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Resumo
Os reflexos originados nos pressorreceptores arteriais
e nos receptores de estiramento da região cardiopulmonar
são os principais mecanismos de controle efetivo da
pressão arterial a curto prazo. O reflexo pressorreceptor
é considerado um sistema de controle de alto ganho que
mantém a pressão arterial dentro de limites normais em
períodos de segundos a minutos. Assim como o diagnóstico
e tratamento da hipertensão arterial focado no nível basal
da pressão sanguínea determina grande redução da
morbi-mortalidade da população, a variabilidade momento
a momento da pressão arterial por si, cujo controle é
função do barorreflexo, é também de importante
significado clínico. Estudos clínicos têm mostrado, por
Palavras-chave: Controle pressão arterial; Barorreflexo; Quimiorreflexo.
Recebido: 26/9/00 – Aceito: 14/11/00 Rev Bras Hipertens 8: 30-40, 2001
Correspondência:
Departamento de Fisiologia e Biofísica
Av. Antonio Carlos, 6627 – ICB – UFMG – 31270-901 – Belo Horizonte, MG, Brasil
Fone: (0XX31) 3499-2951/2934 – FAX: (0XX31) 3499-2924
E-mail: mjcs@icb.ufmg.br – haibara@icb.ufmg.br
exemplo, que uma reduzida sensibilidade do barorreflexo
está associada com a morte súbita que se segue ao
infarto agudo do miocárdio. Uma série de outros reflexos
participam na regulação da pressão sanguínea em animais
e indivíduos normotensos, como, por exemplo, os re-
flexos originados em metaborreceptores musculares, reflexos
originados na área trigeminal e quimiorreflexo. Alterações
no funcionamento desses reflexos na hipertensão não têm
sido exploradas de forma sistemática, com exceção ao
quimiorreflexo, originado por receptores arteriais ativados
por hipóxia, hipercapnia, acidose e isquemia. No presente
artigo pretendemos discutir as alterações dos reflexos
cardiovasculares na hipertensão arterial, enfocando os
distúrbios no funcionamento do barorreflexo e quimior-
reflexo.
Reflexos cardiovasculares
e hipertensão arterial
Maria José Campagnole-Santos, Andréa Siqueira Haibara
Introdução
A regulação da pressão arterial é
uma das funções fisiológicas mais
complexas, que depende de ações
integradas dos sistemas cardiovas-
cular, renal, neural e endócrino. A
hipertensão arterial é uma desordem
do nível médio onde a pressão arterial
é regulada, e, embora tenha enorme
importância clínica porque cronica-
mente a pressão elevada acarreta da-
nos ao coração, vasos sanguíneos e
rins, pelo menos nos estágios iniciais a
hipertensão não causa alterações
evidentes na função cardiovascular.
A maioria das alterações cardio-
vasculares provocadas pela hiperten-
Campagnole-Santos MJ, Haibara AS Rev Bras Hipertens vol 8(1): janeiro/março de 2001
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são é desencadeada por mecanismos
compensatórios provocados direta-
mente pela pressão alta, como a hiper-
trofia ventricular e vascular, ou indire-
tamente, devido ao dano vascular cau-
sado, ou seja, aterosclerose e nefroes-
clerose. A investigação da fisiopato-
logia da hipertensão arterial portanto
significa entender os mecanismos de
controle da pressão arterial normal e
procurar as alterações sutis que pre-
cedem o aumento da pressão para os
níveis de hipertensão. Esses conhe-
cimentos são o substrato essencial
para o desenvolvimento de estratégias
terapêuticas mais eficientes, visando
um controle mais homogêneo da pres-
são arterial em períodos de 24 horas.
A regulação efetiva da pressão
arterial é o resultado da atividade de
sistemas de retroalimentação que
operam a curto e a longo prazo1,2. O
principal mecanismo de controle a
curto prazo é desempenhado pelos
reflexos que são originados nos pres-
sorreceptores arteriais e nos receptores
de estiramento da região cardiopul-
monar. Assim como o diagnóstico e
tratamento da hipertensão arterial fo-
cados no nível basal da pressão san-
guínea determinam grande redução
da morbidade e mortalidade da popu-
lação, a variabilidade momento a mo-
mento da pressão arterial por si, cujo
controle é função do barorreflexo, é
também de importante significado clí-
nico. A redução da sensibilidade do
barorreflexo, por exemplo, é um fator
de risco independente para a morte
súbita que se segue ao infarto agudo do
miocárdio3 e pela morbidade periope-
ratória de diabéticos em decorrência
principalmente de disfunção do
sistema nervoso autônomo4. Uma sé-
rie de outros reflexos participam na
regulação da pressão sanguínea em
animais e indivíduos normotensos, co-
mo, por exemplo, os reflexos originados
em metaborreceptores musculares,
reflexos originados na área trigeminal,
quiiorreflexo, etc. Alterações no fun-
cionamento desses reflexos na hiper-
tensão não têm sido exploradas de
forma sistemática, com exceção ao
quimiorreflexo, originado por recepto-
res arteriais ativados por hipóxia, hiper-
capnia, acidose e isquemia. Por exem-
plo, o aumento da atividade simpática
induzida pela redução de oxigênio e
aumento de dióxido de carbono no
sangue arterial é maior em indivíduos
com hipertensão borderline do que
em indivíduos normotensos5. No pre-
sente artigo pretendemos discutir as
alterações dos reflexos cardiovascula-
res na hipertensão arterial, enfocando
os distúrbios no funcionamento do
barorreflexo e quimiorreflexo.
