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começar o trabalho, leia o Manual do Aluno e Manual do Plágio para compreender todos itens obrigatórios e os critérios utilizados na correção. Divinópolis 2019 ALESSANDRA GELAPE DINIZ O PSICOPATA E O DIREITO PENAL Divinópolis 2019 ALESSANDRA GELAPE DINIZ O PSICOPATA E O DIREITO PENAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade Pitágoras, como requisito parcial para a obtenção do título de graduado em Direito. Orientador: Vitor Dorneli Rodrigues ALESSANDRA GELAPE DINIZ O PSICOPATA E O DIREITO PENAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade Pitágoras, como requisito parcial para a obtenção do título de graduado em Direito. BANCA EXAMINADORA Prof(a). Titulação Nome do Professor(a) Prof(a). Titulação Nome do Professor(a) Prof(a). Titulação Nome do Professor(a) Divinópolis, 16 de abril de 2019 Dedico este trabalho a meus pais, Miguel e Helenice, por serem meus maiores exemplos. Obrigada por cada incentivo, orientação, correções e orações a meu favor. AGRADECIMENTOS Hoje não posso esquecer o papel que Deus teve ao longo do meu percurso. Dedico este trabalho ao Senhor pela força que colocou no meu coração para lutar até alcançar esta grande vitória em minha vida. DINIZ, Alessandra Gelape. O Psicopata e o Direito penal: 2018 (n° de folhas). Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) - Faculdade Pitágoras, Divinópolis, 2019 RESUMO O presente estudo tem como escopo delimitar o que é um indivíduo que possui o transtorno da psicopatia, em que consiste tal patologia, seus principais sinais e sintomas, bem como eventuais formas de tratamento. Serão abordadas as classificações dos psicopatas, bem como a capacidade de responsabilização dos criminosos psicopatas com relação à culpabilidade dos ilícitos que venham a cometer. A análise de imputação à culpabilidade é de suma importância para a correta delimitação da pena a ser aplicada, bem como a forma de seu cumprimento. Isso decorre do fato da culpabilidade ser requisito essencial para a imputabilidade, que, por sua vez, delimita o cumprimento de pena como tipificada na legislação penal pátria ou através de medida de segurança. Será analisado, ainda, à luz das normas vigentes, qual modo de cumprimento de pena seria o ideal para os psicopatas, bem como a existência de peculiaridades e especificidades para o correto deslindo do procedimento punitivo carcerário. Palavras-chave: psicopata, crime, culpa, pena DINIZ, Alessandra Gelape. The Psychopath and the Criminal Law: 2018 (n° de folhas). Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) - Faculdade Pitágoras, Divinópolis, 2019 ABSTRACT The present study has as scope to delimit what is an individual that has the disorder of psychopathy, which consists of such pathology, its main signs and symptoms, as well as eventual forms of treatment. It will address the classifications of psychopaths as well as the accountability of psychopathic criminals to the culpability of the illicit acts they commit. The analysis of imputation to guilt is of paramount importance for the correct delimitation of the sentence to be applied, as well as the form of its fulfillment. This is due to the fact that guilt is an essential requirement for imputability, which, in turn, delimits compliance with punishment as typified in domestic criminal law or through a security measure. It will be analyzed, still, in the light of the current norms, which way of fulfillment of punishment would be the ideal for the psychopaths, as well as the existence of peculiarities and specificities for the correct departure from the punitive procedure of prison. Key-words: psychopath, crime, guilt, penalty LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ART – Artigo LEP – Lei de Execução Penal CC – Código Civil CF - Constituição Federal CID – Código Internacional de Doenças CP – Código Penal TPAS – Transtorno de Personalidade Antissocial SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 10 2. A PSICOPATIA: DOENÇA QUE GERA INIMPUTABILIDADE E SUAS MODALIDADES ........................................................................................................ 12 2.1 Psicopatia: Conceito e definições ................................................................ 12 2.2 sintomas e sinais do início da psicopatia ..................................................... 16 2.3 A origem da psicopatia ................................................................................. 20 2.4 Espécies de psicopatas ................................................................................ 24 3. A CULPABILIDADE NO SISTEMA PENAL BRASILEIRO – A IMPUTABILIDADE E A INIMPUTABILIDADE .......................................................... 30 3.1 A medida de segurança ............................................................................... 33 3.2 DA DESINTERNAÇÃO PROGRESSIVA ......................................................... 36 4. A EXECUÇÃO DE PENA DO CONDENADO PSICOPATA .............................. 38 4.2 o cumprimento de pena dos psicopatas ....................................................... 44 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 49 6. REFERÊNCIAS ................................................................................................. 51 10 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho aborta o tema do Psicopata e o Direito Penal, onde iremos abordar de modo objetivo a apreciação do psicopata a frente do Direito Penal vigente e da Psicologia Forense. Crimes absurdos e sem respostas para tamanha crueldade, para uma boa parte da população necessita-se de maior entendimento, principalmente na Compreensão do transtorno da psicopatia é imprescindível na hora de fixar a pena. Este estudo é de grande relevância, uma vez que a psicopatia está além do que nos mostram as mídias e quais as sanções adequadas a serem utilizadas, de acordo com a condição mental do criminoso. As medidas poderão ser utilizadas perante os níveis variados de gravidade que são caracterizados como leves, moderados e severos. O objetivo especifico é analisar as leis aplicadas e se são eficientes, e identificar qual a melhor forma de punir um psicopata desde o crime mais simples ao mais cruel. No capítulo inicial realiza-se um breve histórico de estudos sobre a criminologia e sua evolução. No segundo capítulo iremos abordar a culpabilidade, qual seria o julgamento ideal para esses indivíduos. E por último vamos abordar uma análise de como o Direito Penal de outros países tratam estes criminosos. A metodologia usada será de natureza qualificativa, uma que se baseia em vários documentos diversos, tais como livros, sites, artigos e até mesmo em outros trabalhos de conclusão de curso. Uma das referências bibliográficas utilizadas será a obra de Ana Beatriz Barbosa Silva 'Mentes perigosas, o psicopata mora ao lado'que nada mais é que uma referência na psicologia. Analisa-se que a pena é uma forma de ressocialização do indivíduo para voltar ao convívio em sociedade após ter cumprido a sanção imposta de acordo com o crime cometido, porém em muitos casos essa ressocialização não ocorre e estes indivíduos tornam-se criminosos reincidentes. Isso é o que ocorre quando o condenado é classificado como “psicopata”, não aprendem com a experiência e, por isso, não se beneficiam com a punição. Na concepção destes autores: O Brasil encontra-se numa encruzilhada. Uma parte da sociedade propõe o endurecimento das penas e a construção de presídios de segurança máxima, enquanto outra, vinculada à defesa dos direitos humanos, sugere a necessidade de novas práticas que ressocializem o preso e 11 humanizem as prisões. Psicopatas não produzem danos contra suas vítimas, mas sim para uma sociedade inteira. 12 2. A PSICOPATIA: DOENÇA QUE GERA INIMPUTABILIDADE E SUAS MODALIDADES A psicopatia é definida como uma patologia cujo doente pode vir a atentar violentamente contra a vida ou integridade física contra pessoas que podem ou não circular entre seu convívio social, com o intuito de beneficiar-se, sem importar em causar dano ou prejuízo a outrem, haja vista que seu comportamento é ilustrado pela dificuldade de sentir empatia, de relacionar-se sentimentalmente com terceiros. Tal patologia pode se manifestar já na tenra idade, com sintomas tais como agressividade precoce, que pode aumentar na adolescência, e se mantém na fase adulta. É uma patologia já estudada pelo ramo da Psicologia, inclusive com o mapeamento de um perfil característico, que se notabiliza pela total aversão e desleixo com relação ao convívio social, de cunho permanente e, até então, sem cura. Todavia, o tratamento hoje empregado para controle de agressividade, bem como de tentativa de adequação social do psicopata tem se mostrado ainda com resultados inconstantes, sendo que alguns dos doentes não respondem ao tratamento, mantendo-se inadequados para a vida em sociedade durante toda a vida. 2.1 PSICOPATIA: CONCEITO E DEFINIÇÕES Barthélemy Coclés, durante o século XVI, foi um estudioso francês que, àquela época, já tentava determinar a personalidade de uma pessoa, atra´ves da análise de suas características externas. Tal ideia, conceituada como fisiognomia utilizada também por Lombroso para determinar se uma pessoa poderia ser criminosa através de seu tipo físico, que gerou os estudos incipientes da Criminologia, foi aceita e difundida até que novos estudos se verteram para analisar o modo de pensar do infrator e das pessoas em geral, e, no ramo médico, tal objeto de estudo acabou por determinar a análise intrínseca da personalidade do cidadão como um estudo psicológico, primeira vez que o termo foi cunhado. O estudo da psicologia, portanto, visou, precípua e primeiramente, a aprofundar seu estudo no cérebro humano para contribuir com o entendimento da mente criminosa. 