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FLAVIO SERPA ZANETTI O USO DE REDES NEURAIS ARTIFICIAIS COMO FERRAMENTA PARA AUXILIAR NA DETERMINAÇÃO DA VIDA ÚTIL DE PAVIMENTOS FLEXÍVEIS Dissertação apresentada à Escola de Engenharia de São Carlos, da Universidade de São Paulo, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Engenharia Civil: Área: Infra- Estrutura de Transportes. Orientador: Prof. Dr. Glauco Tulio Pessa Fabbri São Carlos 2008 i DEDICATÓRIA À minha família, aos meus pais, Dempsey e Marina, aos meus irmãos, Douglas e Eloísa, aos meus tios e tias (meus pais também), Marilda, Sérgio, Marise e José, pela ajuda e carinho. À minha esposa Flávia, pela paciência e estímulo, sem os quais tornaria mais árdua a caminhada deste trabalho. ii AGRADECIMENTOS Ao meu orientador, Prof. Dr. Glauco Tulio Pessa Fabbri, pela ajuda, incentivo, orientação e sugestões fundamentais para conclusão deste trabalho. À minha orientadora da graduação, na UNESP, Professora Eliane Viviani, pelo incentivo na continuidade dos estudos, pelas raras, mas gratificantes, conversas. A todos que me ajudaram de alguma forma na conclusão deste trabalho, aos amigos do departamento, aos meus superiores, da Tecnosonda e da TBG, pela compreensão e pela permissão que eu me ausentasse do trabalho, em virtude do mestrado. A todos os funcionários da Elsamex, em especial ao Walter Maluf, Rui Barros, Jorge, Tomás, Eduardo, Caixutti e Fernando (Nandinho), que me ensinaram muito sobre projeto rodoviário e fizeram com que eu encontrasse uma paixão, a área de transporte rodoviário, e que, sem dúvida alguma, foram fundamentais, para que eu decidisse fazer um mestrado nesta área. iii SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS .................................................................................................. v LISTA DE TABELAS ................................................................................................. ix Resumo...................................................................................................................... x Abstract ..................................................................................................................... xi 1. Introdução ..............................................................................................................1 2. Avaliação Estrutural de Pavimentos Flexíveis........................................................4 2.1. Introdução.....................................................................................................................4 2.2. Análise Mecanística ....................................................................................................5 2.3. Retroanálise da Bacia de Deslocamentos ..............................................................6 2.3.1. Métodos Iterativos ...............................................................................................7 2.3.2. Métodos Simplificados ........................................................................................9 2.4. Fadiga de Misturas Betuminosas ...........................................................................11 2.5. Deformação Vertical Recuperável..........................................................................13 2.6. Coeficiente de Poisson.............................................................................................15 2.7. Equipamentos para Levantamento de Bacias de Deflexão ...............................16 2.7.1. Equipamentos de Carregamento Estático .....................................................18 2.7.2. Equipamentos de Carregamento Dinâmico ..................................................20 2.7.3. Equipamentos de Carregamento por Impulso. .............................................21 2.8. Programas de Análise Mecanística. ......................................................................22 3. Redes Neurais Artificiais (RNAs)..........................................................................25 3.1. Histórico ......................................................................................................................26 3.2. Neurônio Artificial ......................................................................................................27 3.2.1 Função de Ativação............................................................................................28 3.3. Redes Neurais Artificiais “Multilayer Perceptron” ................................................31 3.3.1. Algoritmo de Aprendizagem “backpropagation” ...........................................32 3.4. Usos na Engenharia .................................................................................................35 iv 4 . Metodologia.........................................................................................................42 4.1. Bacias Hipotéticas.....................................................................................................42 4.2. Redes Neurais Artificiais Implementadas .............................................................44 4.3. Simulador EasyNN-plus ...........................................................................................45 4.4. Estimativa da Vida Útil do Pavimento ....................................................................46 5. Apresentação dos Resultados..............................................................................47 5.1. Pavimento de Três Camadas..................................................................................48 5.1.1. Tensão na Face Inferior da Camada de Revestimento...............................48 5.1.2. Tensão no Topo do Subleito............................................................................51 5.1.3. Deformação na Face Inferior da Camada de Revestimento ......................53 5.1.4. Deformação no Topo do Subleito ...................................................................55 5.1.5. Módulos de Resiliência .....................................................................................57 5.1.6. Análise dos Resultados Obtidos .....................................................................60 5.2. Pavimento de Quatro Camadas .............................................................................62 5.2.1. Tensão na Face Inferior da Camada de Revestimento...............................63 5.2.2. Tensão no Topo do Subleito............................................................................65 5.2.3. Deformação na Face Inferior da Camada de Revestimento ......................67 5.2.4. Deformação no Topo do Subleito ...................................................................69 5.2.5. Módulos de Resiliência .....................................................................................71 5.2.6. Análise dos Resultados Obtidos .....................................................................75 5.3. Planilhas para previsão das Tensões, Deformações e Módulos. .....................78 5.4. Exemplo de Aplicação dos Resultados para Determinação da Vida Útil do Pavimento ..................................................................................................................80 6. Conclusões...........................................................................................................83 7. Bibliografia............................................................................................................85ANEXO A .................................................................................................................92 ANEXO B ................................................................................................................CD ANEXO C ................................................................................................................CD v LISTA DE FIGURAS Figura 2.1: Ilustração do comportamento do pavimento submetido à aplicação de um carregamento ........................................................................... 16 Figura 2.2: Ilustração Viga Benkelman.................................................................. 18 Figura 2.3: Viga Benkelman .................................................................................. 19 Figura 2.4: Falling Weight Deflectometer - Dynatest ............................................. 21 Figura 3.1: Modelo não linear de um neurônio artificial, segundo HAYKIN (1994) .................................................................................................. 27 Figura 3.2: Função de ativação linear ................................................................... 29 Figura 3.3: Função de ativação threshold ou limiar ............................................... 29 Figura 3.4: Função de ativação piecewise linear................................................... 30 Figura 3.5: Função de ativação sigmóide unipolar ................................................ 30 Figura 3.6: Ilustração das direções das fases funcional e erro.............................. 33 Figura 5.1: Melhor arquitetura de RNA encontrada para a tensão na face inferior da camada de revestimento para o pavimento de três camadas.............................................................................................. 