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METODOLOGIA CIENTÍFICA APLICADA À PUBLICIDADE AULA 1 Profª Máira Nunes Prof. Matias Peruyera 2 CONVERSA INICIAL Olá, aluno! Nós nos acostumamos a tomar os fatos comprovados cientificamente como verdades absolutas. Mas você já parou para pensar em como essa comprovação ocorre? Aprendemos na escola sobre o resultado das pesquisas científicas, mas não sobre como elas são realizadas. Também aprendemos muito sobre as ciências exatas, naturais, cujos saberes são produzidos e testados em laboratórios. E as ciências humanas e sociais? Você sabe onde são desenvolvidas? É disso que iremos tratar em nossa aula, abordando a construção do conhecimento científico, as diferentes formas de ciência e as características da pesquisa científica no campo da publicidade e propaganda. O principal objetivo da nossa aula é introduzir a ideia de ciência e apresentar algumas características do conhecimento científico e da construção dos campos teóricos, em especial a comunicação social e a publicidade e propaganda. Como todo conhecimento, a ciência também tem uma história, e é importante conhecermos como ela surgiu e de que forma é concebida. Para que possamos produzir pesquisas científicas, precisamos dominar os procedimentos metodológicos e saber a melhor forma de aplicá-los. A pesquisa científica investiga o mundo em que vivemos e a própria humanidade. Para tanto, recorremos à observação e à reflexão. Analisamos problemas relativos à realidade que nos cerca a partir do conhecimento produzido ao longo da história. Será que as respostas e soluções encontradas anteriormente ainda servem nos dias de hoje? Qual a melhor forma de intervir no mundo? Podemos buscar compreender a natureza, a sociedade e os seres humanos transformando a realidade. Desde o surgimento da filosofia, foram estabelecidos diferentes paradigmas que orientam as pesquisas científicas. Um paradigma é um modelo, um padrão a ser seguido na investigação científica, com base em preceitos e procedimentos. É fundamental nos lembrarmos de que a construção do conhecimento científico não é algo que se dá fora do contexto social. Muito pelo contrário. As pesquisas científicas fazem parte da cadeia produtiva, integrando a atividade econômica e política da sociedade. 3 CONTEXTUALIZANDO O conhecimento pode ser caracterizado como determinada representação do real. A forma como conhecemos o mundo se dá de diferentes maneiras. As nossas experiências, as nossas leituras e a interação com outras pessoas produzem mudanças no nosso conhecimento e na nossa concepção da realidade social. Percebemos, então, que existem diferentes tipos de conhecimento, organizados de acordo com as suas características e com a maneira como são produzidos. Figura 1 – Tipos de conhecimento Fonte: Adaptado de Silva, 2005. Esses diferentes tipos de conhecimento fazem parte do nosso repertório social e compõem a forma como apreendemos a realidade. Nesta disciplina, estudaremos as características da construção do conhecimento científico e os tipos de pesquisa científica. É importante que você saiba identificar os diferentes tipos de conhecimento e separar, no próprio repertório, a fonte dos seus • Baseado nas experiências e na tradição, é obtido ao acaso e transmitido oralmente de uma geração para outra. Conhecimento popular/senso comum • Baseado na fé e nas crenças religiosas, não necessita, portanto, de comprovação científica.Conhecimento teológico • Baseado na observação racional dos fatos e fenômenos, e construído por meio da especulação e da reflexão.Conhecimento filosófico • Baseado na análise racional, objetiva e verificável da realidade, por meio de procedimentos metodológicos.Conhecimento científico 4 conhecimentos. Será que o que você acredita como verdade não é fonte do senso comum? TEMA 1 – CIÊNCIA E CONHECIMENTO CIENTÍFICO Os seres humanos desenvolveram, ao longo da história, diferentes formas de organizar e explicar o mundo à sua volta. O primeiro tipo de explicação da realidade criado foi o mito, entendido como uma narrativa genealógica que conta a origem das coisas e explica nossa caminhada existencial pela ação de entes sobrenaturais sobre a realidade. Muitos povos da Antiguidade, como sumérios, egípcios, hebreus, chineses, persas e indianos, criaram mitos para explicar sua própria realidade, mas foram os gregos que, por meio da filosofia, transformaram esses relatos em um tipo de ciência, um conhecimento racional: a filosofia. O