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SUINOCULTURASUINOCULTURA DINÂMICADINÂMICA Ano 7 – No 21 – Junho/99 – Periódico técnico-informativo elaborado pela Embrapa Suínos e Aves Parvovirose Suína Jurij Sobestiansky1 Nelson Mores2 Paulo M. Roehe3 Introdução Em suinocultura as falhas reprodutivas são reconhecidas como um dos fatores mais im- portantes que afetam a eficiência produtiva de um rebanho e, devido a isto, assumem grande importância econômica. Dentro deste contexto, a parvovirose suína tem sido descrita como uma das causas mais importante destas falhas repro- dutivas em vários países do mundo, incluindo o Brasil. A parvovirose suína é uma virose de alta prevalência e distribuição universal. Os sinais da infecção são constatados, principalmente, em fêmeas não imunes no início de sua vida re- produtiva, caracterizados por morte embrionária, mumificação, natimortos, abortos e leitegadas pequenas. Ela se desenvolve basicamente em fêmeas suínas sorologicamente negativas que são infectadas pelo parvovirus durante a primeira metade da gestação. 1Escola de Veterinária, UFG, Cx.P. 131, CEP 74001-970, Goiânia, GO 2Embrapa Suínos e Aves 3Depto. Microbiologia, UFRGS, Av. Sarmento Leite, 500, 90050-170, Porto Alegre, RS Epidemiologia Estudos epidemiológicos demonstram que o PVS está distribuído, sendo enzoótico pratica- mente em todos rebanhos. No Brasil a situação é semelhante, uma vez que já foram realizados estudos envolvendo granjas localizadas em Minas Gerais, Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, constatando-se que todos os rebanhos envolvidos apresentavam animais sorologicamente positivos. Então, provavelmente, a maioria dos rebanho são sorologicamente positivos para o parvovirus. O que existe são plantéis com animais apresentando diferentes títulos de anticorpos circulantes, devido ao tipo de difusão do parvovírus nos rebanhos o que torna os animais de reprodução mais ou menos susceptíveis a doença. Este fato pode ser resultante das diferenças existentes entre criações intensivas, principalmente em relação às condições de higiene e manejo. O vírus pode ser introduzido numa criação através da aquisição de reprodutores que elim- inam o vírus pelas secreções nasais, genitais, placenta, fetos e fezes contaminadas. O cachaço pode infectar-se por ocasião da cobertura de fêmeas infectadas e desempenha um importante papel na disseminação do vírus, inclusive pelo sêmen que pode estar contaminado durante a fase aguda. Suínos e Aves Em geral, pode-se dizer que a maior parte das instalações de uma granja pode estar contam- inada, mas as maiores concentrações do vírus existem nas baias das porcas gestantes e essas representam uma fonte de infecção constante. Os animais mais susceptíveis no plantel são as fêmeas de reposição. Elas se tornam es- pecialmente susceptíveis à infecção quando a imunidade passiva, adquirida via colostro, desa- parece. Isto ocorre normalmente em torno do 5o mês de idade. Após este período, o risco de uma fêmea de reposição sofrer infecção e desenvolver viremia é muito grande sendo que em criações onde as fêmeas primíparas não imunes são mantidas isoladas, sem contato com animais mais velhos, este risco é maior ainda. A nível de rebanho nem todas fêmeas nulíparas sofrem infecção natural já durante primeira gestação e, devido a isto, pode-se ter fêmeas de segundo ou mesmo terceiro parto, susceptíveis à infecção. A medida que aumenta o número de partos por porca, diminuem os problemas reprodutivos associados ao PVS. Em granjas onde a reposição anual de fêmeas é acima de 30% e não são adotadas medidas preventivas de controle da parvovirose, em pouco tempo pode-se ter uma população susceptível à infecção o que pode ter conseqüências reproduti- vas e econômicas severas. A infeção pelo parvovírus se dá principalmente pelo contato oronasal e pelas fezes e secreções contaminadas. Os fetos de porcas infectadas e envoltórios fetais são também importantes fontes de vírus. Leitões, filhos de porcas infectadas durante a gestação, podem nascer infectados, tornando-se persistente fonte de infecção. Após a introdução do vírus em um rebanho susceptível