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Ricardo Seitenfus Doutor em Relações Internacionais pelo Instituto Universitário de Altos Estudos Internacionais da Universidade de Genebra. Diretor da Faculdade de Direito de Santa Maria (FADISMA) e Professor Titular do Departamento de Direito da Universidade Federal de Santa Maria, RS MANUAL DAS -ORGANIZAÇOES INTERNACIONAIS QUARTA EDIÇÃO Revista, Atualizada e Ampliada livrar��a DO AD �GADO edztora Porto Alegre 2005 JUST�Cf.!, v:::::;,)��AL Seçb:;� ". ·. · · :· >.\�·� �$ S462m Seitenfus, Ricardo Antônio Silva Manual das organizações internacionais I Ricardo Antônio Silv-a Seitenfus. 4. ed. rev., atual. e amp. - Porto Alegre: Livra ria do Advogado Ed., 2005. 384 p. ; 16x23cm. ISBN 85-7348-37 6-8 1 . Organização internacional. 2. Organização internacional regional. 3 . Cooperação econômica. 4. Cooperação econômi ca internacional. I. Título. CDU 341 .215.2 339.923 Índices para catálogo sistemático Cooperação econômica Cooperação econômica internacional Organização internacional Organização internacional regional (Bibliotecária responsável: Marta Roberto, CRB 10 I 652) "O tom que ganharem os organismos internacio nais ao longo do tempo definirá o que pode ser e o que podemos fazer com aquilo que chamamos de globalização" Caetano Veloso Siglas e abreviaturas ACNUR - Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados AG - Assembléia Geral das Nações Unidas AID - Agência Internacional de Desenvolvimento AIEA - Agência Internacional de Energia A tômica ALADI - Associação Latinoamericana de Integração e Desenvolvimento ALALC- Associação Latinoamericana de Livre Comércio ALCA - Área de Livre Comércio das Américas ANZUS - Organização de Segurança e Assistência entre Austrália, Estados Unidos e Nova Zelândia APEC - Organização de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico ASEAN - Associação de Nações do Sudeste Asiático BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento BIRD - Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (Banco Mundial) BIT - Birô Internacional do Trabalho CARICOM - Comunidade do Caribe CARIFTA - Associação de Livre Comércio do Caribe CARTA - Carta das Nações Unidas CE - Conselho da Europa CECA - Comunidade Européia do Carvão e do Aço CEE - Comunidade Econômica Européia CEI - Comunidade dos Estados Independentes CEPAL - Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e Caribe CFI - Corporação Financeira Internacional CJCE - Corte de Justiça das Comunidades Européias CIJ - Corte Internacional de Justiça CNUCED ou UNCT AD - Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvi- mento CPEGL - Comunidade Econômica dos Países dos Grandes Lagos CPJI - Corte Permanente de Justiça Internacional CS - Conselho de Segurança das Nações Unidas CSCE - Conferência para a Segurança e a Cooperação na Europa DIP - Direito Internacional Público ECOSOC - Conselho Econômico e Social das Nações Unidas EFTA - Associação Européia de Livre Comércio EURATOM - Comunidade Européia de Energia Atômica FAO- Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura FENU - Forças de Emergência das Nações Unidas FIDA - Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola FMI - Fundo Monetário Internacional G 8 - Grupo dos Oito GATT - Acordo Geral de Tarifas Alfandegárias e Comércio GRULA - Grupo dos Países da América Latina nas Nações Unidas IDI - Instituto de Direito Internacional IMCO - Organização Intergovernamental Consultiva Marítima LEA - Liga dos Estados Árabes MCCA - Mercado Comum Centroamericano MERCOSUL - Mercado Comum do Sul NAFTA - Área de Livre Comércio da América do Norte NU - Nações Unidas OACI - Organização da Aviação Civil Internacional OCDE - Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico ODECA - Organização dos Estados Centroamericanos OEA - Organização dos Estados Americanos OECE - Organização Européia de Cooperação Econômica OI - Organização Internacional OIT - Organização Internacional do Trabalho OLADE - Organização Latinoamericana de Energia OMC - Organização Mundial de Comércio OMI ou IMO - Organização Marítima Internacional OMM - Organização Meteorológica Mundial OMS - Organização Mundial da Saúde OMT - Organização Mundial do Turismo ONG - Organização Não-Governamental ONGAT - Organização Não-Governamental de Alcance Transnacional ONU - Organização das Nações Unidas ONUDI - Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial OPANAL - Organismo para a Proscrição das Armas Nucleares na América Latina OP AQ - Organização para a Proscrição das Armas Quimicas OPEP - Organização dos Países Exportadores de Petróleo OTAN - Organização do Tratado do Atlântico Norte OTASE - Organização do Tratado do Sudeste Asiático OUA - Organização de Unidade Africana P A - Pacto Andino PACTO - Pacto da Liga das Nações PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PD - Países Desenvolvidos PVD - Países em Desenvolvimento SDN - Sociedade (ou Liga) das Nações SELA - Sistema Econômico Latinoamericano SFI - Sociedade Financeira Internacional TANU - Tribunal Administrativo das Nações Unidas TJCE - Tribunal de Justiça das Comunidades Européias UEAC - União dos Estados Centroafricanos UIT - União Internacional de Telecomunicações UN - Nações Unidas UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura U ICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância . CT AD ou CNUCED - Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvi mento U - União Postal Universal No ta à Quarta Edição Coloco à disposição dos leitores uma edição renovada do Ma nual das Organizações Internacionais . Às indispensáveis atualiza ções, em razão do dinamismo do objeto de nossos estudos, foram feitas modificações e acrescentadas informações buscando tornar o texto o mais completo possível. Um grande número de novas tabelas, quadros e gráficos - alguns inéditos e outros extraídos de obras de colegas que se debruçam sobre temas conexos - enriqueceu e densi ficou a presente edição. Contudo, a obra conserva sua característica maior. Trata-se de um "manual" elaborado com o intuito de chamar a atenção dos estudantes e dos cidadãos para o importante fenômeno das Organi zações Internacionais. Estas são constante e superficialmente referi das pelos meios de comunicação de massa, pelos políticos e pelos governos, ausente qualquer preocupação em aprofundar seu enten dimento. Ora, como obra de iniciação, ela deve provocar uma sensi bilização e sugerir um marco de reflexão. No entanto, ela deve continuar sendo necessariamente descritiva, concedendo importante espaço às informações institucionais. De natureza elementar, a obra não pretende orientar o debate para as questões doutrinárias. Sua reduzida dimensão nos obriga a proceder constantes escolhas. Estas são orientadas pela busca do concreto a fim de alcançar um objetivo prático. Isso não a impede a defesa de algumas idéias como, por exem plo, a solidariedade humana decorrente do surgimento e do fortale cimento das Organizações Internacionais. Ao mesmo tempo que este traço é enfatizado, não escapa a baixa qualidade desta solidariedade e a ineficácia dela decorrente. Portanto, este Manual foi concebido e realizado por alguém que, embora desprovido de ilusões, conserva imensas esperanças na evolução da sociedade internacional e no papel que nela podem desempenhar as Organizações Internacionais. Santa Maria, maio de 2005. Nota às edições anteriorres 3a Edição A presente edição contém importantes modificações. Em razão da publicação por esta mesma Editora de coletânea por mim organi zada sob o título «Textos Fundamentais do Direito das Relações Internacionais», foi suprimido o anexo que se encontra nas duas primeirasedições do Manual das Organizações In ternacionais. As páginas liberadas foram utilizadas para o aprofundamento de múltiplos aspectos das organizações internacionais. O leitor en contrará, por exemplo, informações suplementares sobre o FMI, a OMC, a OIT e as instituições não-governamentais . Por outro lado, novas instituições foram incluídas, tais como a OP AQ. Espero que este manual de iniciação ao estudo das organizações internacionais continue auxiliando os estudantes e o cidadão brasi leiro a melhor apreender a natureza, os contornos e os limites da cooperação internacional. Santa Maria, fevereiro de 2003. 