensão dos benefícios ocorrida no período anterior não havia sido contemplada pela definição legal de novos mecanismos de financiamento que viabilizassem o real acesso aos benefícios, principalmente das populações rurais e dos novos contingentes de assalariados urbanos (autônomos, empregados domésticos e setores informais). O debate sobre as medidas saneadoras envolvia a extinção da assistência médica do escopo dos benefícios previdenciários, com sua substituição pelo seguro saúde privado no molde chileno – o pagamento da assistência médica pelo segurado de acordo com faixas de renda, a eliminação de determinados benefícios, incluindo a aposentadoria por tempo de serviço com 35 anos de idade, entre outros. Em janeiro de 1985, realizava-se a Reunião de Montes Claros, da qual participaram lideranças, que se apresentavam para debater propostas para o governo, o qual deveria encerrar o ciclo autoritário de presidentes da República com a candidatura de Tancredo Neves. A Carta de Montes Claros, liderada por José de Saraiva Felipe, secretário municipal de Saúde à época, reafirmava os princípios e postulados de 1979, do simpósio realizado na Câmara dos Deputados. A partir de Montes Claros, sucedem-se reuniões para aprofundar e detalhar a futura operacionalização da proposta para a denominada Nova República, principalmente quanto ao processo de unificação do Ministério da Saúde e do INAMPS, e a passagem da Central de Medicamentos da Previdência Social para a Saúde. 13 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I Com a posse de José Sarney, em 15 de março de 1985, na Presidência da República, devido à doença e ao trágico falecimento de Tancredo Neves, assumiu o Ministério da Previdência e Assistência Social o ministro Waldir Pires, pessoa de notável trajetória política. O ministro manifestou, desde o início de sua gestão, grande sensibilidade para as propostas de reforma da saúde e do sistema de seguridade social. “A Previdência é viável” foi seu lema desde sempre. Na Saúde, José Saraiva Felipe foi nomeado para a Secretaria de Assistência Médica do MPAS e Henri Jouval Jr. assumia interinamente a presidência do INAMPS, até que se concluísse o processo de decisão a respeito do novo presidente dessa Instituição. Os passos decisivos para que se elaborassem os princípios e a prática da Reforma Sanitária foram dados na VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada em Brasília entre 17 e 21 de março de 1986, após conferências preparatórias efetuadas em todos os estados da Federação. Sob a presidência de Antônio Sergio da Silva Arouca (FIOCRUZ), a vice-presidência de Francisco Xavier Beduski (superintendente da SUCAM) e tendo como relator Guilherme Rodrigues da Silva (USP), debateram-se como temas: Saúde como Direito, Reformulação do Sistema Nacional de Saúde e Financiamento do Setor. Participaram da Conferência mil delegados com direito a voto e cerca de 3 mil participantes, que constituíram 135 grupos de trabalho. Separação da Saúde e da Previdência Outro tema bastante polêmico foi relativo à separação da “Saúde” da “Previdência”. O entendimento majoritário foi o de que a previdência social deveria se encarregar de ações próprias do “seguro social” (pensões, aposentadoria e demais benefícios) e a saúde estaria entregue em nível federal a um único órgão com características novas. O setor seria financiado por várias receitas, oriundas de impostos gerais e incidentes sobre produtos e atividades nocivas à saúde. Até que se formasse esse orçamento da saúde, a previdência social deveria destinar os recursos despendidos com o INAMPS para o novo órgão, retraindo-os paulativamente, à medida do crescimento de novas fontes. Na própria Conferência já se vislumbravam barreiras e dificuldades objetivas e subjetivas para a Reforma Sanitária. Foram aprovadas moções de que as AIS não deveriam adiar a implantação do SUS; o financiamento e a discussão da operacionalização ainda deveriam ser mais aprofundados, embora se recomendasse a constituição de um orçamento social que englobasse os recursos destinados às políticas sociais nos diversos ministérios e os dos diversos fundos sociais, cabendo, contudo, a organização de fundos únicos de saúde, nos três níveis da Federação. Propôs-se a criação de um grupo executivo da Reforma Sanitária, convocado pelo Ministério da Saúde - a Comissão Nacional da Reforma Sanitária. Ao mesmo tempo, iniciou-se uma estratégia-ponte para a implantação do SUS, com a iniciativa, por sinal, questionada por segmentos do Movimento Sanitário e do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), de que o INAMPS transferiria seus hospitais, ambulatórios e superintendências regionais para o âmbito dos estados (secretarias estaduais de Saúde) e municípios (secretarias municipais de Saúde). O processo levava adiante as recomendações da VIII Conferência Nacional de Saúde (CNS), para enfrentar o risco de um relativo imobilismo do Ministério da Saúde, que não 14 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) abria seu orçamento aplicado nos estados e nos seus diversos programas, por conta da tradição verticalista da instituição. Os debates e recomendações que se seguiram à VIII CNS contribuíram para três níveis de ação política e técnica da Reforma Sanitária: a luta pelo texto da saúde no capítulo da ordem social da Nova Constituição, os movimentos táticos e a mobilização da sociedade para a ampliação das bases sociais do Movimento Sanitário. O argumento primordial era o da necessidade de conquistar apoios em favor de mudanças, a partir de ações administrativas e institucionais, que representassem melhorias objetivas na organização dos serviços e no atendimento à população. As estratégia intermediárias expressaram-se, até 1986, pelas Ações Integradas de Saúde e, a partir de 1987, pela substituição das AIS pelos sistemas descentralizados e unificados de saúde. Ambos os projetos viriam a ser criticados pelos segmentos técnico-burocráticos que, desde 1985, defendiam a “unificação pelo alto”, ou seja, a passagem imediata do INAMPS para o Ministério da Saúde. De acordo com Paim (1990), esses segmentos teimavam em desconhecer, desqualificar ou subestimar a relevância da estratégia das AIS. Isto se refletiu no relatório final da VIII CNS, que incluía a advertência de que em nenhum momento a existência das AIS deveria ser utilizada como justificativa para protelar a implantação do Sistema Único de Saúde. Logo após, segundo o relator da Conferência, o Ministério da Saúde retomou suapolítica de campanhas, vertical e desintegrada, adotando medidas episódicas para combate à epidemia de dengue, que ameaçava várias capitais e cidades de médio porte do Sudeste e Nordeste. As AIS foram expandidas pela direção-geral do INAMPS para cerca de 2.500 municípios, correspondente à área geográfica onde viviam cerca de 90% da população do País. No entanto, a relação entre os gestores de saúde e prestadores de serviços se realizava pela compra e venda de serviços, esgotando o modelo institucional da AIS. Ao mesmo tempo em que se instalava a Comissão Nacional da Reforma Sanitária, iniciou-se a implantação do Sistema Único Descentralizado de Saúde (SUDS) por meio de convênios com secretarias estaduais de Saúde e destas com as municipais, estabelecendo-se um novo campo de debates acadêmico e político que viria demarcar os passos e as controvérsias da Reforma Sanitária, sob os riscos da “inampização da saúde”. Os recursos definidos para cada estado pelo MPAS, em 1987, foram baseados na Programação Orçamentária Integrada (POI), elaborada durante o segundo semestre de 1986 pela Secretaria de Planejamento do INAMPS, e aprovada na Comissão Interministerial de Planejamento (CIPLAN). De forma integrada, os recursos de investimento e de custeio deveriam ser programados com metas aprovadas na base do sistema de saúde. 