sua difusão é rápida, levando em torno de três meses até que todos animais sejam sorologicamente positivos. Etiologia O agente causador da parvovirose suína é o Parvovirus Suíno (PVS) que pertence à família Parvoviridae, gênero Parvovírus, cujo ácido nu- cléico é o DNA. O nome “parvo” vem do latim e significa “pequeno”, uma alusão ao tamanho do vírus. Todos os parvovirus isolados, são antigeni- camente similares, existindo, portanto, somente um sorotipo identificado, embora hajam diferenças entre a patogenicidade de distintas amostras. Ele Figura 1: A mumificação fetal é um sinal clínico da parvovirose. Os fetos mumificados de uma leitegada afetada pelo parvovirus apresenta-se em diferentes estágios de desenvolvimento por que o vírus não afeta todos os fetos ao mesmo tempo. se caracteriza por se replicar com grande facili- dade em tecidos de rápida multiplicação celular (mitose curta), daí sua preferência por embriões, fetos e espermatozóides. O PVS é um vírus não envelopado o que lhe confere resistência a pH entre 3 e 9, a solventes de gorduras como clorofórmio, a detergentes, a muitos desinfetantes e a condições ambientais adversas. Em instalações desocupadas pode se manter ativo por mais de 20 semanas e em secreções e excreções de suínos infectados, em condições ambientais favoráveis, o parvovírus resiste durante meses. O PVS pode ser destruído em cinco minutos quando se usa soda cáustica ou hipoclorito de sódio. Além disto ele é sensível ao formol (10%) e ao glutaraldeido (2%), porém o tempo necessário para sua destruição é maior. Patogenia Após a infecção oronasal, o PVS se aloja nas amígdala e se replica, seguindo-se a viremia em três a cinco dias após a infecção. Anticorpos contra o parvovírus podem ser detectados cinco a sete dias após a infecção e atingem níveis máximos 14 dias após. Os efeitos do PVS sobre os embriões ou fetos estão sumarizados na Tabela 1. Caso ocorra uma infecção no início da gestação, o mais provável efeito sobre os embriões é a morte seguida de reabsorção dos mesmos. Caso não permaneçam embriões suficientes para estimular a produção 2 Tabela 1: Relação entre o momento da infecção uterina pelo parvovirus, sua ação e o efeito sobre o andamento da gestação na fêmea Momento da Infecção Conseqüencias Andamento da Gestação Da cobertura até 9 dias após Morte de todos embriões (ocorre reabsorção) Retorno ao cio com intervalo regular (18 a 24 dias) ou irregular (25 a 40 dias) Morte de alguns embriões (com mais de quatro sobre- viventes) Leitegadas pequenas (±6 leitões) De 10 a 35 dias de gestação Morte de todos embriões (ocorre reabsorção) Retorno ao cio com intervalo irrregular (até 50 dias) ou falsa gestação Morte de alguns embriões Gestação contínua, leitegadas pequenas (±6 leitões), normais, fracos e com peso baixo, leitões malformados De 35 a 65 dias de gestação Morte de todos fetos Gestação prolongada (124 a 135 dias), leitegadas com presença de mumificados Morte de alguns fetos Nascimento de leitões normais, junto com fracos e inviáveis, com peso baixo e/ou malformados e fetos mumificados De 65 dias de gestação até o parto Sem efeito sobre fetos porém imunização ativa dos mes- mos Nascimento de leitões normais e com anticorpos contra parvovirusi Fonte: adaptado de HUBER (1992) e VANNIER (1993) de hormônios que mantenham a gestação, a porca retornará ao cio. Se a infecção ocorrer após o período embrionário (cerca de 30 dias de gestação), a conseqüência mais provável é a morte do feto com mumificação. Nestes casos é comum observarmos que os fetos mumificados de uma leitegada apresentam-se em diferentes estágios de desenvolvimento, o que sugere que o vírus não afeta todos os fetosao mesmo tempo, infectando-os um após o outro, seqüencialmente. Se todos os fetos forem infectados e sofrerem mumificação, o parto pode não ocorrer na época esperada. Após os 60–70 dias de gestação, os fetos começam ser imunocompetentes o que lhes con- fere certa capacidade de resposta imune com pro- dução de anticorpos específicos frente a agressão de agentes infecciosos. Nestes casos, pode-se detectar anticorpos no soro dos leitões antes deles ingerirem o colostro. A