Barorreflexo e
hipertensão arterial
O papel dos pressorreceptores na
patogênese da hipertensão arterial tem
sido sugerido desde os trabalhos
fundamentais de Hering, 1927,
Heymans e Bouckaert, 1930, e Koch
e Mies, 19296, que descreveram um
aumento súbito da pressão arterial
após a desnervação de áreas sino-
aórticas. Inicialmente se discutia a
possibilidade de que a hipertensão
arterial fosse acompanhada pela inter-
rupção parcial ou total do funciona-
mento dos pressorreceptores arteriais.
Entretanto os estudos de Goldblatt et
al.7 mostraram que em cães com
hipertensão renovascular a função
barorreflexa estava normal, apenas
deslocada para um nível mais alto de
pressão arterial. Evidências diretas
de que ocorria adaptação dos pressor-
receptores do seio carotídeo foram
obtidas por McCubbin et al.8 através
de estudos de eletroneuronografia em
cães com hipertensão renal crônica.
Esse estudo mostrou claramente que
tanto o limiar como a faixa de resposta
do pressorreceptor estavam desloca-
dos para o nível de hipertensão, de
forma que o reflexo pressorreceptor
estava funcionando no sentido de man-
ter, em vez de reduzir os níveis pressó-
ricos. Estudos posteriores de Krieger
et al.9,10 mostraram a evolução tem-
poral da adaptação dos pressorrecepto-
res em ratos submetidos a diferentes
modelos de hipertensão arterial. Hoje
está bem estabelecido que o barorre-
flexo se adapta (resetting) tanto nas
formas de hipertensão experimental
como clínica. Dentro de 5 a 15 minutos
de uma alteração mantida de pressão
arterial, pressorreceptores e barorre-
flexo desviam seu limiar aproximada-
mente 15% a 40% em direção à alte-
ração de pressão. Em 48 horas, a adapta-
ção é relativamente completa, e o barorre-
flexo defende ativamente o novo nível
de pressão. Além do desvio do limiar da
PA basal para provocar bradicardia em
direção a níveis mais elevados (adapta-
ção), ocorre uma significativa atenuação
no ganho do reflexo, tanto em animais
quanto em pacientes com hipertensão
primária ou secundária11.
O reflexo pressorreceptor é consi-
derado um sistema de controle de alto
que mantém a pressão arterial dentro
de limites normais em períodos de
segundos a minutos. A rapidez desse
sistema regulatório é obtida através
de um sistema de retro-alimentação
pelo sistema nervoso autônomo1. Nos
homens, da mesma forma que nos
outros mamíferos, as terminações
sensoriais da maioria das fibras baror-
receptoras estão localizadas em
segmentos da árvore arterial, que apre-
sentam as mais altas propriedades elás-
ticas, ou seja, arco aórtico, seio carotídeo
e artéria subclávia direita. Os terminais
barorreceptores nãosão estimulados
pela pressão por si, são mecanor-
receptores que respondem às altera-
ções de estiramento da parede arterial
causadas pelas alterações de pressão
dentro do vaso1,2. Os barorreceptores
cardiopulmonares também são meca-
norreceptores e, de modo geral, partici-
pam do controle da pressão arterial
qualitativamente de forma semelhante
Campagnole-Santos MJ, Haibara AS Rev Bras Hipertens vol 8(1): janeiro/março de 2001
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aos barorreceptores arteriais. No en-
tanto, por serem menos homogêneos
e se situarem principalmente dentro
de um sistema de baixa pressão, a sua
estimulação se faz muito mais por
expansão de volume sanguíneo do que
por alterações de pressão11.
Graças ao desenvolvimento de
técnicas anatômicas mais sensíveis
utilizando novos traçadores químicos
e histoquímica foi possível se
determinar com maior precisão a loca-
lização das terminações nervosas das
fibras aferentes no SNC12. A figura 1
apresenta um diagrama esquemati-
zando as vias aferentes, principais
áreas de integração bulbar e vias efe-
rentes do reflexo pressorreceptor ar-
terial2. De uma forma simplificada, as
fibras dos nervos aórticos e carotídeos
que trafegam através dos nervos glos-
sofaríngeo e vago convergem para a
região do núcleo do trato solitário
(NTS), considerado então a primeira
estação central dos sinais sensoriais
originados do sistema periférico. A
partir do NTS, neurônios de segunda
ou terceira ordem projetam-se para
dois grupamentos de neurônios no
bulbo ventrolateral: 1) Neurônios inibi-
tórios na área ventrolateral caudal do
bulbo (CVLM), que por sua vez
projetam-se para neurônios pré-
motores do sistema nervoso simpático
(SNS) na área ventrolateral rostral do
bulbo (RVLM, neurônios simpatoexci-
tatórios). Finalmente, os neurônios da
RVLM projetam-se para os neurônios
pré-ganglionares do SNS localizados
na coluna intermediolateral da medula
espinhal ("fonte" do fluxo simpático
para a periferia, o.s., coração e vasos);
2) O outro grupamento de neurônios
está localizado no núcleo ambíguo (NA)
e núcleo dorsal motor do nervo vago,
que contém os corpos celulares dos
neurônios pré-ganglionares do sistema
nervoso parassimpático (SNP). De
cada uma dessas áreas e núcleos
bulbares, neurônios projetam-se para
áreas e núcleos mais rostrais do SNC
levando informações cardiovascu-
lares. Dessas regiões, de maneira recí-
proca, partem projeções para as re-
giões bulbares e até mesmo para os
neurônios da coluna intermediolateral
da medula, determinando a integração
central do controle da pressão arterial.