49 Figura 5.2: Tensão na face inferior da camada de revestimento real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de três camadas ............ 50 Figura 5.3: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída Tensão no Revestimento do pavimento de três camadas ................................................................ 50 Figura 5.4: Melhor arquitetura de RNA encontrada para a tensão no topo do subleito para o pavimento de três camadas ........................................ 51 Figura 5.5 : Tensão no topo do subleito real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de três camadas............................................. 52 vi Figura 5.6: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída Tensão no Subleito do pavimento de três camadas ................................................................ 52 Figura 5.7: Melhor arquitetura de RNA encontrada para a deformação na face inferior da camada de revestimento para o pavimento de três camadas.............................................................................................. 53 Figura 5.8: Deformação na face inferior da camada de revestimento real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de três camadas.............................................................................................. 54 Figura 5.9: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída Deformação no Revestimento do pavimento de três camadas ........................................................... 54 Figura 5.10: Melhor arquitetura de RNA encontrada para a deformação no topo do subleito para o pavimento de três camadas ................................... 55 Figura 5.11: Deformação no topo do subleito real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de três camadas ..................................... 56 Figura 5.12: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída Deformação no Subleito do pavimento de três camadas ................................................................ 56 Figura 5.13: Módulo do revestimento real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de três camadas ..................................................... 58 Figura 5.14: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Módulo do Revestimento do pavimento de três camadas ................................................................ 58 Figura 5.15: Módulo da base real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de três camadas ................................................................ 59 Figura 5.16: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Módulo da Base do pavimento de três camadas ................................................................ 59 Figura 5.17: Módulo do subleito real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de três camadas ................................................................ 60 Figura 5.18: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Módulo do Subleito do pavimento de três camadas ................................................................ 60 vii Figura 5.19: Melhor arquitetura de RNA encontrada para a tensão na face inferior da camada de revestimento para pavimento de quatro camadas.............................................................................................. 63 Figura 5.20: Tensão na face inferior da camada de revestimento real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de quatro camadas........ 64 Figura 5.21: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Tensão no Revestimento do pavimento de quatro camadas ............................................................ 64 Figura 5.22: Melhor arquitetura de RNA encontrada para a tensão no topo do subleito para o pavimento de quatro camadas.................................... 65 Figura 5.23: Tensão no topo do subleito real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de quatro camadas......................................... 66 Figura 5.24: Freqüência de erros – Erro entre o Valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Tensão no Subleito do pavimento de quatro camadas ............................................................ 66 Figura 5.25: Melhor arquitetura de RNA encontrada para a deformação na face inferior da camada de revestimento para o pavimento de quatro camadas.............................................................................................. 67 Figura 5.26: Deformação na face inferior da camada de revestimento real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de quatro camadas.............................................................................................. 68 Figura 5.27: Freqüência de erros – Erro entre o Valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Deformação do Revestimento do pavimento de quatro camadas ................................ 68 Figura 5.28: Melhor arquitetura de RNA encontrada para a deformação no topo do subleito para o pavimento de quatro camadas............................... 69 Figura 5.29: Deformação no topo do subleito real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de quatro camadas................................. 70 Figura 5.30: Freqüência de erros – Erro entre o Valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Deformação no Subleito do pavimento de quatro camadas ............................................................ 70 Figura 5.31: Módulo do revestimentoreal (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de quatro camadas ................................................. 72 viii Figura 5.32: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Módulo do Revestimento do pavimento de quatro camadas ............................................................ 72 Figura 5.33: Módulo da base real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de quatro camadas ............................................................ 73 Figura 5.34: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Módulo da Base do pavimento de quatro camadas ............................................................ 73 Figura 5.35: Módulo da sub-base real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de quatro camadas ......................................................... 74 Figura 5.36: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Módulo da Sub-base do pavimento de quatro camadas ............................................................ 74 Figura 5.37: Módulo do subleito real (ELSYM5) versus previsto pela RNA para o pavimento de quatro camadas ............................................................ 75 Figura 5.38: Freqüência de erros – Erro entre o valor real (ELSYM5) e valor previsto (RNA) para o dado de saída: Módulo do Subleito do pavimento de quatro camadas ............................................................ 75 Figura 5.39: Planilha para previsão das Tensões, Deformações e Módulos para pavimentos de três camadas............................................................... 79 Figura 5.40: Planilha para previsão das Tensões, Deformações e Módulos para pavimentos de quatro camadas .......................................................... 80 ix LISTA DE TABELAS Tabela 2.1: Modelos de previsão de vida útil baseados na ocorrência de fadiga em camadas asfálticas ........................................................................ 13 Tabela 2.2: Modelos de previsão de vida útil baseados na deformação recuperável de compressão no topo do subleito ................................. 15 Tabela 2.3: Faixas de valores de coeficiente de Poisson para materiais utilizados em pavimentos (AASHTO, 1986) ........................................ 16 Tabela 4.1: Parâmetros dos pavimentos de três camadas .................................... 43 Tabela 4.2: Parâmetros dos pavimentos de quatro camadas ................................ 43 Tabela 5.1: Características das RNAs para a saída dos módulos para o pavimento de três camadas ................................................................ 57 Tabela 5.2: Resumo dos valores obtidos pelas RNAs para o pavimento de três camadas.............................................................................................. 61 Tabela 5.3: Características das RNAs para a saída dos módulos para o pavimento de quatro camadas ............................................................ 71 Tabela 5.4: Resumo dos valores obtidos pelas RNAs para o pavimento de quatro camadas................................................................................... 76 Tabela 5.5: Estimativa da Vida Útil do Pavimento baseado na deformação na face inferior do revestimento para o pavimento de três camadas ....... 82 Tabela 5.6: Estimativa da Vida Útil do Pavimento baseado na deformação vertical recuperável no topo do subleito para o pavimento de três camadas.............................................................................................. 