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GRACILIANO RAMOS

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Revista Graduando nº1 jul./dez. 2010 
 
G RAC I L I ANO RAMOS : O E SCR I TO R E O HOM EM 
 
E l i seu Fe r re i r a da S i l va 
G r a d u a n d o d o c u r s o d e L e t r a s V e r n á c u l a s ( U E F S ) 
z e u l i s o @ g m a i l . c o m ; z e u l i t e r a r i o @ h o t m a i l . c o m 
 
 
Resumo : A l i t e r a tu ra reg i ona l i s ta ou modern i smo de 30 teve seu 
auge com o adven to do romance no rdes t i no , carac t e r i zando -se 
po r ado tar uma v i são c r í t i ca das re l ações soc i a i s , vo l tada par a 
os p rob l emas do t r aba l hado r ru ra l , a seca e a m i sé r i a , r essa l -
tando o homem host i l i z ado pe l o amb i en te , pe la te r r a , pe l a c i da-
de , o homem consum ido pe los p rob l emas impostos pe l o me i o . 
Um dos au to res reve l ados nessa época , ex ím i o observado r 
ps i co l óg i co do homem, bem como da soc i edade , fo i G rac i l i ano 
Ramos que , mesmo sendo t r a t ado po r mu i tos c r í t i cos como um 
escr i to r amargo , rude , demonst r a o con t r á r i o , compa i xão , amor , 
am i zade ao nar rar os c ausos de A l exand re com mu i to bom -
humor . 
Pa l av ras - Chave : G rac i l i ano Ramos- A l exand re e ou t ros heró i s - 
Causos- So l i d ão -Fan tas i a 
 
Abstr ac t : Reg i ona l i s t L i te ra tu re o r 1930 ´s Modern i sm reached i ts 
apogee w i th the in t roduc t i on o f the No r theas te rn Nove l , adop t-
i ng a c r i t i ca l v i ew o f soc i a l r e l a t i onsh i ps , add ress i ng to the 
p rob l ems o f peasan ts , d raugh t , m i se ry and the i r s t rugg l e 
aga i ns t advers i t i es o f the env i r onmen t , o f l iv i ng in the coun t ry 
and o f l i v i ng i n the c i ty . One o f the au tho rs emerg i ng f rom tha t 
l i t e r a ry movemen t , an acu te observer o f man ´s psyche as we l l 
as o f soc i e ty , G rac i l i ano Ramos , a l though tak en by some cr i t i cs 
as a b i t t e r rude Wr i te r , when nar ra t i ng the s t o r i es o f A l exand re 
i n such a l i gh t mood , demonst ra te s the oppos i te : compass i on , 
l ove , f r i endsh i p . 
Keywords : Grac i l i ano Ramos- A l exand re and o the rs heroes - 
s to r i es- So l i tude-Fan t asy 
ISSN 2236-3335 
 
 
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I NTRODUÇÃO 
 
Segundo escr i tos da época (décadas de 1930 e 1940 ) , o 
romance , ma i s do que a poes i a e o con to , p redom inou na L i te -
ra tu ra Bras i l e i r a , enverendando -se p r i nc i pa lmen te pe l o reg i ona-
l i smo e pe l a abo rdagem ps i co l óg i ca . Os i n teg ran tes da segunda 
geração modern i s ta , ou modern i smo de 1930 , não chegaram a 
causar impac to , dado o re l evo soc i a l que a revo l ução oco r r i da 
em ou tub ro daque l e ano t i nha c ausado no pa í s . Os aba l os so-
f r i dos pe l o povo na década de 1930 – a c r i se econôm ica p ro-
vocada pe l a queb ra da bo l sa de va l o res de Nova Io rque , a c r i -
se cafee i r a , a Revo l ução de 1930 e o dec l ín i o no No rdes te – 
cond i c i onaram a l i t e r a tu ra a um novo es t i l o f i cc i ona l , pe rcep t i -
ve lmen te ma i s adu l to , ma i s amadu rec i do , ma i s moderno , que 
ser i a marc ado pe l a rus t i c i dade , po r uma l i nguagem ma i s b ras i -
l e i r a com en foque d i r e to nos fa tos , po r uma re tomada do p l ano 
na tu ra l i s t a , p r i nc i pa lmen te no p ropós i to de uma nar ra t i va docu-
men ta l . 
A f i cção de 1930 tem seu auge com o advento do roman-
ce no rdes t i no , que co r respondeu como nenhum ou t ro aos de-
se j os de l i b e rdade temá t i ca e r i go r es t i l í s t i co , carac te r i zando -se 
po r ado tar uma v i são c r í t i ca das re l ações soc i a i s , vo l tada par a 
os p rob l emas do t r aba l hado r ru ra l , para a seca e para a m i sé-
r i a , r essa l tando o homem host i l i z ado pe lo amb i en te , pe l a te r r a , 
pe l a c i dade , o homem consum ido pe los p rob l emas que o me i o 
l he impõe . 
 