pensamento filosófico surgiu na Grécia, entre o final do século VII e o início do século VI a.C., propondo estabelecer uma explicação racional dos fenômenos. Isso significa que, para apresentar respostas aos problemas, a filosofia acredita que devemos realizar uma análise racional com base em regras universais, recusando explicações pré-estabelecidas. Para os gregos, a capacidade intelectual humana era capaz de alcançar a racionalidade do real; já na Idade Média, essa visão começou a sofrer transformações com a inserção, no pensamento filosófico, da questão da fé. A crença na graça divina permitiria à razão o conhecimento das coisas materiais, por meio da vontade de Deus. A filosofia medieval possuía algumas diferenças fundamentais da filosofia clássica grega: o cristianismo distinguia razão e fé, verdades racionais e revelações divinas, corpo e alma (Chaui, 2012). Na Idade Moderna, ocorreu uma nova separação entre fé e razão, principalmente devido ao surgimento do pensamento científico. Os filósofos modernos tomaram o ponto de partida dos gregos e traçaram um caminho para chegar à verdade. A chamada Revolução Científica teve início com a obra Sobre a revolução das orbes celestes (1543), de Nicolau Copérnico, na qual ele defende matematicamente o modelo heliocêntrico (o Sol como centro do cosmo). “A ciência moderna surge quando se torna mais importante salvar os fenômenos e quando a observação, a experimentação e a verificação de hipóteses tornam- se critérios decisivos, suplantando o argumento metafísico” (Marcondes, 2005, p. 150). 5 Figura 2 – Estátua de Nicolau Copérnico. Torun, Polônia Fonte: Shutterstock. É importante lembrarmos que essa ciência surgida após o Renascimento não é a mesma que temos hoje. O uso que fazemos atualmente do termo ciência foi estabelecido no século XIX, período de organização dos diferentes campos científicos. O que existia na Idade Moderna era uma espécie de filosofia natural, desenvolvida para explicar o sistema do mundo em sua totalidade (Henry, 1998). Podemos afirmar, então, que a ciência moderna surgiu da organização de métodos, formas de observação e experimentação, conceitos e teorias que formam um sistema de conhecimento. Assim, definimos a ciência como Um pensamento racional, objetivo, lógico e confiável [tem] como particularidade o ser sistemático, exato e falível, [...] submetido à experimentação para comprovação de seus enunciados e hipóteses, procurando-se as relações causais; destaca-se, também, a importância da metodologia que, em última análise, determinará a própria possibilidade de experimentação (Lakatos; Marconi, 1991, p. 20). Para Lakatos e Marconi (1991), o conhecimento científico possui características muito específicas que o diferenciam dos outros tipos de conhecimento, como as listadas abaixo: • Racionalidade: operações mentais de raciocínio que organizam conceitos e juízos, ordenando as ideias com base em regras lógicas. • Objetividade: concordância com o objeto de estudo, verificando a adequação de hipóteses aos fatos. 6• Factualidade: parte sempre dos fatos segundo preceitos conceituais, utilizando-os como matéria-prima da ciência. • Análise: decomposição do todo em partes componentes buscando soluções para o problema levantado, conduzindo à síntese ou conclusão. • Clareza: busca de objetividade e exatidão, evitando ambiguidades. • Verificação: todo o processo de pesquisa deve ser reproduzível e verificável por meio da prova da experiência. • Comunicação: busca informar o processo de pesquisa, permitindo a verificação de dados e hipóteses. • Investigação: dá-se por meio de planejamento e recuperação de saberes anteriores. • Sistematização: correlação entre ideias e sistemas de referência. • Acumulação: conhecimentos antigos são constantemente recuperados e revisados na construção de novos conhecimentos. Assim, entendemos que a construção do conhecimento científico não acontece espontaneamente, por meio de nossas vivências, mas pelo trabalho de investigação científica, que reúne um conjunto de atividades intelectuais e técnicas organizadas com base em procedimentos metodológicos. TEMA 2 – CLASSIFICAÇÃO DAS CIÊNCIAS Desde a Idade Antiga, a filosofia tem se preocupado com a organização e a classificação dos saberes, além, é claro, com a investigação dos fenômenos. O filósofo Aristóteles, nascido na cidade de Estágira e discípulo de Platão, foi o primeiro a reunir os saberes produzidos e acumulados em todos os campos do saber na