13 Ainda fazendo uma revisão histórica, ainda que superficial, sobre o tema, com o intento de se estudar anatomicamente ainda os crânios dos criminosos em busca de anomalias, sendo os criminosos estudados divididos em ocasionais, aqueles que cometeram um crime quase de forma fortuita e com motivações exclusivamente sociais; e os criminosos naturais, ou seja, aqueles que desde logo já cometiam crimes, sem motivo aparente, e assim permaneceram até o fim da vida. Esses últimos, aliás, vieram a ser os denominados psicopatas.1 Desse modo, afere-se que desde sempre a mente dos criminosos se constitui em tema de fascínio e estudo para os profissionais médicos, policiais e antropólogos, em tentativa de compreender suas motivações, e se há algum tipo de padrão que os defina, que os diferenciem dos cidadãos médios comuns, que se notabilizam pela pacificidade. Em 1941, Hervey Cleckley, psiquiatra norte americano, publicou o primeiro trabalho sobre Psicopatas, cujo objetivo era de ajudar a detectar e diagnosticar o Psicopata e sua importância no âmbito das ciências jurídicas e sociais. Ficou estabelecido que os psicopatas, objeto do presente estudo, utilizam uma técnica denominada como máscara. É uma espécie de camuflagem, onde há uma ocultação das características da verdadeira personalidade do agente, que se sobressai em momentos específicos. Na maior parte do tempo, o que se vê é uma personalidade que tenta emular o que a sociedade entende como comum. Na realidade, a personalidade do psicopata é determinada por déficits afetivos que culminam em falta de empatia, em ausência de sensibilidade e completo desprezo com relação a terceiros, mesmo que lhe sejam próximos ou frequentes. Nesse sentido, Ana Beatriz Silva assevera que: O termo psicopata pode dar a falsa impressão de que se trata de indivíduos loucos ou doentes mentais. A palavra psicopata literalmente significa doença da mente, no entanto, em termos médicos-psiquiátricos, a psicopatia não se encaixa nessa visão tradicional de doenças mentais. Os Psicopatas em geral, são indivíduos frios, calculistas, dissimulados, mentirosos, que visam apenas o benefício próprio. São desprovidos de culpa ou remorso e, muitas vezes, revelam-se agressivos e violentos.2 1 INNES, Brian. Perfil de uma mente criminosa: a psicologia solucionando os crimes da vida real. São Paulo: Editora Escola, 2009, p. 5. 2 SILVA, Ana Beatriz B. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. 2. ed. São Paulo: Globo, 2014, p. 38. 14 O psicopata, portanto, se apresenta com um caráter insuficiente para os padrões da sociedade. Tem ampla inabilidade e vontade de estabelecer relacionamentos e cultivar sentimentos, além de total falta de entendimento de aspectos éticos e morais, e, por este motivo, não encontra óbice para a prática de delitos, pois se apresenta e realiza condutas ética e moralmente questionáveis sem culpa, com o intuito de alcançar seu objetivo ou meta. Pode, para isso, inclusive, utilizar de sua máscara e se portar como uma personagem ora cativante, ora simpática, ora sedutora, com o intuito de alcançar seu intento. Por não possui nenhum tipo de apego aos ditames sociais, a psicopatia também pode ser entendida como uma predisposição puramente biológica. Nesse sentido, o cérebro continua sendo o principal, talvez o único, elemento para a análise da patologia. Como já explanado, o psicopata tem como características principais três discrepâncias com relação ao comportamento normal de uma pessoa qualquer: a ausência de afetividade, a integração com outrem somente em concordância e necessidade de suprir seus interesses pessoais, utilizando de técnicas manipulativas para tal, e um comportamento solitário, predominantemente antissocial. São encontrados em qualquer raça e povo, sociedade, envolto em qualquer tipo de ambiente cultural, e em vários meios sociais e profissionais. Tem como principal característica total ausência de afeto nas relações interpessoais. Segundo Hare, estudioso canadense, psicopatas possuem pleno discernimento de sua conduta, possuem ciência quando ultrapassam limites socialmente estabelecidos, mas não se importam com isso, veja-se: O padrão da personalidade do psicopata como um todo o distingue do criminoso comum. Sua agressividade é mais intensa, sua impulsividade é mais pronunciada, suas reações emocionais são mais “rasas”. Entretanto, a ausência de sentimento de culpa é a principal característica distintiva. O criminoso comum tem um conjunto de valores internalizado, embora distorcido; quando violaesses padrões, ele sente culpa.3 Qualquer infração, delito ou conduta criminosa cometida pelo psicopata, de maior ou menor grau pode ser atribuída à psicopatia. Nem todos os psicopatas realizam atitudes extremadas, como o homicídio; na realidade, apenas uma minoria dos psicopatas assim age. O que ocorre é que são imbuídos de total desapego à 3 HARE, Robert D. Sem consciência: o mundo perturbador dos Psicopatas que vivem entre nós. Tradução Denise Regina de Sales, revisão técnica José G. V. Taborda. Porto Alegre: Artmed, 2013, p. 71. 15 afetividade, sendo certo que todos os psicopatas, em maior ou menor grau, quando interagem com o meio a que estão inseridos, o faz sempre em benefício próprio. Ao se traçar um perfil psicológico dos psicopatas, afere-se que não raras vezes eles se apresentam como espirituosos, articulados, galanteadores, capazes de interagir de forma agradável, ainda que fria. Tal fato decorre da maneira como os psicopatas conseguem se informar de assuntos diversos, com uma boa gama cultural, com facilidade para aprender e utilizar termos e conceitos técnicos, com o intuito de passar credibilidade e inteligência aos seus interlocutores. Diante de tantos comportamentos conflitantes, resta cristalino que o conceito de psicopatia não se trata de conceito fechado; ao contrário, é tema complexo, com muitas variantes, inclusive por dispor de diferentes definições comportamentais ao longo dos anos. Surgiram, com o tempo, diversas teorias acerca de eventual motivação do psicopata, de forma a aclarar seu conceito e tentar definir um padrão de comportamento. Não se pode confundir, entretanto, a psicopatia com uma espécie de doença mental. A palavra psicopata, por si só, significa doença da mente, do grego psyche = mente; e pathos igual doença. No entanto, não é um termo conceitual literal, e sim cunhado pelo ramo da medicina da psiquiatria, e, por isso, apesar do nome que indica, de forma não totalmente equivocada, uma patologia, a psicopatia não é diagnóstico de pessoa louca ou com déficit intelectual. O psicopata, portanto, é sujeito que não consegue entender o conceito de sociedade, moral, ética, costume, leis, culpa e limites; vive conforme conjunto de condutas próprias e particulares. Não seria errado afirmar que o psicopata habita um mundo todo próprio, interior que se exterioriza, para ele, onde a sua conduta não é reprovável, não é desonrosa e não há leis estabelecidas para que sejam seguidas sob pena de punição. O psicopata, portanto, não se sente como um transgressor quando ultrapassa a lei, e sim que realizou ato normal para sua sobrevivência ou vontade, e que, por si só, não constituiria crime. Os sinais de que um indivíduo seja psicopata, na realidade, já foram, ainda que de forma aberta, delimitados pela ciência, como será analisado. 16 2.2 SINTOMAS E SINAIS DO INÍCIO DA PSICOPATIA A psicopatia é um estado comportamental que atinge de 3 a 5% da população mundial, possuindo, portanto, como principal sinal, a falta de senso ético ou moral. A principal característica do relacionamento social do psicopata é a presença de um sentido manipulativo cumulado com uma certa distância e completa frieza. Os psicopatas ao contrário dos doentes mentais de forma geral, conseguem discernir e verbalizar regras de conduta, ética e moral, bem como costumes observados na rotina da vida. Entretanto, discernir e verbalizar não quer dizer respeitar os limites éticos e morais socialmente delimitados. Apesar de sua capacidade cognitiva ser normal, análoga a de uma pessoa que não é psicopata, no âmbito do Direito Penal, tem-se entendido que o psicopata não deve ser punido com medida de segurança, e sim, com as penas previstas em lei. Ana Beatriz em seu livro diz: Sinal bastante característico do comportamento dos Psicopatas é a total falta de preocupação ou constrangimento que eles apresentam ao serem desmascarados como farsantes. Não demonstram a menor vergonha caso sejam descobertos. Esses tipos de Psicopatas são muito comuns no mercado de trabalho, muitas vezes, fingindo ser profissionais qualificados em áreas que nunca atuaram.4 Os psicopatas, em virtude de seu senso de megalomania, como também de sua extrema arrogância e vaidade, os psicopatas não tem interesse na educação casual e normal da sociedade, nem mesmo busca uma profissão específica. Isso se dá pela sua personalidade peculiar que os fazem acreditar que a ausência de empatia é um dom, e não um problema, e, portanto, são pessoas superiores que não se prendem ao que é socialmente estabelecido. No Brasil, cerca de 20% de toda a população carcerária já foi diagnosticada como psicopata. Embora não seja a maioria da população presa, os psicopatas possuem grande influência nos presídios e não raras vezes influenciam os demais presos, seja pela sua alcunha, seja pelo seu pensamento niilista. 