GRAC IL IANO RAMOS: O HOMEM POR TRÁS DO ESCR ITOR 
 
O cr í t i co Á lvaro L ins , em seu Jo rna l de C r í t i ca ( 1 943 , p . 
73 ) , ao re l a ta r o ano l i t e r á r i o de 194 1 , d i sco r re sob re Grac i l i ano 
Ramos e o l ançamen to da segunda ed i ção de Angúst i a , comen-
tando que a ob ra rep resen ta um caso de es tudo c r í t i co mu i to 
d i f í c i l para aque l es do tempo de Ramos . E a f i rma : 
 
l o g o o s s eus romances no s t en tam a con f u nd i r , em 
a n á l i s es conve rg en t es , a s u a f i g u r a d e es c r i t o r e a s u a 
f i g u r a d e homem . E x i s t em homens que exp l i c am a s s u -
a s ob ra s , como há ob ra s que exp l i c am o s s eu s a u t o -
 
 
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r e s . N o ca s o do S r . G r a c i l i a n o R amos , é a o b r a q ue 
exp l i c a o homem . Que ro d i z e r : o h omem i n t e r i o r , o h o -
mem ps i co l ó g i co 
 
 De todos o s escr i to res no rdes t i nos que se reve l a ram 
po r vo l ta da década de 1930 , G rac i l i ano Ramos ta l vez tenha s i -
do o que soube exp r im i r , com ma i s su t i l eza , a d i f í c i l r ea l i d ade 
do homem no rdes t i no sem se de i xar seduz i r pe l o imag i noso da 
reg i ão , f azendo com que o ps i co l óg i co p reva l ecesse sob re o 
soc i a l . O que Grac i l i ano Ramos i nves t i ga é o homem v ivendo o 
d rama i r r ep roduz í ve l de seu des t i no , o homem un i ve rsa l . P ara 
An ton i o Cand i do ( 1996 , p . 9 ) , todo g rande escr i to r é do tado d e 
pe l o menos uma dessas t r ês p reocupações : ‚ o senso ps i co l óg i -
co , o senso soc i o l óg i co e o senso es té t i co . Na ob ra de Grac i l i -
ano Ramos esses t r ê s aspec tos se fundem, se con fundem e 
se comp l e tam , a l cançando raro equ i l í b r io ‛ . 
T ranscreve-se a segu i r uma car t a de Grac i l i ano Ramos 
endereçada a Mar i l i Ramos , po r opo r tun i dade de um con to que 
essa l he env i a ra - i n t i tu l ado Mar i ana - , na qua l se pode perce-
ber toda a persona l i d ade desse g rande escr i to r . 
 
R i o , 2 3 d e Novemb ro d e 1 9 4 9 . 
Ma r i l i : ma ndo - l h e a l g un s núme ro s do j o r n a l q u e pub l i c o u 
o s eu con t o . R e t a r d e i a p ub l i c a çã o : a nde i mu i t o o cupa -
do e es t i v e a l g u n s d i a s d e cama , a cabeça r eb en t ad a , 
s em pode r l e r . Q uando me l ev a n t e i , p ed i a R i c a rd o que 
d a t i l o g r a f a ss e a Ma r i a n a e d e i -a a o Á l v a ro L i n s . N ã o 
qu i s me t ê - l a n uma rev i s t a : e s t a s r ev i s t i n h a s va gabun -
d a s i n u t i l i z am um p r i n c i p i a n t e . Ma r i a n a s a i u n um s up l e -
men t o que a r ecomenda . V e j a a companh i a . H á u n s 
c re t i n o s , ma s h á su j e i t o s impo r t a n t es . A d i a n t e . A qu i em 
ca s a go s ta r am mu i t o d o con to , f o r am exces s i v o s , n ã o 
vou t ã o l o n ge . A che i o -o a p res en t á ve l , mas , em vez d e 
e l o g i á - l o , a cho me l h o r ex i b i r o s d e f e i t o s d e l e . J u l g o que 
você en t r o u num mau cam i n ho . E xpôs uma c r i a t u r a 
s imp l e s , q u e l a v a r o upae f a z r end a , com a s comp l i c a -
ções i n t e r i o r es d e men i n a h a b i t u a d a a o s romances e a o 
co l ég i o . A s ca boc l a s d a nos s a t e r r a s ã o me i o s e lv a -
g ens , q u a s e i n t e i r amen t e s e l v agens . Como pode você 
a d i v i n h a r o q ue s e p as s a na a lma d e l as ? Você n ã o 
b a t e b i l r o s n em l a v a r o upa . Só cons egu imos d e i t a r n o 
p a pe l o s n o s s os s en t imen t o s , a n o ss a v i d a . A r t e é 
s a ngue , é ca rn e . ( g r i f o n os s o ) A l ém d i s s o , n ão h á n a -
 
 
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da . A s nos s as p e r s ona gens s ã o p eda ços d e nó s mes -
mos , s ó podemos expo r o que s omos . E você n ão é 
Ma r i a n a , n ã o é d a c l a s s e d e l a . F i q u e n a s u a c l a ss e , 
a p res en t e - s e como é , n u a , s em ocu l t a r n a d a . A r t e é 
i s s o . A t écn i c a é n eces s á r i a , é c l a r o . Ma s s e l h e f a l t a r 
à t écn i c a s e j a a o menos s i n ce r a . D i g a o que é , mos t r e 
o que é . V ocê t em expe r i ê n c i a e es t á n a i d a d e d e co -
meça r . A l i t e r a t u r a é uma ho r r í v e l p r o f i s s ã o , em que s ó 
podemos p r i n c i p i a r t a r d e ; i n d i s p en sáve l mu i t a o b s e rva -
çã o . P r ecoc i d a d e em l i t e r a t u r a é imposs í v e l : i s t o n ão é 
mús i c a , n ã o t emos g ên i os d e d ez anos . V ocê t eve um 
co l ég i o , t r a b a l h o u , o b s e rvou , d eve t e r s e amo l a d o em 
exces s o . P o r q ue n ã o s e f i x a a í , n ã o t en t a um l i v r o 
s é r i o , o nde ponha a s s u as i l u s õ es e os s eu s d es enga -
nos ? Em Ma r i a n a você mos t r o u umas co i s i n h a s s ua s . 
Mas— r ep i t o—você n ã o é Ma r i a na . E - com o p e rd ã o d a 
p a l a v r a - es s a s m i j a d as cu r t a s n ã o a d i a n t am . R eve l e - s e 
t o d a . A s ua p e r s ona gem deve s e r você mesma . Adeus , 
q u e r i d a Ma r i l i . Mu i t o s a b r a ço s p a r a você G ra c i l i a n o . V o -
cê com ce r t ez a a ch a d i f í c i l l e r i s t o . E s t o u es c reve ndo 
s en t a do num banco , n o f u ndo d a l i v r a r i a , mu i t a g e n t e 
em redo r me ch a t ea ndo . ( RAMOS , 1 9 8 2 ) 
 