Resumindo, o reflexo pressorreceptor
participa da homeostase hemodinâ-
mica, principalmente por controlar o
tônus simpático e parassimpático para
coração e vasos. Exemplificando, a es-
timulação dos pressorreceptores arte-
riais produz redução reflexa da ativi-
dade simpática e aumento da ativida-
de vagal, resultando em dilatação ar-
teriolar, venodilatação, bradicardia e
redução da contratilidade miocárdica.
Logicamente, o funcionamento de
barorreflexo é um pouco mais com-
plexo em decorrência da interação com
outros mecanismos que podem am-
plificar ou atenuar a resposta do receptor
a um determinado estímulo, discriminar
respostas desencadeadas por baro
carotídeo e aórtico ou, ainda, promover
uma maior interação com outros reflexos
ou outras áreas de influência na
modulação do sistema cardiovascular.
No entanto, o barorreflexo é extrema-
mente eficiente em controlar a variabi-
lidade da pressão arterial, o que pode
ser claramente verificado pela labilidade
da pressão arterial que se segue à
desnervação sino-aórtica experimental9
ou à interrupção no funcionamento do
barorreflexo, uma síndrome bastante
rara, mas que acomete pacientes
submetidos a cirurgia no pescoço, qui-
mioterapia, infarto no bulbo ou tumores
no corpo carotídeo13.
Métodos mais usados
para testar a sensibilidade
do barorreflexo
Na prática os dois sistemas efetores
do barorreflexo, o cardíaco e o vas-
Campagnole-Santos MJ, Haibara AS Rev Bras Hipertens vol 8(1): janeiro/março de 2001
Figura 1 – Representação esquemática das vias aferentes, principais áreas de
integração bulbar e vias eferentes do reflexo pressorreceptor arterial. X = nervo
vago; IX = nervo glossofaríngeo; nX = núcleo motor dorsal do nervo vago; nA =
núcleo ambíguo, nTS = núcleo do trato solitário; RVLM = área ventrolateral rostral do
bulbo; CVLM = área ventrolateral caudal do bulbo; CPA = área pressora caudal; IML
= células da medula intermediolateral; SNP = sistema nervoso parassimpático; SNS =
sistema nervoso simpático. Modificado de Dampney, 19942.
RVLM
CVLM
APC
nA
nTS
SNP
IML
SNS
+
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cular, podem ser avaliados separa-
damente. O método mais antigo e
mais utilizado principalmente na
experimentação animal foi descrito
em 1969 por Smyth HS et al.14 e
consiste em injetar endovenosamente
doses crescentes de uma substância
pressora (o agonista α-adrenérgico,
fenilefrina é o mais empregado), pro-
duzindo aumentos da pressão arterial
que estimula os pressorreceptores
arteriais e reflexamente induz reduções
da freqüência cardíaca e da atividade
simpática de um nervo periférico (ner-
vos renal, esplâncnico e mesentérico
são os mais avaliados). Geralmente,
esse teste é seguido da administração
de uma substância vasodilatadora (o
nitroprussiato de sódio tem sido o mais
empregado) que reduz a pressão
arterial e induz à taquicardia reflexa e
ao aumento da atividade simpática
periférica. Recentemente, no entanto,
o emprego de nitroprussiato para
estudar o funcionamento do barorre-
flexo tem sido questionado15. Por outro
lado, como essa droga produz, além da
vasodilatação arterial, venodilatação,
não pode ser afastado que parte das
alterações de freqüência cardíaca e
atividade simpática observadas pos-
sam estar relacionadas à diminuição
da atividade de receptores cardio-
pulmonares em decorrência da queda
da pressão venosa central ou da pré-
carga. De qualquer forma, o uso de
substâncias vasoativas tem sido
extensivamente empregado e tem
permitido explorar a atividade do
barorreflexo em uma larga faixa de
funcionamento. Baseado nas altera-
ções de pressão arterial e nas alte-
rações reflexas de freqüência cardíaca
(expressa em batimentos por minuto
ou intervalo de pulso) ou atividade
simpática periférica, é possível se
traçar curvas que fornecem o ganho
do reflexo (inclinação da curva) e de
set point. Usualmente, o valor obtido
pela razão entre as alterações reflexas
de freqüência cardíaca e as alterações
de pressão arterial é chamado de índice
da sensibilidade do barorreflexo e
expressa a combinação das alterações
de ganho e set point. Uma série de
modificações desse método tem sido
descrita6. Basicamente está relacio-
nada à forma de ativação ou desati-
vação dos pressorreceptores através
de injeção em bolus ou infusões de
curta duração ou à forma de análise
das alterações de pressão arterial e
freqüência cardíaca, pelo emprego de
regressão linear, análise de sigmóides,
entre outros. Na clínica, também já foi
muito utilizada a técnica de produção
de pressão negativa através de um
colar aplicado ao pescoço, estimu-
lando-se assim os pressorreceptores
carotídeos, causando bradicardia
reflexa16.