2a Edição Decorridos escassos dois anos da la edição do Manual das Orga nizações In ternacionais, constato, com satisfação, a excelente acolhida que lhe foi reservada. Adotado em várias Universidades brasileiras, a obra consta da bibliografia aconselhada para o disputado concurso do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores do Brasil . O sucesso desse livro demonstra que surge no Brasil, tanto na Universidade quanto fora dela, um crescente interesse pelas ativida des das Organizações Internacionais. A presente edição, atenta à evolução da cena internacional, foi modificada em diver?OS itens, seja para atualização, seja para trazer informações suplementares. No campo da cooperação econômica e financeira, indico novos elementos sobre a Organização Mundial de Comércio (item 6.3 .6) e acrescento um quadro sobre a estrutura do Fundo Monetário Inter nacional (item 6.3 .2) . Por outro lado, o recente conflito do Kosovo ocasiona uma renovação das reflexões sobre o relacionamento ONU/OTAN (item 9.1 .4). Não se pode deixar de mencionar, ainda, a assinatura, em julho de 1998, do Estatuto da Corte Penal Internacional, por 120 Estados. Por essa razão, acrescentou-se ao final do capítulo 3 um novo item, que arrola as sete jurisdições internacionais em funcionamento na atualidade (item 3.4). Embora não se trate de matéria de organizações internacionais, o conhecimento mínimo sobre tais instâncias é im prescindível à compreensão das primeiras. Finalmente, para facilitar o acesso do público a documentos e boletins informativos de dezenas de entidades, o final desta edição traz uma lista dos sítios mantidos na Internet pelas principais Orga nizações Internacionais, tanto públicas quanto privadas. Santa Maria, setembro de 1999. Prefácio O estudo sistemático das organizações internacionais como dis ciplina acadêmica passou a adquirir feição própria e a desenvolver se a partir da introdução, nas Universidades européias, ao longo dos anos cinqüenta, da cátedra de "Instituições Internacionais". Logo se desenvolveram duas correntes de tratamento da nova disciplina: uma primeira, cultivada nas Universidades da Europa Continental, que pode se denominar corrente "institucional", marcou-se pelo exa me das organizações internacionais no contexto mais amplo da his tória diplomática e do direito internacional público. A outra, que floresceu na Grã-Bretanha, e que pode se chamar corrente "constitu cional", caracterizou-se pelo estudo dos problemas "constitucionais" das organizações internacionais. Decorridas duas décadas, teve início o cultivo da nova discipli na no Brasil, de forma permanente e sistemática . Uma experiência pioneira entre nós constituiu a introdução da matéria, como discipli na obrigatória, na Universidade de Brasília, nos cursos de seu então Departamento - hoje Instituto - de Ciência Política e Relações Inter nacionais. Entre os anos de 1978 e 1994, coube-me a regência da disciplina, no âmbito do direito internacional público, mas já ante vendo sua eventual emergência como disciplina acadêmica autôno ma. Em meu Direito das Organizações Internacionais (Brasília, Escopo Editora, 1990, 521p.) , busquei examinar as questões jurídicas básicas e comuns a todas as organizações internacionais, a saber: personali dade jurídica internacional, interpretação de poderes, capacidade de celebrar tratados, estrutura e funcionamento, processo decisório, di reito interno ou próprio, mecanismos internos de controle, delimita ção de competências entre as organizações e os Estados-Membros, natureza e classificação e efeitos jurídicos dos atas (resoluções) das organizações. Transcorridos alguns anos mais, com a presente publicação do Manual das Organizações Internacionais, de autoria do Professor Ricar- do Seitenfus, que tenho a grata satisfação e o privilégio de prefaciar, dá-se outro passo no sentido de consolidar e difundir o estudo das organizações internacionais em nosso país. Sua publicação se dá em momento oportuno, em que o cenário internacional passa por pro fundas transformações, em meio às quais emergem novas organiza ções, e outras se alteram, e se intensificam os debates correntes acerca das reformas do próprio sistema das Nações Unidas, de modo a adaptá-lo à agenda internacional do novo século. O presente Manual, obra de iniciação ao estudo das organizações internacionais, adota um enfoque próprio, de modo a dirigir-se não só aos estudiosos do Direito, mas também das Ciências Sociais e da História. Ao revestir-se de propósito essencialmente didático, abor da aspectos tanto teóricos corno operacionais do quotidiano das or ganizações internacionais, revelando a visão de alguém que reconhece e sente sua relevância a partir da perspectiva do hemisfé rio sul. Ademais, corno o próprio autor assinala, abre caminho para o aprofundamento do estudo através da leitura, pelos interessados na matéria, de suas indicações bibliográficas, ao final do Manual. Desse modo, passa a presente obra a dirigir-se a um público leitor particularmente amplo. Seu enfoque interdisciplinar já era de se esperar, em razão da própria formação do autor. O Professor Ricardo Seitenfus, já há muito conhecido de seus colegas dos círculos acadêmicos brasileiros, doutoroy-se em Relações Internacionais pelo Institut Universitaire de Hautes Etudes Internationales (IUHEI), de Genebra, sendo hoje Profes sor Titular de Relações Internacionais do Mestrado em Integração 'Latino-Americana da Universidade Federal de Santa Maria (Rio Grande do Sul). Autor de várias obras (entre as quais, recentemente, Uma História Diplomática do Brasil (1531-1945), Rio de Janeiro, Civili zação Brasileira, 1995, 512p., em co-autoria com o Professor José Honório Rodrigues), tive o prazer de com ele trabalhar, nos primei ros anos da década de noventa, no desenvolvimento do Projeto Sessenta Anos de Política Externa Brasileira, da Universidade de São Paulo (Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da USP) e do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI) do Ministério das Relações Exteriores (ele corno coordenador da Comissão Orga nizadora, e eu corno integrante da Comissão Editorial do referido Projeto). O presente Manual das Organizações Internacionais, seu novo li vro, aborda, de início (parte II), os aspectos teóricos da matéria, já aí despontando o enfoque interdisciplinar na consideração de questões comuns às organizações internacionais, sem descuidar de sua evolu- ção histórica. A seguir, examina aspectos jurídicos (parte III), não se limitando à personalidade jurídica das organizações internacionais, mas se detendo também no atual debate acerca da delimitação das competências entre as organizações e os Estados-Membros, em con textos e situações distintos, e pelo prisma a um tempo jurídico e político . Nas partes subseqüentes da obra (IV a IX), elenca o autor as organizações internacionais - tanto políticas corno econôrnicas, e nos planos tanto global corno regional - com a preocupação pedagó gica; consoante o enfoque interdisciplinar (não essencialmente jurí dico)� não descuida das organizações não-governamentais (parte X) . E certamentecom a maior satisfação que receberão o presente livro do Professor Ricardo Seitenfus todos os que se dedicam ao estudo da matéria . Importa que o interesse pela mesma desperte definitivamente e se difunda ao máximo, mormente em um país com as dimensões do Brasil. Com a publicação deste Manual, de tanta utilidade aos estudiosos oriundos de distintas áreas de especializa ção, dá o autor a sua contribuição, das mais válidas, neste propósito. Só podemos sinceramente esperar, todos os que há anos acompanha mos com a maior atenção a operação e a evolução das organizações internacionais, que logrem estas adaptar-se de modo a atender às necessidades da humanidade no limiar do novo século, e contribuir eficazmente a que as relações internacionais se conduzam doravante pautadas por maior solidariedade humana. Brasília, abril de 1997. Antônio Augusto CANÇADO TRINDADE Ph.D. (Cambridge) em Direito Internacional, Juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Professor Titular da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, Ex-Consultor Jurídico do Ministério das Relações Exteriores do Brasil (1985-1990) Sumário 1. Intródução 2. Teoria das organizações internacionais 2 .1 . Definição . . . . . . . . . . . . . . . . . 2.2. Elementos constitutivos . . . . . . . . 2 .3 . Enfoques dos estudos das organizações internacionais 2.4. Origem histórica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2.4. 1 . O surgimento do Estado e as premissas da organização internacional . . . . . . . . . 2.4.2. As doutrinas precursoras . . . . . . . . 2.4.3 . A experiência nas Américas . . . . . . 2.4.4. As uniões técnicas e administrativas . 2.5. Classificação das organizações internacionais . 2.5 . 1 . A classificação segundo a natureza 2.5.2. A classificação segundo suas funções . . 2.5.3 . A classificação segundo a estrutura do poder 2.5.3 . 1 . As regras do processo de tomada de decisões 2.5 .3 .2. Os procedimentos . . . . . . . . . 2.5.3 .3 . A direção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2.5.4. A classificação segundo sua composição . . . . . . . . 2.6. As organizações internacionais em movimento: considerações sobre o processo de tomada de decisões . . . . . . . . . . . 2.6. 1 . A ideologia das organizações internacionais . . 2.6.2. A realidade do processo decisório . . . . . . . . 3. Personalidade jurídica das organizações internacionais 3 . 1 . Fundamentos . . . . . . . . . . . . . . 3 .2. Competência e instrumentos de ação . 3 .2 . 1 . Natureza e extensão . . . . . . . . 3 .2 .1. 1 . Competência norma ti v a 3 .2 . 1 .2. Competência operacional . 3 .2. 1 .3 . Competência impositiva 3 .2 . 1 .4. O controle . . . . . . . 3 .2.2. Os instrumentos materiais . . . 3 .2.2. 1 . Os recursos humanos . 3 .2.2.2. Os recursos financeiros 3 .3 . A representação dos Estados-Membros . 3 .4. As jurisdições internacionais . . . . . . . 25 29 32 34 35 38 39 41 41 43 44 45 45 47 47 50 51 51 52 52 55 59 60 64 65 65 67 68 82 84 84 91 97 100 4. A Liga das Nações 103 4. 1 . Origem . . . . . 103 4.2. Características . 106 4.2 .1 . Os Estados-Membros 106 4.2.2. Os mecanismos de manutenção da paz 109 4 .2.3 . A estrutura institucional 110 4.3 . A crise da Liga das Nações . . . . . : . 1 13 4.3 . 1 . Os pequenos sucessos . . . . . . 1 14 4.3 .2. Os grandes fracassos . . . . . . 118 4.4. Um balanço da experiência da SDN . 123 5. A Organização das Nações Unidas . . . 125 5 . 1 . Origem . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125 5.2. Características da Carta de São Francisco 128 5 .3 . Os Estados-Membros . . . 135 5.4. A estrutura . . . . . . . . . . . . . 138 5.4. 1 . A Assembléia Geral 140 5 .4.2. O Conselho de Segurança 142 5 .4.3 . O poder de veto . . . . . . 