Pode-se no tar na car ta env i ada à i rmã que a r i g i dez , a 
s i sudez , o r i go r , ta l vez f ru tos da exper i ênc ia de onze meses 
como p reso po l í t i co , tenham mo l dado o homem Grac i l i ano Ra-
mos . Pe rcebe-se i sso na fo rma como e l e demonst ra as obser -
vações que sua i rmã dever i a fazer em respe i to ao con to : ‚ só 
consegu imos de i ta r no pape l os nossos sen t imen tos , a nossa 
v i da . Ar te é sangue , é carne ‛ ( gr i f os meus ) . Para Grac i l i ano , 
escrever não é qua l quer co i sa , é co l ocar a v i da no pape l , é 
t r aba l ho e tem que ser s i ncero . N ão bas ta te r só a técn i ca , es -
ta sem a s i ncer i dade não é nada . G rac i l i ano Ramos teve uma 
v i da ag i tada , passou po r exper i ênc i as que o marcaram p ro fun-
damen te , como a p r i são po r persegu i ção po l í t i ca e , para mu i tos , 
e l e e ra cons i de rado um homem amargo , pess im i s ta , f r anco , 
quase rude , e é essa du reza da a lma que se ten ta desm i s t i f i -
car em re l ação à ob ra A lexand re e ou t ros heró i s . 
Osman L i ns ( apud VASCONCELOS, 19 97 , p . 1 ) d i z que o l i -
vro A l exand re e ou t ros heró i s rep resen ta , den t ro da ob ra de 
Grac i l i ano Ramos , ‚uma espéc i e de pausa , de rec re i o , que se 
concede es te escr i to r severo , so f r i do , tão ex i gen te em re l ação 
 
 
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à fo rma e tão pene t r ado do sen t i do t r ág i co da ex i s tênc i a ‛ . O 
au to r de romances e memór i as como : Cae tés ; São Bernardo ; 
Angúst i a ; V i ven tes das A l agoas ; L i nhas to r tas ; V i das secas ; 
I n fânc i a ; I nsôn i a ; Memór i as do cárcere , en t re ou t r as ob ras , 
também escreveu para c r i anças , e seu l i v ro de con tos A l exan-
d re e ou t ros Heró i s , ou causos per tencen te s ao fo l c l o re no r -
des t i no , é cons i de rado po r mu i tos es tud i osos como secundár i o 
em sua ob ra . 
Desp rezado pe l o cânone l i t e r á r i o e pe l a pesqu i sa c r í t i co -
l i t e r á r i a , esses con tos p rec i sam de uma i nves t i gação que p ro-
cu re demonst ra r todo o seu po tenc i a l , a su a a tua l i d ade , a l ém 
de j ogar uma l uz sob re Grac i l i ano Ramos , o seu fazer l i t e r á r i o , 
suas nar ra t i v as e o bu r l esco que c i r cunda as h i s tó r i as fan t as i -
osas de A l exand re , a cu l tu ra popu l a r e o fo lc l o re no rdes t i no . O 
con to popu l a r é r i co em ens i namen tos e exper i ênc i as , que são 
passados de pessoa a pessoa , de geração a geração , de uma 
fo rma ag radáve l , p razerosa e não u t i l i t a r i s ta , a l ém de nos pos-
s i b i l i t a r compreender a v i da , o se r humano e respe i ta r as d i -
versas cu l tu ras p resen te s no mundo , e é i sso que nos faz A-
l exand re ao nar rar as suas h i s tó r i as . 
Segundo Vasconce l os ( 1997 . p . 5 ) : ‚O amor , fo rça capaz 
de romper a so l i d ão , e i n teg rar o homem na comunhão com o 
p róx imo , não fo i um e l emen to conhec ido pe los personagens do 
au to r de I n sôn i a ” . Af i rmação essa , sempre fe i ta pe l os es tud i o -
sos da ob ra de Grac i l i ano Ramos , que não encon t ra ressonân-
c i a na l e i tu ra de A l exandre e ou t ros heró i s . G rac i l i ano Ramos 
p reocupou -se mu i to em nar rar a par t i r de observações da rea-
l i d ade e dos o l hares de l e p róp r i o . Para Son i a Brayner ( 1978 ) , é 
famosa a a f i rmação de Grac i l i ano Ramos a re spe i to de uma es -
cr i ta pon tuada pe l o au tob i og rá f i co : ‚Nunca pude sa i r de m im 
mesmo . Só posso escrever o que sou . E se as personagens 
se compor tam de modos d i f e ren tes é po rque não sou um só ‛ . 
O l i v ro de Grac i l i ano Ramos , A l exand re e ou t ros heró i s , 
pub l i cado pe l a p r ime i r a vez em 1938 , nar ra as aven tu ras de A-
l exand re , um con tado r de h i s tó r i as que , ‚ fumando um c i gar ro 
de pa l ha mu i to g rande , d i sco r r i a sob re acon t ec imen tos da mo-
c i dade ‛ . São qua to rze h i s tó r i as nar radas po r e l e , a ma i o r i a re l a-
ta fe i tos que envo l vem suas capac i dades f í s i cas e i n te l ec tu a i s 
 
