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A Técnica Psicanalítica - Livro Psicologia Hospitalar e Psicanálise

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LIVRO: PSICOLOGIA HOSPITALAR E PSICANÁLISE
CAP III - A TÉCNICA PSICANALÍTICA
O adoecimento é o ponto de partida de uma travessia com final aberto, pode ser a cura, pode ser a morte, ou algum estado intermediário.
A posição ética da psicanálise é que atravessar o adoecimento falando faz bem, se for do querer do sujeito.
A associação livre e a escuta
A associação livre sem uma escuta produz pouco efeito.
É o endereçamento da fala para alguém que escuta em posição neutra que cria a energia necessária para um verdadeiro trabalho psíquico. 
Na psicanálise a função da palavra e da linguagem não é informar, mas sim evocar.
Não cabe ao psicanalista guiar o paciente para falar da doença ou de temas relacionados. A estratégia é levar o paciente a falar do que ele quiser, ou puder, naquele momento.
No hospital a doença é o centro da conversa apenas como ponto de partida, mas não é o guia da fala, esta se guia pela associação livre do paciente, e não pela situação de adoecimento. Ela nunca pode ser um objetivo.
O psicanalista trabalha a partir dos ditos do sujeito, e nunca a partir de sua fala para o sujeito. 
“Falamos e falamos (...) até que a dor dê lugar à palavra”.
O silêncio
No hospital, diferentemente do consultório, o silencio não funciona bem como momento inicial do atendimento; geralmente é mais eficaz começar com um diálogo corriqueiro e gradualmente substituí-lo por uma postura mais silenciosa, de ouvinte, e depois finalmente poder desaparecer como interlocutor direto.
Ao escutar silenciosamente, o psicanalista cria e sustenta um espaço de não-saber para ser ocupado pelo saber do paciente. Esse espaço de não-saber é diferente de não saber algo, diferente do desconhecido; trata-se da “douta ignorância”. Uma ignorância formal.
Jung definiu o final do tratamento como o momento no qual o paciente pega para si o saber que, no inicio do tratamento, havia depositado no analista.
O psicanalista escuta tanto a fala quanto o silêncio do paciente. 
O que torna o silêncio do psicanalista efetivo é que ele é um silêncio tenso, diferente do silêncio meditativo.
A interpretação
Além da escuta o psicanalista trabalha com duas outras intervenções, que também podem ser consideradas básicas: a interpretação e o manejo.
O manejo refere-se à ação concreta do psicanalista na situação de adoecimento, incluindo tudo aquilo que ele efetivamente faz na cena hospitalar, desde fechar uma janela na suspeita de um risco de suicídio, até se intrometer nas questões administrativas do hospital em prol do paciente.
Os psicanalistas trabalham com o corpo simbólico. E onde se encontra o corpo simbólico? Nas palavras, e em nenhum outro lugar.
Este é o desafio do psicanalista no hospital: como fazer de uma simples conversa, de pé, na beira do leito, sem divã nem poltronas, com um mínimo ou com nenhuma transferência, um acontecimento com efeitos clínicos? Vejamos algumas técnicas para isso, começando com a interpretação.
Chamamos genericamente de interpretação tudo o que tem a ver com a fala, com a linguagem e com o significados, incluindo perguntas, pontuações, construções, marcações, explicações, interjeições, entre outras.
Esse trabalho verbal do psicanalista se faz sobre a superfície linguageira produzida pelo paciente. Funciona mais ou menos assim: o paciente fala e o psicanalista vai marcando, pontuando essa fala através da escansão e da repetição, para realçar certos tempos e certas expressões.
Escansão é um recurso da análise poética, é o ato de decompor um verso em seus elementos métricos, destacando na pronúncia as sílabas de uma palavra ou das palavras de uma frase.
Mas por que é necessário dizer ao paciente o que ele disse? Para colocar o sujeito diante de si mesmo.
A estratégia psicanalítica é concordar com o certo da pessoa e não com o errado da situação. 
Para a psicanálise está fora de questão interpretar a doença, não é este o trabalho do psicanalista.
Se não cabe ao psicanalista dizer ao sujeito o que significa sua doença, para que serve então a interpretação? A interpretação tem a função de sacudir a cadeia significante na qual se encontra enredado o sujeito. Para Lacan a interpretação é feita para “fazer ondas”. O movimento produzido por essa onda leva o sujeito a uma elaboração do encontro com a realidade do adoecimento. 
O objetivo da interpretação é colocar em andamento um processo de elaboração que requer tempo para se desenvolver e chegar a algum resultado prático.
Existem situações em que faltam palavras aos pacientes, não por um comprometimento anatômico, mas pela emergência abrupta de uma angustia tal que não cabe nas palavras. Nessas situações a técnica baseada na escuta precisa de um ajuste; é preciso que o psicanalista seja um pouco mais ativo e chegue mesmo a emprestar suas palavras para quem não tem momentaneamente as suas. O psicanalista pode mesmo nomear o que supõe que o paciente esteja sentindo.
A transferência 
A cena hospitalar é o palco de um grande desencontro transferencial. Existe um personagem disposto a dar escuta e atenção, o psicanalista; o problema é que o paciente apresenta essa demanda de amor em relação ao médico, e não ao psicanalista.
O psicanalista trabalha sob uma transferência trabalhada. Se a transferência para o médico é espontânea, quase natural, a transferência para o psicanalista é menos consistente, precisa ser construída pela via do simbólico.
A ideia de que “a oferta cria a demanda” descreve magnificamente a clínica sob transferência que se pratica no hospital geral.
O setting
Qual é a posição do psicanalista no hospital? Em pé. Definimos a atividade psicanalítica no hospital como uma clínica pela palavra, em pé, e entre vários.
O tempo
No hospital o tempo é veloz. Acrescenta-se a isso o cruzamento de dois tempos: o da medicina e o do sujeito. O primeiro da ordem da urgência e o segundo do universo da elaboração. O médico tem pressa, já o sujeito precisa de tempo, em todos os sentidos.
O tempo de atendimento psicanalítico no hospital é muito variável, mas dificilmente é longo; a maioria dos pacientes é atendida poucas vezes, e muitas vezes apenas uma única vez.
O tempo de atendimento psicanalítico não responde a nenhuma dimensão psicológica; ele é determinado pela evolução médica do caso e pelas questões administrativas, o que leva o psicanalista a trabalhar com o final em aberto.
Já o tempo e duração de cada atendimento é mais pertinente, pois o psicanalista tem sobre ele algum controle. Existem atendimentos previstos para ser rápidos, as chamadas visitas psicológicas, e existem atendimentos mais longos.
Não cabe determinar o tempo de duração do encontro, deixando que ele se estabeleça a partir da emergência dos conteúdos, do nível de angústia suscitado pela conversa e também pela condição física do paciente.
A técnica psicanalista exige certo cuidado com a dosificação da angustia: se é muito baixa não chega a criar o questionamento necessário a um engajamento no processo reflexivo, mas se é excessiva cria resistências, barra aa associações livres e pode favorecer comportamentos disrruptivos.
Esse cálculo do quanto de angustia se faz presente ajuda o psicanalista a determinar o tempo de duração de cada atendimento no hospital.
O desafio dos psicanalistas que trabalham na cena hospitalar é desenvolver uma técnica que seja clinicamente eficaz nos limites de um único encontro.
Noção lacaniana dos três tempos: tempo de ver, tempo de compreender e tempo de concluir.
A palavra e o gesto
No hospital não é suficiente o trabalho apenas no simbólico, com as palavras, quase sempre é preciso fazer um gesto.

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