15 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I Implementação do SUS em 1988 A implantação do Sistema Único de Saúde dependia da consolidação de seus fundamentos na nova Constituição Federal, aprovada e promulgada em 5 de outubro de 1988. Os princípios da saúde como direito de cidadania e incorporada ao conceito de seguridade social foram debatidos num processo do qual participaram ativamente pesquisadores, líderes sindicais, lideranças políticas, administradores de saúde. Controvérsias ainda hoje são objeto de indagações: 1. o conceito de seguridade social, envolvendo ações destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, previdência e assistência social. Ao incluir a saúde, superou-se o conceito tradicional de seguro social, que compreende apenas os direitos dos contribuintes diretos, enquanto a seguridade inclui contribuintes e não contribuintes, estes cobertos pelas receitas tributárias e contribuições sociais de toda a sociedade; 2. o conceito de universalidade de cobertura, análogo ao reconhecimento do direito de todos à saúde. Alguns contrapõem o enfoque da direção dos recursos aos grupos sociais mais vulneráveis; 3. o princípio de que é dever do Estado garantir a saúde, mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco e outros agravos que explicitam o reconhecimento da determinação social do processo saúde- doença. Os segmentos mais conservadores questionaram a abrangência do conceito. Contudo, não conseguiram eliminá-lo do texto constitucional; 4. as relações com o setor privado foram objeto de negociações conflitivas desde o início da Constituinte, em virtude de terem sido propostos: a relevância pública das ações e serviços de saúde, o caráter complementar da participação do setor privado no SUDS, a vedação da destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas sem fins lucrativos, assim como a participação de empresas e capitais estrangeiros na assistência à saúde, “salvo nos casos previstos em lei”; foi vedada, também, a comercialização da coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, tecidos e órgãos; 16 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) 5. descentralização do SUS, com direção única em cada nível de governo, sem referência à municipalização; 6) o financiamento seria em parte realizado pela seguridade social, mediante recursos provenientes de contribuições sociais e de recursos dos orçamentos da União, estados e municípios, fixando-se um percentual de 30% do orçamento da seguridade, até que se aprovasse a Lei Orgânica da Saúde. Abaixo, esquema divulgado pelo Ministério da Saúde - SUS. Dados do ano de 2006. Hoje, em 2013, como está o SUS? Abaixo uma reportagem do Portal da Saúde - SUS – Disponível em: <http:// portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/noticia/4390/162/ministerio-avalia-e- monitora-acesso-e-qualidade-dos-servicos-de-saude.html> Acesso em: 4.7.2012. Ministério avalia qualidade dos serviços de saúde O ministro Alexandre Padilha lançou, nesta quinta-feira (1/03/2012), o Índice de Desempenho do SUS (IDSUS 2012); ferramenta vai avaliar 24 indicadores e ajudar governo federal, estados e municípios a qualificarem atendimento de saúde. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, lançou, nesta quinta-feira (1/03), em Brasília, o Índice de Desempenho do SUS (IDSUS 2012), ferramenta que avalia o acesso e a qualidade dos serviços de saúde no país. Criado pelo Ministério da Saúde, o índice avaliou entre 2008 e 2010 os diferentes níveis de atenção (básica, especializada ambulatorial e hospitalar e de urgência e emergência), verificando como está a infraestrutura de saúde para atender as pessoas e se os serviços ofertados têm capacidade de dar as melhores respostas aos problemas de saúde da população. Confira a apresentação Além de dar maior transparência ao quadro geral da oferta e da situação dos serviços de saúde, o IDSUS 2012 servirá como instrumento de monitoramento e avaliação para que os dirigentes dos três níveis – federal, estadual e municipal - tomem decisões em favor do aprimoramento das ações de saúde pública no país, 17 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I explica Padilha. O SUS não pode temer processo de avaliação do sistema e deve dar publicidade às informações, pois se trata de uma ferramenta para aprimorar a gestão. O IDSUS 2012 está disponível para consulta de toda a sociedade pelo endereço < www.saude.gov.br/idsus>. Avaliação O índice avalia, com pontuação de 0 a 10, municípios, regiões, estados e o país com base em informações de acesso, que mostram como estão a oferta de ações e os serviços de saúde, e de efetividade, que medem o desempenho do sistema, ou seja, o grau com que os serviços e ações de saúde estão atingindo os resultados esperados. O IDSUS é formado por seis grupos homogêneos e leva em consideração a análise concomitante de três índices: de Desenvolvimento Socioeconômico (IDSE), de Condições de Saúde (ICS) e de Estrutura do Sistema de Saúde do Município (IESSM). Basicamente, os grupos 1 e 2 são formados por municípios que apresentam melhor infraestrutura e condições de atendimento à população; os grupos 3 e 4 têm pouca estrutura de média e alta complexidade, enquanto os grupos 5 e 6 não têm estrutura para atendimentos especializados. A proposta é unificar em grupos cidades com características similares. Situação De acordo com o índice, o Brasil possui IDSUS equivalente a 5,47. A região Sul teve pontuação de 6,12, seguida do Sudeste (5,56), Nordeste (5,28), Centro-Oeste (5,26) e Norte (4,67). Entre os estados, possuem índices mais altos os da região Sul - Santa Catarina (6,29), Paraná (6,23) e Rio Grande do Sul (5,90). Na sequência, vêm Minas Gerais (5,87) e Espírito Santo (5,79). As menores pontuações são do Pará (4,17), de Rondônia (4,49) e Rio de Janeiro (4,58). De acordo com o IDSUS 2012, as maiores notas por Grupo Homogêneo foram: 7,08 para Vitória (ES), no grupo 1, e 8,22 para Barueri (SP), no grupo 2. Na sequência, nos grupos 3 e 4, vêm 8,18 para Rosana (SP) e 7,31 para Turmalina (MG). Nos grupos 5 e 6 os destaques foram Arco-Íris (SP) e Fernandes Pinheiro (PR), com IDSUS de 8,38 e 7,76, respectivamente. Modelo O IDSUS 2012 é resultado do cruzamento de 24 indicadores, sendo 14 que avaliam o acesso e outros 10 para medir a efetividade dos serviços. No quesito acesso, é avaliada a capacidadedo sistema de saúde em garantir o cuidado necessário à população em tempo oportuno e com recursos adequados. Entre esses indicadores estão a cobertura estimada de equipes de saúde; a proporção de nascidos vivos de mães com sete ou mais consultas pré-natal; e a realização de exames preventivos de 18 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) cânceres de mama, em mulheres entre 50 e 69 anos, e de colo do útero, na