82 x Resumo Este trabalho apresenta um procedimento para auxiliar na determinação da vida útil de pavimentos flexíveis através da determinação de tensões e deformações causadas pela solicitação de um eixo padrão na estrutura de pavimentos flexíveis utilizando Redes Neurais Artificiais. Para treinamento e validação das redes foram utilizadas bacias de deflexões hipotéticas geradas com o auxílio do programa ELSYM5, simulando o carregamento com Falling Weight Deflectometer. Foram criados quatro conjuntos de bacias hipotéticas, dois para pavimentos de três camadas e dois para pavimentos de quatro camadas. As Redes Neurais Artificiais foram treinadas e validadas utilizando-se o simulador EasyNN-plus, que utiliza redes Multilayer Perceptron com algoritmo de aprendizagem backpropagation. Os dados de entrada das redes são as espessuras das camadas do pavimento e a bacia de deflexão. Como saída, têm-se as tensões e deformações na face inferior do revestimento e no topo do subleito e os módulos de resiliência das camadas do pavimento. Foram determinadas retas de regressão, coeficientes de regressão e histogramas de erros entre os valores reais (ELSYM5) e os valores previstos (RNA). Os resultados obtidos pelas Redes Neurais Artificiais apresentaram boa correlação com os valores reais, demonstrando a capacidade das redes neurais para auxiliar na determinação da vida útil de pavimentos flexíveis, ao estimar diretamente as tensões e deformações em pontos específicos da estrutura. Palavras Chaves: Redes Neurais Artificiais, Análise Mecanística, Ensaios Não-Destrutivos, Bacia de Deflexões, Vida Útil de Pavimentos Flexíveis. xi Abstract This paper presents a procedure to assist the evaluation of the remaining life of flexible pavements by means of the determination of stresses and strains caused by a standard load in flexible pavements structures using Artificial Neural Networks. Hypothetical deflections basins, generated by the ELSYM5 program, simulating the load applied by a Falling Weight Deflectometer, were used to train and to validate the networks. Four sets of hypothetical basins were created, two for pavements with three layers and two for pavements with four layers. The Artificial Neural Networks were trained and validated using the EasyNN-plus simulator, which uses Multilayer Perceptron networks with back-propagation learning algorithm. The networks input data are the pavements layer’s thickness and the deflection basin. The networks outputs are the stresses and strains in the bottom of the asphalt layer and at the top of the subgrade and resilience modulus of the pavement layers. The results obtained by the Artificial Neural Networks showed good correlation with the real values, demonstrating that neural networks have capacity to assist in the evaluation of the remaining life of flexible pavements, estimating directly the stresses and strains of specific points of the pavement structure. Keywords: Artificial Neural Networks, Mechanistic Analysis, Nondestructive Testing, Deflection Basins, Remaining Life of Flexible Pavements. 1 1. Introdução A análise mecanística dos pavimentos representa, na atualidade, um papel importante na determinação da vida útil remanescente do pavimento, na avaliação estrutural e, consequentemente, no dimensionamento de reforços de pavimentos. Com a popularização de microcomputadores, os programas de análise mecanística se tornaram uma ferramenta de fácil acesso aos profissionais envolvidos em projetos de pavimento, causando uma rápida difusão desse tipo de abordagem no âmbito da avaliação estrutural de pavimentos. Outro fator associado ao desenvolvimento dos métodos mecanísticos refere-se às vantagens apresentadas pelos ensaios não destrutivos que, por serem realizados “in situ”, captam a condição real de solicitação a que o pavimento é submetido, isto é, nas condições de umidade, densidade,temperatura e estado de tensões/deformações reais de serviço. Para que seja efetuada a análise mecanística de um pavimento é necessário realizar um ensaio que simule as cargas aplicadas na estrutura pelo tráfego e que, ao mesmo tempo, registre os deslocamentos da estrutura no momento da aplicação da carga. Existem diversos equipamentos que realizam ensaios não destrutivos, dentre eles pode-se destacar: Ensaio da Placa, Viga Benkelman, Falling Weight Deflectometer – FWD, Kuab, entre outros. No momento da aplicação da carga a estrutura do pavimento deforma-se, delineando um perfil longitudinal denominado Bacia de Deslocamentos Recuperáveis que é registrado pelo equipamento. A partir dos dados obtidos desse ensaio é realizada a análise mecanística do pavimento através do processo de retroanálise, que, por sua vez, fornece, dentre outras informações, as tensões e 2 deformações horizontais de tração na fibra inferior da camada de revestimento e as tensões e deformações verticais de compressão no topo do subleito, que são importantes para a avaliação estrutural do pavimento flexível. O primeiro fator está ligado diretamente à ocorrência de fadiga no revestimento do pavimento e o segundo na ocorrência de deformações permanentes. A análise mecanística do pavimento permite avaliar as tensões, deformações e deslocamentos oriundos dos efeitos originados na estrutura do pavimento pelo carregamento gerado pelos veículos. Esta análise é realizada através de diversos programas computacionais, dos quais se pode destacar: ELSYM5, FEPAVE, PAVE e BISAR, etc. Pode-se, também, determinar, através do processo de retroanálise, os módulos de resiliência das camadas do pavimento. A retroanálise das bacias de deformação recuperável é um processo iterativo e que não gera uma única solução, pois a partir dos deslocamentos recuperáveis medidos em campo e das espessuras das camadas, faz-se o cálculo, através da Teoria da Elasticidade, dos módulos para as diversas camadas constituintes da estrutura do pavimento, de forma a se obter, por meio de tentativas, um bom ajuste entre a bacia de deformação teórica (calculada) e aquela obtida em campo. Assim, além de ser um processo árduo, a retroanálise pode apresentar valores de módulos que não condizem com a realidade, acarretando um erro na avaliação estrutural do pavimento. As Redes Neurais Artificiais são muito utilizadas, atualmente, em diversas áreas da engenharia; são ferramentas poderosas, que procuram imitar o funcionamento do cérebro humano no seu processo de aquisição e recuperação de conhecimento. Estudos recentes destacam-se na área de Engenharia de Transportes com a aplicação de Redes Neurais Artificiais, como os de RODGHER et. al. (1997), que apresentou um estudo para classificação de solos tropicais e de COUTINHO NETO (2000), que investigou um procedimento de retroanálise utilizando RNA. Estes estudos têm demonstrado que as RNAs podem fornecer alternativas às soluções convencionais da Engenharia de Transporte de maneira simples, rápida e econômica. 3 O objetivo deste trabalho é propor a utilização de Redes Neurais Artificiais Multilayer Perceptron para determinar diretamente as tensões e deformações horizontais de tração na face inferior da camada do revestimento e as tensões e deformações verticais de compressão no topo do subleito a partir da bacia de deflexão e das espessuras das camadas que compõem o pavimento. Propõe-se, também, a partir dos mesmos dados de entrada, bacia de deflexão e espessura das camadas do pavimento, determinar os módulos de resiliência das camadas do pavimento e do subleito. Para atingir o objetivo, foram gerados dois conjuntos de 10.000 bacias de deflexão hipotéticas cada, com o auxílio do programa ELSYM5, simulando carregamento com Falling Weight Deflectometer (FWD), para pavimentos com três e quatro camadas. Desses conjuntos foram utilizadas as bacias de deflexões, as espessuras das camadas e as tensões e deformações na face inferior do revestimento e no topo do subleito para o treinamento e validação das Redes Neurais Artificiais. Para determinação dos módulos de resiliência foram gerados outros dois conjuntos de 20.000 bacias de deflexões hipotéticas cada, baseados no mesmo critério adotado no caso anterior, sendo que neste caso foram utilizados os módulos de resiliência no treinamento e na validação das Redes Neurais Artificiais. 4 2. Avaliação Estrutural de Pavimentos Flexíveis A seguir expõem-se algumas considerações acerca de avaliação estrutural de pavimentos flexíveis. 