4 SILVA, Ana Beatriz B. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. 2. ed. São Paulo: Globo, 2014, p. 70. 17 Como alhures mencionado, até 5% da população mundial são psicopatas em potencial, ou seja, pelo menos 280 milhões de pessoas no mundo possuem o distúrbio da psicopatia. o órgão Americano Psycopathy Checklist, que trabalha em torno da avaliação dos psicopatas é um dos índices e parâmetros utilizado em todos os países como material de apoio e suporte traçando paralelos entre o comportamento psicopata e o que os diferencia dos criminosos comuns.5 Robert Hare, um dos mais renomados estudioso sobre o tema, entende a psicopatia como um comportamento anômalo, que possui guarida em estudos clínicos, tendo grande importância e aplicabilidade no direito penal e no sistema prisional brasileiro e mundial. Nos estudos de Hare, há uma distinção entre o psicopata e o Transtorno de Personalidade Antissocial (TPAS). Seu argumento é que alguns psicopatas podem preencher os requisitos para diagnóstico de TPAS< mas nem todos os diagnosticados com o transtorno de personalidade antissocial são, de fato, psicopatas. Isso se dá principalmente ao desprezo dos psicopatas pelo regramento de condutas sociais. Enquanto os portadores de TPAS até podem cometer crimes, mas isso não é uma conduta que os tipifica, os psicopatas desde tenra idade se mostram aptos a cometerem infrações e as cometem, não tendo mudanças comportamentais significativas quando submetidos a programas de reabilitação, tendo alto índice de reincidência criminal. Relevante frisar que os psicopatas atualmente passam pelos mesmos programas de reabilitação e são submetidos aos mesmos procedimentos de progressão de regime dos detentos normais, entretanto, tal fato não deveria ocorrer, tendo os psicopatas, assim diagnosticados clinicamente, a necessidade de serem impostos regras próprias para benefícios penitenciários. Todavia, não há estudos suficientes para delimitar quais seriam os procedimentos alternativos e mais eficazes para a concessão de regalias e um programa de socialização ou de pelo menos que visem evitar sua reincidência. Seria de grande valia principalmente devido ao problema social que enfrenta o país atualmente, no que concerne ao número de penitenciárias e a superlotação a que estão submetidas. 5 DAYNES, Kerry; FELLOWES, Jessica. Como identificar um psicopata: cuidado! ele pode estar mais perto do que você imagina. Tradução Mirtes Frange de Oliveira Pinheiro São Paulo: Cultrix, 2012, p. 30. 18 Trata-se de um problema não só do âmbito penal, mas, por que não dizer, de saúde pública,principalmente a se levar em consideração a periculosidade e a reincidência dos psicopatas ao cometimento de ilícitos. Dentre os sinais que o psicopata fornece para o diagnóstico desse desvio comportamental, que são poucos e muitas vezes deliberadamente simulados, pois, como já explanado, o psicopata geralmente se trata de pessoa competente, inteligente e que sabe ser articulada e simpática quando necessário, faz com que seja possível elencar os principais indícios de seu transtorno. Entre eles, sua mudança comportamental e social em determinado ambiente para se adaptar as demandas necessárias para alcançar o que almeja, seja para um ganho patrimonial seja para ter simplesmente paz e privacidade, que são sentimentos de bem estar que geralmente deseja. Para isso, são capazes de comportamento emotivos, frios, relutantes, efusivos, sempre em prol de atingir seus objetivos. Ademais, por ser pessoa egocêntrica e que sempre pensa possuir prerrogativas e habilidades que nem sempre correspondem à verdade, se utilizam de subterfúgios como mentiras ou camuflagens para tentar demonstrar habilidades ou experiências de vida que não necessariamente possui, apenas em prol de se adaptar ao lugar em que está ou ao que deseja alcançar, utilizando de técnicas de manipulação e sem demonstrar remorso ou culpa. Ademais, e principalmente ao serem fracassados em sua tentativa de conseguir o que almeja, demonstram certa confusão, descontrole, podendo gerar e praticar atos impulsivos e agressivos, sendo, quando desmascarados, incapazes de assumir sua conduta delituosa, agindo como se inocente fosse. Apesar da falta de empatia observada nos portadores de psicopatia, não se pode olvidar que os mesmos possuem alta gama de entendimento acerca da personalidade e sentimentos de terceiros, analisando isso de forma fria e pragmática, sendo habilidosos ao manipular pessoas, seja pelo sentimento, seja pela probabilidade de conduta, o que os tornam especialmente perigosos no trato com pessoas vulneráveis ou influenciáveis, que podem chegar a se prejudicar sob induzimento do psicopata. Nesse diapasão, frequentemente os psicopatas se tornam profissionais competentes e valorizados quando trabalham em áreas onde o relacionamento com cliente não é primordial e onde seja necessário grande concentração e frieza de raciocínio para atingir os objetivos. Direito, medicina, entre outras profissões são 19 propícias para psicopatas. Por mais que se argumente que medicina trata e protege vidas, o que seria num primeiro momento contraditório, entretanto, a medicina pode ser entendida como uma ciência humana que se apodera de muitos conceitos matemáticos, como estatísticas, dosagens, ´para seu correto desenrolar. A se considerar que a doença é algo que pode mecanicamente ser extirpado, sem se levar em conta o caráter social da profissão, a medicina se torna uma profissão bastante atrativa para os psicopatas, pois, além de tudo, traz retorno financeiro, social e de status, algo que os psicopatas tem muito apreço. A carreira militar, pela própria natureza do psicopata, sua falta de sentimentos e empatia, também se demonstra carreira profissional com alta probabilidade de sucesso. Biologicamente, também merece destaque o fato de que o psicopata não compreende o sentido da palavra stress, haja vista que os hormônios do stress sabidamente tem sua difusão no corpo do psicopata não relativizada ou diminuída, mas inócua, já que os psicopatas não reconhecem o sentido de pressão ou compromisso com outrem. Ademais, do mesmo modo, psicopatas não possuem cansaço mental derivado de pensamentos comportamentais, o que se consubstancia em uma vantagem com relação aos funcionários sem tal distúrbio, que se compadecem com as vicissitudes da vida. Por este motivo, os psicopatas possuem a vantagem de não se importar com carga de trabalho, carga horária, prazos, e, independentemente de problemas ou distrações, se mantém focados frente à sua atividade, calmos, o que facilita sobremaneira a tomada de decisões, motivo pela qual são, via de regra, profissionais competentes e de sucesso. Além do mais, por não gostarem de realizar tarefas mecânicas, buscam continuamente inovações e aprimoramentos, o que torna uma visão superficial de empregado proativo na verdade uma conduta egoísta que o leva a ficar com o m´inimo de conforto no cumprimento de suas atividades. Ana Beatriz Silva comenta: Segundo uma pesquisa feita com pessoas que ocupam cargos de maior autoridade e hierarquia operacional, ao menos 4% desses, são ocupados por Psicopatas, principalmente do sexo masculino. [...] sem contar, aqueles que são capazes de falsificar sentimentos e burlar vários tipos de testes, que são feitos quando suas mascaras caem.6 6 SILVA, Ana Beatriz B. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. 2. ed. São Paulo: Globo, 2014, p. 89. 20 Por serem focados e concentrados, são também mais inteligentes que a média, embora tal requisito e característica não seja uma constante em 100% dos psicopatas já analisados, não sendo requisito imprescindível para seu diagnóstico. Um fato relevante, entretanto, é buscar a causa da psicopatia. Estudos mostram que nos Estados Unidos, aproximadamente 4% da população sofre com psicopatia. No Japão, tal patamar se encontra em 0,3% da população do país. A estatística apresentada pode ser um indicativo que a causa, para além de genética, também pode encontrar componentes sociais para seu aparecimento na sociedade.7 2.3 A ORIGEM DA PSICOPATIA Um dos grandes sintomas da psicopatia se manifesta desde a tenra idade, com agressividade incontrolável, imotivada e exacerbada. Tal comportamento encontra uma certa estabilidade quando da adolescência e no decorrer da vida adulta, mas pode, da mesma maneira, continuar aparecendo já em idades avançadas. Sua conduta tem por objetivo precípuo sua satisfação pessoal, seja satisfação de cunho sexual, drogas, patrimônio, poder, status, utilizando-se inclusive de fraudes, dado seu comportamento niilista. Entretanto, também são capazes de realizar atos criminosos com alto grau de planejamento, inclusive com manipulação de outrem, que estejam em situações de fragilidade emocional e sob influência do psicopata, que, por sua vez, utiliza uma de suas máscaras, a da completa sanidade e simpatia, para ter o que pretende. Agem de forma premeditada, inteligente, com uma suposta presunção de veracidade, o que os diferencia do simples infrator, que geralmente não possui sequer intelecto para planejar algo mais elaborado. Ainda, diferentemente dos criminosos naturais, que geralmente agem por necessidade ou provocação, o psicopata age em busca de sua meta. Jorge Trindade alega: Psicopatas também são ávidos pela busca de emoções e de sensações. Essa atração pode se estender para o crime, especialmente para a violência sexual. A tração por emoções radicais coloca-os em constante situação de risco ou perigo e pode estar associada com uma maior probabilidade para agressão sexual e para exposição ao recidivismo. Psicopatas não suportam 7 GOLEMAN, Daniel. Inteligência Social. Rio de Janeiro: ELSEVIER, 2016, p. 34. 