faixa de 25 a 59 anos. Já na avaliação de efetividade, ou seja, se o serviço foi prestado adequadamente, encontram-se itens como a cura de casos novos de tuberculose e hanseníase; a proporção de partos normais; o número de óbitos em menores de 15 anos que foram internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTI); e o número de óbitos durante internações por infarto agudo do miocárdio. O levantamento de dados para divulgação do IDUS 2012 será realizado a cada três anos. Desde a idealização até a fase de finalização, o índice foi construído com a participação de vários segmentos do governo, técnicos, acadêmicos e com a participação e aprovação do Conselho Nacional de Saúde. Resumindo Antes do advento do Sistema Único de Saúde (SUS), a atuação do Ministério da Saúde se resumia às atividades de promoção de saúde e prevenção de doenças como por exemplo, vacinação, realizadas em caráter universal, e à assistência médico- hospitalar para poucas doenças; servia aos indigentes, ou seja, a quem não tinha acesso ao atendimento pelo Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social. O INAMPS foi criado pelo regime militar em 1974 pelo desmembramento do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que hoje é o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS); era uma autarquia filiada ao Ministério da Previdência e Assistência Social (hoje Ministério da Previdência Social), e tinha a finalidade de prestar atendimento médico aos que contribuíam com a previdência social, ou seja, aos empregados de carteira assinada. O INAMPS dispunha de estabelecimentos próprios, mas a maior parte do atendimento era realizado pela iniciativa privada; os convênios estabeleciam a remuneração por procedimento. O movimento da Reforma Sanitária nasceu no meio acadêmico no início da década de 1970 como forma de oposição técnica e política ao regime militar, sendo abraçado por outros setores da sociedade e pelo partido de oposição da época - o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Em meados da década de 1970 ocorreu uma crise do financiamento da previdência social, com repercussões no INAMPS. Em 1979, o general João Baptista Figueiredo assumiu a presidência com a promessa de abertura política, e de fato a Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados promoveu, no período de 9 a 11 de outubro de 1979, o I Simpósio sobre Política Nacional de Saúde, que contou com participação de muitos dos integrantes do movimento e chegou a conclusões altamente favoráveis ao mesmo; ao longo da década de 1980 o INAMPS passaria por sucessivas mudanças com universalização progressiva do atendimento, já numa transição com o SUS. A 8a Conferência Nacional de Saúde (CNS) foi um marco na história do SUS por vários motivos. Foi aberta em 17 de março de 1986 por José Sarney, o primeiro presidente civil após a ditadura, e foi a primeira CNS a ser aberta à sociedade; além disso, foi 19 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I importante na propagação do movimento da Reforma Sanitária. A 8ª CNS resultou na implantação do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), um convênio entre o INAMPS e os governos estaduais, mas o mais importante foi ter formado as bases para a seção “Da Saúde” da Constituição brasileira de 5 de outubro de 1988. A Constituição de 1988 foi um marco na história da saúde pública brasileira, ao definir a saúde como “direito de todos e dever do Estado”. A implantação do SUS foi realizada de forma gradual: » primeiro veio o SUDS; » depois, a incorporação do INAMPS ao Ministério da Saúde (Decreto no 99.060, de 7 de março de 1990); » e por fim, a Lei Orgânica da Saúde (Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990) fundou o SUS. Em poucos meses foi lançada a Lei no 8.142, de 28 de dezembro de 1990, que imprimiu ao SUS uma de suas principais características: o controle social, ou seja, a participação dos usuários (população) na gestão do serviço. O INAMPS só foi extinto em 27 de julho de 1993 pela Lei no 8.689. Fonte: Wikipédia. A enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Sistema_ Único_de_Saúde>. Acesso em: 4.7.2012 Conceito de Sistema Único de Saúde Segundo o manual do Ministério da Saúde - SUS princípios e Conquistas - o Sistema Único de Saúde é formado pelo conjunto de todas as ações e serviços de saúde prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público. À iniciativa privada é permitido participar desse Sistema de maneira complementar. O SUS pode ser considerado uma das maiores conquistas sociais consagradas na Constituição de 1988. Seus princípios apontam para a democratização nas ações e nos serviços de saúde que deixam de ser restritos e passam a ser universais, da mesma forma, deixam de ser centralizados e passam a nortear-se pela descentralização. Na verdade, o SUS representa a materialização de uma nova concepção acerca da saúde em nosso país. Antes a saúde era entendida como estado de não doença, o que fazia com que toda lógica girasse em torno da cura de agravos à saúde. Essa lógica, que significava apenas remediar os efeitos com menor ênfase nas causas, deu lugar a uma nova noção centrada na prevenção dos agravos e na promoção da saúde. Para tanto, a saúde passa ser relacionada com a qualidade de vida da população, a qual é composta pelo conjunto de bens que englobam a alimentação, o trabalho, o nível de renda, a educação, o meio ambiente, o saneamento básico, a vigilância sanitária e farmacológica, a moradia, o lazer etc. 20 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) De acordo com essa nova concepção de saúde, compreende-se que os níveis de saúde da população expressam a organização social e econômica do País, ou seja, há o acertado reconhecimento de que os indicadores de saúde da população devem ser tomados para medir o nível de desenvolvimento do país e o de bem estar da população. Importante notar que a luta pela instituição do SUS parte da base da sociedade. As reivindicações que nortearam o movimento que ficou conhecido por Movimento Sanitarista eram apresentadas, fundamentalmente, por meio dos secretários municipais de saúde e foram catalisadas na 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986. As resoluções dessa Conferência deram os parâmetros que mais tarde viriam a ser inscritos na Constituição de 1988. Lei no 8.080, 19.9.1990, art. 3o. (Essa lei será estudada com mais detalhes nas próximas unidades) Antes disso, existia um duplo comando na área da saúde, pois o Ministério da Saúde cuidava das ações preventivas e o Ministério da Previdência Social incumbia-se pela prestação dos serviços médicos curativos. O acesso a esses serviços médicos curativos, até então não era um direito de todos, universal, mas somente dos que contribuíam para o sistema de então, que era ligado ao Ministério da Previdência Social. Somente os trabalhadores com carteira registrada, pois, faziam jus aos serviços públicos de saúde. Sob outro aspecto, ações como as campanhas de vacinação eram de competência do Ministério da Saúde, revelando a duplicidade e a fragmentação das ações e dos serviços de saúde. A mudança foi grande; ocorreua unificação de comando, representada pela transferência ao Ministério da Saúde de toda a responsabilidade pela saúde no plano federal. Da mesma forma ocorreu nos estados e