144 5 .4.4. O Conselho Econômico e Social . 149 5.4.5. O Secretariado . . . . . . . . . . . 152 5.5. A Corte Internacional de Justiça . . . . 155 5.6. As Nações Unidas em movimento: um balanço de suas realizações 158 5 .6 .1 . A impossível socialização do desenvolvimento . . . . . . . . . 159 5.6 . 1 . 1 . As transformações institucionais . . . . . . . . . . . . . 161 5.6 . 1 . 1 . 1 . Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161 5.6 . 1 . 1 .2. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento 162 5 .6 .1 .2. O resultado das transformações . 163 5.6.2. Outras ações das Nações Unidas . . . . 164 5 .6 .3 . Limites e reforma do sistema . . . . . . 178 6. As organizações internacionais especializadas . 181 6. 1 . Conceito . . . . . . . . . . 181 6.2. Origem . . . . . . . . . . . . . . . . . . 182 6.3 . Características das crises . . . . . . . 184 6.4. Estrutura da cooperação econômica . 186 6.4.1 . Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) . 186 6.4.2. Fundo Monetário Internacional (FMI) 190 6.4.2 .1 . A Argentina e o FMI . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 201 6.4.2.2. O Brasil e o FMI . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 205 6.4.3 . Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) . 206 6.4.4. Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) . . . . . . . . . . . . · . . . . . . . . . . . . . 208 6.4.5. Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (ONUDI) . . . . . . . . . . . . . . . 210 6.4.6. Organização Mundial do Comércio (OMC) . . . . . . . . . . 211 6 .5 . Estrutura da cooperação social . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 226 6.5.1 . Organização Internacional do Trabalho (OIT) . . . . . . . . 226 6.5.2. Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) . . . . . . . . . . . . 232 6.5.3 . Organização Mundial da Saúde (OMS) . . . . . . . . . . . . . 233 6.6. Estrutura da cooperação em comunicações . . . . . . . . . 235 6.6. 1 . União Postal Universal (UPU) . . . . . . . . . . . . . . 236 6.6.2. União Internacional de Telecomunicações (UIT) . . . 238 6.6.3 . Organização da Aviação Civil Internacional (OACI) 239 6.6.4. Organização Marítima Internacional (OMI) . 241 6.7 . Cooperação com fins específicos . . . . . . . . . . . . . . . . 243 6.7 . 1 . Organização Meteorológica Mundial (OMM) . . . . 243 6.7 .2. Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) . 245 6.7 .3 . Organização para a Proibição das Armas Químicas (OP AQ) 249 6.7 .4. Organização Mundial de Turismo (OMT) . 25 2 7. A Organização dos Estados Americanos (OEA) . . . . . . 255 7 .1 . Condicionantes das relações inÍ:eramericanas . . . . . . 255 7 .2. Origens das organizações internacionais nas Américas 25 6 7 .3 . Fundamento da OEA . . . . . 260 7 .3 . 1 . Objetivos e Princípios . . . . . . . . . . . . . . . . . 260 7 .3 .2. Estrutura Institucional . . . . . . . . . . . . . . 262 7 .4. A solução pacífica dos litígios e a institucionalização da cooperação militar: o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) 268 7 .5 . Um balanço da experiência da OEA . . . . . . . . . . . . 270 7 .6. Perspectivas da OEA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 2 8. As organizações de cooperação econômica nas Américas 275 8 . 1 . Uma organização de alcance continental . . . . . . . . . 27 8 8.2. As organizações de alcance regional . . . . . . . . . . . 27 9 8.2. 1 . Associação Latino-Americana de Integração e Desenvolvimento (ALADI) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 9 8.2.2. Sistema Econômico Latino-Americano (SELA) . . . . . . . 281 8.2.3 . Organização dos Estados Centro-Americanos (ODECA) . 282 8.2.4. Mercado Comum Centro-Americano (MCCA) 283 8.2.5 . Comunidade do Caribe (CARICOM) . . . . . . . . . 284 8 .2.6.Pacto Andino . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 284 8.2.7 . Área Norte-Americana de Livre Comércio (NAFTA) 286 8.2.8. Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) . . . . . . . . 288 8.2.8.1 . O prelúdio do Mercosul: os acordos argentino-brasileiros 288 8.2.8.2. O nascimento do Mercosul . . . . . . . . . . 290 8.2.8.3 . As características do Tratado de Assunção 291 8.2.8.4. A atual estrutura do Mercosul . 294 9. As organizações regionais não-americanas . . 30 1 9 . 1 . As organizações dos países desenvolvidos . . 30 1 9 . 1 . 1 . União Européia . . . . . . . . . . . . . . . 30 1 9 . 1 .2. Uma Constituição para a Europa? . . . 3 1 1 9 . 1 .3 . Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) 315 9 .1 .4. Conselho da Europa (CE) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 17 9 .1 .5 . Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) . . . . . 319 9.1 .6. Organização para Segurança e Cooperação Européia (OSCE) 324 9 .1 .7 . G rupo dos Oito (G 8) . . . . . . . . . . . . . 326 9.2. As organi�ações dos países em desenvolvimento . 329 9.2 . 1 . Na Africa 330 9.2.2. Na Ásia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 334 10. As Organizações Não-Governamentais de Alcance Transnacional (ONGAT) 337 10 .1 . Conceito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 339 10.2. As organizações internacionais frente às ONGAT: cooperação ou competição? . . . . . . . . . . . . . . . 342 10.3. Classificação . . . . . . . . . . . . . . . 344 10 .3 . 1 . As ONGAT de harmonização 345 1 0.3.2. As ONGAT de intervenção . . 348 10.4. As ONGAT: nascimento de uma sociedade civil internacional? . 35 0 11. Conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 3 12. Anexo Quadro cronológico resumido sobre a participação do Brasil nas organizações internacionais . . . . . 35 7 FMI - Cotas dos Estados-Membros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 9 13. Bibliografia 13 .1 . Obras fundamentais . . 365 13.2. Obras complementares 366 13.3. Artigos . . . . . . . . . . 370 1 4. Endereços das Organizações Internacionais na Internet 14.1 . Organizações governamentais . 373 14.2. ONGAT . . 375 15. Índice analítico . . . . . . . . . . . . . 377 1 Introdução A organização das sociedades humanas foi impregnada, a partir do século XVI, pelo modelo do Estado que alcançou seu apogeu no século XIX e começou a declinar ao longo do século passado. Perce bido por muitos como sendo uma simples categoria histórica e um fenômeno passageiro destinado a desaparecer, o Estado adquiriu, ao contrário, densidade e se multiplicou esquartejando a totalidade da face da Terra. Contudo, para fazer frente à complexidade crescente das rela ções internacionais - extraordinária teia que envolve múltiplos as pectos e interesses - os Estados decidiram criar novas instituições decorrentes dos liames permanentes que surgem entre eles e que fossem capazes de levar adiante ações de interesse comum. Portanto, estas organizações constituem um elemento novo, externo aos Esta dos, possuidoras de uma existência objetiva de natureza internacio nal. Em outras palavras, o fenômeno que nos interessa é algo decorrente da vontade do Estado, mas que se encontra além dele. Até o surgimento das instituições internacionais havia simples mente a clássica comunidade de direito internacional reunindo as instituições nacionais. Entre elas, estabeleciam-se relações contra tuais que respeitavam princípios mínimos de direito costumeiro. Ora, a sociedade internacional que hoje vigora é muito distinta a reunir uma significativa e diversa quantidade de organizações inter nacionais. Atualmente, o número de OI em atividade é superior ao de Estados soberanos, sem levar em consideração as sociedades e instituições não-governamentais. Elas constituem um espaço de diá logo, por vezes de confronto, que representa um esforço civilizatório significativo no contexto das relações internacionais. Decorrentes de negociações multilaterais que defendem uma concepção ampla e durável de seus interesses, os Estados criam uma moldura permanente e cómoda de consulta e concertação sem incor- - 25 - User Realce rer no formalismo diplomático excessivo do passado. As instituições internacionais introduzem o multilateralismo através do que con vencionou-se denominar diplomacia parlamentar. Por ser coletiva e pública, esta prática afasta a diplomacia secreta, que sempre foi um dos elementos de desequilíbrio e de confronto na cena internacional. As OI se responsabilizam pela correta operacionalização dos tratados internacionais concluídos pelos Estados. Estas normas de vem ser respeitadas pelos Estados soberanos, condição sine gua non para que possam integrar uma organização internacional. E igual mente uma forma de reconhecimento do outro, de aceitação da dife rença, que minora a concepção autárquica do Estado. Ultrapassando os limites do político, as OI demonstraram que os interesses nacionais dos Estados-Membros podem vir a combinar se muito melhor na vida prática a partir do momento em que surgem fenômenos de complementariedade e de solidariedade entre eles. A multiplicação de entidades internacionais de natureza técnica e es pecializada que gravitam em volta das Nações Unidas constitui claro exemplo desta tendência. Estes organismos são dotados de maiores meios e de objetivos e responsabilidades crescentes: funções de arquivo, preparação de reuniões, elaboração de documentos de maneira consensuada, reda ção de regulamentos, gerenciarnento de novos serviços e o auxílio técnico e financeiro concedido a certos Estados. Para fazer frente à crescente densidade e diversificação dos interesses nacionais surge uma cooperação construtiva através das OI. Há também a constatação