 
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ou sua re l ação com an ima i s e ob j e tos excepc i ona i s . As h i s tó -
r i as são con tadas em sua casa , na p resença de c i nco pesso-
as : sua esposa Cesár i a , o cego F i rm i no , o cu rande i r o mest re 
Gaudênc i o , o can tado r L i bó r io , a a f i l h ada de A l exand re e tam-
bém a benzede i r a Das Do res . As h i s tó r i as são amb i en tadas no 
no rdes te do pa í s , no me i o ru ra l , num tempo passado em que 
e l e e sua fam í l i a ‚v i v i a de g rande‛ e e ram es t imados pe l os po l í -
t i cos e vaque i r os da reg i ão . 
Esse passado con t ras ta com a rea l i d ade na qua l es tão as 
personagens no momen to das nar ra t i vas . A l exandre possu i 
‚uma casa pequena , me i a dúz i a de vacas no cu r ra l , um ch i -
que i r o de cab ras e roça de m i l ho na vazan te do r i o ‛ ( RAMOS, 
1997 , p . 9 ) . Um reco r te necessár i o para en tender as es tó r i a s 
de A l exand re e sua re l ação com o au to r G rac i l i ano Ramos são 
as men t i r a s , aque l as con tadas em nossos re l ac i onamen tos pes-
soa i s : de mar i dos às e sposas , empregados aos pa t rões , f i l h os 
aos pa i s , en t re am i gos e v i z i nhos e en t re compad res e coma-
d res , como é o caso de A l exandre . 
A p rá t i ca da men t i r a rep resen tada po r A l exand re , como j á 
d i to , são as chamadas ‚men t i r as de pescado r ‛ , con tadas com o 
ob j e t i vo de p render a a tenção da p l a té i a . Nessas men t i r as a 
veross im i l h ança não é pre tend i da e , no rma lmen te , e l as oco r rem 
em s i tuações em que não há aparen t emen te uma h i e rarqu i a en-
t re os seus ouv i n te s , e nem há no rmas soc i a i s sendo desres-
pe i tadas , p rovocando em nós o r i so , es te que é um e l emen to 
d i s tan te d a ob ra de Grac i l i ano Ramos . Segundo Vasconce l os 
( 1 997 , p . 6 ) , 
Pouca s vezes s e pode r i r d e s eu s es c r i t o s , e q u a ndo 
i s s o a con t ece , é o homem G ra c i l i a n o que s e vê expos -
t o a o r i d í c u l o , q u e s e rve d e ch a co t a p a r a q ue o s ou -
t r o s r i am de l e . Sa bemos que h á um t r a ço obs e rváve l , 
q u e s e r e i t e r a a o l o n go d e s u a ob ra , es s e t r a ço s e 
ch ama a ngús t i a . 
 
Todos nós conhecemos o Grac i l i ano Ramos observado r do 
homem e da soc i edade b ras i l e i r a ( o qua l não de i xa de dar uma 
cu tucada na soc i edade com esses causos ) , o c r í t i co l i t e r á r i o 
( v i de a car ta à i rmã Mar i l i ) , o G rac i l i ano que foge aos re l a tos 
pessoa i s e , segundo Vasconce l os ( 1997 , p . 9 ) , 
 
 
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do t es t emunho p a r a a p a rece r me i o d es po j ad o , eng raça -
do , i n v e ro s s ím i l , ‘m en t i r o s o ’ n a s h i s t ó r i a s con t a d as n ã o 
pa ra r eve l a r s eu l a d o s i s u do , p es s im is t a , b i o g r á f i c o , 
ma s p a r a d i v e r t i r . A ve r t en t e d o a u t o r q u as e d esco -
nhec i d a q ue d e i x a d e l a d o a ob s e rva çã o con t í n u a d a 
r e a l i d a d e e do ‘ h omem sub t e r r â n eo , ’ [ a f r a s e u t i l i z a d a 
pe l o a u t o r An t o n i o Cand i d o e que a p a rece no p ró p r i o 
a r t i g o é B i ch o s do s ub t e r r â n eo ] p a r a d e i x a r v i r a to n a 
o r i s o , a g a rg a l h a da so l t a , as h i s t ó r i a s ( i m ) p o s s í v e i s d e 
A l ex a nd re . 
 
As personagens desse l i v ro são pessoas que acred i tam 
em um fu tu ro me l ho r , mas também são pessoas marc adas , so-
f r i d as , e que j á t i ve ram bons tempos , como con ta A l exand re na 
h i s tó r i a de quando vo l tava d a casa de seu sog ro a c ava l o , 
com os ar re i os (Cesár i a d i z que fo ram o s de ou ro , e A l exand re 
i n te rvém d i zendo que fo ram os de p ra ta ) de p ra ta e fo i p i cado 
po r uma cob ra cascave l de do i s me tros e me i o , o cego F i rm i no 
descon f i ou do tamanho , mas se deu po r ven c i do quando Cesá-
r i a fo i buscar seu gu i so . Como e l a não o encon t rou , F i rm i no 
ace i tou apenas seu te s temunho como p rova . Na verdade , a co-
b ra mordeu o es t r i bo , que e ra de p ra ta , e depo i s de a l guns 
d i as , quando A l exand re qu i s mon tar com a mesma se l a , seu 
empregado d i sse que não consegu i a re t i r á - l a do chão , po i s es-
tava p resa . A l exand re fo i a té o l oca l e encon t rou o es t r i bo i n -
chado , vazando p ra ta . O que acon teceu fo i que a cob ra p i cou 
o es t r i bo e e l e i nchou dev ido ao veneno . A l exand re ganhou 
mu i to d i nhe i r o vendendo p ra ta a t é o veneno f i car ve l ho e per -
der seu e fe i to . Ve j amos como se deu o causo : 
 