municípios, onde a responsabilidade ficara a cargo das respectivas secretarias estaduais e municipais de saúde. Sob outro aspecto, o princípio da universalidade, inscrito no art. 196 da Constituição, representou a inclusão de todos no amparo prestado pelo SUS. Qualquer pessoa passa a ter o direito de ser atendido nas unidades públicas de saúde. Aliás, o Ministério da Saúde assumiu, desde agosto de 1999, por intermédio da Fundação Nacional de Saúde, a responsabilidade de estruturar e operacionalizar o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, articulado com o Sistema Único de Saúde (SUS), passando, assim, a responder pela totalidade das ações de saúde para os povos indígenas tanto preventivas quanto assistenciais e de promoção à saúde. Esse fato faz com que atualmente toda a população brasileira, sem exceção, seja beneficiária dos serviços e das ações prestadas pelo SUS o que concretiza em definitivo o princípio da universalização. Os avanços democráticos não param por aí. De uma gestão extremamente centralizada, passa- se à descentralização como a melhor forma de garantir uma maior participação na formulação e na implantação dos serviços e ações de saúde, ou seja, o município, enquanto o ente federado mais próximo da realidade da população, ganha a atribuição fundamental, bem como os recursos para tanto, de responsabilizar-se pela melhor política de saúde para a população local. Nada mais acertado, considerando a diversidade e a disparidade de realidades locais espalhadas pelo Brasil. O município é, por excelência, o melhor dos entes federados para tratar da saúde dada a sua maior proximidade e, por isso mesmo, maior conhecimento da ordem de prioridades e das demandas da população local. 21 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I No entanto, para além da descentralização dos serviços e dos recursos de saúde, a participação social passa a ser condição essencial. Assim, a existência e o funcionamento de conselhos de saúde nos três níveis de governo passam a ser obrigatórios visando garantir a participação social nas políticas de saúde, tanto em sua formulação como em sua execução. Nesse sentido, o controle e a participação social na área saúde pública paulatinamente vêm aumentando suas dimensões e aperfeiçoando seus métodos. É bem verdade que o SUS, como não poderia deixar de ser, está em constante processo de aperfeiçoamento. Por um lado, a promoção da saúde à população nunca deixará de sofrer transformações, pois, como as sociedades são dinâmicas, a cada dia surgem novas tecnologias que devem ser incorporadas para a melhoria dos serviços e das ações de saúde. Da mesma forma, é constante o surgimento de novos agravos à saúde que carecem de novas profilaxias e de novos cuidados. Sob outro aspecto, não obstante todo o caminho já percorrido até aqui, o SUS ainda está em estruturação. Desse modo, trabalha-se arduamente pela consolidação de seus princípios doutrinários (universalidade, equidade e integralidade nos serviços e ações de saúde), bem como dos princípios que dizem respeito a sua operacionalização (descentralização dos serviços, regionalização e hierarquização da rede e participação social). O trabalho é no sentido de capacitar os municípios a assumirem suas responsabilidades e prerrogativas diante do SUS, bem como desenvolverem ações que dêem prioridade à prevenção e à promoção de saúde. Aliás, uma observação das normas que vêm estruturando o SUS desde sua origem permite que se perceba o processo de constante aperfeiçoamento ao longo de sua curta história. Em outubro de 1988, o SUS foi instituído constitucionalmente, sendo que a seção que trata da saúde na Constituição vai dos arts 196 a 200. A consagração constitucional do SUS trouxe a previsão da necessidade de novas leis para sua regulamentação. Isso ocorrera por meio das Leis no 8.080 e 8.142, ambas editadas em 1990, que conjuntamente formam a Lei Orgânica da Saúde. A organização operacional do SUS, sob outro aspecto, evoluiu mediante a edição de três Normas Operacionais Básicas (NOB), cada qual substituindo e aperfeiçoando a anterior. A primeira edição ocorre em 1991, a segunda, em 1993 e a terceira, em 1996; esta última (NOB/96), apesar das alterações e dos aperfeiçoamentos em relação a sua edição original, é a que está em vigor. Da leitura dessas e de outras normas, como uma série de portarias do Ministério da Saúde e outras tantas resoluções do Conselho e das Conferências Nacionais de Saúde, tem-se a perfeita compreensão que se trata de um processo em constante aperfeiçoamento. Referência: SUS princípios e Conquistas - Ministério da Saúde, Secretaria Executiva, Brasília, DF 2000. Norma Operacional Básica – SUS A partir da nova Constituição da República, várias iniciativas institucionais, legais e comunitárias foram criando as condições de viabilização plena do direito à saúde. Destacam-se, neste sentido, no âmbito jurídico institucional, as chamadas Leis 22 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) Orgânicas da Saúde (no 8.080/1990 e 8.142/1990), o Decreto no 99.438/1990 e as Normas Operacionais Básicas (NOB), editadas em 1991 e 1993. Com a Lei no 8.080/1990, fica regulamentado o Sistema Único de Saúde (SUS), estabelecido pela Constituição Federal de 1988, que agrega todos os serviços estatais − das esferas federal, estadual e municipal − e os serviços privados (desde que contratados ou conveniados) e que é responsabilizado, ainda que sem exclusividade, pela concretização dos princípios constitucionais. As Normas Operacionais Básicas, por sua vez, de acordo com a avaliação do estágio de implantação e desempenho do SUS, se voltam, mais direta e imediatamente, para a definição de estratégias e movimentos táticos, que orientam a operacionalidade deste Sistema. A presente Norma Operacional Básica tem por finalidade primordial promover e consolidar o pleno exercício, por parte do poder público municipal e do Distrito Federal, da função de gestor da atenção à saúde dos seus munícipes (art. 30, incisos V e VII, e art. 32, § 1o, da Constituição Federal), com a conseqüente redefinição das responsabilidades dos Estados, do Distrito Federal e da União, avançando na consolidação dos princípios do SUS. Esse exercício, viabilizado com a imprescindível cooperação técnica e financeira dos poderes públicos estadual e federal, compreende, portanto, não só a responsabilidade por algum tipo de prestação de serviços de saúde (art. 30, inciso VII), como, da mesma forma, a responsabilidade pela gestão de um sistema que atenda, com integralidade, à demanda das pessoas pela assistência à saúde e às exigências sanitárias ambientais (art. 30, inciso V). Busca-se, dessa forma, a plena responsabilidade do poder público municipal. Assim, esse poder se responsabiliza como também pode ser responsabilizado, ainda que não isoladamente. Os poderes públicos estadual e federal são sempre co- responsáveis, na respectiva competência ou na ausência da função municipal (inciso II do art. 23, da Constituição Federal). Essa responsabilidade, no entanto, não exclui o papel da família, da comunidade e dos próprios indivíduos, na promoção, proteção e recuperação da saúde. Isso implica aperfeiçoar a gestão dos serviços de saúde no país e a própria organização do Sistema, visto que o município passa a ser, de fato, o responsável