de que estas associações merecem consideração diferenciada entre seus Estados-Membros, sendo, no mais das vezes, inversamente proporcional à importância que eles mesmos detêm frente aos demais. Em outras palavras, os Estados encontram no sistema das organizações internacionais condições que eles não disporiam caso mantivessem unicamente um relacionamen to bilateral. Trata-se de urna constatação de alcance geral, embora tenha maior importância para os Estados que não dispõem de gran des atributos de poder. O fenômeno organizacional do sistema internacional adquiriu grande relevância ao longo do século que passou, especialmente a partir da Segunda Guerra Mundial. Existem, na atualidade, aproxi madamente mil organizações internacionais, a grande maioria de âmbito regional e uma centena delas de alcance universal. Assim, o estudo deste conjunto de coletividades, mais ou menos autônomas, é uma das peças fundamentais para que sejam com preendidas as complexas relações internacionais contemporâneas. E - 26 - �-------------------------------- -- User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce ele somente pode ser feito a partir da conjugação de diversos enfo ques, numa iniciativa multidisciplinar. A história, o direito, a econo mia e a política são ângulos indispensáveis no tratamento de um tema muito presente na Europa ocidental e na América do Norte, embora pouco consolidado como doutrina ou conhecimento acadê mico. No Brasil, é escasso o próprio interesse pelo estudo das orga nizações internacionais. Esta publicação é um manuat que não foge às peculiaridades do gênero. Obra de iniciação, busca ser rigoroso ao descrever as organizações internacionais, e ao mesmo tempo, transcende a sim ples descrição na medida em que coloca em evidência os mecanismos do processo de tomada de decisões e não se furta de abordar o controverso tema que trata do grau de eficácia das organizaçõesinternacionais. Pode-se dizer, portanto, que o característico sobrevôo dos manuais é complementado por avaliações sobre a ação concreta destas associações de Estados. Evidentemente, este manual é escrito a partir de uma perspec tiva brasileira ou, na melhor das hipóteses, do continente americano. Objetiva atrair a atenção dos leitores para que, uma vez interessados no tema, sejam lançados à amplitude do objeto através da bibliografia nele arrolada. A obra possui uma parte teórica em seus dois primeiros capítu los, que procura conceituar as organizações internacionais, tratando de forma científica este recente fenômeno. A seguir, utilizando-se da classificação proposta nos capítulos iniciais, divide as organizações segundo seu alcance e seus propósitos. As duas organizações uni versais- Liga das Nações e Organização das Nações Unidas- me recem uma atenção particular. Posteriormente, o capítulo 6 trata das dezessete organizações especializadas de âmbito universal. Os dois capítulos seguintes são consagrados às experiências ocorridas nas Américas com um enfo que especiat por um lado, sobre a Organização dos Estados Ameri canos e, por outro, nos organismos regionais de cooperação econômica. Foi feito igualmente um sobrevôo das organizações regionais não-americanas, especialmente as que reúnem os Estados desenvol vidos onde se destaca a experiência singular da União Européia. Num capitulo resumido, há o tratamento, em grande? pincela das, das organizações não-governamentais de alcance transnacional. Malgrado o fato de não ser objeto deste Manuat tornou-se impossí vel eludir este crescente fenômeno da vida coletiva internacional. - 27- Os anexos contêm um quadro resumido da participação brasi leira nas mais importantes OI, a listagem atualizada dos Estados Membros em algumas organizações internacionais e uma bibliografia especializada sobre a temática. Finalmente, com vistas a facilitar o trabalho dos pesquisadores são indicados os endereços eletrônicos de um número significativo de OI e um índice analítico. - 28 - 2 Teoria d as organizações internacionais O direito internacional, codificando o costume e estabelecendo princípios e regras básicas para a convivência entre os Estados, lança as primeiras - portanto, rudimentares - bases de organização da sociedade internacionai .l Estes alicerces são bilaterais e respondem a interesses específicos dos países contratantes. Daí surgiram os acordos com o objetivo de regularizar a situação das pessoas que detêm dupla nacionalidade, avenças sobre a concessão de imunidade diplomática, sobre a extradição e a cooperação judiciária, ou sobre a delimitação de territórios contíguos. A condição destes acordos é a reciprocidade. Um patamar superior de cooperação internacional foi alcançado quando três ou mais Estados decidiram trabalhar para atingir fins comuns. Passamos então do bilateralismo para o multilateralismo. Este vem a ser o traço fundamental da organização internacional contemporânea. Sua evolução demonstra que as primeiras grandes conferências internacionais tinham um objeto definido, embora não houvesse preocupação com a periodicidade destas reuniões. Poste riormente, as conferências tornaram-se freqüentes, fazendo surgir um embrião de institucionalização em razão desta regularidade. Finalmente, foi necessário que estas conferências resolvessem duas questões práticas: por um lado, a preparação da agenda e da infra-estrutura indispensáveis à realização do encontro. Por outro, a 1 Convém anotar que a denominação de sociedade internacional não reflete com exatidão o que pretendemos descrever. Trata-se do meio internacional ou sistema internacional. Todavia, optan do por outra designação, utilizada com freqüência pela literatura, qual seja a expressão comu nidade internacional, estaríamos nos distanciando mais ainda das características objetivas que marcam as relações internacionais. Com efeito, a expressão comunidade implica a existência de uma comunhão de interesses e a vontade de viver de forma congraçada. Ora, as relações inter nacionais demonstram que o congraçamento não consiste no maior de seus traços. Portanto, adotamos a expressão sociedade in ternacional no seu sentido sociológico, a demonstrar a exis tência de um mínimo de vontade de convivência. - 29 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce necessidade de manter uma memória do que foi decidido. Aparece ram então os secretariados das conferências, fazendo com que surgis se, efetivamente, a organização internacional. Esta evolução desemboca na consolidação de três de suas prin cipais características : multíla teralídade, permanência e institucionaliza ção. Não existe nenhuma controvérsia no que diz respeito às duas primeiras. A multilateralidade pode caracterizar-se pelo regionalismo ou pelo universalismo. Mais do que os objetivos e princípios, a dife rença entre o regionalismo e o universalismo é encontrada na com posição dos sócios. Os primeiros pertencem ao espaço físico delimitado, onde a contigüidade geográfica é uma das principais, mas não decisiva, características. Ao contrário, as organizações in ternacionais de cunho universalista não fazem discriminação de ori gem, de organização política ou de localização entre seus sócios. As relações entre as organizações regionais e as universais são estabelecidas nos tratados constitutivos. Os compromissos assumi dos pelos Estados em âmbito regional não podem ser incompatíveis com os firmados na organização universaP Portanto, esta condicio na tanto os acordos regionais passados quanto os futuros à estrita observância dos termos do tratado de âmbito universal. A permanência das organizações internacionais manifesta-se através de dois elementos. Por um lado, a organização internacional é criada com o objetivo de durar indefinidamente. Isto não pressu põe que ela seja perene, pois muitas organizações internacionais já desapareceram; ou ainda que os Estados-Membros não possam de sobrigar-se e dela retirar-se, após cumprir o rito previsto no tratado constitutivo. A duração por tempo indeterminado prende-se à au sência de qualquer limite temporal estabelecido no ato constitutivo, mesmo que este contenha a previsão, de forma explícita, de sua própria reforma, porém excluída, desde logo, a sua extinção. 