Grécia. Tomando como ponto de partida o pensamento filosófico, passou a estabelecer uma diferenciação entre esses saberes, hierarquizando- os, dos mais simples para os mais complexos. Assim, para Aristóteles, “cada saber, no campo que lhe é próprio, possui seu objeto específico, procedimentos específicos para sua aquisição e exposição, formas próprias de demonstração e prova” (Chaui, 2012, p. 48). O filósofo entendia que cada campo do conhecimento se constitui em uma ciência – uma episteme. Figura 3 – Estátua de Aristóteles, filósofo grego 7 Fonte: Shutterstock. Em seu sistema classificatório, segundo Chaui (2012), Aristóteles organizou as ciências da seguinte maneira: ciências produtivas (arquitetura, economia, medicina, pintura, escultura, poesia, teatro, oratória), ciências práticas (ética, política) e ciências teóricas (divididas em ciência das coisas naturais submetidas à mudança – física, biologia, meteorologia, psicologia –, ciência das coisas naturais que não estão submetidas à mudança – matemática, astronomia –, ciência da realidade pura – metafísica – e ciência teórica das coisas divinas – teologia). A classificação das ciências proposta pela filosofia passou por diferentes mudanças até a estruturação das ciências como campos do conhecimento e áreas disciplinares, que ocorreu no século XIX. Durante muito tempo, pesquisadores e teóricos discutiram sobre a possibilidade da existência de ciências humanas e sociais, principalmente pelo fato de não poderem usar as mesmas premissas e procedimentos metodológicos das ciências naturais. Se a ciência trabalha com classificações, leis gerais, fatos observáveis, análises e sínteses, como é possível produzir uma observação racional e metódica da subjetividade humana? Foi para responder a essa pergunta que passaram a ser desenvolvidos métodos específicos das ciências sociais, que permitem a construção do conhecimento científico com base no estudo das relações humanas e da vida social dos indivíduos. 8 É importante também lembrarmos que não existe um único método ou uma única ciência, mas vários tipos de conhecimento científico organizados de acordo com as características de seu objeto. Há diferentes formas de classificar as ciências: algumas são histórias, outras universais, outras regionais (distintas em cada país). Figura 4 – Possíveis divisões da ciência Fonte: Adaptado de Lakatos e Marconi, 1991, p. 24. Há outras formas de classificar a ciência. No Brasil, existem dois sistemas de classificação, o do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)1 e o da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)2. Segundo a classificação do CNPq, existem grandes áreas: 1 <www.cnpq.br>. 2 <www.capes.gov.br>. Ciências Formais Lógica Matemática Factuais Naturais Física Química Biologia Sociais Comunicação Sociologia Psicologia 9 • ciências agrárias; • ciências biológicas; • ciências da saúde; • ciências exatas e da terra; • engenharias; • ciências humanas; • ciências sociais aplicadas; • linguística, letras e artes. A Capes possui um campo a mais, o multidisciplinar. A publicidade e propaganda se constitui também como uma área do conhecimento científico e faz parte do campo teórico da comunicação social. Segundo a classificação vigente, está inserida na grande área chamada ciências sociais aplicadas. Entre as características dessa grande área estão o estudo das necessidades humanas, os aspectos sociais da nossa realidade e, principalmente, a interdisciplinaridade. Entendendo que, desde o século XIX, as ciências se separaram e se especializaram, percebemos que a interdisciplinaridade é uma forma de superar a fragmentação do conhecimento em diferentes “caixas”, em áreas que não se conversam e não compartilham saberes. Apesar das suas especificidades, a comunicação social é uma ciência que se encontra na fronteira entre diferentes saberes, como a história, a sociologia, a filosofia e a psicologia. Essa característica nos permite pensar nas práticas e processos comunicacionais de forma ampla, relacionando-os com a nossa realidade social. TEMA 3 – O MÉTODO CIENTÍFICO Desde as primeiras civilizações, produzimos formas de compreender e organizar o mundo à nossa volta: o povo egípcio desenvolveu conhecimentos sobre matemática e medicina; os gregos criaram a filosofia e organizaram os saberes existentes até então; os pensadores católicos medievais submeteram a razão à fé; os renascentistas resgataram o conhecimento científico. Foi durante a Idade Moderna