Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Fato, opinião e tipos de discurso Verônica Daniel Kobs* O que é fato ou opinião no texto? Um fato é algo que aconteceu na realidade. Por isso, para muitos, essa ver- dade que o fato representa exige total isenção do autor do texto: fato é fato – opinião é outra coisa. No entanto, as coisas não são assim tão simples. Não existem compartimentos que garantam que esses dois polos nunca se cruzem. É certo que um texto que se restringe aos fatos evita excessivas marcas de opi- nião. Isso é possível, por exemplo, com o abandono de adjetivos. Mas será que todos recontam um fato exatamente do mesmo modo? Não: cada um começa de um jeito e organiza as ideias que formam o con- junto textual de uma maneira bastante específica. Até mesmo a seleção das informações que vão figurar no texto ou que receberão prioridade revela a opinião do autor. Essas brechas garantem espaço à opinião, mas ela se instala no texto de modo sorrateiro, nesses casos, e é percebida por poucas pessoas. Se a opinião pode ser evidenciada até mesmo na organização textual, quando o autor quer dar mais relevo ao fato em si é comum que ele obedeça a alguns critérios que objetivam controlar o nível de opinião do texto, assegurando que ela não se alastre, a fim de não comprometer o conteúdo e também para evitar excessiva influência sobre o leitor. A fórmula mais usada para tentar esse controle sobre a opinião e para dar mais destaque ao fato é bem conhe- cida: verbos na terceira pessoa, pouca adjetivação e ênfase na descrição. Vamos, agora, analisar o que é fato e o que é opinião em algumas notas de jornais. * Doutora em Estudos Li- terários pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Literatura Bra- sileira pela UFPR. Licencia- da em Letras Português- -Latim pela UFPR. Idosos terão recursos (IDOSOS terão recursos, 2010) A prefeitura de Curitiba, através da Secretaria Municipal do esporte e Lazer, receberá R$100 mil para atender projetos voltados à terceira idade neste ano. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 2 Fato, opinião e tipos de discurso Os recursos são provenientes de emenda ao Orçamento da União, aprovada por solicitação da Câmara, junto aos deputados federais, no Congresso Nacional. De acordo com o projeto, a verba será investida na implantação e modernização da infraestrutura de esporte recreativo e de lazer para idosos. O texto transcrito acima consegue se deter sobre o fato, sem muitas in- terferências de opinião. Não há adjetivação que julgue as informações apre- sentadas. Pode-se dizer apenas, pelo conjunto, que o texto deixa transpare- cer o lado positivo da notícia, o que fica claro desde o título: “Idosos terão recursos”. As palavras desse título não foram escolhidas ao acaso: elas dão um bom resumo da notícia, apresentam coerência em relação ao texto, mas também passam a ideia de que o fato de os idosos receberem recursos é algo benéfico. Luta (LUTA, 2010) Acontecerá no próximo dia 13 de março, às 19h, no Palácio de Cristal, no Círculo Militar do Paraná, o Power Fight Extreme 2, eleito o melhor evento de MMA em 2009 […]. Apesar de também nesta nota o fato ser privilegiado, nela há uma pe- quena amostra de como a seleção das informações passadas ao leitor pode variar, demonstrando opinião, mesmo que em escala bastante reduzida. O texto divulga um evento, informando data, hora e local, e fornecendo o nome completo desse evento. Porém, o que chama atenção é que o texto também menciona o fato de o Power Fight Extreme 2 ter sido “eleito o melhor evento de MMA em 2009”. Sem dúvida isso é um fato, pois a eleição aconteceu e o evento de artes marciais mistas (ou mixed martial arts – MMA) foi mesmo premiado. Porém, dar essa informação ao se divulgar o evento serve para influenciar o público positivamente – afinal, para quem gosta desse tipo de campeonato, o prêmio é um estímulo a mais para que a pessoa decida pela participação. Destaque-se, porém, que esse tipo de recurso é normal em textos de divulgação, cujo principal objetivo é criar público para a atração. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Fato, opinião e tipos de discurso 3 Fim do sufoco (FIM do sufoco, 2010) Ponte que vai desafogar o trânsito da região Fazendinha e CIC será inaugu- rada em março. Obra é uma reivindicação antiga da comunidade, e já está em fase de acabamento. Nesse texto, ao contrário dos dois anteriores, a opinião é mais evidenciada. O primeiro indício dessa predominância é o título: “Fim do sufoco”. Em tom bastante apelativo, o título corresponde a algo como “até que enfim!” e isso acontece porque o autor recuperou o fato mentalmente, fez uma avaliação sobre ele e, no título, registrou o resultado dessa avaliação. E as marcas de opinião aparecem ainda em outros pontos. É o caso do verbo desafogar, que não apareceria em uma nota que privilegiasse o fato. E qual é o fato? É a construção de uma ponte. Apenas isso precisava ser in- formado. A conclusão de que a “ponte vai desafogar o trânsito da região” é subjetividade, opinião, e, com certeza, influenciará potencialmente o pensa- mento do leitor. Outro detalhe que demonstra opinião é a afirmação de que a “obra é uma reivindicação antiga da comunidade”: esse trecho ressalta o quanto os mo- radores da região esperavam e lutavam pela construção da ponte e, de certa forma, essa interferência opinativa reforça a ideia de “até que enfim”, implí- cita no título. Marcas de opinião Com um simples exercício de separar fato da opinião, pode-se concluir que há diferentes modos de a opinião interferir no texto. Alguns, mais abun- dantes e bastante eficazes, merecem destaque. Veja abaixo. 1. Uso de adjetivos. 2. Uso de frases, locuções ou expressões. 3. Escolha vocabular. 4. Ordem das informações na oração. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 4 Fato, opinião e tipos de discurso Comecemos pelo uso de adjetivos, classe de palavras que tem a função de apresentar qualidades ou defeitos de pessoas ou objetos. Para exemplifi- car como o uso de adjetivos serve para demonstrar opinião, vamos recuperar algumas construções largamente utilizadas na mídia: O irreverente show da banda… O bom desempenho do jogador… A má atuação do político… 1. Os adjetivos, nos exemplos dados, aparecem destacados e são usados para qualificar as palavras a que se referem. Justamente por isso, ou seja, pelo fato de escolherem atributos positivos ou negativos para qualificar o show, o desempenho do jogador e a atuação do político, o autor do texto marca sua opinião, desviando-se da informação pura e simples. Retomando o exemplo do jogador, considerando que o de- sempenho do atleta tenha sido realmente bom, bastaria que o autor do texto descrevesse os melhores lances de que ele participou. Com isso, o próprio leitor chegaria à conclusão de que o jogador teve boa atuação. 2. Vamos imaginar agora um exemplo para o uso de frases, locuções ou expressões para marcar opinião: XXX, redator de um jornal espanhol de grande circulação, denunciou que uma de suas matérias foi reescrita, com a supressão de vários trechos. O fato, sem dúvida, é um acinte à liberdade de opinião e à democracia. Aqui, a opinião é explícita e corresponde a todo o segundo período do texto: “O fato, sem dúvida, é um acinte à liberdade de opinião e à democracia.” Esse tipo de construção textual privilegia a alternância entre fato e opinião e geralmente aparece em crônicas ou colunas de jornais e revistas. 3. Quanto à escolha vocabular, a comparação é o melhor modo de en- tender o impacto que determinadas palavras podem causar notexto. Admitamos, então, dois modos diferentes de noticiar um fato: O presidente da França visita vários países em companhia de Carla Bruni. O presidente da França visita vários países em companhia da esposa, Carla Bruni. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Fato, opinião e tipos de discurso 5 A única diferença entre os dois períodos é pequena, mas de funda- mental importância. Enquanto o primeiro período cita apenas o nome de Carla Bruni, o segundo faz questão de informar que ela é esposa do presidente. Esse detalhe pode passar despercebido no primeiro mo- mento – afinal, esposa nem é adjetivo. Entretanto, o substantivo espo- sa dá maior importância a Carla Bruni, porque no primeiro período o nome dela poderia ser substituído pelo nome de qualquer outra mu- lher, talvez alguém do meio político. Já no segundo período isso não é