2 O artigo 20 do Pacto da Liga das Nações "revoga todas as obrigações ou acordos entre si, incompatíveis com os seus termos, e [os Estado signatários] se comprometem, solenemente, a não contrair, no futuro, outros, semelhantes". Além disso, "se, antes de sua entrada na Socie dade, algum Membro tiver assumido obrigações incompatíveis com os termos do Pacto, esse deverá adotar medidas imediatas para se desligar de tais obrigações". O artigo 52 da Carta das Nações Unidas, mesmo reconhecendo que "nada na presente Carta impede a existência de acordos ou entidades regionais, destinadas a tratar dos assuntos relativos à manutenção da paz e da segurança internacionais que forem suscetíveis de uma ação regional", enfatiza que tal liberalidade pressupõe que "tais acordos ou entidades regionais e suas atividades sejam compatíveis com os Propósitos e Princípios das Nações Unidas" . O artigo 136 da Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA) reconhece a primazia da organização universal ao definir que "nenhuma das estipulações desta Carta se interpretará no sentido de prejudicar os direitos e obrigações dos Estados Membros, de acordo com a Carta das Nações Unidas". - 30 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce De outra parte, o caráter permanente dasorganizações interna cionais expressa-se pela criação de um Secretariado, com sede fixa, dotada de personalidade jurídica internacional, que permite a assi natura de acordos-sede, com a aplicação do princípio da inviolabili dade e com os direitos e obrigações inerentes às atividades de representação diplomática no exterior. Para o cumprimento de suas funções, a organização internacional possui capacidade para emitir passaportes ou laissez-passer para seus funcionários. Estes não per dem a nacionalidade original mas, no exercício de suas obrigações funcionais, dispõem de documentos legais fornecidos pela organiza ção internacional. A questão da institucionalização das organizações internacionais é bastante complexa, em razão da natureza da realidade internacio nal, cuja essência consiste no sistema relacional entre os Estados; isto é, urna intrincada rede de relações bilaterais. O objetivo desta prática secular é fornecer aos Estados as condições para a sua segurança. Com o surgimento das organizações internacionais, o sisternà rela cional não desapareceu, na medida em que, até o momento, as rela ções no âmbito das organizações não atingiram um grau que pudesse vir a substituí-lo. Os Estados, ao manterem suas prerrogativas tradicionais de exercício do poder, concordaram em criar mecanismos multilaterais dotados de instrumentos capazes de atuar nos mais diversos cam pos, inclusive de forma preventiva, corno, por exemplo, quando se trata da manutenção da paz e da segurança internacionais. Todavia, as funções das organizações internacionais são percebidas de forma diferenciada pelos Estados-Membros. A institucionalização pressupõe três elementos. O primeiro deles é a previsibilidade de situações que outrora passavam a ser tratadas coletivarnente apenas quando os interessados buscassem auxílio ou atuassern em defesa própria. A organização, em seus tratados, prevê fatos e condutas que virão a materializar-se na realidade e atribuir lhe conseqüências, inclusive, entre elas, sanções internacionais. Cria se, assim, um espaço institucional de solução de conflitos e de relacionamento interestatal. Neste sentido, o advento das organiza ções internacionais é um importante fator de juridicização das rela ções internacionais. O ganho que deveria advir da institucionalização pode ser sin tetizado pela previsibilidade, via de conseqüência, das próprias re lações internacionais - leia-se estabilidade do sistema -, bem corno um maior grau de justiça das decisões coletivas. Naturalmente, estas - 31- User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce vantagens dependem da equação de poder compreendida pelas or ganizações internacionais, tanto quanto da eficácia de sua atuação.3 O segundo elemento a ser considerado é a soberania. A partici pação de um Estado numa organização internacional pode vir a significar a necessidade de dimensionar coletivamente certas com petências que antes pertenciam ao absoluto domínio nacional, no caso de algumas culturas sob a forma de um dogma. Como último elemento, é necessário frisar que a vontade mani festada por um Estado de aderir à organização internacional é que condiciona sua posterior aceitação do processo decisório em curso, desde que o mesmo respeite os tratados acordados. Portanto, a pos terior denúncia não exime o Estado de sua sujeição ao decidido no período em que integrava o corpo coletivo. A mais simplista e primária forma de institucionalização con siste em formar um restrito secretariado administrativo sob a respon sabilidade, por vezes rotativa, de um dos sócios. A mais complexa e avançada se reflete na delegação de competência e poderes dos Es tados-Membros para um órgão supranacional, capacitado a impor as decisões e controlar sua forma de aplicação. Como exemplo atual e marcante, serve uma parte da estrutura orgânica da União Européia - a Comissão Européia e o Tribunal de Luxemburgo. A existência de uma organização internacional pressupõe a ma nifestação da vontade dos sócios. Portanto, o voluntarismo deve ser acrescido da formalização jurídica obtida através da assinatura de um tratado que implica a responsabilidade estatal. Do ponto de vista jurídico, tem duplo sentido a natureza do tratado que origina uma organização internacional. Pelo prisma formal, ele possui as caracte rísticas próprias de um acordo e, materialmente, representa ao mes mo tempo um tratado e uma espécie de Constituição, eis que determina a estrutura e o funcionamento de um novo ente autônomo. 2. 1 . DEFINIÇÃO As organizações internacionais são associações voluntárias de Es tados4 que podem ser definidas da seguinte forma: trata-se de uma 3 "A organização internacional tende a corrigir o caráter facultativo dos procedimentos polí ticos e jurisdicionais, colocando a sua disposição instâncias pré-instituídas", in DUPUY, R.-J., Le droit international, Paris, PUF, 1993, p. 115. 4 Em razão das características de seus sócios, as organizações internacionais são interestatais, pois a responsabilidade dos Estados encontra-se comprometida. Neste sentido, a intergover namentabilidade das organizações internacionais decorre da atuação do Estado em seu seio através do governo. - 32 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce sociedade entre Estados, constituída através de um Tratado, com a finali dade de buscar interesses comuns através de uma permanente cooperação entre seus membros .5 O artigo 2°, § 6°, da Carta das Nações Unidas ressalta o voluntarismo desta participação, pois a ONU não pode impor sua autoridade a um Estado que não a compõe.6 O tratado constitutivo de uma organização internacional objeti va estabelecer os direitos e obrigações dos Estados-Membros com as organizações internacionais e, muitas vezes, entre os Estados-Mem bros. Portanto, a criação e o funcionamento de uma organização internacional depende do tratado constitutivo, como dele também depende o respeito aos direitos e deveres dos Estados-Membros em suas relações recíprocas. Por esta razão, os Estados mais débeis in gressam nas organizações internacionais em busca de legitimação e segurança. Muitos autores enfatizam a importância de a organização inter nacional ser dotada de instituições, ou seja, de órgãos próprios. Al guns, como Paul Reuter, somente consideram a existência de uma organização internacional quando ela pode, através de uma organi cidade própria e independente, manifestar uma vontade distinta dos Estados-Membros? Em outras palavras, caso a institucionalização represente um novo espaço para a atuação dos Estados sem que eles deleguem ou concedam instrumentos de atuação à OI com um míni mo grau de autonomia, a organização internacional assim concebida será um mero instrumento estatal, já que desprovida de seu elemen to fundacional. Desta percepção decorre uma definição distinta das organizações internacionais. Assim, estas seriam uma associação voluntária entre Estados, constituída através de um tratado que prevê um aparelhamento institucional permanente e uma personalidade jurídica distinta dos Estados que a compõem, com o objetivo de buscar interesses comuns, através da cooperação entre seus membros .8 5 Esta definição permite distinguir as organizações internacionais das empresas transnacionais, de caráter econômico, que possuem uma matriz num determinado Estado e atividades de produção ou serviços através de filiais localizadas em outros Estados. Portanto, devemos descartar a denominação de empresas multinacionais utilizada em grande parte da literatura. 6 Contudo, as regras e os princípios contidos em um Tratado constitutivo de uma organizaçãointernacional com vocação universal podem adquirir, através do costume, valor para os Esta dos não-membros. Exemplos nos são fornecidos pela declaração da República Federal Alemã de 1954, que aceita os princípios contidos na Carta da ONU, ou ainda o artigo 28 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. 7 REUTER, P., Institu tions internationales, Paris, Dalloz, p. 199. 8 A Conferência de Viena sobre o Direito dos Tratados define de forma sucinta as organizações internacionais: entende-se por Organização Internacional uma organização intergovernamental (art. 2°). - 33 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce 2.2 . ELEMENTOS CONSTITUTIVOS a) Os membros de uma organização internacional são os Esta dos, portanto, etimologicamente, poderíamos identificar uma orga nização internacional como sendo uma organização interestatal. Este elemento descarta, por conseguinte, as organizações internacionais de cunho privado ou aquelas que concedam igual condição jurídica a membros públicos e privados. Isso não quer dizer que as organi zações interestatais não venham a acolher instituições privadas como conselheiras ou consultoras. b) A constituição de uma organização internacional é feita atra vés de um tratado, ou seja, um acordo firmado entre os Estados segundo as normas do direito internacional. Portanto, elas são de origem clássica que se inspira no Direito dos Tratados. As exceções são encontradas no caso da União Européia, que deu nascimento a um direito próprio - o Comunitário - e as organizações de integração econômica criadoras de um Direito da Integração. c) O tratado firmado entre os Estados-Membros equivale tam bém à constituição da organização internacional. Por essa razão, o texto que dá origem à organização é denominado tratado constitu tivo . Nele se encontram os objetivos e os instrumentos previstos para alcançá-los. Caso os meios previstos se mostrem insuficientes ou inadaptados para que sejam concretizados os objetivos definidos nos tratados constitutivos, é aplicado