21 uma vida simplesmente comum e normal, necessitam de estímulos frequentes para que a vida não lhes pareça aborrecida ou pacata demais.8 O indivíduo psicopata não raras vezes se trata de ser que vive sem anseios sexuais, mas que, por algum motivo qualquer, satisfaz sua vontade e tédio através de ataques sexuais, realizados de forma coercitiva. Relatos já documentados pela ciência, atravésde estudos da psicologia clínica e da ciência forense. Por serem seres instáveis, impulsivos e agressivos, seus vínculos não são duradouros, motivo também por apresentarem impaciência e irritação que prejudica os jogos de sedução da nossa sociedade, o que os leva a coibir seus alvos a praticarem sexo sob ameaça ou coerção. Alguns psicopatas possuem transtornos sexuais que são potencializados pela psicopatia. Cleckley, estudioso pioneiro da psicopatia no século passado, afirmava que até 30% dos presos condenados por crimes sexuais no mundo podem ser psicopatas. Dos reincidentes, metade possui tal diagnóstico. Podem apresentar cases de violência imotivada, agindo com excesso em todas as suas atividades, inclusive no ato infracional eventualmente praticado. Verifica-se que esse comportamento é também um sintoma da psicopatia, que pode sentir conforto ao causar privação ou sofrimento a outrem. Desse modo, para os psicopatas, a violência possui uma função, de cunho imediato, de satisfação do seu desejo. Alguns predicados importantes ainda devem ser observados. Estatisticamente, crianças com comportamento antissocial, na maioria das vezes, possuem ascendentes que padecem do mesmo mal; ademais, o padrão econômico familiar baixo, com pouco cuidado com relação aos costumes, que culmina com um comportamento atrevido, impulsivo e disperso podem contribuir para o desencadeamento da psicopatia. ou seja, um lar disfuncional, seja tal disfuncionalidade de âmbito social, familiar, econômico, ou todos, influem diretamente na formação do psicopata. A alienação parental é complicado fator que pode desencadear ainda a psicopatia. Sobre o tema, impende tecer um breve comentário acerca da 8 TRINDADE, Jorge; BEHEREGARAY, Andréa; CUNEO, Mônica Rodrigues. Psicopatia: a Máscara da Justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 76. 22 responsabilidade civil acerca da alienação parental e como a teoria do desamor pode influenciar no diagnóstico do psicopata. O termo “responsabilidade” no senso comum, deriva-se da palavra em latim respondere, que significa “responder, prometer em troca”. Dessa forma, uma pessoa que seja considerada responsável, por alguma situação ou coisa, terá que responder pela prática de seus atos. No Direito Civil, o instituto da responsabilidade civil, gera muitas discussões polêmicas devido aos efeitos provenientes das relações humanas. Inevitavelmente todas as pessoas estão em interação a todo momento. Sendo assim, a atitude de uma pessoa pode interferir na vida de outra, e assim positiva ou negativamente, pode gerar a necessidade de reparar prejuízos ou restituir ganhos. O conceito de responsabilidade civil, conforme abordado de forma sucinta anteriormente, encontra dificuldades em sua definição na doutrina nacional e estrangeira, pois há autores que a definem a partir da culpa, enquanto outros, ao tratar deste assunto, conceituam de forma mais ampla, não restringindo a discussão a mera culpabilidade do autor, mas colocando em foco também a divisão dos prejuízos causados e ponderação de direitos e interesses. O doutrinador Caio Mário Pereira da Silva (2001, p.11), em sua obra “Responsabilidade Civil” define conceito de Responsabilidade Civil da seguinte maneira: A responsabilidade civil consiste na efetivação da reparabilidade abstrata do dano em relação a um sujeito passivo da relação jurídica que se forma. Reparação e sujeito passivo compõem o binômio responsabilidade civil, que então se enuncia como princípio que subordina a reparação à sua incidência na pessoa do causador do dano. Não importa se o fundamento é a culpa, ou se é independentemente desta. Em qualquer circunstância, onde houver a subordinação de um sujeito passivo à determinação de um dever de ressarcimento, aí estará a responsabilidade civil. Dessa forma, a responsabilidade civil, é o emprego de medidas necessárias, que visam a obrigar uma pessoa a reparar através do dano moral ou material, causado a outrem em decorrência do próprio imputado, ou de fato, coisa sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou em decorrência de mera imposição legal (responsabilidade objetiva). No caso da responsabilidade civil por abandono afetivo, trata-se de um ato de omissão por parte dos pais, que deveriam prover os cuidados e afetos 23 necessários para o desenvolvimento psíquico, moral, e afetivo e não o fazem. Para Carlos Roberto Gonçalves (2012, p.71) acerca da responsabilidade por omissão: Para que se configure a responsabilidade por omissão é necessário que exista o dever jurídico de praticar determinado fato (de não se omitir) e que se demonstre que, com a sua prática, o dano poderia ter sido evitado. O dever jurídico de agir (de não se omitir) pode ser imposto por lei (dever de prestar socorro às vítimas de acidente imposto a todo condutor de veículo pelo artigo 176, I, do Código de Trânsito Brasileiro) ou resultar de convenção (dever de guarda, de vigilância, de custódia) e até da criação de alguma situação especial de perigo. A família é a base da sociedade, sendo a principal instituição reduto de convivência humana. Ao fazer parte de uma família, o indivíduo estará sujeito a diversas relações nas quais possui interesse direto, a exemplo do poder familiar, obrigação alimentar; casamento, união estável, parentesco, etc. A desunião, ou separação judicial, divórcio dos cônjuges não implicada na separação, ou desunião de seus descentes imediatos. Separam-se os pais, mas não os seus filhos menores de dezoito anos. A falta de convivência entre os pais, não implica a falta de convivência com seus filhos, mesmo que habitando em ambientes distintos. No artigo 1589 do Código Civil, assegura-se os direitos prioritários dos filhos, e garante que o genitor não guardião poderá visitar e ter o filho em sua companhia conforme o acordo estabelecido com o outro genitor ou conforme ofixado pelo juiz, assim como fiscalizar sua educação e manutenção. Tal premissa explicitada parte do princípio do melhor interesse das crianças e adolescentes. Nesse sentido, os dois fatores principais que costumeiramente deveriam existir em uma relação familiar que coíbe a psicopatia latente seria a supervisão e a disciplina parental, que também são uma manifestação de carinho. A falta de disciplina e autoridade pode ensejar o desencadeamento da psicopatia, pois auxilia no entendimento de ausência de limites e favorece o comportamento infrator. Ademais, a falta de limites fornece ao infante uam certa ausência de limites, ou seja, um dos sintomas principais da psicopatia. não se pode olvidar, ainda, que uma família disfuncional, sem um relacionamento afetivo natural, pode moldar um comportamento errático e sem amor da criança, o que pode incutir no infante uma normalização da violência 24 Hare, o estudioso da psicopatia, ainda elenca a baixa escolaridade e baixa educação como fatores preponderantes para o desencadeamento da psicopatia. Os sintomas e características do psicopata, entretanto, a agressividade, desonestidade, falta de empatia e a manipulação não perfazem diagnósticos restritivos. Nem todos que apresentam tal comportamento são psicopatas. E nem todo psicopata é um infrator, ainda que potencialmente o seja. Mas deve-se atentar que as características do psicopata devem ser avaliadas utilizando-se, ainda, os fatores psicossociais do indivíduo, para que seja traçado um panorama macro, para sua correta delimitação e diagnóstico.9 Entretanto, há psicopatas que tiveram uma infância dentro dos padrões da normalidade e mesmo assim o são. Trata-sede diagnóstico complicado, portanto, mas já se pode delimitar algumas espécies de psicopatas conceituados clínica e cientificamente. 