[ . . . ] um mês d epo i s , com a f o r ça d a l u a o es t r i b o i n c h a -
va como i n ch am t o d a s a s mo rd edu ra s d e cob ra s . 
E r a p o r i s s o que e l e es t a va t ã o c r es c i d o e t ã o p esado . 
Mande i ch ama r um mes t r e n a r u a e , com ma r t e l o e es -
cop ro , r e t i r amos do es t r i b o , c i n co a r r o b a s d e p r a t a , 
a n t es que o me t a l d es i n cha s s e . I s t o s e r ep e t i u d u r an t e 
a l g u n s anos : t od o s os meses o es t r i b o i n ch ava , i n ch a -
va , e , con f o rme a f o r ça d a l u a , eu t i r a v a d e l e t r ê s , 
q u a t r o , c i n co a r r o b a s d e p r a t a . 
Seu L i b ó r i o ca n t a do r , mes t r e Gaudênc i o cu r a nde i r o , o 
cego p re t o F i rm i n o e Da s Do res l ev a n t a r am -s e a dm i r a -
d o s . 
 
 
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—O s enho r d eve t e r g anho uma fo r t u n a , s eu A l ex a nd re , 
ex c l amou o ca n t ado r . 
—Um pouco , s eu L i b ó r i o , s emp re a r r a n j e i a l g um d i n h e i r o 
g r a ça s a Deus . ( RAMOS , 2006 , p . 4 9 ) 
 
G rac i l i ano Ramos es t reou como romanc i s t a em 1933 , com 
Cae tés , uma nar ra t i va da v i da p rov i nc i ana de Pa lme i r a dos Ín -
d i os , um exerc í c i o de técn i ca l i t e r á r i a com ca rac te r í s t i cas na tu-
ra l i s ta s , como sever amen te o au to r reconhec i a . O segundo ro-
mance , São Bernardo ( 1 934 ) , é verdade i r a ob ra -p r ima da l i t e r a -
tu ra b ras i l e i r a . Nessa ob ra , G rac i l i ano ap resen ta uma no táve l 
evo l ução de técn i ca e de es t i l o e um s i gn i f i ca t i vo ap ro funda-
men to na aná l i se ps i co l óg i ca das personagens , em que o resu l -
tado é a c r i aç ão de Pau l o Honó r i o , um dos ma i s marc an te s 
personagens da l i t e r a tu ra b ras i l e i r a . Da í segu i u Angúst i a ( 1936 ) , 
em que o romanc i s ta acen tua a p reocupação ps i co l óg i ca , se r -
v i ndo-se de avançados recu rsos exp ress i vos . 
Só para f i carmos nes tes t r ês exemp l os , em Caé tes , São 
Bernardo e Angust i a , encon t ramos personag ens com su as v i -
das secas ( gr i f o meu ) desan imadas , embr u tec i das , so f r i das , 
des t ru í das , que serv i r am de i nsp i r ação p ara o a to de con t ar , a 
exemp l o de João Va l é r i o e seu amor po r Lu i sa , e os Cae té s . 
Nes te l i v ro , segundo V i ana ( 198 1 , p . 14 ) , 
 
O uso d e a d j e t i v o s , cu i d a do s amen t e s e l e c i o n a dos , r e -
s u l t a numa com i c i d a d e r a r a em G ra c i l i a n o R amos . T a l -
v ez n ã o s e j a ex a ge ro ima g i n a r q ue e l e , t ã o ex i g en t e e 
t ã o econôm i co com a s pa l a v r a s , d eve t e r s e d i v e r t i d o 
us a ndo , n uma ún i c a p á g i n a , a d j e t i v o s como ‘ i n g en t e , 
i n f a u s t a , s umos , impud i co s , l i b i d i n o s o s , i n g r a t o , a p ra z í -
ve l [ . . . ] e s ub s t a n t i v o s como ‘ i n f o r t ú n i o , b r i o , ce l e r a do , 
aman t e , ma t r o n a , u rb e [ . . . ] . 
O ex a ge ro p ro pos i t a l pa r ece i n d i c a r d i st a n c i amen t o q ue 
d eve t e r , d a r ea l i d a d e , o i n d i v í d u o que p r a t i c a um a t o 
d es s a n a t u r ez a . É o r i d í c u l o d a s i t u a çã o a p a recendo , 
n a mesma p ro po rçã o , n o r i d í c u l o d a l i n g u a gem 
 
Já em São Bernardo tem-se a exp l o ração ps i co l óg i ca de 
Pau l o Honór i o – que perm i te conhecer o p rocesso v i v i do pe l a 
personagem de tomada de consc i ênc i a sob re s i mesma e sob re 
o mundo que c r i ou , e i sso não se dá i so l adamen te , mas é am-
 