porca se estiver imune contra o PVS trans- fere uma grande quantidade de anticorpos para os leitões, via colostro, que são indistinguíveis daqueles produzidos ativamente pelo feto. Sinais Clínicos Em porcas, o PVS provoca uma infecção que passa clinicamente desapercebida, na maioria dos casos, e simultaneamente induz uma forte imunidade. Pode-se suspeitar de uma infecção por PVS quando ocorre um aumento na taxa de retorno ao cio, nascimento de fetos mumificados de difer- entes tamanhos juntamente com leitões normais e/ou fracos ou o nascimento de leitegadas peque- nas. Além disto, deve-se suspeitar de parvovirose quando ocorrer uma interrupção no ganho de peso das porcas no último mês da gestação, bem como a ocorrência de falsa gestação,gestação prolongada ou fêmeas que estão vazias na época do parto. Mas o sinal mais indicativo de parvovi- rose é o nascimento de fetos mumificados em diferentes estágios de desenvolvimento. A infecção no macho é assintomática e não tem efeito sobre a qualidade do sêmen. Machos e fêmeas persistentemente infectados podem se tornar portadores assintomáticos do vírus, e assim transmitir a infecção por contato. Diagnóstico A parvovirose deve ser lembrada sempre que forem observados sinais clínicos descritos ante- riormente. O diagnóstico confirmativo deve ser 3 realizado através de exames laboratoriais, incluin- do a identificação do vírus ou antígenos nos fetos da leitegada suspeita. Para identificação do vírus, por imunofluorescência direta, recomenda-se que sejam remetidos para o laboratório vários fetos mumificados de uma leitegada afetada, acondi- cionados em gelo. Já isolamento do vírus é menos indicado para o diagnóstico, pois em geral a infecciosidade do vírus é diminuída ou inativa em tecidos ou fetos mortos ou mumificados, além de que tecidos destes fetos são usualmente tóxicos para os cultivos celulares. A prova mais amplamente utilizada para o diagnóstico sorológico de infecção pelo PVS é a inibição da hemaglutinação (HI). Esta prova baseia-se na propriedade do PVS de aglutinar hemácias de algumas espécies. Caso o soro do animal possua anticorpos contra o vírus, esta capacidade hemaglutinante é bloqueada, pois os anticorpos se ligam aos antígenos virais e impedem que estes se adsorvam às hemácias. Os títulos de anticorpos obtidos variam de acordo com a técnica empregada para sua detecção, e de acordo com a metodologia empregada em cada laboratório. As vacinações, usualmente, dão origem a títulos inibidores de hemaglutinação muito baixos (isto é 1:8 a 1:160), porem previnem a ocorrência da doença, enquanto que infecções com vírus de campo dão origem a títulos altos de anticorpos (superiores a 1:1000). Infecções com vírus de campo provavelmente dão origem a uma imunidade duradoura enquanto que imunizações com vacinas, devido aos baixos títulos obtidos, devem ser periodicamente repetidas. É provável que, devido à presença de vírus de campo circu- lante nos rebanhos, a maioria dos animais irão ter contato com o agente durante sua vida útil e pôr conseguinte, revacinações após o terceiro parto podem se tornar desnecessárias uma vez que o contato com o vírus de campo provavelmente manterá a estimulação antigênica necessária. Para se ter uma idéia melhor da situação de um rebanho, quanto a parvovirose, recomenda-se fazer um perfil sorológico, amostrando fêmeas de reposição e porcas de diferentes ordens de parto. A observação de diferentes níveis de anticorpos no plantel são indicativos de infecção em evolução. Este tipo de perfil sorológico tem sido o mais comumente encontrado em rebanhos suínos no Brasil. Muitas vezes questiona-se qual o título consid- erado protetor. Este resultado é variável, pois de- pende da metodologia empregada nos testes de HI. As variáveis da metodologia que interferem no resultado incluem, essencialmente, o tratamento ou não do soro com hemácias para a remoção de hemaglutininas não específicas, ou ainda o tratamento ou não com caulim para a remoção de inibidores inespecíficos da hemoaglutinação. Se o laboratório submete os soros a estes trata- mentos, títulos baixos ( p. ex. 1:8) já podem ser significativos. Se