2.4 ESPÉCIES DE PSICOPATAS Há uma grande gama de psicopatas já conceituados cientificamente através de exames clínicos. O Psicopata Social é talvez o mais virulento para a sociedade, pois comete várias infrações sem nenhum tipo de culpa com relação ao dano causado a outrem. Extremamente manipulador, não se importa de prejudicar diretamente o próximo para atingir sua meta. Pode surgir desde a infância, onde não raras vezes se passa por uma agressividade que deve ser observada. Pode ainda desenvolver-se na adolescência ou senão tão somente na fase adulta. A classificação de personalidades dissociais pode ser ranqueada por intensidade da patologia. Isso quer dizer que o psicopata social pode ter grau leve, moderado e grave. Nesse sentido, os denominados psicopatas comunitários são os que encontram baixo grau de psicopatia, sendo que não estão nem mesmo 9 BASÍLIO, Luiz Cavalieri; KRAMER, Sonia. Infância, educação e direitos humanos. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2006, p. 158. 25 completamente conceituados no Relatório de Transtorno de Personalidade Antissocial (TPAS). Podem ser encontrados na maioria das classes e sociedades, sendo o tipo de psicopatia mais usual. O psicopata comunitário comete infrações, mas sempre de pouca complexidade, e dificilmente chegam a cometer homicídio. Possuem difícil diagnóstico, podendo passar vida inteira sem ser diagnosticado como tal. Quando condenados, mantém comportamento exemplar de forma dissimulada apenas para conquistar progressão de regime.10 Já o psicopata diagnosticado como moderado ou grave, esses denominados como Psicopata Antissocial, é o indivíduo que, conforme conceituação do TPAS, compreende quase todos os requisitos da escala, inclusive podendo se enquadrar como serial killers, pois, além de não terem empatia, podem ter prazer ao causar dano a outrem. Por serem mais niilistas, têm mais dificuldade de se inserirem no convívio social sorrateiramente, sendo comumente encaminhados para a reclusão. Possuem as mesmas características do psicopata comunitário, como a ausência de empatia, o viés manipulador, arrogância, megalomania, entretanto, em grau exacerbado. São mais atrelados, devido ao alto grau de psicopatia, a crimes mais graves, como rebeliões, grandes golpes, assassinatos, entre outros. Ainda conseguem dissimular suas intenções e real comportamento, mas com menos cautela. Os psicopatas de grau moderado, em sua maioria, inserem-se no meio de usuários e tráfico de drogas e entorpecentes, vandalismo, cafetinagem, corretagem, jogos de azar, golpes, roubos, entre outros. Já os psicopatas de grau grave são sádicos, normalmente assassinos, não sendo raros transtornos de personalidade e de ansiedade concomitantes. São assassinos ou criminosos sexuais, em sua maioria. São fios e sentem prazer no sofrimento alheio, buscando o cometimento de crimes como uma forma de dar um sentido na vida, que para eles, é vazia de significado, dada sua amoralidade e total falta de empatia. Comumente se cansam de tudo e todos a seu redor, virando verdadeiros nômades. Majoritariamente sofreram abusos quando na infância, o que ajuda a explicar o comportamento errático, e um agravante da psicopatia. 10 SILVA, Ana Beatriz B. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. 2. ed. São Paulo: Globo, 2014, p. 77. 26 Visto a latente disparidade no grau de psicopatia, que, como explanado, foram determinadas como leve, moderada e grave, alguns estudiosos e teóricos da área propuseram uma ramificação dessa classificação, que seria efetivada através de subclassificações, ou subtipos. Blackburn, por exemplo, delimitou os psicopatas ainda como primários e secundários. Karpman, trabalhando sobre a teoria de Blackburn, determinou como psicopata primário o indivíduo que deliberadamente age com psicopatia em proveito próprio. O psicopata secundário, por seu turno, manifestava sua psicopatia em caráter revanchista, reagindo de circunstâncias que desencadearam o distúrbio. Nesse sentido, importante sopesar que os psicopatas primários possuem a psicopatia com origem primordialmente genética, com deficiência biológica de discernimento acerca de ética, moral e sociedade. O psicopata secundário, por sua vez, se encontra no rol dos psicopatas de origem social, que tiveram em seu meio social disfunções e condutas anômalas que moldaram erroneamente seu conceito de vida em sociedade e respeito aos costumes sociais, principalmente oriunda uma infância problemática. Importante ainda ressaltar que quanto mais inteligentes, menos os psicopatas se valem de subterfúgios violentos para atingir o que pretendem, pois possuem mais recursos para tentar conseguir o almejado com artimanhas de menor potencial punitivo, ou de pelo menos menor chance de ser condenado. Nesse sentido, e explorando ainda mais as classificações, houve a sistematização da classificação dos psicopatas, cujos principais subtipos serão estudados. O Psicopata Carente de Princípios está associado a psicopatas com personalidade histérica e narcisista, totalmente egocêntricos e arrogantes. São individualistas e tentem a manter um estilo de vida mentiroso e fraudulento, seja para alcançar suas metas megalômanas ou para se provar como um superior entre a sociedade. Não raras vezes manipulam e exploram terceiros, estando classificado como dominante dentro do sistema primário e secundário de Blackburn.11 O Carente de princípios é psicopata que possui poucos valores sociais, tendência para infringir leis, normas e costumes, sem culpa por eventual dano 11 DAYNES, Kerry; FELLOWES, Jessica. Como identificar um psicopata: cuidado! ele pode estar mais perto do que você imagina. Tradução Mirtes Frange de Oliveira Pinheiro São Paulo: Cultrix, 2012, p. 25. 27 causado a terceiros. De um ponto de vista psicológico freudiano, possuem o superego ausente ou extremamente enfraquecido, sendo amorais e antissociais ao extremo, além de vingativos e extremamente persuasivo. Gosta de se arriscar e não leva em consideração para sua conduta eventual consequência punitiva. Suas relações sociais são pautadas em seus próprios interesses, começando e terminando conforme sua utilidade. Não possuem dificuldade em mentir quando lhes é conveniente, inclusive para se eximir de responsabilidade de práticas delituosas cometidas. Assume, portanto, uma máscara adequada para cada situação que tem que lidar, podendo modificar sua personalidade de acordo com necessidade e conveniência, podendo agir com educação ou não, inocência ou autoridade, vitimismo ou vilania, sempre com o intuito de conseguir o que pretende. Quando condenados ou punidos, buscam aperfeiçoar suas técnicas, para que não sejam pegos novamente. Não há redenção ou reabilitação. Já o Psicopata Malévolo se caracteriza como pessoa extremamente hostil, com forte impulso vingativo. Extremamente paranoico, não confia em ninguém de seu círculo social, o que alimenta a paranoia, o sentimento de injustiça e o sentimento de vingança. Tem semelhanças com os sádicos, e muitos dos psicopatas malévolos se apresentam como serial killers.12 Punições e sanções penais não causam efeitos de reabilitação nessa classe de indivíduos, pelo contrário, apenas alimenta seu espectro vingativo. Em situação de superioridade, tornam-se tiranos e sádicos, agindo excessivamente para provar e comprovar seu statusde superioridade. Por terem comportamento tão errático, acabam por se tornarem párias, e esse é apenas mais um resultado que retroalimenta seu desejo de vingança. Sempre se encontra num ciclo de retroalimentação de ódio, o que os torna revoltados e fortalece a sua já natural ausência de empatia e de sentimento de culpa pelo cometimento de atos ilícitos. Tem pleno conhecimento dos limites éticos socialmente impostos, o que é de especial valia para transgredi-los sem perder o controle da situação ou se colocarem em situação de perigo de condenação ou reclusão. Essa noção do que é permitido, legal, e o que não é se torna uma vantagem para seu oportunismo e persuasão, de se fazerem por dissimulados para conquistar 12 TENDLARZ, Silvia; GARCIA, Carlos. A quem o assassino mata? : O serial killer à luz da criminologia e da psicanálise. Tradução Rubens Correia Junior São Paulo: Atheneu, 2013, p. 131. 