2.1. Introdução A avaliação estrutural do pavimento é realizada com o objetivo de analisar o comportamento estrutural das suas camadas em função das solicitações das cargas oriundas do tráfego. O pavimento é uma estrutura sujeita a tensões e deformações provenientes do tráfego. A análise mecanística visa, de uma forma simplificada, determinar o número de solicitações, oriundas da passagem de veículo padrão, ao qual o pavimento resistiria com a estrutura íntegra. Esta análise pode ser realizada para qualquer camada do pavimento mas é, usualmente, feita em dois pontos específicos da estrutura do pavimento, a saber: • No Revestimento: a aplicação de cargas repetidas pode provocar tensões e deformações de tração na face inferior do revestimento que podem levar o material asfáltico à fadiga, originando fissuras que se propagam até a superfície do pavimento; e • No Topo do Subleito: a aplicação de cargas pode provocar deformações permanentes que, acumuladas ao longo do tempo, provocam afundamento de trilha de roda. 5 2.2. Análise Mecanística O dimensionamento de um pavimento pode ser feito tendo como base métodos empíricos, empírico-mecanísticos ou mecanísticos. Nos processos empíricos as espessuras das camadas são obtidas em função de um índice de suporte do subleito, como por exemplo, o método que se baseia no CBR, adotado pelo DNIT. Os processos de análise mecanística baseiam-se nas características intrínsecas dos materiais que compõem o pavimento e na relação entre a tensão e a deformação oriundas de um carregamento. Pode-se, por exemplo, determinar as espessuras que satisfaçam alguns critérios pré-estabelecidos quanto a tensões e/ou deformações admissíveis, como a determinação do número N em função das deformações intrínsecas na estrutura. O processo de análise mecanística é utilizado, também, para avaliação estrutural do pavimento, através da retroanálise. Uma das primeiras aplicações baseadas na teoria elástica foi realizada em 1885, por Boussinesq, que apresentou soluções para determinação de tensões, deformações e deslocamentos em qualquer ponto, a uma profundidade z e distância r da carga pontual, em um sistema homogêneo, isotrópico e elástico linear, baseado no modelo de Hooke, generalizado em espaço semi-infinito sob um ponto de carregamento (ULLIDTZ, 1987). Diversos pesquisadores, através das premissas estipuladas por Boussinesq, apresentaram evoluções para sistemas de 2, 3 e 4 camadas. Dentre estes se destacam os brasileiros Barros e Andreatini, nas décadas de 60 e 70. No entanto, ressaltam-se os estudos apresentados por Burmister, em 1943 (The Theory of Stresses and Displacements in Layered systems and Aplications to the Design of Airport Runways) e 1945 (The General Theory of Stresses and Displacements in Layered Soil Systems I, II and III), que apresentaram uma das primeiras soluções para os meios estratificados. O método de análise mecanística tinha pouca aceitaçãona prática da engenharia, em virtude da solução matemática dos sistemas de multicamadas ser muito trabalhosa. A partir da década de 1960, com a popularização dos 6 microcomputadores, surgiram os programas de análise mecanística que facilitaram e popularizaram esse tipo de análise no meio técnico baseada, principalmente, na teoria elástica linear, originalmente, desenvolvida por Burmister em 1945. Atualmente, a aplicação de métodos racionais em projeto e avaliação de pavimentos tem recebido atenção especial por vários organismos nacionais e internacionais ligados à pavimentação, mostrando o interesse no aspecto de avaliação estrutural de pavimentos com a consideração não só dos deslocamentos verticais recuperáveis na superfície dos pavimentos, mas também, das tensões e deformações atuantes na estrutura, correlacionando-as com a definição da vida de fadiga. HUANG (1993) comenta que comparações de tensões e deformações da estrutura de pavimento calculadas pela teoria elástica com aquelas medidas em protótipos de pavimentos, tais como as realizadas na década de 60, por Whiffin & Lister na Inglaterra; Gusfeldt & Dempwolf na Alemanha; Nijboer e Klomp & Lister na Holanda; indicaram a validade da teoria. Dessa forma, verificou-se que, se os esforços de tensões e deformações de uma estrutura de pavimento podem ser estimados teoricamente, é possível projetar o pavimento de maneira que não excedam os valores admissíveis em pontos específicos. Recentemente, novas técnicas de avaliação estrutural, têm sido difundidas. Essas técnicas se baseiam na mecânica dos pavimentos, e comparam a deformação ou tensão de tração na fibra inferior da camada asfáltica com valores determinados através de modelos de fadiga e a deformação ou tensão de compressão no topo do subleito com os valores determinados através de equações de previsão de afundamento excessivo de trilha de roda baseadas no comportamento elástico de materiais granulares, avaliando, desta forma, a vida útil do pavimento em termos de repetições de solicitações padrão. 2.3. Retroanálise da Bacia de Deslocamentos As aplicações de técnicas de retroanálise permitem a avaliação mecanística da estrutura e a estimativa da vida útil remanescente do pavimento. Uma das mais 7 importantes aplicações dos parâmetros deflectométricos refere-se à obtenção dos valores dos módulos de resiliência, das tensões e das deformações das camadas dos pavimentos quando submetidos a carregamentos impostos pelo tráfego. O módulo de resiliência, definido pela relação entre as tensões e as deformações reversíveis dos materiais que compõem as camadas do pavimento, pode ser determinado de duas formas: • Em laboratório, através do ensaio triaxial dinâmico (solos) e de compressão diametral (misturas asfálticas, materiais cimentados); • Analiticamente, através de retroanálise, a partir das bacias deflectométricas obtidas sob a superfície do pavimento. O objetivo principal da retroanálise é fornecer as propriedades das camadas do pavimento “in situ”, dados estes que são utilizados na manutenção e/ou restauração das características aceitáveis do pavimento (VILLELA e MARCON, 2001). CARDOSO (1995) listou algumas limitações existentes no processo de retroanálise, dos quais se destacam: • Ainda não há um consenso quanto à consideração da não linearidade de materiais de base, sub-base e subleitos; • A teoria utilizada nos processos de retroanálise é baseada na análise estática das camadas elásticas, mas deveria se basear na análise dinâmica e considerar a não linearidade dos materiais; Basicamente, os métodos de retroanálise são classificados em dois grupos: iterativos e simplificados. 2.3.1. Métodos Iterativos O processo de retroanálise iterativo é bastante trabalhoso e pode levar a resultados duvidosos dependendo do operador e dos módulos iniciais adotados, pois não existe um resultado único, isto é, pode-se obter um conjunto de módulos que apresentam 8 uma soma de erros entre as deflexões medidas e calculadas mínima, o que seria considerado como satisfatório, porém que não representam a realidade da estrutura analisada. Os aplicativos computacionais, que realizam a retroanálise pelo método iterativo, apresentam como dados de entrada, as características do pavimento estudado, tais como: espessuras das camadas, coeficientes de Poisson, módulos estimados, características do carregamento no qual o ensaio foi realizado (carga, raio ou pressão de enchimento dos pneus) e coordenadas dos pontos onde foram medidos os deslocamentos na superfície. Com esses dados de entrada, os programas testam valores de módulos para as camadas de tal forma que os deslocamentos verticais calculados (deflexões teóricas) na superfície do pavimento se ajustem às deflexões medidas em campo. A retroanálise é considerada satisfatória quando o conjunto de módulos determinados minimiza a soma dos erros entre as deflexões medidas e as calculadas. Dentre os programas computacionais mais utilizados para determinação destes parâmetros deflectométricos destacam-se: BISAR, ELSYM5, FEPAVE, JULEA, KENLAYER, PAVE, MODULUS, REPAV, RETRONA, EVERCALC. Segundo PREUSSLER et. al. (2000), os resultados obtidos através de métodos iterativos de retroanálise são influenciados pelos seguintes fatores: • Os valores modulares finais da estrutura em estudo são dependentes dos valores modulares iniciais (seed moduli) adotados para as camadas; • Admitem várias soluções, pois uma bacia de deflexões pode corresponder a uma centena de configurações estruturais diferentes, sendo que o processo de convergência, por sua vez, é função dos valores modulares iniciais adotados; • As espessuras adotadas para as camadas da estrutura influenciam nos valores dos módulos finais. Quando é adotada para uma determinada camada uma espessura menor do que a sua espessura real, o módulo obtido poderá ser bem maior do que o do pavimento real. Isso ocorre para se compensar o valor da rigidez equivalente de cada camada, que é função do 9 módulo e da espessura. Daí a necessidade da obtenção das espessuras, que seriam de fácil obtenção se os relatórios de execução de obras (as built) fossem um item obrigatório dos contratos de construção e de supervisão de obras; • A presença e a profundidade de uma camada rígida influenciam os resultados da retroanálise, assim como a presença de camadas de solos saturados ou até mesmo de lençol freático no subleito. 