imediato pelo atendimento das necessidades e demandas de saúde do seu povo e das exigências de intervenções saneadoras em seu território. Ao tempo em que aperfeiçoa a gestão do SUS, esta NOB aponta para uma reordenaçãodo modelo de atenção à saúde, na medida em que redefine: a. os papéis de cada esfera de governo e, em especial, no tocante à direção única; 23 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I b. os instrumentos gerenciais para que municípios e estados superem o papel exclusivo de prestadores de serviços e assumam seus respectivos papéis de gestores do SUS; c. os mecanismos e fluxos de financiamento, reduzindo progressiva e continuamente a remuneração por produção de serviços e ampliando as transferências de caráter global, fundo a fundo, com base em programações ascendentes, pactuadas e integradas; d. a prática do acompanhamento, controle e avaliação no SUS, superando os mecanismos tradicionais, centrados no faturamento de serviços produzidos, e valorizando os resultados advindos de programações com critérios epidemiológicos e desempenho com qualidade; e. os vínculos dos serviços com os seus usuários, privilegiando os núcleos familiares e comunitários, criando, assim, condições para uma efetiva participação e controle social. Fonte: Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde/NOB-SUS 96 - Brasília: Ministério da Saúde, 1997. 34 p. Disponível em: < http://siops.datasus.gov.br/Documentacao/NOB%2096.pdf >. Revisão sistemática sobre o conceito de acesso nos serviços de saúde: contribuições do planejamento: Washington Luiz Abreu de Jesus e Marluce Maria Araújo Assis: Ciência & Saúde Coletiva, 15(1):161-170, 2010. Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/csc/v15n1/a22v15n1.pdf> Uma revisão sobre os conceitos de acesso e utilização de serviços de saúde: Claudia Travassos e Mônica Martins: Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20 Sup 2:S190-S198, 2004. Disponível em: < http://www.scielosp.org/pdf/csp/v20s2/14.pdf > Espaço para você, aluno, fazer uma síntese dos textos e enriquecê-los com sua contribuição pessoal. _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ 24 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ __________________________________________________ Explique como surgiu o Sistema Único de Saúde. Conceitue SUS. Descreva a NOB-SUS. 25 CAPÍTULO 2 Funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) No SUS, situações desiguais devem ser tratadas desigualmente. Baseia-se, portanto, no princípio da equidade. O único lugar onde o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário. (Albert Einstein) As diferentes situações de vida dos vários grupos populacionais geram problemas de saúde específicos, bem como riscos e/ou exposição maior ou menor a determinadas doenças, acidentes e violências. Isto significa, portanto, necessidades diferenciadas, exigindo que as ações da gestão do sistema e dos serviços de saúde sejam orientadas para atender a essas especificidades. Entretanto, o SUS oferece o mesmo atendimento a todas as pessoas, sendo que algumas não recebem o que necessitam enquanto outras têm além do satisfatório, o que aumenta as desigualdades. Mas afinal, como funciona o SUS? Funcionamento do SUS O SUS é um sistema de saúde de abrangência nacional, porém, coexistindo em seu âmbito subsistemas em cada estado (o SUS estadual) e em cada município (SUS municipal). É sempre bom lembrar que a ênfase está nos municípios. Assim, a totalidade das ações e de serviços de atenção à saúde, no âmbito do SUS, deve ser desenvolvida em um conjunto de estabelecimentos, organizados em rede regionalizada e hierarquizada, e disciplinados segundo os subsistemas municipais o SUS-Municipal voltados ao atendimento integral da população local e inseridos de forma conjunta no SUS em suas abrangências estadual e nacional. 26 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) Os estabelecimentos desses subsistemas municipais, do SUS-Municipal, não precisam ser, obrigatoriamente, de propriedade da prefeitura, nem precisam ter sede no território do município. Suas ações podem ser desenvolvidas pelas unidades estatais (próprias, estaduais ou federais) ou privadas (contratadas ou conveniadas, com prioridade para as entidades filantrópicas) e têm que estar organizadas e coordenadas de modo que o gestor municipal possa garantir à população do respectivo município o acesso aos serviços e a disponibilidade das ações e dos meios para o atendimento integral. O funcionamento do SUS faz com que a área de saúde esteja entre as mais democráticas, pois, além de comportar um alto grau de participação social, sua gestão é um dos modelos de descentralização com maior êxito nos serviços públicos brasileiros. A participação social é expressa pela existência e pelo funcionamento de conselhos de saúde nos três níveis de governo, como comentado adiante. Já em relação ao modelo de descentralização adotado para o SUS, sua organização define como gestores corresponsáveis os três níveis de governo com mecanismos previstos para negociação e pactuação das políticas adotadas na saúde. Nesse aspecto existem as Comissões Intergestores Bipartites (CIBs), no âmbito de cada estado, e a Comissão Intergestores Tripartite (CIT), que é o fórum nacional. A CIT é composta, paritariamente, por representação do Ministério da Saúde (MS), do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS) e do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS). As CIBs, compostas igualmente de forma paritária, são integradas pelas representações da Secretaria Estadual de Saúde (SES) e do Conselho Estadual de Secretários Municipais de Saúde (COSEMS) ou órgão equivalente. Um dos representantes dos municípios é o secretário de saúde da capital. A Bipartite pode operar com subcomissões regionais. As conclusões das negociações pactuadas na CIT e na CIB são formalizadas em ato próprio do gestor respectivo. Os gestores do SUS são os representantes dos três níveis de governo. Assim, a responsabilidade para com a gestão do sistema é dos municípios, dos estados, do Distrito Federal e da União solidariamente por meio de seus órgãos que são, respectivamente, as Secretarias Municipais de Saúde (SMS), as Secretarias Estaduais de Saúde (SES) e o Ministério da Saúde. Isso na medida que a direção do SUS é única em cada nível de governo, ou seja, ela é exercida por esses órgãos em suas respectivas esferas. A rede do SUS é organizada de forma regionalizada e com nível de complexidade crescente. Os municípios podem formar consórcios para desenvolver ações e prestar serviços que estejam sob suas responsabilidades, sendo que, mesmo nesse caso, a direção do sistema continua sendo única em cada nível de governo. Referência: SUSprincípios e Conquistas - Ministério da Saúde, Secretaria Executiva, Brasília, DF, 2000. 27 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I Norma Operacional Básica do Sistema Único de Saúde/NOB-SUS 96. Brasília: Ministério da Saúde, 1997. 34 p. Disponível em: <http://siops.datasus.gov.br/Documentacao/NOB%2096.pdf> 1) Descreva como ocorre o funcionamento do Sistema Único de Saúde. 