o laboratório não realiza tratamentos prévios dos soros, títulos baixos não são considerados e somente títulos superiores a 1/160 ou 1/320 são considerados positivos. Na interpretação dos exames sorológicos, deve- se ter em mente que o que realmente se deseja é que a fêmea seja positiva, isto é, que ela seja imune (com exceção de granjas comprovada- mente livres de parvovirose). Em uma granja, entre reprodutores podemos encontrar animais imunes (títulos altos), animais recentemente infec- tados (títulos altos ou baixos) e animais suscep- tíveis (títulos negativos ou baixos). A detecção de anticorpos no soro de leitões nascidos mortos ou vivos mas que não ingeriram o colostro, permite um diagnóstico seguro da infecção intra-uterina por PVS. A detecção de anticorpos no soro da porca não permite determinar o momento da infecção nem esclarecer mortalidade embrionária ou fetal. Para fins de diagnóstico, o exame sorológico para presença de anticorpos contra PVS tem pouco significado a nível de rebanho, uma vez que o PVS está presente na maioria das criações de forma que geralmente se obtém resultados positivos. Além disso, este fato não tem nenhum significado quando se procura esclarecer causas de aborto. Nestes casos, deve-se fazer testes pareados, com intervalo de três semanas, para verificar se há soroconversão. É imprescindível fazer o diagnóstico diferen- cial, através de exames laboratorias, com outras doenças como Leptospirose, Brucelose, Doença de Aujesky e Síndrome Reprodutiva e Respiratória do Suíno (SRRS) que também provocam proble- mas reprodutivos semelhantes. Controle Não existe um tratamento específico para in- fecção pelo PVS e devido a isto, todos os cuidados devem ser direcionados para uma uniformização da imunidade do plantel, evitando-se a presença de animais não imunes. Para isto utilizam-se dois tipos de medidas: o “feed back” e a vacinação. Através do “feed back” procura-se estabelecer a infecção natural das leitoas um mês antes 4 Tabela 2: Programa de vacinação contra a parvovirose suína LEITOAS (REPOSIÇÃO) • 1a dose: aos 170–180 dias de idade ou 30 dias antes da cobertura. • 2a dose: aos 190–200 dias de idade ou 15 dias após a primeira. MACHOS • 1a dose: 5 a 6 semanas antes de ser utilizado pela primeira vez. • 2a dose: 15 a 20 dias após a primeira vacinação. A partir daí, revacinar anualmente. PORCAS • 10 a 15 dias após o 1o, 2o, 3o, 5o, 7o e 9o parto (para vacinas oleosas) da primeira cobertura, através do contato direto com porcas do plantel ou pela exposição à fezes, restos de placenta e fetos mumificados. Esse método apresenta bons resultados quando se deseja imunizar leitoas antes da cobertura, mas apresenta um risco muito alto, pois pode ser recomendado somente para aquelas gran- jas em que existe um controle sorológico das demais doenças de impacto econômico sobre a reprodução. Além disso, pode haver falha na imunização devida ao desconhecimento da dose infectante, não sendo possível assegurar que o material exposto às nulíparas contenha vírus suficiente para causar uma infecção e provocar uma resposta imunitária. A implantação de um programa de vacinação é o meio mais prático, seguro e confiávelde promover e padronizar a imunidade de plantel e evitar a infecção intra-uterina dos embriões ou fetos. Dentro de um programa de vacinação o mais importante é assegurar que a vacina seja administrada nas fêmeas de reposição numa idade em que sua resposta não seja neutralizada pela imunidade passiva (após os 5 meses de idade) de forma que as fêmeas de reposição devem ser vacinadas em torno de um mês antes de entrarem em reprodução e, para induzir uma resposta imune mais intensa, revacinadas 15 dias após a primeira dose. Esquema de Vacinação Em geral, quando a vacina é procedente de laboratório idôneo e conservada corretamente ela não provoca reações adversas aos suínos. Um programa de vacinação contra a parvovirose suína encontra-se na Tabela 2. A critério do médico veterinário este programa pode ser alterado para atender características específicas de determi- nadas situações epidemiológicas. 5
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