que se estruturaram os preceitos da ciência pelo desenvolvimento do método científico e, a partir do século XIX, a ciência se tornou o campo do conhecimento que conhecemos hoje. 10 Com a separação entre fé e razão, surge a teoria do conhecimento de fato, e o conhecimento passa a ocupar lugar de destaque na compreensão de como nossas ideias correspondem à realidade. Os filósofos modernos, então, tomam o ponto de partida dos gregos e traçam um caminho que parte das opiniões para chegar à verdade. A principal mudança está no questionamento da própria possibilidade do conhecimento e de qual é o sujeito do conhecimento. Os estudos filosóficos modernos se dividem, então, em racionalismo e empirismo. Considera-se que Galileu Galilei foi o primeiro pensador a desenvolver um método experimental como forma de sistematização de atividades. Os passos do seu método compreendiam a observação dos fenômenos, a análise dos elementos que constituem esses fenômenos, a indução de hipóteses, a verificação dessas hipóteses, a generalização dos resultados para outros semelhantes e a confirmação das hipóteses. Já Francis Bacon, seu contemporâneo, propôs como método as seguintes etapas: experimentação, formulação de hipóteses, repetição, testagem das hipóteses, formulação de generalizações e leis (Lakatos; Marconi, 1991). O principal representante do racionalismo moderno é o filósofo René Descartes. Na busca do verdadeiro conhecimento, Descartes desenvolveu a dúvida metódicacomo procedimento de aferição da verdade, propondo uma reforma do entendimento das ciências que pode ser feita pelo sujeito do conhecimento. Em 1637, Descartes publicou na obra O discurso do método, na qual apresentou seus preceitos do método científico: a evidência, a análise, a síntese e a enumeração. 11 Figura 5 – Retrato de René Descartes (1596-1650) Fonte: Shutterstock. Ao estudarmos esse desenvolvimento histórico, verificamos que o método científico consiste, então, em um conjunto de procedimentos que organiza a formulação do pensamento científico e que representa a concepção moderna de ciência. Assim, para que se possa estabelecer um conhecimento racional e exato, são necessários procedimentos metodológicos para que haja a verificação dos resultados alcançados. O método científico é, portanto, “o conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos adotados para se atingir o conhecimento” (Gil, 2008, p. 12). A metodologia científica nos permite adquirir um novo conhecimento, apontando caminhos para o autoaprendizado. Nesse caminho, aprendemos a encontrar e sistematizar o conhecimento identificando, entre os métodos disponíveis, suas limitações e/ou vantagens. Portanto, toda investigação parte da observação de algum fenômeno, de alguma experiência, para que se possa resolver problemas e passar da dúvida à certeza. 12 Para Lakatos e Marconi (1991), o conceito de método parte da teoria da investigação e se concretiza quando cumpre as seguintes etapas: • Identificação do problema a ser pesquisado. • Colocação precisa do problema. • Procura de conhecimentos ou instrumentos relevantes ao problema. • Tentativa de solução do problema com auxílio dos meios identificados. • Formulação de novas ideias. • Produção de novos dados empíricos. • Obtenção de uma solução para o problema. • Investigação das consequências da solução obtida. • Comprovação da solução. • Correção das hipóteses, teorias, procedimentos ou dados empregados na obtenção da solução incorreta. Cada campo científico desenvolve seu conjunto de procedimentos metodológicos de maneira específica. Nas ciências sociais e humanas, de acordo com sua função na pesquisa, os que proporcionam as bases lógicas da investigação científica são os apontados a seguir: Podem ser incluídos neste grupo os métodos: dedutivo, indutivo, hipotético-dedutivo, dialético e fenomenológico. Cada um deles vincula-se a uma das correntes filosóficas que se propõem a explicar como se processa o conhecimento da realidade. O método dedutivo relaciona-se ao racionalismo, o indutivo ao empirismo, o hipotético- dedutivo ao neopositivismo, o dialético ao materialismo dialético e o fenomenológico, naturalmente, à fenomenologia (Gil, 2008, p. 9). Já os conjuntos que esclarecem acerca dos procedimentos técnicos que poderão ser utilizados são: o experimental, o observacional, o comparativo, o estatístico e o monográfico. A pesquisa em comunicação compreende o estudo dos meios e processos de comunicação e, portanto, pressupõe o estabelecimento de procedimentos metodológicos específicos. Devido ao fato de a área ser interdisciplinar, podemos também compartilhar tipos de pesquisa, métodos e procedimentos de outras áreas. Assim, na comunicação, as pesquisas podem ser exploratórias, quantitativas ou qualitativas, documentais, estatísticas etc. O aporte teórico e a natureza do objeto de pesquisa é que conduzirão a escolha do melhor método ou, até mesmo, uma possível combinação de diferentes procedimentos metodológicos. 