28 CAPÍTULO 3 Definição de Conselho de Saúde O Controle Social não deve ser traduzido apenas em mecanismos formais e, sim, refletir-se no real poder da população em modificar planos, políticas, não só no campo da saúde. (Relatório final da 9ª Conferência Nacional de Saúde de 1992) A persistência é o menor caminho do êxito. (Charles Chaplin) Com a participação da comunidade na gestão do SUS se estabelece uma nova relação entre Estado e a Sociedade, de forma que as decisões do Estado sobre o que fazer na saúde terão que ser negociadas com os representantes da Sociedade, uma vez que eles são quem melhor conhecem a realidade da saúde da comunidade. Por isso ela é entendida como uma das formas mais avançadas de democracia. (Guia de Referência para Conselheiros Municipais - Ministério da Saúde) Qual o verdadeiro objetivo dos Conselhos de Saúde? Como a população pode transformar o SUS? Definição de Conselho de Saúde Os Conselhos de Saúde estão estruturados nos três níveis de governo, ou seja, existe um conselho de saúde em cada município, denominados Conselhos Municipais de Saúde; um em cada estado, que são os Conselhos Estaduais de Saúde; e outro no plano federal, qual seja, o Conselho Nacional de Saúde. Os conselhos de saúde, como dito anteriormente, são imprescindíveis. Por exemplo: para que os municípios recebam quaisquer recursos do Ministério da Saúde ou se habilitem a seus programas é necessário que o conselho municipal de saúde exista e esteja em funcionamento. Pode-se definir um conselho de saúde como o órgão ou instância colegiada de caráter permanente e deliberativo, em cada esfera de governo, integrante da estrutura básica da secretaria ou departamento de saúde dos estados e municípios, com composição, organização e competência fixadas em lei. O Conselho consubstancia a participação da sociedade organizada na administração do SUS, propiciando e melhorando o controle social do Sistema. Importante lembrar que o funcionamento dos conselhos de saúde é condição essencial e obrigatória ao funcionamento do SUS. A participação comunitária é enfatizada na legislação, tornando os 29 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I conselhos uma instância privilegiada na discussão da política de saúde. A legislação também estabelece a composição paritária dos usuários, em relação aos outros segmentos representados. Desta forma, um conselho de saúde deverá ser composto por representantes do governo, de profissionais de saúde, de prestadores de serviços de saúde e usuários, sendo o seu presidente eleito entre os membros do conselho, em reunião plenária. De modo geral, o número de componentes em cada conselho varia entre 10 a 20 membros. A situação de cada estado e município e a discussão com os segmentos que participarão do Conselho leva à melhor definição dessa composição numérica. A representação de órgãos e/ou entidades, apresentada a seguir como exemplo, varia de acordo com a realidade existente em cada estado, município e no Distrito Federal, preservando-se, porém, o princípio da paridade em relação aos usuários. Em relação aos Conselhos Estaduais de Saúde: Representante(s) do Governo Federal, indicado(s) pelo Ministro de Estado da Saúde e outros Ministérios; representante da Secretaria de Saúde do Estado; representante(s) das Secretarias Municipais de Saúde; representante(s) dos trabalhadores na área de saúde; representante(s) de prestadores de serviço de saúde, sendo 50% de entidades filantrópicas e 50% de entidades não filantrópicas. A representação dos usuários deverá ser composta por: representante(s) de entidades congregadas de sindicatos de trabalhadores urbanos e rurais; representante(s) de movimentos comunitários organizados na área da saúde; representante(s) de conselhos comunitários, associações de moradores ou entidades equivalentes; representante(s) de associações de portadores de deficiências; representante(s) de associações de portadores de patologias; representante(s) de entidades de defesa do consumidor. A representação total dos conselhos deve ser distribuída da seguinte forma: 50% de usuários, 25% de trabalhadores de saúde e 25% de prestadores de serviços (público e privado). Os representantes dos usuários deverão ser indicados impreterivelmente pelas suas entidades. Em relação aos Conselhos Municipais de Saúde, a composição é semelhante à dos conselhos estaduais, adaptada ao município. Geralmente, não será necessária a presença de representante do governo federal, a não ser em casos especiais, que serão definidos localmente. Os usuários terão representação semelhante à dos conselhos estaduais. O governo estadual e o governo municipal também terão seus representantes nos conselhos municipais. Do mesmo modo, os trabalhadores da área da saúde e os prestadores de serviços de saúde de entidades filantrópicas e não filantrópicas. Nenhum conselheiro poderá ser remunerado pelas suas atividades, sendo estas consideradas de relevância pública. Fonte: Estas definições acerca dos conselhos de saúde são dadas por meio da Resolução 33, de 23.12.1992, do Conselho Nacional de Saúde. Referência: SUS princípios e Conquistas - Ministério da Saúde, Secretaria Executiva, Brasília, DF 2000. 30 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) Conselho Nacional de Saúde O Conselho Nacional de Saúde, embora exista desde 1937, somente em 1990, após a instituição do SUS, ganhou o papel que tem hoje. Na verdade, O Decreto no 99.438/1990 cria um novo Conselho Nacional de Saúde; o antigo pra-ticamente já não existia, assim como o papel para o qual foi concebido já não tinha lugar na nova conjuntura. Assiste-se, pois, muito mais a uma ruptura que uma continuidade com o passado. Sua composição também garante a participação ampla da sociedade, a exemplo do observado em relação aos conselhos municipais e estaduais. Conforme o Decreto no 99.438/1990, as atribuições e competências do Conselho Nacional de Saúde incluem: » Deliberar sobre: › formulação de estratégia e controle da execução da política nacional de saúde em âmbito federal; › critérios para a definição de padrões e parâmetros assistenciais;11Manifestar-se sobre a Política Nacional de Saúde. » Decidir sobre: › planos estaduais de saúde, quando solicitado pelos Conselhos Estaduais de Saúde; › divergências levantadas pelos Conselhos Estaduais e Municipais de Saúde, bem como por órgãos de representação na área da saúde; › credenciamento de instituições de saúde que se candidatem a realizar pesquisa em seres humanos. » Opinar sobre a criação de novos cursos superiores na área de saúde, em articulação com o Ministério da Educação e do Desporto. » Estabelecer diretrizes a serem observadas na elaboração dos planos de saúde em função das características epidemiológicas e da organização dos serviços; Acompanhar a execução do cronograma de transferência de recursos financeiros, consignados ao SUS, aos estados, municípios e Distrito Federal. » Aprovar os critérios e valores para a remuneração dos serviços e os parâmetros de cobertura assistencial. » Acompanhar e controlar as atividades das instituições privadas de saúde, credenciadas mediante contrato, ajuste ou convênio. 