 
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parado pe l o en foque po l í t i co -soc i o lóg i co do au to r . G rac i l i ano 
Ramos se p ropõe , no romance , a con tar a v ida de Pau l o Honó-
r i o de gu i a de cego a p rop r i e tá r i o da fazenda São Bernardo , 
v i da du ra , v i da ag res te . Já em Lu í s da S i l va , em Os Cae tés , há 
a sondagem do mundo i n te r i o r do ser humano , que se rea l i z a 
p l enamen te no romance . Lu í s da S i l va é um func i onár i o púb l i co 
e escr i to r f rus t r ado , que v i ve pob remen te , é i ncapaz de sa i r da 
med i oc r i dade em que v i ve e sen te ra i va de todos à su a vo l ta , 
p r i nc i pa lmen te de Ju l i o Tavares , um homem r i co e i r r esponsáve l 
que seduz sua no i va e depo i s a abandona . E o romance An-
gús t i a , cons t ru í do com l ongos monó l ogos , de modo comp l exo , é 
uma das ma i s s i gn i f i ca t i vas ob ras de aná l i se ps i co l óg i ca do mo-
dern i smo . 
Os personagens ac ima descr i tos buscam, n o tec i do que 
nar ra as suas h i s tó r i as , o conhec imen to pessoa l de l es p róp r i os , 
do mundo e dos mecan i smos que fazem movê - l o . São pad rões 
soc i a i s , op resso res e po l í t i cos que , po r te rem s i do v í t imas , fo -
ram i ncapazes de se mos t ra rem, de se ab r i r em para o mundo , 
como fo ram capazes os personagens de A l exand re e ou t ros 
heró i s . Po r i sso , es ta ob ra se to rna ímpar den t ro da p rodução 
de Grac i l i ano Ramos , po r te r s i do aque l a que ab r i u as po r ta s 
para a poss i b i l i d ade de voar nas asas da f an tas i a , amp l i a r os 
ho r i zon tes de sonhos poss í ve i s a t r avés de h i s tó r i as e sonhar , 
mesmo quando não res tava nada a esses p ersonagens , a não 
ser o funes to mundo daque l es que hab i tam o No rdes te e gas -
tam suas v i das esperando po r me l ho r i as po l í t i cas , soc i a i s e hu-
manas . Po r i sso , op tam po r devanear , evad i r em , encan tarem -
se , mar av i l h a rem-se po r um tempo em que ‚a v i da fo i v i v i da 
c om mu i t a s p o s s e s , t e mp o d e f a r t u r a e b o n a n -
ça‛ (VASCONCELOS, 1997 , p . 1 1 ) . 
Os causos v i venc i ados po r A l exand re na moc i dade , ‚um 
homem che i o de conversas , me i o caçado r e me i o vaque i -
ro ‛ ( RAMOS, 2006 , p . 1 1 ) , homem de posses m i údas , e ram 
‘ad i v i nhados ’ pe l a esposa Cesár i a . Sen tado no banco do a l pen-
d re com seu o l har to r to , sen ta -se uma p l a té i a i l u s t r í ss ima : seu 
L i bó r i o , can tado r de embo l adas ; mes t re Gaudênc i o , cu rande i r o ; 
F i rm i no , cego p re to e a a f i l h ada de Cesár i a e benzede i r a de 
mau o l hado , Das Do res . O púb l i co é l im i tado , ass im como são 
 
 
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l i m i tadas as posses dos ouv i n tes . 
Nas h i s tó r i a s que A l exand re con ta , sempre comp l emen ta-
das pe l a esposa Cesár i a quando a ‚memór i a fa l ha ‛ , não temos 
um o l har vo l tado para a veross im i l h ança dos fa tos , para a rea-
l i d ade como e l a se ap resen ta , i s to é , os personagens es tão en-
vo l v i dos num mundo rea l , de m i sé r i a to ta l , a f as t ados do conv í -
v i o da c idade e do mundo cap i ta l i s ta e p rodut i vo , não têm pos-
ses ma te r i a i s , o quere r , o te r e o possu i r . Para Vasconce l os 
( 1 997 , p . 1 1 - 1 2 ) , 
 
Desp rov i d o s d e r ecu rs o s , f i n ca dos no s e r t ã o no rd es t i -
n o , n uma penú r i a t o t a l , e s s e g ru po exc l u í d o , nã o ob s -
t a n t e e l e g e r á uma ou t r a f o rma de i n s e rçã o , d e con ta t o 
com o mundo : conv i v e r e s upo r t á - l o p e l o p ode r d a i -
mag i n a çã o , p e l o a to d e con t a r 
 
As h is tó r i a s de A lexandre func ionam como uma espé-
c ie de ‚ recre io ‛ , num mundo encan tado onde , por te r usa-
do tão aber tamen te sua imag inação e de seu poder de 
fan tas ia , po r não te r tes temunhado a rea l i dade e a v ivênc ia 
humana - ta l como aparecem em mu i tas das suas obras , 
a t ravés dos seus personagens - , o au to r de Memór ias do 
cárcere se to rna ou tro , d i fe ren te , sendo o própr io , mas re-
ve lando-se mú l t i p l o . As h is tó r i as que A lexandre con ta es-
tão à margem, são d i fe ren tes das h is tó r i a s t r i s te s e amar-
gas con tadas pe lo men ino Grac i l i ano em I n fânc i a . Com aque-
l as , poucas pessoas se i den t i f i ca rão e raros são os seus l e i to -
res . 
Sa i ndo das nar ra t i v as de ou t ros escr i tos , em que se ev i -
denc i a um au to - re t r a to , um tes temunho de s i mesmo , ma i s às 
vezes dos homens , e das re l ações soc i a i s que os op r imem e 
marcam a conv i vênc i a humana , A l exand re e ou t ros heró i s é um 
l i v ro que amen i za o sen t i do t r ág i co da ex i s tênc i a , que perpas-
sou v i da/ob ra de Grac i l i ano Ramos . Compostas po r qua to rze 
h i s tó r i as f i cc i ona i s , as nar r a t i vas de A l exand re têm em comum 
a i nveross im i l h ança , o d i s tanc i amen to do rea l , embora se j am 
ca l çadas ne l e e em um n í ve l de m i sé r i a só v i s to em V i das se-
cas . “O que d i f e renc i a é a busca do sonho , do dese j o , da von-
 