28 o que almejam com o mínimo de risco de punição, inclusive selecionando as pessoas que subjugará. O Psicopata Dissimulado é um indivíduo que utiliza seu discernimento acerca do regramento social para usar continuamente uma máscara de sociabilidade e amizade. Entretanto, possui tendências impulsivas e de alteração brusca de comportamento. Pode-se, inclusive, realizar um comparativo com o Transtorno de Personalidade, já que ambos os distúrbios caracterizam-se pela máscara usada para caracterizar um estilo de vida, com enfoque totalmente teatral. Se caracteriza por um comportamento imaturo, e, como todo psicopata, possui imensa facilidade de mentir, dissimular, planejar, conspirar, trair, manipular e se eximir da responsabilidade de seus atos, incutindo culpa sempre a um incauto próximo. Possui na dissimulação sua principal arma para conseguir o que almeja, não sendo violento fisicamente, mas extremamente manipulador. Seu prazer do psicopata dissimulado se encontra nesse jogo de máscaras que usa para conseguir o que almeja. Quando acuados, pode reagir de forma agressiva e impetuosa, ou tramar uma vingança posterior, não sendo sua conduta facilmente previsível. O Psicopata Ambicioso sofre por entender que não tem tudo da qual é merecedor, sempre invejando um terceiro que eventualmente tenha mais sucesso em determinada área, principalmente ligada ao âmbito material. Tende a ter desejo e cometimento de atos que visem destruir ou destituir, como forma de equiparar sua situação, sem se importar muito com violações e punições praticadas. Esse tipo de psicopata se notabiliza por realizar pequenas transgressões, sendo que poucas aquisições já se mostram suficientes para satisfazer sua sanha. Seu prazer é alcançado muito mais em prejudicar e roubar de outrem do que efetivamente possuir bens. Não possuem satisfação plena, e, nesse sentido, ainda que se pareçam com os Psicopatas Carentes de Princípios, o Psicopata ambicioso realiza uma exploração muito mais salientada, e sua motivação precípua é o sentimento de inveja, bem como o desejo de se apropriar e desapropriar outrem com algo que o ambicioso não possui e se julga merecedor. Há estudos que o vazio sentido pelo psicopata ambicioso pode ser ensejado por alienação parental na infância, sendo vítima do desamor.13 13 SILVA, Ana Beatriz B. Mentes inquietas: TDAH: desatenção, hiperatividade e impulsividade. Rio de Janeiro: OBJETIVA, 2009, p. 163. 29 Concluindo, o Psicopata explosivo se diferencia dos demais psicopatas pelo caráter de urgência e impetuosidade que imprime em suas condutas intempestivas e excessivamente agressivas ou arrojadas. Os Psicopatas Explosivos são acometidos por acessos de fúria, com investidas a outras pessoas, agredindo até mesmo membros de sua própria família. Os ataques explosivos vêm em forma de agressão, de supetão, o que faz com que a vítima seja pega de surpresa e sem capacidade de defender a contento. Os explosivos são psicopatas que não planejam sua conduta, muitas vezes infringindo a lei de forma impetuosa e de improviso, muitas vezes sem provocação, sendo esta sua principal característica e também sua principal diferença com relação a outros psicopatas. Entre os psicopatas de maior periculosidade, e a título de exemplificação, pode- se citar o matador de massa, psicopata que mata várias pessoas ao mesmo tempo, geralmente um grupo que o instigou, provocou ou oprimiu; o serial killer, psicopata que mata várias pessoas de forma frequente, na modalidade dolosa, durante meses, anos, com intervalos que podem ser regulares ou não, na maioria dos casos escolhendo as vítimas com alguma característica em comum, como biótipo físico, idade, cor do cabelo, raça, entre outros. O spree killer trata-se de um matador impetuoso, que pratica seus crimes sem planejamento prévio nem uma vítima em específico. A pessoa que estiver próxima ao spree kileer quando em acesso de fúria torna-se uma vítima em potencial. Pode matar ou machucar várias pessoas em curto período, e cessar seus ataques tão bruscamente como começou. Os sociopatas não possuem animus assassino, apesar de também serem considerados psicopatas. A psicopatia não é um transtorno neurológico, e sim, dotade de personalidade antissocial, e, desse modo, pode responder judicialmente pelos seus atos, não sendo cabível a medida de segurança, ainda que o Código Penal Brasileiro caracterize o psicopata como inimputável. 30 3. A CULPABILIDADE NO SISTEMA PENAL BRASILEIRO – A IMPUTABILIDADE E A INIMPUTABILIDADE No âmbito do Direito Penal Pátrio, a culpabilidade é o grande gargalo que deve ser enfrentado quando na seara da Teoria do Delito. É necessário delimitar e conceituar o crime e a adoção da culpabilidade como caractere fundamental da formação do delito. Somente a partir desse estudo é possível haver condenação e responsabilidade penal quando o agente é imputável. Importante salientar que são conceitos diferentes a imputabilidade com a responsabilidade penal. Esta se consubstancia na série de fatos expressamente e legalmente exigidos para que o agente possa se submeter e estar sujeito a uma condenação, ao cumprimento de pena. Aquela, por sua vez, é elemento da própria culpabilidade, sendo antecedente à responsabilidade. Afinal, só há responsabilidade penal se o criminoso for imputável. Com relação à antijuridicidade, pode-se afirmar que tal fenômeno se encontra entre a ação e a lei, quando a conduta do criminoso vai contra o que está legalmente disposto como conduta jurídica. Logo, a antijuridicidade, em âmbito penal, é a contravenção ou o crime, que possui penalidade prevista. A culpabilidade, de outro turno, não se dá quando do cometimento de ato antijurídico, ou seja, no cometimento do delito, e sim, na reprovação do infrator que comete ato que viola o direito. A culpabilidade, portanto, encontra amparo no pensamento do agente que pode fazer de outra maneira, mas não o faz, e, por isso, age com culpa, ou seja, age sabendo que está violando direito, assumindo voluntariamente os riscos de sanção prevista no ordenamento jurídico brasileiro. Nesse sentido, entende-se que a culpabilidade decorre de um anterior juízo de censura, ou seja, o agente realiza um juízo da conduta delituosa, admite agir de forma a lhe ser imputado culpa pelo dano que comete. O juízo de censura é realizado pelo Juiz, a partir de critérios técnicos e racionais. Destarte, há a separação pela maioria dos doutrinadores da culpabilidade em três fundamentos distintos para a delimitação da culpabilidade: i. a imputabilidade, comoindicador de culpabilidade, ii. A inexistência de causa de absolvição, ou seja, a falta de elementos que possam retirar a responsabilidade do agente, e iii. O 31 conhecimento da ilicitude do ato, ou seja, a constatação que o agente tinha conhecimento da antijuridicidade da conduta. Nesse sentido a imputabilidade pode ser entendida como capacidade para ser culpado, ou seja, a capacidade do agente de ser responsável pelos seus atos. Como se vê, a imputabilidade se difere da responsabilidade, sendo àquela um meio para o surgimento desta. Logo, a imputabilidade é uma capacidade de culpabilidade, a capacidade de discernimento do agente reconhecer a ilicitude da conduta e mesmo assim praticá-la. Convém destacar que no ordenamento jurídico brasileiro, a imputabilidade não existe para menores de dezoito anos, sendo estes considerados presumidamente incapazes de ter culpa por sua conduta. Desse modo, o que se observa é que, a se considerar a culpabilidade como elemento formador do ilícito, ou seja, como um dos requisitos para a caracterização do crime, a ausência de culpabilidade inibe a formação de crime, ou seja, mesmo que o agente cometa ato ilícito, se a este não pode ser imputada a culpa, seja por delimitação legal, seja por incapacidade mental ou intelectual, este não responde pela conduta cometida, pois não se configura como crime, ausente a culpabilidade, um dos elementos essenciais para a formação do delito. Nesse sentido, deve-se salientar que o sistema penal pátrio, além do sistema biológico de indicação de imputabilidade, também adota o sistema biopsicológico, ou seja, também leva em consideração se o agente tem discernimento dos seus atos, e, não o tendo, é eximido de punibilidade. No Direito Penal Brasileiro, há inimputabilidade sempre que o infrator não possuir condições psíquicas mínimas para entender a ilicitude dos seus atos. Quando o agente possuir retardo mental, completo ou incompleto, ou doença mental que modifique seu discernimento, cabe à seara penal decidir se a esse agente pode ser imputada culpa. Ao imputar culpa, o agente cumprirá pena. Se não for possível imputar culpa ao agente, o mesmo não cumprirá a pena prevista no Código Penal, e sim, poderá cumprir medida de segurança. Na atualidade, a inimputabilidade requer dois elementos importantes, primeiro psicológico e segundo biológico, onde ambos já foram anteriormente explicados. A principal característica da inimputabilidade está relacionada à capacidade de conhecer e querer, pois o sujeito no momento que comente o crime, não está 32 consciente de seus atos. Para o reconhecimento da incapacidade de culpabilidade é suficiente que o agente não tenha uma das duas capacidades, de entendimento ou de autodeterminação. Faltando a capacidade de entendimento, ou seja, não ter a capacidade de avaliar seus próprios atos, de valorar sua conduta, positiva ou negativamente, o agente, consequentemente não sabe e não pode saber a natureza valorativa do ato que pratica.14 Se o indivíduo não possuir tal capacidade, não ser capaz de auto avaliar-se ou de avaliar o que acontece ao seu redor, não possui, por corolário lógico, condições de autodeterminação. Esse fato, no Brasil, se trata da inimputabilidade, com previsão nos artigos 26, 27 e 28 do CP, que, dentre outros, determina como inimputável doente mental e o retardado, bem como em algumas hipóteses de desenvolvimento mental incompleto. Ademais, há a previsão no artigo 27 de ser inimputável o menor, bem como a inimputabilidade temporária, como em casos de embriaguez. No artigo 26, que delimita a inimputabilidade por doença mental, entre outros, encontra-se como doença mental as psicoses, que são patologias que obstam o portador, temporária ou permanentemente, de manter contato com a realidade à sua volta, seja por motivos de delírios ou alucinações. Dentre as psicoses aceitas clinicamente no país, estão a esquizofrenia, a paranoia, as epilepsias e a psicose exógena. A psicose exógena se trata de patologia que não possui cunho biológico, sendo deflagrada através de estímulos externos, como a psicose sifilítica, oriunda do avanço da doença da sífilis, as psicoses traumáticas, que se iniciam após a vivência de algum evento traumático, a psicose derivada de embriaguez contínua ou que tem como origem o uso de trogas alucinógenas, bem como transtornos bipolares e demência. A psicopatia tem caráter anormal, se constituindo em formação de personalidade diversa, anômala, anomalia esta caracterizada por má formação ou ausência de formação, ou ainda, formação equivocada de valores de personalidades como amor, afeto, vontade e inteligência, o que leva o psicopata a responder de forma diversa das pessoas normais a estímulos cotidianos.15 14 MIR PUIG, Santiago. Derecho Penal, Parte General. 