31 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I » Acompanhar o processo de desenvolvimento e incorporação científica e tecnológicana área de saúde, para a observância de padrões éticos compatíveis com o desenvolvimento sociocultural do País. » Propor a convocação e organizar a Conferência Nacional de Saúde, ordinariamente a cada quatro anos e, extraordinariamente, quando o conselho assim deliberar, de acordo com a Lei no 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Referência: SUS princípios e Conquistas - Ministério da Saúde, Secretaria Executiva, Brasília, DF 2000. Ver em < www.conselho.saude.gov.br> Conselho Nacional de Saúde – Apresentação – Histórico do CNS Resumindo: O Conselho Nacional de Saúde (CNS) instância máxima de deliberação do Sistema Único de Saúde, de caráter permanente e deliberativo, tem como missão a deliberação, fiscalização, acompanhamento e monitoramento das políticas públicas de saúde. O CNS é um órgão vinculado ao Ministério da Saúde composto por representantes de entidades e movimentos representativos de usuários, entidades representativas de trabalhadores da área da saúde, governo e prestadores de serviços de saúde, sendo o seu Presidente eleito entre os membros do Conselho. É competência do Conselho, dentre outras, aprovar o orçamento da saúde assim como, acompanhar a sua execução orçamentária. Também cabe ao pleno do CNS a responsabilidade de aprovar a cada quatro anos o Plano Nacional de Saúde. Disponível em: <http://conselho.saude.gov.br/apresentacao/apresentacao.htm> Os conselhos de saúde como espaços democráticos de participação social. Texto do artigo: “Conselhos de saúde e a participação social no Brasil: Matizes da Utopia”, de Poliana Cardoso Martins et al., em Physis Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 18 [ 1 ]: 105-121, 2008: Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/physis/ v18n1/v18n01a07.pdf > Os Conselhos de Saúde podem ser entendidos como um espaço deliberativo da máquina político-institucional do SUS, sendo instrumento privilegiado para fazer valer os direitos dos cidadãos, rompendo com as tradicionais formas de gestão e possibilitando a ampliação dos espaços de decisão e ação do poder público. Estas instâncias impulsionam a constituição de esferas públicas democráticas, 32 UNIDADE I │ SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) transformando-se também em potenciais capacitadores dos sujeitos sociais para processos participativos mais amplos de interlocução com o Estado (KRUGER, 2000). A Lei no 8.142/1990 confere aos Conselhos de Saúde as atribuições de atuar na cogestão do SUS nas três esferas de poder, interferindo na formulação de estratégias e no controle da execução das políticas de saúde, atribuições estas que são também do próprio Poder Executivo e do Poder Legislativo. Os conselhos devem ser criados por lei municipal, estadual ou federal com base na Lei no 8.142/1990, destacando que, tanto no processo de criação como na reformulação do conselho, o poder público, com base nos princípios democráticos, deve acolher as demandas da população, consubstanciadas nas resoluções das conferências de saúde (BRASIL, 2003). A composição dos conselhos deve se dar por representantes do governo, prestadores de serviços, profissionais da saúde e usuários. Este fato representa importante inovação no âmbito da organização do setor saúde brasileiro, com a particularidade de se situar na contramão da tradicional tendência clientelista e autoritária do Estado brasileiro. Aparece como um constructo institucional expressivo da imagem- objetivo de democracia em saúde, perseguida pelo Movimento da Reforma Sanitária (CARVALHO, 1995), apostando na construção de uma sociedade mais justa e livre, baseada no aprofundamento da democracia participativa como principal mecanismo para atingir a dignidade, a liberdade e a justiça social. O objetivo central da participação dos usuários neste espaço é viabilizar sua atuação nas deliberações sobre as políticas e programas de saúde, exercendo o controle sobre os atos das autoridades locais destinadas a implementar as diretrizes decididas com o aval do próprio conselho (ASSIS; VILLA, 2003). De acordo com a Pesquisa de Informações Municipais, realizada em 2001 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 97,6% dos municípios brasileiros têm instituídos os conselhos de saúde, sendo que em 98,7% destes municípios, os conselhos realizaram reuniões neste ano. A maioria dos municípios (69,7%) informou que as reuniões do conselho são muito freqüentes, mas em 10,3% as reuniões ocorrem de forma irregular, sendo esta situação mais comum nos municípios de pequeno porte. Essas informações indicam que embora a maioria dos conselhos municipais de saúde esteja em efetivo funcionamento, alguns ainda parecem não atuar como preconizado, podendo estar constituídos apenas para cumprir um dispositivo legal (IBGE, 2003). Observa-se profusa ampliação destas arenas de deliberação e debate no Brasil, desde a implantação do SUS. Evidências empíricas comprovam que os conselhos enfrentam enormes problemas de funcionamento, principalmente na legitimação e eficácia dessas arenas. Esse paradoxo é compreensível e coerente com o descompasso que as democracias maduras - como nas democracias européias - levaram mais de um século para equacioná-lo, uma vez que, por um lado, tem-se a pouca adesão dos governantes e, por outro, a disseminação ainda capilar desses valores no seio da sociedade (LABRA, 2005). 33 SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS) │ UNIDADE I Espaço para você, aluno, fazer uma síntese dos textos e enriquecê-los com sua contribuição pessoal. _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ 1) Explique e defina Conselho Nacional de Saúde. Estado, conselhos de saúde e grupos de interesses. José Mendes Ribeiro: Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 13(1):81-92, jan./mar., 1997. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/csp/v13n1/0226.pdf > Associativismo, participação e cultura cívica. O potencial dos conselhos de saúde: Maria Eliana Labra e Jorge St. Aubyn de Figueiredo:Ciência & Saúde Coletiva, 7(3):537-547, 2002. Disponível em:< http://www.scielosp.org/pdf/csc/v7n3/13030. pdf > Dilemas culturais, sociais e políticos da participação dos movimentos sociais nos Conselhos de Saúde: Guizardi, F. L. & Pinheiro, R.:Ciência & Saúde Coletiva, 11(3):797-805, 2006. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/csc/v11n3/30994. pdf > 34 UNIDADE IIPRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS CAPÍTULO 1 Universalização, equidade e integralidade Segundo esse princípio a saúde é um direito de todos e é um dever do Poder Público a provisão de serviços e de ações que lhe garanta. Mas como chegar esse objetivo? O insucesso é apenas uma oportunidade para recomeçar de novo com mais inteligência. (Henry Ford) O Sistema Único de Saúde é uma nova formulação política e organizacional para o redirecionamento dos serviços e ações da saúde. É assim definido por seguir a mesma doutrina e os mesmos princípios organizativos em todo o território nacional, sob a responsabilidadedas três esferas do governo: federal, estadual e municipal. Não se trata de um serviço ou uma instituição, mas um sistema que significa um conjunto de unidade, de serviços e ações que interagem para um fim comum. Esses elementos integrantes do sistema referem-se, ao mesmo tempo, às atividades de promoção, proteção e recuperação da saúde. Baseado nos preceitos constitucionais, a construção do SUS se norteia pelos seguintes princípios doutrinários: UNIVERSALIZAÇÃO, EQUIDADE E INTEGRALIDADE. Afinal o que significa o princípio da universalização? E da equidade e integralidade? Essas perguntas serão respondidas nessa unidade. 