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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ 14ª CÂMARA CÍVEL - PROJUDI RUA MAUÁ, 920 - ALTO DA GLORIA - Curitiba/PR - CEP: 80.030-901 Autos nº. 0020055-32.2010.8.16.0088 Apelação Cível n° 0020055-32.2010.8.16.0088 Vara Cível de Guaratuba CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASILApelante(s): VALDENICE MARIA QUINTANEIRO RIBEIRO e DAVID OLIVEIRA RIBEIROApelado(s): Relator: Juiz Subst. 2ºGrau Antonio Domingos Ramina Junior APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO –- ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA COM PACTO ADJETO DE HIPOTECA - SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA – INSURGÊNCIA DA EMBARGADA – REVISÃO CONTRATUAL – POSSIBILIDADE – MITIGAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PACTA E DA BOA-FÉ OBJETIVA – NECESSIDADE DE SESUNTA SERVANDA EXPURGAR EVENTUAIS COBRANÇAS INDEVIDAS EM OBEDIÊNCIA AO PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO – CABIMENTO DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM RAZÃO DA VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO – ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA COBRANÇA DE JUROS CAPITALIZADOS – PROCEDÊNCIA – MAGISTRADA QUE PROFERE SENTENÇA CONDICIONAL AO DETERMINAR O AFASTAMENTO DE ENCARGO CUJA OCORRÊNCIA SEQUER FOI COMPROVADA – EMBARGANTE QUE, AO RENUNCIAR A PRODUÇÃO DA PROVA PERICIAL, NÃO COMPROVOU A ALEGADA EXISTÊNCIA DE ANATOCISMO – ÔNUS QUE LHE INCUMBIA – ALEGADA INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE NA COBRANÇA DO COEFICIENTE DE EQUALIZAÇÃO DE TAXAS – RAZÕES RECURSAIS QUE NÃO IMPUGNAM O FUNDAMENTO DA SENTENÇA – OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – RECURSO NÃO CONHECIDO NESTE PONTO – PRETENDIDA REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA – POSSIBILIDADE, DE ACORDO COM OS GANHOS E PERDAS DE CADA LITIGANTE. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, PARCIALMENTE PROVIDO. , relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nºVISTOS 20055-32.2010.8.16.0088, DA Vara Cível da Comarca de Guaratuba, em que é Apelante CAIXA , figurando como Apelados PREVIDÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL - PREVI DAVID e .OLIVEIRA VALDENICE MARIA QUINTANEIRO RIBEIRO 1. Relatório. Trata-se de apelação interposta por Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil – PREVI contra a sentença (mov. 62.1) que, nos autos dos Embargos à Execução nº 0020055-32.2010.8.16.0088, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para “a. Declarar a nulidade das cláusulas que preveem a incidência da capitalização de juros, do CET e da cobrança de honorários advocatícios e custas processuais em desfavor dos devedores; b) Determinar a readequação do débito exequendo, com base na exclusão da cobrança dos juros capitalizados e do CET (para fins de abatimento do valor exigido na execução apensa); a qual será feita em liquidação de sentença, com fulcro no art. 509, I do NCPC”. Em razão da sucumbência recíproca, condenou o Embargante ao pagamento de 70% e o Embargado a 30% das custas e honorários, estes fixados em 10% do valor da causa. Irresignada, Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil – PREVI interpõe recurso, sustentando, em suma, que: a) o Apelado desistiu da realização da prova pericial; b) ante a não realização da perícia, não restaram demonstradas as alegações do Embargante/Apelado; c) a Magistrada , equivocadamente, determinou que, caso verificada a cobrança de capitalização, sejaa quo afastada em liquidação; c) a condenação é despropositada, eis que, em liquidação, pode-se concluir que os encargos afastados sequer foram cobrados; d) era ônus do Apelante comprovar a incidência de juros capitalizados e demais encargos afastados; e) a Apelante é entidade privada de previdência fechada e não instituição financeira e, portanto, sujeita-se a legislação específica, devendo ser respeitado o pacta sunt e o princípio da boa-fé, do contrário, serão prejudicados todos os associados; f) a previsão daservanda incidência de juros “capitalizados mensalmente” não pressupõe acumulo dos juros ao saldo devedor, eis que uma parte da parcela se destina ao pagamento dos juros e a outra parte à amortização da dívida, logo, os juros são liquidados mensalmente e não são integrados ao saldo devedor; g) sucessivamente, deve ser admitida a capitalização anual, eis que permitida por lei; h) não há ilegalidade na cobrança do Coeficiente de Equalização de Taxas e os Apelados não demonstraram nenhum vício em sua cobrança. A parte Apelada ofereceu suas contrarrazões no mov. 89.1, pugnando pelo não conhecimento do recurso em razão da ofensa ao princípio da dialeticidade, no mérito, pugnou pelo seu desprovimento. Subiram os autos a este Tribunal, vindo-me em seguida conclusos. É o relatório. 