6 ed. Barcelona: Reppertor, 2012, p. 551. 15 PALOMBA, Guido Arturo. Tratado de Psiquiatria Florense, Civil e Penal. São Paulo: Atheneu, 2003, p 42. 33 A psicopatia se encontra elencada dentro das neuroses pela corrente majoritária doutrinária nacional, o que pode ser entendido como um grande equívoco, pois a neurose é conceito amplo demais dentro do ramo da psiquiatria, pois a neurose pode ser a explicação pro toda a sorte de doenças ou problemas mentais, de personalidade ou associativos. Atualmente, as neuroses têm sido objeto de maior delimitação, com origem e fases, bem como diferenciação de uma espécie de neurose para outra. Pode-se afirmar que as neuroses possuem diferença em sua origem, mas que, ironicamente, sempre se encontra algum tipo de alienação parental na infância que desencadeia o aparecimento de neurose no indivíduo.16 Contrariando o entendimento atual da psicopatia, para a doutrina pátria a psicopatia ainda é uma espécie de neurose, uma das espécies dos transtornos de comportamento antissocial. E, sendo considerada uma patologia, inclusive com previsão no CID – Código Internacional de Doenças, o psicopata, mesmo sendo capaz de discernir que sua conduta é delituosa, assumindo voluntariamente o risco de seu comportamento ocasionar sanções penais, e, portanto, passível de culpa, é considerado inimputável pelo nosso ordenamento jurídico, e, portanto, cumpre medida de segurança, e não pena, quando diagnosticado clinicamente como psicopata. Quando a pessoa é psicopata mas não diagnosticada por profissional competente, não é possível a aplicação de medida de segurança, tendo o infrator ter que cumprir as penas previstas no Código Penal. 3.1 A MEDIDA DE SEGURANÇA Há no Brasil, sistemática e constantemente, uma reforma no tocante ao entendimento do tratamento psiquiátrico, tanto dos meliantes inimputáveis quanto dos doentes em geral. É cediço que, de acordo com o entendimento do funcionamento procedimental das medidas de segurança, há algumas contradições e idéias opostas entre a reforma psiquiátrica e o que condiz o entendimento legislativo da medida de segurança. Um 16 TRINDADE, Jorge; BEHEREGARAY, Andréa; CUNEO, Mônica Rodrigues. Psicopatia: a Máscara da Justiça. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 110. 34 dos pontos controvertidos é a internação como regra, e a aparente cessação da periculosidade quando a internação tem seu fim. Considerando a legislação penal, em especial o artigo 97 do CP, temos que existem duas medidas de segurança previstas: internação propriamente dita e tratamento ambulatorial. Importante salientar que a internação é medida que, via de regra, virá a ser aplicada pelo juiz, enquanto o tratamentoambulatorial pode ser determinado, apenas quando observada a necessidade de apenas este tipo de tratamento, e quando o crime cometido foi punível com detenção. A internação, entretanto, na prática, não muda muito do simples encarceramento. Aliás, é imperioso salientar que, na realidade, a internação por tempo determinado pode até mesmo ser considerada um tipo de encarceramento, só que com terminologia diferente, apenas para se direcionar àqueles que sofrem de transtornos mentais. Mas, de forma concomitante, a internação funciona também como um dispositivo de exclusão social, já que, assim como a pena privativa de liberdade, não oferece mudanças positivas no tocante ao comportamento, nem em relação ao contexto em que o internado está inserido, mas acarreta, como no encarceramento, uma desculturação, uma “desadaptação às condições necessárias para a vida em liberdade” (GOFFMAN, 1974, p. 11). Não é equivocado afirmar que a medida de segurança sempre foi determinada não em face da necessidade do delinqüente inimputável, mas, sim, sobre a gravidade do delito. Segue, de certa forma, a mesma teoria da proporcionalidade prevista na dosimetria de pena. Com essa aproximação tão pugente do encarceramento e da medida de segurança, acaba-se por confundir e não haver diferença entre um e outro, no tocante à aplicabilidade ao doente mental. A extinção da medida de segurança, cabe dizer, é realizada através de exame para avaliar a cessação da periculosidade do agente, sendo que, via de regra, é realizado após transcorrido o prazo determinado pelo juízo da validade da medida de segurança. Se, acaso a periculosidade ainda é apontada em tal exame, a medida de segurança se mantém, o que acarreta que o agente pode ficar anos, décadas, até mesmo ad aeternum na instituição psiquiátrica. 35 Reconhece-se, nesse ponto, que a duração da medida de segurança, em seu cerne, ser indeterminada, é flagrantemente inconstitucional, pois viola o inciso XLVIII, alínea “b”, do artigo 5º de nossa Carta Magna, abaixo transcrito: “XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis;” (BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. 1988) Nesse diapasão, a medida de segurança, como é hoje aplicada, possui caráter perpétuo e cruel, o que, de plano, a torna totalmente contra nossos ditames constitucionais. O STF já se manifestou sobre o tema, indicando entender que o limite máximo de duração da medida de segurança não deve exceder 30 (trinta) anos, do mesmo modo que é regulamentada a pena privativa de liberdade, no artigo 75 do Código Penal, veja-se: “AÇÃO PENAL. Réu inimputável. Imposição de medida de segurança. Prazo indeterminado. Cumprimento que dura há vinte e sete anos. Prescrição. Não ocorrência. Precedente. Caso, porém, de desinternação progressiva. Melhora do quadro psiquiátrico do paciente. HC concedido, em parte, para esse fim, com observação sobre indulto. 1. A prescrição de medida de segurança deve calculada pelo máximo da pena cominada ao delito atribuído ao paciente, interrompendo-se-lhe o prazo com o início do seu cumprimento. 2. A medida de segurança deve perdurar enquanto não haja cessado a periculosidade do agente, limitada, contudo, ao período máximo de trinta anos. 3. A melhora do quadro psiquiátrico do paciente autoriza o juízo de execução a determinar procedimento de desinternação progressiva, em regime de semi-internação” (HC 97.621, Rel. Min. Cezar Peluso, Segunda Turma, Dje 26.6.2009). “PENAL. EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. RÉU INIMPUTÁVEL. MEDIDA DE SEGURANÇA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. EXTINÇÃO DA MEDIDA, TODAVIA, NOS TERMOS DO ART. 75 DO CP. PERICULOSIDADE DO PACIENTE SUBSISTENTE. TRANSFERÊNCIA PARA HOSPITAL PSIQUIÁTRICO, NOS TERMOS DA LEI 10.261/01. WRIT CONCEDIDO EM PARTE. I - Não há falar em extinção da punibilidade pela prescrição da medida de segurança uma vez que a internação do paciente interrompeu o curso do prazo prescricional (art. 117, V, do Código Penal). II - Esta Corte, todavia, já firmou entendimento no sentido de que o prazo máximo de duração da medida de segurança é o previsto no art. 75 do CP, ou seja, trinta anos. Precedente. III - Laudo psicológico que, no entanto, reconheceu a permanência da periculosidade do paciente, embora atenuada, o que torna cabível, no caso, a imposição de medida terapêutica em hospital psiquiátrico próprio. IV - Ordem concedida em parte para extinguir a medida de segurança, determinando-se a transferência do paciente para hospital psiquiátrico que disponha de estrutura adequada ao seu tratamento, nos 36 termos da Lei 10.261/01, sob a supervisão do Ministério Público e do órgão judicial competente” (HC 98.360, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, Dje 23.10.2009). Já o STJ entende que o limite da medida de segurança não deve ser maior que o máximo possível de pena, em eventual condenação, da análise abstrata em relação ao delito cometido, conforme entendimento da Súmula 527 do Colendo Tribunal, que orienta que “o tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo de pena, abstratamente cominada ao delito praticado.” O poder executivo, inclusive, através de decretos, como o 8.380/2014, concede sistematicamente indultos a quem possui internação via medida de segurança por mais de 30 (trinta) anos, em conformidade ao entendimento acima delineado. Entretanto, a nossa legislação ainda é omissa quanto ao assunto, o que causa celeuma e insegurança jurídicas, principalmente com as constantes mudanças de paradigmas no tratamento psiquiátrico atuais. 