35 PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS │ UNIDADE II Universalização A universalização, todavia, não quer dizer somente a garantia imediata de acesso às ações e aos serviços de saúde. A universalização, diferentemente, coloca o desafio de oferta desses serviços e ações de saúde a todos que deles necessitem, todavia, enfatizando a ações preventivas e reduzindo o tratamento de agravos. Não obstante o acesso universal, eficiente, eficaz e efetivo aos serviços e às ações de saúde ser um processo em construção, onde há muito trabalho a ser feito, a cobertura e a oferta desses serviços e dessas ações vêm ampliando-se rapidamente. Prova disso são indicadores que dão conta de um considerável aumento na oferta de consultas médicas, cujo número ultrapassa 2 (duas) consultas por habitante/ano; de internações hospitalares, que chegam a média de 7 (sete) para cada grupo de 100 (cem) habitantes/ano; dos atendimentos hospitalares para o parto que já beiram os 100%; da mesma forma são as vacinações, cada vez mais variadas e com maior cobertura. Referência: SUS princípios e Conquistas - Ministério da Saúde, Secretaria Executiva, Brasília, DF 2000. Equidade Para entendermos melhor equidade vamos discutir um artigo denominado: Equidade e Reforma em Sistemas de Serviços de Saúde: o caso do SUS. Jairnilson Silva Paim. Saúde e Sociedade v.15, n.2, p.34-46, maio-ago. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v15n2/05.pdf> O ensaio procurou responder a seguinte pergunta: o SUS é uma política pública de promoção da equidade? Nesse sentido, apresenta alguns delineamentos prévios sobre certas noções presentes na pergunta, especialmente sobre as concepções de eqüidade e do SUS. Realiza uma breve revisão sobre reformas setoriais em contraponto com a Reforma Sanitária Brasileira e um sumário do perfil de desigualdades em saúde no país. Conclui examinando alguns esforços para a redução dessas desigualdades levantando a hipótese de que o SUS pode promover eqüidade no sentido de justiça sem comprometer o seu caráter universal e igualitário. 36 UNIDADE II │ PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS As reformas nos sistemas de serviços de saúde na América Latina têm sido analisadas considerando- se doze eixos temáticos: marco jurídico; direito aos cuidados de saúde; aumento da cobertura; função reitora dos Ministérios da Saúde; descentralização; participação e controle social; oferta de serviços; separação de funções, modelo de gestão; recursos humanos; qualidade; avaliação de tecnologias. Na avaliação dos seus resultados têm-se tomado como atributos a eqüidade, eficiência, efetividade, sustentabilidade, qualidade, participação e controle social (Infante e col., 2000). Desde a realização da 11ª Conferência Nacional de Saúde, realizada no ano 2000, o Conselho Nacional de Saúde tem formulado proposições e estratégias reunidas em onze compromissos apresentados aos candidatos das eleições presidenciais de 2002, entre os quais “a construção da eqüidade” destaca-se em primeiro lugar (CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, 2002, p.297). Assim, a equidade vem sendo reiterada como uma das principais referências para a avaliação das reformas setoriais e para a reorientação de políticas e de sistemas de saúde. Daí a pertinência e oportunidade da pergunta que orientou a elaboração do presente texto: O SUS é uma política pública de promoção da equidade? Alguns delineamentos prévios Se a questão acima já é complexa em termos de formulação, mais desafiante, ainda, é a tentativa de respondê-la. No que diz respeito à pergunta, em si, diversas considerações podem ser feitas. » De que SUS se está tratando? » O que se entende como política pública? » Pretende-se privilegiar qual momento do ciclo de uma política pública? » Trata-se de uma avaliação implícita do SUS enquanto política pública? » Insinuando-se uma avaliação, a ênfase seria na formulação, no processo de implementação, nos produtos, nos resultados, no impacto? » Qual o conceito de equidade que fundamentaria tal questão? Diante da multiplicidade de possíveis respostas a essas indagações, procurar-se-á proceder a alguns delineamentos prévios para precisar alguns ângulos de análise para fins de elaboração do ensaio. Equidade Do ponto de vista semântico e etimológico a palavra equidade está próxima da igualdade. Ambas são consideradas contrapontos para as desigualdades socioeconômicas e de saúde (PINHEIRO et al. 2005). No caso da saúde, haveria que distinguir inicialmente as necessidades de saúde e as necessidades de serviços de saúde, o que remeteria para a separação, com fins analíticos, entre 37 PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS │ UNIDADE II desigualdades nas condições de vida e saúde, de um lado, e desigualdades no acesso e consumo de serviços de saúde, de outro (ALMEIDA, 2002). Organismos internacionais da área de saúde admitem que equidade implica: a. en condiciones de salud, disminuir las diferencias evitables e injustas al mínimo posible; b. en servicios de salud, recibir atención en función de la necesidad (equidad de acceso y uso) y contribuir en función de la capacidad de pago (equidad financiera). (OPS, 1997:16). Tal entendimento legitima o pagamento de serviços de saúde pelos que podem fazê-lo, justificando e restringindo a atuação dos serviços públicos para os pobres. Inspira-se em um texto muito divulgado pelo Escritório Regional da OMS na Europa (WHITEHEAD, 1990) cuja abordagem de equidade em saúde contempla “diferenças evitáveis e desnecessárias e que também podem ser consideradas injustas” (PINHEIRO et al., 2005 p. 451), sugerindo que as desigualdades inaceitáveis e injustas mereceriam correções. Segundo esses autores o termo equidade não aparece na base de dados MEDLINE como descritor e sim na do LILACS, referido-se à cobertura, distribuição e uso de recursos, acesso e estado de saúde. (PINHEIRO et al., 2005 p. 451). Portanto, embora a maioria dos textos técnicos e doutrinários que tratam da questão da eqüidade não tenha como preocupação uma precisão conceitual, é possível identificar dois enfoques subjacentes que tentam distingui-la da noção de igualdade: o econômico e o da justiça. No enfoque econômico trata-se de buscar uma distribuição mais eficiente dos recursos, recorrendo a estudos de análise econômica, a modelos matemáticos e estudos econométricos. Tem sido objeto privilegiado da Economia da Saúde, na qualidade de disciplina acadêmica (Andrade et al., 2004). Parte dos autores realiza incursões reflexivas quanto à justiça distributiva, buscando referências na obra de Amartya Sen, que ganhou o Prêmio Nobel (SEN, 2002). Todavia, no plano das políticas patrocinadas por organismos internacionais, esse enfoque apresenta-se sob uma postura aparente de Robin Hood, defendendo políticas de focalização em contraposição às políticas universais, além da concentração de recursos nos mais necessitados - Pro-Poor Programs - (SOARES, 1999), sejam regiões, estados, municípios, distritos, bairros, grupos ou pessoas. Já o enfoque centrado na ideia de justiça recorre à filosofia de Aristóteles e Platão a Rawls e Sen, passando por Hobbes, Rousseau,
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