 
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tade de se l i b e r ta rem desse mundo que esse g rupo de v i ven-
tes es tá a p rocu rar . ‛ (VASCONCELOS, 1 997 , p . 14 ) . 
A chamada para a v i agem a esse mundo fan tas i oso , ima -
g i na t i vo , aparece no i n í c i o do l i v ro , an tes a t é da ap resen t ação 
de A l exand re e Cesár i a : ‚ as h i s tó r i as de A l exand re não são 
o r i g i na i s : pe r tencem ao fo l c l o re do No rdes te , e é poss í ve l que 
a l gumas tenham s i do escr i tas ‛ . A par t i r da í , desse av i so , não 
p rop r i amen te no l i v ro , pe rcebe -se sua impo r tânc i a , v i s to o nar -
rado r fa l a r que ago ra a imag i nação e a o ra l i d ade en t r a rão em 
cena . É o conv í v i o imag i na t i vo , com o mundo rea l , que faz res-
su rg i r ma i s um escr i to de Grac i l i ano Ramos , e sem a e scr i t a 
enquan to angús t i a , l abu ta , como d i sse Á lvaro L i ns . Nas H i s tó -
r i as de A l exandre , temos apenas cau sos con tados pe l o au to r/
nar rado r a seus heró i s/ouv i n tes , num esfo rço de A l exandre de 
reco rdar o passado , g rand i oso , aven tu re i r o , exper imen tado po r 
e l e , em que e l e ‚ só d i z o que acon teceu ‛ , e va i r e fe rendar a 
veross im i l h ança na pa l avra e scr i ta , ‚ é poss í ve l , que a l gumas 
tenham s i do escr i ta s ‛ . 
 
O AMOR E A CUMPL IC IDADE ENTRE ALEXANDRE E CESÁR IA 
 
D i ve rsos c r í t i cos têm apon tado como uma das qua l i d adesde Grac i l i ano a marca p ro funda e p resen te da so l i d ão . S i na l e s-
te que o au to r fez ques tão de pon tuar em seus personagens . 
A té mesmo a so l i d ão de V i das secas , que j á se to rnara v i s í ve l 
a i nda na es t ru tu raç ão do romance , ou se j a , dos cap í tu l os e 
personagens p roduz idos separadamen te e em tempos d i f e ren-
tes . Para Ne l l y Novaes Coe l ho ( apud VASCONCELOS, 19 97 , p . 
40 ) , a so l i d ão e a i ncompreens i b i l i d ade p resen tes nas persona-
gens g rac i l i anas advêm , segundo a c r í t i ca , po rque Grac i l i ano 
Ramos ‚não acred i t ava na ún i ca fo rça que pode a j udar o ho-
mem a romper a So l i d ão e a i n teg rá - l o na comunhão com o 
p róx imo . G rac i l i ano não dev i a ac red i ta r na poss i b i l i d ade de o 
amor ex i s t i r . ‛ 
A l ém desse pon to descr i to pe l a escr i to ra há ou t ros que 
fo rmam uma espéc i e de bar re i r a en t re a ob ra sup rac i tada e as 
ou t r as ob ras de Grac i l i ano , como : a h i e rarqu ização cu l tu ra l , so-
c i a l ( os que têm e os que nada têm ; os que possuem a cu l tu ra 
 
 
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do saber , l i t e r á r i a , e o s que têm a cu l tu ra o ra l , f a l ada ; o pa t r i -
a rcado e , do ou t ro l ado , a massa anôn ima ; o mundo adu l to e o 
mundo da c r i ança e todos os empec i lhos ao amor f r a te rna l , r e-
fe rendado po r duas esfe ras soc i a i s : a i g re j a e a esco l a ) . 
 
CONCLUSÃO 
 
No mundo c i v i l i z ado , o rgan i zado , u rbano , so l i tá r i o e ego í s-
ta , A l exand re e rgue ou t ro mundo , no qua l todos se conhecem, 
todos se respe i tam e se cumpr imen tam numa co rd i a l i d ade ím-
par . A d i s tânc i a , a mudez , a i nd i f e rença são e l emen tos desco-
nhec i dos dessas pessoas que se reúnem numa comunhão , to -
dos os dom ingos , como numa m i s sa , para ouv i r em a pa l avra 
sag rada , a de A l exand re , a qua l é um evange l ho para seu L i -
bó r i o Can tado r . A pa l avra é po r ta de acesso à comunhão , à 
am i zade , a esse amor ma i s s i ncero – ‚ esse c asa l adm i r áve l não 
b r i gava , não d i scu t i a . A l exand re es tava sempre de aco rdo com 
Cesár i a , Cesár i a es tava sempre de aco rdo com A l exan-
d re ‛ ( RAMOS, 2006 , p . 1 1 ) . 
 
 
REFERÊNC IAS 
 
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se . São Pau l o : C i a Ed . Nac i ona l , 1 964 . p . 96 - 1 1 8 . 
 