Procedimentos menos invasivos
têm sido explorados há mais de dez
anos, com o objetivo de poder ser
empregado mais indiscriminadamente
na avaliação da atividade barorreflexa
no homem, mas também para permitir
a determinação da atividade baror-
reflexa por longos períodos, durante o
sono ou durante as atividades diárias
normais, ou seja, a variabilidade espon-
tânea batimento a batimento. Entre
esses métodos, a análise espectral da
pressão arterial ou freqüência cardíaca
e a detecção de seqüências espontâ-
neas acopladas de alterações de PA e
FC em registros contínuos de PA
(através de cateteres arteriais ou
através de MAPA)17,19são as mais
estudadas. A técnica de detecção de
seqüências acopladas para investigar
o controle barorreflexo espontâneo da
freqüência cardíaca é baseada na
identificação de seqüências de
batimentos consecutivos nos quais
aumentos progressivos da pressão
sistólica são seguidos, com apenas um
batimento de atraso, por aumentos
progressivos do intervalo de pulso ou
vice-versa, ou diminuições progressi-
vas de pressão sistólica são seguidas
por diminuições progressivas de inter-
valo de pulso. A inclinação da reta que
correlaciona os valores de pressão
sistólica e intervalo de pulso de cada
seqüência é considerada como índice
da sensibilidade do reflexo pressor-
receptor, da mesma forma que aquele
induzido pela administração de subs-
tâncias vasoativas. Em condições nor-
mais, essas seqüências ocorrem com
uma freqüência relativamente alta, cer-
ca de 80 seq/h foram observadas em
indivíduos saudáveis19. Interessante-
mente, através dessas análises foi
observado que entre as séries acopla-
das existem várias alterações de PA
que não são acompanhadas por altera-
ções de FC, sugerindo que o barorre-
flexo pode não ser invariavelmente
efetivo. O aprimoramento dessa técni-
ca, acoplado ao desenvolvimento de
registros a longo prazo de pressão
arterial mais confiáveis, certamente
irá contribuir para determinações mais
precisas das alterações de sensibilidade
do barorreflexo na normo e hipertensão
arterial.
Controle barorreflexo na
hipertensão arterial
Está muito bem estabelecido que
tanto animais como pacientes com
hipertensão arterial apresentam
atenuação importante da sensibilidade
do reflexo pressorreceptor8,11,16,20. Na
hipertensão primária ou experimental
o grau de diminuição da sensibilidade
do barorreflexo para o controle da
freqüência cardíaca é muito maior do
que para o controle da resistência
vascular11. As respostas reflexas de
freqüência cardíaca estão atenuadas
não apenas para as alterações breves,
mas também para as alterações mais
longas de pressão arterial (produzidas
por infusão de substâncias vasoativas).
O grau de atenuação do barorreflexo,
presente nas diferentes formas de
hipertensão (primária ou secundária),
tem correlação importante com a
severidade da hipertensão, no entanto,
Campagnole-Santos MJ, Haibara AS Rev Bras Hipertens vol 8(1): janeiro/março de 2001
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pode ser observada também em pa-
cientes com alteração inicial da pres-
são arterial (hipertensão limítrofe)16.
A técnica de detecção de alterações
barorreflexas espontâneas através dos
registros contínuos de pressão arterial
por períodos mais longos, 24 horas,
permitiu verificar que a sensibilidade
do barorreflexo varia de acordo com o
período dia/noite, apresentando-se
sistematicamente maior durante a
noite em indivíduos normais11. No
entanto, os pacientes com hipertensão
arterial apresentam atenuação da
sensibilidade barorreflexa em todas
as horas do dia e não apresentam
aumento da sensibilidade durante o
período da noite11. Em outras palavras,
além de os indivíduos hipertensos
apresentarem maior variabilidade da
pressão arterial, os pressorreceptores
têm uma capacidade menor de tam-
ponar essas flutuações do que os
indivíduos normais e ainda a sensi-
bilidade do barorreflexo não aumenta
nas mesmas situações que causam
aumento nos indivíduos normais.
Algumas questões ainda não estão
claras, como se a alteração da sen-
sibilidade do pressorreceptor precede
ou participa no desenvolvimento da
hipertensão, ou se o prejuízo no con-
trole barorreflexo da FC depende de
alteração da atividade vagal ou da
atividade simpática cardíaca ou das
duas. Uma vez que o componente
vagal parece predominar nas respos-
tas reflexas de freqüência cardíaca,
este deve certamente ser afetado
pela hipertensão.
Modulação da atividade
barorreflexa
Várias substâncias podem modular
a atividade do barorreflexo, entre elas
os peptídeos do sistema renina-
angiotensina (SRA) têm sido muito
estudados21. O sistema renina-
angiotensina tecidual está envolvido
na regulação da estrutura e função
cardiovascular e, conseqüentemente,
no controle a longo prazo da pressão
arterial, contribuindo de forma signi-
ficativa para o desenvolvimento e ma-
nutenção da alta resistência periférica
e hiper-reatividade vascular encon-
trada em várias formas de hipertensão
arterial, tais como hipertensão primária
(essencial), hipertensão experimental
de origem renovascular, neurogênica,
genética ou por mineralocorticóides e
sal. Além disso, a menor sensibilidade
do reflexo pressorreceptor promovido
pela Ang II contribui de forma signi-
ficativa para a fisiopatologia da hiper-
tensão e insuficiência cardíaca em
animais de experimentação e no ho-
mem22. Em decorrência desses efeitos,
os inibidores da enzima conversora de
angiotensina I (ECA) representam um
grande avanço no tratamento das
doenças cardiovasculares.