13 TEMA 4 – TEORIA: COMUNICAÇÃO E PUBLICIDADE Tipicamente, ao começar um trabalho de pesquisa, precisamos de um arcabouço teórico. Vamos escolher uma teoria, ou um campo de estudos, que será o embasamento teórico de nossa pesquisa. Segundo Barros (2011), todo campo científico, como é o caso da publicidade e propaganda, ou da comunicação, tem uma organização própria, uma linguagem, que por sua vez dialoga com outros campos do saber; além disso, essa linguagem também vai se tornando consciente das suas realizações, formando, assim, um repertório próprio. Vale lembrar que, quando falamos em teoria, não estamos falando de conjecturas, hipóteses ou chutes. Em ciência, o termo teoria se refere a informações cientificamente comprovadas. Ainda segundo Barros, uma teoria é uma visão de mundo, uma espécie de lente com a qual cientistas – você mesmo, inclusive – enxergam o mundo (Barros, 2011). Ele ainda propõe considerar a existência de três níveis de teoria. 4.1 Um campo de estudos Nesse nível, a teoria diz respeito a tudo o que se sabe sobre um campo do conhecimento. Quando falamos em Teoria da Comunicação, estamos nos referindo a tudo o que já foi pesquisado e escrito a respeito da comunicação. Para nos referirmos à diversidade e possíveis contradições entre diferentes pesquisas, geralmente falamos no plural: Teorias da Comunicação. 4.2 Modelos explicativos Esse nível se refere a explicações mais específicas de fenômenos de complexidades diferentes. Sabemos como um mosquito se reproduz, quais foram os fatos que se desdobraram na declaração da independência brasileira ou por quais motivos certas pessoas escolhem uma marca de achocolatado; ou ainda questões mais amplas, como é o caso da Teoria da Evolução das Espécies, ou a do Big Bang. Essas explicações estão dentro de teorias mais amplas, correspondentes ao nível de campo de estudos: biologia, história, comportamento do consumidor, física etc. 14 4.3 Uma forma de apreender o mundo Nesse nível, Barros (2011) foca na teoria como atitude. Ele fala da diferença entre o teórico e o intuitivo. A teoria precisa de métodos, de comprovações, de lógica. A intuição, não. O conhecimento proveniente da intuição não precisa ser comprovado, é instantâneo, porque não precisa das mediações entre sujeito e objeto. Já a teoria precisa de etapas, procedimentos e métodos. A intuição, apesar de poder colaborar com a ciência, não é científica. 4.4 Teorias na comunicação E em que aspectos isso nos interessa para a pesquisa em comunicação? Primeiro, para sabermos da existência de teorias que explicam o nosso objeto de pesquisa. Claro que vamos adaptá-las e combiná-las, para construir um arcabouço teórico que nos ajude a alcançar nossos objetivos de pesquisa, inclusive trazendo teorias de outros campos – nesta aula, por exemplo, estamos discutindo com base na teoria elaborada por um historiador. Temos também de saber escolher de qual teoria vamos partir, com qual lente vamos ver nosso objeto de pesquisa e se essa teoria é adequada ao nosso trabalho. Precisamos reconhecer as limitações das teorias e até que ponto elas podem colaborar com nosso trabalho. Por último, é importante reconhecermos a importância da teoria diante da intuição. Um trabalho científico não pode ser feito com a intuição, com informações retiradas do senso comum ou de achismos. Tudo o que estiver em um trabalho científico precisa estar fundamentado, apoiado em teorias já existentes ou fundamentado em experimentos levados a cabo por quem pesquisa. Dar importância a esse tipo de conhecimento também nos ajuda a valorizar o trabalho de quem produz material com embasamento e a ter uma visão crítica sobre a ciência de modo geral. TEMA 5 – A PESQUISA EM PUBLICIDADE E PROPAGANDA Falamos, até aqui, de vários aspectos e definições de ciência, de teorias, de tipos de conhecimento. E onde entra a publicidade nesse contexto? Podemos partir do princípio de que a publicidade se torna ciência a partir do momento em que ela – e também quem a produz – pode se caracterizar comoum objeto de pesquisa, ou até um método de pesquisa. 