o princípio da capacidade implícita que dispõe a OI. d ) A existência de uma organização internacional implica o estabelecimento de órgãos permanentes . Mesmo que a direção dos trabalhos da OI possa vir a ser feita através de um rodízio entre os Estados-Membros - caso do Mercosul - existe um corpus funcional e uma estrutura de permanente de poder, amplo ou reduzido, a servi ço da instituição. e) As organizações internacionais são sujeitos mediatos ou secun dários da ordem jurídica internacional.9 Isso significa dizer que ao contrário dos Estados que nascem a partir do momento do preenchi mento de certos requisitos, tanto o surgimento quanto o desapareci mento de uma OI está a depender de uma vontade externa à sua. f) Uma organização internacional pressupõe a existência de ob jetivos de interesse comum entre os Estados-Membros. Por conseguin te, as OI exercem uma função de cooperação interestatal que pode 9 A única excessão é a União Européia, pois o seu caráter supranacional permite que ela se constitua em sujeito imediato ou primário da ordem jurídica internacional. - 34 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce ser operacionalizada basicamente de duas maneiras: (a) por um lado, deixando intacta a estrutura da sociedade internacional composta por Estadós soberanos (organizações de cooperação) ou (b) buscando aproximar os Estados que dela fazem parte, exercendo em seu nome certas funções delegadas (organizações de in tegração) . g) Os Estados criam ou associam-se livremente às organizações internacionais. Portanto, eles o fazem numa expressão de vontade própria de origem nacional. A base voluntarista das OI decorre, igual mente, do fato que toda organização repousa sobre um tratado. Mes mo quando urna OI nasce de --urna resolução adotada em urna conferência internacional - caso da OPEP - tal resolução deve ser entendida corno um acordo em forma simplificada que possui o valor de um tratado. h) Os Estados-Membros de urna OI, além das desigualdades material e objetiva que os caracterizam, podem ser considerados titulares de direitos e deveres diferenciados na condição de integrantes do coletivo . i) Os Estados fundadores das OI são definidos corno membros originários, e os demais, membros ordinários ou associados. 2.3. ENFOQUES DOS ESTUDOS DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS Apesar da crescente importância das instituições internacionais nas relações interestatais, internacionais e transnacionais, o estudo deste fenômeno é bastante recente. O estreito e tradicional vínculo entre o direito internacional público e o estudo das organizações internacionais, além de restringir o enfoque destas à exclusiva per cepção jurídica, fez com que o entendimento do novo fenômeno do mundo contemporâneo estivesse imbricado a urna disciplina que normalmente era ministrada ao final da formação jurídica. Com a aceleração da integração mundial, qualquer que seja a conotação que queiramos atribuir à popular globalização, os estudio sos viram-se obrigados a identificar o ambiente internacional no qual atuarn os sistemas nacionais. O ambiente internacional é, ao mesmo tempo, jurídico, político, econôrnico, social e militar. Sua compreen são, ainda que mínima, é condição indispensável para o entendimen to dos fenômenos internos dos Estados. Estes, aliás, não são mais os atares solitários da nova realidade internacional. Além das forças transnacionais privadas, corno, por exemplo, as empresas comer ciais, industriais ou financeiras, as relações internacionais compor- - 35 - User Realce User Realce User Realce User Realce tam a existência de outros atares, como as organizações não-gover namentais e as internacionais. A manutenção da paz e a busca do desenvolvimento econômico e social fazem as organizações internacionais desempenharem um papel de prestadoras de serviços internacionais aos Estados. Portan to, as relações entre fenômenos intra e extra-estatais são constantes e profundas. São estas circunstâncias que tornaram os estudos das orga nizações internacionais elemento fundamental para a formação nos vários ramos das Ciências Sociais em muitos sistemas educacionais. Ao conseguir desvencilhar-se do fardo de constituir um simples apêndice do direito internacional público e ao tornar-se, em várias importantes Universidades dos países desenvolvidos ocidentais, dis ciplina obrigatória da gradução, o estudo da organização das relações internacionais conquistou seu próprio espaço nas Ciências Sociais. Contudo, a experiência educacional brasileira encontra-se mui to distante das necessidades de entendimento do cenário internacio nal. Raros são os cursos dedicados às relações internacionais. Nos cursos de formação jurídica, a matriz curricular, no que diz respeito às questões internacionais, é a mesma que as Faculdades de Direito da Europa Ocidental e da América do Norte aboliram durante os anos 1950. Nestas condições, é significativo o escasso interesse para as publicações nacionais que se debruçassem exclusivamente sobre a organização das relações internacionais . 10 Os modernos manuais de direito internacional público editados no Brasil oferecem um peque no espaço para o estudo das organizações internacionais. Trata-se, geralmente, da inserção de um pequeno capítulo descritivo, no final do livro, que fornece dados sobre as instituições internacionais. Todavia, sem desmerecer o importante substrato jurídico nas análises sobre as instituições internacionais, consideramos que esta percepção não consegue indicar o grau de eficácia das organizações e as relações de poder entre seus integrantes. Analisar as instituições internacionais sob o exclusivo prisma jurídico consisteem cometer o mesmo erro de analisar as instituições políticas nacionais basean do-se exclusivamente nos textos constitucionais e suas interpretaçõ es jurídicas. Já na década de 1930, os primeiros ensaios publicados sobre a experiência da Liga das Nações, também chamada Sociedade das Nações (SDN), enfatizavam a necessidade de transcender o enfoque 10 Cabe ressãltãr a pioneirã publicação do Prof. Cançado Trindade sobre o Direito das Organi zações Internacionais, Brasília, Escopo, 1990, 521 p. e a publicação do Prof. Albuquerque Mello, Direito Internacional da Integração, Rio de Janeiro, Renovar, 1996, 357 p. - 36 - User Realce User Realce jurídico para bem entender o fenômeno das organizações internacio nais. Assim, nascem os internacionalistas, os quais, diferentemente dos juristas dedicados ao Direito Internacional Público, estão cons cientes das limitações dos estudos exclusivamente jurídicos das or ganizações e realidade internacionais. O melhor exemplo encontra-se em William Rappard, com seu estudo sobre a Crise mundial, publicado em 1938. Ele identifica duas formas distintas e de valor desigual, para o estudo da SDN. Esta organização, não logrando alcançar aquilo que seus fundadores pre tendiam, devendo adaptar-se ao mundo real, não poderia ser com preendida unicamente através do direito: seria indispensável recorrer ao método histórico. O método jurídico, segundo Rappard, "quando aplicado à aná lise do Pacto da Sociedade [das Nações], pode iluminar-nos sobre as intenções de seus redatores. Mas ele não pode, naturalmente, reve lar-nos o verdadeiro caráter de uma instituição que, apesar de ter nascido de seus esforços, não corresponde mais às suas expectativas. Por outro lado, para determinar o seu caráter, caso estendamos a aplicação do método jurídico de análise do Pacto à da jurisprudência dos órgãos da Sociedade das Nações, nós encontramos, imediata mente, uma grande dificuldade. Esta jurisprudência, com efeito, não é obra unicamente da Corte Permanente de Justiça Internacional, mas também de todos os outros órgãos da Sociedade". Portanto, além do texto constitutivo das organizações interna cionais, os juristas devem levar em consideração tanto as interpreta ções que são fornecidas pela Corte de Haia, quanto as oriundas dos próprios órgãos da estrutura das organizações internacionais. Quando se analisa a jurisprudência emanada dos órgãos das organizações internacionais, percebe-se que a falta de ortodoxia }u rídica e as permanentes e decisivas injunções de ordem política atin gem o cerne dos compromissos coletivos das organizações internacionais. Assim, não surpreende que as organizações interna cionais, como, por exemplo, a SDN e a ONU, tenham criado comis sões, após décadas de existência, encarregadas de estudar as questões relativas à aplicação de seus princípios func�adores e os problemas decorrentes. O que é o método histórico? Deve-se afastar de pronto a escola histórica tradicional que alinha um rosário de fatos, muitos sem clara conexão, e os apresenta como sendo a totalidade do real. A qualifi cação do método histórico, quando aplicado ao estudo das organi zações internacionais, consiste, antes de mais nada, nos instrumentos analíticos que têm como objeto o poder em movimento. Ou seja, os - 37 - User Realce fatores objetivos que diferenciam e hierarquizam as quase duas cen tenas de Estados soberanos que constituem as Nações Unidas. O movimento representa o entrechoque de interesses e valores, expres sos ou velados, entre os sócios. A interpenetração dos métodos histórico e jurídico é fenômeno recente dos estudos interdisciplinares. Assim, estamos distantes do nível científico que marca os estudos sobre as instituições políticas estatais . Renomados historiadores do século XIX, como Webster, Dupuy e Nicolson, não recorreram à análise do Congresso de Viena e do Diretório europeu, apesar de estes Congressos lançarem as bases da organização internacional contemporânea . Por outro lado, cabe ressaltar que certos juristas, ao analisarem as instituições inter nacionais, tendem a considerá-las como sendo fenômenos estáticos, incapazes de evolução ou involução. 