A ação inibitória da Ang II sobre
o reflexo pressorreceptor tem sido
bem descrita em diversos estudos
utilizando diferentes modelos de
hipertensão arterial em cães, coelhos
e ratos, tanto após administração
periférica quanto central2,21,23.
Hiperatividade do SRA cerebral
mostrou, em ratos espontaneamente
hipertensos (SHRs), em uma série de
estudos, que a administração central
de inibidores da ECA (captopril,
enalapril, ramiprilato), de antagonistas
peptidérgicos não-seletivos (sarala-
sina) ou antagonistas de receptores
AT1 (losartan) produz diminuição da
pressão arterial21,23. Os mecanismos
pelos quais a hiperatividade do SRA
cerebral levaria ao aumento da pressão
arterial são basicamente os mesmos
envolvidos no efeito pressor produzido
pela administração central de Ang II,
ou seja, estimulação da liberação de
vasopressina, ativação do sistema
nervoso simpático e inibição do
barorreflexo. A Ang II estaria envolvi-
da tanto no deslocamento da faixa de
funcionamento do pressorreceptor
(alteração de set point) quanto na
redução do ganho do controle barorre-
flexo (Averril/Diz). Interessante-
mente, o efeito da Ang II sobre o
barorreflexo independe da elevação
da pressão arterial causada por esse
peptídeo. Vários estudos mostram
que mesmo quando se previne a queda
da pressão arterial após bloqueio da
ECA, há alteração da sensibilidade
do barorreflexo no sentido dos valores
normais21. Essa observação leva a
uma segunda conclusão muito impor-
tante: o efeito atenuador do SRA, ou
Ang II, sobre o barorreflexo deve ser
exercido no sistema nervoso central.
Os estudos mostrando aumento da
sensibilidade do barorreflexo após a
administração intracerebroventricular
de captopril em ratos SHR já davam
suporte a esta hipótese21,23.
De acordo com a visão mais atual,
os peptídeos do SRA incluiriam, além
da Ang II, a Ang III, a Ang-(1-7), a
Ang IV e a Ang-(3-7). A Ang-(1-7)
tem atraído a atenção mais recente-
mente devido à seletividade de suas
ações, à possibilidade de ser formada
por via independente da Ang II e pela
possibilidade de desempenhar um papel
contrarregulador dos efeitos da Ang
II, em decorrência principalmente de
suas ações antagônicas, tanto centrais
como periféricas24. Enquanto a infusão
central de Ang II (e Ang III) atenua o
controle barorreflexo, a infusão de
Ang-(1-7), sem alterar os níveis basais
de pressão arterial e freqüência cardía-
ca, produz facilitação do controle refle-
xo da freqüência cardíaca24. Além
disso, esse efeito é seletivo para au-
mentos da pressão arterial (bradicar-
dia barorreflexa) e não é observado
após infusão intravenosa aguda. Cor-
roborando essas observações, infusão
central do antagonista seletivo de Ang-
(1-7), A-779, produz atenuação
significativa do barorreflexo enquanto
a infusão do antagonista seletivo de
receptores AT1 de Ang II, losartan,
melhora a sensibilidade do barorrefle-
xo24. Esses dados sugerem um papel
Campagnole-Santos MJ, Haibara AS Rev Bras Hipertens vol 8(1): janeiro/março de 200135
endógeno para os peptídeos angioten-
sinérgicos na modulação do reflexo
pressorrreceptor. Mais interessante-
mente, Britto et al.25, em ratos com
hipertensão renovascular do tipo 2-
rins-1-clip, e Heringer-Walther et al.26,
em ratos SHR, observaram que a
melhora da sensibilidade do baror-
reflexo produzida por tratamento com
inibidores da ECA (via oral ou
intracerebroventricular) é revertida
por infusão central do antagonista
seletivo de Ang-(1-7), A-779 (Figura
2). Esses dados sugerem que a Ang-
(1-7) pode contribuir, pelo menos em
parte, para os efeitos benéficos dos
inibidores da ECA. Centralmente, o
núcleo do trato solitário parece ser
um local para os efeitos modulatórios
dos peptídeos angiotensinérgicos so-
bre o controle barorreflexo27. Estudos
futuros serão necessários para avaliar
qual desses peptídeos do SRA atua
predominantemente ao nível do SNC
para modular o barorreflexo na
situação de normotensão. Mais ainda,
como os peptídeos circulantes ou
endógenos interagem centralmente
para determinar a atenuação do con-
trole barorreflexo da freqüência car-
díaca e atividade simpática na hiper-
tensão arterial.