15 Mas o que é possível pesquisar na publicidade? Muita coisa! A publicidade é um objeto complexo, com várias facetas e maneiras de estudá-las. Para ilustrarmos a variedade dessas facetas, vamos falar dos temas propostos nos cinco grupos de trabalhos do VII Propesq, congresso de pesquisa em publicidade e propaganda (Propesq, 2016). Não estamos abordando os cinco grupos exatamente da maneira apresentada pelo Propesq, apenas usamos essa divisão como base para vermos a diversidade de assuntos que podem ser abordados. Poderíamos ter feito outro tipo de levantamento, mas escolher um determinado documento e dizer que consideraremos as informações contidas nele é um procedimento científico válido. Fizemos, então, um recorte da informação disponível sobre o assunto, já que não poderíamos abarcar toda a produção científica de publicidade. A semiótica é uma ciência importantíssima para a publicidade, afinal, esta produz justamente o que aquela estuda: signos. Analisar peças publicitárias com base na semiótica é uma maneira bem comum de fazer ciência. Verificar como esses signos produzem sentido e significados para diferentes pessoas, e como os indivíduos que os produziram fizeram uso de elementos de linguagem para comunicar o que precisavam, está dentro do escopo da semiótica. As produções de sentido também podem ser abordadas por outro ângulo, o dos estudos de recepção, que tratam justamente da forma que as pessoas recebem certos signos, como os produzidos pela publicidade. Os estudos de recepção e a semiótica são diferentes maneiras – mas não as únicas – de abordar a questão da relação entre sujeitos e signos, seja considerando pessoas específicas, seja analisando populações maiores. A forma dos signos pode ser analisada fazendo-se uso de teorias relacionadas à estética, ao design, à arte, à história, entre outras áreas. Na rede inglesa de supermercados Tesco, por exemplo, a distribuição dos produtos não é aleatória; foi pensada para influenciar nas decisões dos compradores. É possível estudar tanto essas técnicas como estudar os consumidores para criar outras novas. 16 Figura 6 – Gôndola de supermercado Tesco em Londres, Inglaterra Fonte: Shutterstock. Além de como as pessoas recebem os materiais, é possível tentar entender como elas consomem produtos – em um sentido amplo tanto da palavra consumir como da palavra produtos. É possível analisar de que forma as pessoas se comportam como consumidores, quais produtos compram, quais produtos preferem, como elas veem as diferentes marcas etc. Pensando em sentidos mais amplos, pesquisam-se a quais séries as pessoas assistem, seus hábitos à frente da TV, quais lugares das cidades elas frequentam, entre outros. Figura 7 – Homem assistindo à televisão Fonte: Shutterstock. Seu objeto de pesquisa pode se parecer bastante com essa foto. Ou ainda, sua pesquisa pode consistir em assistir à televisão. 17 Também é importante mencionar as pesquisas de tendências, que tentam prever o futuro, sondar como as pessoas consomem e recebem produtos, como fazem uso deles e como vão consumir esses produtos no futuro. Algumas pessoas apontam caminhos, mesmo sem saber, e é pela pesquisa que o mercado consegue encontrá-las e ir atrás desses caminhos. As tendências da moda, por exemplo, são um tema de pesquisa, assim como o jeito que as pessoas usam as roupas, as maneiras como elas divulgam suas próprias fotos de moda nas redes sociais, entre outros. São muitos os temas de pesquisa possíveis para o assunto, não é mesmo? Figura 8 – Na moda, até mesmo a linguagem fotográfica pode ser pesquisada Fonte: Shutterstock. Além de levantar informações, a pesquisa precisa descobrir como as fotografias circulam, são distribuídas, compartilhadas em redes sociais, principalmente na comunicação. Há também as questões éticas relacionadas à publicidade, tanto na produção como na veiculação, e a existência de leis ou regulações que ajudam a publicidade a ser mais ética. É muita coisa! Imagino que você se identifique ou se sinta curioso com algum desses aspectos e possibilidades de pesquisa. Qual o seu preferido? TROCANDO IDEIAS Conforme vimos na nossa aula, os tipos de conhecimento têm natureza e características diferentes. Após compreender as diferenças entre eles, procure verificar de onde vem seu próprio saber. Estabeleça uma rotina de reflexão ao 18 longo do dia, tentando perceber se os