2. Voto: Preliminar Em contrarrazões, os Apelados sustentam que o recurso não combate os fundamentos da sentença e, portanto, não reúne condições de admissibilidade. Com parcial razão. Isso porque parte das razões de Apelação, conforme adiante se verá, não combate efetivamente os fundamentos da sentença, motivo pelo qual conhece-se do recurso apenas em parte. Do , da Boa-Fé Objetiva e do Suposto Prejuízo aos DemaisPacta Sunt Servanda Associados. Sustenta o Apelante que devem ser observados os princípios da pacta sunt servanda e da Boa-Fé objetiva, devendo prevalecer as previsões contratuais. Assevera, ainda, que a revisão contratual implicará prejuízos a todo o grupo de associados. Sem razão. Em que pesem os argumentos da instituição financeira, é perfeitamente cabível a revisão dos contratos sem ofensa aos princípios que orientam a liberdade de contratar, previstos no art. 422 do Código Civil. Isso porque deve, também, ser observada a função social do contrato, admitindo-se a mitigação do .pacta sunt servanda Nesse sentido leciona Flávio Tartuce: "Anote-se que o princípio da força obrigatória como regra máxima tinha previsão já no direito romano, segundo o qual deveria prevalecer o pacta sunt servanda, ou seja, a força obrigatória do estipulado no pacto. Não poderia, portanto, sem qualquer razão plausível, ser o contrato revisto ou extinto, sob pena de acarretar insegurança jurídica ao sistema. Porém, a realidade jurídica e fática do mundo capitalista e pós-moderno não possibilita mais a concepção estanque do contrato. O mundo globalizado, a livre concorrência, o domínio do crédito por grandes grupos econômicos e a manipulação dos meios de marketing geraram um grande impacto no Direito Contratual. Como já se destacou, vive-se, na expressão de Enzo Roppo, o Império dos Contratos-Modelo, pela prevalência maciça dos contratos de adesão, com conteúdo pré-estipulado. Dentro dessa realidade, o princípio da força obrigatória ou da obrigatoriedade das convenções continua previsto em nosso ordenamento jurídico, mas não mais como regra geral, como antes era concebido. A força obrigatória constitui exceção à regra geral da socialidade, secundária à função social do contrato, princípio que impera dentro da nova realidade do direito privado contemporâneo. Certo é, portanto, que o princípio da força obrigatória não tem mais encontrado a predominância e a prevalência que exercia no passado. O princípio em questão está, portanto, mitigado ou relativizado, sobretudo pelos princípios sociais da função social do contrato e da boa-fé objetiva”. Conclui-se, portanto, que é plenamente admitida a revisão contratual para afastar eventuais abusividades ou ilegalidades e atender à função social do contrato, sem que isso implique ofensa aos princípios orientadores do Código Civil. No que tange ao alegado prejuízo aos demais associados, não há nos autos qualquer prova nesse sentido, sendo descabida a pretensão. Ademais, reconhecida eventualmente a existência de cobranças abusivas, a repetição do indébito é consequência lógica, sob pena de enriquecimento ilícito. Nessas circunstâncias, nego provimento ao recurso nesse ponto. Da Capitalização de Juros Sustenta o Apelante que os Apelados não comprovaram a existência efetiva de cobrançade juros capitalizados, eis que renunciaram à produção da prova pericial que anteriormente havia sido deferida. Assevera, ainda, que determinar que a ocorrência da capitalização seja verificada em liquidação é medida inadequada, porquanto, caso inexista capitalização de juros, já se atribuíra à parte a sucumbência parcial. Com razão. Compulsando os autos, verifica-se que a sentença proferida é condicional e, portanto, nula de pleno direito, no que diz respeito à capitalização mensal dos juros. Isso porque a Magistrada determinou o expurgo de encargo cuja incidênciaa quo sequer foi comprovada no processo, postergando a verificação da efetiva ocorrência de capitalização mensal dos juros para a fase de liquidação de sentença, o que não se admite. Ora, o art. 492, parágrafo único, do CPC impõe que a sentença deve ser certa,[1] ainda que resolva relação jurídica condicional. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELAÇÕES DE AMBAS AS PARTES. RECURSOS PREJUDICADOS. NULIDADE DA SENTENÇA. DECISÃO CONDICIONAL QUE, A DESPEITO DA AUSÊNCIA DE CONTRATO NOS AUTOS, RECONHECE A ALEGADA ABUSIVIDADE DE CLÁUSULAS, AO MESMO TEMPO EM QUE DELEGA À FASE DE LIQUIDAÇÃO A VERIFICAÇÃO DAS ILEGALIDADES. AFRONTA AO ART. 460, P. ÚNICO, DO CPC. ANÁLISE DOIMPOSSIBILIDADE. RECURSO PREJUDICADA.” (TJPR - 14ª C.Cível - AC - 1214388-3 - Pato Branco - Rel.: Gil Francisco de Paula Xavier F Guerra - Unânime - - J. 03.12.2014)(destaquei) Logo, porque condicional, a sentença seria nula de pleno direito neste tópico. Todavia, por estar a causa madura para julgamento, nos termos do art. 1.013, do CPC/2015, nada impede que o Colegiado decote esse tópico para, desde logo, analisar a questão. Como já salientado, embora tenha alegado a ocorrência de indevida capitalização mensal dos juros, os Apelados renunciaram à produção da prova pericial que anteriormente haviam