Quimiorreceptores e
controle cardiovascular
Os quimiorreceptores periféricos
são constituídos por células altamente
especializadas, capazes de detectar
alterações da pressão parcial de
oxigênio (pO2), pressão parcial de
dióxido de carbono (pCO2) e con-
centração hidrogeniônica (pH) do
sangue28. Encontram-se distribuídos
em corpúsculos carotídeos e aórticos,
localizados bilateralmente na bifur-
cação da carótida comum (quimiorre-
ceptores carotídeos) ou em pequenos
corpúsculos espalhados entre o arco
aórtico e a artéria pulmonar (quimior-
receptores aórticos), sendo irrigados
por sangue arterial através de peque-
nos ramos que se originam a partir da
carótida externa e aorta, respectiva-
mente. Uma importante característica
dessas células quimiorreceptoras
refere-se ao fato de estarem intima-
mente associadas aos capilares san-
guíneos, sendo cerca de 25% do
volume total do corpúsculo carotídeo
ocupado por capilares e vênulas, ou
seja, uma vascularização de 5 a 6
vezes maior que a do cérebro29.
Heymans e Bouckaert (1930)28
foram os primeiros a demonstrar,
através de estudos fisiológicos, que a
região da bifurcação carotídea
Campagnole-Santos MJ, Haibara AS Rev Bras Hipertens vol 8(1): janeiro/março de 2001
Figura 2 – Alterações reflexas de freqüência cardíaca (expressas em intervalo de pulso) em resposta às alterações de pressão
arterial induzidas por fenilefrina. As linhas representam a reta de melhor ajuste calculadas por regressão linear. O gráfico de
barras representa a sensibilidade do barorreflexo calculada pela razão entre as alterações de intervalo de pulso e pressão
arterial média. A- Ratos com hipertensão renal crônica submetidos a tratamento com enalapril têm redução da sensibilidade do
barorreflexo após infusão central com o antagonista seletivo de Ang-(1-7), A-779. B- Ratos SHRs apresentam melhora do
controle barorreflexo após infusão central de ramipril, que é revertida por infusão central de antagonista seletivo de Ang-(1-
7), A-779. Modificado de Britto et al.25 e Heringer-Walther et al.26.
36
constitui-se de uma área reflexogênica
sensível a hipóxia. Em seu estudo,
observaram em experimentos de
circulação cruzada que a perfusão in
situ do seio carotídeo com sangue de
um animal doador, submetido à hipo-
ventilação, promovia reflexamente no
animal receptor resposta de hiperven-
tilação, sugerindo que a composição
química do sangue no nível da bifur-
cação carotídea influenciava reflexa-
mente a atividade dos centros respira-
tórios. Dessa forma, a ativação dos
quimiorreceptores periféricos resulta
em ajustes ventilatórios que se caracte-
rizam por aumento do volume de ar
corrente, aumento da freqüência res-
piratória e aumento do volume minuto
respiratório, exercendo, portanto, um
importante papel no controle reflexo
da ventilação30.
Além de promover respostas venti-
latórias, a estimulação dos quimior-
receptores periféricos também modi-
fica reflexamente os valores de pres-
são arterial. Bernthal (1938)31 e
Winder et al. (1938)32 demonstraram
que a estimulação dos quimior-
receptores carotídeos, com cianeto de
sódio ou isquemia localizada do corpús-
culo carotídeo em cães, promoveu
reflexamente taquipnéia, vasocons-
trição periférica e hipertensão arterial.
Dessa forma, o papel fisiológico dos
quimiorreceptores periféricos está
relacionado à promoção de ajustes
ventilatórios e cardiovasculares no
sentido de proporcionar a manutenção
da composição química do sangue em
níveis ideais, bem como uma pressão
de perfusão sanguínea adequada para
todos os tecidos.
Tem sido sugerido que os quimior-
receptores periféricos possuem uma
influência tônica sobre o controle
cardiovascular, contribuindo dessa
forma para a manutenção dos níveis
basais da pressão arterial e de parte
da resistência periférica total. Estudos
de Guazzi et al. (1968)33 demonstra-
ram que a hipotensão que ocorre
durante o sono dessincronizado em
gatos foi de maior magnitude nos
animais submetidos à remoção dos
corpúsculos carotídeos por termocoa-
gulação, sugerindo que a hipotensão
que ocorre durante o sono dessin-
cronizado seria "tamponada" por
ação dos quimiorreceptores caro-
tídeos. Ratos submetidos a situações
agudas de hiperóxia, induzindo à
desativação dos quimiorreceptores,
apresentaram uma queda transitória
da pressão arterial34 e da atividade
simpática35. Da mesma forma, ratos
com desnervação carotídea apre-
sentaram uma redução significativa
da atividade do nervo simpático renal,
a qual foi atribuída à remoção dos
quimiorreceptores carotídeos36.
Resultados semelhantes também
foram observados no estudo de
Franchini e Krieger (1992)37, os quais
demonstraram que a remoção seletiva
da atividade dos quimiorreceptores
carotídeos, através da ligadura da
artéria que irriga o corpúsculo
carotídeo, promoveu redução de
pequena magnitude dos níveis basais
de pressão arterial, mas mantida
cronicamente. Esses estudos em con-
junto sugerem que os quimiorrecepto-
res periféricos exercem uma influência
tônica excitatória na manutenção da
pressão arterial.