conhecimentos acionados nas suas atividades cotidianas (como tomar café, escolher uma música, estudar para uma disciplina, debater um fato político etc.) são conhecimentos populares, científicos, filosóficos ou teológicos. Faça anotações sobre as reflexões e dúvidas que possam vir a surgir ao longo da atividade e compare suas ideias com as dos colegas de turma. Vocês podem separar alguns temas específicos e promover um debate sobre os tipos de conhecimento que acionamos todos os dias. NA PRÁTICA A Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom) é o principal órgão de pesquisa em comunicação social do país. Com outras sociedades, a Intercom fomenta, divulga e premia as melhores pesquisas nos diferentes campos que compõem a comunicação. Anualmente, são realizados dois encontros, um regional e um nacional, no qual são apresentadas as pesquisas realizadas por discentes e docentes de instituições de ensino de todo o país. Há uma grande variedade temática e é importante conhecermos as diferentes categorias, para que possamos não apenas participar dos eventos, mas principalmente saber o que está sendo pesquisado. Nossa atividade consiste em iniciar a escolha do tema de pesquisa e está dividida em três etapas: 1. Consulte os anais dos encontros nacionais da Intercom, verificando as pesquisas apresentadas nos últimos três anos no campo da publicidade e propaganda: o 2017: <http://portalintercom.org.br/anais/nacional2017/lista_area_DT2- PP.htm>; o 2016: <http://portalintercom.org.br/anais/nacional2016/lista_area_DT2- PP.htm>; o 2015: <http://portalintercom.org.br/anais/nacional2015/lista_area_DT2- PP.htm>; 19 2. Consulte as outras divisões temáticas existentes no encontro: o 2017: <http://portalintercom.org.br/anais/nacional2017/lista_GPs.htm>; o 2016: <http://portalintercom.org.br/anais/nacional2016/lista_GPs.htm>; o 2015: <http://portalintercom.org.br/anais/nacional2015/lista_GPs.htm>. 3. Após conhecer o que está sendo pesquisado na área da publicidade e propaganda, comece a pensar no seu tema de pesquisa. Qual área mais interessa a você? Faça anotações, inclusive de suas dúvidas. Após refletir sobre os seus interesses, redija um pequeno texto falando sobre o seu possível tema de pesquisa e o que tem sido discutido sobre ele na Intercom. Lembre-se de que o assunto não precisa ser inédito, mas a abordagem de pesquisa, sim. 20 FINALIZANDO Figura 9 – Síntese da pesquisa em publicidade e propaganda Ciência: conhecimento racional, objetivo, lógico e confiável que tem como particularidade o ser sistemático, exato e falível. Método científico: conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos adotados para se atingir o conhecimento. Classificação da ciência: Ciências agrárias; ciências biológicas; ciências da saúde; ciências exatas e da terra; engenharias; ciências humanas; ciências sociais aplicadas; linguística, letras e artes. Teoria: campo de estudos; modelos explicativos; forma de apreender o mundo. Pesquisa em publicidadee propaganda 21 REFERÊNCIAS BARROS, J. A. Teoria da história. Petrópolis: Vozes, 2011. CHAUI, M. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2012. GIL, A. C. Métodos e técnicas da pesquisa social. São Paulo: Atlas, 2008. HENRY, J. A revolução científica e as origens da ciência moderna. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. de A. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 1991. MARCONDES, D. Iniciação à história da filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. PROPESQ. 7., 2016, Rio de Janeiro. Grupos de trabalhos. São Paulo: ECA, 2016. Disponível em: <http://www2.eca.usp.br/propesq/grupos.html>. Acesso em: 3 out. 2017. SILVA, M. A. F. da. Métodos e técnicas de pesquisa. Curitiba: Ibpex, 2005. Conversa inicial Olá, aluno! Nós nos acostumamos a tomar os fatos comprovados cientificamente como verdades absolutas. Mas você já parou para pensar em como essa comprovação ocorre? Aprendemos na escola sobre o resultado das pesquisas científicas, mas não sobre como elas são real... O principal objetivo da nossa aula é introduzir a ideia de ciência e apresentar algumas características do conhecimento científico e da construção dos campos teóricos, em especial a comunicação social e a publicidade e propaganda. Contextualizando 4.1 Um campo de estudos 4.2 Modelos explicativos 4.3 Uma forma de apreender o mundo 4.4 Teorias na comunicação Trocando ideias Na prática FINALIZANDO REFERÊNCIAS
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