2.3.2. Métodos Simplificados Métodos de retroanálise simplificados são aqueles onde a obtenção das características elásticas da estrutura do pavimento é feita através da utilização de equações, tabelas e gráficos, entre outros procedimentos simplificados oriundos da teoria da elasticidade aplicada aos meios homogêneos, isotrópicos e linearmente elásticos. De maneira geral, consistem na conversão do pavimento real em estruturas equivalentes mais simples, de duas ou três camadas incluindo a camada de subleito. Como tratam o problema de forma simplificada, são mais rápidos do que os métodos iterativos, porém perdem em acurácia. Segundo COUTINHO NETO (2000) dentre os métodos simplificados, os mais conhecidos a nível nacional são: • Método da AASHTO (1993): Desenvolvido pela AASHTO (1993), este método apresenta um procedimento simplificado de retroanálise em que o pavimento real é considerado como uma estrutura de duas camadas, sendo uma delas o conjunto das camadas do pavimento propriamente dito (revestimento, base, sub-base) e a outra o subleito. Omódulo do conjunto das camadas do pavimento é chamado de módulo efetivo do pavimento (Ep). O módulo do subleito é designado por (Mr). Os dados necessários à aplicação deste procedimento são: o Bacia de deflexão; 10 o Carregamento solicitante da estrutura, representado pela pressão ou tensão e pelo raio da área de contato; o A espessura total do pavimento acima do subleito. • Método de FABRÍCIO et. al. (1994): O método desenvolvido por FABRÍCIO et al., (1994), baseia-se no conceito de pavimento equivalente e no modelo elástico de Hogg. O método apresenta dois gráficos de bacias de deflexões teóricas normalizadas em função da deflexão máxima (D0). Um gráfico foi desenvolvido para levantamentos com Viga Benkelman e outro para levantamentos com FWD. Estes gráficos foram obtidos através das cartas de influência de Hogg e representam uma significativa simplificação do método. Dois nomogramas; elaborados para a relação Ep/ESL = 6,18; correlacionam a espessura do pavimento equivalente (HEQ), a relação D60/D0 e o produto ESL x D0, tanto para levantamentos realizados com a Viga Benkelman, como para os efetuados com FWD. A partir desses nomogramas, conhecendo-se a relação D60/D0, pode-se calcular a espessura e o módulo do pavimento equivalente, o módulo do subleito e a tensão e deformação vertical no topo do subleito. • Método de NOURELDIN (1993): O método de NOURELDIN (1993) utiliza bacias de deflexão medidas com FWD para retroanalisar o módulo de resiliência do subleito, o módulo efetivo do pavimento e estimar o número estrutural do pavimento. Neste método, a estrutura real do pavimento é substituída por uma estrutura equivalente de duas camadas: a primeira camada é composta do revestimento, base e sub- base e a segunda camada é o subleito. O conceito deste método se baseia no fato de que existe um ponto na superfície do pavimento no qual a deflexão deve-se apenas ao subleito. Este procedimento permite que a deflexão máxima seja decomposta em duas componentes, a deflexão do subleito e a do pavimento. Os valores dos módulos de resiliência do subleito e do pavimento são obtidos graficamente através da entrada da espessura total do 11 pavimento e da distância e deflexão medida no geofone mais afastado do centro de aplicação da carga. 2.4. Fadiga de Misturas Betuminosas A fadiga do pavimento está associada à repetição de cargas das rodas dos veículos que solicitam à flexão a camada asfáltica. A repetição da solicitação das cargas gera o início de trincas, geralmente na face inferior do revestimento, que se propagam para cima até atingir a superfície. A fadiga é o fenômeno de degradação estrutural, progressivo e localizado, que sofre um material submetido a tensões ou deformações repetidas, inferiores à sua resistência última, podendo culminar na fissuração ou ruptura completa do material após um número suficiente de repetições. Portanto, a resistência à fadiga de uma mistura asfáltica pode ser definida como a sua capacidade de suportar, sem ruptura, as solicitações repetidas do tráfego. A vida de fadiga da mistura asfáltica é influenciada por vários fatores, dentre os quais, pode-se destacar: magnitude das cargas, número de aplicações de carga, tipo e teor de cimento asfáltico utilizado na mistura, granulometria do agregado, volume de vazios da mistura, temperatura de serviço, etc. Segundo PINTO e MOTTA (1995), a estimativa da vida de fadiga de misturas asfálticas pode ser feita das seguintes maneiras: • Em ensaios de placa ou pistas de simulação de tráfego que se aproximem bastante das condições de um pavimento real, ou • Em ensaios de laboratório com corpos-de-prova submetidos a níveis de tensões de modo a simular as condições de solicitação no campo, ou • Através de equações de fadiga, contidas na literatura, que são alimentadas por dados obtidos de programas computacionais de retroanálise. 12 Há na literatura diversas equações de fadiga para misturas asfálticas, em função, principalmente, da grande dispersão dos resultados devido, não só, à inerente heterogeneidade do material, como também, às técnicas de ensaio (preparação dos corpos-de-prova, tipos de ensaio, etc). As equações tradicionais para determinação da vida útil de fadiga das misturas asfálticas são baseadas nos modelos apresentados a seguir: n KN ∆×= σ 1 (2.1) n t KN ×= ε 1 (2.2) n t KN ×= σ 1 (2.3) Onde: N = número de repetições de carga necessário à ruptura do corpo de prova; ∆σ = diferença entre tensões horizontal e vertical εt = deformação de tração σt = tensão de tração n; K = parâmetros experimentais Dentre os modelos citados, encontra-se com maior freqüência, na literatura, equações baseadas nos modelos baseados na deformação de tração. Na tabela 2.1 são apresentados os parâmetros experimentais (n, k) e os respectivos autores das diversas equações de fadiga. As equações estimam a vida útil dos revestimentos a partir das deformações de tração nas fibras inferiores das camadas asfálticas (εt) e baseiam-se no modelo de desempenho apresentado na equação (2.2). 13 Tabela 2.1: Modelos de previsão de vida útil baseados na ocorrência de fadiga em camadas asfálticas Autor K n Epps e Monismith (1973) 2,20 x 10-19 3,010 Federal Highway Administration (FHWA ,1976) 1,09 x 10-06 3,512 Baker, Brabston e Chou (1977) 9,70 x 10-10 4,030 Brown, Pell & Stock (1977) 8,90 x 10-13 4,900 Treybeg et al (1977) 9,73 x 10-15 5,163 Pinto e Preussler (1980) – CAP 50/60 2,85 x 10-07 3,690 Pinto e Preussler (1980) – CAP 85/100 9,68 x 10-03 2,300 Verstraeten, Veverka e Francken (BRRC – Belgian Road Research Center, 1982) 4,86 x 10-14 4,762 Preussler (1983) 2,99 x 10-06 2,150 Transportation and Road Research Laboratory (TRRL, 1984) 1,66 x 10-10 4,320 Illinois Department of Transportation (1987) 5,00 x 10-06 3,000 Pinto (1991) 6,64 x 10-07 2,930 Asphalt Institute 3,02 x 10-06 3,291 2.5. Deformação Vertical Recuperável A ação de cargas que trafegam sobre os pavimentos gera deformações verticais permanentes e recuperáveis. As deformações permanentes são aquelas que permanecem mesmo após cessar o efeito da atuação da carga, tendo como exemplo as deformações observadas nas trilhas de roda. Ela pode ocorrer devido à combinação de dois mecanismos distintos, isto é, da densificação (variação de volume) e da deformação cisalhante repetida (fluxo plástico sem variação do volume). Segundo BEZERRA NETO (2004) dois aspectos importantes têm que ser controlados para que não ocorra deformação permanente no pavimento: • Limitar a deformação (ou tensão) vertical de compressão no topo do subleito, considerada a camada de menor resistência ao cisalhamento e às deformações plásticas; 14 • Limitar a deformação total resultante do somatório das deformações permanentes de cada camada, que seria o afundamento de trilha de roda admissível. As deformações verticais recuperáveis caracterizam-se pelo comportamento elástico da estrutura, deixando de existir alguns momentos após a retirada da carga. O dimensionamento de um pavimento, para que não ocorra deformação permanente em função da deformação cisalhante repetida, é baseado na determinação da vida útil do pavimento quanto às deformações verticais recuperáveis no topo do subleito, utilizando modelos de fadiga semelhantes aos utilizados para determinação da vida útil de fadiga de misturas asfálticas, isto é: n c KN ×= ε 1 (2.4) n c KN ×= σ 1 (2.5) Onde: N = número de repetições de carga necessário à ruptura do corpo de prova, fadiga; εc = deformação de compressão σc = tensão de compressão n; K = parâmetros experimentais Na tabela 2.2 são apresentados os parâmetros experimentais (n, k) e os respectivos autores de diversas equações de fadiga. As equações estimam a vida útil dos pavimentos a partir das deformações de compressão recuperáveis no topo do subleito (εc) baseadas no modelo de desempenho da equação (2.4) que é usualmente mais utilizado do que o modelo baseado na tensão de compressão. 15 Tabela 2.2: Modelos de previsão de vida útil baseados na deformação recuperável de compressão no topo do subleito Autor K n Dormon e Metcalf (Shell, 1965) 6,07 x 10-10 4,762 Brown et al (Nottingham University, 1977) 1,13 x 10-06 3,571 Verstraen, Veverka e Francken (BRRC, 1982) 3,05 x 10-09 4,348 Marchand et al (LCPC – Pavimento novo, 1983) 1,20 x 10-07 4,167 Marchand (LCPC – Reforço, 1983) 2,72 x 10-09 4,098 Santucci (Asphalt Institute, 1984) 1,34 x 10-09 4,484 Claessen et al (Shell, 1985) - 95% de confiabilidade 1,05 x 10-07 4,000 TRRL – 85% de confiabilidade 6,18 x 10-08 3,950 2.6. Coeficiente de Poisson O coeficiente de Poisson (v) é definido como a razão entre a deformação lateral (εl) e a deformação axial recuperável (εa), isto é: a lv ε ε= (2.6) Teoricamente o coeficiente de Poisson pode variar de 0,0 (corpo rígido) até 0,50 (deformação sem variação de volume). HUANG (1993) comenta que o coeficiente de Poisson tem um efeito relativamente pequeno nos esforços gerados na estrutura do pavimento quando submetido a um carregamento, sendo habitual assumir um valor usual para uso em projeto, em lugar de determiná-lo em teste de laboratório. O guia da AASHTO (1986) apresenta algumas faixas de coeficientes de Poisson para alguns materiais a serem utilizados em análise mecanística, conforme apresentado na tabela 2.3. 