Quimiorreflexo e
hipertensão arterial
Apesar das diferentes evidências
demonstrando a importância dos
quimiorreceptores periféricos no con-
trole da circulação, e ainda por desem-
penharem um papel único como sen-
sores capazes de iniciar ajustes venti-
latórios e cardiovasculares integrados,
o enfoque desse aspecto no estudo da
fisiopatogenia da hipertensão tem sido
pouco explorado. Nesse sentido, os
estudos da hipertensão relacionada à
síndrome da apnéia do sono têm eviden-
ciado que características funcionais
dos quimiorreceptores merecem parti-
cular atenção na consideração dos
mecanismos envolvidos na hiperten-
são. Por exemplo, elevação aguda da
pressão arterial sistólica e pressão
arterial média tem sido bem documen-
tada em pacientes com apnéia notur-
na38. Além disso, a hipertensão crônica
observada em indivíduos com síndro-
me da apnéia do sono pode ser rever-
tida pelo tratamento da apnéia39.
Fletcher et al. (1992)40 reportaram
que ratos expostos cronicamente a
breves períodos de hipóxia apresen-
tavam elevação da pressão arterial, o
que não foi observado em ratos
submetidos à desnervação do nervo
do seio carotídeo.
Mais recentemente, estudos em
várias espécies animais têm demons-
trado que na hipertensão arterial
crônica os quimiorreceptores periféri-
cos, especialmente os carotídeos,
apresentam alterações morfológicas,
bioquímicas e funcionais, as quais
poderiam estar correlacionadas com
a gênese da hipertensão arterial41,42.
Aumento da atividade quimiorreflexa
em modelos experimentais de hiper-
tensão foi inicialmente sugerido no
final da década de 1970, quando a
composição dos gases sanguíneos de
ratosespontaneamente hipertensos
foi comparada com a de animais nor-
motensos43. Nesse estudo foi obser-
vado que animais hipertensos jovens
apresentavam aumento da pO2,
aumento do pH e redução da pCO2
sanguíneas quando comparados aos
animais normotensos. Além disso,
outros estudos têm confirmado que
ratos adultos espontaneamente
hipertensos apresentam maior volume
minuto respiratório que ratos Wistar
normotensos44,45. A partir desses
estudos, foi sugerido que as alterações
da composição química do sangue de
animais hipertensos seriam resul-
tantes de hiperventilação, possivel-
mente induzida por hiperatividade dos
Campagnole-Santos MJ, Haibara AS Rev Bras Hipertens vol 8(1): janeiro/março de 2001
37
quimiorreceptores periféricos nesses
animais.
Corroborando com essa hipótese,
outros estudos têm descrito uma
correlação positiva entre hipertensão
arterial e atividade dos quimiorrecepto-
res periféricos41. Registros da ativi-
dade do nervo do seio carotídeo de
ratos adultos têm demonstrado que a
sensibilidade dos quimiorreceptores
à hipóxia está aumentada em ratos
espontaneamente hipertensos quando
comparada aos animais controles
normotensos46. Esses mesmos resul-
tados foram observados em humanos
com hipertensão essencial47 ou
hipertensão limítrofe48, e, de maneira
interessante, não são observados em
animais com hipertensão renal49.
As alterações na sensibilidade do
quimiorreflexo em ratos espontanea-
mente hipertensos têm sido atribuídas
ao estreitamento do lúmen da artéria
que irriga o corpúsculo carotídeo,
possivelmente resultante de arterios-
clerose na carótida41. Além desse
aspecto, Smith et al. (1984)50 obser-
varam alterações nos capilares dos
corpúsculos carotídeos dos animais
espontaneamente hipertensos, as quais
consistiam na proliferação de miofi-
broblastos e excessiva secreção de
substâncias mucopolissacarídicas,
levando a um quadro de estreitamento
do lúmem dos capilares. Essas alte-
rações morfológicas determinariam em
redução do fluxo sanguíneo para o
corpúsculo carotídeo, levando à isque-
mia local e conseqüentemente resultan-
do em aumento tônico da atividade
das células quimiorreceptoras, o que
poderia contribuir para a fisiopatogenia
da hipertensão arterial.
Outras alterações morfológicas
também têm sido observadas em ani-
mais e indivíduos hipertensos. Ha-
beck et al. (1981)51 observaram em
ratos espontaneamente hipertensos um
aumento do tamanho do corpúsculo
carotídeo, quando comparados a ratos
normotensos, decorrente de um
processo de hiperplasia das células do
corpúsculo carotídeo50. Apesar da re-
lação entre as alterações do corpúsculo
carotídeo e o nível de pressão arterial
permancer ainda controversa, a única
outra condição na qual também tem
sido observado aumento do tamanho e
do crescimento do corpúsculo caro-
tídeo é a hipoxemia crônica, situação
na qual ocorre estimulação prolongada
dos quimiorreceptores52.
A figura 1 mostra um diagrama
esquemático com alguns outros fatores
que podem estar relacionados à estimu-
lação do quimiorreceptores periféricos
considerados dentro do complexo me-
canismo da hipertensão. Dentre esses
diferentes fatores, um mecanismo
novo pode ser proposto, ou seja, o
aumento do suprimento tecidual de
oxigênio devido à hiperventilação indu-
zida pelos quimiorreceptores42. A
hiperóxia tecidual é um fator vasocons-
tritor local, podendo ser responsável
pelo aumento da resistência periférica
total e da pressão arterial em animais
de experimentação e humanos53.