requerido e fora deferido pelo juízo singular, não trazendo aos autos qualquer prova capaz de confirmar a efetiva prática do alegado anatocismo. Ademais, a análise da documentação acostada aos autos não permite a conclusão de que houve efetiva e indevida capitalização mensal dos juros, sendo a incidência da Tabela Price e a menção contratual à possibilidade de capitalização mensal insuficientes para comprovar a cobrança. Isso porque a incidência da Tabela Price, por si só, não implica capitalização de juros, mas apenas indica o método de cálculo utilizado para a composição das parcelas. Já a capitalização de juros consiste na cobrança de novos juros sobre os juros vencidos e não pagos, não se confundido com o método de cálculo eleito na fase pré-contratual. Logo, para se comprovar a ocorrência da capitalização de juros, era imprescindível a realização de prova pericial, não bastando a simples alegação genérica de sua ocorrência. Todavia, os Apelados desistiram da prova pericial e, por isso, não se desincumbiram do ônus que lhes era imposto pelo art. 373, I do CPC , sendo de rigor o indeferimento da pretensão.[2] Da Cobrança do Coeficiente de Equalização de Taxas Sustenta o Apelante que, por não configurar abusividade, não há óbice à incidência do CET. Nesse ponto, contudo, verifica-se que o Apelo não impugna o fundamento da sentença e, portanto, não merece conhecimento. Isso porque a sentença não tratou sobre a abusividade do Coeficiente, esclarecendo, inclusive, que o Coeficiente de Equalização não é abusivo. Todavia, reconheceu-se a abusividade da incidência simultânea do CET e do Fundo de Liquidez. Veja-se: “O fundo de liquidez está previsto na cláusula 5ª - b do contrato, enquanto a cobrança de Coeficiente de Equalização de Taxas estipulado na cláusula 12ª. Apesar de a incidência de fundo de liquidez e do CET não ser considerada abusiva – desde que expressamente inserida no contrato, os tribunais superiores têm vedado a aplicação simultânea dos referidos encargos, já que esta hipótese representa onerosidade excessiva para o devedor. Neste sentido: APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS À EXECUÇÃO – PREVIDÊNCIA PRIVADA – MÚTUO HABITACIONAL - AQUISIÇÃO DE IMÓVEL - PREVI – [...] - AFASTAMENTO DE SUA UTILIZAÇÃO – COBRANÇA DO COEFICIENTE DE EQUALIZAÇÃO DE TAXAS (CET) QUE CONFIGURA BIS IN IDEM ANTE A ESTIPULAÇÃO DO FUNDO DE LIQUIDEZ PACTUADO CONCOMITANTEMENTE – AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR APÓS SUA CORREÇÃO - POSSIBILIDADE - PRECEDENTES DO STJ – MULTA MORATÓRIA DE 10% PACTUADA ANTES DA LEI N. 9.289/1996, QUE ALTEROU A REDAÇÃO DO § 1º, DO ART. 52, DA LEI 8.078/1990 – EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO - SENTENÇA A QUO QUE REVISOU AS CLÁUSULAS ABUSIVAS CONTIDAS NO CONTRATO E EXTINGUIU A EXECUÇÃO - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (RECURSO ESPECIAL Nº 1.625.006 - SE (2016/0237325-3) RELATORA: MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI Brasília (DF), 08/08/2018) Havendo sobreposição de taxas com o mesmo objetivo, há de ser declarada nula a cláusula que prevê a aplicação do CET”. (destaquei) Contudo, o Apelante não teceu qualquer argumento no sentido de amparar a possibilidade da cobrança simultânea de tais encargos, limitando-se a sustentar a inexistência de abusividade da CET e, por isso, não dialogou com o hostilizado.decisum Logo, como se vê, o fundamento da sentença não foi combatido pelo Apelante, razão pela qual, em razão da ofensa ao princípio da dialeticidade, o recurso não merece conhecimento, neste ponto. Da Redistribuição Da Sucumbência Ante o parcial provimento do presente recurso, é de rigor a adequação da condenação em custas e honorários. Assim, considerada a extensão de êxito do Apelante, o ônus de sucumbência deve ser redistribuído, incumbindo aos Embargantes/Apelados o pagamento de 80% das custas e honorários fixados, restando ao Embargado/Apelante a responsabilidade pelos 20% restante. Por conseguinte, o voto é pelo parcial conhecimento e, na parte conhecida, pelo parcial provimento do presente apelo. Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em[1] quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado. Parágrafo único. A decisão deve ser certa, ainda que resolva relação jurídica condicional. Art. 373. O ônus da prova incumbe:[2] I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; Ante o exposto, acordam os Desembargadores da 14ª Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em julgar pelo (a) Conhecimento em Parte e Provimento em Parte do recurso de CAIXA DE PREVIDÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL. O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador José Hipólito Xavier Da Silva, com voto, e dele participaram Juiz Subst. 2ºgrau Antonio Domingos Ramina Junior (relator) e Desembargadora Themis De Almeida Furquim. 12 de junho de 2019 Antonio Domingos Ramina Junior Relator Convocado
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