16 Tabela 2.3: Faixas de valores de coeficiente de Poisson para materiais utilizados em pavimentos (AASHTO, 1986) Coeficiente de Poisson MATERIAL FAIXA USUAL Concreto de cimento Portland 0,10 – 0,20 0,15 Concreto asfáltico e bases betuminosas 0,15 – 0,45 0,35 Bases estabilizadas com cimento 0,15 – 0,30 0,20 Bases e sub-bases granulares 0,30 – 0,40 0,35 Subleito 0,30 – 0,50 0,40 2.7. Equipamentos para Levantamento de Bacias de Deflexão Os deslocamentos verticais recuperáveis de um pavimento representam a resposta das camadas estruturais e do subleito à aplicação do carregamento. Quando uma carga é aplicada em um ponto da superfície do pavimento, todas as camadas fletem devido às tensões e às deformações geradas pelo carregamento, sendo que o valor do deslocamento geralmente diminui com a profundidade e com o distanciamento do ponto de aplicação da carga. A Figura 2.1 ilustra o comportamento do pavimento submetido à aplicação de uma carga. Superfície do pavimento durante a aplicação do carregamento Sub-Leito Base Revestimento Superfície do pavimento antes do carregamento Figura 2.1: Ilustração do comportamento do pavimento submetido à aplicação de um carregamento A capacidade estrutural de um pavimento pode ser medida por métodos não destrutivos, que têm sido desenvolvidos nos últimos anos e fazem parte da 17 metodologia de avaliação estrutural de pavimentos de vários organismos rodoviários mundiais. Os primeiros equipamentos para determinação de bacias de deflexão de pavimentos consistiam de placas de carga, que utilizavam uma estrutura adaptada à traseira de um caminhão correntemente utilizado em obras rodoviárias. Este veículo, depois de lastreado, permitia a aplicação de até 10 toneladas nessa placa, situada a 2,5m das rodas do mesmo. A intensificação da utilização do ensaio conduziu à substituição do ensaio de placa por um procedimento mais ágil, cujo carregamento é feito com os próprios pneus de um caminhão carregado, ao invés da placa circular. O instrumento de medição das deflexões nesse novo procedimento foi denominado viga Benkelman. A utilização da Viga Benkelman teve um grande impulso no final da década de 50, quando a AASHO Road Test, bem como engenheiros do CGRA – Canadian Goods Roads Association, desenvolveram fórmulas, nomogramas e normas para interpretação das medidas de deflexão. A Viga Benkelman continua sendo utilizada atualmente em larga escala, devido, entre outros aspectos, ao seu baixo custo de aquisição se comparado com outros tipos de equipamento. Todavia, os equipamentos continuaram sendo melhorados e surgiram equipamentos com diversos tipos de carregamento e com capacidade cada vez maior de aquisição de dados, tais como o FWD (Falling Weight Deflectometer), Dynaflect, Road Rater e outros. Os equipamentos de ensaio não destrutivos de pavimentos, para fins de aquisição de dados deflectométricos, podem ser divididos em três grupos, em função do tipo de carregamento: • Equipamentos de carregamento estático; • Equipamentos de carregamento dinâmico; • Equipamentos de carregamento por impulsos. 18 2.7.1. Equipamentos de Carregamento Estático A Viga Benkelman é um equipamento que utiliza um carregamento quase estático na superfície do pavimento. Ela é composta basicamente de duas partes: uma fixa, que fica apoiada no pavimento por três pés reguláveis, e outra móvel, que é acoplada à parte fixa através de uma articulação. A parte móvel da viga tem uma de suas extremidades em contato com o a superfície do pavimento no local onde se deseja mediar a deflexão, a outra extremidade fica em contato com um extensômetro, que acusa qualquer movimento vertical da ponta de prova, conforme figura 2.2 e 2.3 Figura 2.2: Ilustração Viga Benkelman (Fonte: http://www.tede.ufsc.br/teses/PECV0205.pdf, Janeiro de 2008) No ensaio utiliza-se como carga de prova a roda dupla traseira de um caminhão basculante, com carga de eixo de 8,2 tf, igualmente distribuídas entre as duas rodas duplas. Os pneus devem ser calibrados para a pressão de 5,6 kgf/cm2. A medida é executada do seguinte modo: • Seleciona-se e marca-se o ponto do pavimento onde será realizada a medida do deslocamento vertical recuperável; • Centra-se a roda dupla do caminhão sobre o ponto selecionado; • Coloca-se a ponta de prova da viga no meio da roda dupla, posicionando-a sobre o ponto selecionado; 19 • Solta-se a trava da viga, e os pés da parte fixa são ajustados de modo que a haste do extensômetro fique em contato com a parte móvel da viga; • Ajusta-se o pé traseiro, de forma que o extensômetro fique aproximadamente na metade do seu curso; • Liga-se o vibrador e a leitura inicial é feita quando a velocidade de deformação do pavimento for igual ou inferior a 0,01 mm/minuto, ou decorridos 3 minutos da ligação do vibrador; • Realizada a leitura inicial, desloca-se o caminhão lentamente para frente, parando-o quando o eixo traseiro estiver à distância de 10 metros da ponta de prova, fazendo-se a leitura final quando a velocidade de recuperação do pavimento for igual ou inferior a 0,01 mm/minuto, ou decorridos 3 minutos após o caminhão sair da posição original; • Calcula-se, então, o deslocamento vertical recuperável no ponto (D0), através da expressão matemática: D0 = (leitura inicial – leitura final) X (relação de braço da viga – “a/b”) (2.7) Figura 2.3: Viga Benkelman (Fonte: http://www.cremape.com.br/FotosAbrilL1/2004_04_01/VB280,5BELEF2.JPG, Janeiro de 2008) As grandes vantagens da Viga Benkelman são: o baixo custo do equipamento e a facilidade de armazenamento, transporte e manuseio. Entretanto apresenta algumas 20 desvantagens como: baixa produtividade, cerca de 5 a 8 km/dia; a medida é realizada de forma quase estática, não representando a aplicação da carga dinâmica produzida pelos veículos; as medidas não apresentam boa repetibilidade e a precisão das medidas diminui sensivelmente nos pontos mais afastados em relação ao ponto de aplicação da carga. O Califórnia Travelling Deflectometer, também se caracteriza por um carregamento quase estático, ele foi desenvolvido nos EUA pelo Departamento de Transportes da Califórnia e consiste, basicamente, em uma Viga Benkelman automatizada que mede a deflexão provocada pelas rodas do caminhão a intervalos de 6,22 m enquanto o veículo se move a uma velocidade constante. Outro equipamento de carregamento quase estático é o Deflectógrafo Lacroix, que consiste basicamente em um caminhão adaptado para a execução dos ensaios e registro dos resultados de forma totalmente automatizada. O veículo se move a uma velocidade constante de cerca de 3 km/h, com eixo de carga com 13 tf. As deflexões são medidas, entre as rodas duplas do caminhão, por um bastão sensor conectado a uma viga de referência, enquanto o veículo se movimenta. 2.7.2. Equipamentos de Carregamento Dinâmico Estes equipamentos se caracterizam pela aplicação de uma pré-carga na superfície do pavimento, para evitar o repique da prova de carga, o que geraria uma descaracterização do estado de tensões no pavimento, e a indução de uma vibração harmônica que configura o caráter dinâmico do carregamento. O carregamento oscilante é obtido através da rotação de dois volantes desbalanceados. Pode-se citar os seguintes equipamentos nesta categoria: Dynaflex, Road Ratter e o Vibrador WES-16, do Corpo de Engenheiros do Exército Americano (USACE). Os resultados dos ensaios realizados com esses equipamentos permitem avaliar a resposta do pavimento ao carregamento dinâmico e, através de retroanálise, pode- se obter os módulos de elasticidade dinâmicos das camadas do pavimento. 21 2.7.3. Equipamentos de Carregamento por Impulso. São caracterizados pelos Falling Weight Deflectometers (FWD), dentre os mais utilizados pode-se citar: Dynatest, Figura 2.3; Kuab, e Phonix. Figura 2.4: Falling Weight Deflectometer - Dynatest (Fonte: http://www.ce.umn.edu/~guzina/fwd.jpg, Janeiro de 2008) O princípio de funcionamento desses equipamentos baseia-se na geração de um pulso de carga através da queda de um conjunto de massas metálicas sobre um sistema de colchões amortecedores de borracha que transmite a carga ao pavimento através de uma placa com 300 mm de diâmetro, apoiada sobre uma membrana de borracha. A força aplicada ao pavimento pode variar entre 1500 Ib (7 kN) a 25000 Ib (111kN) em função da altura de queda e da configuração do conjunto de massas utilizado. As deflexões geradas na superfície do pavimento são medidas por 7 geofones com capacidade para medir deslocamentos de até 2,0 mm, instalados na placa de carga e ao longo de uma barra metálica de 2,25 m de comprimento. 