Além disso, a resposta vasoconstritora
ao oxigênio é significativamente maior
em arteríolas de ratos espontanea-
mente hipertensos54.
Em muitos distúrbios da homeos-
tase circulatória existe uma simultânea
participação e interação dos meca-
nismos reflexos (baro e quimiorrefle-
xo), para que dessa forma possam
ocorrer os ajustes apropriados para a
normalização dos parâmetros cardio-
vasculares. Assim, alterações da ativi-
dade quimiorreflexa são geralmente
acompanhadas por alterações da ati-
vidade barorreflexa55. Registros da
atividade eferente simpática têm de-
monstrado que durante a estimulação
dos quimiorreceptores a resposta
simpatoinibitória dos barorreceptores
está atenuada ou mesmo suprimida56.
Somers et al. (1991)57 sugeriram que
essa interação entre o barorreflexo e
o quimiorreflexo pode ser explicada
pela convergência das aferências
cardiovasculares no SNC, sugerindo,
portanto, a existência de uma interação
neuronal entre os dois mecanismos
reflexos. Posteriormente, estudos
eletrofisiológicos de Mifflin (1993)58
sugeriram que essa modulação ocorre
no estágio inicial do arco reflexo, no
núcleo do trato solitário (NTS).
Um dos possíveis mecanismos de
interação entre as aferências dos baro-
e dos quimiorreceptores no NTS pare-
ce envolver a ativação de áreas hipota-
lâmicas de defesa. É bem descrito que
a ativação dos quimiorreceptores
periféricos promove, além de respostas
ventilatórias e cardiovasculares, uma
importante resposta comportamental,
que envolve uma ativação coordenada
e integrada de diferentes áreas hipota-
lâmicas, produzindo um padrão de
respostas que dependem de ajustes
somáticos e autonômicos, caracteri-
zando a denominada reação de defesa.
Além disso, a estimulação das áreas
hipotalâmicas de defesa promove
facilitação da resposta simpatoexcita-
tória evocada pelo quimiorreflexo59.
Assim, parece existir uma interação
mutuamente facilitatória entre esses
dois mecanismos (reação de defesa e
quimiorreflexo). Por outro lado, a
estimulação das áreas hipotalâmicas
de defesa promove inibição do compo-
nente simpatoinibitório do barorreflexo,
mediada pela ativação de interneu-
rônios inibitórios no NTS60. Consi-
derando que a sensibilidade do quimior-
reflexo está aumentada na hiperten-
são, é possível sugerir que a modifi-
cação da sensibilidade desses meca-
nismos neurais possa contribuir na
etiologia dessa patologia.
Ao contrário dos barorreceptores
arteriais, que facilmente se adaptam
frente às alterações mantidas da pres-
são arterial, os quimiorreceptores
periféricos têm sua atividade faci-
litada quando expostos a períodos
prolongados de estimulação61. Nesse
aspecto, é surpreendente que durante
muitos anos o quimiorreflexo tenha
Campagnole-Santos MJ, Haibara AS Rev Bras Hipertens vol 8(1): janeiro/março de 2001
38
sido considerado irrelevante nos
estudos da hipertensão, diferen-
temente dos barorreceptores, os quais
têm sido exaustivamente estudados.
Aparentemente, a razão para esse
pequeno interesse é devido à obser-
vação de que os quimiorreceptores
periféricos não influenciam a pressão
arterial basal ou a atividade simpática
em indivíduos normotensos. Assim,
apesar das diferentes evidências na
literatura sugerindo o envolvimento
dos quimiorreceptores periféricos na
gênese da hipertensão, estudos adi-
cionais são ainda necessários para
melhor compreensão do envolvimento
desses sensores na fisiopatogenia da
hipertensão arterial.
Figura 3 – Diagrama esquemático mostrando algumas das respostas
reflexas à estimulação dos quimiorreceptores periféricos, a curto e a
longo prazo, consideradas nos mecanismos da hipertensão primária.
Campagnole-Santos MJ, Haibara AS Rev Bras Hipertens vol 8(1): janeiro/março de 2001
Abstract
Cardiovascular reflexes and arterial hypertension
The reflexes originating in the arterial baroreceptors
and in the stretch receptors in the cardiopulmonary region
are the major mechanisms to effectively control the
arterial pressure over a short time frame. The baroreflex
is considered a relatively high gain control system that
maintains the arterial pressure within normal limits.
Eventhough the diagnosis and treatment of hypertension
based on the baseline level of blood pressure results in an
important decrease in the morbidity of the population, the
arterial pressure variability per se, which is a roleof
baroreflex, is also of importance in clinical therapy. The
attenuation of the baroreflex sensitivity, for instance, is
associated to the sudden death after myocardial infarction.
Several others reflexes participate in the control of blood
pressure, such as, the muscle metaboreceptors, trigeminal
reflex and chemoreflex. Changes in these reflexes in
hypertensive subjects have not been systematically
evaluated, with the exception of the chemoreflex, which
is originated in the arterial receptors activated by hipoxia,
acidosis and ischemia. In the resent article we have
attempted to discuss the cardiovascular reflexes changes
in arterial hypertension, focussing on the baroreflex and
chemoreflex.
Keywords: Blood pressure control; Baroreflexes; Chemoreflex.
Rev Bras Hipertens 8: 30-40, 2001
39
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