2.4. ORIGEM HISTÓRICA Ha dois pressupostos básicos para que exista uma sociedade internacional organizada nos moldes da atual: por um lado, a pre sença de múltiplos Estados que são os sujeitos desta sociedade e, por outro, que estes Estados se considerem reciprocamente em igualdade de condições jurídicas, ou seja, que exista um respeito mútuo entre eles. · Sinais de solidariedade entre grupos humanos já se manifestam desde a Antiguidade. Num primeiro momento, foram estabelecidas regras de arbitragem entre as cidades gregas. Em seguida, no século V, surge a aplicação do princípio confederativo, segundo o qual cada cidade fazia-se representar no Conselho segundo um peso pondera-· do calculado através da importância de cada um de seus membros. O perigo que ronda estes burgos faz com que muitos deles coorde nem sua política de defesa e compartilhem de uma defesa coletiva, sustentada pela contribuição financeira dos participantes. Mais do que as rivalidades entre as cidades, a predominância de Aten"as e as guerras com os Persas e Macedônicos, o que demons trou os limites da solidariedade no mundo helênico foi a inexistência do respeito mútuo entre os sujeitos de direito. Certamente, há muitos Estados. Contudo, eles desconsideravam a igualdade jurídica já que Israel se autoproclamava o único povo eleito; os gregos percebiam os demais povos como bárbaros, e os romanos pretendiam uma dominação universal. Assim, a Antiguidade se sustentava essencial mente no princípio da subordinação - base dos impérios da Assíria, - 38 - User Realce User Realce Babilônia, Pérsia, Egito e de Roma - que obtinham a paz unicamente através da guerra. A Idade Média faz surgir, de fato, uma sociedade transnacional. Contudo, não se trata de organizar as relações dentro do mundo cristão, mas submetê-lo à autoridade espiritual e temporal do Papa e do Imperador. Tal diarquia concedeu ao Papa um verdadeiro pre domínio na esfera internacional. Ele atuou, durante quase toda a Idade Média, como árbitro supremo e inapelável dos conflitos entre os Príncipes cristãos. Estes foram liberados de juramentos, eximin do-se de obrigações contraídas via tratados. O Papa adjudicava im périos a distintos Estados, como o fizeram Inocêncio III e Alexandre VI com as Bulas papais que dividiram as terras a serem descobertas no Novo Mundo. Apesar de ser considerada a primeira forma de organização ou de governo supranacional da sociedade internacional, o poder exer-. ciclo pelo Papado não pode ser assimilado à de uma organização internacional nos moldes atuais. Não somente o Papa procurava estender o imperialismo romano para dominar o. conjunto dos cris tãos do Ocidente, mas sobretudo a natureza da organização interna cional contemporânea - obra feita pelo Estado - está muito distante do poder espiritual exercido pelo Papado. 2.4.1. O surgimento do Estado e as premissas da organização internacional A contestação da primazia do Papado e da influência do Impe rador ao final da Idade Média - obra do Renascimento e da Reforma - provoca o surgimento de monarquias nacionais e de Estados laicos. Abre-se uma era que se estende aos dias atuais e durante a qual a sociedade internacional irá adquirir novos contornos. Os Tratados de Vestefália (1648), mais do que colocar um termo a Guerra dos Trinta Anos, estabeleceram um "sistema pluralista e secular de uma sociedade de Estados independentes, substituindo, desde então, a ordem providencial e hierarquizada da Idade Média" . 1 1 Surgindo contra o Papado e os os senhores feudais, os Estados afastaram a idéia oferecida pela experiênciada Igreja . Eles poderiam substituir o poder do Papado por uma autoridade criada pelo esfor ço coletivo entre eles e que estivesse a seu serviço. Ao contrário disso, definiram claros objetivos igualitarios: formalização de sua 1 1 De VISSCHER, Ch., Théories et Réalités en Droit International Public, Paris, 1953, p. '19 . - 39 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce independência; rechaço de qualquer autoridade que se encontre fora e acima deles; igualdade soberana entre eles e admissão da existência de uma relação de poder entre os Estados. A balança de poder entre os Estados que caracterizou a Idade Média foi definida por Talleyrand como a relação entre as forças de agressão recíproca dos diversos corpos políticos. Nestas condições, não surpreende o fato de ser impossível a estruturação pacífica das relações internacionais através de uma organização da sociedade entre os Estados que a compõem. O resultado desta opção foi a cristalização de uma sociedade hobbesiana marcada pelas guerras dinásticas, lutas de hegemonia, guerra repressiva, inclusão de cláu sulas secretas contra terceiros Estados nos tratados e as alianças militares . De fato, estamos frente a uma sociedade anárquica marca da por uma guerra permanente de todos contra todos. O início do século XIX aporta as premissas de uma mudança com o surgimento de um embrião de organização da sociedade in ternacional. O final das guerras napoleônicas permite a formação da Santa Aliança em 1815 . Tem início a "era dos Congressos", que faz surgir a diplomacia de alcance multilateral no continente europeu. A partir de então, os problemas europeus serão debatidos em seu mais alto nível e, sobretudo, não serão objeto de deliberações bilate rais, mas coletivas. Trata-se de uma pentarquia que reúne, a partir de 1818, Aústria, França, Prússia, Reino Unido e Rússia sob a denominação de "Dire tório Europeu". Pela primeira vez na história, as Grandes Potências se reunem em tempo de paz para solucionar seus problemas através de consultas. Por conseguinte, surge claramente uma preocupação com a prevenção dos conflitos. Todavia, é necessario fazer uma dis tinção entre o objetivo perseguido pelo Diretório - luta contra os governos revolucionários que se opunham à monarquia, inclusive com intervenção armada - e o significado para o surgimento das organizações internacionais dos mecanismos de concertação imagi nados por ele. Apesar de seu fenecimento a partir de 1825, a experiência da Santa Aliança é retomada pelo Concerto Europeu - novo modelo de governo de fato e oligárquico da sociedade internacional. O senti mento de solidariedade dos países vencedores de Napoleão fez sur gir um processo de entendimento na Europa, baseado no princípio da monarquia, legitimado no direito divino e do equilíbrio de poder entre seus integrantes. Todavia, não se tratava de organizações in ternacionais no sentido estrito, mas de um esforço permanente de - 40 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce consultas diplomáticas para que os litígios e diferendos entre os Estados não se transformassem em guerras. As reuniões ocorriam sobre uma base voluntarista, e seus resul tados não eram coercitivos. Por esta razão, o Concerto Europeu nun ca esteve em condições de impor suas decisões a uma grande potência . Entretanto, o Concerto conseguiu intervir de forma coleti va na China e lutou de maneira coordenada para colocar um termo ao tráfico negreiro e à escravidão. Definiu, no Congresso de Berlim de 1885, as regras para a divisão colonial da África. O encontro entre as experiências multilaterais européias e ame ricanas ocorreu no final do século. Foram as duas primeiras Conferên cias de Haia (1899 e 1907) que, de forma inédita, tentaram estabelecer princípios jurídicos comuns para a organização internacional. 2.4.2. As doutrinas precursoras Os constantes conflitos entre grupos socialmente organizados conduziram a humanidade, desde o século XIV, a interrogar-se sobre os meios de controlar a guerra e tornar permanente a paz. Incipientes e de escasso alcance, as idéias de constituição de uma organização internacional de caráter universal foram manifestadas por Pierre Dubois e, em 1464, por George de Podiebrad, Rei da Boêmia, com um projeto de manutenção da paz na Europa. A partir do século XVI, novos estudos são divulgados por Wil liam Penn, Jean-Jacques Rousseau, os abades São Pedro e Gregório. Surge o importante trabalho de Kant sobre a paz perpétua. Contudo, a manifestação destas vontades isoladas ou de pequenos grupos não atinge a política dos Estados que prosseguem em uma concepção nacional e individualista da segurança de seus respectivos Estados. 