possível, porque o vocábulo esposa faz parte da informação principal, ao passo que Carla Bruni desempenha apenas a função de aposto. No que se refere à escolha das palavras que irão compor o texto, ressal- te-se que algumas são usadas com o claro intuito de provocar a emo- tividade do leitor. Para entender melhor como esse efeito pode ser obtido, basta pensar na diferença de linguagem entre um jornal “sério” e outro “sensacionalista”. Supondo que uma notícia apresenta uma in- justiça sofrida por um idoso, por exemplo, haveria diferença considerá- vel se um jornal (o “sério”) usasse o substantivo idoso e o outro (o “sen- sacionalista”) optasse pelo diminutivo velhinho. Isso porque uma das funções do diminutivo é provocar afetividade e, somando essa carga do diminutivo à ideia de injustiça, é certo que o leitor sentiria piedade depois de ler o texto, dando a resposta que o autor esperava quando optou por usar velhinho em vez de idoso. 4. O quarto modo de marcar a opinião no texto diz respeito à ordem dos elementos no período. Vamos analisar um exemplo: A casa do rei do rock recebe dezenas de pessoas diariamente. Em pleno século XXI, o culto a Elvis Presley continua. Há duas coisas importantes, na ordem desse período: o destaque ao número de pessoas que visitam a casa do artista e o fato de o título “rei do rock” ser mencionado antes do nome de Elvis, o que só é possível porque essa expressão já foi empregada tantas vezes para se fazer re- ferência a Elvis Presley que acaba funcionando quase como um sinôni- mo para o seu nome próprio. Além disso, no exemplo dado se acentua o fato de Elvis ser considerado uma lenda, o que justifica tantas home- nagens e visitas à sua mansão, diariamente. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 6 Fato, opinião e tipos de discurso Experimentemos agora inverter a ordem do exemplo dado: Em pleno século XXI, o culto a Elvis Presley continua. A casa do rei do rock recebe dezenas de pessoas diariamente. A transformação pode parecer inexistente ou insignificante, mas o fato é que, com essa pequena troca de posição dos períodos, o sentido do texto sofreu um impacto. Indubitavelmente, tudo o que foi dito no pri- meiro texto também é dito nesse. O que é diferente é o modo como as informações são apresentadas. O começo do texto prioriza a atempo- ralidade de Elvis, para só depois mencionar o número de visitantes que chegam à mansão do cantor todos os dias. Enfatize-se, porém, que o uso da locução adverbial “Em pleno século XXI”, logo no início do tex- to, empresta um tom que pode ser interpretado como crítica àqueles que cultuam a imagem do rei do rock, como se a atitude dos fãs fosse considerada fora de época. Tipos de discurso Fazer uma citação é um bom recurso para garantir a predominância do fato sobre a opinião. Se a fala de alguém, transcrita direta ou indiretamente, fizer algum julgamento de valor, o autor do texto não se compromete com isso: o crédito ou descrédito da afirmação ou da crítica vai para aquela pessoa que fez a declaração. Ao autor do texto apenas coube a tarefa da transcrição. Desse modo, seja qual for o tipo de discurso adotado pelo autor do texto – direto, indireto ou indireto livre –, a utilização da palavra do outro é um bom artifício para se isentar de opinar sobre o fato apresentado no texto. Para exemplificar isso, vamos transformar o trecho “O bom desempenho do jogador…” em um discurso proferido por outra pessoa e apenas citado pelo autor do texto. Vamos tentar primeiro a citação da forma direta: O técnico disse: “O jogador teve um bom desempenho.” Agora, vamos utilizar o discurso indireto: O técnico disse que o jogador teve um bom desempenho. Mesmo considerando as diferentes modalidades de discurso, a conclu- são é uma só: quem achou que “O jogador teve um bom desempenho” foi o técnico e não o autor do texto. Isso comprova a validade das citações como meio de dar mais destaque ao fato que à opinião do autor do texto. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Fato, opinião e tipos de discurso 7 Veterinárias lançam sorvete para cachorro; especialista condena petiscos (GRANJEIA, 2010) Os sorvetes tradicionais podem causar diarreia, vômito e cáries nos dentes dos animais de estimação. Com o forte calor do verão e a relação cada vez mais cheia de mimos entre os donos e seus bichos, duas veterinárias de São Paulo lançaram, em janeiro, um sorvete produzido especialmente para cachorros. Thaís Mucher, veterinária e empresária, afirma que a ideia surgiu porque ela mesma dava sorvete para seu cachorro. “Muita gente faz isso, mas não é reco- mendado. Nós pegamos a fórmula básica de um sorvete e tiramos a gordura hidrogenada, o açúcar e diminuímos em quase 50% o teor de lactose”, explica. […] Mas, assim como os demais petiscos, o sorvete não deve substituir a ração. Thaís e sua irmã Juliana, que também é veterinária, dizem acreditar que o produto é o primeiro do tipo fabricado no Brasil. “Fizemos muitas pesquisas, achamos uma marca registrada, mas não achamos o sorvete para vender e não achamos site da empresa. Encontramos sorvetes para cachorros produzi- dos nos Estados Unidos, Bélgica e Taiwan”, diz Thaís. […] O médico veterinário especialista em dermatologia, Alexandre Pasternak, não recomenda nenhum tipo de petisco para os animais de estimação. Paster- nak, que é diretor da Anclivepa (Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais) de São Paulo, diz que 90% das alergias em cachorros são causadas por esses tipos de alimentos. […] De acordo com o veterinário, a alimentação desregulada, com o excesso de carboidrato dos petiscos, pode causar distúrbios gastrointestinal, endocrino- lógico ou dermatológico, como as alergias, obesidade, diabetes e hipertireoi- dismo. “Eu não recomendo bife, sorvete, nada disso. Uma cenoura e interação com o animal são mais indicados do que esses petiscos”, afirma Pasternak. Porém, não basta sabermos que fato e opinião têm relação com os tipos de discurso: também é necessário que nos lembremos de como identificar e como usar cada um deles. Para isso, com base na breve retomada feita pelos exemplos acima, leia o texto a seguir e nele tente localizar as partes que exemplificam os discursos direto e indireto, muito usados diariamente, em diversas situações da fala ou da escrita. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 8 Fato, opinião e tipos de discurso Discurso direto O discurso direto inclui no texto uma fala ou um texto escrito, na íntegra ou em partes. As marcas que evidenciam que a citação corresponde à fala ou ao texto de outra pessoa compõem uma espécie de fórmularesponsável por introduzir o discurso do outro no texto que está sendo escrito. A fórmula do discurso direto é composta dos elementos abaixo. Indicação do autor do discurso que será citado – Pode ser feita pelo � nome próprio ou pelo uso de um relator, como cargo/função ou pronome pessoal (ele/ela), por exemplo. Abertura – Pode ser feita por um verbo � dicendi, ou seja, por um ver- bo que anuncia que alguém disse, relatou, afirmou ou contou alguma coisa. Também é comum o uso de verbos no imperativo (observe, leia, confira…). Além disso, a abertura pode ser extensa e compreender até mesmo um período inteiro (A passagem que demonstra isso, no texto, é...). Dois-pontos – Vêm logo depois da abertura e funcionam como diviso- � res entre o texto que está sendo escrito e o texto do outro (citação). Mas também há outra fórmula para o discurso direto. Vejamos. Vírgula – Vem logo depois do discurso citado, a fim de separar a apre- � sentação da citação em si. Verbo � dicendi. Indicação do autor do discurso que foi citado. � O que determina qual esquema será usado é a ordem escolhida. O pri- meiro esquema é utilizado quando a citação é feita depois da apresentação de seu autor. Já o segundo, vale para situações em que a citação vem antes de se dizer ao leitor quem é o autor do discurso citado. No entanto, há um ponto comum entre esses dois modos de se usar o discurso direto: as aspas, que são usadas para indicar que a passagem foi transcrita tal como se apresenta no texto original. Em se tratando de fala, indicam que o que o outro falou foi transcrito literalmente, sem nenhuma modificação. Quando as aspas não aparecem, é usado o travessão, com a mesma função de preservar o conteúdo do discurso alheio. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Fato, opinião e tipos de discurso 9 Depois dessa breve introdução, é possível classificarmos algumas passa- gens do texto lido como exemplos de discurso direto: “Muita gente faz isso, mas não é recomendado. Nós pegamos a fórmula básica de um sorvete e tiramos a gordura hidrogenada, o açúcar e diminu- ímos em quase 50% o teor de lactose”, explica. (Quem explica é Thaís Mucher, veterinária e empresária.) “Fizemos muitas pesquisas, achamos uma marca registrada, mas não acha- mos o sorvete para vender e não achamos site da empresa. Encontramos sorvetes para cachorros produzidos nos Estados Unidos, Bélgica e Taiwan”, diz Thaís. (Refere-se a ela mesma e à sua irmã Juliana.) “Eu não recomendo bife, sorvete, nada disso. Uma cenoura e interação com o animal são mais indicados do que esses petiscos”, afirma Pasternak. Observe que todos esses trechos usam o segundo esquema, isto é, primei- ramente fazem a citação e depois informam a autoria. Os elementos básicos do esquema utilizado (vírgula, verbo dicendi e nome do autor) aparecem res- saltados em cada citação. Repare, porém, que o primeiro exemplo é o único que não cita o nome de quem fez a declaração apresentada entre aspas. Isso é possível porque antes da citação o nome dessa pessoa já foi anunciado. Logo, nesse caso, o autor da citação pode ficar subentendido. Discurso indireto O discurso indireto diferencia-se bastante do discurso direto. Em primeiro lugar, isso ocorre porque o discurso indireto dispensa as aspas. O mesmo ocorre com a pontuação: vírgula e dois-pontos não aparecem em uma pas- sagem que privilegia o discurso indireto. Entretanto, o discurso indireto in- forma quem é o autor do discurso citado e, para isso, também precisa da ajuda do verbo dicendi e do que: A mãe disse que… Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 10 Fato, opinião e tipos de discurso Mas há casos em que o verbo dicendi e o que são desnecessários, quando, em vez dele, o autor do texto prefere usar uma conjunção ou uma locução conjuntiva, como conforme, de acordo com, segundo etc. Vamos retomar alguns exemplos de discurso indireto que apareceram no texto lido para tornar mais claras todas essas informações. Thaís Mucher, veterinária e empresária, afirma que a ideia surgiu porque ela mesma dava sorvete para seu cachorro. Thaís e sua irmã Juliana, que também é veterinária, dizem acreditar que o produto é o primeiro do tipo fabricado no Brasil. Pasternak, que é diretor da Anclivepa (Associação Nacional de Clínicos Ve- terinários de Pequenos Animais) de São Paulo, diz que 90% das alergias em cachorros são causadas por esses tipos de alimentos. De acordo com o veterinário, a alimentação desregulada, com o excesso de carboidrato dos petiscos, pode causar distúrbios gastrointestinal, en- docrinológico ou dermatológico, como as alergias, obesidade, diabetes e hipertireoidismo. Para analisarmos os exemplos retirados do texto, vamos dividi-los em dois grupos: um que abrange os três primeiros e outro que se restringe ao último. Observe, no primeiro grupo, o destaque dado ao autor do discurso citado, ao verbo dicendi e ao que: esses três elementos introduzem a citação propria- mente dita (as partes que, nos exemplos, estão sublinhadas). As citações não estão entre aspas, mas isso não quer dizer que o autor do texto que recupera o discurso de outra pessoa pode transcrevê-lo de qualquer maneira. Em ab- soluto: o discurso indireto precisa ser uma paráfrase, sem provocar alteração considerável no sentido daquilo que foi dito ou escrito. Antes de passarmos ao último exemplo, vamos ressaltar que os três pri- meiros apresentam aposto ou oração explicativa depois de informar o nome da pessoa que é dona do discurso que está sendo citado. Embora tenham valor secundário, o aposto e a oração explicativa servem para fornecer ao leitor mais detalhes sobre a pessoa que disse ou escreveu aquilo que foi citado no texto. Já no último exemplo, percebemos claramente que, em vez do verbo di- cendi seguido de que, o autor do texto utiliza “De acordo com o veterinário”, Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Fato, opinião e tipos de discurso 11 trecho em que a locução conjuntiva de acordo com é seguida da informação de quem é o autor da citação – “o veterinário”. Além disso, merece atenção a