3.2 DA DESINTERNAÇÃO PROGRESSIVA Talvez uma das soluções, pelo menos uma das soluções discutidas atualmente é o conceito de desinternação progressiva, instituto que não encontra amparo em nossa legislação. Impende sopesar que, com relação ao sistema de cumprimento de pena privativa de liberdade, já existe o sistema progressivo. Os inimputáveis condenados ao enclausuramento através de condenação via medida de segurança são encaminhados ao Hospital de Custódia e tratamento psiquiátrico. Neste local, ocorre a sua segregação da vida em sociedade. A lei de Execução Penal (Lei 7.210/84) prevê que o Hospital de Custódia é parte integrante de nosso sistema prisional, o que é incoerente, pois, se a medida de segurança é uma pena alternativa com o objetivo primevo e, teoricamente, exclusivo, de tratar o inimputável para readequação da vida em sociedade, o Hospital de Custódia deveria ser ligado aos sistemas de saúde governamentais, e não ao sistema que possui o encarceramento como plano base. Com esse entendimento, a portaria 001/2014 instituiu a “Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional” (PNAISP), com o intuito de fazer com que o sistema de Saúde Governamental (SUS 37 e SUAS) estejam mais integrados a auxiliar os indivíduos que estejam privados de liberdade. Além desta portaria, as 94/2014 e 95/2014 também versam sobre o tema, principalmente com relação à primeira, que delimita a criação de um serviço de avaliação e acompanhamento de tratamento aplicável a pessoas com transtornos mentais, enquanto a segunda trata de financiamento desse serviço. 38 4. A EXECUÇÃO DE PENA DO CONDENADO PSICOPATA A execução da pena é tema que até a presente data gera enorme celeuma em nosso ordenamento jurídico, seja com relação à sua natureza, origem, seja por definir seu momento temporal, regramentos e normas, metodologia, eventuais limites. Em todo o mundo,a execução penal é motivo de contínuo debate, não sendo equivocado falar que praticamente existe um ramo autônomo do Direito, anexo ao Direito Penal, que a o Direito de Execução Penal. No Brasil, essa autonomia é ainda mais flagrante, eis que regido por lei especial própria, não possuindo nem mesmo previsão no Código de Processo Penal. Historicamente, a execução penal no Brasil teve seus primeiros registros no Código Penitenciário, em 1933. Memora-se que nessa época não havia ainda sido publicado o Código Penal, que só foi promulgado em 1940, e a execução penal não foi regulamentada no referido Códex. Desse modo, àquela época, nem o Código Penal nem o Código de Processo Penal possuíam previsão apta a regulamentar a execução penal, quando se fala em reclusão para cumprimento de pena privativa de liberdade.17 A execução penal, como qualquer medida de execução, é o cumprimento da pena propriamente dita, seja pena privativa de liberdade, privativa de direitos, multa ou medida de segurança. Através do regramento a que a execução deve ser submetida é possível aferir que o delinquente, mesmo sendo condenado, possa cumprir a pena que lhe foi atribuída e não ter violados seus direitos fundamentais constitucionalmente protegidos. Salienta-se que, no decorrer da história, os criminosos foram tratados quando recolhidos pelo Estado como párias, animais, indignos de existência, judiados, e, por isso, a manutenção da dignidade da pessoa humana, mesmo que esse humano seja delinquente, é tema que continuamente tem se revelado objeto de estudo dos doutrinadores e do judiciário, quase que como modo de reparar os exageros cometidos no passado. Pode-se afirmar, portanto, que, atualmente, o processo criminal obedece a dois dogmas, o primeiro, proteger a sociedade do delinquente, tendo como responsável 17 PENTEADO, Jaques de Camargo. A Coisa Julgada e Execução Penal. São Paulo: São Paulo, 1988, p. 65. 39 pela mantença da ordem o Estado, e, o segundo, garantir ao delinquente que, caso condenado, responda pelo seu crime, cumpra sua pena, mas que não tenha violado demais direitos que ainda mantém, mesmo com a condenação. Essa preocupação originou uma série de diretrizes a serem seguidos tanto na fase de inquérito e processo, bem como na execução de pena, sendo certo que algumas até se tornaram princípios. A título de exemplificação, pode-se citar o princípio do in dubio pro reu, ou seja, na falta de prova da culpabilidade, deve-se favorecer o acusado; a proibição da tortura como método de confissão, do homicídio permitido legalmente, a diretriz de que há a presunção de inocência, a manutenção e proteção do direito ao acusado da ampla defesa, devido processo legal e do contraditório, entre outros subterfúgios.18 Nesse sentido, a lei de Execução Penal (LEP), Lei nº 7.210/84 foi publicada para delimitar o cumprimento de pena, acolhendo o sistema de progressão da mesma. Em outras palavras, a LEP admite que a pena seja abrandada no decorrer do tempo, de acordo com o comportamento do condenado e o tempo que o mesmo já cumpriu de sua pena. Como se pode perceber, a natureza jurídica da execução penal é matéria que enseja ainda maiores estudos, complexa, pois possui incidência tanto administrativa quanto penal. Alguns doutrinadores afirmam que a execução de pena é essencialmente jurisdicional, a se considerar apenas os incidentes, tais como indulto, livramento condicional, progressão e tipos de regime – aberto, semiaberto e fechado – além de seguir os dispostos na LEP e considerar a progressão do regime mediante obediência de requisitos específicos. Na mesma senda, afirmam outros doutrinadores a execução penal ter também natureza administrativa, quando se leva em consideração que a finalidade da execução penal é sempre tentar a reabilitação do condenado, sua integração social, bem como a contínua e necessária fiscalização dos institutos carcerários do país, bem como de registro de todos os trâmites do preso, como guia de recolhimento, histórico penal, entre outros. 18 MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução Criminal: teoria e prática: doutrina, jurisprudência, modelos. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 92. 40 Anda a se falar dos princípios que regem a execução penal, imperioso ressaltar o princípio da regularidade processual. O princípio da Ampla Defesa, do Devido Processo Legal e da Ampla Defesa são os princípios basilares, que, todavia, ainda são acompanhados e complementados pelos princípios da Legalidade, da Proporcionalidade, da Imparcialidade do Juiz, da Individualização da Pena, da Razoabilidade. Nesse sentido, o princípio da individualização da pena é decorrente e extensão do princípio da Isonomia, a ser considerado em seu sentido doutrinário, onde os desiguais devem ser tratados na medida de sua desigualdade. Em se falando de execução penal, deve-se atentar para o fato do indivíduo na aplicação da sanção condenatória, de modo que a mesma tenha sua função punitiva, mas também pedagógica, ou seja, que também se preste a buscar a reabilitação do condenado, devendo ser imposta com metodologias diferentes para cada condenado de modo a ser o mais efetiva possível.19 Nesse sentido, a individualização da pena, além de seu conceito complementar ao Princípio da Isonomia, compreende também a satisfação da culpabilidade em sua exata medida mensurada através da capacidade do agente e da extensão do dano. Nesse sentido, deve-se considerar que a culpabilidade emerge como caractere de grande valia para a correta delimitação da pena e formação do ato penal, auxiliando na imposição de limites mínimos e máximos no tocante à condenação, dosimetria da pena e do modo de cumprimento de pena. Do mesmo modo, o estudo do agente infrator, seus antecedentes, situação econômica e social são igualmente levados em consideração para a fixação devida da condenação. Ainda nesse diapasão, o princípio da Individualização da Pena permite que se individualize a condenação, e são utilizados quatro tipos principais de individualização de pena no ordenamento jurídico pátrio, seja pela pena determinada na parte especial do Código Penal, proporcionando ao Magistrado realizar a dosimetria da pena, seja fixando a pena de forma parcialmente indeterminada, ou seja, fixando o máximo a ser cumprido, mas não o mínimo, ou quando se prevê duração mínima e máxima variável, a se considerar o comportamento do apenado quando em cumprimento da pena que 19 NUCCI, Guilherme de Souza. Individualização da Pena. 2.ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 343. 41 lhe foi aplicada. Por fim, a faculdade do magistrado quantificar como julgar devido a pena máxima e mínima a ser aplicada no aso concreto. Para isso, a determinação da pena pode ser realizada em três etapas distintas. De forma prefacial, o Magistrado fixa a pena máxima e mínima levando em conta o previsto e expresso no Códex Penal. Ato contínuo, ao se realizar a delimitação do ato penal cometido e como foi realizado, com todos agravantes a atenuantes, onde o Juiz determinará, baseado na pena prevista em lei e as peculiaridades do caso concreto, a condenação propriamente dita. Por terminante, o Juiz determina a modo que a execução penal será aplicada.20 O juiz, ao realizar a individualização da pena, deve delimitar a forma de início da pena, e, acaso seja em regime fechado, a individualização da pena deve ser realizada através da Comissão Técnica de Classificação do presídio onde o agente cumprirá sua pena. Essa
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