22 Os afastamentos dos geofones em relação à placa de carga devem ser adequados à estrutura objeto do ensaio, entretanto é comum tomarem-se espaçamentos de 0, 20, 30, 45, 60, 90 e 150 cm. Os FWD’s possuem como característica principal a capacidade de simular o efeito da passagem de um veículo com velocidade entre 60 e 80 km/h sobre a superfície do pavimento. Esses equipamentos permitem a aquisição de dados de forma rápida e precisa, quando tomados os cuidados necessários com manutenção, calibração e interpretação de resultados. Ainda, segundo NAGAO (2001), as vantagens de utilização do FWD são: • As deflexões geradas são as que mais se aproximam dos deslocamentos verticais recuperáveis produzidos por um caminhão carregado em movimento; • A rapidez para variar a carga aplicada, além de agilizar o ensaio, permite avaliar a não linearidade, no comportamento tensão-deformação, dos materiais constituintes das camadas do pavimento; • Ensaios executados por um mesmo equipamento apresentam maior acurácia e repetibilidade de resultados; • É possível medir e registrar automaticamente as temperaturas do ar e da superfície do pavimento e das distâncias percorridas entre estações de ensaio. 2.8. Programas de Análise Mecanística. Após a década de 1970, com o avanço da computação, foram desenvolvidos muitos sistemas de cálculo de tensões e deformações para pavimentos asfálticos e de concreto. Entre os programas para cálculo de tensões e de deformações em sistemas de camadas elásticas citam-se: BISAR, CHEVRON, WESLEA, ELSYM5, KENLAYER, FEPAVE, FEPAVE2, ECOROUTE, EVERPAVE. Alguns desses programas utilizam métodos aproximados de cálculo e permitem que sejam assumidas hipóteses de descontinuidade, outros permitem considerar mais de 23 um tipo de carregamento, e outros ainda consideram a não linearidade na elasticidade dos materiais. Dentre os programas citados, os mais acessíveis e utilizados no Brasil são: • FEPAVE – utiliza o método dos elementos finitos e permite a hipótese de elasticidade não linear para as camadas do pavimento; além disso, o aplicativo utiliza elementos axissimétricos com procedimento incremental, isto é, calcula a estrutura considerando um eixo de simetria passando pelo ponto de aplicação da carga, que é aplicada em incrementos iguais, conforme o número de divisões especificadas pelo usuário. Esse programa admite até 12 camadas de materiais diferentes com características elásticas não lineares e para o revestimento permite a variação do módulo resiliente com a temperatura. Não admite análise do efeito de cargas múltiplas no pavimento; • ELSYM5 – (Elastic Layered System Computer Program) é um aplicativo computacional para o estudo da distribuição de tensões-deformações em pavimentos com várias camadas, em linguagem Fortran, baseado no método das diferenças finitas. Foi desenvolvido por Stuart Kopperman, George Tiller e Mingtson Tseng na Universidade da Califórnia, em Berkeley, inicialmente para computador de grande porte. A versão para microcomputadores foi desenvolvida por KOPPERMAN et al. (1985) e foi patrocinada pelo Federal Highway Administration, U S Department of Transportation (FHWA). O ELSYM5 considera as camadas do pavimento como sendo compostas de um material isotrópico, homogêneo e de comportamento elástico-linear, seguindo as hipóteses de solução de Burmister. A superfície do pavimento pode ser carregada com uma ou mais cargas, que são consideradas idênticas, atuando vertical e uniformemente sobre uma área circular. O ELSYM5 tem como principal vantagem o seu baixo tempo de processamento e a facilidade de uso rotineiro. Entretanto, tem contra si o fato de não considerar a não linearidade dos materiais, fator importante num estudo mais apurado. • KENLAYER – foi desenvolvido por Huang e citado em seu livro (HUANG, 1993). O programa foi criado para pavimentos flexíveis, pode ser aplicado 24 para sistemas de múltiplas camadas (máximo 19) submetidos a carregamentos estáticos e/ ou dinâmicos provenientes de rodas simples ou rodas duplas de eixos simples ou eixos tandem. O comportamento Tensão/Deformação de cada camada pode ser elástico-linear, elástico não- linear ou viscoelástico. O programa se fundamenta nos modelos teóricos generalizados por Burmister. O programa fornece as tensões horizontais,verticais e de cisalhamento máximo, assim como as tensões principais em qualquer ponto do sistema. As camadas são consideradas horizontalmente infinitas, possuindo espessuras uniformes e finitas com exceção da última que possui espessura infinita. Os módulos de resiliência e coeficientes de Poisson podem ou não ser constantes, dependendo do modelo adotado no projeto. As possibilidades relativas às configurações de carregamento estabelecem como limite até 24 cargas, cuja aplicação é distribuída uniformemente sobre uma área circular na superfície do sistema. O programa analisa danos nas camadas do pavimento, a partir da divisão do ano de serviço do mesmo em períodos (no máximo 24). Cada período guarda um grupo de propriedades diferenciadas dos materiais envolvidos a partir das repetições de diferentes carregamentos axiais. Os danos causados ao pavimento devido à fadiga e a deformação permanente em cada período pré-estabelecido, considerando a ação dos vários grupos de carregamento, são sumarizados de forma a se analisar a vida de projeto do pavimento em estudo. 25 3. Redes Neurais Artificiais (RNAs) As RNAs compõem um dos ramos da Ciência da Computação denominado Inteligência Artificial, que procura desenvolver modelos computacionais inspirados na capacidade natural do cérebro humano de pensar. As RNAs apresentam ótimos resultados na solução de problemas complexos envolvendo muitas variáveis, por isso, atualmente, as RNAs são aplicadas nas mais diversas áreas, como biologia, medicina, negócios, meio ambiente, indústria, engenharia, geologia e física, entre outras. Suas principais características estão relacionadas à capacidade de aprender por exemplos, de interpolar e/ou extrapolar com base em padrões fornecidos e de selecionar características especificas dentro de um universo amostral. Como já mencionado, as RNAs se baseiam no funcionamento do cérebro humano; simulam, também, sua composição, similar aos neurônios biológicos. São compostas por várias unidades de processamento (neurônios), conectadas por canais de comunicação (sinapses) aos quais são associados pesos que representam a importância de cada sinal transmitido. As RNAs diferem dos modelos computacionais tradicionais por apresentarem propriedades e características particulares, tais como: adaptabilidade ou aprendizagem, capacidade de generalização, agrupamento, organização de dados e tolerância a falhas. As RNAs, segundo WASSERMAN (1989), possuem muitas características do cérebro humano. Certos tipos de redes ensinam a si mesmas, através de exposição 26 repetida de um conjunto de dados, reconhecem características comuns entre eles e agrupa-os ordenadamente. Outros tipos de redes podem ser programadas para associar um conjunto de entrada com suas respectivas saídas. As RNAs podem generalizar através de exemplos imperfeitos (ruídos) e extrair informações essenciais das entradas contendo tanto dados relevantes como irrelevantes. A forma pela qual os neurônios estão interconectados constitui a arquitetura da rede. Geralmente essa escolha se faz através do nível de complexidade do problema a ser analisado. Deve-se experimentar várias arquiteturas até se chegar à mais conveniente, pois não existe uma regra a ser seguida, as diversas arquiteturas têm que ser testadas e escolhida a que melhor se comporta para cada problema. 3.1. Histórico O desenvolvimento das RNAs iniciou-se na década de 40, com os trabalhos de McCULLOCH & PITTS (1943) e HEBB (1949) que discutiam a capacidade de aprendizagem de informações das RNAs. O modelo matemático desenvolvido por Mcculloch e Pitts em 1943 tratava-se de um simples neurônio que trabalhava em um processo de decisão lógica (verdadeiro ou falso). O neurônio, nesse modelo, era composto de uma simples unidade de processamento, ativado pela soma ponderada das entradas e das saídas computadas por uma função threshold bi-estável (0 ou 1). HEBB (1949) apresentou uma teoria que explica o processo de aprendizagem que, segundo o autor, quando o axônio de uma célula A está próximo o suficiente para excitar uma célula B e repetida e insistentemente toma parte na emissão do sinal elétrico da célula B, algum processo de crescimento ou mudança metabólica acontece em uma ou ambas as células tal que a eficiência de A, para fazer a célula B disparar, é aumentada. WINDROW & HOFF (1960) desenvolveram o ADALINE (Adaptive Linear Element) e o MADALINE (Many ADALINE) Perceptron como dispositivos práticos para resolver tarefas de reconhecimento de padrões. O ADALINE e MADALINE usam saídas analógicas ao invés das binárias originalmente propostas por McCulloch e Pitts. 27 Minky e Papert fizeram um estudo cuidadoso desses algoritmos e publicaram, em 1969, seu livro Perceptrons. Provaram formalmente que uma rede formada de uma única camada de neurônios, independente do algoritmo de aprendizagem, é capaz de resolver o problema de associação de padrões apenas quando os conjuntos são linearmente separáveis. Esses resultados foram devastadores no desenvolvimento das RNAs que ficaram na década de 70 e início da década de 80 em plano secundário. A deficiência das redes Perceptron na resolução de problemas não-lineares foi suprida por RUMELHART et al. (1986). A solução encontrada foi a Regra Delta Generalizada, mais conhecida como algoritmo de aprendizagem backpropagation, para redes Perceptron de várias camadas de neurônios, com entradas e saídas analógicas, denominadas Multilayer Perceptron. A partir deste ponto houve um grande crescimento de pesquisas e aplicações das RNAs consolidando o uso das mesmas em diversas áreas. 