vírgula utilizada entre a primeira e a segunda parte do trecho, pois nesse caso a pontuação serve para separar a abertura do discurso propriamente dito (parte sublinhada). Discurso indireto livre A modalidade do discurso indireto livre abre mão das referências à auto- ria da fala ou do texto transcrito. É comum também que a passagem da voz do narrador para a do personagem que fala não seja marcada por pontua- ção. Apesar da falta de delimitação entre as vozes que compõem esse tipo de discurso, a fusão garante maior dinamismo e fluência do texto. No entanto, é claro que também exige maior atenção do leitor, que já não conta com os sinais gráficos ajudando a indicar onde acaba o discurso do autor do texto e começa o discurso de outra pessoa, citada pelo autor para reforçar ou exem- plificar sua ideia. Para apreender a diferença que representa o discurso indireto livre em re- lação às outras duas modalidades de discurso, mais conhecidas e utilizadas, vamos supor uma situação. Há um casal e o marido decide pedir demissão do emprego, por diversas razões, sobre as quais já conversou com a esposa. Depois de ele informar a escolha à mulher, ela diz , tocando a mão dele, que o apoiará sempre. Vejam que, no exemplo acima, foi usado o discurso indireto (parte su- blinhada), para apresentar o que a mulher disse ao marido. As principais marcas desse discurso (indicação de quem fala + verbo dicendi + que) estão destacadas. Agora vejamos a cena dada em forma de discursodireto. O marido decide pedir demissão do emprego, por diversas razões, sobre as quais já conversou com a esposa. Depois de ele informar a escolha à mulher, ela diz, tocando a mão dele: – Eu sempre vou apoiar você. O mesmo exemplo, mantendo a forma de discurso direto, poderia, ainda, ser apresentado desta forma, usando aspas, em vez de travessão: Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 12 Fato, opinião e tipos de discurso Os cães de gravata (MAINARDI, 2007) Cada um escolhe seu próprio inimigo. O meu morreu no mês passado, aos 95 anos. Era Joseph Barbera, um dos fundadores dos estúdios Hanna-Barbera. No começo de janeiro, morreu também um de seus principais colaboradores, Iwao Takamoto, criador do Scooby-Doo. Estou com sorte. Livrei-me de dois inimigos em menos de um mês. O marido decide pedir demissão do emprego, por diversas razões, sobre as quais já conversou com a esposa. Depois de ele informar a escolha à mulher, ela diz, tocando a mão dele: “Eu sempre vou apoiar você.” Já no discurso indireto livre, as marcas das modalidades anteriores de dis- curso, acima exemplificadas, desaparecem por completo: O marido decide pedir demissão do emprego, por diversas razões, sobre as quais já conversou com a esposa. Depois de ele informar a escolha à mulher, ela toca a mão dele. Eu sempre vou apoiar você. Não há verbo dicendi, que, dois-pontos, aspas e nem mesmo a indicação clara de que ela assumiu a palavra. Isso é subentendido pela sequência da ação – afinal, depois de ser informada da decisão tomada pelo marido, ela se aproxima dele, toca sua mão e, no período seguinte, já aparece uma fala que combina perfeitamente com a situação. A lógica não permite que o leitor interprete essa fala como sendo do marido. Isso quer dizer que a ausência das marcas dos outros discursos não prejudica a compreensão do texto, mas é certo que exige muito mais atenção e comprometimento do leitor para interpretá-lo. Desse modo, o discurso indireto livre é mais comum em textos literários. Os textos de jornais, revistas e sites, por privilegiarem uma comunicação mais imediata, tendem a privilegiar textos mais claros e objetivos e os discursos direto e indireto servem melhor a essa finalidade. Texto complementar Leia o texto abaixo analisando a relação entre fato e opinião e tentando identificar os tipos de discursos utilizados pelo autor. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Fato, opinião e tipos de discurso 13 Atribuo grande parte do meu fracasso pessoal aos desenhos animados de Hanna-Barbera. O fato de ter assistido a todos os episódios dos Herculoides, da Tartaruga Touché e dos Flintstones comprometeu meu futuro. O dano cau- sado por horas e horas de Space Ghost, de Wally Gator e de Jonny Quest foi definitivo. Muitas de minhas falhas intelectuais e de personalidade podem ser imputadas a eles. De nada adiantou ler Montaigne mais tarde. No deserto mental provocado por Frankenstein Júnior, pelos Irmãos Rocha e pela Formi- ga Atômica, Montaigne simplesmente não frutifica. Até a década de 1960, um episódio de Tom e Jerry ou de Pernalonga era feito com algo entre 25 mil e 40 mil desenhos. Joseph Barbera e seu sócio bolaram um jeito de produzir suas séries com menos de dois mil, abatendo seus custos. A técnica recebeu o nome de animação limitada. Os personagens permaneciam estáticos. A única parte de seu corpo que se movia era a cabeça, que pulava compulsivamente da direita para a esquerda, ora com a boca fe- chada, ora com a boca aberta. Para facilitar o corte, todas as figuras tinham o pescoço encoberto por um colarinho ou por uma gravata. Nos desenhos da Hanna-Barbera, sempre há um cachorro de gravata, um super-herói de grava- ta, um dinossauro de gravata. As paisagens sofreram o mesmo tratamento reducionista. Os personagens dos desenhos de Hanna-Barbera habitam um mundo claustrofobicamente cir- cular. De dois em dois segundos eles passam pela mesma pedra, pelo mesmo veículo espacial, pelo mesmo homenzinho careca e bigodudo de terno azul. A angústia de pertencer a um universo que se repete continuamente só é su- perada pelo fato de que ninguém se dá conta disso. Maguila, Simbad Júnior e os Brasinhas do Espaço parecem desprovidos de memória. As tramas também se repetem de uma série para a outra. Muda apenas o mote de cada persona- gem, a sua frase característica, como “Saída pela esquerda”, “Shazam!” ou “Oh, querida Clementina”, recitada por um mau dublador. Joseph Barbera e Iwao Takamoto empobreceram minha vida. Assim como empobreceram a vida de todos os meus contemporâneos. Há fases em que a humanidade melhora e há fases em que ela piora. Nada representa com tanta clareza o barateamento intelectual do nosso tempo quanto os desenhos ani- mados de Hanna-Barbera. Cada quadro economizado por eles significou para Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 14 Fato, opinião e tipos de discurso nós uma ideia a menos, um pensamento a menos, uma sinapse a menos. Os pioneiros de Hanna-Barbera acabam de morrer, mas nossa época está irreme- diavelmente perdida. O único consolo é que esquecemos a miséria em que vivemos de dois em dois segundos. Atividades 1. Identifique as marcas de opinião no texto abaixo. Navegar é preciso (NAVEGAR é preciso, 2009) O velejador, economista e empresário Vilfredo Schürmann lançou o livro Navegando com o Sucesso na praça central do Shopping Muel- ler, em Joinville, e na praça central do Shopping Neumarkt, em Blu- menau. Ótimo contador de histórias, apresentou reflexões sobre o sentido de palavras como sucesso, família, trabalho em equipe, sonho e disciplina. 2. O texto abaixo se atém mais aos fatos ou à expressão da opinião? Por quê? Nascida em Curitiba, em 1982, Marjorie Estiano se mudou para São Paulo aos 18 anos, onde se profissionalizou como atriz e cantora. Já no Rio de Janeiro, estreou na tevê em 2003, em Malhação, e desde então esteve em várias novelas […].” (MARJORIE ESTIANO atriz e can- tora, 2009) Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Fato, opinião e tipos de discurso 15 3. Identifique a modalidade de discurso dada e depois faça a alteração indicada entre parênteses. a) O pai disse ao filho: “Decidi lhe dar um carro.” (Passar para o discur- so indireto.) b) A professora informou aos alunos que no dia seguinte não haveria aula. (Passar para o discurso direto.) c) O neto abraçou o avô e disse que quando crescer quer ser aviador. (Passar para o discurso indireto livre.) 4. Assinale a alternativa que exemplifica o discurso indireto livre: a) A menina disse: “Não gosto desse tipo de comida.” b) O secretário alertou que a reunião seria longa. c) O chefe parecia verdadeiramente irritado. Não ousem me pertur- bar com problemas! d) “Cansei de carregar peso”, disse ele. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 16 Fato, opinião e tipos de discurso 5. Marque a alternativa em que há uma explícita interferência de opinião. a) Ele leu o relatório e se dirigiu à sala do redator. b) A aplicação de multas é um meio eficaz para controlar o excesso de velocidade. c) Como atleta, ele pratica exercícios regularmente. d) O gaveteiro era grande e marrom. 