CAND IDO , An ton i o . G rac i l i ano Ramos . 4 . ed . R io de Jane i r o : Ag i r , 
1996 . ( Nossos C l áss i cos ) 
 
L INS , Á l varo . Jo rna l de Cr í t i ca , 2ª sé r i e . R i o de Jane i ro : José 
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RAMOS, G rac i l i ano . A l exand re e ou t ros heró i s . 49 . ed . R i o de 
Jane i r o : C i v i l i z ação Bras i l e i r a , 2006 . 
 
 
 
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J 
Revista Graduando nº1 jul./dez. 2010 
RAMOS, G rac i l i ano . Se l eção de tex tos , no tas , es tudos b i og rá f i -
co , h i s tó r i co e c r í t i co e exerc í c i os po r V iv i na de Ass i s V i ana . 
São Pau l o : Ab r i l Educação , 198 1 . (Co l eção L i te ra tu ra Comen t ada ) 
 
RAMOS, G rac i l i ano . Car tas . R i o de Jane i r o : Reco rd , 1982 . 
 
VASCONCELOS, F ranc i sco Fáb i o P i nhe i ro de . Ho ra do rec re i o : o 
mundo encan tado de A l exand re e ( seus ) ou t ros heró i s . 1 997 . 
1 20 p . D i sse r t ação (Mest r ado em Le t ras e L i ngu í s t i ca ) – Ins t i tu t o 
de Le t r as , Un i ve rs i dade Federa l da Bah i a , Sa l vado r . 
 
NOTAS 
 
1 Há um desconhec imen to to ta l des ta ob ra , t an to po r par te dos 
l e i to res de Grac i l i ano , bem como , pe l os es tudan tes dos cu rsos 
de l e t r as . I s to pode ser ver i f i cado ped indo -se aos re fe r i dos 
l e i to res uma l i s ta dos l i v ros j á l i dos do a l ud i do escr i to r , e 
perceber -se-á a sup ressão desse l i v ro . Po r par te dos c r í t i cos , 
poucos são os ar t i gos conhec i dos en t re nós sob re esse l i v ro . 
A ausênc i a de re fe rênc i as é quase to ta l . R i cardo Ramos no seu 
l i v ro Grac i l i ano : r e t r a to f r agmen tado , nos d i z : " ao escreve r 
H i s tó r i as de A l exand re , mu i to a sua mane i r a , f i cava repe t i ndo 
que e ra um l i v ro meno r [ ass im como também d i z i a sob re a 
permanênc i a de sua ob ra , ‘ Não va l e nada , a r i go r , j á 
desapareceu ’ ] ; s imp l es ap rove i tamen to de temas fo l c l ó r i cos , 
i n s i gn i f i can tes . De tan to ouv i r aqu i lo , o inadver t i do Auré l i o 
Buarque um d i a conco rdou : ‘ F r ancamen te , homem, n ão se 
compara mesmo , aos seus romances ’ . Fo i o su f i c i en te . Sempre 
que se re fe r i a a A l exand re , e l e ac rescen tava : – Auré l i o não 
gosta ‛ . 
 
2 H i s tó r i as de A l exandre , em que se ressa l ta o tema da ma l an-
d ragem, em versão sa t í r i ca , popu l a r e no rdest i na , j á fo i assoc i -
ada , e r roneamen te , à f i gu ra de Ge tu l i o Vargas , o p res i den te 
ma l and ro . Essa assoc i aç ão se deve à ten ta t i v a de a l guns ensa-
í s ta s de ap rox imar o escr i to r com o e s t ado Novo . R i cardo Ra-
mos , f i l h o do escr i to r , ass im se pos i c i ona sob re essa ap rox ima-
ção : "como exp l i ca r que a f i gu ra de A l exand re , em todos os 
 
 
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seus t r aços carac te r í s t i cos , se man tenha v i va a té ho j e no 
te l ev i s i onado p rog rama de humor i s ta famoso? [ Re fe re -se R i -
cardo ao p rog rama de Ch i co An í s io , e ao personagem Pan ta-
l eão ] Pe l a sua verdade fo l c l ó r i ca , ou pe l a evocação de um 
Ge tú l i o há tan to desaparec i do? Conven i en temen te , e squecem 
de menc i onar as ob ras V i das Secas , I n fânc i a , ou A te r ra dos 
men i nos pe l ados , escr i tas no per íodo . I n : RAMOS, R i cardo . 
GRAC IL IANO : re t r a to f r agmen tado . São Pau l o : S i c i l i ano , 1992 , p . 
218 -2 19 . Ta l vez essa assoc i ação i n fundada se deva ao fa to 
de te r G rac i l i ano Ramos co l abo rado na Rev i s ta Cu l tu ra po l í t i ca , 
te r s i do i nspe to r de ens i no e também te r escr i to a l gumas 
crôn i cas e con tos na rev i s ta l uso -b ras i l e i r a A t l ân t i co , r ev i s t a 
subo rd i nada ao Depar tamen to de Imprensa e P ropaganda do 
Es tado Novo . Para nós essa ten ta t i va de l i ga r o escr i to r ao 
Es tado Novo a l ém de i n fe l i z é puer i l , um g rande desrespe i to à 
f i gu ra do mest re do escr i to r que cer t a vez d i sse : " se não me 
censu rarem , púb l i co a té no D i á r i o O f i c i a l " . 
 
3 RAMOS, G rac i l i ano . A lexand re e ou t ros heró i s . 49 . ed . R i o 
de Jane i r o : Reco rd , 2006 – Ep í g ra fe .

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