12 2.4.3. A experiência nas Américas O perigo de uma reconquista, por parte da Espanha, de sua ex-colônia peruana e as idéias integracionistas defendidas por Simon 12 Os pesquisadores brasileiros estão sendo contemplados com a inédita e impressionante publicação da Coleção Clássicos do IPRI (edição da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, UnB e Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais do Ministério das Relações Exteriores). Ela se compõe, numa primeira etapa, de 21 volumes com as obras fundamentais de autores que marcaram o pensamento sobre os assuntos internacionais. Cada texto é apresentado e comentado por um especialista brasileiro. A maioria dos autores referidos neste Manual compõe a Coleção. - 41 - User Realce User Realce User Realce Bolívar, a fim de resguardar a jovem independência da América Latina, fazem com que vários países do continente reúnam-se no Panamá em meados de 1826. O Primeiro Congresso dos Estados Americanos conta com a participação da Colômbia (atualmente os territórios da Colômbia, Equador, Panamá e Venezuela), da América Central (Costa Rica, Guatemala, Honduras, Nicarágua e El Salvador), dos Estados Uni dos Mexicanos e do Peru. São observadores a Grã-Bretanha e a Ho landa. Argentina, Bolívia, Brasil e Estados Unidos da América não se fazem representar. Neste Congresso, é firmado o Tratado do Panamá, prevendo a formação de uma Confederação de Estados, com o objetivo de manter a paz e buscar soluções negociadas para os conflitos. Do ponto de vista institucional, é prevista uma assembléia geral onde todos os países deveriam estar em perfeita igualdade jurídica. Sem ratificações, o Tratado do Panamá confronta-se com a rea lidade política do Novo Mundo, e seus objetivos se diluem. Parado xalmente, não foram as ex-metrópoles ibéricas os principais adversários do movimento de aproximação, mas os próprios latino americanos . Ao contrário do pretendido por Bolívar, aos conflitos continentais seguem-se guerras civis, provocando a desintegração territorial de vários Estados. A Grande Colômbia é dividida em quatro Estados independentes; a América Central também se frag menta, e vários conflitos territoriais - Guerra do Paraguai e Méxi co/Estados Unidos - demonstram rapidamente os limites das tentativas de organização pan-americanas. Ainda assim, os Estados latino-americanos reúnem-se periodi camente para tratar de problemas comuns. O Congresso de Lima (1847-48) decide criar uma Confederação de Estados - jamais concreti zada - e define regras para o comércio e a navegação. Em 1856, a reunião acontece em Santiago do Chile e apesar da pouca repre sentatividade, pois tão-somente três países participam, é firmado um Tratado de Aliança Militar e de Assistência Recíproca. No mesmo ano, outros países aderem a esta proposta. Porém, a ausência de ratifica ção compromete sua aplicação. O Terceiro Congresso de Lima (1864-65) debate a contínua de sintegraçãocontinental que ameaça a América Latina. Suas resolu ções novamente sofrem pela ausência de ratificação. A fragilidade do processo de concertação aliada às dificuldades para a criação de vínculos confederais entre os países latino-americanos leva Simon Bolívar a convencer-se da inutilidade de seus esforços. Ele afirma que eles são tão eficazes quanto "arar no mar" . - 42 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce É digna de nota a oposição da monarquia brasileira à aproxima ção com as jovens repúblicas hispanoamericanas. Estas, progressiva mente engolfadas por problemas internos, dão-se as costas e abandonam os projetas de cooperação. Os Estados Unidos já haviam, em 1823, indicado de forma uni lateral as bases sobre as quais as relações da América Latina com o mundo deveriam ser concretizadas. Trata-se da Doutrina Monroe que, sob o manto dos interesses britânicos, pretende afastar as antigas metrópoles da América Latina. A contrapartida é representada pela intenção de Washington de não interferir nos assuntos europeus. Entre 1889 e 1890, reuniu-se em Washington, agora sob a con duta dos Estados Unidos, a Primeira Conferência Internacional dos Estados Americanos. A ampla e pretensiosa agenda pretendia definir um sistema permanente de arbitragem, além da diminuição e har monização das tarifas de importação por parte dos países latino americanos. Apesar de seu fracasso, a Conferência criou um escritório de divulgação de oportunidades comerciais para os países-membros. Além disso, instaurou-se, a partir desta reunião, uma regularidade na convocação das conferências que deveriam realizar-se a cada cin co anos. Os Estados Unidos tornaram-se elemento preponderante em todos os ajustamentos futuros na organização das relações interame ricanas. Na Conferência de Buenos Aires, em 1910, o Escritório Comer cial transforma-se na União Panamericana. Contudo, a eclosão da Primeira Guerra Mundial interrompeu a regularidade das reuniões. Após 1919, o Presidente dos Estados Unidos, Woodrow Wilson, pro pôs um pacto nas Américas semelhante àquele que cria a Liga das Nações. A proposta contemplava, entre outros elementos, uma pan americanização da Doutrina de Monroe e o princípio da segurança coletiva continental. Somente com o surgimento da Organização dos Estados Americanos (OEA), através da Carta de Bogotá em 1948, tais princípios serão aceitos. 2.4.4. As uniões técnicas e administrativas No início do século XIX, um certo número de Estados é conven cido de que, em razão da natureza dos interesses comuns que come çam a surgir, seria menos onerosa e mais prática a constituição de órgãos internacionais permanentes em vez de continuar reunindo - 43 - User Realce User Realce User Realce conferências diplomáticas de maneira pontual e descontínua, como haviam feito até então. Desta forma, surgiram as primeiras organizações internacionais para tratar de questões técnicas. Assim, já em 1815, foi criada uma comissão fluvial internacional para tratar da administração conjunta da navegação no Reno e, em 1856, criou-se a comissão do Danúbio. Na segunda metade do século XIX, em torno de questões admi nistrativas, foram criados instrumentos de cooperação. Assim, fun dam-se a União Telegráfica (1865), a União Postal Universal (1874), a União para a Proteção da Propriedade Intelectual (1883) e a União das Ferrovias (1890) . As condições de trabalho e de vida dos operários das manufa turas fez aparecer uma consciência social na Europa durante o século XIX. Em 1900, uma conferência diplomática, reunida em Paris, criou a Associação Internacional para a Proteção Legal dos Trabalhadores (AIPLT). Lançou-se, então, a semente da futura Organização Inter nacional do Trabalho (OIT), fundada em 1919. Os consistentes esforços das organizações técnicas e administra tivas identificaram-nas como as precursoras da solidariedade inter nacional . Como declarou o internacionalista francês Louis Renault, apesar de estes organismos serem ignorados pela opinião pública, eles "fizeram mais pela civilização e o entendimento entre os povos do que célebres diplomatas" . 2 .5 . CLASSIFICAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS O rápido crescimento, sobretudo após 1945, do número de or ganizações internacionais foi acompanhado por uma extraordinária variedade de modelos, formas, eficácia e propósitos. Como não po deria deixar de ser, os especialistas propuseram múltiplas técnicas e princípios para tentar colocar um mínimo de ordenamento e coerên cia em estudos que abordam o que parece ser inclassificável. Com o objetivo de tornar mais orgânica a exposição, ressaltando nela carac terísticas comuns das organizações internacionais, proceder-se-á a uma identificação de suas semelhanças e diferenças. O inventário classificatório das organizações internacionais obedece a certos princípios básicos . Assim, elas podem ser identifi cadas: a) pela natureza de seus propósitos, atividades e resultados; b) pelo tipo de funções que elas se atribuem; - 44 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce c) pelos poderes ou estrutura decisória que elas dispõem; d) pela composição, ou seja, trata-se de organismos compostos de forma universal e não discriminatória ou, ao contrário, existem prin cípios que colocam limites à participação dos Estados. 2.5.1. A classificação segundo a natureza A forma mais simples de identificar as organizações internacio nais implica o delineamento de dois propósitos distintos. Por um lado, as organizações que perseguem objetivos políticos e, por outro, as organizações que objetivam a cooperação técnica . As primeiras enfrentam questões essencialmente conflitiva , e as segundas traba lham com assuntos vinculados à cooperação funcional. As organizações internacionais de natureza política podem pre tender congregar a totalidade do mundo, como, por exemplo, a Liga das Nações ou a ONU, ou somente parte deste, caso da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da União Africana (UA) . Seu traço fundamental prende-se ao caráter político-diplomático de suas ativi dades. Seu objetivo primeiro é a manutenção da paz e da segurança internacionais de alcance universal ou regional. As organizações internacionais de natureza política exercem sua influência sobre questões vitais dos Estados-:vfembros, como por exemplo a soberania e a independência nacional. Sua forma de ação é essencialmente preventiva. Assim, para o Estado, o fato de ser integrante da entidade exige a observância de certas normas de con vívio internacional, que tendem a impedir a tomada de decisões militares externas ou mesmo de alguma decisões internas, por exemplo, na área dos direitos humanos, que Yenham a ferir os com promissos assumidos, sem a anuência prévia da organização inter nacional. As entidades podem agir de forma a reparar atos praticados pelos Estados-Membros que sejam considerados lesivos à sua carta constitutiva . Trata-se essencialmente de contrapor-se a agressões de um Estado-Membro contra outro. Em razão de seus objetivos, in cluem-se neste rol as organizações internacionais de caráter militar. As organ izações de cooperação técnica, denominadas também de organizações especializadas, descartam, em princípio, a interferência em assuntos de natureza política e restringem-se unicamente a apro ximar posições e tomar iniciativas conjuntas em áreas específicas. Estas são delineadas pela natureza dos problemas que só podem ser enfrentados com a ação do coletivo internacional. Trata-se, por - 45 - User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce User Realce
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