6. Sobre o discurso indireto, é correto afirmar que a) em algumas situações, introduz o discurso do outro depois do ver- bo dicendi seguido de que. b) permite a utilização de aspas ou travessão. c) utiliza o “que” em todas as situações.d) é o tipo de discurso que mais preserva a fala do outro. 7. Assinale a alternativa que apresenta a principal mudança que se faz na passagem do discurso direto para o discurso indireto livre. a) Uso do que. b) Ausência da informação de quem está falando, impedindo a total compreensão do texto. c) Uso de conjunções. d) Não utilização de sinais gráficos para indicar a inclusão do discurso do outro no texto. 8. Leia o trecho abaixo. O vendedor perguntou ao cliente: – Em quantas prestações você pretende pagar? Assinale a opção que classifica corretamente o tipo de discurso utiliza- do no fragmento lido. a) Discurso indireto. b) Discurso direto. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Fato, opinião e tipos de discurso 17 c) Discurso indireto livre. d) Discurso direto livre. 9. A(s) modalidade(s) de discurso mais utilizada(s) nos textos publicados em veículos de comunicação de massa é(são) a) indireto e indireto livre. b) direto e indireto. c) direto e indireto livre. d) direto. 10. Assinale a opção que faz corretamente a transposição do discurso in- direto abaixo reproduzido para o indireto livre. O padre deu dois passos em direção ao homem, abençoou-o e de- sejou, com palavras ternas, que ele ficasse em paz. a) O padre deu dois passos em direção ao homem, abençoou-o e lhe desejou paz. b) O padre deu dois passos em direção ao homem, abençoou-o e de- sejou ternamente. Fique em paz. c) O padre deu dois passos em direção ao homem e o abençoou. Fi- que em paz. d) O padre deu dois passos em direção ao homem, o abençoou e de- sejou: “Fique em paz.” 11. Sobre o discurso direto, é correto afirmar que a) não se preocupa em informar quem está falando. b) usa a vírgula ou os dois-pontos, dependendo da ordem em que a fala citada aparece no texto. c) substitui o verbo dicendi pelos dois-pontos. d) admite paráfrase do discurso citado. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 18 Fato, opinião e tipos de discurso Dica de estudo Para treinar os tipos de discursos mais utilizados, procure algumas en- trevistas publicadas em jornais, revistas ou sites e observe as marcas do dis- curso direto. Em uma segunda etapa, tente a transcrição de algumas falas, usando a modalidade do discurso indireto. Referências FIM DO SUFOCO. Correio do Salles, 5 mar. 2010. GRANJEIA, Julianna. Veterinárias lançam sorvete para cachorro; especialista condena petiscos. Folha On-line, 16 mar. 2010, Seção Bichos. Disponível em: <http://www1. folha.uol.com.br/folha/bichos/ult10006u707616.shtml>. Acesso em: 20 mar. 2010. IDOSOS terão recursos. Correio do Salles, 5 mar. 2010. LUTA. Correio do Salles, 5 mar. 2010. MAINARDI, Diogo. Cães de gravata. Veja, 31 jan. 2007. MARJORIE ESTIANO, atriz e cantora. Ler & Cia, set. e out. 2009. NAVEGAR é preciso. Ler & Cia, set. e out. 2009. Gabarito 1. Há marca de opinião no uso do adjetivo em “Ótimo contador de histó- rias [...].” 2. O texto se restringe aos fatos, pois não apresenta marcas de opinião explícitas. As informações dizem respeito à cidade de origem da ar- tista, a idade com que se mudou para São Paulo, o ano de sua estreia na tevê etc., e essas informações não são julgadas nem positiva, nem negativamente. 3. a) Discurso direto. Passagem para o discurso indireto: O pai disse ao filho que tinha decidido lhe dar um carro. b) Discurso indireto. Passagem para o discurso direto: A professora informou aos alunos: “Amanhã não haverá aula.” Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Fato, opinião e tipos de discurso 19 c) Discurso indireto. Passagem para o discurso indireto livre: O neto abraçou o avô. Quando eu crescer, quero ser aviador. 4. C 5. B 6. A 7. D 8. B 9. B 10. C 11. B Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 20 Fato, opinião e tipos de discurso Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br
Compartilhar