3.2. Neurônio Artificial O Neurônio Artificial é uma unidade fundamental de processamento de uma RNA, o qual recebe uma ou mais entradas, transformando em saídas. Cada entrada tem um peso associado que determina sua intensidade, influência no dado de saída. A Figura 3.1 ilustra o esquema do neurônio artificial. sinais de entrada x1 k1W Wk22x xn knW ϕ (.) Saída ky pesos sinápticos função soma função de ativação uk θk threshold Figura 3.1: Modelo não linear de um neurônio artificial, segundo HAYKIN (1994) 28 Baseados na Figura 3.1 é possível distinguir alguns elementos considerados importantes na estrutura de um neurônio: • Sinapses: caracterizadas por um peso (w), que pode representar sua intensidade. O papel do peso wkj é multiplicar o sinal xj na entrada da sinapse j, conectada a um neurônio k. O peso wkj é positivo se a sinapse é excitatória e negativo se a sinapse associada é inibitória; • Somatório: adiciona as entradas ponderadas pelos seus pesos respectivos, ou seja, ∑ = = n j jkjk xwu 1 (3.1) • Limiar (threshold): θk, possui um papel determinante na saída do neurônio. Se o valor de uk for menor que este limiar, então, a saída do neurônio fica inibida. Caso contrário, o neurônio fica ativo; • Função de ativação: funciona como um limitante à amplitude da saída do neurônio, ou seja, a entrada é normalizada dentro de um intervalo fechado, geralmente [0,1] ou [-1,1]; • Saída do neurônio: yk, sendo: )( kkk uy θϕ −= (3.2) onde φ é a função de ativação 3.2.1 Função de Ativação HAYKIN (1994) afirma que a função de ativação define o valor da ativação de um neurônio conforme o nível de atividade da entrada. As funções de ativação típicas trabalham com adição, comparação ou transformações matemáticas. Algumas das funções de ativação comuns são:29 • Função Linear: )()1( tvt i=+ϕ ; ϕi(t+1) v i(t) Figura 3.2: Função de ativação linear • Função threshold ou limiar: < ≥=+ θν θνϕ )(,0 )(,1 )1( tse tse t i i i ; ϕi(t+1) v i(t)θ 1 Figura 3.3: Função de ativação threshold ou limiar 30 • Função piecewise linear: −<− ≤≤− >+ =+ θν θνθ θν ϕ )(,1 )( )(,1 )1( tse t tse t i i i i ; ϕi(t+1) v i(t)θθ -1 1 Figura 3.4: Função de ativação piecewise linear • Função sigmóide unipolar: )1( 1)1( )(ti ie t νϕ −+=+ ; ϕi(t+1) v i(t) +1 Figura 3.5: Função de ativação sigmóide unipolar A função sigmóide é para muitos a forma mais comum de função de ativação usada na construção de RNAs. É definida como uma função de caráter estritamente crescente, que mostra propriedades homogêneas e assintóticas. Enquanto uma função limiar assume o valor de 0 ou 1, uma função sigmóide assume valores em 31 uma faixa contínua entre 0 e 1. Além disso, a função sigmóide é diferenciável, enquanto que a função limiar não. 3.3. Redes Neurais Artificiais “Multilayer Perceptron” As RNAs tipo “Multilayer Perceptron” (MLP) são as mais empregadas atualmente, por serem muito versáteis e capazes de resolver problemas desde os mais simples até os mais complexos. Nas redes tipo MLP, camadas intermediárias são inseridas entre as camadas de entrada e de saída, em um número que pode ser ajustado em função da complexidade do problema e da precisão desejada. Porém, não existe uma arquitetura predefinida de acordo com a complexidade dos problemas. É necessário pesquisar a melhor alternativa, isto é, a melhor arquitetura da rede. A primeira camada de uma rede tipo MLP consiste de unidades de entrada, com as variáveis independentes. A última camada contém as unidades de saída, associadas às variáveis dependentes. Todas as outras unidades no modelo são denominadas unidades escondidas e constituem as camadas intermediárias. O algoritmo de treinamento utilizado em uma rede tipo MLP é o de backpropagation, que permite a minimização do erro por meio de ajuste dos pesos das sinapses. O desenvolvimento desse algoritmo é o principal responsável pela recente retomada de interesse pelas redes neurais. Uma das razões para isso é que uma RNA tipo MLP, com um número suficiente de unidades escondidas, pode aproximar qualquer função contínua com qualquer grau de precisão, empregando função de ativação tipo sigmoidal. Esta função tem por finalidade modificar um estado de ativação (ativo ou inativo) de uma unidade em um sinal de saída, comparando sinais antigos e atuais. Escolhida a arquitetura de uma rede tipo MLP e dado o conjunto de entrada e de saída, procede-se ao seu treinamento, empregando o algoritmo backpropagation, para estimar as relações funcionais entre as entradas e as saídas. A rede neural pode ser empregada, então, para modelar ou prever a resposta correspondente a um novo padrão. Esse procedimento é semelhante a um problema de regressão, na estatística convencional, em que se deseja encontrar uma relação entre variáveis independentes (entradas) e dependentes (saídas). 32 Este conhecimento é adquirido através de um processo de aprendizado ou treinamento; durante o treinamento, um conjunto de exemplos (ensaios, por exemplo), com as respostas já conhecidas, é apresentado à rede. Os dados de entrada são fornecidos ao sistema e é obtido o conjunto de respostas (saídas). As saídas da rede são comparadas com as respostas previamente conhecidas e, da diferença entre elas, é obtido o erro. Com o valor do erro, os pesos sinápticos são ajustados e o processo é repetido iterativamente, parando quando o erro atingir patamares satisfatórios. O conjunto de treinamento deve possuir um número razoável de dados que englobe toda a gama de valores, para que a capacidade de generalização não seja comprometida. Após o treinamento da rede, é testada sua capacidade de generalização. Para tal, apresenta-se à rede dados que não fizeram parte do conjunto de treinamento e analisam-se as respostas fornecidas por ela, verificando-se seu desempenho. Assim, a modelagem através de redes neurais apresenta algumas vantagens, como: flexibilidade da rede (a rede pode ser adaptada para um novo ambiente através da troca de padrões de entrada → saída), facilidade de capturar novas informações do meio (dados de novos ensaios, por exemplo) e treinamento possível mesmo na presença de ruídos, o que é comum em dados experimentais. 3.3.1. Algoritmo de Aprendizagem “backpropagation” O algoritmo de aprendizagem backpropagation do Multilayer Perceptron também é conhecido como Regra Delta Generalizada. Este algoritmo permite minimizar o erro, entre o valor real e o valor previsto pela rede, modificando os pesos das conexões entre os neurônios, por meio de uma retropropagação. O algoritmo backpropagation opera basicamente em duas fases, conforme mostra a Figura 3.6, cada uma percorrendo a rede em um sentido, a saber: 33 • Fase funcional (forward): ocorre quando os sinais de entrada são fornecidos à rede e esta produz uma saída. Esta saída é comparada com a saída desejada e o erro para cada neurônio da camada de saída é calculado; • Fase erro (backward): se processa a partir da última camada, é quando cada neurônio procura ajustar seus pesos de maneira a reduzir seu erro. Nesta fase a rede procura ajustar seus pesos baseando-se no erro admissível. Propagação do sinal funcional Retropropagação do erro Figura 3.6: Ilustração das direções das fases funcional e erro O treinamento usando esta regra consiste em fornecer à rede um conjunto de pares de entradas e saídas, onde a cada entrada do treinamento tem-se uma saída desejada. Este algoritmo é um método de gradiente descendente, que não garante chegar ao mínimo erro global, e que pode ser dividido em 5 passos segundo FILHO et al. (apud BREGA, 1996)1. • Passo 1: Apresente um padrão de entrada e a saída desejada. Utilizando uma determinada estratégia de apresentação coloque um dos padrões de entrada na camada de entrada e saída desejada nas suas respectivas camadas, então ative o passo calcule saída. 1 FILHO, E.C.B.C; LUDERMIR, T.B.; JUNIOR, W.R.O.; FRANÇA, F.G. (1994) Minicurso: modelagem aplicações e implementações de redes neurais. In: I Congresso Brasileiro de Redes Neurais. Itajubá, MG 34 • Passo 2: Calcule saída. A partir da primeira camada, permita que cada camada produza os valores de saída até atingir a camada de saída e, então ative o passo ajuste dos pesos da camada de saída. • Passo 3: Ajuste dos pesos da camada de saída. Para cada neurônio j da camada de saída, atualize todos os pesos wij conforme Equação 3.3, então ative o passo ajuste dos pesos das camadas escondidas. ijij ow ηδ=∆ (3.3) Onde: η: taxa de aprendizado; oi: saída do neurônio; δj: diferença (erro) entre a saída computada e a saída desejada do neurônio j, que pode ser calculada segundo a Equação 3.4: )1)(( jjjjj oodo −−=δ (3.4) Onde: dj: saída desejada em nj. • Passo 4: Ajuste de pesos das camadas escondidas Para ajustar os pesos de todas as camadas escondidas, atualiza-se o peso wki de um neurônio ni de uma camada escondida que está ligado a outro neurônio nk na camada anterior conforme Equação 3.5. kki iow /ηδ=∆ (3.5) Onde: η: taxa de aprendizagem δ/i: erro relativo do neurônio ni,
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